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Biblioteca_1650494 (2) pdfaula4 polifonia

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Aula 4 
Polifonia e Intertextualidade na Construção do Discurso 
Jurídico.
Objetivos:
▪ Compreender a relevância da polifonia para a produção
do discurso jurídico.
▪ Reconhecer a polifonia como fenômeno intertextual.
▪ Rescrever trechos e parágrafos por meio de paráfrases
(citações indiretas).
▪ Dominar as recomendações da ABNT acerca do uso de
citações diretas.
Modos de Narrar o Texto Jurídico: Discurso Direto e 
Indireto
O discurso relatado caracteriza as vozes do discurso alheio, isto
é, a presença do outro no discurso. Na descrição de algumas
formas de discurso relatado estão o discurso direto e o discurso
indireto, que são modos de relatar o discurso de outrem.
Para se compreender esse procedimento linguístico, é preciso
estar consciente de que há, sempre, um discurso citante, o
discurso de quem está produzindo o texto e um discurso citado,
aquele discurso utilizado para complementar ou ilustrar o
discurso citante.
No corpo textual da narrativa jurídica, muitas vezes, é
importante atribuir uma fala ou comentário a uma das partes.
Nessas situações, pode-se recorrer a diferentes modos de
organização da linguagem para informar o que foi dito por
alguém, fazendo uso do discurso direto e indireto.
Sempre que o narrador apresenta a fala integral das partes, sem
qualquer interferência, diz-se que ocorreu o uso do discurso
direto.
As narrativas costumam marcar o discurso direto com o uso de
travessões ou aspas para identificar a fala da personagem. O
discurso direto caracteriza-se pela presença de verbos dicendi,
aqueles que servem para introduzir a fala da outra pessoa (dizer,
afirmar, responder, declarar, definir), de verbos da área semântica
de perguntar (indagar, adquirir, questionar, interrogar) e de verbos
sentiendi, os que expressam estado de espírito, reação psicológica
da pessoa que fala, emoções (gemer, suspirar, lamentar (-se),
queixar-se, explodir).
Os verbos dicendi e sentiendi não só podem abrir (preceder) o
diálogo, como também encerrá-lo.
Ex.: 1) O Réu declarou:
“Eu sou inocente”.
2)“Eu sou inocente” – declarou o Réu.
O discurso direto – que é uma citação direta – se faz
muito presente em busca da argumentação por
autoridade para alcançar convencimento ou persuasão.
Para fundamentar suas razões, no campo jurídico, citam-
se doutrinadores e jurisprudências, muitas vezes,
ocupando tais estratégias a maior parte do corpo do texto
produzido.
No entanto, deve-se evitar o uso do discurso direto na
narrativa jurídica porque o advogado deve mostrar, em
seu texto, a sua competência linguística por meio de uma
linguagem própria, autônoma, narrando e descrevendo
com sua própria linguagem o que a parte lhe relatou
sobre o caso concreto, buscando maior veracidade para os
fatos narrados.
Quando o advogado, em lugar de apresentar a fala da (s)
parte (s) em seu texto, as reconstrói por meio da sua
linguagem, tem-se a ocorrência do discurso indireto.
Ex.:1) O Réu declarou que era inocente.
2) Na audiência de instrução e julgamento, realizada em
29/08/2013 (quinta-feira), foram ouvidas duas testemunhas
de acusação que, cada uma a seu turno, disseram ter visto
Diogo pular o muro da residência da vítima e de lá sair, cerca
de vinte minutos após, levando uma mochila cheia.
➢ O discurso indireto caracteriza-se, geralmente, pela
presença de verbos dicendi e sentiendi, pela conjunção
integrante que ou se e pela alteração, de tempos verbais,
advérbios e pronomes
O discurso indireto é uma paráfrase do que foi proferido
pelo enunciador citado. A paráfrase é uma técnica
amplamente utilizada, principalmente nos textos jurídicos,
pois é uma reescritura de texto sem alterar o seu conteúdo.
Em Direito, os representantes legais das partes processuais,
por exemplo, ao elaborarem a narrativa jurídica, sempre fazem
paráfrase daquilo que foi narrado por elas, em um discurso
indireto, respeitando-se a modalidade culta da língua. Dessa
forma, percebe-se que a narrativa jurídica é profundamente
influenciada pelo texto do outro; não é um texto puro, mas
sim um intertexto.
Entretanto, o advogado da parte tem sua criatividade tolhida:
é impossível – e ilegal – que os fatos sejam expostos de forma
diferente daquela apresentada pela parte, sob pena de se
alterarem os próprios fatos, o que seria uma litigância de má-
fé, além de envolver questões ético-profissionais.
É a relação de um texto com outros textos previamente
existentes, isto é, efetivamente produzidos.
Ex.: Música Monte Castelo (Legião Urbana) cita a Bíblia e
Camões.
Monte Castelo (Legião Urbana)
Ainda que eu falasse I Coríntios 13.
A língua dos homens (Apóstolo Paulo)
E falasse a língua dos anjos 
Sem amor eu nada seria
É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade
O amor é bom, não quer o mal
Não sente inveja ou se envaidece
O amor é o fogo que arde sem se ver 
É ferida que dói e não se sente Amor é fogo que arde sem se ver.
É um contentamento descontente ( Luiz de Camões) 
É dor que desatina sem doer
Ainda que eu falasse 
A língua dos homens I Coríntios 13.
E falasse a língua dos anjos (Apóstolo Paulo)
Sem amor eu nada seria
É um não querer mais que bem querer 
É solitário andar por entre a gente Amor é fogo que arde sem se ver
É um não contentar-se de contente ( Luiz de Camões)
É cuidar que se ganha em se perder
É um estar-se preso por vontade 
É servir a quem vence, o vencedor Amor é fogo que arde sem se ver
É um ter com quem nos mata a lealdade ( Luiz de Camões)
Tão contrário a si é o mesmo amor 
Estou acordado e todos dormem
Todos dormem, todos dormem
Agora vejo em parte
Mas então veremos face a face
É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade
Ainda que eu falasse 
A língua dos homens I Coríntios 13.
E falasse a língua dos anjos (Apóstolo Paulo)
Sem amor eu nada seria
Intertextualidade explícita e implícita
A intertextualidade é explícita, quando há citação da
fonte do intertexto, como acontece no discurso relatado,
nas citações e referências.
A intertextualidade implícita ocorre sem citação expressa
da fonte, cabendo ao interlocutor recuperá-la na memória
para construir o sentido do texto, como na paródia, certos
tipos de paráfrases e de ironia.
Emprega-se o termo polifonia para caracterizar um certo tipo de texto,
em que se deixam entrever muitas vozes.
No discurso jurídico indicar as vozes que compõem o relato é
importantíssimo. Na fundamentação, citam-se trechos da lei, da
jurisprudência, da doutrina etc. como argumentos de autoridade. São
vozes que se associam à voz do orador e lhe fornecem maior
credibilidade. Essa apropriação da voz do outro se chama
intertextualidade.
Leiamos o relato de uma sentença para verificarmos exemplos de
polifonia.
SENTENÇA:
Vistos etc. O Representante do Ministério Público Federal ingressou
com a presente ação criminal contra L.L.L, qualificado na inicial de fls.
02, como incurso nas sanções dos arts. 129, “caput”, e 331, c/c o art. 69,
todos do Código Penal, por ter, sucessivamente, desacatado e agredido o
Patrulheiro Rodoviário Federal FFF, no dia 12 de fevereiro de 1997, na
Rodovia BR-235, no Município de Itabaina /SE, quando este procedia à
lavratura de um auto de infração de trânsito, cometido por um terceiro.
Narra a denúncia que, após várias pessoas terem solicitado ao
patrulheiro relevar a falta, as quais se encontravam próximas do
evento, o denunciado, sendo mais incisivoe motivado por
anterior discussão com o aludido policial, passou a dirigir-lhe
ofensas verbais, inclusive com ameaças, tendo-lhe desferido um
tapa no seu rosto e, após ser perseguido, voltou a produzir novas
lesões na vítima, agora utilizando-se de um pedregulho.
Laudo de Exame de Lesões Corporais às fls. 13 e 14.
Recebida a denúncia (fl. 64), e estando prejudicada a proposta
de suspensão do processo, nos moldes previstos no art. 89, da Lei
nº 9.099/95(fls. 35, 47, 48, 63 e 129), foi procedido o
interrogatório do Réu (fls. 81 e 82).
Em seu interrogatório, o acusado nega ter agredido o policial
rodoviário, esclarecendo que ao avistar um seu colega autuado
pelos patrulheiros, encaminhou-se ao local e, por encontrar-se
embriagado, tropeçou e acabou por esbarrar em um deles,
originando toda a confusão. Informa mais, ‘por ouvir dizer’, que
uma pessoa conhecida por “Branquinho”, teria sido o autor da
pedrada que acertou o policial.
Foram ouvidos o ofendido, cujas declarações encontram-se a
fls. 145 e 146, e duas testemunhas de Acusação, cujos
depoimentos encontram-se a fls. 147 e 182.
Também foram colhidos os depoimentos de três testemunhas
arroladas pela defesa (fls. 213, 214/215 e 234)
No prazo do art. 499, do CPP, o M.P.F nada requereu (fl. 236-v.).
A defesa do acionado, apesar de intimidada para os fins do art.
499, do CPP, manteve-se silente (fls. 238/239 e 240).
O Ministério Público Federal, em suas razões finais (fls. 241 e
242), à vista das provas coligidas aos autos, e pela aplicação do
princípio da consunção, requer a condenação do Réu nas
sanções do art. 331-desacato -, do Código Penal, cuja conduta
absorveria o crime de lesões corporais leves.
A fls.246 a 251, as alegações finais do acusado....
No mérito, o Réu nega ter desacatado o policial
rodoviário e, mesmo, lançado contra ele uma pedra,
ocasionando-lhe as lesões descritas no laudo pericial.
Argumenta pela insistência de dolo específico face ao
estado de embriaguez, conforme se depreende da
prova testemunhal produzida, não se podendo
considerar, assim, a conduta do agente como típica.
Pugna, ao final, pela sua absolvição.
É o relatório.
Obs.: Toda intertextualidade é um exemplo de polifonia. Entretanto,
nem toda voz em um texto é considerada uma intertextualidade.
As vozes de testemunhas em uma narrativa jurídica é uma polifonia
(vozes), mas não é uma intertextualidade. Para ser intertextualidade
precisa ser um texto (uma voz) previamente conhecido dentro de outro.
Relevância da polifonia na sentença
▪ Pleno entendimento do caso.
▪ Julgamento imparcial.
Elementos linguísticos que têm o papel de marcar a polifonia
▪ Conjunções conformativas: segundo, conforme, como etc.
▪ Verbos introdutores de vozes (dicendi): dizer, falar, (verbos mais
neutros); enfatizar, afirmar, advertir, ponderar, confidenciar, alegar.
 Exercícios
Questão 1 
Leia o fragmento, compreenda seu sentido global e parafraseie seu
conteúdo.
Consoante orientação de Malhães, “os estudantes que estão se iniciando na
vida intelectual precisam ser orientados pelos seus professores, a fim de
adquirirem familiaridade com os livros e habilidades na seleção das obras a
serem consultadas.”
Questão 2 
O texto adiante é rico em polifonia. Identifique essas ocorrências e comente qual o
papel dessas informações na construção do texto.
O Ministério Público de Santa Catarina impediu que o bacharel em Direito Carlos
Augusto Pereira prestasse concurso público para Promotor de Justiça do órgão, por ele
ser cego. Ele recorreu da decisão, mas teve o seu pedido negado.
Na carta em que justifica a medida, o MP de Santa Catarina alegou que a função é
indelegável, e Pereira, obrigatoriamente, teria que se socorrer de pessoas estranhas ao
quadro funcional que não prestaram juramento público.
O Presidente da Comissão de Concurso, Pedro Sérgio Steil, afirmou que o "Promotor
tem de preservar o sigilo e não pode repassá-lo a ninguém. Há impossibilidade de
exercício profissional de uma pessoa com essa deficiência".
Já o Presidente da Associação Nacional do Ministério Público, Marfam Vieira, discorda.
"Não vejo incompatibilidade. Há áreas em que ele poderia atuar perfeitamente. E é
função do Ministério Público proteger o deficiente físico, sobretudo porque a
Constituição determina reserva de vaga nos concursos públicos. É lamentável que o MP
de Santa Catarina esteja praticando um ato de discriminação". Marfam vai pedir à
presidência da Associação do MP daquele Estado que reveja a decisão. Carlos Augusto
Pereira afirmou que, se fosse aprovado, teria um funcionário investido de fé pública para
ler os documentos para ele.
“A orientação da manifestação ministerial seria dada por mim. Além
disso, há sistemas que fazem a leitura pelo computador, como os
sintetizadores de voz", ressaltou, ainda, Vieira. O Estado de Santa
Catarina tem na Procuradoria da Advocacia Geral da União - órgão
federal - um cego, Orivaldo Vieira. Há casos semelhantes em outros
Estados do país. O procurador do Trabalho, Ricardo Marques da
Fonseca, chefe da Procuradoria Regional de Campinas, e o defensor
público Valmery Jardim, também são cegos.
O bacharel é funcionário concursado da Justiça Eleitoral. Na ocasião do
concurso, para auxiliá-lo nos exames, foram designados dois advogados:
um leu para ele a prova e os livros usados para consulta, e o outro
escreveu as respostas.
O candidato considera ter sido uma vítima do preconceito e vai mover
uma ação em face do órgão catarinense e exigir indenização por danos
morais.
Ainda, segundo o Corregedor-Geral do MP de Santa Catarina, um cego
precisaria, em algumas circunstâncias, do auxílio de outra pessoa. A
tecnologia fornece facilidades, mas o reconhecimento de provas ou o
exame de uma perícia ficam prejudicados. Não é razoável que o Estado
tenha de criar uma estrutura para viabilizar uma exceção.
Questão 2 . (Objetivas) 
A mudança de posição dos termos em destaque, proposta na versão à direita,
PREJUDICA o sentido pretendido no texto original apenas em...
(A)TEXTO ORIGINAL: Itamar disse que espera mudanças nas regras dos debates a serem
promovidos em Minas. 'É impossível falar sobre a desorganização administrativa que se instalou
no Estado em apenas um minuto', justificou,... (ESTADO DE MINAS - 1/8/98) ALTERAÇÃO
PROPOSTA: Itamar disse que espera mudanças nas regras dos debates a serem promovidos em
Minas. "É impossível, em apenas um minuto, falar sobre a desorganização administrativa que se
instalou no Estado", justificou,...
(B) TEXTO ORIGINAL: A informação da polícia é de que alguns dos aparelhos teriam chegado até
os presos escondidos dentro de galinhas assadas. (A GAZETA - 12/8/98) ALTERAÇÃO
PROPOSTA: A informação da polícia é de que alguns dos aparelhos teriam chegado, escondidos
dentro de galinhas assadas, até os presos.
(C) TEXTO ORIGINAL: Apesar de os atiradores estarem sem capacete, ninguém conseguiu ver
seus rostos, que estavam em uma moto Honda XL250. (A GAZETA - 12/8/98) ALTERAÇÃO
PROPOSTA: Apesar de os atiradores, que estavam em uma moto Honda XL250, estarem sem
capacete, ninguém conseguiu ver seus rostos.
D) TEXTO ORIGINAL: Victor dá posse amanhã a Rômulo Penina, para a casa civil, que acumulará
os dois cargos. (A GAZETA - 1/4/98) ALTERAÇÃO PROPOSTA: Victor dá posse amanhã, para a
casa civil, a Rômulo Penina, que acumulará os dois cargos.
(E) TEXTO ORIGINAL: Com essa aquisição, a Saraiva, que ocupava o quarto lugar no ranking
das editoras de livros didáticos, deu um passo largo para dominar o mercado. (A GAZETA -
27/8/98) ALTERAÇÃO PROPOSTA: Com essa aquisição, a Saraiva deu um passo largo para
dominar o mercado, que ocupava o quarto lugar no ranking das editoras de livros didáticos
2. Sobre polifonia e intertextualidade, qual a análise incorreta?
(A) A polifonia é a incorporação ao discurso de asserções
emitidas diretamente por terceiros.
(B) A polifonia é um reforço à linha argumentativa e ao recorrer a
vozes alheias pelas citações, busca fundamentar proposição.
(C) Na intertextualidade, a citação direta é uma ocorrênciapredominante na fundamentação do argumento.
(D) A intertextualidade sem uma intenção exclusivamente
argumentativa repete - ideias e falas - de outros emissores, as
quais serão notadas em função do repertório de leitura do
interlocutor e não pela citação direta.
(E) A paráfrase é um recurso linguístico presente tanto na
polifonia quanto na intertextualidade.

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