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GRADUAÇÃO 2017.1 PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO AUTORA: MELINA ROCHA LUKIC Sumário Planejamento Tributário Sumário PARTE 1 — CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ..................................................................... 4 AULA 1 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E TRIBUTAÇÃO NO BRASIL ................................................................................ 5 1) Por que pagar tributo? Conceito de Tributo e Funções da Tributação ............................................................. 5 2) Por que fazer planejamento tributário? ....................................................................................................... 10 3) Distribuição da carga tributária ................................................................................................................. 14 4) Efeitos perversos do Sistema Tributário sobre os Contribuintes ..................................................................... 16 AULA 2 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NO PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DO DIREITO ....................................................... 19 1) Regra Matriz de Incidência Tributária: critérios da hipótese ........................................................................ 21 2) Regra Matriz de Incidência Tributária: critérios do conseqüente .................................................................. 23 AULA 3 — ELEMENTOS DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E FIGURAS AFINS ..................................................................... 30 1) Conceito e elementos do Planejamento Tributário ....................................................................................... 30 2) Planejamento Tributário e Figuras Afins ..................................................................................................... 34 AULA 4 — AS FASES E LIMITES DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO .................................................................................. 42 1) Primeira fase: liberdade salvo simulação ..................................................................................................... 42 2) Segunda fase: liberdade salvo patologias dos negócios jurídicos ..................................................................... 49 3) Terceira fase e a transição de modelos: liberdade com capacidade contributiva ............................................. 55 AULA 5 — NORMA GERAL ANTIELISIVA DO BRASIL? .................................................................................................. 61 1) Escopo da norma ........................................................................................................................................ 61 2) Argumentos acerca da inconstitucionalidade ............................................................................................... 63 3) Necessidade de regulamentação ................................................................................................................... 65 PARTE 2 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E TRIBUTAÇÃO DA RENDA ............................................................................. 75 AULA 6 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA — PESSOA FÍSICA 76 1) Normas Gerais do Imposto de Renda ........................................................................................................... 76 2) Elementos da Regra Matriz de Incidência Tributária do Imposto de Renda Pessoa Física ............................. 79 AULA 7 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E TRIBUTAÇÃO SOBRE O LUCRO E A RECEITA DA PESSOA JURÍDICA ............................ 94 1) Simples Nacional ........................................................................................................................................ 95 2) Lucro presumido ......................................................................................................................................... 97 3) Lucro real 101 AULA 8 — CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS SOBRE O FATURAMENTO E O LUCRO— PIS, COFINS, CSLL .......................................... 113 1) Contribuição social sobre o lucro líquido ................................................................................................... 113 2) PIS/PASEP e COFINS ............................................................................................................................. 115 AULA 9 — APROVEITAMENTO DO ÁGIO ................................................................................................................ 125 1) Contabilização do ágio ............................................................................................................................. 127 2) Incorporação para fins de aproveitamento do ágio ...................................................................................... 136 AULA 10 — TRIBUTAÇÃO DA REMUNERAÇÃO DE ADMINISTRADORES, SÓCIOS E ACIONISTAS ............................................. 167 1) Distribuição dos lucros e resultados ........................................................................................................... 167 2) Participação nos lucros e resultados ........................................................................................................... 167 3) Stock options 168 4) Debêntures com Participação nos Lucros ................................................................................................... 169 5) Juros sobre o capital próprio ...................................................................................................................... 170 AULA 11 — TRIBUTAÇÃO DAS COLIGADAS E CONTROLADAS NO EXTERIOR ..................................................................... 173 AULA 12 — COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO FISCAL .................................................................................................... 203 Compensação de prejuízos fiscais Incorporação às avessas ................................................................................ 203 PARTE 3 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL ....................................................................................... 213 AULA 13 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL ....................................................................................... 214 a) Harmful preferential tax system................................................................................................................. 215 b) Tax Havens ....................................................................................................................................... 216 AULA 14 — PREÇO DE TRANSFERÊNCIA ................................................................................................................ 243 1) Calcule o Preço Parâmetro pelo método PRL (Preço de Revenda menos o Lucro) conforme a lei 9.430/96 e segundo a MP 563/2012. .................................................................................................. 243 AULA 15 — SUBCAPITALIZAÇÃO ......................................................................................................................... 246 PARTE 4 — MERCADO FINANCEIRO E TRIBUTOS INDIRETOS ...................................................................................... 259 AULA 16 — MERCADO FINANCEIRO ..................................................................................................................... 260 AULA 17 — TRIBUTOS INDIRETOS ....................................................................................................................... 267 Caso 1: ICMS Importação ............................................................................................................................ 267 Caso 2: Glosa de crédito de benefício de guerra fiscal ..................................................................................... 268 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................................... 270 PLANEjAMENTO TRIbUTáRIOFGV DIREITO RIO 4 PARTE 1 — CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 5 1 Art. 3º Tributo é toda prestação pecu- niária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituí- da em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. AULA 1 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E TRIBUTAÇÃO NO BRASIL 1) POR QUE PAGAR TRIBUTO? CONCEITO DE TRIBUTO E FUNÇÕES DA TRIBUTAÇÃO A relação fisco-contribuinte é por, sua natureza, marcada desde sempre por um confronto de idéias e interesses. De um lado, o contribuinte tende a ver o tributo como uma interferência estatal em seu patrimônio; de outro, o tributo representa um pilar fundamental para o funcionamento e funções do Estado. O tributo está, assim, no meio termo entre a liberdade do contri- buinte em organizar seus negócios e a necessidade do Estado em arrecadar. É neste confronto, portanto, que surge o planejamento tributário. Mas antes de adentrarmos na análise do planejamento tributário em si, importante nos dedicarmos ao estudo do conceito de tributo e das funções da tributação. Ora, só há planejamento tributário porque há a obrigatorieda- de de pagarmos tributos. Assim, para entendermos planejamento tributário, necessário se faz entender o que é tributo e por que devemos pagá-lo, ou seja, quais os fundamentos para a sua cobrança. Para cumprir certas funções que a seguir descreveremos, o Estado tem a seu dispor o poder de instituir tributos. Por se tratar de um Estado De- mocrático de Direito, este poder tributário encontra fundamento, e limites, na lei — no caso do Brasil — prioritariamente na Constituição Federal. A Constituição Federal brasileira, no entanto, não define nem institui tributos. O que a Constituição faz é escolher certos fatos ou atos e negócios jurídicos que expressam riqueza e distribui a competência para instituir tributos sobre estes fatos aos entes federativos (União, Estado, Município e Distrito Fede- ral) ou a entidades paraestatais. Assim, cada ente, no âmbito da competência outorgada pela Constituição, deverá instituir os tributos respectivos. O tributo é definido pelo art. 3° do CTN como uma prestação compulsó- ria a ser paga ao Estado1. Assim, uma vez realizado o fato descrito na sua nor- ma de incidência (fato gerador), estará o contribuinte ou responsável obri- gado a recolher aos cofres públicos o respectivo montante. O planejamento tributário se insere, portanto, neste contexto. Se, por um lado, há a obrigação de pagar tributo com a ocorrência do fato gerado; por outro, o contribuinte pode entender que tem o direito de orientar seus negócios de maneira tal que não haja a configuração do fato descrito na norma de imposição tributária ou que o fato ocorra em valores menores. No contexto do planejamento tributário, o próprio conceito de tributo pode sofrer diferentes significações, dependendo da visão do agente que o utiliza. Assim, para o contribuinte, o tributo geralmente é visto como algo 1. Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 6 não querido, como uma intervenção do Estado no seu patrimônio e, sendo assim, deve ser feita nos estritos limites da lei. Ives Gandra Martins conceitua tributo como uma “norma de rejeição social”. Para fundamentar esta visão, invoca os princípios da legalidade estrita e tipicidade. Ou seja, aquilo que não estiver estritamente previsto em lei, não poderá ser cobrado do contri- buinte a título de tributo. Já se falarmos da visão do Estado, o tributo seria a participação de cada um nas despesas comuns, na manutenção e no exercício das funções essenciais da Administração Pública. Ligado a esta visão, estaria o princípio da capacidade contributiva, segundo o qual cada um deve con- tribuir na medida das suas disponibilidades econômica-financeiras. A conse- qüência é que, tendo o contribuinte manifestado a capacidade contributiva, estaria o poder público autorizado a onerá-lo por meio da tributação. Assim, o conceito de tributo, apesar de claramente disposto no Código Tributário Nacional, pode ter diferentes significações no âmbito do plane- jamento tributário, dependendo, principalmente, da posição do agente que dele faz referência. No mesmo sentido, a tributação pode assumir múltiplas funções, de acor- do com os valores e princípios maiores que se deseja por meio dela alcançar. Sobre o assunto, Ricardo Lobo Torres afirma que a atividade financeira do Estado, apesar de instrumental, “não é neutra frente aos valores e princípios jurídicos, senão que a eles se vincula fortemente” (Torres, 2009, p.5). Sobre a orientação do Direito Tributário por valores, Klaus Tipke afirma que: O Direito Tributário de um Estado de Direito não é Direito técni- co de conteúdo qualquer, mas ramo jurídico orientado por valores. O Direito Tributário afeta não só a relação cidadão/Estado, mas também a relação dos cidadãos uns com os outros. É Direito da coletividade (Tipke, 2002, p. 15). A este título, Ardant afirma que “a atividade econômica e a evolução mes- ma do mundo, não podem ser compreendidas sem que façamos uma abstra- ção do meio fiscal no qual se banham” (Ardant, 1965). Primeiramente, no que diz respeito às idéias e crenças em torno do assun- to, a tributação pode comportar múltiplos sentidos, que correspondem, de acordo com Bouvier (2007, p. 14), “a um projeto que a sociedade, a um dado momento, atribuiu globalmente ao imposto”. Neste sentido, a extensão e a legitimidade do poder tributário variaram no curso dos anos, de acordo com as teorias e interpretações dominantes de cada época. Assim, se durante o século XVII, a idéia é que o tributo era devido em contrapartida aos serviços prestados pelo Estado; a partir do século XIX, teorias sobre a função social do tributo emergiram. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 7 Esta situação não é diferente na América Latina e no Brasil. No início do período colonial o aparato fiscal instalou-se nesta região. Se, nesta época, a tributação foi utilizada como um simples instrumento de arrecadação de di- nheiro para a metrópole; com o advento dos Estados independentes o impos- to tornou-se um instrumento para políticas econômicas e sociais, seguindo os sucessivos ciclos de produção. No meio de tudo isso, o continente também conheceu revoltas e rebeliões contra a utilização abusiva do imposto. Especificamente com relação aos objetivos da tributação, regra geral, os tributos cumprem prioritariamente uma finalidade fiscal, ou seja, arrecadar recursos financeiros aos cofres públicos. Neste sentido, os tributos ocupam um lugar central, sendo responsáveis por cerca de 80% do total das receitas do governo, conforme quadro abaixo: RESULTADO NOMINAL DO GOVERNO GERAL 2010 (*) Natureza Governo Geral (1) Federal Estadual Municipal (**) I. Recebimento de Caixa por Atividades Ope- racionais 1.383.495.939 987.875.190 452.282.378 290.810.845 I.1. Impostos 956.017.604 575.578.855 312.421.294 68.017.455 I.1.1. Impostos sobre renda, lucros e ganhos de capital 261.088.571 242.700.615 12.917.368 5.470.588 IR 213.060.361 194.672.405 12.917.368 5.470.588 CSLL 46.370.276 46.370.276 — — Outros 1.657.933 1.657.933 — — I.1.2. Impostos sobre a folha de pagamento e a força de trabalho 12.226.541 12.226.541 — — I.1.3. Impostos sobre o patri- mônio 47.027.078 1.335.486 24.397.785 21.293.807 IPTU 16.244.630 — 400.009 15.844.622 IPVA 21.277.523 — 21.277.523 — Outros 9.504.925 1.335.486 2.720.254 5.449.185 PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 8 Natureza Governo Geral (1) Federal Estadual Municipal (**) I.1.4. Impostos sobre bens e serviços 589.146.563 293.452.352 265.661.144 30.033.068 IPI 37.553.815 37.553.815 — — IOF 26.576.14526.576.145 — — COFINS 141.232.331 141.232.331 — — ICMS 265.661.144 — 265.661.144 — ISS 30.033.068 — — 30.033.068 Outros 88.090.061 88.090.061 — — I.1.5. Impostos sobre o comér- cio e as transa- ções internacio- nais 21.093.347 21.093.347 — — I.1.6. Outros impostos 25.435.505 4.770.515 9.444.997 11.219.993 I.2. Contribui- ções sociais 246.812.767 223.357.199 17.531.526 5.924.042 I.3. Doações 22.436 22.436 83.183.304 197.463.532 I.4. Outras receitas 180.643.131 188.916.700 39.146.253 19.405.816 I.4.1. Juros (2) 7.925.835 70.753.015 3.998.457 — I.4.2. Outros 172.717.297 118.163.684 35.147.796 19.405.816 Fonte— Tesouro Nacional (*) Não inclui as operações do Banco Central nem de empresas estatais. (**) Grau de cobertura de 93,6% dos municípios brasileiros. (1) O resultado consolidado exclui as transferências intergovernamentais. (2) Calculados pelo conceito de competência (BACEN). Ocorre, porém, que os tributos podem igualmente ser utilizados pelo Es- tado como instrumento de para ou extrafiscalidade, ou seja, tanto como uma forma de intervenção na economia, como um elemento chave na apli- cação das políticas sociais e de redistribuição (Bouvier, 2007, p. 14). A este título, Machado (2005, p.81) afirma que “no mundo moderno (...) o tributo é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, es- timulando atividades, setores econômicos ou regiões, desestimulando o con- sumo de certos bens e produzindo, finalmente, os efeitos mais diversos na PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 9 economia”. O mesmo autor elucida a diferença entre os diferentes objetivos do tributo. Segundo ele, quanto ao seu objetivo, o tributo é a. Fiscal, quando seu principal objetivo é a arrecadação de recursos financeiros para o Estado. b. Extrafiscal, quando seu objetivo principal é a interferência no domí- nio econômico, buscando um efeito diverso da simples arrecadação de recursos financeiros. c. Parafiscal, quando o seu objetivo é a arrecadação de recursos para o custeio de atividades que, em princípio, não integram funções próprias do Estado, mas este as desenvolve através de entidades es- pecíficas (Machado, 2005, p. 82) No mesmo sentido, Giambiagi (2008, p.10) afirma que a política fiscal pode realizar três funções principais. A primeira — função alocativa — re- fere-se ao fornecimento de bens públicos. A segunda é a função distributiva, associada à redistribuição de renda através da tributação. Por último, a última função corresponde à estabilização, cujo objetivo é influenciar a política econômica para atingir certo nível de emprego, estabilidade dos preços e taxa de crescimento econômico. Ardant também enumera duas funções principais dos tributos: criar os recursos necessários para o funcionamento do Estado e assegurar o equilíbrio e a orientação da economia. Segundo o mesmo autor, a tributação “permite também alterar a distribuição dos rendimentos e das fortunas, quer no sentido da consolidação de privilégios, quer no sentido da equalização das condições” (Ardant, 1965). Assim como a tributação, a idéia de planejamento tributário igualmente sofreu modificações, de acordo com o contexto histórico, político, social e econômico no qual se inseriu. Conforme veremos em capítulos posteriores, os primórdios do debate sobre o planejamento tributário se concentravam na liberdade total dos indivíduos de organizarem suas atividades da maneira que bem entendessem no sentido de evitar ou diminuir a tributação, proibindo- -se somente o emprego de meios ilícitos ou de simulação. Com o passar do tempo, o debate se modificou no sentido de não aceitar como planejamento tributário, casos que envolvam o emprego de fraude à lei, abuso de direito, simulação ou sem um “propósito negocial”. Uma terceira fase do debate tem como principal enfoque o princípio da capacidade contributiva como critério para a averiguação da existência de obrigação tributária. Assim, ocorrendo a manifestação da capacidade contributiva, independentemente do perfil do negócio realizado, haveria o dever de pagar o tributo devido. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 10 2) POR QUE FAZER PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO? Diversas razões podem ser invocadas para justificar a decisão de se fazer um planejamento tributário. Os motivos para se fazer um planejamento tributário não estão circunscritas à esfera jurídica. Pelo contrário, o principal deles é, sem dúvidas, de ordem econômico-financeira. O primeiro conceito importante para se entender a questão é o princípio da neutralidade fiscal. Este princípio representa uma tentativa de ponderar a equidade e eficiência econômica. A neutralidade fiscal tem como pressuposto evitar que a tributação cause dese- quilíbrio na economia, principalmente no sistema de preços (Caliendo, 2009, p.101). Assim, o princípio da neutralidade fiscal apregoa que a tributação deve ter menor afetação possível na economia, com a finalidade de manter o seu equilíbrio geral (Caliendo, 2009, p.101). Ou seja, uma carga tributária exces- siva pode afrontar a neutralidade fiscal do sistema e “se constituir em um custo distorcivo do sistema de preços de uma determinada economia”. (Caliendo, 2009, p.101). Diante de uma carga tributária pesada, os agentes econômicos passam a incluir entre as suas variáveis de uma decisão econômica o peso da tributação. É aí que entra, em termos econômicos, o planejamento tributário das empresas, no sentido de estruturar suas operações e negócios de forma que sobre eles recaia o menor ônus tributário possível. Em razão da interferência da tributação nos agentes econômicos, o econo- mista Arthur Laffer, desenvolveu em 1974 um gráfico que bem representa a relação causada entre a arrecadação de tributos por parte do Estado e a carga tributária sobre os agentes econômicos. É a chamada curva de Laffer: Fonte: MANKIW, Nicholas Gregory. Princípios de Microeconomia. Tradução de Allan Vidigal Hastings. São Paulo: Thomson Learning, 2007. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 11 O gráfico é formado por dois eixos: um que representa o quantum pago em tributo e outro referente à receita obtida pelo governo. A linha em pará- bola existente no gráfico representa o quanto a demanda conseguirá absorver a imposição da tributação. Conforme percebido, a partir de um certo ponto (t*), inicia-se um processo decrescente da parábola, o que quer dizer que a receita do Governo diminuirá diante de uma carga tributária excessiva. Com a análise da curva de Laffer e da interferência da tributação sobre o mercado, conclui-se que um sistema tributário eficiente é aquele que gera para o Estado o mesmo montante de recursos com um menor custo para o contribuinte. Por esta razão., antes de se iniciar o estudo jurídico do planejamento tribu- tário, precisamos relacioná-lo com a estrutura da tributação e arrecadação no Brasil. Ao se conhecer a composição e funcionamento do sistema tributário brasileiro, podemos entender alguns dos motivos pelos quais o planejamento tributário tornou-se uma opção recorrente dos contribuintes, principalmente nos últimos anos. Pode-se apontar como uma das razões para a necessidade do planejamento tributário o forte aumento da carga tributária no Brasil nas duas últimas décadas. Em 1988, a carga fiscal representava 22,4% do PIB. Vinte anos após, a carga subiu a quase 35,31% do PIB em 2011, como po- demos ver nos quadros abaixo: PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 12 1988 22,4% 2000 32,55% 1989 24,1% 2001 34,01% 1990 30,50% 2002 35,61% 1991 25,21% 2003 34,92% 1992 25,85% 2004 35,88% 1993 25,72% 2005 33,38% 1994 29,46% 2006 33,51% 1995 29,76% 2007 34,72% 1996 28,97% 2008 35,80% 1997 29,03% 2009 33,58% 1998 29,74% 2010 33,56% 1999 32,15% 2011 35,31% Elaborado pela autora — Fonte: Ministério da Fazenda/Receita Federal Para se ter uma noção do tamanho da carga tributária brasileira, impor- tante compará-la com a carga de alguns países no mundo. Conforme os da- dos da tabela abaixo, a carga tributáriabrasileira está próxima a países como Canadá, Espanha, Reino Unido e Alemanha. O Brasil lidera o ranking dos países da América latina, tendo a maior carga tributária da região, bem como a dos países integrantes do “BRICS”, cujo grau de desenvolvimento econô- mico é equiparado com o brasileiro. JAPÃO 17,6% América Latina ESTADOS UNIDOS 26,9% ARGENTINA 29,3% SUÍÇA 29,4% URUGUAI 24%, CANADÁ 32,2% CHILE 21%, ESPANHA 33% MÉXICO 20,4% BRASIL 34,41% PERU 17% REINO UNIDO 35,7% ALEMANHA 36,4% BRICS PORTUGAL 36,5% ÁFRICA DO SUL 26,9% PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 13 HUNGRIA 40,1% RÚSSIA 23% NORUEGA 42,1% CHINA 20% FRANÇA 43,1% ÍNDIA 12,1% ITÁLIA 43,2% BÉLGICA 44,3% Elaborado pela autora — Fonte: OCDE As principais razões para a alta da carga tributária nas últimas duas déca- das são as seguintes: a) utilização da tributação como instrumento de política fiscal, prin- cipalmente para i) ajustar as contas públicas nacionais ii) enfren- tar problemas financeiros recorrentes no período e iii) seguir pres- crições de acordos internacionais. Este aumento da carga fiscal se deu através do aumento dos tributos já existentes e criação de no- vos, principalmente contribuições especiais como o FINSOCIAL (1982), IPMF (1993), CPMF (1997), COFINS (1991) e CIDE- -Combustíveis (2001). b) estabilização da economia — após década perdida de 80 houve uma recuperação da economia que culminou com a estabilização econô- mica trazida pelo plano real em 1994. Se, por um lado, a melhora dos principais indicadores macroeconômicos que influenciam dire- tamente na tributação (tais como produção industrial, lucrativida- de das empresas e volume geral de vendas no varejo) fizeram com que a arrecadação aumentasse; por outro, o fim da inflação pôs fim ao equilíbrio artificial das contas públicas (representado pelo fato da arrecadação ser indexada e as despesas corroídas pela inflação) e, por consequência, houve necessidade de aumento da carga tributá- ria para reequilibrar as contas públicas nacionais. c) impacto das novas tecnologias — nos últimos anos um enorme apa- rato tecnológico foi criado para auxiliar a arrecadação, fiscalização e recolhimento do imposto, tais como: declaração eletrônica do IR, sistema SISCOMEX, nota fiscal eletrônica, SPED, entre outros. Estes instrumentos trouxeram facilidade na fiscalização e arrecada- ção, diminuição da burocracia e da sonegação e evasão fiscal. A pergunta que nos interessa aqui fazer é em que medida o aumento e peso da carga tributária influenciam nas decisões de planejamento tribu- tário? É possível fazer uma relação direta entre aumento da carga tributá- ria e aumento dos casos de planejamento tributário? Em outras palavras, PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 14 há relação de causa-efeito entre aumento da carga tributária e aumento do número de planejamentos tributário? 3) DISTRIBUIÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA Um aspecto importante ligado à questão do planejamento tributário se refere ao modo como a carga tributária é distribuída de acordo com as ma- terialidades dos tributos. Uma das características mais notáveis do sistema tributário brasileiro repousa sobre o fato de que os impostos sobre o con- sumo constituem a maior parte das receitas e da carga fiscal total. Em 2011, estes impostos representaram 48,44% das receitas tributárias totais, o que corresponde a 17,32% do PIB. Em contrapartida, os impostos sobre a ren- da e sobre a propriedade constituem uma fraca parte da carga. Em 2011, representaram apenas respectivamente 20,45% e 3,18% das receitas totais, segundo dados da Receita Federal do Brasil. Elaborado pela autora — Fonte: Ministério da Fazenda/Receita Federal, 2013 * Em folha de salários está compreendida também a receita relativa ao seguro desemprego. ** Em outros está compreendida também a receita relativa à tributação sobre transações financeiras. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 15 Elaborado pela autora — Fonte: Ministério da Fazenda/Receita Federal, 2012 * Em folha de salários está compreendida também a receita relativa ao seguro desemprego. ** Em outros está compreendida também a receita relativa à tributação sobre transações financeiras. A partir da análise dos quadros acima, confirmamos que, no Brasil, a pres- são fiscal é elevada sobre o consumo — quase metade da carga provém de impostos relativos à produção e circulação de bens e serviços — e a imposi- ção é fraca sobre a renda e a propriedade. Os países da OCDE apresentam a situação oposta: os impostos sobre o consumo representam 31,5% em média enquanto que o imposto sobre a renda representa 37%, conforme quadro abaixo: Carga Tributária por Base de Incidência — 2008 Brasil x Países da OCDE (em % da Carga Tributária Total) Base de incidência Brasil OCDE Máx. Mín. Média Renda 20,5% 60,6% (a) 20,8% (e) 37,0% Folha de Salários 24,1% 43,8% (b) 2,0% (a) 25,3% Propriedade 3,3% 15,1% (c) 1,1% (b) 5,8% Bens e Serviços 48,7% 60,7% (d) 17,0% (f ) 31,5% Transações Finan- ceiras 2,1% - - - Outros 1,3% 5,3% 0,0% 0,9% Total 100% Obs.: (a) Dinamarca (b) Rep. Tcheca, (c) Japão, (d) México, (e) República Eslovaca, (f ) Estados Unidos. Fonte: Ministério da Fazenda/Receita Federal, 2010. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 16 O que esta distribuição da carga tributária tem a ver com o planejamento tributário? Interessante notar que, apesar da carga tributária no Brasil estar concentrada nos impostos sobre consumo, a grande maioria dos casos de pla- nejamento tributário, conforme veremos, ocorre com tributos que oneram a renda e o patrimônio. Por que este fenômeno ocorre? A explicação se dá pelo fato dos tributos sobre o consumo serem, em geral, tributos indiretos, que podem ser repassados ao consumidor final, juntamen- te com o preço do bem, mercadoria ou serviço. É o caso da já conhecida distinção entre contribuinte de fato e contribuinte de direito. Nos tributos indiretos, não é o contribuinte de direito, ou seja, aquele que figura como sujeito passivo da obrigação tributária, que via de regra arca com o ônus eco- nômico do tributo. Ou seja, na cadeia de circulação das mercadorias e servi- ços, o respectivo tributo é repassado ao consumidor final — o contribuinte de fato — que desembolsará na prática o respectivo valor. Claro que também é importante para as empresas terem uma diminuição ou não-incidência dos tributos indiretos, tendo em vista que, com isso, diminuirão a carga tributária dos bens e serviços e, portanto, poderão reduzir o preço dos mesmos. Mas o fato é que, podendo estes tributos ser repassados ao consumidor final, os contribuintes pessoas jurídicas são onerados muito mais por impostos diretos — aqueles que recaem sobre o seu patrimônio e renda. Assim, explica-se porque a atenção dos empresários volta-se muito mais para a redução do ônus tributário destes tipos de tributos através de planejamento tributário. 4) EFEITOS PERVERSOS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO SOBRE OS CONTRIBUINTES O planejamento tributário também encontra fundamento no impacto negativo que a tributação gera aos agentes econômicos. Se o tributo é visto pelo contribuinte como uma intervenção do Estado no seu patrimônio, esta transferência de recursos do privado para o público gera efeitos muitas vezes negativos sobre as empresas e sobre o mercado. É o que se convencionou chamar de “peso morto dos tributos”. Os tributos são vistos como um custo no processo de produção e geração de riqueza. Assim, visto sob este ângulo, há uma tendência natural do agente econômico reagir à tributação, e uma das formas é pelo planejamento tributário. Ocorre, porém, que se o pagamento do tributo, por si só, já causa efeitos na economia e no mercado, o fato de alguns agentes realizarem evasão fiscal ou planejamento tributário, pode tam- bém afetar o equilíbrio concorrencial. Uma das dificuldades frequentemente evocadas pelas empresas é o caráter caótico do sistema, com superposição de incidências e um elevado nível de complexidade. O grandenúmero de tributos, alíquotas, regras e formas de PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 17 arrecadação existentes no país, tornam o sistema extremamente complexo e pouco transparente, o que gera custos elevados e uma burocracia excessiva para as empresas. Para citar alguns números, hoje os cidadãos pagam em mé- dia 38 tipos de impostos e as empresas cerca de 59 (IBPT, 2008). De acordo com um estudo da FIPE, as obrigações fiscais secundárias cus- tam, em média, entre 0,33% e 1,7% das receitas totais das empresas. A bu- rocracia ocupa 7% do tempo administrativo das sociedades, contra 4,1% das sociedades da América Latina (CDES, 2009a). De acordo com o Banco Mundial, no Brasil uma empresa gasta 2.600 horas cada ano para a cobran- ça de impostos sobre o comércio, os salários e os lucros, contra uma média de 500 horas na maioria dos países estudados (World Bank Group, 2009). Além disso, de acordo com o setor empresarial, a tributação sobre os salários impede o crescimento do emprego formal. A incidência de tributos repre- senta cerca de 42,3% a 50,8% dos salários, o que traz impactos negativos à produtividade, à criação de emprego e à possibilidade de investimentos na qualificação da mão de obra (CNI, 2008). No que diz respeito ao efeito cumulativo, o sistema fiscal no Brasil é estru- turado a partir de incidências de acordo com a base econômica, o que gera superposição de tributos, como o ICMS, IPI e ISS sobre a circulação de bens e do ICMS, COFINS, IR e CSLL no plano das contribuições (Torres, 2004, p. 227). Alguns tributos que oneram o consumo, principalmente a COFINS, PIS e a extinta CPMF, trazem problemas particulares, porque são cobrados, em alguns casos, “em cascata”, ou seja, são cumulativos: a cada etapa da pro- dução e da circulação de produtos, estes tributos são novamente cobrados, sem serem deduzidos os pagamentos efetuados nas etapas anteriores. Resumi- damente, estas contribuições sobrepõem-se ocultando o seu efeito final nos preços de bens e serviços, o que faz com que a carga fiscal sobrecaia sobre os agentes econômicos, principalmente o consumidor final (CDES, 2009). Em termos econômicos, as consequências de uma tributação excessiva e cumulativa sobre o consumo são: o aumento dos preços, a diminuição da demanda, a retração da produção e a redução da oferta. Por último, ela res- tringe a capacidade de consumo dos médios e baixos rendimentos, atingindo o mercado interno e a produção. Finalmente, todos os elementos acumulados impedem o crescimento econômico do país (Unafisco Sindical, 2007). No que diz respeito ao peso dos tributos sobre os preços, um estudo realizado pelo IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) mostrou que as porcentagens de impostos sobre os preços de uma série de produtos variaram entre 23% a 70% (Zockun, 2007). PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 18 QUESTÕES Por que pagar tributo? i) O que é tributo? ii) O tributo para o contribuinte e para o fisco iii) Quais as funções da tributação? Por que fazer planejamento tributário? i) Qual a relação entre carga tributária brasileira e planejamento tributário? ii) Como se dá a distribuição da carga tributária (tributos diretos X indiretos) e qual o reflexo no planejamento tributário? iii) Quais os efeitos perversos da tributação sobre as empresas? LEITURA OBRIGATÓRIA GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. São Paulo: Dialética, 2008, p. 13-21. BIBLIOGRAFIA SUGERIDA PEIXOTO, Marcelo Magalhães, ANDRADE, José Maria Arruda de. Plane- jamento Tributário. São Paulo, MP Editora, 2007. SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento Tributário e o “Propósito Nego- cial”. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 13-20. YAMASHITA, Douglas. Elisão e Evasão de Tributos. São Paulo: Lex Editora, 2005. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 19 2 Art. 150. Sem prejuízo de outras ga- rantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I — exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; AULA 2 — PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NO PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DO DIREITO Para uma melhor compreensão do fenômeno do planejamento tributário e, posteriormente, para diferenciá-lo de outras figuras como evasão, elisão e sonegação, necessário localizar o planejamento tributário no processo de positivação do Direito. O processo de positivação do Direito é a maneira pela qual as normas ju- rídicas são aplicadas aos fatos efetivamente ocorridos. As normas são criadas para serem aplicadas aos eventos que ocorrerem no mundo, para terem eficá- cia social. No caso das normas tributárias, sua finalidade última é a arrecada- ção de valores a título de tributo aos cofres públicos. Ocorre que até se chegar a este objetivo, um longo caminho é percorrido, a começar pelas normas de competência previstas na Constituição Federal. Estas normas darão funda- mento às normas instituidoras de tributos que, por sua vez, fundamentarão o nascimento da obrigação tributária e a constituição do crédito tributário. Assim, conforme já desenvolvido no capítulo anterior, o Direito Tribu- tário brasileiro tem fundamentação na Constituição Federal, que delega a competência tributária aos entes federativos. A competência tributaria é con- siderada “a aptidão para criar tributos” (Amaro, 2010, p. 115). Tácio Lacerda Gama a define como “a aptidão (...) que alguém detém, em face de outrem, para alterar o sistema jurídico positivo, mediante a introdução de novas nor- mas jurídicas que, direta ou indiretamente, disponham sobre a instituição, arrecadação e fiscalização de tributos” (Gama, 2009, p.218). Por fim, Paulo de Barros Carvalho conceitua competência tributaria como “uma das parce- las entre as prerrogativas legiferantes de que são portadoras as pessoas políti- cas, consubstanciada na possibilidade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre tributos” (Carvalho, 2007, p. 228). A competência tributaria é, em síntese, o poder que detém os entes políticos de instituir tributos por meio de lei, bem como de legislar sobre sua arrecadação e fiscalização. A com- petência tributária, conforme dito acima, pertence aos entes federativos — União, Estado, Distrito Federal e Municípios. Ela é outorgada pela CF/88, ou seja, é a Constituição que reparte e outorga as competências a cada ente federativo. Assim, a CF/88 não cria ou institui os tributos nela menciona- dos, mas somente outorga aos entes políticos, para que estes, ao exercerem a competência que lhes foi dada pela CF/88, instituam os respectivos tributos. Pois bem, no exercício da competência tributária que lhe foi atribuída pela Constituição Federal, os entes federativos instituem os respectivos tri- butos por meio de lei, em respeito ao princípio da legalidade insculpido no art. 150, I da CF/882. Instituir um determinado tributo por meio de lei significa definir “todos os aspectos pertinentes ao fato gerador, necessários à quantificação do tributo devido em cada situação concreta” (Amaro, 2010, 2. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Dis- trito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 20 p. 134). Machado (2005, p.53) afirma que “criar um tributo é estabelecer todos os elementos de que se necessita para saber se este existe, qual é o seu valor, quem deve pagar, quando e a quem deve ser pago”. Dessa forma, a lei que institui o tributo deverá conter os elementos mínimos para que ocorra a incidência da norma e o nascimento da obrigação tributária: sua hipótese de incidência — qual o fato que uma vez ocorrido dará nascimento à obri- gação tributária, onde e quando este fato deverá ocorrer, além dos critérios definidores da obrigação tributária — base de cálculo e alíquota do tributo e sujeitos ativo e passivo. Estes critérios mínimos estão presentes no que se denomina regra matriz de incidência tributária (Carvalho, 2007).A regra-matriz de incidência tributária, portanto, consiste nos elementos mínimos que podemos extrair da norma que regula determinado tributo para sabermos: i) qual fato dará ensejo à obrigação de pagar o tributo (fato gera- dor), bem como onde e quando ele deve ocorrer e ii) quais serão os termos da obrigação tributária, ou seja, de que forma o tributo será cobrado e pago. A regra-matriz de incidência tributária demonstra, portanto, como se dará a incidência da norma que regula determinado tributo, sobre fatos ocorridos concretamente. Assim como toda norma que prevê uma regulação de conduta, a regra- -matriz de incidência tributária é composta por duas parte: a) uma hipótese, na qual estará previsto um fato com conteúdo eco- nômico (inserido em espaço e tempo definidos) de possível ocor- rência e b) uma conseqüência para o caso do fato descrito na hipótese ocorrer efetivamente. Tendo em vista que tratamos de norma de incidência de tributo, esta conseqüência será a obrigação tributária, ou seja, o dever de pagar determinado tributo. Assim, a regra-matriz de incidência tributária tem por função definir a incidência do tributo, descrevendo fatos, estipulando os sujeitos da relação e os termos que determinam a dívida (Carvalho, 2007). Há somente uma regra-matriz para cada tributo. Como visto, portanto, a regra-matriz de incidência tributária apresenta critérios definidores de sua hipótese e da consequência que se instalará caso ocorrido o fato descrito nesta hipótese. Enquanto a hipótese se divide nos cri- tério material, espacial e temporal; a consequência é composta pelos critérios pessoal e quantitativo. Estes, por sua vez, se subdividem entre sujeito ativo e passivo (critério pessoal) e base de calculo e alíquota (critério quantitativo). Tais critérios representam os elementos mínimos para identificarmos o fe- nômeno da incidência tributária: qual fato, onde e quando este deve ocorrer para dar nascimento à conseqüência — a obrigação de recolher determinado PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 21 tributo. Por sua vez, os elementos da conseqüência trarão os elementos míni- mos para se identificar os termos da obrigação tributária — quem irá cobrar e quem irá pagar, além do valor da obrigação — quanto que será pago a tí- tulo de tributo. Importante ressaltar que a ausência de ocorrência de um dos critérios da regra-matriz faz com que não haja a subsunção da norma ao fato e, por conseqüência, que não nasça a obrigação tributária dela decorrente. Assim, conhecer a regra-matriz de incidência de determinado tributo e seus elementos é caminho imprescindível para a realização de planejamento tributário. O planejamento tributário, tendo por objetivo final a não inci- dência da norma ou a redução da obrigação tributária, se voltará para a não ocorrência ou redução de um dos critérios que dela fazem parte. 1) REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA: CRITÉRIOS DA HIPÓTESE — Critério Material No critério material da regra-matriz de incidência tributária encontra- remos uma descrição de “um comportamento de pessoas, físicas ou jurídi- cas, condicionado por circunstancias de espaço e tempo” (Carvalho, 2007, p.267). Ou seja, haverá a previsão de um fato, de um comportamento de pessoas (vender mercadorias, prestar serviços, auferir renda) que deverá ocor- rer no mundo real para que surja a obrigação de pagar determinado tributo. Cumpre ressaltar que o critério material sempre será formado por um verbo seguido de um complemento (dar, fazer, ser alguma coisa). Assim, será no critério material que estará a resposta à pergunta: “qual fato que deverá ocorrer para que nasça a obrigação que tem por objeto o pagamento de tributo?”. No critério material é que estará o que a doutrina e a legislação comumente chamam de “fato gerador”. O CTN define, em seu art.114, o fato gerador como “a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”. Uma das formas de realizar planejamento tributário, conforme veremos, é fazer com que os atos praticados não correspondam ao fato descrito no critério material. Ou seja, o objetivo seria realizar operações diversas daquelas previstas neste critério, para que não configure a ocorrência do fato gerador e por conseqüência, não nasça a obrigação tributária. Exemplo de suposto planejamento tributário neste sentido é a operação “casa e separa” em que o ganho de capital que seria obtido em uma operação de compra e venda é “evitado” por meio de operações societárias de aumento de capital, situação esta que veremos mais detalhadamente nos próximos capítulos. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 22 3 Entretanto, veremos que o artigo 74 da Medida Provisória 2.158/01 dispõe que “Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na for- ma do regulamento”. — Critério Espacial A simples descrição de um fato no critério material não é suficiente para fazermos uma completa determinação da hipótese de incidência tributária. Necessário se faz localizar este fato no espaço e no tempo. Por exemplo, se uma determinada pessoa for proprietária de imóvel no Município de São Paulo, por certo não estará obrigada a pagar o IPTU do Município do Rio de Janeiro. Da mesma maneira, se um comerciante vendeu mercadoria no Estado do Amapá, igualmente não deverá recolher o ICMS do Estado de Santa Catarina. Assim, imprescindível definir o local em que deve ocorrer o fato descrito no critério material para dar azo ao nascimento da obrigação de pagar o tributo. Esta é a função do segundo critério da regra-matriz de incidência tributária: o critério espacial. O critério espacial se caracteriza, portanto, como o local onde o fato des- crito no critério material deve ocorrer para dar nascimento à obrigação tribu- taria. Assim, caso a operação ocorra em local diverso do descrito no critério espacial, não haverá a subsunção do fato ocorrido com a norma. O critério espacial, portanto, é outra alternativa a ser levada em conta na realização do planejamento tributário. Exemplo de utilização do critério espacial em pla- nejamentos tributários é a utilização de paraísos fiscais na tributação sobre a renda, a tributação do ICMS em importações por conta e ordem, casos que veremos mais profundamente mais a frente. — Critério Temporal Assim como é preciso localizar o fato descrito no critério material no es- paço, igualmente imprescindível é localizá-lo no tempo. Assim, se uma de- terminada pessoa foi proprietária de imóvel há dez anos, mas já não o é, não poderá ser cobrada a pagar o IPTU relativo ao presente ano. O critério tem- poral é, portanto, o “quando”, o momento em que se reputa ocorrido o fato descrito no critério material e, por conseqüência, o momento em que nasce a obrigação tributária prevista no conseqüente. Sobre este critério, Paulo de Barros Carvalho leciona que ele nos oferece os elementos para saber “em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credor, em fun- ção de um objeto — o pagamento de certa prestação pecuniária” (Carvalho, 2007, p. 274). O critério temporal, por exemplo, poderá ser relevante em planejamentos tributários envolvendo a tributação de coligadas e controladas no exterior, tendo em vista que, em princípio3, até que os lucros não sejam efetivamente distribuídos ao sócio brasileiro, não deverá haver tributação da renda no país. 3. Entretanto, veremos que o artigo 74 da Medida Provisória 2.158/01 dis- põe que “Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidospor controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na for- ma do regulamento”. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 23 2) REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA: CRITÉRIOS DO CONSEQÜENTE O conseqüente da regra-matriz de incidência tributária descreverá os ter- mos da obrigação tributária que nascerá caso ocorrido o fato descrito na sua hipótese. Ou seja, é no conseqüente que encontraremos a previsão de uma relação jurídica que, segundo o artigo 113 §1° do Código Tributário Nacio- nal, se instala automaticamente quando o fato se concretiza. O conseqüente da regra-matriz é composto de critérios para a identifica- ção do vínculo jurídico que nasce — « quem cobra, quem deve pagar e de que forma ». Assim, para identificar estes elementos, os critérios do conse- qüente são o pessoal (sujeito ativo e passivo) — que nos dirá quem é o credor e quem é o devedor da obrigação tributária — e o quantitativo — que nos informará, através da conjugação da base de cálculo e alíquota, o valor a ser pago pelo devedor (sujeito passivo) ao credor (sujeito ativo). — Critério Pessoal Conforme explicado acima, é no critério pessoal que se identificará quem são os sujeitos da relação jurídica tributária. Ou seja, é nele que se aponta o sujeito ativo e passivo da obrigação tributária, o credor e devedor do tributo. Estes sujeitos do vínculo são pessoas interligadas entre si pela prestação (Car- valho, 2007). a) Sujeito Ativo O sujeito ativo é o titular de direito subjetivo de exigir a prestação pecu- niária. Ele será o credor da relação jurídica tributária, a quem deverá ser pago e quem poderá exigir o pagamento do tributo. O CTN define no art. 119 o sujeito ativo nos seguintes termos: Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento. Apesar da dicção do CTN ser clara ao dizer que o sujeito ativo será pessoa jurídica de direito público, o certo é que pode ser pessoa jurídica pública ou privada. Pessoas jurídicas públicas são as pessoas políticas de direito interno, dotadas de poder legislativo e habilitadas a editar normas. São elas a União, Estados, Municípios e Distrito Federal. O sujeito ativo também poderá ser pessoa jurídica privada que, no entanto, não são titulares de competência PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 24 tributária. Exemplos de pessoas jurídicas de direito privado que poderão ser sujeitos ativos de relação jurídica tributária são as entidades paraestatais, com funções de finalidade pública, no caso das contribuições instituídas e pagas a seu favor. b) Sujeito Passivo O sujeito passivo da obrigação tributária será a pessoa, física ou jurídica, pública ou privada, de quem se exige o cumprimento da prestação do tributo ou dos deveres instrumentais. O art. 121 do CTN explicita que: Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. O parágrafo único do art. 121 do CTN nos informa ainda que po- derão ser sujeitos passivos da relação jurídica tributária o contribuinte e o responsável: Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I — contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situ- ação que constitua o respectivo fato gerador; II — responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei. Assim, a sujeição passiva poderá ser direta, quando for representada pelo contribuinte, entendido como aquele que tem relação pessoal e direta com a situação descrita pela norma. Geralmente o contribuinte será aquele que realiza o fato descrito pelo critério material da regra-matriz. A sujeição pas- siva poderá, no entanto, ser indireta, quando for encampada pela figura de responsável, aquele cuja obrigação decorre de disposição expressa de lei. A sujeição passiva também será um elemento chave para a realização do planejamento tributário. Por exemplo, no caso do Imposto de Renda, a alí- quota aplicável varia caso o sujeito passivo seja pessoa física ou pessoa jurí- dica. É o caso dos planejamentos tributários em que profissionais que pres- tam serviços intelectuais, artísticos ou personalíssimos receberem a renda por meio de pessoa jurídica. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 25 — Critério Quantitativo Por fim, será pelo critério quantitativo que se determinará o valor a ser pago a titulo de tributo. Este critério prescreve, portanto, os termos do objeto da prestação, através da conjugação de dois elementos — base de cálculo e alíquota — para definir a quantia a ser paga pelo sujeito passivo a titulo de tributo. Assim, a função do critério quantitativo é estabelecer a exata quantia devi- da a título de tributo. Ele definirá qual o valor que o sujeito ativo pode exigir e que o sujeito passivo deve pagar. Este valor é, regra geral, estabelecido pela conjugação de dois elementos: base de cálculo e alíquota. Ressalta-se, po- rém, que nos tributos fixos, como no caso de algumas taxas, não há a presen- ça destes dois elementos, haja vista que os valores são definitivos e invariáveis. a) Base de cálculo A base de cálculo é o elemento do critério quantitativo que se destina a dimensionar a intensidade do comportamento descrito no critério material da regra-matriz. Ao se combinar com a alíquota, a base de cálculo determina o valor do tributo. Paulo de Barros Carvalho (2007) ensina que a base de cálculo cumpre três funções distintas: i) Medir as proporções reais do fato — demonstrar o valor econô- mico do acontecimento, do fato descrito no critério material. ii) Determinar a dívida — a base de calculo é um fator integrante de uma operação de multiplicação, para o fim de definir o valor a ser pago a titulo de tributo, da seguinte forma: Valor do tributo = Base de cálculo X Alíquota iii) Confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material do antecedente da norma — a base de cálculo deve mensurar adequadamente a materialidade do evento descrito na hipótese, confirmando-o no caso de equivalência; infirmando-o, no caso de divergência entre base de cálculo e critério material e afirmando-o no caso de obscuridade do fato gerador. A base de cálculo é elemento muito importante na realização do planeja- mento tributário, pois é através deste critério que se pode realizar atos para a diminuição do valor a ser pago. Assim, conhecer a composição exata da base de cálculo do imposto em jogo no planejamento tributário é fundamental para a formulação de atos visando um menor pagamento de tributo. Exem- PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 26 plos de utilização da base de cálculo como elemento central do planejamento tributário são as operações de segregação de atividades, em que uma grande empresa, tributada pelo lucro real, separa suas atividades em empresas me- nores, a fim de se aproveitar, quando possível, da opção de regime tributário mais vantajoso (simples ou lucro presumido). Outro exemplo são as dedu- ções realizadas na base de cálculo do Imposto de Renda na sistemática do lucro real, a manutenção de créditos no ICMS e as regras referentes à preço de transferência e subcapitalização que podem determinar ajustes na base de cálculo do imposto de renda do contribuinte. b) Alíquota A alíquota é o elemento que, congregada à base de cálculo, estabelece o quantum a ser pago a titulo de tributo. A alíquota pode corresponder a uma porcentagem ou ser estabelecida em termos monetários fixos ou variáveis, em função de escalas progressivas de base de cálculo. As alíquotas que corres- pondem a um percentual ou não da base de cálculo poderão ser proporcional invariável, progressiva ou regressiva. O planejamento tributário também pode ser realizado no sentido de pro- mover atos para que o critério material se enquadre na alíquota mais vantajo- sa ao contribuinte. Éo mesmo caso citado anteriormente, dos planejamentos tributários em que profissionais que prestam serviços intelectuais, artísticos ou personalíssimos receberem a renda por meio de pessoa jurídica (ex.: caso Ratinho e Felipão), incidindo, portanto a alíquota referente ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica, muito menor do que a tributação da pessoa física. Outro planejamento são as operações envolvendo ICMS aproveitando-se de alíquotas mais favoráveis de determinados Estados. Em resumo, o planejamento tributário poderá dizer respeito a um ou mais critérios da regra-matriz de incidência tributária, conforme o esquema abaixo: PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 27 4 O art. 113 do CTN divide a obrigação tributária em principal e acessória. Segundo o § 1º deste artigo, a obri- gação principal surge com a ocorrên- cia do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente ESQUEMA DA REGRA-MATRIZ DE INCIDENCIA TRIBUTARIA Após verificarmos o esquema da regra-matriz de incidência tributária, muito importante para a realização de planejamentos tributários, a próxi- ma etapa do processo de positivação do Direito é a incidência da norma tributária com a ocorrência do “fato gerador” (hipótese da regra-matriz de incidência tributária) que tem por conseqüência o nascimento da obrigação tributária4 (descrita no conseqüente da regra-matriz de incidência tributária) Conforme veremos nos próximos capítulos, o nascimento da obrigação tributária, com a ocorrência do fato gerador e a incidência da respectiva nor- ma, é o marco limite do planejamento tributário. Ou seja, para a maioria dos doutrinadores, só há planejamento tributário se os atos ocorrerem antes da ocorrência do fato gerador, portanto antes do nascimento da obrigação tributária. Ocorre que, com o nascimento da obrigação tributária pela ocorrência do fato gerador, o Estado ainda não pode exigir o cumprimento da obrigação — o pagamento do tributo, da penalidade pecuniária ou, ainda, o cumprimento de alguma obrigação acessória. Para isso, necessária a realização de outro ato — o lançamento — a fim de constituir um crédito tributário em seu favor. Segundo a lógica trazida pelo Código Tributário Nacional, somente após a realização do lançamento, que tem por conseqüência a constituição do cré- dito tributário, é que o Poder Publico poderá exigir o pagamento do tributo, realizando-se, por conseqüência, a finalidade da norma tributária. 4. O art. 113 do CTN divide a obri- gação tributária em princi- pal e acessória. Segundo o § 1º deste artigo, a obrigação prin- cipal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 28 Em outras palavras, a obrigação tributária é o primeiro momento na relação tributária: o conteúdo da prestação ainda não é determinado e sujei- to passivo ainda não está formalmente identificado, ou seja, o Estado ainda não pode exigir o pagamento do tributo. Com o nascimento da obrigação tributária pela ocorrência do fato gerador, ou a) o Estado tem o direito/dever de efetuar o lançamento, no caso do tributo estar submetido na sistemática do lançamento por homologação ou b) o contribuinte tem o dever de ante- cipar o pagamento, que ficará sujeito a posterior homologação por parte do Poder Público, no caso de tributos sujeitos à sistemática do lançamento por homologação. Com o lançamento há a constituição do crédito tributário, entendido como o vínculo jurídico de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo), pode exigir do sujeito passivo (contribuinte ou responsável), o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária. Ou seja, o lançamento, ao constituir o crédito tributário, torna exigível, passível de cobrança, a obrigação tributária. Conforme a diferenciação que faremos no próximo capítulo, atos que im- pliquem o não pagamento ou diminuição do tributo a ser pago que ocor- reram após a ocorrência do fato gerador e do nascimento da obrigação tri- butária, não poderão mais ser considerados como atos de planejamento tributário, mas como figuras tais como evasão, sonegação ou inadimplência. QUESTÕES i) Como o planejamento tributário se insere no processo de aplicação do Direito? ii) Contra quais elementos da regra de incidência pode se voltar o plane- jamento tributário? Em qual momento ele deve ocorrer? LEITURA OBRIGATÓRIA CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 18ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2007, pp.255-279, pp.295-315 e 338-341. BIBLIOGRAFIA SUGERIDA AMARO, Luciano, Direito tributário brasileiro. 12ª ed. São Paulo, Saraiva, 2010. ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. São Paulo: Ma- lheiros, 2010. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 29 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 1972. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 21ª ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Malheiros, 2011. PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 30 AULA 3 — ELEMENTOS DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E FIGURAS AFINS Conforme visto no capítulo anterior, o processo de positivação do Direito tributário tem por fim último a arrecadação de tributo aos cofres públicos. Ocorre que, neste caminho, o contribuinte pode praticar uma série de atos para que o fato gerador não ocorra e para que a obrigação e o crédito tribu- tário não nasçam. Ocorre que nem todos os atos praticados com o fim de fugir do reco- lhimento do tributo aos cofres públicos podem ser considerados como pla- nejamento tributário. Assim, para delimitarmos o campo de estudo sobre o planejamento tributário, necessário se faz distingui-lo de figuras jurídicas afins que, tendo igualmente como conseqüência uma exclusão e/ou redução da carga tributária, podem com ele se confundir. 1) CONCEITO E ELEMENTOS DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO De início, cabe a distinção entre planejamento tributário, evasão, elisão, elusão e sonegação fiscal. Não há consenso doutrinário a respeito destas fi- guras e a concepção de cada uma dependerá das premissas adotadas. No que tange ao termo evasão fiscal, podemos identificar até três tipos de definições: uma primeira que diferencia evasão em sentido amplo e evasão em sentido estrito. Evasão em sentido amplo seria toda a ação ou omissão do contri- buinte que acarretasse impedir a incidência do tributo ou reduzir ou excluir a obrigação tributária, seja por meio de atos lícitos ou ilícitos. Neste sentido, Antônio Roberto Sampaio Dória define evasão lato sensu como “toda e qual- quer ação ou omissão tendente a elidir, reduzir ou retardar o cumprimento da obrigação tributária”. Já com relação ao significado de evasão em sentido estrito não há concor- dância doutrinária. A maioria dos autores considera que a evasão comporta- ria atos ilícitos que teriam por conseqüência a não ocorrência do fato gerador, uma redução do valor a ser pago ou o próprio não pagamento do tributo após o nascimento da obrigação tributária. Normalmente, a evasão em sentido estrito engloba o que se chama de sonegação fiscal. Alguns autores, no entan- to, como Hugo de Brito Machado (2001), definem evasão como a conduta lícita e elisão à conduta ilícita, já que para ele “elidir é eliminar, ou suprimir, e somente se pode eliminar, ou suprimir, o que existe. Assim, quem elimina ou suprime um tributo, está agindo ilicitamente, na medida em que está eli- minando, ou suprimindo a relação tributária já instaurada”. Ricardo Lobo Torres (2000) defende igualmente o sentido de que a evasão seria sempre composta de atos lícitos, sendo “a economia de imposto obtida PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 31 ao se evitar a prática do ato e o surgimento do fato jurídico ou da situação de direito suficientes à ocorrência do fato gerador tributário”. Já a elisão seria “a economia de imposto obtidapela prática de um ato revestido de forma jurídica que não subsume na descrição abstrata da lei”. No que se refere especificamente à elisão, tratada correntemente como sinônimo de planejamento tributário, trata-se do conjunto de atos lícitos, praticados pelo sujeito passivo, com a finalidade de diminuir ou excluir a obrigação tributária, seja pela não ocorrência do fato gerador ou pela ocor- rência em aspectos quantitativos menores. Ou seja, através da elisão fiscal, o contribuinte procura, através de atos lícitos, ou impedir a ocorrência do fato gerador ou diminuir a base de cálculo imponível, impedindo o nascimento da obrigação tributária ou reduzindo o valor a ser pago a título de determi- nado tributo. Para Greco (2002) elisão é a “conduta lícita do contribuinte antes da ocor- rência do fato gerador, que ele pratique sem que esteja revestida de nenhuma prática simulatória, com a qual ele obtenha uma menor carga tributária le- galmente possível”. Segundo ele, “planejamento e elisão são conceitos que se reportam à mesma realidade, diferindo apenas quanto ao referencial adotado e à tônica que atribuem a determinados elementos” (2008, p.81). Ao fazer referência a planejamento, o foco é dado à conduta do contribuinte e suas respectivas qualidades tais como: liberdade contratual, licitude e momento da conduta, etc; enquanto que ao se falar em elisão a preocupação se voltaria não mais à conduta em si, mas nos efeitos que esta conduta gera em relação à incidência e arrecadação de tributos (Greco, 2008). Especificamente em relação ao planejamento tributário, Greco o concei- tua como o “conjunto de condutas que o contribuinte pode realizar visando buscar a menor carga tributária legalmente possível” (Greco, 2008, p. 117). Hugo de Brito Machado Segundo (2007, p. 360) conceitua o instituto como “a economia lícita de tributos obtida através da organização das atividades do contribuinte, de sorte que sobre elas recai o menor ônus possível”. Um termo também utilizado é o de elusão fiscal. Heleno Tôrres (2003, p.174) o conceitua como uma figura no meio termo entra a evasão e elisão fiscal. Ocorreria nos casos em que o contribuinte tenha praticados atos que, apesar de lícitos, são desprovidos de causas negociais tendo sido realizados com fraude à lei ou abuso de direito, nos termos do art. 166 IV e 187 do Código Civil. Os autores costumam, portanto, adotar a seguinte terminologia para a diferenciação destas figuras: PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 32 5 Art. 1º A República Federativa do bra- sil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Fede- ral, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: IV — os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature- za, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a invio- labilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprieda- de, nos termos seguintes: II — ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; XXII — é garantido o direito de pro- priedade; Art. 170. A ordem econômica, funda- da na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegu- rar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV — livre con- corrência; Ocorrência do fato gerador/ Nascimento da obrigação tributária Licitude dos atos Elisão/ Planejamento Antes Lícitos Evasão Antes ou depois Ilícitos Elusão Antes mas com posterior des- caracterização Lícitos, mas com fraude à lei ou abuso de direito O planejamento tributário tem fundamento em princípios constitucio- nalmente previstos como a liberdade de iniciativa (art. 1°, IV e 170 caput da CF/88), na livre concorrência (art. 170, IV CF/88) e nas liberdades previstas ao longo do art. 5° da CF/885, que expressam a liberdade do indivíduo de organizar sua vida, principalmente no que tange a liberdade contratual, bem como no principio da legalidade e na garantia do direito de propriedade. É preciso se ter claro, no entanto, que nem toda a prática de atos que im- pliquem em redução da carga tributária para o contribuinte pode ser conside- rada como planejamento tributário stricto sensu, devendo ser excluídas deste conceito as situações de ilícitos, extrafiscalidade, incentivos e opções fiscais, bem como as substituições materiais ou meras abstenção de fatos, Na visão clássica do planejamento tributário, somente dois requisitos eram importantes para a sua configuração: o requisito cronológico e o cri- tério da licitude (Greco, 2008). Pelo requisito cronológico, somente poderia ser considerado como planejamento tributário aqueles atos realizados antes da incidência do tributo, ou seja, antes da ocorrência do fato gerador. Já pelo critério da licitude, os atos e os efeitos dos atos praticados pelo contribuinte no sentido de reduzir ou excluir o ônus tributário deveriam ser lícitos. Numa concepção mais moderna, surge também o requisito de eficácia dos atos perante o fisco. Ou seja, a visão mais contemporânea admite que para a configuração do planejamento tributário deve haver, além de licitude e anterioridade dos atos, a possibilidades destes serem oponíveis ao fisco. Ser oponível ao Fisco significa que os atos praticados e seus efeitos devem ser su- portados e eficazes perante a Administração Pública. Sobre o assunto, Greco afirma que “em suma, o núcleo central do tema é a eficácia fiscal dos atos ou negócios jurídicos realizados, vale dizer “não basta ser lícito, é preciso ser eficaz perante o Fisco”’(Greco, 2008, p. 114). O planejamento tributário tem por primeiro elemento definidor, o fato de ser formado por atos lícitos. Greco (2008, p. 114) afirma que esta é “a primeira exigência para reconhecer a existência de planejamento tributário. O segundo requisito é que o planejamento tributário seja composto por con- dutas que não estão reguladas pelo ordenamento, seja de forma positiva (per- mitindo, obrigando ou incentivando) ou negativa (proibindo). Em outras 5. Art. 1º A República Federativa do brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado De- mocrático de Direito e tem como fun- damentos: IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature- za, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a invio- labilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprieda- de, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; XXII - é garantido o direito de pro- priedade; Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV - livre concorrência; PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 33 palavras, sobre os efeitos das condutas realizadas não há uma previsão expres- sa no ordenamento autorizando-as, obrigando-as ou proibindo-as. É por esse motivo que geralmente se diz que o planejamento tributário se utiliza das “lacunas da lei”. Com isso não se quer dizer que os atos praticados não têm previsão legal, mas que os efeitos do formato que tal figura foi adotada, para fins tributários, não é previsto pelo ordenamento. Sobre este assunto, Greco (2008, p. 115) dá o exemplo da incorporação às avessas: enquanto a incorpo- ração é instituto lícito expressamente previsto no ordenamento, a forma da sua utilização, na incorporação às avessas — em que uma empresa deficitária incorpora uma empresa superavitária para fins de compensação de prejuízos fiscais — pode trazer dúvidas quanto a estar ou não dentro do perfil “normal” do instituto. A grande questão do planejamentotributário se encontra nas figuras das “substituições jurídicas”. Trata-se do uso de formas jurídicas lícitas no lugar de outras, mas numa configuração diferente dos fins normais a que se presta, tendo por consequência a não incidência do tributo ou a diminuição da obri- gação tributária. É o caso, por exemplo, da operação “casa e separa”, em que há um aumento do capital social da sociedade seguido de cisão parcial, mas o objetivo da operação na maioria das vezes era a alienação da participação societária ou venda de bem imóvel. A pergunta que se coloca é se todas as substituições jurídicas, ainda que lícitas, terão efeitos perante o fisco? Quais os limites para a utilização das substituições jurídicas? O caminho que se tem seguido, para se responder a estas perguntas é saber, para fins de oponi- bilidade contra o fisco, se a conduta realizada tinha outros fins que não os exclusivamente tributários. Não há uma maneira pré-estabelecida de se realizar um plano. Ocorre, porém, que pela experiência prática, podemos reconhecer algumas caracterís- ticas comuns nos planejamentos realizados. A primeira delas é apontada por Greco como: (...) a circunstância de haver um objetivo escolhido previamente à esco- lha dos instrumentos a serem utilizados. Vale dizer, o fim (redução de tributo) é definido antes dos meios (contratos, etc). Isto leva ao predo- mínio do fim sobre o meio, pois este é escolhido unicamente porque e desde que sirva ao objetivo visado. (Greco, 2008, p. 118) Além desta primeira característica, o planejamento pode se concretizar numa única conduta — ato ou negócio jurídico — ou num conjunto de- las. Se realizada em mais de uma conduta, estas não devem ser analisadas individualmente, mas deve o planejamento ser visto em seu todo, como um negócio global (Greco, 2008, p. 119), para fins de enquadramento no regime PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 34 tributário pertinente. Marco Aurélio Greco (2008) aponta cinco indicadores da existência de um plano, são eles: a) encadeamento de etapas, havendo um nexo de causa e efeito entre elas; b) inexorabilidade da sequência, no sentido dos atos praticados de- verem ser vistos não na sua individualidade, mas como partes inte- grantes de um negócio maior c) não celebração de negócios intermediários com terceiros: con- tribuinte só realiza atos daquela forma com certas pessoas d) uso de institutos em hibernação — utilização de institutos muitas vezes inusual para o fim que pretensamente se pretende atingir e) neutralização dos efeitos indesejáveis, pela introdução de cláusu- las que bloqueiem os efeitos normais do negócio escolhido. Em resumo, o planejamento tributário parte do pressuposto que a opera- ção foi realizada dentro de um contexto lícito. Assim, a questão não é saber se os atos são lícitos ou ilícitos, mas se são eficazes ou não perante o fisco. Veremos, no capítulo 5, que não é porque o planejamento tributário foi re- alizado por meio de atos totalmente dentro da lei que ele será considerado eficaz perante o fisco. 2) PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E FIGURAS AFINS Conforme visto, o planejamento tributário ou elisão fiscal, são institutos que tem por finalidade impedir a ocorrência do fato gerador do tributo ou reduzir o aspecto quantitativo da obrigação tributária. Ou seja, tanto o plane- jamento quanto a elisão levam a uma diminuição ou exclusão do pagamento do tributo. Ocorre que outras situações igualmente podem ter o efeito de excluir ou reduzir o pagamento de tributo, mas que, por motivos a seguir explicitados, não são consideradas por parte da doutrina como formas de planejamento tri- butário/elisão fiscal. Assim, pode-se chegar à conclusão de que nem toda a si- tuação que implique numa diminuição ou exclusão do valor a recolher a título de tributo será necessariamente um planejamento tributário. Marco Aurélio Greco (2008, p. 84), distingue o planejamento tributário das seguintes figuras: a) atos ilícitos — que se caracterizam por ser condutas repelidas pelo ordenamento jurídico b) extrafiscalidade e incentivos — conceituadas como condutas que são incentivadas ou induzidas pelo ordenamento jurídico PLANEjAMENTO TRIbUTáRIO FGV DIREITO RIO 35 6 Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer aces- sório, mediante as seguintes condutas: I — omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazen- dárias; II — fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omi- tindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III — falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV — elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V — negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou do- cumento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena — reclusão de 2 (dois) a 5 (cin- co) anos, e multa. Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: I — fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir- -se, total ou parcialmente, de paga- mento de tributo; II — deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribui- ção social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obri- gação e que deveria recolher aos cofres públicos; III — exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV — deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvi- mento; V — utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que per- mita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena — detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. 7 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou im- prudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê- -lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons cos- tumes. c) opções fiscais — definidas como as condutas positivamente auto- rizadas pelo ordenamento jurídico d) substituições materiais ou meras abstenção de fatos — condutas em que o contribuinte modifica sua opção de consumo ou deixa de realizar determinadas condutas e que são indiferentes ao ordena- mento jurídico Vejamos as especificidades de cada uma destas figuras e as razões para que não possam ser consideradas como planejamento tributário: a) Atos ilícitos O planejamento tributário abrange necessariamente atos praticados de acordo com lei, seja ela tributária, penal ou civil. Assim, a prática de atos em desacordo com as prescrições legais — atos ilícitos — mesmo tendo por conseqüência a exclusão ou redução do pagamento de tributos, não pode ser considerada como planejamento tributário. Sobre o assunto e seguindo as lições de Greco (2008, p. 86), necessário desenvolver algumas observações importantes. A primeiro delas se refere à pergunta sobre quais os ilícitos que descaracterizam a hipótese de planeja- mento tributário: somente os tributários, ou todo e qualquer ato contrário a lei, seja ele penal, tributário ou cível. A resposta parece ser a de que todo e qualquer ato ilícito, seja de que natureza for, é situação capaz de descaracte- rizar a validade de um planejamento tributário. Assim, ilícitos penais, tanto as hipóteses elencadas no Código Penal, como as elencadas na lei 8.137/906, se praticados
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