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Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6304-8
9 788538 763048
História do Brasil: do Início da Colonização às Conjurações
M
aristela Carneiro
2017
História do Brasil: do início da 
Colonização às Conjurações
Maristela Carneiro
Apresentação
Todos os direitos reservados.
IESDE BRASIL S/A. 
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Capa: IESDE BRASIL S/A.
Imagem da capa: Shutterstock
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
C289h Carneiro, Maristela
História do Brasil: do início da colonização às conjurações / Maristela 
Carneiro. - 1. ed. - Curitiba, PR : IESDE Brasil, 2017.
154 p. :il.
Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-387-6308-6
1. Brasil - História - Período colonial, 1500-1822. I. Título.
17-41907
CDD: 981
CDU: 94(81)
© 2017 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito 
dos autores e do detentor dos direitos autorais.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 3
Apresentação
O propósito deste livro é abordar a história do Brasil Colônia, pe-
ríodo de início da formação política e cultural da América portuguesa e 
da configuração territorial que compreendemos hoje como o Estado bra-
sileiro. Muitos historiadores dissertaram sobre variados aspectos do co-
tidiano, do pensamento, da religiosidade e, principalmente, dos grandes 
ciclos econômicos que pautaram as atividades produtivas e as práticas de 
sociabilidade em uma colônia fundada, sobretudo, para suprir Portugal 
com riquezas como o pau-brasil, o açúcar, as “drogas do sertão” e o ouro.
Persistem atualmente, todavia, muitas interpretações folclóricas a res-
peito do período, baseadas mais no senso comum do que em fontes biblio-
gráficas, iconográficas ou materiais. Por isso, é fundamental que os estudos 
sobre a Colônia sejam constantemente revistos e reavaliados, permitindo a 
construção de uma imagem mais completa desse momento de nossa história.
Esse período formativo tem início no século XVI, com a chegada dos 
primeiros portugueses, capitaneados por Pedro Álvares Cabral, às praias 
do Atlântico, e se encerra com o estabelecimento da corte lusitana no Rio de 
Janeiro, no começo do século XVIII. Naquele momento, o centro de poder 
foi deslocado da Metrópole para a Colônia, a fim de resguardar Portugal 
da ofensiva que o império de Napoleão lançava sobre toda a Europa.
Tendo isso em vista, os dez capítulos que compõem esta obra con-
templam as principais questões que envolveram cerca de três séculos de 
história: a presença indígena no Brasil pré-Cabralino, o sistema colonial 
português, as religiosidades coloniais, o ciclo do açúcar, o ciclo do ouro, a 
escravidão, as revoltas na Colônia e a eventual crise do projeto português 
nas Américas, ao fim do século XVIII.
Para além daquilo que se encontra cristalizado no senso comum, 
ainda que seja parte fundamental do modo como muitos brasileiros veem 
a si mesmos e sua história, esperamos que a abordagem desses assun-
tos instigue um olhar pesquisador e crítico, de modo a problematizar a 
complexa cadeia de permanências e rupturas da qual emergiu um Brasil 
imensamente plural em religiosidades e práticas culturais, marcado por 
conflitos e sociabilidades cujas raízes remontam ao passado colonial.
Boa leitura!
Sobre a autora
Maristela Carneiro
Pós-Doutoranda em História, pela Universidade Federal do Mato 
Grosso (2017). Doutora em História, pela Universidade Federal de Goiás 
(2016). Mestre em Ciências Sociais Aplicadas, pela Universidade Estadual 
de Ponta Grossa (2012). Licenciada em História, na mesma instituição 
(2007) e em Filosofia pela Faculdade Santana (2011). Atua como docen-
te nas áreas de História e Filosofia nos mais diversos níveis de ensino. 
Autora de livros e materiais didáticos.
6 História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
SumárioSumário
1 Considerações sobre a historiografia da colonização brasileira 9
1.1 Interpretações clássicas do projeto colonial 10
1.2 Periodização da história do Brasil Colônia 15
1.3 Fontes para o estudo da história da colonização brasileira 17
2 Grupos indígenas brasileiros 25
2.1 Organização social e cultural das comunidades indígenas 26
2.2 Os aldeamentos e a escravidão indígena 30
2.3 Costumes e permanências culturais 33
3 Portugal e a colonização das terras tropicais 41
3.1 A estruturação econômica e política da colônia 42
3.2 União Ibérica: conflitos e expansão das fronteiras do Brasil colonial 45
3.3 Domínio holandês e o legado de Nassau 48
4 O Santo Ofício no Brasil colonial 57
4.1 A Contrarreforma, os jesuítas e a catequese indígena 58
4.2 A inquisição e os cristãos-novos 
 na sociedade colonial 62
4.3 Sincretismo e negociações religiosas no Brasil Colônia 63
5 A manufatura do açúcar 71
5.1 Aspectos da economia açucareira colonial 72
5.2 Sociedade e cultura do açúcar 75
5.3 Declínio do ciclo açucareiro 77
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 7
SumárioSumário
6 Tráfico negreiro e escravismo 85
6.1 Caracterização do tráfico negreiro: 
ideologias e justificativas do trabalho cativo 86
6.2 Revoltas e resistência africana: o caso de Palmares 90
6.3 Costumes e permanências culturais 92
7 A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII) 97
7.1 Circunstâncias da instituição da economia mineradora 98
7.2 Conflitos entre os paulistas e os emboabas 102
7.3 A sociedade das Minas Gerais 103
8 As revoltas coloniais e as contestações políticas 111
8.1 Conjuntura das contestações políticas 112
8.2 Tensões provinciais, conflitos de fronteira e revoltas nativistas 113
8.3 Revoltas emancipacionistas 117
9 Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira 125
9.1 A influência das ideias iluministas 126
9.2 O caso da Inconfidência Mineira 129
9.3 As reconfigurações do império português 132
10 Crise do sistema colonial 139
10.1 Rumos da economia 140
10.2 Novas relações de poder e sociabilidade 143
10.3 Demandas locais e crise do sistema colonial 146
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 9
1
Considerações 
sobre a historiografia da 
colonização brasileira
O período compreendido entre os séculos XV e XVI apresentou um significativo 
crescimento comercial na Europa, com uma demanda cada vez maior por artigos de 
luxo vindos de fora, estimulando o florescimento do comércio marítimo, no que se tor-
naria conhecido como a Era das Grandes Navegações. Nesse contexto, burgueses ricos 
e reis começaram a articular capital para investir em trocas internacionais, facilitadas 
pela chegada de tecnologias como a pólvora, a bússola, o astrolábio e o papel. A inven-
ção da imprensa, por Johannes Gutenberg, popularizou conhecimentos antes restritos 
a poucos, e os novos modelos de embarcação permitiram viagens mais longas e com 
tripulações menores. Enquanto isso, narrativas famosas, como a de Marco Polo, atiça-
vam a curiosidade de empreendedores europeus, com relatos de riquezas incríveis. 
A Igreja Católica, por sua vez, viu nessas viagens uma oportunidade de catequizar os 
gentios e reagir contra o crescimento das igrejas reformistas.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 10
A expansão das navegações também representou o início de um processo de incorpora-
ção das Américas na mentalidade e no imaginário europeu do período, além de se constituir 
como um período de difusão cultural e início de um processo de mundialização. Todos esses 
fatores, em maior ou menor medida, deram vida à colonização brasileira, conforme será 
exposto ao longo deste livro.
1.1 Interpretações clássicas do projeto colonial
A Era dos Descobrimentos mudaria de forma crucial o modo como os europeus viam 
o mundo, abrindo seus horizontes de forma radical e irreversível. No início do século XVI, 
os limites geográficos dos povos do “Velho Mundo”, acomeçar pelos ibéricos, seriam ex-
pandidos extraordinariamente, e a variedade de mercadorias disponíveis alcançaria novos 
níveis. Essa dilatação dos territórios sob influência europeia inevitavelmente alcançaria as 
terras americanas, já ocupadas por milhares de etnias indígenas. Entre estas, encontravam-
-se as terras reivindicadas pelo reino de Portugal, conformando, assim, parte do império 
ultramarino português.
As décadas iniciais de exploração promovidas pela Coroa portuguesa se resumiram a 
expedições de reconhecimento do território recém-adquirido. Instalações precárias foram 
estabelecidas a fim de explorar o pau-brasil (Paubrasilia echinata, antigamente Caesalpinia 
echinata), madeira nobre que podia ser empregada para tinturaria. Além disso, foi necessá-
rio garantir a defesa desse território contra incursões empreendidas por outros europeus, 
como os franceses, os quais também tinham interesse na extração do pau-brasil, que podia 
ser obtido por meio de alianças com povos indígenas, como os tupinambás, declaradamente 
inimigos dos portugueses.
Embora existam registros do estabelecimento de uma feitoria em Cabo Frio em 1503, 
quando da expedição de Américo Vespúcio e Gonçalo Coelho, as primeiras ocupações defini-
tivas empreendidas por portugueses se deram somente em meados de 1530, quando a Coroa 
dividiu a costa brasileira em grandes lotes, adotando o sistema de Capitanias Hereditárias. 
Foi a partir desse momento, portanto, que efetivamente se iniciou o processo de colonização 
do que chamamos de América portuguesa. Os donatários, senhores dessas capitanias, tinham 
autoridade para explorar amplamente as riquezas locais, bem como instituir cargos burocrá-
ticos e amealhar tributos. O vínculo entre o donatário e a Coroa era regulamentado em dois 
documentos, que estabeleciam quanto dos rendimentos da capitania deveria ser transmitido 
a Portugal, bem como os deveres do donatário: a Carta de Doação e a Carta de Foral.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
1
11
Figura 1 – TEIXEIRA, Luís. Divisão da costa brasileira em capitanias hereditárias. 1574. Cópia 
elaborada a partir do original. Biblioteca da Ajuda, Lisboa.
Fonte: Wikimedia Commons.
Dentro dos limites legais, o senhor podia escravizar índios cativos em sua capitania, 
capturados nas Guerras Justas1. Também podia repartir seu território em sesmarias, ceden-
do lotes a cristãos portugueses, que assumiam o compromisso de colonizar a terra. Assim 
a administração portuguesa buscava garantir mão de obra para as atividades produtivas e 
forças para a defesa da Colônia, desonerando a Coroa da obrigação de realizar investimen-
tos exclusivos para esses fins.
Para as populações nativas, esse modelo de ocupação representou duas mudanças trau-
máticas em seu modo de vida: a expropriação de suas terras por um Estado oficial, com 
limites artificialmente estabelecidos, e a conformação forçada a uma rotina de trabalho com-
pulsória, que não era de modo algum semelhante aos modelos produtivos que conheciam.
Povos indígenas como os tupiniquins não apenas serviriam como soldados nos com-
bates contra corsários franceses, como também, por muito tempo ainda, seriam a principal 
1 O conceito de “guerra justa” foi defendido por pensadores cristãos, entre os quais Santo Agostinho. 
Para ele, as autoridades seculares têm o dever de auxiliar a Igreja em seu combate contra as iniquida-
des humanas, sendo então lícito e justo empregar armas para enfrentar inimigos externos ou oposito-
res da fé. Na América Ibérica, o conceito seria empregado para empreender guerra contra indígenas 
que se negassem à conversão. Para saber mais sobre o tema, ver: VAINFAS, Ronaldo. A heresia dos 
índios: catolicismo e rebeldia no Brasil Colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 12
fonte de força produtiva a ser empregada em atividades como a coleta do pau-brasil, a cons-
trução de engenhos e fortificações e o cultivo da terra.
Esse primeiro sistema de governo da colônia brasileira produziu resultados precários, 
de modo que a Coroa optou por implementar um modelo centralizado, instaurando no ter-
ritório representantes diretos da Metrópole. A partir dessa iniciativa foi gestado o sistema de 
Governo-Geral, no qual um governador nomeado pelo monarca deveria conduzir a explora-
ção econômica na Colônia, a fundação de vilas e o combate a ameaças, como os corsários de 
outras nações europeias. A primeira sede do Governo-Geral foi situada na cidade de Salvador.
Um sistema centralizado como esse demandava uma burocracia considerável. O gover-
nador-geral contava, entre os funcionários de seu gabinete, com o auxílio de um ouvidor-mor, 
que cuidava da aplicação da justiça, um provedor-mor, que deveria tratar da arrecadação de 
impostos e das finanças da colônia, e um capitão-mor, cuja função era combater os inimigos 
da Colônia.
Fundamental para a manutenção dos interesses da Coroa, ao menos a princípio, foi a 
ação das ordens religiosas, especialmente da Ordem de Jesus. Designando-se a missão de 
catequizar os gentios do Brasil colonial, os jesuítas forneciam aos portugueses uma justifica-
tiva moral para sua presença em terras distantes: a salvação das almas daqueles que desco-
nheciam a “luz de Cristo”. Assim, a política de disseminação do cristianismo dava suporte 
à exploração econômica dos colonos.
Eventualmente, porém, a escravidão indígena viria a ser substituída pela escravidão 
negra, em razão de fatores conjunturais: 1) o imaginário de que os indígenas eram natural-
mente inadequados para o trabalho intenso das lavouras; 2) a resistência de diversos grupos 
indígenas ao trabalho compulsório; 3) a disseminação de doenças europeias, às quais os 
nativos não eram resistentes, o que gerou grande mortalidade entre essas populações e, 
consequentemente, uma diminuição na disponibilidade de mão de obra; e 4) a intensificação 
e a lucratividade do tráfico de mão de obra escravizada oriunda da África. A escravidão, as 
grandes propriedades hereditárias e a prática da monocultura visando à importação – em 
suma, o modelo de agricultura que é conhecido hoje como plantation – se tornariam pilares 
da vida econômica da América portuguesa. Esse modelo de administração centralizada tra-
ria grandes lucros para a metrópole portuguesa por cerca de três séculos, causando impacto 
indelével na configuração do país que emergiria desse território.
A visão predominante em livros didáticos e exames vestibulares sobre a história colo-
nial do Brasil é significativamente influenciada pela abordagem do historiador Caio Prado 
Júnior (1907-1990) na obra Formação do Brasil contemporâneo, de 1942. A visão de Prado Júnior 
sedimentou-se no imaginário nacional, consolidando sua imagem como um grande intér-
prete da cultura brasileira, comparável a Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre.
Na interpretação de Prado Júnior, esse Brasil Colônia surge estritamente em função 
da Metrópole, não com um desenvolvimento orgânico, mas como um projeto exploratório. 
Estabelecendo o conceito de Sentido da Colonização, o autor situa a Colônia como uma 
extensão da empresa comercial ibérica, um fruto do capitalismo mercantil português, con-
denada à produção de artigos de importação para a Metrópole e às práticas do latifúndio, 
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
1
13
da monocultura e da escravidão. Restritos pelo Pacto Colonial a fazer comércio apenas com 
Portugal, que detinha o monopólio dos bens manufaturados consumidos em território colo-
nial, os brasileiros foram tolhidos da possibilidade de possuir uma indústria manufatureira 
e um empreendedorismo próprios. O autor argumenta que,
No seu conjunto e vista no plano mundial e internacional, a colonização dos 
trópicostoma o aspecto de uma vasta empresa comercial, mais complexa do que 
a antiga feitoria, mas sempre com o mesmo caráter que ela, destinada a explorar 
os recursos naturais de um território virgem em proveito do comércio europeu. 
É este o verdadeiro sentido da colonização tropical, de que o Brasil é uma das 
resultantes; e ele explicará os elementos fundamentais, tanto no econômico como 
no social, da formação e evolução históricas dos trópicos americanos. (PRADO 
JÚNIOR, 1957, p. 16)
A abordagem seguida por Prado Júnior, e por outros historiadores que seguem sua 
linha de pensamento, tende a subvalorizar os indivíduos que de alguma forma existiam à 
margem do modo de vida agrícola, homens livres que não eram senhores de terras, menos-
prezando seu possível papel na economia colonial.
Abre-se assim um vácuo imenso entre os extremos da escala social: os senhores 
e os escravos [...]. [Esses] dois grupos são os dos bem classificados na hierarquia 
e na estrutura social da colônia: os primeiros serão dos dirigentes da colonização 
nos seus vários setores; os outros, a massa trabalhadora. Entre essas duas cate-
gorias nitidamente definidas e entrosadas na obra da colonização comprime-se o 
número, que vai avultando com o tempo, dos desclassificados, dos inúteis e ina-
daptados; indivíduos de ocupações mais ou menos incertas e aleatórias ou sem 
ocupação alguma. Aquele contingente vultoso em que Couty, mais tarde, veria o 
“povo brasileiro”, e que pela sua inutilidade, daria como inexistente, resumindo 
a situação social do país com aquela sentença que ficaria famosa: “le Brésil n’a 
pas de peuple”.2 (PRADO JÚNIOR, 1957, p. 279-280)
Essa condição de “inutilidade” reduziria, por exemplo, o valor de pequenas manufa-
turas domésticas, como a fabricação de tecidos, que poderia empregar tanto a mão de obra 
escrava quanto a livre, ou a presença de pequenas propriedades rurais, muitas vezes cedidas 
a escravos alforriados, a título de recompensa por produtividade, ou a cargos de homens 
brancos pobres.
Em razão dessa contradição da abordagem pradiana, surgiram outras perspectivas his-
toriográficas, centradas justamente na autonomia dos elementos mercantis brasileiros “inú-
teis e inadaptados”. Uma vasta produção bibliográfica a respeito ganhou fôlego a partir da 
década de 1970, com particular força nas duas décadas seguintes, norteada principalmente 
por fontes primárias. Essas pesquisas de base mais empírica buscaram apontar, para além 
do paradigma da produção colonial predominantemente exportadora, elementos produti-
vos voltados ao consumo interno, fosse em pequenas unidades de subsistência, fosse por 
meio da circulação de gêneros alimentícios dentro das fronteiras da Colônia.
2 “O Brasil não tem povo.”
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 14
Iraci del Nero da Costa (1992), por exemplo, observou a existência de diversos núcleos 
populacionais, em várias regiões brasileiras, entre os séculos XVIII e XIX, onde indivíduos 
livres e não proprietários tinham relevância para a economia local, trabalhando em setores 
como a manufatura rural, o comércio e o transporte de mercadorias.
Figura 2 – DEBRET, Jean-Baptiste. Negra tatuada vendendo caju. 1827. Aquarela sobre papel, co-
lor.: 15,5 x 21 cm. Museu da Chácara do Céu, Rio de Janeiro, RJ.
Um estudo marcante acerca das particularidades do período que se opõe ao conceito de 
Sentido da Colonização foi proposto por João Luís Fragoso e Manolo Florentino (2001), em 
O Arcaísmo como projeto. Esses autores, que estudaram a economia fluminense na passagem 
do século XVIII para o XIX, sustentaram que, ao menos em seu período tardio, a economia 
colonial desfrutava de considerável autonomia, haja vista que, embora o Pacto Colonial es-
tabelecesse regras rígidas para o comércio e as relações entre Colônia e Metrópole, como 
apontado por Prado Júnior, essas normativas estavam sujeitas à flexibilidade do cotidiano 
brasileiro no período e à dinâmica da vida econômica, que nem sempre podia ser devida-
mente regulada.
Qual seria a grave limitação do modelo interpretativo de Caio Prado Júnior? 
[...] A nosso juízo tal limitação deveu-se ao fato de ele haver transposto para o 
plano fenomênico, sem as necessárias e devidas mediações, elementos próprios 
do que considerou a essência de nossa formação e da sociedade aqui constituída. 
Reduzido, assim, o plano do concreto [...] a elementos de sua pretensa essência 
[...], resta-nos uma caricatura de vida econômica e social, desfigurada, rígida, 
descarnada, apartada da experiência do dia a dia [...] que faz com que nos sinta-
mos tão incomodados, tão “desconfortáveis” quando confrontamos nossa visão 
daquela sociedade com a que derivamos da leitura dos escritos de Caio Prado 
Júnior. (COSTA, 1995, p. 18)
Isso se daria porque o projeto colonial não teria sido rigorosamente uma extensão do 
capital mercantil burguês de Portugal, mas, antes, uma perpetuação do Antigo Regime em 
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
1
15
Portugal, um reino no qual não era contraditória a figura do fidalgo-mercador, um nobre 
que não se aplicava apenas à administração do meio rural, mas ao comércio e à vida urba-
na. O tráfico negreiro se tornaria, em particular, uma força motriz da economia colonial, 
e muitos de seus agenciadores ficariam mais ricos que os grandes proprietários rurais. Do 
ponto de vista de O Arcaísmo, o projeto colonial é muito mais uma perpetuação do poder da 
velha aristocracia, exercendo seu modelo de domínio lusitano, que um fruto da iniciativa do 
capital burguês em associação com o Estado.
É válido observar que os dois grandes modelos explicativos apresentados aqui, por serem 
contraditórios entre si, são passíveis de tensões. O ponto de vista pradiano indica com clareza 
os principais fatores envolvidos nas políticas oficiais de colonização exercidas pelo Estado 
português, enquanto a mirada da autonomia colonial aponta para brechas nessas políticas, ex-
ploradas em casos que devem ser estudados de acordo com suas especificidades conjunturais.
1.2 Periodização da história do Brasil Colônia
Entre as décadas de 1500 e 1530, a experiência colonial portuguesa no Brasil foi essen-
cialmente limitada a visitas exploratórias para a aquisição de pau-brasil. Em 1531, Martim 
Afonso de Sousa foi enviado à Colônia com uma expedição militar, a fim de eliminar a 
presença francesa na costa brasileira. A partir dessa expedição, teve início um processo de 
povoamento de facto, com a inauguração da vila de São Vicente, em 1532. Esse povoamento 
deveria servir aos propósitos de repelir invasores, amealhar escravos, organizar a Colônia 
por meio da divisão de terras e iniciar o cultivo da cana-de-açúcar.
Em 1534, a terra foi dividida em quinze capitanias hereditárias, em um modelo de go-
verno que sofreu com inúmeros problemas, a começar pela dificuldade dos colonos de se 
adaptarem às terras tropicais. Além disso, havia a necessidade de investimentos maciços 
para a construção de engenhos – onde a cana deveria ser processada para a produção do 
açúcar –, sem previsão de retornos imediatos, bem como a dificuldade de se obter mão de 
obra para o trabalho pesado nas lavouras de monocultura.
Essas questões causaram o insucesso de boa parte das capitanias, o que levou a Coroa 
portuguesa a instituir o Governo-Geral, de 1548 a 1549, centralizando a administração colo-
nial brasileira nas mãos de Tomé de Sousa. Ainda assim, é relevante pontuar que, mesmo 
com a formalização desse sistema, houve a permanência de algumas das capitanias heredi-
tárias – ou seja, a implantação desse governo não significou a desarticulação completa das 
capitanias3. Ao longo desse período, a cana-de-açúcar se tornou um dos mais importan-
tes produtos de importação do mundo, trazendo riquezas para o território, especialmente 
3 Segundo o historiador e professor JoãoPaulo Garrido Pimenta, da Universidade de São Paulo ( USP),o 
sistema de capitanias hereditárias foi abolido juridicamente no Brasil apenas no século XVIII, em 1759, 
sendo que a última capitania foi extinta somente no século XIX. Esse aspecto é indicativo tanto da 
inadequação de periodizações muito rígidas da história do Brasil quanto da convivência de diferentes 
formas de governo ou modelos de organização. Saiba mais assistindo ao vídeo História do Brasil Colonial 
I, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=l4683aqImi0&list=PLpJ5wGT4jMZx5-f7nQ-dIc-
YeGu8GbaDdV>. Acesso em: 7 abr. 2017.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 16
para as regiões de Pernambuco e São Vicente, onde o cultivo intensivo havia se mostrado 
mais exitoso. À medida que crescia a exportação de açúcar, crescia também a importação de 
escravos, alimentando o tráfico negreiro no Atlântico.
Embora o Tratado de Tordesilhas, assinado pelas Coroas de Portugal e Espanha em 
1494, dividindo entre os dois Estados a posse dos “territórios por descobrir”, desse aos por-
tugueses o direito de exploração sobre a costa brasileira, muitos corsários, especialmente 
de nacionalidade francesa, buscaram tirar proveito das riquezas do território ao longo do 
século XVI, atacando embarcações ibéricas no Atlântico.
Entre 1555 e 1560, os franceses procuraram estabelecer-se em definitivo na América 
portuguesa, aliando-se à tribo tupinambá para formar a França Antártica, empreendimento 
que viria a fracassar em razão de conflitos internos e batalhas com os portugueses e seus 
aliados indígenas. Uma nova tentativa seria feita com a França Equinocial, entre 1612 e 
1615, novamente suprimida pelos portugueses.
Os próprios portugueses acabaram por desobedecer às normas do Tratado de 
Tordesilhas, permitindo o fluxo de entradas e bandeiras, através do interior do território e 
invadindo os limites dos domínios espanhóis na porção sul da América.
A tensão entre os reinos espanhol e português atingiria seu ápice em 1580, com uma 
unificação dinástica que se estendeu até 1640. Ao longo desse período, a Coroa portuguesa 
foi integrada à espanhola, na unidade política conhecida como União Ibérica, gerando im-
pacto nas colônias e colocando o território brasileiro em rotas de conflito. Por exemplo, uma 
das consequências da Guerra Anglo-Espanhola, combate entre as Coroas inglesa e ibérica, 
resultaria em um ataque do corsário inglês James Lancaster ao porto de Recife.
Entre 1630 e 1654, seria a vez dos holandeses buscarem estabelecer domínios em solo 
brasileiro. Fixando-se na região Nordeste, sob o comando de Maurício de Nassau, eles tira-
ram proveito da riqueza açucareira e implementaram diversas mudanças em Pernambuco, 
até sua expulsão pelos portugueses.
Ao longo dos séculos XVII e XVIII, a Colônia passaria por um período de consolidação 
e formação de uma identidade local. No decorrer das décadas e dos séculos de colonização, 
os colonos desenvolveram afinidades entre si e com a região onde viviam, o que viria a con-
tribuir para a formação dessa identidade e a progressiva acentuação das diferenças entre os 
“portugueses da Colônia” e os “portugueses da Metrópole”.
A descoberta de ouro nas Minas Gerais alimentaria um novo ciclo econômico. As ten-
sões sociais desse período, envolvendo a demanda dos colonos por maior autonomia, de-
sembocaria em revoltas como a Inconfidência Mineira (1789), que tentaria organizar uma 
conspiração para impor fim ao domínio português sobre a região das Minas.
O período colonial teria fim em 1815, quando a Família Real portuguesa, então exila-
da no Rio de Janeiro, em razão da invasão de Portugal por tropas napoleônicas, instituiu 
várias reformas. O Brasil foi então elevado da categoria de Colônia a reino par de Portugal, 
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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constituindo a união política conhecida como Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. 
O Quadro 1, a seguir, apresenta uma breve cronologia dos principais acontecimentos do 
período colonial brasileiro.
Quadro 1 – Linha do tempo do Brasil Colônia.
1500-1530 Período exploratório do pau-brasil
1530 Início da colonização – expedição de Martim Afonso de Sousa
1532 Fundação da Vila de São Vicente
1534 Divisão das capitanias hereditárias
1548 Reforma político-administrativa: Governo-Geral
1580-1640 União Ibérica
1808 Vinda da Família Real ao Brasil
1815 Fim do Período Colonial – elevação do Brasil a reino par de Portugal: Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
Fonte: Elaborado pela autora.
1.3 Fontes para o estudo da história 
da colonização brasileira
O estudo do período colonial no Brasil dispõe de uma diversidade de fontes primárias, 
já que os registros que oferecem vislumbres da época têm proveniência oficial e literária. 
Documentos referentes à administração colonial ultramarina portuguesa, como os comuni-
cados oficiais e as cartas régias – por exemplo, como o Decreto de Abertura dos Portos às Nações 
Amigas, assinado pelo príncipe-regente Dom João de Bragança (Dom João VI de Portugal) –, 
abrem uma janela para a observação das políticas assumidas por Portugal em relação a seu 
território além-mar.
Deve-se lembrar, contudo, que essas fontes foram produzidas por europeus, de modo 
que carregam um discurso eurocêntrico. O historiador deve se atentar para esse filtro cul-
tural, sendo especialmente cuidadoso em seu trato com a fonte, questionando-a e buscan-
do contemplar mais do que um ponto de vista dominante. Também é importante lembrar 
que documentos oficiais não são as únicas fontes válidas. Esses documentos, que carregam 
certamente um discurso oficial, podem ser enriquecidos pelos indícios da vida cotidiana, 
oferecidos por bilhetes trocados com finalidades não oficiais, diários e listas de compras, 
por exemplo.
As cartas, por exemplo, são documentos relativamente abundantes desse período. Escritas 
por missionários ou exploradores, com finalidades diversas, como relatar as potencialidades 
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 18
do novo território para a empresa colonial, pedir auxílio ou reportar conquistas, as missivas 
abrem espaço para muitas interpretações acerca do período. Um caso célebre é o da carta la-
vrada por Pero Vaz de Caminha, escrivão da armada de Pedro Álvares Cabral. Trata-se de um 
comunicado oficial dirigido ao rei Dom Manuel acerca das terras recém-descobertas, oferecen-
do informações sobre o território e os povoamentos pré-Cabralinos ali existentes. Ao mesmo 
tempo que dá pistas sobre a configuração do território e o modo de vida dos nativos, essa carta 
também possibilita uma reflexão sobre o olhar europeu, ao evidenciar o deslumbramento de 
Caminha (e presumivelmente de seus conterrâneos) diante de um ambiente completamente 
novo, marcado por fauna, flora e culturas distintas de tudo que os portugueses haviam conhe-
cido até então.
Portanto Vossa Alteza, que tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cui-
dar da sua salvação. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim.
Eles não lavram, nem criam. Não há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ove-
lha, nem galinha, nem qualquer outra alimária, que costumada seja ao viver dos 
homens. Nem comem senão desse inhame, que aqui há muito, e dessa semente 
e frutos, que a terra e as árvores de si lançam. E com isto andam tais e tão rijos 
e tão nédios, que o não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos. 
(BRASIL, 2017)
Documentos emitidos por autoridades governamentais ou eclesiásticas também podem 
lançar luzes sobre a vida da Colônia, oferecendo amostras dos caminhos institucionais que 
caracterizavam a vida local. Um exemplo é o seguinte trecho de Primeira Visitação do Santo 
Officio ás Partes do Brasil, que relata a primeira passagem pela Américaportuguesa de um 
visitador licenciado, encarregado de reforçar as normativas do Santo Ofício português nas 
possessões ultramarinas da Metrópole:
Em 1573 foi queimado um francez herético na Bahia. As circumstancias não vie-
ram a nosso conhecimento. Estava nas attribuições episcopaes velar pela pureza 
da fé, dar combate ás heresias, castigar os herejes. Quando as heresias medievaes 
appareceram sob as formas mais diversas, reclamando especialistas theologos 
para as desmascararem, e surgiram nos pontos mais afastados, exigindo unidade 
de acção para debellalas, a autoridade episcopal foi diminuindo, embora não 
desaparecesse de todo diante da autoridade dos inquisidores. (MENDONÇA, 
1922 [1591-92], p. 5)
O documento em questão traz detalhes reveladores a respeito dos procedimentos, pu-
nições e modelos de investigação empregados pela Inquisição portuguesa, bem como o al-
cance de sua influência fora do território continental português, além da visão que se tinha 
das práticas religiosas, oficiais ou não, desenvolvidas na Colônia.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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De forma comparável às cartas, os relatos de viajantes são também discursos que po-
dem ser lidos sob duas perspectivas: 1) informações relevantes sobre os povos encontra-
dos por indivíduos como Hans Staden, Jean de Léry, Pero de Magalhães Gândavo, Fernão 
Cardim, Claude D’Abbeville e Yves D’Evreux, incluindo estudos das línguas e costumes 
dos povos tupis e descrições da flora e da fauna nativas, muitas vezes acompanhadas de 
ilustrações pitorescas; e 2) o que esses autores, europeus e cristãos, expressavam acerca da 
terra e de seus habitantes e o que isso pode revelar sobre o pensamento eurocêntrico do pe-
ríodo, frequentemente focado na assimilação do exótico – como no excerto a seguir, em que 
Fernão Cardim trata da sexualidade tupi:
Nenhum mancebo se acostumava casar antes de tomar contrário, e perseverava 
virgem até que o tomasse e matasse correndo-lhe primeiro suas festas por espaço 
de dois ou três anos; a mulher da mesma maneira não conhecia homem até lhe 
não vir sua regra, depois da qual lhe faziam grandes festas; ao tempo de lhe en-
tregarem a mulher faziam grandes vinhos, e acabada a festa ficava o casamento 
perfeito, dando-lhe uma rede lavada, e depois de casados começavam a beber, 
porque até aí não o consentiam seus pais, ensinando-os que bebessem com tento, 
e fossem considerados e prudentes em seu falar, para que o vinho lhe não fizes-
se mal, nem falassem cousas ruins, e então com uma cuia lhe davam os velhos 
antigos o primeiro vinho, e lhe tinham a mão na cabeça para que não arreves-
sassem, porque se arrevessava tinham para si que não seria valente e vice-versa. 
(CARDIM, 2009 [1583-1601], p. 176-177)
Evidentemente, é importante observar que cada um desses relatos guarda em si um dis-
curso próprio, não podendo ser tomado sem a confrontação com outros relatos disponíveis 
e uma avaliação crítica. Por exemplo: relatos de viagens e cartas que fazem referências aos 
povos nativos do Brasil são unilaterais, posto que apresentam a visão de clérigos e admi-
nistradores portugueses, mas não contemplam qualquer visão que os próprios indígenas 
tivessem de si. Com frequência, tais documentos expressam a clara intenção de preparar o 
terreno para a evangelização e a escravização dos povos nativos, o que pode resultar em um 
viés “barbarizante” acerca destes, justificando ações intrusivas, ou mesmo violentas, como 
as promovidas reiteradamente por bandeirantes, missionários e autoridades coloniais.
Em razão dessas questões, como qualquer outra fonte, os registros coloniais4 devem ser 
abordados com cuidado, sempre com a confrontação de dados divergentes em natureza e 
de procedências diferentes, evitando-se a simples reprodução de discursos já sedimentados.
4 Atualmente, podem ser encontradas compilações de fontes do período colonial, como o material 
organizado pelo professor Luiz Carlos Villalta, da Universidade Federal de Minas Gerais, intitulado 
Coletânea de documentos e textos de História do Brasil Colonial, o qual compreende testemunhos de nature-
zas diversas datados do período. Esses registros podem ser acessados no endereço eletrônico: <http://
www.fafich.ufmg.br/pae/colonia/documentos/coletaneadedocumentos.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2017.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 20
 Ampliando seus conhecimentos
Escritor e político, nascido em São Paulo, Caio Prado Júnior (1907-1990) 
teorizou sobre a formação do Brasil em vista de seu passado colonial. 
Pesquisador de viés marxista, Prado Júnior buscava abordar os eventos 
coloniais a partir da ótica do materialismo histórico, vinculando a histó-
ria brasileira à natureza de sua relação econômica com Portugal e sempre 
relacionando, em seu entendimento, esses acontecimentos às repercussões 
contemporâneas. Sua obra Formação do Brasil contemporâneo é frequen-
temente considerada equivalente em importância a Casa-grande e senzala, 
de Gilberto Freyre, e Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda. Seu 
conceito de “sentido da colonização” situa a fundação do Brasil como um 
centro de produção de bens de exportação. Essa conjuntura seria vista pelo 
autor como problemática para o desenvolvimento da América portuguesa 
como colônia, posto que teria tolhido a formação de um mercado interno 
e, consequentemente, de um país independente e economicamente forte.
O sentido da colonização
(PRADO JÚNIOR, 1957, p. 15-22)
[...] O sentido da evolução de um povo pode variar; acontecimentos 
estranhos a ele, transformações internas profundas do seu equilíbrio ou 
estrutura, ou mesmo ambas essas circunstâncias conjuntamente, poderão 
intervir, desviando-o para outras vias até então ignoradas. Portugal nos 
traz disso um exemplo frisante que para nós é quase doméstico. [...] No 
alvorecer do século XV, a história portuguesa muda de rumo. Integrado 
nas fronteiras geográficas naturais que seriam definitivamente as suas, 
constituído territorialmente o reino, Portugal se vai transformar num país 
marítimo; desliga-se, por assim dizer, do continente, e volta-se para o 
oceano que se abria para o outro lado; não tardará, com suas empresas e 
conquistas no ultramar, em se tornar uma grande potência colonial.
[...] Isso nos leva, infelizmente, para um passado relativamente longínquo 
e que não interessa diretamente ao nosso assunto. Não podemos contudo 
dispensá-lo, e precisamos reconstituir o conjunto da nossa formação colo-
cando-a no amplo quadro, com seus antecedentes, desses três séculos de 
atividade colonizadora que caracterizam a história dos países europeus a 
partir do século XV; atividade que integrou um novo continente na sua 
órbita, paralelamente aliás ao que se realizava, embora em moldes diver-
sos, em outros continentes: a África e a Ásia. [...]
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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21
[...] A expansão marítima dos países da Europa, depois do século XV, 
expansão de que o descobrimento e a colonização da América constituem 
o capítulo que particularmente nos interessa aqui, se origina de simples 
empresas comerciais levadas a efeito pelos navegadores daqueles países. 
Deriva do desenvolvimento do comércio continental europeu, que até o 
século XIV é quase unicamente terrestre, e limitado, por via marítima, 
a uma mesquinha navegação costeira e de cabotagem. Como se sabe, a 
grande rota comercial do mundo europeu que sai do esfacelamento do 
Império do Ocidente é a que liga por terra o Mediterrâneo ao mar do 
Norte, desde as repúblicas italianas, através dos Alpes, os cantões suíços, 
os grandes empórios do Reno, até o estuário do rio onde estão as cidades 
flamengas. No século XIV, mercê de uma verdadeira revolução na arte de 
navegar e nos meios de transporte por mar,outra rota ligará aqueles dois 
polos do comércio europeu: será a marítima que contorna o continente 
pelo estreito de Gibraltar. Rota que, subsidiária a princípio, substituirá 
afinal a primitiva no grande lugar que ela ocupava. O primeiro reflexo 
dessa transformação, a princípio imperceptível, mas que se revelará pro-
funda e revolucionará todo o equilíbrio europeu, foi deslocar a prima-
zia comercial dos territórios centrais do continente, por onde passava a 
antiga rota, para aqueles que formam a sua fachada oceânica: a Holanda, 
a Inglaterra, a Normandia, a Bretanha e a península Ibérica.
Esse novo equilíbrio firma-se desde o princípio do século XV. Dele derivará 
não só todo um novo sistema de relações internas do continente, como, 
nas suas consequências mais afastadas, a expansão europeia ultrama-
rina. O primeiro passo estava dado e a Europa deixará de viver recolhida 
sobre si mesma para enfrentar o oceano. O papel de pioneiro nessa nova 
etapa caberá aos portugueses, os melhores situados, geograficamente, 
no extremo dessa península que avança pelo mar. Enquanto holandeses, 
ingleses, normandos e bretões se ocupam na via comercial recém-aberta, 
e que bordeja e envolve pelo mar o ocidente europeu, os portugueses vão 
mais longe, procurando empresas em que não encontrassem concorrentes 
mais antigos e já instalados, e para que contavam com vantagens geográfi-
cas apreciáveis: buscarão a costa ocidental da África, traficando aí com os 
mouros que dominavam as populações indígenas. Nessa avançada pelo 
oceano descobrirão as ilhas (Cabo Verde, Madeira, Açores), e continuarão 
perlongando o continente negro para o sul. Tudo isso se passa ainda na 
primeira metade do século XV. Lá por meados dele começa a se dese-
nhar um plano mais amplo: atingir o Oriente contornando a África. Seria 
abrir para seu proveito uma rota que os poria em contato direto com as 
opulentas Índias das preciosas especiarias, cujo comércio fazia a riqueza 
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 22
das repúblicas italianas e dos mouros por cujas mãos transitavam até o 
Mediterrâneo. Não é preciso repetir aqui o que foi o périplo africano, rea-
lizado afinal depois de tenazes e sistemáticos esforços de meio século.
[...] Em suma e no essencial, todos os grandes acontecimentos desta era, 
que se convencionou com razão chamar dos “descobrimentos”, articu-
lam-se num conjunto que não é senão um capítulo da história do comércio 
europeu. Tudo que se passa são incidentes da imensa empresa comercial a 
que se dedicam os países da Europa a partir do século XV, e que lhes alar-
gará o horizonte pelo oceano afora. Não têm outro caráter a exploração 
da costa africana e o descobrimento e colonização das ilhas pelos portu-
gueses, o roteiro das Índias, o descobrimento da América, a exploração e 
ocupação de seus vários setores. [...]
[...] Tudo isso lança muita luz sobre o espírito com que os povos da Europa 
abordam a América. A ideia de povoar não ocorre inicialmente a nenhum. 
É o comércio que os interessa, e daí o relativo desprezo por este território 
primitivo e vazio que é a América; e inversamente, o prestígio do Oriente, 
onde não faltava objeto para atividades mercantis. A ideia de ocupar, não 
como se fizera até então em terras estranhas, apenas como agentes comer-
ciais, funcionários e militares para a defesa, organizados em simples 
feitorias destinadas a mercadejar com os nativos e servir de articulação 
entre as rotas marítimas e os territórios ocupados; mas ocupar com povoa-
mento efetivo, isso só surgiu como contingência, necessidade imposta por 
circunstâncias novas e imprevistas. Aliás, nenhum povo da Europa estava 
em condições naquele momento de suportar sangrias na sua população, 
que no século XVI ainda não se refizera de todo das tremendas devasta-
ções da peste que assolou o continente nos dois séculos precedentes. Na 
falta de censos precisos, as melhores probabilidades indicam que em 1500 
a população da Europa ocidental não ultrapassava a do milênio anterior.
[...] Os problemas do novo sistema de colonização, envolvendo a ocupa-
ção de territórios quase desertos e primitivos, terão feição variada, depen-
dendo em cada caso das circunstâncias particulares com que se apre-
sentam. A primeira delas será a natureza dos gêneros aproveitáveis que 
cada um daqueles territórios proporcionará. A princípio, naturalmente, 
ninguém cogitará de outra coisa que produtos espontâneos, extrativos. 
É ainda quase o antigo sistema das feitorias puramente comerciais. Serão 
as madeiras, de construção ou tintoriais (como o pau-brasil entre nós) na 
maior parte deles; [...] Viria depois, em substituição, uma base econômica 
mais estável, mais ampla: seria a agricultura. [...]
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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 Atividades
1. Discorra sobre o conceito de Sentido da Colonização, elaborado por Caio Prado Júnior.
2. Em que sentido a abordagem da obra O Arcaísmo como projeto diverge significativa-
mente da visão pradiana?
3. Que cuidados são necessários com relação ao tratamento das fontes primárias do 
período colonial?
 Referências 
BRASIL. Ministério da Cultura. Fundação Biblioteca Nacional. A carta de Pero Vaz de Caminha. 
[1500]. Disponível em: <http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/carta.pdf>. Acesso 
em: 21 mar. 2017.
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009 [1583-1601].
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
______. Repensando o modelo interpretativo de Caio Prado Júnior. Cadernos NEHD, São Paulo, n. 3, 
1995.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia, Rio de janeiro, c.1790-c.1840. Rio de 
Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
MENDONÇA, Heitor Furtado de. Primeira Visitação do Santo Ofício às partes do Brasil – Confissões 
da Bahia. São Paulo: Paulo Prado, 1922 [1591-92]. Disponível em: <https://archive.org/stream/primei-
ravisita00sociuoft#page/n5/mode/2up>. Acesso em: 1 dez. 2016.
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
VAINFAS, Ronaldo. A heresia dos índios: catolicismo e rebeldia no Brasil Colonial. São Paulo: 
Companhia das Letras, 1995.
 Resolução
1. É fundamental ressaltar aqui que Prado Júnior considerava a colonização do ter-
ritório brasileiro como uma extensão do projeto capitalista mercantil português, o 
que, em sua visão, impactou profundamente a história brasileira, repercutindo até 
a contemporaneidade. Fruto de um ideal burguês de expansão comercial, a Colônia 
estaria sempre fadada a ser um fornecedor de produtos tropicais de interesse da 
Métropole, incapaz de obter sua própria autonomia, mesmo com a independência 
política. A massa popular situada entre os senhores e os escravos seria irrelevante 
para tal projeto colonial.
Considerações sobre a 
historiografia da colonização brasileira1
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 24
2. Fragoso e Florentino percebem o projeto como uma implementação do Antigo Regi-
me no Novo Mundo, mais uma extensão do modelo aristocrático português que um 
devaneio de empreendedorismo burguês. Os autores sugerem um Brasil Colônia, ao 
menos em seu período tardio, muito mais flexível que aquele apresentado por Prado 
Júnior, onde as normativas do Pacto Colonial eram frequentemente tensionadas para 
permitir uma autonomia individual, especialmente no que dizia respeito à via do 
comércio, capaz de produzir riquezas individuais ainda mais pródigas que o cultivo 
da cana-de-açúcar pelos grandes latifundiários.
3. Assim como qualqueroutra forma de registro, as cartas e os relatos de viagem re-
fletem um ponto de vista, particularmente recuado no tempo, pois pertence a indi-
víduos confrontados com uma realidade radicalmente nova a seus olhos. No caso 
de relatos elaborados por missionários e administradores europeus sobre as popu-
lações nativas e sobre o modo de vida de colonos locais, é importante atentar para 
possíveis discursos normatizadores, pautados por interesses diversos.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 25
2
Grupos indígenas brasileiros
Uma das concepções mais difundidas acerca da formação do povo brasileiro é 
a de que esse processo se deu pelas vias da miscigenação e da interação pacífica, até 
mesmo afetuosa, entres três “matrizes culturais”: a europeia, a indígena e a africana. 
Embora seja visível que componentes de todas essas vertentes étnicas contribuíram 
para a “invenção” do Brasil, a complexidade do processo de trocas culturais dificil-
mente poderia ser sintetizada em uma fórmula. A miscigenação não se deu sempre 
por vias consensuais, e grupos inteiros foram submetidos a circunstâncias de opres-
são, perda de território ou extermínio até que fosse constituída uma unidade nacional 
reconhecível como Brasil.
De todo modo, qualquer compreensão mais refinada da diversidade cultural que 
marcou a formação do Brasil colonial deve certamente passar pelo estudo das culturas 
indígenas que aqui viveram – e, em muitos casos, ainda vivem. É válido começar com 
um esclarecimento sobre o uso da palavra índio, que era empregada pelos europeus 
do século XVI para descrever nativos do Extremo Oriente (“as Índias”). Posto que o 
primeiro contato dos europeus com terras americanas os pôs a pensar que estas se tra-
tavam de território asiático, os povos que eles encontraram passaram a ser designados 
como índios, uma denominação que se perpetua até os dias atuais, com graus maiores 
ou menores de aceitação, dependendo do contexto. Outros termos ainda foram utiliza-
dos, tais como gentio, bárbaro, selvagem e negro da terra.
Grupos indígenas brasileiros2
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 26
A denominação índio ou indígena mostra-se particularmente enganosa, por encorajar 
a ideia de que esses povos constituem uma espécie de unidade coesa em termos de modo 
de vida, língua, religião ou organização social. Esses grupos são na verdade caracterizados 
por uma imensa diversidade, ainda que compartilhem a noção de continuidade relativa ao 
período pré-colombiano, a concepção de patrimônio cultural local como fato agregador da 
comunidade e um senso de si como entidade diferenciada do restante do conjunto nacional.
A teoria mais aceita atualmente é a de que as primeiras populações americanas teriam 
se originado de ondas migratórias provenientes da Ásia e, posteriormente, ramificaram-se 
em uma infinidade de sociedades, adotando modelos variados de vida ritual, subsistência 
e composição social.
Apesar de haver controvérsia entre autores que tratam do tema, os números estimados 
para a população indígena brasileira anterior ao contato com os europeus flutuam entre um 
e cinco milhões de indivíduos, compreendendo cerca de mil grupos diferentes. O antropólo-
go Darcy Ribeiro (2004) afirmou que, apenas no início do século XX, cerca de oitenta grupos 
teriam desaparecido devido a epidemias e ações violentas.
Considerando que essas sociedades eram ágrafas, nada deixaram em termos de registros 
por meio dos quais possamos reconstituir sua visão acerca da chegada dos invasores ou de 
toda a história que a precedeu. Tudo que se sabe dessas culturas do período pré-Cabralino 
parte de achados arqueológicos e de suposições elaboradas com base na grande quantidade 
de crônicas ou relatos de viagem escritos por exploradores europeus que estiveram no Brasil 
a partir do século XVI, como Jean de Léry e Hans Staden.
Há de se reconhecer, evidentemente, o impacto que tiveram essas culturas na língua 
falada, nos costumes praticados no Brasil e no modo como o território nacional veio a se 
organizar. No entanto, os grupos indígenas, longe de se configurarem como algo restrito a 
um passado colonial, são ainda hoje uma parcela relevante, embora de visibilidade restrita 
e sujeita a generalizações frequentes, do povo brasileiro. Assim, compreender a história des-
ses povos é fundamental para pintar um quadro mais completo da formulação histórica do 
Brasil colonial.
2.1 Organização social e cultural 
das comunidades indígenas
A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons 
narizes, bem-feitos. Andam nus, sem nenhuma cobertura. Nem estimam de co-
brir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar 
o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos 
brancos e verdadeiros, de comprimento duma mão travessa, da grossura dum 
fuso de algodão, agudos na ponta como um furador. Metem-nos pela parte de 
dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita como ro-
que de xadrez, ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no 
falar, no comer ou no beber. (BRASIL, 2017)
Grupos indígenas brasileiros
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
2
27
Essa descrição, contida na Carta de Pero Vaz de Caminha, de 1500, o escrivão da arma-
da de Pedro Álvares Cabral se refere aos primeiros nativos avistados por portugueses no 
território que se tornaria o Brasil. Tratava-se de tupiniquins, um povo falante de uma língua 
tupi, como vários outros que habitavam a costa brasileira. Com o tempo, vários elemen-
tos da cultura tupi foram assimilados à cultura brasileira, sendo inclusive abraçados pelos 
escritores românticos do século XIX. Desse modo, faz sentido que, nas mentes de muitos 
brasileiros, tupi e índio sejam quase termos intercambiáveis.
Entretanto, o contexto cultural é mais complexo. Há cerca de 150 línguas indígenas so-
breviventes no Brasil de hoje, por exemplo, as que pertencem aos troncos linguísticos tupi 
e macro-jê, além de várias outras famílias linguísticas extensas, como as línguas caribes e 
as aruaques, e línguas isoladas, como a trumái e a ticuna. Essa variedade linguística reflete 
uma diversidade de costumes e visões de mundo que ainda são objeto de interesse de pes-
quisadores de várias áreas.
Dentro desses grupos são várias as particularidades de ordem religiosa, artística e so-
cial observadas, mas também há pontos em comum entre eles. De modo geral, as sociedades 
indígenas encontradas pelos portugueses eram caracterizadas principalmente por adota-
rem uma economia de subsistência, sistemas políticos mais simples e um nível de elabora-
ção material relativamente menor que os europeus. Nenhum desses grupos dominava, por 
exemplo, a metalurgia, a irrigação, o uso de animais de tração (e, consequentemente, da 
tecnologia da roda) ou a arquitetura com alvenaria. Como foi observado por viajantes como 
Jean de Léry, esses povos não pareciam ter uma religião reconhecível aos olhos europeus, 
com templos, ídolos esculpidos, cultos organizados ou mesmo uma hierarquia rigorosa de 
deuses, segundo uma perspectiva teísta convencional.
No campo da organização social, os indígenas que se encontravam no território brasi-
leiro não possuíam instituições reconhecíveis como reinos, ministérios ou cúrias sacerdotais. 
As relações dentro das comunidades eram pautadas principalmente por questões de faixa 
etária, ancestralidade, gênero e vida ritual. Chefias com frequência eram baseadas no poder 
da oratória ou nas proezas militares de um indivíduo, nem sempre levando em conside-
ração a hereditariedade. As interações entre um povo e outro podiam variar de modelos 
tradicionais e rígidos de cooperação a alianças precárias e motivadas por necessidade, de 
francas inimizades a estados de relativa submissão motivadas por um histórico de conflito.
Costumes e rituais podiam interferir significativamente nessas relações intertribais, es-
pecialmentecom respeito às guerras. Os povos tupis da costa, por exemplo, guardavam o 
costume da antropofagia: inimigos capturados em combate eram conduzidos à aldeia dos 
vitoriosos, onde eram executados em um elaborado ritual, após o qual sua carne era consu-
mida. Acreditava-se que, entre inimigos tradicionais, como os tupinambás e os tupiniquins, 
a antropofagia era um dever de vingança ritual, já que um guerreiro compensava o consumo 
de seus ancestrais pelos inimigos consumindo os descendentes destes, em uma cadeia infi-
nita de vendetas intertribais.
Algumas das sociedades nativas do Brasil ainda eram predominantemente nômades, 
vivendo da caça, da pesca e da coleta de produtos sazonais da floresta. Outras desenvolviam 
essas atividades em complementaridade com um modelo de agricultura adaptado às terras 
Grupos indígenas brasileiros2
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 28
tropicais: a agricultura de coivara, que envolve o plantio em áreas recém-queimadas de flo-
resta, as quais são abandonadas para repousar e se recompor após algumas colheitas. Via de 
regra, as culturas coletoras desenvolveram repertórios materiais mais simples, enquanto as 
culturas agrárias criaram formas reconhecíveis de cerâmica, cestaria e tecelagem, por vezes 
decoradas com elaborados grafismos, ricos em simbologias.
Dado que desconheciam animais de tração, como o cavalo e o boi, completamente au-
sentes na fauna nativa das Américas, e seus implementos estavam restritos a tecnologias 
líticas (artefatos como machadinhas ou cortadores feitos de pedra) ou orgânicas (madeira, 
osso, couro), essas culturas desenvolviam suas atividades produtivas de forma diferente 
dos europeus, empregando o fogo como sua principal ferramenta e produzindo ambientes 
de cultivo que, visualmente, eram pouco semelhantes às fazendas europeias. Não se pode 
subestimar o choque representado pela chegada dos europeus, equipados com implementos 
de ferro, que facilitavam o trabalho agrícola, e armas de fogo, alterando significativamente 
o modo como se praticava a caça e a guerra.
Essa assimetria, somada a outros fatores conjunturais, como a questão religiosa, pro-
duziria um forte impacto nas culturas indígenas, que, apesar dos constantes atritos com os 
europeus, desenvolveriam também uma relação de dependência com os invasores, buscan-
do obter deles bens exóticos, como roupas, espelhos, ferramentas de ferro, armas de fogo e 
animais de criação.
Reforçando esse choque, a organização social dessas comunidades não apresentava 
classes sociais do modo compreendido pelo europeus, posto que os modelos econômicos 
que adotavam não permitiam acúmulo considerável de excedentes ou concentração de bens 
de vulto nas mãos de indivíduos específicos, até porque o conceito de riqueza imobiliária 
estava praticamente ausente do imaginário indígena. Enquanto os europeus estavam fami-
liarizados à rigidez dos estamentos sociais (nobreza/clero/burguesia/campesinato), a estrati-
ficação existente entre as populações indígenas brasileiras era pautada, conforme já foi dito, 
por questões de gênero e faixa etária. Na maioria das vezes, as mulheres eram responsáveis 
pela atividade agrícola, pelo processamento dos alimentos e pelos cuidados com as crianças 
pequenas, e os homens pela caça, pela pesca e por formas específicas de coleta, bem como 
pela fabricação de armas e implementos envolvidos nessas atividades. As crianças, de acor-
do com o gênero, eram educadas seguindo a rotina de atividades dos adultos, quando não 
tinham atribuições específicas. Os idosos com frequência tinham também uma rotina bem 
estabelecida de atividades produtivas diversificadas, posto que não poderiam mais se apli-
car com vigor em atividades extenuantes.
Nesse modelo produtivo, todos os indivíduos de determinado estrato (homens ou mu-
lheres, em determinada faixa etária) possuíam a gama de conhecimentos necessários para 
levar a cargo as atividades produtivas e rituais que eram deles esperadas, o que resultava na 
inexistência de “especialistas”. Ferreiros, carpinteiros e construtores não teriam lugar, por-
tanto, em uma sociedade onde o conjunto de tarefas é conhecido por todos os participantes, 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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em todas as etapas do processo. Ferreiros e joalheiros, em particular, não teriam razão de ser 
em uma sociedade que desconhecia a metalurgia.
Mesmo os chefes indígenas raramente apresentavam o caráter institucionalizado/sacra-
lizado que caracterizava os monarcas europeus, sem jamais possuírem a mesma extensão de 
poder. A escolha dos chefes podia ser ditada por habilidades particularmente acentuadas 
de liderança em combate e atividades produtivas ou pelo uso da oratória em ocasiões de ri-
tuais. Uma das poucas formas de especialidade encontradas em tais sociedades é a categoria 
dos xamãs ou pajés, palavra de origem tupi que se refere a curandeiros e líderes espirituais. 
Em certos grupos indígenas, todavia, o papel de condução de rituais pode ser pulverizado 
entre vários indivíduos, ou até mesmo entre todos os membros de uma comunidade em 
contextos específicos. Em muitos casos, o xamã não está isento de participar de atividades 
produtivas como a caça, por exemplo.
Portanto, ao contrário das sociedades encontradas pelos europeus nos Andes e no Vale 
do México, aquelas que residiam no território brasileiro não construíram cidades ou mesmo 
templos, nem desenvolveram uma arquitetura monumental, posto que seus sistemas reli-
giosos e civis não exigiam isso. Além disso, não havia aristocracias ou uma diversificação 
econômica que pudesse distinguir significativamente os membros de uma comunidade. Um 
trecho de Viagem à terra do Brasil, do francês Jean de Léry, comenta elogiosamente sobre esse 
modelo de organização:
É coisa quase incrível e de envergonhar os que consideram as leis divinas e hu-
manas como simples meios de satisfazer sua índole corrupta, que os selvagens, 
guiados apenas pelo seu natural, vivam com tanta paz e sossego. É evidente que 
me refiro a cada nação de per si ou às que vivem como aliadas, pois aos inimigos 
já sabemos como tratam. (LÉRY, 1980 [1578], p. 205-206)
A comunidade tupinambá, à qual se refere Léry, era aliada dos franceses e praticava 
a antropofagia ritual, assim como outros povos tupis, sacrificando inimigos capturados e 
consumindo sua carne. Mesmo repugnado por tal prática, o autor ressalta em mais de um 
momento o estado de paz que prevalecia dentro das aldeias brasileiras ou entre aldeias que 
possuíam alguma forma de aliança, ainda que não houvesse qualquer presença forte de 
ordenamento civil, ou seja, nenhum tipo de policiamento organizado ou regulação oficial 
institucionalizada por ministros, secretários, prefeitos etc. Na obra apresentada na Figura 1, 
o artista Jean-Baptiste Debret expõe o cotidiano das comunidades indígenas1.
1 É relevante notar que a maioria das imagens utilizadas neste material não foi produzida no período 
em análise, tendo sido elaboradas por artistas posteriores, atendendo às demandas dos respectivos 
períodos de produção. Afora o caso dos artistas holandeses no século XVII, testemunhos visuais das 
populações nativas do Brasil foram relativamente raros até meados do século XX, quando artistas 
franceses foram convidados pela Coroa portuguesa a se estabelecerem no território brasileiro, repre-
sentando então suas paisagens e seu povo. Jean-Baptiste Debret (1768-1848) foi um dos nomes mais 
relevantes entre esses artistas vindos da França.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 30
Figura 1 – DEBRET, Jean-Baptiste. Botocudos, Puris, Pataxós e Machacalis. 1834. Litografia sobre 
papel, color.: 21,1 x 32,6 cm. Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo.
O choque cultural que se seguiu ao contato entre colonizadores e nativos foi crucial 
para o desenrolar da história colonial. Em mais de um momento as concepções indígenas de 
religiosidademostraram-se incompatíveis com a assimilação dos princípios cristãos, assim 
como as noções de vida prática se revelaram incompatíveis com a assimilação de institu-
cionalidades e modelos econômicos europeus. Somados, esses fatores ajudaram na criação 
de um modelo colonial que frequentemente incorporaria os povos americanos, quando es-
tes não se conformavam às reduções jesuíticas, devidamente cristianizados e adequados ao 
modo de vida europeu, apenas como mão de obra escrava. Mais comum foi seu isolamento 
do convívio com o restante da sociedade colonial, como alvo óbvio de guerras e predação, 
situação que acarretaria grande número de conflitos no interior do território nos séculos por 
vir. Perduraria ainda o estranhamento entre esses dois “Brasis”, um devidamente configura-
do conforme modelos europeus, e outro apenas precariamente controlado, foco de disputas, 
distante das instituições civis e religiosas tradicionais.
2.2 Os aldeamentos e a escravidão indígena
Os indígenas representavam um problema para o processo colonizador português. Se 
fossem considerados humanos, o que era algo controverso entre os primeiros colonos e su-
jeito a diversas discussões entre os letrados do período, seriam súditos da Coroa portuguesa 
e não poderiam ser escravizados. Mas, se não pudessem ser escravizados, também não po-
deriam ser assimilados de forma alguma à sociedade que se pretendia construir nos trópi-
cos, pois viviam de forma muito distinta dos colonos.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Em contato com essas pessoas tão diferentes na aparência, nos hábitos e na visão de 
mundo, muitos europeus começaram a avaliar se elas eram igualmente humanas ou se eles 
precisavam rever suas percepções sobre o que era humanidade. Frequentemente prevaleceu 
a visão de que a nudez, a linguagem, o paganismo e a antropofagia eram indicadores de 
barbarismo que deveriam ser suprimidos por meio do convívio e do trabalho forçado, e da 
subsequente cristianização forçada, ou pela via da “guerra justa” – o extermínio do “gentio 
bárbaro”, ameaçador da ordem civilizada.
Figura 2 – DEBRET, Jean-Baptiste. Índios soldados da província de Curitiba escoltando prisioneiros 
nativos. 1831. Litografia sobre papel: 20 x 32,5 cm. Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo.
Além do choque cultural, a praticidade normalmente levava os colonos a flexibilizar 
os limites do legalismo, ditando suas próprias regras. Como necessitavam de escravos que 
pudessem empregar no cultivo de cana-de-açúcar, a exploração dos não cristãos (e, portan-
to, “não humanos”) como mão de obra forçada tornava-se um componente fundamental 
da economia da Colônia. A captura de nativos era uma forma conveniente de obter cativos 
para o trabalho agrícola, enfraquecendo – quando não eliminando – grupos indígenas que 
poderiam representar uma ameaça aos colonos.
Os colonizadores exploravam, em diversos momentos, as inimizades históricas entre os 
diferentes povos indígenas, aliando-se a alguns grupos com a finalidade de atacar e destruir 
ou escravizar indivíduos de outras comunidades. Povos aliados podiam, por exemplo, ser 
recompensados com bens, rendimentos e títulos. Algumas comunidades indígenas acaba-
riam por buscar alianças com os colonos, com a intenção de evitar sua própria destruição, 
enquanto outras, em vista dos conflitos crescentes, tornar-se-iam ainda mais inimigas.
As expedições que adentravam o território, com a finalidade de desbravar a Colônia em 
busca de minérios e outras riquezas naturais, eram conhecidas como entradas e bandeiras, 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 32
lideradas por capitães do mato, e também se dedicavam à prática do preamento, que en-
volvia a captura de indígenas para trabalhos forçados. Confrontar agrupamentos indígenas 
que não se encontravam sob a tutela de missionários era perfeitamente lícito, pois tais gru-
pos eram considerados resistentes à fé cristã e enfrentá-los constituía uma forma de guerra 
justa. Mesmo aqueles que se encontravam devidamente abrigados em reduções jesuíticas 
estavam sujeitos a ataques, uma vez que a simples aderência ao cristianismo não freava os 
impulsos predatórios de muitos capitães preadores de escravos. Índios em condição de pe-
núria poderiam ainda se vender, numa prática conhecida como escravidão voluntária, que 
foi regulamentada pelo administrador colonial Mem de Sá, em 1566.
Além da escravização, implementada com o uso da força, os colonos sujeitavam os in-
dígenas à condição servil por meio do trabalho assalariado e da aculturação2, empreendida 
principalmente pelos jesuítas, mas também por outras ordens religiosas, as quais introdu-
ziam os nativos a um novo modelo de ocupação da terra, que substituía sua organização 
tribal por um novo regime de trabalho e sua vida ritual pelo catolicismo. Esses indígenas 
eram batizados, recebiam nomes portugueses e deviam se portar como portugueses, como 
demonstra este excerto de uma carta do Padre José de Anchieta:
Todos êstes impedimentos e costumes são mui faceis de se tirar se houver temôr 
e sujeição, como se viu por experiencia desde do tempo do governador Mem 
de Sá até agora; porque com o os obrigar a se juntar e terem igreja, bastou para 
receberem a doutrina dos Padres e perseverar nela té agora, e assim será sempre, 
durando esta sujeição. (ANCHIETA, 1964 [1584], p. 333)
Figura 3 – RUGENDAS, Johann Moritz. Aldeia tapuia. 1824. Aquarela e grafite sobre papel: 15,5 x 
28,2 cm. Coleção da Arte da Cidade de São Paulo, São Paulo.
2 O contato intercultural pode se processar de várias maneiras, e a aculturação é uma das mais mar-
cantes entre essas dinâmicas. A aculturação se processa em relações culturais assimétricas, quando 
uma das culturas envolvidas se revela mais potente, ou seja, desfruta de maior alcance e influência. 
Nesses casos, a cultura menos influente acaba por adotar elementos da mais poderosa, o que pode 
resultar na extinção de muitos de seus caracteres identitários. Essa relação pode ser vista no caso 
dos grupos indígenas brasileiros que assimilaram muitos dos hábitos, da tecnologia e da religião de 
origem europeia. Há exemplos, no entanto, de casos de resistência cultural e hibridizações. Sobre o 
conceito, ver: MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma in-
trodução. São Paulo: Atlas, 2006.
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33
Nos aldeamentos jesuíticos, os índios eram catequizados em sua própria língua, medi-
da utilizada pelos missionários para facilitar o processo de conversão. Com efeito, os jesuí-
tas esforçaram-se para sistematizar as línguas tupi por meio da criação de uma gramática. 
Muito do que ainda se conhece acerca do tupi antigo, falado por muitas comunidades da 
costa brasileira, deve-se aos esforços de pesquisa linguística dos missionários.
Nesses locais se desenvolvia um processo de “destribalização” que demandava uma 
aculturação radical: o trabalho agrícola, por exemplo, tradicionalmente uma atribuição fe-
minina nas sociedades tupis, precisava ser empreendido por todos, independentemente do 
gênero ou da faixa etária, o que poderia causar confrontos a princípio. O ensino de cânticos 
religiosos e métodos de construção e artesanato europeus acabava por descaracterizar o 
modo de vida também no nível estético e da vida doméstica.
Para além da aculturação, que transformava os indígenas efetivamente em súditos da 
Coroa portuguesa, os aldeamentos convertiam-nos em força produtiva e reserva militar con-
tra índios “bravios”, ou seja, aqueles que ainda não haviam sido aldeados.
Figura 4 – Ruínas da redução jesuítica de São Miguel Arcanjo, em São Miguel das Missões (RS).
Fonte: Jolkesky/iStockphoto.
A exploração dos indígenas como escravos só seria encerrada legalmente no século XVIII, 
via uma lei assinada pelo secretário de Estado do rei D. José I, o Marquêsde Pombal. É válido 
notar que mesmo antes disso, ainda em fins do século XVI, a escravidão indígena havia en-
trado em declínio, sendo gradualmente substituída pela escravidão negra, tanto pela acepção 
comum, entre os colonos, de que os indígenas eram pouco aptos ao trabalho pesado quanto 
por interesses envolvidos no lucrativo tráfico negreiro, que trazia cativos da África.
2.3 Costumes e permanências culturais
A cultura de um povo, expressão de sua identidade que se manifesta por meio de seu 
patrimônio material, de suas tradições e ritos, é uma cadeia dinâmica, não estática. Uma 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 34
cultura local ou nacional é tão definida pelas permanências de épocas passadas quanto pela 
assimilação de elementos novos.
Figura 5 – Casa em aldeia Kamayurá, no Alto Xingu (MT).
Fonte: Phototreat/iStockphoto.
As comunidades indígenas muitas vezes adotaram posturas diferentes em relação à 
administração colonial portuguesa, conforme o período colonial em questão, ou mesmo 
posteriormente, no que diz respeito ao território brasileiro. Os níveis de interação desses 
grupos com o restante do coletivo nacional variaram significativamente, desde uma roti-
na de trocas regulares a estados de isolamento, quando o histórico do contato se revelou 
traumático demais para permitir uma convivência mais estreita. Em todos os casos, porém, 
observam-se os efeitos duradouros e o impacto indelével do contato entre culturas radical-
mente diferentes.
Afora os topônimos de origem tupi que hoje permeiam amplamente a geografia brasi-
leira (nomes como Araraquara, Bertioga, Itaim, Ipiranga, Iguaçu, Paraíba, Sergipe, Ubatuba), as 
permanências mais visíveis de culturas indígenas na cultura brasileira podem ser observa-
das em práticas cotidianas fundamentais, como a arte popular e a medicina. A importância 
da cerâmica e da cestaria para a cultura popular brasileira, assim como o emprego comum 
de ervas e rituais como soluções para problemas de saúde, é também, certamente, herança 
das sociedades tradicionais pré-Cabralinas.
Além disso, os métodos de produção e processamento de alimentos são um marco im-
portante. A agricultura de coivara, por exemplo, foi preservada através dos séculos e con-
tinua a ser praticada em várias partes do território nacional. O cultivo da mandioca-brava 
é uma permanência particularmente relevante, já que se mantém como o item mais impor-
tante da agricultura da América tropical, mas também há exemplos de outras culturas agrí-
colas claramente relevantes para a culinária brasileira e que são parte da herança alimentar 
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indígena: o milho, a batata-doce, o cará, o feijão, o tomate, o amendoim, o tabaco, a abóbora, 
o urucu, as cuias e cabaças, o abacaxi, o mamão, a erva-mate e o guaraná, além de árvores 
como o caju, o pequi e o cacau.
 Ampliando seus conhecimentos
Sobre os canibais
(MONTAIGNE, 2009 [1580], p. 51)
[...] Eles são selvagens assim como chamamos selvagens os frutos que 
a natureza produziu por si mesma e por seu avanço habitual; quando 
na verdade os que alteramos por nossa técnica e desviamos da ordem 
comum é que deveríamos chamar de selvagens. Naqueles são vivas e 
vigorosas, e mais úteis e naturais, as virtudes e propriedades verdadeiras, 
e, nestes, nós as abastardamos adaptando-os ao prazer de nosso gosto 
corrompido. E por conseguinte, o próprio sabor e a delicadeza de diversos 
frutos daquelas paragens que não são cultivados são excelentes até para 
nosso próprio gosto, se comparados com os nossos: não é razão para que 
o artifício seja mais reverenciado que nossa grande e poderosa mãe natu-
reza. Sobrecarregamos tanto a beleza e a riqueza de suas obras com nossas 
invenções que a sufocamos totalmente. Seja como for, em qualquer lugar 
onde sua pureza reluz ela envergonha esplendidamente nossos vãos e frí-
volos empreendimentos:
Et veniunt bederae sponte sua melius,
Surgit et in solis formosior arbutus antris,
Et volucres nulla dulcius arte canunt.
[A hera cresce melhor por si só nas grutas solitárias;
O medronheiro cresce mais bonito,
E os pássaros têm um canto mais melodioso sem trabalho.]
Todos os nossos esforços não conseguem sequer reproduzir o ninho do 
menor passarinho, sua contextura, sua beleza e sua utilidade; tampouco 
a teia da miserável aranha. Todas as coisas, diz Platão, são produzidas 
pela natureza ou pela fortuna ou pela arte. As maiores e mais belas, por 
uma ou outra das duas primeiras; as menores e imperfeitas, pela última. 
Portanto, essas nações parecem assim bárbaras por terem sido bem 
pouco moldadas pelo espírito humano e ainda estarem muito próximas 
de sua ingenuidade original. As leis naturais ainda as comandam, muito 
pouco abastardadas pelas nossas; mas a pureza delas é tamanha que, por 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 36
vezes, me dá desgosto que não tenham sido descobertas mais cedo, na 
época em que havia homens que, melhor que nós, teriam sabido julgar. 
Desagrada-me que Licurgo e Platão não as tenham conhecido, pois pare-
ce-me que o que vemos por experiência naquelas nações ultrapassa não 
somente todas as pinturas com que a poesia embelezou a Idade de Ouro, e 
todas as suas invenções para imaginar uma feliz condição humana, como 
também a concepção e o próprio desejo de filosofia. Eles não consegui-
ram imaginar uma ingenuidade tão pura e simples como a que vemos 
por experiência e nem conseguiram acreditar que nossa sociedade conse-
guisse manter-se com tão pouco artifício e solda humana. É uma nação, 
eu diria a Platão, em que não há nenhuma espécie de comércio, nenhum 
conhecimento das letras, nenhuma ciência dos números, nenhum termo 
para magistrado nem para superior político, nenhuma prática de subor-
dinação, de riqueza, ou de pobreza, nem contratos nem sucessões, nem 
partilhas, nem ocupações além do ócio, nenhum respeito ao parentesco 
exceto o respeito mútuo, nem vestimentas, nem agricultura, nem metal, 
nem uso de vinho ou de trigo. As próprias palavras que significam men-
tira, traição, dissimulação, avareza, inveja, difamação, perdão são desco-
nhecidas. Como ele consideraria distante dessa perfeição a república que 
imaginou! [...]
Sobre o governo e as autoridades, 
e o que existe de ordem e de justiça
(STADEN, 2011 [1557], p. 122)
Entre os selvagens, não há um governo constituído e não há privilégios. 
Cada cabana tem um superior. Ele é o chefe. Todos os chefes são da mesma 
origem e têm o mesmo direito de dar ordens e governar. Disso cada um 
concluirá o que quiser. No caso de um deles se sobressair aos demais por 
atos de guerra, será mais seguido do que os outros numa campanha de 
guerra, como o antes mencionado Cunhambebe. Além disso, não eviden-
ciei nenhum privilégio entre eles, exceto que os mais jovens devem obe-
decer aos mais velhos, de acordo com o que exigem os costumes deles.
Se alguém bater ou atirar em outra pessoa de forma a matá-la, os parentes 
e amigos do morto podem ficar dispostos a matá-lo por sua vez, mas isso 
raramente ocorre. Os moradores de cada cabana obedecem ao chefe de 
cada uma delas. O que o chefe ordenar será feito, não por obrigação ou 
por temor, mas unicamente por boa vontade.
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Religião dos selvagens da América; erros 
em que são mantidos por certos trapaceiros 
chamados caraíbas; ignorância de Deus
(LÉRY, 1980 [1578], p. 205)
Embora seja aceita universalmente a sentença de Cícero, de que não há 
povo, por mais bruto, bárbaro ou selvagem que não tenha ideia da existên-
cia de Deus, quando considero os nossos tupinambás vejo-me algo emba-
raçado em lhe dar razão. Pois além de não ter conhecimento algum do 
verdadeiro Deus, não adoram quaisquer divindades terrestres ou celestes, 
comoos antigos pagãos, nem como os idólatras de hoje, tais os índios do 
Peru, que, a 500 léguas do Brasil, veneram o sol e a lua. Não têm nenhum 
ritual nem lugar determinado de reunião para a prática de serviços reli-
giosos, nem oram em público ou em particular. Ignorantes da criação 
do mundo, não distinguem os dias por nomes específicos, nem contam 
semanas, meses e anos, apenas calculando ou assinalando o tempo por 
lunações. Não só desconhecem a escrita sagrada ou profana, mas ainda, 
o que é pior, ignoram quaisquer caracteres capazes de designarem o que 
quer que seja. [...]
 Atividades
 Com base no que foi explanado no capítulo e nos excertos do texto complementar, 
responda:
1. Quais as distinções significativas que podemos observar no modo como os cronistas 
europeus concebem as sociedades indígenas em relação às europeias?
2. Que efeitos, segundo os cronistas, tinham essas distinções no modo como a ordem so-
cial e a justiça eram aplicadas nas sociedades brasileiras em comparação às europeias?
3. Qual era a percepção que os colonos tinham da religiosidade indígena?
 Referências 
ANCHIETA, José de, S. J. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões, 1534-1597. Rio de 
Janeiro: Civilização Brasileira, 1933.
______. Informação do Brasil e de suas capitanias. São Paulo: Obelisco, 1964 [1584].
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BRASIL. Ministério da Cultura. Fundação Biblioteca Nacional. A carta de Pero Vaz de Caminha. 
[1500]. Disponível em: <http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/carta.pdf>. Acesso 
em: 21 mar. 2017.
ISA – Instituto Socioambiental. Povos indígenas no Brasil. 2015. Disponível em: <http://pib.socioam-
biental.org/pt>. Acesso em: 13 abr. 2017.
LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Tradução e notas de Sérgio Milliet. São Paulo: Edusp, 1980 
[1578].
MONTAIGNE, Michel de. Dos canibais. São Paulo: Alameda, 2009 [1580].
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das 
Letras, 1995.
______. Os índios e a civilização: a integração das populações indígenas no Brasil moderno. São Paulo: 
Companhia das Letras, 2004.
STADEN, Hans. Duas viagens ao Brasil: primeiros registros sobre o Brasil. Porto Alegre: L&PM, 2011 
[1557]. (Coleção L&PM Pocket).
 Resolução 
1. As sociedades europeias do século XVI, à parte suas particularidades regionais, 
eram caracterizadas por uma organização estritamente estratificada, nas quais havia 
uma aristocracia ou nobreza, uma elite, que se distinguia do restante da população 
em razão de seu nascimento, o que ficava nítido no nome de família que o indivíduo 
possuía. Via de regra, os nobres eram proprietários de boa parte das terras produti-
vas da Europa, quando não atuavam como militares ou administradores a serviço de 
senhores de terras. Em regimes monárquicos, o mesmo princípio aristocrático legiti-
mava o direito de governar que um rei possuía desde o nascimento. Nos estados ca-
tólicos, a Igreja transcendia as barreiras sociais, por vezes sobrepondo-se à nobreza, 
em razão de possuir suas próprias terras, e valendo-se de sua influência para arbitrar 
importantes questões políticas com os governantes.
 Entre os indígenas, por outro lado, foram encontradas sociedades com menor elabo-
ração material e institucional, nas quais não se percebem divisões, por exemplo, en-
tre governantes, artesãos e trabalhadores rurais, posto que, dentro da estratificação 
por gênero e idade, todos os indivíduos que pertencem a um grupo (mulheres ou 
homens) partilham dos mesmos conhecimentos práticos.
2. É importante levar em consideração que os indígenas não possuíam sistemas de po-
liciamento, juízes ou qualquer modelo de burocracia semelhante àqueles adotados 
pelos europeus. As disputas entre indivíduos e famílias eram mediadas por chefes 
locais, os quais eram reverenciados e seguidos pelos demais em razão de sua idade 
ou por terem se destacado na guerra, tornando-se lideranças orgânicas, mais ba-
seadas na experiência do que em critérios de hereditariedade, como ocorria com as 
monarquias europeias.
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 Montaigne, que não chegou a testemunhar as práticas culturais indígenas de perto, 
conhecendo-as principalmente por meio da leitura de cronistas da época, mostra 
particular admiração pelo modo de vida dos nativos brasileiros, comparando sua 
“selvageria” com frutos selvagens, capazes de preservar qualidades louváveis, ine-
vitavelmente perdidas pela aclimatação e pela técnica arbitrariamente impostas pelo 
engenho humano.
3. Resta claro que, para autores como Anchieta, de Léry e Staden, não obstante sua 
aceitação de inúmeros hábitos dos brasileiros nativos, beirando a admiração em al-
guns pontos, a ausência de uma religiosidade cristã – ou mesmo uma que seja com-
parável a esta – é algo quase tão repugnante quanto a prática da antropofagia.
 De Léry, por exemplo, mostra-se chocado em vista da total ausência de templos, 
ritos regulares e mesmo de um conceito compreensível de dividande entre os tupi-
nambás, haja vista que os “índios do Peru” (referindo-se, provavelmente, aos incas) 
construíam templos para honrar “o sol e a lua”.
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3
Portugal e a colonização 
das terras tropicais
Ao longo dos trinta anos subsequentes à chegada de Cabral, a exploração do ter-
ritório brasileiro pela metrópole portuguesa manteve-se restrita à faixa litorânea. A 
importância econômica atribuída à colônia consistia em sua capacidade de suprimento 
de pau-brasil: em 1534, um documento português já determinava que todas as árvores 
de pau-brasil eram propriedade da Coroa, instituindo penalidades para sua explora-
ção irregular (PRESTES, 2000, p. 130).
Conhecida pelos indígenas como ibirapitanga ou ibirapiranga (“madeira vermelha”), a 
árvore já era empregada, à época da chegada de Cabral, na confecção de arcos e flechas, e 
o cerne do tronco, rico em pigmento vermelho, era usado como corante (CABRAL, 2013, 
p. 53). O termo brasil1 seria uma referência justamente à cor vermelha vibrante que pode-
ria ser obtida da árvore, uma “cor de brasa”. Além de se tratar de uma madeira nobre, 
foi empregada pelos europeus principalmente para a tinturaria (CABRAL, 2013, p. 55).
Os troncos de pau-brasil eram obtidos em grande parte por meio do escambo com 
comunidades indígenas aliadas aos portugueses, como os tupiniquins. O escambo era 
um sistema de trocas simples: bens de consumo de origem europeia, como machados de 
ferro, facas, anzóis, espelhos, roupas, pinças, miçangas, pentes e outras quinquilharias 
e ornamentos, de valor relativamente baixo para os europeus, eram oferecidos aos nati-
vos, que consideravam tais objetos úteis ou novidades interessantes. Em troca, os indíge-
nas supriam os portugueses com matérias-primas, alimentos, serviços e auxílio militar.
1 Para saber mais sobre a utilização do nome “Brasil”, ver: SOUZA, Laura de Mello e. O nome do Brasil. Revista 
de História, São Paulo, n. 145, p. 61-86, 2001. Disponível em: <http://revhistoria.usp.br/images/stories/revistas/145/
RH-145_-_Laura_de_Mello_e_Souza.pdf>. Acesso em: 7 abr. 2017.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 42
Todavia, a jovem colônia ainda não dispunha de estabelecimentos ou postos avançados 
permanentes, de modo que era possível a exploradores europeus de outros reinos, especial-
mente os franceses, terem acesso ao pau-brasil, fosse por meio do escambo com comunidades 
indígenas inimigas dos tupiniquins, fosse pelo saque de embarcações mercantes portuguesas 
a caminho dos portos da Metrópole, prática empreendida por piratas e corsários. As perdas 
impostas ao incipiente comércio transatlântico português levariam progressivamente à imple-
mentação de um projeto colonial nos trópicos, buscando assegurar a posse do territórioe os 
privilégios comerciais obtidos por meio do controle de seus produtos.
3.1 A estruturação econômica e política da colônia
Desde os últimos anos do séc. XV as costas brasileiras começam a ser frequentadas 
por navegantes portugueses e espanhóis. Não interessa discutir aqui prioridades, 
o que muitos historiadores, ocupados mais em procurar glórias nacionais que em 
escrever história verdadeira, já fizeram à saciedade; aliás sem maiores resultados. 
De início aquelas viagens eram apenas de exploração. Tratava-se no momento, 
como foi lembrado, de resolver um problema geográfico de grande importância: 
descobrir o caminho das Índias. Os portugueses tinham procurado a solução na 
rota do Oriente, contornando a África; os espanhóis, partindo da premissa de que 
a Terra era redonda, dirigem-se para o Ocidente. Uns e outros topariam com a 
América: os espanhóis, porque ela se encontrava em seu caminho natural; e per-
longando-a em busca da passagem que os levaria às Índias, tocariam as costas 
brasileiras. Os portugueses, por seu turno, arrastados pelos azares da navegação, e 
interessados em observar o que os espanhóis estavam realizando, afastar-se-ão da 
sua rota ao longo da África e também chegarão ali. (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 15)
Em 1494, quando os monarcas de Portugal e da Espanha firmaram o Tratado de 
Tordesilhas, que dividia a posse das terras do Atlântico, a costa brasileira encontrava-se 
dentro do campo português e possuía potencial para a exploração econômica imediata, por 
meio da extração do pau-brasil – em caráter de monopólio pela Coroa de Portugal –, feita 
pelos próprios nativos em troca de artigos relativamente baratos e de fácil transporte. A ação 
de corsários e contrabandistas2, entretanto, representava um problema para os interesses 
portugueses no Brasil.
A figura a seguir mostra o chamado Planisfério de Cantino, um mapa adquirido por um 
italiano chamado Alberto Cantino para seu patrono, o duque de Ferrara (SOLER, 2002, p. 99). 
2 Embora ataques por mar com o propósito de saquear portos ou tripulações de mercadores sejam co-
nhecidos desde a Antiguidade, pode-se dizer que a “pirataria moderna”, como a conhecemos, nasce com 
a chegada dos europeus às Américas. Muitos capitães piratas eram oriundos da França e da Inglaterra e 
atacavam embarcações espanholas e portuguesas que voltavam das Américas carregadas de riquezas. As 
Coroas de países inimigos da Espanha e de Portugal se beneficiavam desses ataques e, por vezes, emi-
tiam documentos chamados cartas de corso, que autorizavam seus portadores a praticar atos de pirataria 
legalmente. Os indivíduos empossados com esses documentos eram conhecidos como corsários. Para 
mais informações sobre o tema, ver: FRANÇA, Jean Marcel Carvalho; HUE, Sheila. Piratas no Brasil: as 
incríveis histórias dos ladrões dos mares que pilharam nosso litoral. São Paulo: Globo, 2014.
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
3
43
Encomendado a um cartógrafo anônimo de Lisboa, esse mapa exibe o meridiano que demarca 
o Tratado de Tordesilhas e representa, ainda que de forma rudimentar, as terras recém-con-
quistadas por Portugal nas Américas. Por ser uma representação bastante antiga, ele apresenta 
apenas a faixa litorânea do território brasileiro3.
Figura 1 – O Planisfério de Cantino. 1502. Biblioteca Estense Universitaria, Modena, Itália.
Uma primeira resposta à pirataria foi o envio de duas expedições guarda-costas, uma 
organizada em 1516 e a outra em 1526. Essas expedições se revelaram pouco efetivas no 
combate ao contrabando e à ocupação do território brasileiro por colonos estrangeiros. Um 
dos maiores obstáculos à efetivação do poder português sobre a costa era o contexto de 
conflito entre as várias comunidades nativas. Duas das mais influentes nações indígenas do 
litoral, tupiniquins e tupinambás, eram inimigas declaradas, a primeira aliando-se normal-
mente aos portugueses, a segunda aos franceses. A conjuntura foi sintetizada pelo historia-
dor Capistrano de Abreu: “durante anos ficou indeciso se o Brasil ficaria pertencendo aos 
Peró (portugueses) ou aos Mair (franceses)” (ABREU, 1988, p. 74).
Na terceira década do século XVI teria início o empreendimento colonial de fato, es-
pecificamente em 1530. A fim de fazer frente ao avanço dos franceses, Portugal enviaria 
uma expedição liderada por Martim Afonso de Sousa. Para além dos propósitos militares, 
a expedição estabeleceria, em 1532, o primeiro povoamento português oficial, a Vila de São 
Vicente, na região da atual Baixada Santista. São Vicente deveria ser organizada como uma 
frente defensiva contra investidas estrangeiras e como um centro produtor de cana-de-açú-
car. O cultivo da terra exigia mão de obra, o que motivaria avanços rumo ao interior para a 
captura de indígenas, desencadeando confrontos.
Como parte do projeto para explorar o território da melhor forma possível, foi instituí-
do o sistema de capitanias hereditárias, sendo que a primeira delas foi outorgada a Fernão 
de Loronha, cristão novo e comerciante lisboeta, em 1504, por meio de uma carta régia do 
3 Para mais informações sobre o Planisfério de Cantino e outros mapas históricos, ver: CASA FIAT DE 
CULTURA. A arte nos mapas na Casa Fiat de Cultura. Nova Lima, 2008.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 44
rei D. Manuel I. Apesar disso, esse sistema não foi implementado de forma particularmente 
intensa até 1534, quando toda a costa mapeada foi dividida em quinze capitanias:
1. Capitania do Maranhão (primeira seção);
2. Capitania do Maranhão (segunda seção);
3. Capitania do Ceará;
4. Capitania do Rio Grande;
5. Capitania de Itamaracá;
6. Capitania de Pernambuco;
7. Capitania da Baía de Todos os Santos;
8. Capitania de Ilhéus;
9. Capitania de Porto Seguro;
10. Capitania do Espírito Santo;
11. Capitania de São Tomé;
12. Capitania de São Vicente (primeira seção);
13. Capitania de Santo Amaro;
14. Capitania de São Vicente (segunda seção);
15. Capitania de Santana.
Cada capitania era governada por um donatário, um indivíduo que recebia da Coroa 
portuguesa uma carta de doação, a qual era importante, posto que estabelecia os limites de 
sua autoridade territorial e, assim, determinava o espaço onde poderia explorar riquezas e 
população locais.
A carta de foral, carta foral, ou simplesmente “foral”, era o segundo documento de maior 
importância para o capitão donatário. O foral consistia do contrato entre donatário e monarca, 
uma disposição que remontava a modelos feudais, estabelecendo as atribuições burocráticas 
do capitão e os encargos que devia à Coroa, bem como seus direitos, que incluíam:
• criar vilas;
• repartir terras em sesmarias, as quais poderiam ser outorgadas a terceiros;
• empreender guerras contra as populações indígenas para obter mão de obra escrava;
• receber uma parte dos lucros advindos do comércio de pau-brasil e dos metais 
preciosos encontrados no solo.
Embora o sistema de capitanias hereditárias tenha persistido até o século XVIII, ape-
nas a de Pernambuco e a de São Vicente se revelariam empreendimentos verdadeiramente 
bem-sucedidos. Segundo as historiadoras Lilian Schwarcz e Heloísa Starling (2015, p. 55), 
em sua obra Brasil: uma biografia, as poucas capitanias hereditárias que se saíram bem foram 
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
3
45
aquelas que aliaram produção de cana-de-açúcar e uma tentativa de convivência pacífica 
com os indígenas. Muitos colonos portugueses encontravam dificuldades para se habituar 
ao clima local ou enfrentavam problemas para suprir seus territórios com a infraestrutura 
necessária, especialmente os engenhos, fundamentais ao processo da cana, que estava se tor-
nando a força motriz da economia colonial. As grandes lavouras de cana precisavam ainda 
de um volume de mão de obra que não poderia ser facilmenteobtida, sobretudo em função 
da resistência dos povos indígenas e mesmo da proteção a eles, por parte dos jesuítas.
Conforme aponta Caio Prado Júnior (1970, p. 18),
No terceiro decênio do séc. XVI o Rei de Portugal estará bem convencido que 
nem seu direito sobre as terras brasileiras, fundado embora na soberania do 
Papa, nem o sistema, até então seguido, de simples guardas-costas volantes, era 
suficiente para afugentar os franceses que cada vez mais tomam pé em suas pos-
sessões americanas. Cogitará então de defendê-las por processo mais amplo e 
seguro: a ocupação efetiva pelo povoamento e colonização. Mas para isto ocorria 
uma dificuldade: ninguém se interessava pelo Brasil.
A implementação do sistema de Governo-Geral, de 1548 a 1549, buscou sanar a carência 
de governança na Colônia, centralizando a administração local em uma autoridade máxima, 
o governador-geral, que contava com outros três profissionais de alto escalão: o ouvidor-
-mor, o provedor-mor e o capitão-mor.
Salvador, fundada em 1549 e batizada primeiramente como São Salvador da Bahia de 
Todos os Santos, foi a capital colonial desse governo até a burocracia administrativa ser 
deslocada para o Rio de Janeiro, em 1621. O crescimento da importação de açúcar levaria a 
um florescimento econômico, mas impulsionaria também o crescimento do brutal comércio 
transatlântico de escravos oriundos da África.
3.2 União Ibérica: conflitos e expansão 
das fronteiras do Brasil colonial
Em 1578, o rei Sebastião I, “o Adormecido” ou “o Desejado”, desapareceu durante a 
Batalha de Alcácer-Quibir, no Marrocos, presumivelmente morto em combate, embora a ocor-
rência tenha sido posteriormente revestida em lendas. Visto que Sebastião não havia deixado 
herdeiros, seguiu-se uma crise de sucessão em Portugal. O cardeal Dom Henrique assumiu 
a Coroa, mas faleceu em 1580, criando um novo vácuo no poder. O monarca espanhol Filipe 
II, que era neto do rei português Manuel I, reclamou para si o direito de sucessão, usando o 
poderio militar da Espanha para pressionar o Estado português e reforçar sua reivindicação. 
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 46
A união das Coroas na pessoa de Filipe (cognominado “I” em Portugal e “II” na Espanha) 
inaugurou, assim, um novo período na história dos dois impérios: a União Ibérica.
Figura 3 – MORAIS, Cristóvão de. Retrato de D. Sebastião. 1571–1574. Óleo sobre tela: 100 x 85 cm. 
Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, Portugal.
Figura 2 – TIZIANO, Vecellio. Retrato de Filipe II. 1554. Óleo sobre tela: 185 x 103 cm. Galleria 
Palatina (Palazzo Pitti), Florença, Itália.
Com a incorporação da nova Coroa portuguesa, a Espanha adquiria uma posição privi-
legiada no comércio marítimo internacional, bem como um prestígio renovado por parte da 
Igreja Católica: o Império Espanhol passou a ser o maior entre os Estados leais ao papa no 
cenário europeu e o principal responsável pela expansão e defesa do credo católico no mundo.
Embora a nova posição fosse vantajosa para o monarca espanhol, autorizando-o a ex-
plorar novos recursos oriundos da tributação sobre produtos coloniais e o rico comércio 
escravocrata empreendido pelos lusitanos no Novo Mundo, foi permitido amplamente à 
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Colônia manter seus costumes, sua língua e suas autoridades locais. Os comerciantes de es-
cravos portugueses também mantiveram seus direitos, embora sua supremacia no Atlântico 
começasse a ser minada pelo ingresso de empreendedores de outras nacionalidades.
No entanto, o declínio do poderio português no comércio de escravos e especiarias não 
foi o único problema enfrentado pelos ibéricos e colonos brasileiros. O impacto mais pro-
fundo que a União Ibérica teria na vida destes últimos viria de outra frente: a militar. Como 
a América portuguesa passou então a território espanhol, estava ainda mais suscetível a 
invasões e ações piratas de inimigos da Espanha, como os franceses e os holandeses.
Os franceses, que entre 1555 e 1560 haviam tentado estabelecer uma colônia, a França 
Antártica, retornariam para tentar um segundo empreendimento, a França Equinocial, em 
1612, tendo persistido até 1615.
Em 1618, as tensões entre católicos e protestantes que vinham fermentando no cenário 
europeu atingiram seu clímax. O que começou como uma disputa religiosa e política dos esta-
dos alemães logo se alastrou, produzindo um confronto de dimensões continentais: a Guerra 
dos Trinta Anos. Envolvida no confronto e incapaz de cuidar de todas as frentes do império, 
a Espanha pouco pôde fazer quando, em 1640, um grupo de conspiradores restaurou um 
português ao trono lusitano: o duque de Bragança, coroado como João IV, primeiro represen-
tante da dinastia de Bragança, no processo que ficou conhecido como a Restauração da Coroa 
portuguesa. Cabe salientar que esses conspiradores, membros da elite portuguesa, estavam 
desgostosos com a ameaça de redução de seus privilégios no decorrer da União Ibérica.
Prado Júnior (1970) observa que, mesmo livre da influência espanhola e restaurada a 
seu posto de independência, a Coroa portuguesa não recuperaria seu antigo prestígio ou seu 
posto de primazia no comércio marítimo entre as potências europeias.
De 1580 a 1640 a coroa portuguesa esteve reunida à da Espanha. O reino de 
Portugal não foi englobado na monarquia espanhola; embora sob a dominação 
do mesmo monarca, conservou sua autonomia, sendo governado por um Vice-
Rei em nome do soberano espanhol. Foi um período sombrio da história por-
tuguesa [...]. Os Países-Baixos e a Inglaterra, com que a Espanha estivera em 
luta quase permanente, ocuparão, para não mais a devolver, boa parte das pos-
sessões portuguesas [...]. Na própria colônia americana a soberania portuguesa 
correrá grande risco. Além de incursões esporádicas de ingleses e holandeses, 
estes últimos ocuparão efetivamente durante longos anos boa parte da colônia. 
Em 1630 instalam-se em Pernambuco, e daí estendem suas conquistas para o sul 
até Alagoas, e para o norte até o Maranhão. É somente depois de restaurada a 
independência portuguesa que os holandeses serão definitivamente expulsos do 
Brasil (1654). (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 31)
Assim, o próximo desafio enfrentado pela Coroa portuguesa – a fim de garantir a posse 
e a prosperidade de sua Colônia do outro lado do Atlântico – seria a investida holandesa.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 48
3.3 Domínio holandês e o legado de Nassau
Figura 4 – BAEN, Jean de. Retrato de Maurício de Nassau. ca. 1668-1670. Óleo sobre tela: 151,5 x 
114,5 cm. Royal Picture Gallery Mauritshuis, Haia, Holanda.
Em 1581, por meio do Ato de Abjuração, as províncias dos Países Baixos se tornaram 
independentes do Império Espanhol, constituindo a República das Sete Províncias Unidas 
dos Países Baixos4, República Unida dos Países Baixos, ou simplesmente Províncias Unidas. 
Esse fato teria sérias repercussões internacionais, colocando em questão o poderio, então 
desafiado por poucos, da Coroa espanhola. Esse conflito deve ser pensado no contexto da 
complexa convergência em que a Europa se encontrava imersa entre os séculos XVI e XVII, 
envolvendo principalmente três fatores:
1. a questão religiosa, que dividia as potências europeias em católicas e protestantes;
2. as tensões na luta pela manutenção/reestruturação das fronteiras dentro do conti-
nente europeu; e
3. a luta por fronteiras expandidas no Velho Mundo, que implicava não apenas em 
uma ampliação territorial, mas no controle de um lucrativo comércio marítimo.
Em represália à emancipação política dos holandeses, o rei Filipe II decretou que todos 
os portos da União Ibérica deveriam ser fechados para embarcações holandesas. A resposta 
a tal pressão foi a criação, em 1602, da Companhia Unida das Índias Orientais, tambémchamada Companhia Holandesa ou Neerlandesa das Índias Orientais. Essa companhia se 
tornaria um dos primeiros empreendimentos de comércio transatlântico já criados e passa-
ria a dominar o comércio de especiarias pela rota do Oceano Índico, sem jamais perder de 
vista a meta de ocupar um lugar privilegiado no lucrativo comércio de açúcar.
4 No século XVI, os Países Baixos estavam sob domínio espanhol. O processo de independência da 
região se deu em um longo conflito, a Guerra dos Oitenta Anos (1568-1648). Essa guerra compreendeu, 
na verdade, dois conflitos, entremeados por um hiato chamado “Trégua dos Doze Anos (1609-1621)”: 
o primeiro consistiu de uma luta por independência; o segundo, de um conflito entre a potência co-
lonial já estabelecida da Espanha e os holandeses em ascensão (MELLO, 2007, p. 19). A entrada dos 
holandeses na empresa colonial representaria uma ameaça ao poderio ibérico.
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
3
49
A partir do modelo da primeira, uma segunda Companhia seria fundada em 1621: a 
Companhia das Índias Ocidentais, com o propósito de estender a influência holandesa ao 
Novo Mundo. O governo das Províncias Unidas cedeu a essa companhia o monopólio de ex-
ploração de todos os territórios entre a Terra Nova e o Estreito de Magalhães, e dessa iniciativa 
emergiria a empresa de colonização holandesa no Nordeste brasileiro (MELLO, 2007, p. 20).
A capitania de Pernambuco, por sua vez, constituía um riquíssimo polo açucareiro, 
onde os fazendeiros viviam com uma opulência que corsários e empreendedores estrangei-
ros não podiam desprezar. Em 1594, Recife seria saqueada pelo corsário James Lancaster, 
que retornou à Inglaterra com um butim5 formidável.
As próximas investidas viriam dos holandeses. Entre 1624 e 1625, invadiriam e ocu-
param Salvador, aprisionando o governador local. Os espanhóis retaliaram enviando uma 
armada e expulsando os invasores. Em 1630, seria a vez de Olinda, em Pernambuco. Embora 
tenha havido resistência da parte de líderes como Filipe Camarão e Martim Soares Moreno, 
muitos senhores de engenho se alinharam com os holandeses, certos de que trabalhar com 
a Companhia das Índias Orientais traria novos investimentos, melhor infraestrutura e me-
lhores oportunidades de mercado, posto que o modelo de governo holandês parecia mais 
liberal que o modelo ibérico.
Figura 5 – RETRATO de Filipe Camarão. séc. XVII. Óleo sobre tela: 96 x 70 cm. Museu do Estado 
do Pernambuco, Recife.
À medida que crescia o apoio entre os colonos ibéricos, os holandeses expandiam sua área 
de influência. As principais cidades do Brasil holandês eram Olinda, Recife, rebatizada como 
Maurits-Stadt, João Pessoa (Frederikstad), Natal (Nieuw Amsterdam) e Fortaleza (Fort Schoonenborch). 
5 O butim, também chamado de espólio, presa ou despojo, era o produto da pilhagem empreendida duran-
te um ataque. Esse conjunto de bens podia compreender metais preciosos, mercadorias de importação, 
como o açúcar, e escravos. Para países rivais, como a França, tirar proveito de piratas e corsários para 
tomar o butim era uma forma de adquirir riquezas e, ao mesmo tempo, enfraquecer os impérios ibéricos.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 50
Em 1636, o conde João Maurício de Nassau-Siegen foi convidado pela Companhia das Índias 
Orientais para administrar os territórios neerlandeses no Nordeste brasileiro.
Após sua chegada, em 1637, com uma comitiva que dispunha não apenas de explora-
dores, comerciantes e cartógrafos, mas também de teólogos, cientistas, arquitetos e pintores, 
Maurício de Nassau instituiu uma intensa política de urbanização, organizando serviços 
essenciais para a manutenção e ampliação das cidades e estimulando o estabelecimento de 
jardins, um museu e um observatório em Recife. Nassau também assumiu uma política 
predominantemente conciliatória entre os colonos, permitindo a liberdade religiosa para os 
não católicos e judeus.
O jurista e autor Luís da Câmara Cascudo escreveu acerca da indelével marca deixada 
pelos estrangeiros no imaginário nordestino:
Neste 1945 o holandês não é para mim um assunto mas uma presença. Conquistou 
e dirigiu a região brasileira em que nasci e vivo, a mais amada e conhecida. 
Não o encontro apenas nos livros, mapas, nótulas e relatórios da Geoctroyer 
Westindische Companie, mas na recordação inconsciente de sua visita de vinte e 
quatro anos, inapagável na memória nordestina. (CASCUDO, 1956, p. 13)
Talvez um dos legados mais significativos da curta permanência holandesa seja o conjun-
to de representações pictóricas das paisagens brasileiras e das etnias que viviam no território 
do Brasil holandês por pintores como Alberto Eckhout. Havia um esforço cuidadoso de re-
tratar com minúcia os aspectos naturais e o ar exótico desse novo espaço que os neerlandeses 
reclamaram para si. É importante salientar, contudo, que, mais que mera curiosidade ou inte-
resse científico, as obras da época refletem o impulso colonizador também por parte dos ho-
landeses e a necessidade de apreender da melhor forma possível o território recém-dominado. 
Também se deve atentar para a unilateralidade dessas representações, já que revelam apenas a 
visão dos holandeses acerca da população e do território colonial brasileiro.
Em 1641, como consequência da restauração do trono português, houve a assinatura de 
uma trégua entre os holandeses e os portugueses. Em Lisboa, fermentava uma indignação 
com relação à tomada, pelos holandeses, dos estados de Sergipe e Maranhão e também de 
Angola. A presença holandesa na África ameaçava o fornecimento de mão de obra para o 
cultivo do açúcar, bem como havia um crescente sentimento de revolta dos colonos lusitanos 
– todavia, esse levante ainda encontraria, por alguns anos, dificuldade para se materializar.
Enquanto o governo holandês se consolidava, a Companhia das Índias Orientais co-
meçou a questionar a necessidade de Nassau para o projeto de colonização brasileira. 
Assim, em 1642 seus serviços foram dispensados e, em 1643, ele embarcou de volta para 
a Europa. Seus sucessores, menos conciliadores, cobrariam dívidas pendentes dos senho-
res de engenho e falhariam em negociar tão habilmente com os interesses locais, o que 
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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51
finalmente deflagraria uma revolta. Em uma série de confrontos, dos quais o mais de-
cisivo foi a Segunda Batalha dos Guararapes, em 1649, os luso-brasileiros conseguiram 
efetivamente desarticular o poderio holandês na região.
O quadro Batalha de Guararapes, produzido por Victor Meirelles em 1879, no período 
imperial, ou seja, mais de dois séculos após o evento que representa, traz uma versão ideali-
zada do confronto, ressaltando seu caráter heroico e fundacional para a identidade brasilei-
ra. Seria, afinal de contas, uma celebração do primeiro grande evento em que brasileiros se 
uniram como nação para enfrentar uma ameaça estrangeira.
Figura 6 – MEIRELLES, Victor. Batalha de Guararapes. 1879. Óleo sobre tela: 494,5 x 923 cm. 
Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Em 1654, no Campo do Taborda, diante do Forte das Cinco Pontas, os holandeses as-
sinaram sua capitulação e abandonaram o Brasil. Em 1661, foi assinado o Tratado de Haia, 
no qual os portugueses concordavam em pagar uma compensação aos inimigos em troca 
da devolução formal da Nova Holanda. Terminava assim a pretensão da formação de um 
domínio holandês na América portuguesa6.
6 O historiador e diplomata Evaldo Cabral de Mello (1936-) é considerado a maior referên-
cia sobre a presença holandesa no Brasil. Sobre o tema, é válido consultar suas obras: MEL-
LO, Evaldo Cabral de. Rubro veio: o imaginário da restauração pernambucana. Rio de Janeiro: 
Topbooks, 2005 (originalmente publicado em 1986); O negócio do Brasil, Portugal, os países baixos 
e o Nordeste,1641-1669. Rio de Janeiro: Topbooks, 2003 (originalmente publicado em 1998); Nassau: 
governador do Brasil holandês. São Paulo: Companhia das Letras, 2006; e Olinda Restaurada: guerra e 
açúcar no Nordeste, 1630-1654. São Paulo: Ed. 34, 2007.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 52
 Ampliando seus conhecimentos
Fernão Cardim (1549-1628) foi um religioso português que embarcou para 
o Brasil em 1583, a serviço da Companhia de Jesus. Produziu uma obra 
extensa sobre a América portuguesa, a qual foi inicialmente adquirida 
por um editor britânico e publicada em inglês, em 1625, com o título A 
Treatise of Brazil written by a Portugall which had long lived there, sendo 
a autoria equivocadamente atribuída a um português chamado Manuel 
Tristão. O conjunto desses trabalhos viria a ser compilado em 1925, com-
preendendo três manuscritos: “Do clima e terra do Brasil”, “Do princípio 
e origem dos índios do Brasil” e “Narrativa epistolar”.
Da Capitania de Pernambuco, por Fernão 
Cardim, escrito entre 1583-1601
(CARDIM, 2009 [1583-1601], p. 35-36)
A capitania de Pernambuco está cinco léguas de Tamaracá, pelo o sul 
em altura de oito graus, da qual é capitão e governador Duarte Coelho 
Dalbuquerque. Tem duas povoações, a principal se chama Olinda, a outra 
Guaraçu, que está quatro léguas pela terra dentro. Haverá nesta capitania 
mil vizinhos. Tem vinte e três engenhos de açúcar posto que destes três ou 
quatro não são ainda acabados.
Alguns moem com bois, a estes chamam trapiches, fazem menos açúcar 
que os outros: mas a maior parte dos engenhos do Brasil moem com água. 
Cada engenho destes um por outro, faz três mil arrobas cada ano, nesta 
capitania se fazem mais açúcares que nas outras, porque houve ano que 
passaram de cinquenta mil arrobas, ainda que o rendimento deles não é 
certo, são segundo as novidades e os tempos que se oferecem. Esta se acha 
uma das ricas terras do Brasil, tem muitos escravos índios que é a prin-
cipal fazenda da terra. Daqui os levam e compram para todas as outras 
capitanias, porque há nesta muitos, e mais baratos que em toda a costa: 
há muito pau do Brasil e algodão de que enriquecem os moradores desta 
capitania. O porto onde os navios entram está uma légua da povoação 
Olinda; servem-se pela praia e também por um rio pequeno que vai dar 
junto da mesma povoação. A esta capitania vão cada ano mais navios 
do reino que a nenhuma das outras. Há nela um mosteiro de padres da 
Companhia de Jesus. [...]
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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 Atividades
1. Explique de que forma o modelo econômico exploratório inicialmente adotado pelos 
portugueses no território brasileiro, em 1500, impactou no desenvolvimento de um 
novo projeto colonial nas terras tropicais, que viria a ser implantado a partir de 1530.
2. Discorra sobre o contexto de conflitos em que a Colônia se viu envolvida entre os 
séculos XVI e XVII, durante a emergência da União Ibérica.
3. Observe as três pinturas de Albert Eckhout, a seguir, e discorra a respeito de como 
seus temas são representados, refletindo sobre as características do discurso visual 
apresentado.
ECKHOUT, Albert. Homem Tapuia. 1641. Óleo sobre tela, color.: 272 x 161 cm. Museu Nacional de 
Copenhague, Dinamarca.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 54
ECKHOUT, Albert. Mulher Africana. 1641. Óleo sobre tela, color.: 265 x 178 cm. Museu Nacional 
de Copenhague, Dinamarca.
ECKHOUT, Albert. Homem Tupi. 1643. Óleo sobre tela, color.: 272 x 163 cm. Museu Nacional de 
Copenhague, Dinamarca.
 Referências 
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v. 37, n. 129, p. 49-55, abr./jun. 2013.
Portugal e a colonização das terras tropicais
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
3
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Letras, 2015.
 Resolução 
1. A opção inicialmente adotada pelos portugueses, de apenas visitar a costa brasileira 
para obter pau-brasil, por meio do escambo com as tribos nativas, abriu o territó-
rio para disputas com corsários e exploradores oriundos de outros reinos europeus, 
como os franceses. Após a emergência dessas ameaças ao domínio lusitano do co-
mércio de pau-brasil, a Coroa portuguesa se viu pressionada a defender a costa de 
interesses estrangeiros, investindo na ocupação, que exigiria, por sua vez, uma estru-
tura burocrática, a qual se formatou primeiro no modelo das capitanias hereditárias 
e, posteriormente, no sistema de governo-geral.
2. Assimilados pela Coroa espanhola, o Estado português e suas colônias se viram envol-
vidos nos conflitos nos quais a Espanha já estava imersa, especialmente os de ordem 
religiosa, territorial e institucional que conduziriam à Guerra dos Trinta Anos. Como 
a divisão entre católicos e protestantes era uma questão central do confronto e a Espa-
nha assumia a posição de defensora do poder católico no cenário europeu, a hostilida-
de de Estados protestantes, como os ingleses e holandeses, atuando como corsários ou 
expedições de ocupação, passou a ser dirigida também ao território brasileiro.
Portugal e a colonização das terras tropicais3
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 56
3. Como um holandês recém-chegado a um território tropical, fica evidente que 
Eckhout (como, provavelmente, muitos de seus conterrâneos) ficou fascinado pela 
flora e pela configuração do território. Em suas obras, tanto os elementos da flora e 
da fauna quanto o elemento humano são caracterizados pelas diferenças que carre-
gam: assim como a grande aranha em Homem Tapuia (no canto inferior esquerdo) e 
as convidativas frutas no cesto, a espiga de milho, a praia e a palmeira em Mulher 
Africana, as pessoas representadas são exóticas, seja por sua nudez, seja pelos artí-
ficios de decoração. Há certamente o esforço de representar, com grande detalha-
mento, um mundo outro, com uma humanidade outra, à qual os holandeses teriam 
então acesso, em razão do sucesso de seu empreendimento exploratório. De forma 
semelhante a Homem Tapuia, o quadro Homem Tupi destaca os elementos exóticos 
da vegetação, em especial a raiz de mandioca aos pés do indivíduo retratado. Ob-
serva-se que, ao contrário de outros povos, os tupis praticavam a agricultura, utili-
zando a mandioca como principal fonte de nutrientes de origem vegetal. O homem 
é mostrado com arco e flechas, representado, portanto, como caçador e guerreiro, 
membro de uma cultura vista pelos europeus como radicalmente diferenteda sua, 
possivelmente como inferior. Entretanto, ao contrário do Homem Tapuia, o Tupi tem 
a nudez parcialmente coberta por calções de algodão e carrega uma faca, elementos 
estes de origem europeia, os quais apontam para um contato já consolidado com 
grupos colonizadores.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 57
4
O Santo Ofício 
 no Brasil colonial
Em um processo iniciado ainda no século VIII, que passou a ser conhecido como 
Reconquista, os principados que eventualmente se consolidariam nos Estados de 
Espanha e Portugal formaram-se por meio da luta pelo restabelecimento da supre-
macia do cristianismo. Os dois reinos ibéricos se formaram, portanto, como marcas 
do poderio de monarcas cristãos sobre territórios tomados dos árabes. Regiões ante-
riormente governadas por emires muçulmanos, onde se garantia relativa liberdade de 
culto para os “povos do livro” (cristãos e judeus), encontravam-se então sob a égide 
de governantes que não davam alternativas a seus súditos, além da incondicional con-
versão ao cristianismo. Espanha e Portugal nascem, assim, como reinos que tem na 
defesa da fé cristã não apenas um apoio espiritual, mas sua própria razão de ser como 
Estados nacionais.
Portugal nasceu e cresceu, portanto, como uma nação católica por excelência, mas 
também possuía uma população considerável de cristãos-novos ou conversos. Assim 
eram denominados os ibéricos muçulmanos e judeus que haviam se convertido ao cris-
tianismo para garantir sua sobrevivência nos regimes absolutistas que se configuravam 
após a Reconquista. Mesmo convertidos, esses cristãos ainda eram alvos de atenção hos-
til e considerados pouco confiáveis, traiçoeiros ou más influências. Alguns, julgava-se, 
convertiam-se apenas para disfarçar um persistente credo judaico, o qual as autoridades 
cristãs temiam que pudesse ser propagado por meio da influência judaizante.
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 58
Em 1449, em Toledo, na Espanha, foram promulgados os Estatutos de Pureza de Sangue, 
que convertiam as práticas de segregação racial e religiosa em políticas de Estado. Nesse 
contexto, passou a ser comum o uso do termo limpeza de sangue, referindo-se à ausência 
de sangue judeu ou muçulmano, o que garantia respeitabilidade, certa medida de nobreza 
e prestígio. Posteriormente, no contexto das colônias, o termo seria empregado também 
para tratar de colonos considerados “livres” de ancestralidade indígena ou africana. Possuir 
“limpeza de sangue” era, assim, um componente fundamental para o status social de um 
indivíduo, numa visão que viria a se perpetuar nas sociedades americanas de influência 
ibérica, por meio de formas socialmente aceitas de racismo.
Além do fator religioso, o status econômico dos conversos contribuía para o clima de 
tensão na sociedade ibérica, posto que eles eram normalmente burgueses de posses, dedica-
dos às manufaturas e ao comércio.
O reino espanhol nascera equipado com uma Inquisição de amplos poderes, mas os 
monarcas portugueses também tinham interesse em possuir ferramenta semelhante e, as-
sim, vieram a requisitá-la. Em 1531, o papa Clemente VII assinou a bula Cum ad nihil magis, 
porém ela teve vigência de apenas um ano, período após o qual o pontífice a revogou, com 
a emissão da Sempiterno Regi, perdoando os cristãos-novos portugueses. A Coroa lusitana 
continuaria a demandar a implementação dos serviços inquisitoriais em seus territórios e, 
em 1536, o novo papa, Paulo III, instituiu uma segunda Cum ad nihil magis, autorizando a 
formação de um Santo Ofício na Corte portuguesa. Portugal, no entanto, considerou inad-
missíveis os termos da bula, exigindo poderes de investigação, condenação e aplicação de 
punições comparáveis aos dos monarcas espanhóis, o que só ocorreria com a emissão da 
bula Meditatio cordis, em 1547.
Desse modo, à medida que o poderio português se espalhava, espalhava-se também a 
Inquisição, firmando raízes nas colônias, onde persistiam as tensões do Velho Mundo. Esses 
conflitos envolviam a questão dos cristãos-novos e o confronto entre os cristãos reformistas 
e a impetuosa Contrarreforma encorajada pela Igreja Católica.
O Santo Ofício português sobreviveria até o início do século XIX, quando cederia às 
pressões de políticos liberais de matriz iluminista, como o Marquês de Pombal. Em 1821, a 
inquisição portuguesa seria abolida por completo pelas Cortes Gerais de Portugal.
4.1 A Contrarreforma, os jesuítas 
e a catequese indígena
Em 1517, Martinho Lutero tornou públicas suas 95 teses contra a Igreja. Tal fato fora 
o estopim para a eclosão de uma onda de movimentos reformistas que varreria a Europa, 
dando início a conflitos que se estenderiam para as colônias. Questionando práticas conside-
radas antiquadas e corruptas no seio da hierarquia católica romana, a Reforma Protestante 
se ramificou e atingiu toda a Europa em pouco tempo. Até mesmo nobres e chefes de Estado 
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
4
59
aderiram ao movimento, muitos dos quais provavelmente buscando meios para se tornarem 
politicamente independentes dos desmandos de uma inflexível classe eclesiástica.
Figura 1 – CRANACH, Lucas. Martinho Lutero. 1543. Óleo sobre painel: 21 x 16 cm. Germanisches 
Nationalmuseum, Nuremberg, Alemanha.
Os pregadores protestantes descreveram um golpe crítico contra a histórica supremacia 
política e espiritual que a Igreja Romana possuía no cenário europeu, acrescendo ainda mais 
inquietude ao caldeirão efervescente da geopolítica do período. A Europa do século XVI 
passava pelo auge do Renascimento e das Grandes Navegações, confrontando-se com a am-
pliação das fronteiras geográficas, culturais e científicas instigadas pela descoberta de novas 
terras e povos e pela emergência do pensamento humanista. Nesse ínterim, os Estados na-
cionais começavam a adquirir contornos mais claros, à medida que a descentralização do 
feudalismo dava lugar à supremacia territorial inquestionável dos monarcas absolutistas 
e dos Estados soberanos. Fatalmente, o estabelecimento dessas novas fronteiras e a conso-
lidação das Coroas gerariam conflitos. Guerras por territórios já travadas entre as potên-
cias absolutistas emergentes, a partir de então alimentadas mais ainda pela tensão religiosa 
oriunda da Reforma, converter-se-iam também em guerras pela fé.
Em 1545, a Contrarreforma se materializou por meio de políticas lançadas no Concílio 
de Trento, convocado pelo papa Paulo III. O propósito da reunião da cúria era claramente 
revitalizar a instituição católica, impondo novas normativas com relação à doutrina e visan-
do, principalmente, atrair os fiéis perdidos de volta para o seio da Igreja. Interrompido e 
retomado diversas vezes, em razão de polêmicas entre os religiosos participantes, o Concílio 
se arrastaria até 1563. Se a princípio havia interesse das autoridades católicas no retorno dos 
protestantes à Igreja, ao final dos debates tridentinos, qualquer desejo pela conciliação com 
as cristandades reformistas havia sido vencido.
À parte questões de doutrina e teologia, as quais conduziriam o pensamento católico 
por séculos a seguir, parece razoável estimar que, ao menos num nível político e social, as 
consequências mais fundamentais das resoluções tridentinas foram:
1. A instituição formal de um tribunal organizado do Santo Ofício, ou a Inquisição 
Romana, à maneira dos que já haviam sido instituídos em outros lugares, como 
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 60
na França e na Espanha, com a finalidade de reforçar a observância dos fiéis à 
doutrina oficial. Garantia-se, assim, que desvios e heresias fossem encontrados e 
devidamente abordados, se necessário pela aplicação de penas severas.
2. O fortalecimento da Companhia de Jesus, uma ordem religiosa fundada em 1534 
por Inácio de Loyola. A meta central do Concílio era prezarpela revitalização da fé, 
o que passava pelas vias da propagação e institucionalização do credo. Destarte, a 
outorga de maior autonomia e recursos às congregações responsáveis por realizar 
trabalhos missionários e educacionais se materializaria principalmente na institui-
ção dos jesuítas.
A Companhia de Jesus, até os dias de hoje uma das congregações católicas com maior 
número de adeptos, estabeleceu-se como uma ordem de interesses principalmente missio-
nários e educacionais. Os jesuítas eram conhecidos por sua impetuosidade, que os levava 
a atuar como uma “milícia” católica, e a monarquia portuguesa logo descobriria que eles 
podiam ser uma poderosa arma para cristianizar e adequar à cultura portuguesa seus ter-
ritórios da Ásia, da África e das Américas. A dedicação e a erudição dos membros da or-
dem os tornava instrumentos eficientes para a colonização. O “Apóstolo do Brasil”, José de 
Anchieta, apontaria que:
Se somos guerreiros, como devemos ser, pois militia est vita homini super terram; 
se somos esforçados, como devemos ser, pois somos cristãos, e cristão não quer 
dizer outra coisa senão homem de Cristo, nosso verdadeiro e valentíssimo capi-
tão, o qual, ungido como o óleo da graça prae consortibus suis, nos ungiu também 
a nós, para sermos valentes e esforçados lutadores e guerreiros contra o Diabo e 
a Carne. (ANCHIETA, 1988 [1568], p. 521-522)
Francisco Xavier, considerado o “Apóstolo do Oriente”, levaria seus esforços missioná-
rios até o Japão, a China e a Índia, e empreendimentos semelhantes seriam dirigidos à con-
versão no Congo e na Etiópia. Nas Américas, haveria investidas da companhia no Canadá e 
em vários pontos da América Espanhola, incluindo América Central, Argentina e Paraguai, 
além de uma forte presença no Brasil.
O primeiro grupo de jesuítas que chegou à América portuguesa veio com o primeiro 
governador-geral, Tomé de Sousa, em 1549. Liderados a princípio pelo padre Manuel da 
Nóbrega e, posteriormente, por José de Anchieta, os adeptos da Companhia de Jesus deve-
riam empreender a cristianização dos povos nativos do Brasil.
As populações indígenas representavam uma série de problemas para os portugue-
ses. Além da inadequação desses grupos às demandas de produtividade e, consequente-
mente, aos interesses econômicos da administração colonial, tribos beligerantes poderiam 
antagonizar os colonos ou se aliarem a europeus de outras nacionalidades, ameaçando a 
supremacia lusitana no território. Havia, ainda, a preocupação religiosa: a vasta população 
nativa pagã representava uma derrota para a cristandade, almas incontáveis condenadas à 
“danação eterna” por não terem sido apresentadas ao credo de Cristo.
Em Tratado da terra do Brasil, Pero de Magalhães Gandavo, um dos cronistas mais rele-
vantes do Brasil recém-descoberto, comentaria sobre os nativos dessas terras:
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
4
61
A língua deste gentio toda pela costa é, uma: carece de três letras – scilicet, não 
se acha nela F, nem L, nem R, cousa digna de espanto, porque assim não têm 
Fé, nem Lei, nem Rei; e desta maneira vivem sem Justiça e desordenadamente. 
(GANDAVO, 1980 [1576], p. 52)
Gandavo, evidentemente, utilizara de hipérbole para ressaltar o abismo cultural que se-
parava índios e portugueses. A falta de institucionalidade, de um sistema religioso e um sis-
tema de governo organizados, era um vício nativo, que precisava ser sanado de algum modo.
Os jesuítas se provariam instrumentais para reverter essas situações. José de Anchieta 
faria esforços significativos para sistematizar a fala tupi da costa brasileira em uma língua 
com gramática própria, adaptando conceitos cristãos conforme palavras preexistentes, mas 
agregando a elas novos sentidos. O termo Tupã, por exemplo, usado tradicionalmente para de-
signar uma entidade ou abstração relativa ao poder elementar do trovão, passaria a designar 
Deus, no sentido judaico-cristão, assim como Anhangá, termo associado a uma entidade ator-
mentadora, que residia em florestas e ermos, seria escolhido por Anchieta para se referir ao 
Diabo cristão. Com essas novas associações, era possível para os jesuítas traduzir e/ou adaptar 
fórmulas, orações e ritos inteiros para os povos falantes de línguas tupis, além de abrir cami-
nho para a criação de textos originais, como cantos, sermões e peças de cunho catequético.
O conhecimento da língua se revelaria fundamental e uma chave de poder em muitas 
ocasiões, dando aos jesuítas acesso às comunidades locais e influência entre suas lideranças. 
Em 1555, tribos de toda a costa da atual região Sudeste se uniram na Confederação dos 
Tamoios. A confederação, por sua vez, aliou-se aos colonos da França Antártica contra os 
portugueses e seus aliados tupiniquins. Anchieta, hábil linguista e conhecedor das línguas 
tupi, mediou as negociações entre as tribos beligerantes, ajudando a sedimentar uma trégua 
entre tamoios, tupiniquins e portugueses.
Contudo, afora seus méritos políticos e linguísticos, o empreendimento mais célebre dos 
jesuítas no território brasileiro seriam as missões ou reduções jesuíticas. Uma redução era um 
espaço delimitado para acolher indígenas, os quais deveriam ser convertidos à fé católica e 
educados para um modelo europeu de trabalho. Os jovens, em particular, deveriam aprender 
a língua e os costumes europeus, ritos e cânticos religiosos católicos, bem como formas utilitá-
rias de artesanato, tais como a carpintaria, a metalurgia e a construção com alvenaria. Pintura 
e teatro também faziam parte do aprendizado, pois se esperava formatar essa cristandade 
do Novo Mundo segundo os mesmos parâmetros culturais daquela que se encontrava na 
Europa, então passando por uma vívida fase de efervescência cultural e artística.
A princípio, os indígenas aldeados nas reduções encontravam-se protegidos pela auto-
ridade dos jesuítas, ao contrário dos “bravios” ou “selvagens”, que resistiam à conversão e 
ao modo de vida dos colonos, suscetíveis à perseguição legal pelos bandeirantes que cru-
zavam o interior em busca de mão de obra escrava. Todavia, por concentrarem populações 
inteiras, devidamente pacificadas pela catequese e, consequentemente, menos beligerantes, 
as missões ofereciam alvos fáceis para as incursões dos bandeirantes.
Essas incursões pressionaram as reduções a se deslocarem para o sul. Em Portugal, 
entre os séculos XVII e XVIII, as relações entre a Coroa e Companhia de Jesus também 
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 62
começaram a se deteriorar, de modo que os jesuítas encontravam dificuldade para defen-
der seus territórios. A Guerra Guaranítica, travada entre 1750 e 1756, marcou uma última 
grande resistência dos índios reduzidos, liderados por Sepé Tiaraju, contra as forças portu-
guesas. O conflito foi marcado por idas e vindas, com os habitantes sendo impelidos de um 
território a outro, dependendo do período.
O século XVIII trouxe ainda um novo fator para o confronto: Portugal, cada vez mais 
distante da monarquia cristianíssima fruto da Reconquista, que encontrava sua razão de ser 
na defesa e ampliação da fé católica, tornava-se progressivamente mais inclinado aos princí-
pios liberais do Iluminismo e à busca da razão. O impulso jesuítico pela propagação de uma 
fé tridentina e militante era visto, cada vez mais, como algo estranho e anacrônico aos olhos 
de políticos portugueses de renome, como o Marques de Pombal.
Em 1759, Portugal expulsou em definitivo os jesuítas de seus territórios; em 1767, a 
Espanha fez o mesmo. Na década seguinte, a empresa jesuítica nas Américas foi desmante-
lada por completo, embora projetos semelhantes de aldeamento, conversão e doutrinação 
de indígenas tenham sobrevivido1.
4.2 A inquisição e os cristãos-novos 
 na sociedade colonial
Figura 2 – GOYA, Francisco. Auto-da-fé ou Tribunal do Santo Ofício. 1812-1819. Óleo sobre madei-
ra: 46 x 73 cm. Real Academia de BelasArtes de San Fernando, Madri, Espanha.
Assim, uma das motivações para o surgimento e florescimento dos tribunais inquisi-
toriais em território europeu era justamente a supressão dos cristãos-novos, os quais eram 
1 Sobre os temas da influência jesuítica no território brasileiro e as relações da religião dominante com 
os povos indígenas locais, ver: MOISÉS, Beatriz Perrone. História dos índios no Brasil. São Paulo: 
Companhia das Letras, 1992; VAINFAS, Ronaldo. Traição: um jesuíta a serviço do Brasil holandês pro-
cessado pela Inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 2008; e A heresia dos índios: catolicismo e 
rebeldia no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
4
63
questionados acerca da sinceridade de sua fé, sempre posta em dúvida. Mais ainda: havia 
sempre a suspeita de que os convertidos não apenas preservavam o credo judaico, mas 
que trabalhavam para propagá-lo, minando a autoridade suprema da Igreja sobre as almas 
portuguesas.
Conforme descrito na introdução do capítulo, a Inquisição portuguesa conseguiu, após 
sucessivas tentativas, estabelecer-se com grande força e influência. Todavia, a atuação do 
Santo Ofício nunca pôde desempenhar suas atividades nas colônias conforme os mesmos 
procedimentos da Metrópole. Em parte, isso pode ter ocorrido pelos custos envolvidos no 
estabelecimento de Cortes Inquisitoriais devidamente equipadas; é possível, também, que 
os monarcas lusos buscassem centralizar o poder da Inquisição, tal como centralizavam ou-
tros dispositivos da autoridade monárquica, a fim de garantir a efetividade e o alcance de 
seu poder. Tentativas de estabelecer tribunais do Santo Ofício na Colônia em 1622 e 1649 
seriam, inclusive, malogradas justamente pelo temor de que a iniciativa pudesse gerar uma 
divisão de poder dentro da instituição.
Em 1591, deu-se a Primeira Visitação do Santo Ofício ao Brasil. A comitiva era encabeça-
da por um visitador licenciado, Heitor Furtado de Mendonça, que passou pelas capitanias 
da Bahia e de Pernambuco. Essas capitanias eram visadas por serem especialmente próspe-
ras, apresentando um histórico de estreitas relações entre cristãos-novos e os pilares mais 
tradicionais da rica economia açucareira. Havia inclusive casamentos entre cristãos-velhos e 
cristãos novos, e mesmo a manutenção de ritos judaicos, em algumas regiões.
A função de Mendonça era reunir confissões e delações referentes a heresias diversas, 
mas apenas as mais graves práticas judaizantes e a feitiçaria deveriam ser encaminhadas à 
Corte de Lisboa. O visitador tinha ainda autoridade para julgar casos menores como blasfêmia 
ou bigamia, embora não tivesse competência para organizar autos de fé, eventos nos quais os 
hereges eram apresentados e punidos diante do povo. Mesmo assim, é possível que, com ou 
sem a anuência de autoridades habilitadas, tenham sido promovidos autos de fé na Colônia.
O século XVII teve novas visitações, à medida que se fortalecia uma rede de agentes 
laicos, assim como os bispos, que buscavam suspeitos nas congregações locais, denuncian-
do-os para as autoridades. Alguns desses suspeitos seriam condenados à “pena do fogo”. 
No todo, tal como na metrópole portuguesa, os principais alvos dos inquisidores não seriam 
os alquimistas ou feiticeiros, mas os cristãos-novos, sob as mais diversas suspeitas. Parece 
razoável supor que, para além do componente religioso, havia um interesse da aristocracia 
dominante em usar o Santo Ofício como ferramenta para regular a burguesia ascendente.
4.3 Sincretismo e negociações 
religiosas no Brasil Colônia
A distância geográfica entre a Colônia e a Metrópole gerou os diversos problemas es-
truturais enfrentados pelos lusitanos em impor sua autoridade sobre o território que busca-
vam consolidar nas Américas. Nos tempos coloniais, essa autoridade era exercida pela hierar-
quia de duas instituições: o Estado monárquico e a cúria eclesiástica. Tal como a monarquia 
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 64
encontrava dificuldades em firmar suas estruturas em solo brasileiro, o mesmo ocorria com 
a Igreja.
O catolicismo tridentino certamente teria dificuldades para se estabelecer, especialmen-
te diante da impossibilidade de fundar uma Corte do Santo Ofício e da dependência das 
ocasionais visitações. Espalhou-se, contudo, um catolicismo popular, especialmente no que 
tocava à veneração dos santos e à incorporação de rituais e orações às práticas do dia a dia.
Além disso, a América portuguesa não era habitada apenas por católicos lusitanos, mas 
também por outros grupos étnicos europeus e cristãos-novos, além de ameríndios e escra-
vos oriundos da África, e todos esses grupos infundiram várias de suas tradições a uma rede 
complexa de religiosidades populares que ganhou força no imaginário nacional.
Uma simplificação grosseira comumente assimilada ao discurso das religiosidades 
sincréticas brasileiras é a de que elas se limitam à mistura do catolicismo oficial a compo-
nentes das religiosidades africanas trazidas ao Brasil pelos escravos, como uma forma de 
resistência destes à dominação ou um modo consciente de disfarçar seus ritos tradicio-
nais, travestindo-os sob uma máscara catolicizada.
Essa visão, no entanto, desconsidera um quadro mais complexo. Os escravos trazidos ao 
Brasil eram provenientes de várias partes do continente africano e tinham suas próprias tra-
dições, muitas vezes consideravelmente divergentes entre si. Há de se considerar, ainda, que 
o elemento indígena também foi assimilado2 em níveis variáveis, conforme a época e a região.
Por fim, é fundamental não perder de vista que esses ritos foram, também em dife-
rentes escalas, de acordo com a época e o local, incorporados pelos brancos da Colônia. O 
consumo de garrafadas e a participação em rodas de batuques, por exemplo, não foram em 
todos os momentos, nem em todas as partes, práticas exclusivas das classes subalternas do 
Brasil colonial.
Figura 3 – DEBRET, Jean-Baptiste. Diferentes nações negras. ca. 1830. Gravura, color. New York 
Public Library – Digital Gallery, Nova Iorque, EUA.
Do mesmo modo, danças, fórmulas, orações, amuletos, defumações e simpatias, para 
boa parte da população, não seriam mutuamente exclusivos com o catolicismo oficial das 
2 No horizonte das ciências sociais, assimilação é o processo de interações sociais entre um grupo do-
minante e um minoritário, sendo o grupo minoritário aceito à medida que admite valores e práticas 
do dominante (GIDDENS, 2005, p. 562).
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
4
65
missas e da extrema-unção. Esses elementos se tornariam componentes fundamentais da 
“religiosidade folclórica” brasileira, a qual nunca foi integralmente suprimida, preservan-
do-se em uma relação de tensões e alianças com a fé institucionalizada3. 
 Ampliando seus conhecimentos
3 Sobre as relações de sincretismo e tensão entre diferentes panoramas religiosos na Colônia, ver: 
VAINFAS, Ronaldo; SOUZA, Juliana Beatriz de. Brasil de todos os santos. Rio de Janeiro: J. Zahar, 
2000; OLIVEIRA, Anderson José Machado de. Devoção negra: santos pretos e catequeses no Brasil 
Colonial. Rio de Janeiro: Quartet/Faperj, 2008; e SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a terra de Santa 
Cruz: feitiçaria e religiosidade popular no Brasil Colônia. São Paulo: Companhia das Letras, 1986.
Primeira Visitação do Santo Ofício às 
partes do Brasil pelo licenciado Heitor 
Furtado de Mendonça4 
(ABREU, 1922 [1591-92], p. 1-5)
Ao desvairado e quasi deserto territorio brasílico chegavam estas noticias 
vagas e incompletas.
Em Lisboa a 13 de Setembro de 1543 Joáo Barbosa Paes denunciou Pero 
do Campo Tourinho, donatário de Porto Seguro, por se dizer papa e rei e 
fazer trabalhar aos domingos.
Em 24 de Novembro de 1546, quando o tribunal estava suspenso por 
Paulo III, clérigos e secularescapturaram Tourinho, arvoraram-se em jui-
zes e preso a ferros, remetteram o potentado para além-mar, onde em 
1550 ainda respondia a interrogatorio.
[...]
Pouco preoccupavam-se com o Santo Officio os mamalucos de Santo 
André da borda do campo, a julgar por uma carta de José de Anchieta, 
escrita da capitania de S. Vicente em 1554. Um delles, tendo usado de cer-
tas praticas gentílicas, sendo advertido duas vezes se acautelasse com &. 
Santa Inquisição, respondeu: acabaremos as inquisições a frexas.
Ao nome de Anchieta tem andado injustamente ligado o de Joáo Cointa, 
senhor de Boulés, fidalgo francez vindo ao Rio de Janeiro em 1557 com os 
huguenotes trazidos por Bois-le-Comte. Nas lutas theológicas que agitaram 
a colonia decidiu-se por Villegaignon e pelo catholicismo; desertou mais 
tarde para S. Vicente e nessa villa, em Santos, na Bahia, em Pernambuco 
4 O licenciado Heitor Furtado de Mendonça era deputado do Santo Ofício e foi nomeado visitador das 
colônias pelas autoridades eclesiásticas portuguesas, tendo chegado à Bahia em 9 de junho de 1591.
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 66
andou soltando palavras impias e semeando doutrinas heterodoxas. Entrou 
na expedição contra os francezes partida da Bahia em 1560, gaba-se de ter 
facilitado a tomada do inexpugnavel forte Coligny. [...]
José de Anchieta e Fernão Cardim mencionam, sem lhe declarar o nome, 
um varão mágico ou nigromatico, de acção preponderante nas guerras de 
Duarte Coelho II contra os indigenas da Nova Lusitania. Chama-o o padre 
do Ouro a história do Brasil de frei Vicente do Salvador, que narra seus 
feitos como os memorava a tradição pernambucana meio século depois. O 
processo, publicado pelo erudito Pedro de Azevedo no Archivo Histórico 
Portuguez, desvenda o mysterio: as denominações vagas identificam o 
aventureiro com Antonio de Gouvéa, ilheu da Terceira, clerigo de missa, 
pertencente algum tempo á Companhia, viajado por diversos paizes 
europeus, alchimico e outras cousas mais que o levaram pela primeira 
vez ao pretorio inquisitorial. Degredado para o Brasil, obteve do hispo 
a reintegração nas ordens sacias, firmou-se na sympathia de Duarte de 
Albuquerque Coelho e operou livremente em Pernambuco.
Suas façanhas chegaram ao velho mundo: accusavam-no de dizer missa 
com paramentos heréticos em sitios vedados pelo concilio tridentino, de 
matar ou ferrar na cara indios tomados em combate, de arrancar as cunhãs 
a seus donos ou amantes, de desafiar para duelos, de difamar os jesuítas 
attribuindo-lhes pensamentos suspeilos, doutrinas heréticas, etc. [...]
Em 1573 foi queimado um francez herético na Bahia. As circumstancias 
não vieram a nosso conhecimento. Estava nas attribuições episcopaes 
velar pela pureza da fé, dar combate ás heresias, castigar os herejes. 
Quando as heresias medievaes appareceram sob as formas mais diversas, 
reclamando especialistas theologos para as desmascararem, e surgiram 
nos pontos mais afastados, exigindo unidade de acção para debellalas, a 
autoridade episcopal foi diminuindo, embora não desaparecesse de todo 
diante da autoridade dos inquisidores.
A pena de fogo reservada primeiro a nigromantes e aos manicheus, tor-
nou-se de praxe depois das constituições do imperador Frederico II, a que 
a igreja se conformou. [...]
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
4
67
 Atividades
1. Observe o excerto do texto complementar e discorra sobre quais práticas Heitor Fur-
tado de Mendonça caracteriza como crimes e o modo como defende que eles devem 
ser abordados em termos punitivos.
2. Tendo empreendido diversas viagens, o naturalista prussiano Alexander Von Hum-
boldt afirmou em seus escritos, em 1807, que não possuir em sua genealogia judeus 
ou árabes garantia ao homem certo estatuto de nobreza. Comparativamente, ob-
servou Humboldt, nas Américas, a cor da pele (mais ou menos branca) indicava a 
posição social do indivíduo. Essas práticas discriminatórias têm longínquas raízes 
históricas na formação dos reinos ibéricos e na colonização do Novo Mundo. Como 
isso se relaciona ao que foi estudado neste capítulo?
3. Leia o trecho a seguir:
Se abraçarmos alguns costumes deste gentio, os quais não são contra nossa fé ca-
tólica, nem são ritos dedicados a ídolos, como é cantar cantigas de Nosso Senhor 
em sua língua […] e isto para os atrair a deixarem os outros costumes essenciais 
[…]. (NÓBREGA, [1552] apud MONTEIRO, 2004, p. 36)
 Com base no que foi abordado ao longo do capítulo e no texto complementar, o que 
a passagem escrita por Manuel da Nóbrega tem a dizer a respeito do modo como 
os religiosos recém-chegados ao território brasileiro viam a terra, seu povo e suas 
crenças nativas?
 Referências 
ABREU, João Capistrano de. Primeira Visitação do Santo Ofício às partes do Brasil pelo licenciado 
Heitor Furtado de Mendonça. São Paulo: Paulo Prado, 1922 [1591-92].
ANCHIETA, José de. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões. Belo Horizonte: Itatiaia; 
São Paulo: Edusp,1988 [1568].
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009 [1583-1601].
CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: J. Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
2001 [ca. 1790-ca.1840].
GANDAVO, Pero Magalhães. Tratado da terra do Brasil: história da Província de Santa Cruz. Belo 
Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980 [1576].
GIDDENS, Anthony. Sociologia. Porto Alegre: Artmed, 2005.
O santo ofício no Brasil colonial4
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 68
MONTEIRO, John. Dos Campos de Piratininga ao Morro da Saudade: a presença indígena na história 
de São Paulo. In: PORTA, Paulo (Org.). História da cidade de São Paulo: a cidade colonial. São Paulo: 
Paz e Terra, 2004.
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
 Resolução 
1. Entre as práticas condenadas no texto de Mendonça, encontram-se:
• a blasfêmia do donatário de Porto Seguro, que se autoproclama “rei e papa”, 
aparentemente exigindo trabalho aos domingos (o que é ilícito no catolicismo 
tradicional);
• a resistência dos “mamelucos de Santo André”, que se apegavam a suas práticas 
“gentílicas”, ameaçando receber os inquisitores “a frexas”;
• a possível persistência no protestantismo de um huguenote francês.
• as constantes blasfêmias, inclusive contra membros da Companhia de Jesus, 
e práticas “alchimicas” de um ex-padre atuando como “varão mágico” ou 
“nigromático”.
 Não restam dúvidas ao autor de que as medidas contra as práticas mencionadas 
devem ser tratadas com severidade, incluindo levar os acusados “a ferros” ou sujei-
tá-los à “pena do fogo”, a fim de expressar o poder da Inquisição de forma exemplar 
para a população colonial.
2. Tendo sido previamente governada por soberanos árabes, a Península Ibérica co-
nheceu um período de convivência estável entre adeptos do cristianismo, do islã e 
do judaísmo. A reconquista dos territórios por monarcas cristãos marcou a transi-
ção desse estado de convivência para um regime no qual a religião dos governan-
tes, a católica, deveria ser observada por todos os seus súditos. Surgiam, assim, os 
cristãos-novos. Esses convertidos de outras fés eram vistos com desconfiança, por 
não pertencerem a uma tradição, e também podiam ser alvos de preconceito, tendo 
em vista sua condição de comerciantes relativamente prósperos.
 Uma consequência desse estado de coisas era a preocupação com a “pureza de san-
gue” de um indivíduo, a qual era consideradamaculada pela presença de antepas-
sados não-cristãos. Nas Américas, essa visão veio a ser perpetuada, frequentemente 
relegando indivíduos não-brancos a postos subalternos na sociedade.
3. Manuel da Nóbrega defende a utilização do que poderiam ser “pontos em comum” 
entre a visão de mundo dos povos nativos e o credo cristão, ou partes “inofensivas” 
do modo de vida indígena, a fim de atrair essas populações para a cristandade de 
forma mais tranquila e eficiente.
O santo ofício no Brasil colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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69
 Essa visão revela um pouco da tarefa da qual se investiram os jesuítas em sua em-
presa brasileira, vendo-se como missionários que trariam a “luz de Cristo” para os 
pagãos do Novo Mundo, mas que deveriam desenvolver essa transição de uma for-
ma que fosse compreensível e atraente para os convertidos.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 71
5
A manufatura do açúcar
O açúcar foi o produto de importação brasileiro por excelência ao longo do período 
colonial. Com efeito, a cana-de-açúcar dominaria sozinha todo um ciclo de nossa his-
tória. Produzido em larga escala, a partir de uma estrutura composta por unidades 
manufatureiras conhecidas como engenhos e latifúndios monocultores, operados por 
meio do sistema conhecido atualmente como plantation, o açúcar não modelaria apenas 
a economia da Colônia, mas também seu panorama social e cultural, especialmente na 
região Nordeste, onde o ciclo produtivo se revelou mais forte e lucrativo.
Se os primeiros passos para a formação de uma economia colonial no Brasil se 
materializaram apenas na extração de pau-brasil por mão de obra indígena, a grande 
marca do estágio de ocupação das terras por colonos portugueses seria o estabeleci-
mento de uma infraestrutura açucareira.
O ciclo da cana-de-açúcar teve início com a fundação das capitanias hereditárias. 
Apesar das dificuldades administrativas referentes à manutenção das capitanias, o 
cultivo se revelaria bem-sucedido nas de Pernambuco, São Vicente e Bahia. O cultivo 
da cana sacarina produzia retorno rápido e certo, nas condições tropicais do território, 
e a proximidade das plantations à costa garantia o escoamento ágil do produto para os 
portos europeus.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 72
O sucesso da empresa canavieira seria tanto que criaria uma opulenta elite local e atrai-
ria o interesse de piratas e dos holandeses, que fariam grandes esforços para se estabelecer 
no Nordeste brasileiro. Esse cultivo impulsionaria outro grande negócio português: o co-
mércio de escravos vindos da África. Exigindo grandes contingentes de trabalhadores, as 
plantations causariam um impacto indelével na sociedade local e criariam um panorama 
étnico e cultural, originando uma mentalidade escravocrata que permaneceria dominante 
por séculos.
Figura 1 – VAN SCHAGEN. Mapa da África. 1689. Gravura, color. Amsterdam, Holanda.
5.1 Aspectos da economia açucareira colonial
Durante as Cruzadas, os europeus travaram contato com caravanas mercantes da África 
e do Oriente Médio e conheceram o açúcar. O acesso ao produto, trazido da Ásia, era seve-
ramente limitado na Europa, de modo que se constituía em iguaria consumida apenas pelas 
elites. Primeiro foi instituído seu consumo como um produto de propriedades estritamente 
medicinais, vendido por boticários; depois, passou a ser utilizado como especiaria de luxo 
suplementar ao mel, então o único adoçante disponível. Tratava-se de um bem valioso, que 
se tornaria um dos motores de impulsão das economias coloniais com a emergência da era 
das Grandes Navegações.
Em 1415, durante o reinado de João I de Aviz, os portugueses tomaram Ceuta, situada 
na costa do Marrocos e separada da Península Ibérica pelo Estreito de Gibraltar, na Batalha 
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
5
73
de Ceuta. A tomada desse território fora um evento fundamental na ampliação dos horizon-
tes geográficos portugueses, abrindo caminho para uma política cada vez mais agressiva de 
exploração de terras que pudessem ser agregadas ao domínio lusitano, gerando riquezas.
Demonstrando interesse nas possíveis riquezas ocultas além das fronteiras europeias, o 
infante Dom Henrique, filho do rei João, revelar-se-ia uma peça fundamental para a consoli-
dação das políticas coloniais lusas. Dom Henrique deu suporte para uma série de incursões 
exploratórias na África e no Atlântico, com destaque para a colonização dos arquipélagos de 
Açores e da Madeira.
Os territórios eram confiados a membros da casa real de Aviz, que por sua vez outorga-
vam o trato das terras a outros indivíduos, de status menor, responsáveis por sua exploração 
de facto. Os interessados em ocupar essas novas fronteiras portuguesas deveriam garantir 
a produtividade das terras, e a cana-de-açúcar foi um produto crucial para o êxito dos co-
lonos. Assim, quando o Brasil se tornou uma posse lusitana, a metrópole ibérica já contava 
com um rentável experimento envolvendo o cultivo de cana no Atlântico.
À medida que surgia o interesse em ocupar o Brasil para defendê-lo de interesses ini-
migos, apresentava-se a possibilidade de converter o novo território em um lucrativo polo 
agrícola. Tal como ocorreu em outras regiões do Novo Mundo onde o clima mostrava-se 
favorável, o Brasil se revelaria solo adequado para o empreendimento de plantation. Esse 
modelo se desdobraria com sucesso, como aponta o historiador Caio Prado Júnior, também 
no sul das colônias britânicas (que viriam a originar os Estados Unidos da América), bem 
como na América Central:
Nas ilhas de Barbados passou-se qualquer coisa de semelhante. A primeira or-
ganização que se estabeleceu aí foi de propriedades regularmente subdivididas, 
e não se empregou o trabalho escravo em escala apreciável. Mas pouco depois, 
introduzia-se na ilha a cultura eminentemente tropical da cana-de-açúcar: as 
propriedades se congregam, transformando-se em imensas plantações; e os es-
cravos, em número de pouco mais de 6.000, em 1643, sobem, 23 anos depois, 
para mais de 50.000. (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 20)
Observa-se, nesses casos de “agricultura tropical”, a convergência de três características. 
Em primeiro lugar, ela fora pensada para a exportação, ou seja, busca suprir um mercado 
estrangeiro, no caso específico do Brasil, a metrópole portuguesa. Para tal, esse modelo preci-
sava buscar uma escala de produtividade monstruosa, envolvendo latifúndios monocultores, 
dedicados primordialmente ao produto de exportação e contingentes expressivos de mão de 
obra para o trabalho nessas terras. O método de trabalho feudal, baseado na servidão por 
contrato, não podia ser aplicado, dada a ausência de colonizadores europeus em grande quan-
tidade, de modo que seria rapidamente instituído um modelo de trabalho escravo.
Esse trinômio (monocultura-exportação-escravidão) dominaria a economia agrícola 
brasileira e teria um impacto inolvidável na estruturação da sociedade colonial, nas relações 
entre os grupos sociais que a compunham, e em aspectos da vida religiosa e artística da 
Colônia e do país que eventualmente se formaria a partir disso.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 74
Mas seja com escravos africanos, escravos ou semi-escravos indígenas, a or-
ganização das grandes propriedades açucareiras da colônia foi sempre, desde 
o início, mais ou menos a mesma. É ela a da grande unidade produtora que 
reúne num mesmo conjunto de trabalho produtivo, um número mais ou menos 
avultado de indivíduos sob a direção imediata do proprietário ou seu feitor. É 
a exploração em larga escala, que conjugando áreas extensas e numerosos tra-
balhadores, constitui-se como uma única organização coletiva do trabalho e da 
produção. Opõe-se assim à pequena exploração parcelaria realizada diretamente 
por proprietários ou arrendatários. (PRADO JÚNIOR,1970, p. 23)
Para além do uso da terra, o caractere dominante no cenário colonial seria o engenho. 
A princípio, o termo, cuja origem latina, ingeniu, designa “criação”, “invento” ou “intelecto 
criador”, trataria apenas da máquina rústica empregada no estágio inicial do processamento 
da cana: a moagem. Com o passar do tempo, todavia, engenho passaria a designar também o 
conjunto de instalações da propriedade açucareira (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 23).
O canavial ocupava boa parte do conjunto do engenho, assim como uma porção de ter-
reno designada às culturas de subsistência e um bosque ou reserva florestal, mantido com o 
propósito de suprir as residências e os equipamentos com a madeira necessária. Além disso, 
a grande propriedade tinha também um curral, para abrigar os animais.
O engenho em si era composto pela moenda, um aparelho rudimentar para moer a cana 
e extrair a garapa, que seria a base de produtos como o açúcar, o melaço e a aguardente. O 
aparelho era movido por bois, escravos ou pela força da água. Mas o engenho não represen-
tava apenas as instalações destinadas às atividades produtivas; estavam nele circunscritos 
também a casa-grande, onde residia o senhor de engenho, a senzala, onde viviam os es-
cravos, as casas dos trabalhadores livres, principalmente os trabalhadores especializados, 
como ferreiros e capatazes, assim como a capela, considerada fundamental, onde seriam 
realizadas missas e outros ritos católicos.
Até o fim do século XVII, o material predominante na arquitetura colonial era o pau-
-a-pique ou taipa, estrutura de madeira e palha reforçada com paredes de barro, especial-
mente grossas no caso das grandes construções dos engenhos. Alvenaria era algo presente 
apenas nas propriedades mais prósperas, dado o nível de especialização necessário para a 
moldagem de tijolos e o corte de pedras. Telhas eram frequentemente produzidas em uma 
instalação especializada do engenho, a olaria, mas muitos edifícios coloniais mais simples 
apresentariam tetos cobertos com palha.
Certamente esse não seria o leiaute de todos os engenhos, posto que nem todos os se-
nhores possuíam condições financeiras para equipar suas propriedades com as provisões 
citadas, ficando dependentes de senhores mais ricos, por exemplo, para fazer uso de suas 
moendas. Entretanto, posto que a cana-de-açúcar era uma cultura de exportação, produzida 
em larga escala, as condições econômicas acabaram por encorajar o domínio das proprieda-
des maiores e mais prósperas, onde o senhor se convertia numa autoridade centralizadora, 
da qual dependia a população que vivia no entorno da casa-grande.
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
5
75
Esse arranjo pautou relações sociais e culturais por séculos, gerando termos, costumes 
e modelos de clientelismo econômico e político que teriam repercussão duradoura no ima-
ginário brasileiro.
5.2 Sociedade e cultura do açúcar
A sociedade que emergiu do ciclo açucareiro marcaria profundamente o Brasil, em par-
ticular a região Nordeste, onde a presença dos engenhos foi mais forte. Era uma sociedade 
patriarcal e marcadamente estratificada, o que repercutia na arquitetura do engenho, bem 
como na alimentação, nas indumentárias e nas formas de entretenimento de seus habitantes.
Figura 2 – DEBRET, Jean-Baptiste. Um jantar brasileiro. 1827. Aquarela sobre papel, 15,9 x 21,9 cm. 
Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo.
Os senhores de engenho constituíam um tipo de aristocracia semelhante à da Europa 
feudal em alguns pontos, derivando da posse de terras e bens seus poderes políticos e in-
fluência e detendo grande poder sobre seus filhos e agregados. Escravos, cujo trabalho pe-
sado era fundamental para a economia do período, eram tratados como bens, negociados, 
mantidos em condições de miséria e torturados quando não atingiam a produtividade 
esperada ou se mostravam rebeldes.
A estratificação da sociedade do açúcar, em linhas gerais, era estabelecida com os se-
guintes grupos determinantes:
1. Senhores de engenho – proprietários de grandes unidades agrárias e detentores dos 
meios para produzir o valioso produto de exportação, eles estavam no centro da so-
ciedade açucareira. O senhor residia com sua família na casa-grande, marca do luxo 
e da suntuosidade que vinham do açúcar, mas também da influência e do poder 
local que poderiam exercer sobre suas famílias, localidades e autoridades políticas.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 76
2. Homens livres – havia muitos homens livres na Colônia que não eram senhores. 
Sua condição podia variar imensamente, desde funcionários públicos e comercian-
tes, os quais podiam possuir considerável riqueza, passando por trabalhadores 
especializados de tipos diversos, indispensáveis para a manutenção da vida no 
campo e na cidade, até proprietários rurais menores, dependentes dos senhores.
Prado Júnior comenta sobre a organização desse modelo de estratificação da sociedade:
O seu elemento central é o engenho, isto é, a fábrica propriamente, onde se reúnem 
as instalações para a manipulação da cana e o preparo do açúcar. O nome de “en-
genho” estendeu-se depois da fábrica para o conjunto da propriedade com suas 
terras e culturas: “engenho” e “propriedade canavieira” se tornaram sinônimos. 
Embora o proprietário explore, em regra, diretamente suas terras [...], há casos 
frequentes em que cede partes delas a lavradores que se ocupam com a cultura e 
produzem a cana por conta própria, obrigando-se contudo a moerem sua produ-
ção no engenho do proprietário. São as chamadas fazendas obrigadas; o lavrador 
recebe metade do açúcar extraído da sua cana, e ainda paga pelo aluguel das ter-
ras que utiliza urna certa porcentagem, variável segundo o tempo e os lugares, e 
que vai de 5 a 20%. Há também os lavradores livres, proprietários das terras que 
ocupam, e que fazem moer a sua cana no engenho que entendem; recebem então a 
meação integral. Os lavradores, embora estejam socialmente abaixo dos senhores 
de engenho, não são pequenos produtores, da categoria de camponeses. Trata-se 
de senhores de escravos, e suas lavouras, sejam em terras próprias ou arrendadas, 
formam como os engenhos grandes unidades. (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 23)
Ou seja, muitos proprietários rurais não eram propriamente “senhores de engenho”, 
embora fossem “senhores de escravos”, que gerenciavam agronegócios de grandes propor-
ções, capazes de gerar considerável riqueza, mas não tão bem equipados. Por causa de sua 
posição menos privilegiada, tornavam-se dependentes dos grandes senhores, estabelecendo 
relações de clientelismo1 com estes.
3. Escravos – os escravos constituíam a espinha dorsal da economia açucareira. 
Realizando praticamente todo o tipo de trabalho intenso, desde o cultivo da cana-
-de-açúcar, passando pelo processamento da matéria-prima em produtos refinados, 
até o transporte e armazenagem. Ademais, muitos escravos exerciam outras atri-
buições, como a venda de alimentos e água nas cidades ou a prestação de serviços, 
principalmente barbearia, entregando os ganhos diários a seus senhores.
Não obstante sua importância crucial para todos os setores da economia colonial, o mo-
delo de trabalho nas plantations de cana-de-açúcar era invariavelmente caracterizado pelo 
tratamento brutal dispensado aos escravos. Recebendo apenas parcas vestimentas, muitas 
vezes reduzidas a trapos, e uma alimentação básica e em quantidades pequenas, os escra-
vos eram abrigados em condições de confinamento no espaço da senzala. Esses indivíduos 
precisavam trabalhar continuamente sob a ameaça de punições severas e recebiam castigos 
1 O clientelismo é uma prática que consiste na troca de favores entre duas partes assimétricas, a parte 
mais poderosa geralmente favorecendo a outra com benefícios materiais – moradia, alimentação, su-
porte financeiro –, em troca de apoio político.
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações5
77
físicos sempre que não se mostrassem produtivos o bastante ou agissem de forma insub-
missa. O trabalho no engenho, além dessas condições esquálidas, podia ser particularmente 
perigoso, já que acidentes no rudimentar aparelho da moenda eram comuns.
De um ponto de vista mais pragmático, a sociedade açucareira se desenvolveu como 
um vasto organismo produtivo que dominou o cenário rural da Colônia. Sua função era ge-
rar riqueza para a Metrópole, por meio da produção de açúcar e outros derivados da cana, 
mas seus efeitos foram mais complexos e mais duradouros. A desigualdade social resultante 
de um sistema que dava amplos poderes políticos e prestígio social aos proprietários rurais 
desenvolveria uma dependência sistêmica dos escravos e homens livres subalternos para 
com os senhores de engenho, originando uma cultura política baseada no clientelismo, na 
troca de favores e na intimidação. A tradição de uma economia fundada na grande proprie-
dade e no uso de mão de obra escrava concederia um aspecto de “naturalidade” à condi-
ção exploratória das atividades econômicas coloniais, estimulando uma atitude negligente, 
quando não francamente cruel, com a senzala e os setores mais pobres da população livre.
5.3 Declínio do ciclo açucareiro
O primeiro golpe contra a economia açucareira colonial veio de uma nação inimiga de 
Portugal: a Holanda. De 1601 a 1661, o Reino de Portugal e a República das Sete Províncias 
Unidas estiveram envolvidos no confronto conhecido como Guerra Luso-Holandesa. Essa 
guerra foi travada como uma disputa pela supremacia sobre as rotas marítimas no Atlântico e no 
Oriente e sobre o rentável comércio de especiarias, o que incluía o açúcar. Parte significativa do 
conflito se inscreveu no Nordeste brasileiro, onde os neerlandeses tentaram estabelecer colônias.
Figura 3 – OGILBY, John. A tomada de Olinda. 1671. Litografia aquarelada, p&b: 36 x 29 cm. 
Londres, Inglaterra.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 78
Acima de tudo, o conflito custou aos portugueses possessões e portos no Oriente. Os 
lusitanos tiveram sucesso em resguardar seus domínios no Brasil e em Angola, mas precisa-
riam naquele momento lidar com a concorrência dos holandeses, que estabeleceram enge-
nhos bem-sucedidos na região das Antilhas.
Tendo adquirido experiência em técnicas de produção e refinamento, os holandeses 
produziam em larga escala, empregando menos espaço do que os latifúndios da América 
portuguesa, e eram capazes de oferecer aos ricos consumidores europeus um produto mais 
competitivo, posto que era mais barato. É importante frisar que esse nível de expertise na 
produção de açúcar foi adquirido pelos holandeses durante o período em que colonizaram 
Pernambuco. Ingleses e franceses também se estabeleceram na América Central e Caribe e 
tomaram para si uma fatia desse mercado.
O açúcar continuaria a ser um produto importante para a Colônia, mas a crise gerada 
pela concorrência externa teve efeitos severos na renda das elites da América portuguesa e 
na economia da Metrópole, uma vez que a queda na procura pelo açúcar português tinha 
por consequências imediatas:
1. uma redução nos negócios dos senhores de engenho, cujo lucro dependia sobre-
maneira dos derivados da cana-de-açúcar; e
2. a diminuição das rendas da Coroa portuguesa, que extraía lucros substanciais dos 
tributos pagos pelos colonos ricos e das taxas impostas aos comerciantes que es-
coavam os produtos.
Com a finalidade de se recuperar das perdas resultantes dessa crise, o governo português 
estimularia a busca por novos produtos que pudessem ser explorados. Uma das alternativas 
encontradas foi a exploração das drogas do sertão. O termo sertão, na época, referia-se ao in-
terior do Brasil, ainda pouco explorado pelos portugueses, e as drogas eram produtos nativos, 
encontrados, coletados e amplamente contrabandeados pelos bandeirantes, como ervas medi-
cinais, cacau, guaraná, cravo, urucu e castanha-do-pará. Todos esses produtos eram reconhe-
cidos como especiarias na Europa e podiam ser vendidos a preços elevados.
A tabela a seguir, exposta por Simonsen (2005), lista de forma geral os produtos de ex-
portação mais relevantes da Colônia e uma estimativa dos valores que articularam em libras 
esterlinas, ao longo de todo o período colonial. É possível observar, nessa variedade de itens, 
não só a importância do açúcar para a economia local, mas também a de uma variedade de 
outros produtos.
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
5
79
Tabela 1 – Produtos de exportação do Brasil colonial.
Açúcar – valor de sua exportação................................................................... £ 300.000.000
Mineração: ouro e diamantes – idem, idem.................................................. £ 170.000.000
Couros – idem, idem........................................................................................ £ 15.000.000
Pau-Brasil e outras madeiras – idem, idem................................................... £ 15.000.000
Tabaco – idem, idem.......................................................................................... £ 12.000.000
Algodão – idem, idem...................................................................................... £ 12.000.000
Arroz – idem, idem........................................................................................... £ 4.500.000
Café – idem, idem.............................................................................................. £ 4.000.000
Cacau, especiarias e várias outras drogas – idem, idem.............................. £ 3.500.000
£ 536.000.000
Fonte: SIMONSEN, 2005, p. 487.
Todavia, a verdadeira ruptura viria com a emergência de um novo ciclo econômico, não 
mais movido pela produção agrícola, mas pela exploração de recursos minerais. No século 
XVIII, a Coroa encorajaria cada vez mais a busca por minérios Brasil adentro, oferecendo 
honrarias aos colonos que encontrassem veios auríferos.
Figura 4 – RUGENDAS, Johann Moritz. Lavagem do minério de ouro: a montanha Itacolomi. 1835. 
Gravura, color.: 28,5 x 20,5 cm.
Começava assim o ciclo do ouro, ou ciclo da mineração, que deslocaria a obtenção de 
riquezas exuberantes da costa brasileira para as Minas Gerais.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 80
 Ampliando seus conhecimentos
História econômica do Brasil
(PRADO JÚNIOR, 1970, p. 18-20)
No terceiro decênio do séc. XVI o Rei de Portugal estará bem convencido 
que nem seu direito sobre as terras brasileiras, fundado embora na sobe-
rania do Papa, nem o sistema, até então seguido, de simples guardas-cos-
tas volantes, era suficiente para afugentar os franceses que cada vez mais 
tomam pé em suas possessões americanas. Cogitará então de defendê-las 
por processo mais amplo e seguro: a ocupação efetiva pelo povoamento e 
colonização. [...]
[...] A perspectiva principal do negócio está na cultura da cana-de-açú-
car. Tratava-se de um produto de grande valor comercial na Europa. 
Forneciam-no, mas em pequena quantidade, a Sicília, as ilhas do 
Atlântico ocupadas e exploradas pelos portugueses desde o século ante-
rior (Madeira, Cabo Verde), e o Oriente de onde chegava por intermédio 
dos árabes e dos traficantes italianos do Mediterrâneo. O volume deste 
fornecimento era contudo tão reduzido que o açúcar se vendia em boticas, 
pesado aos gramas.
Já se conhecia o bastante do Brasil para esperar que nele a cana-de-açú-
car dar-se-ia bem. O clima quente e úmido da costa ser-lhe-ia altamente 
favorável; e quanto à mão de obra, contou-se a princípio com os indígenas 
que, como vimos, eram relativamente numerosos e pacíficos no litoral. 
Estas perspectivas seriam amplamente confirmadas; o único fator ainda 
ignorado antes da tentativa, a qualidade do solo, revelar-se-ia surpreen-
dentemente propício, em alguns pontos pelo menos da extensa costa. Foi 
o caso, particularmentedo Extremo-Nordeste, na planície litorânea hoje 
ocupada pelo Estado de Pernambuco; e do contorno da baía de Todos os 
Santos (o Recôncavo baiano, como seria chamado). Não seriam aliás os 
únicos: de uma forma geral, toda a costa brasileira presta-se ao cultivo da 
cana-de-açúcar.
É nesta base, portanto, que se iniciarão a ocupação efetiva e a colonização 
do Brasil. [...] A cultura da cana somente se prestava, economicamente, a 
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
5
81
grandes plantações. Já para desbravar convenientemente o terreno (tarefa 
custosa neste meio tropical e virgem tão hostil ao homem) tornava-se 
necessário o esforço reunido de muitos trabalhadores; não era empresa 
para pequenos proprietários isolados. Isto feito, a plantação, a colheita e 
o transporte do produto até os engenhos onde se preparava o açúcar, só 
se tomava rendoso quando realizado em grandes volumes. Nestas con-
dições, o pequeno produtor não podia subsistir. São sobretudo estas cir-
cunstâncias que determinarão o tipo de exploração agrária adotada no 
Brasil: a grande propriedade. A mesma coisa aliás se verificou em todas 
as colônias tropicais e subtropicais da América. O clima terá um papel 
decisivo na discriminação dos tipos agrários. As colônias inglesas do 
Norte, pela contiguidade aí de zonas diferentes e variedade de tentativas 
e experiências ensaiadas, bem como pelo fato de serem todas da mesma 
origem nacional, nos oferecem esplêndido campo de observação. Nas 
de clima temperado (Nova Inglaterra, Nova Iorque, Pensilvânia, Nova 
Jérsei, Delaware) estabeleceu-se a pequena propriedade do tipo campo-
nês; às vezes encontramos a grande propriedade, como em Nova Iorque, 
mas parcelada pelo arrendamento; a pequena exploração em todo caso, 
realizada pelo próprio lavrador, proprietário ou arrendatário, auxiliado 
quando muito por um pequeno número de subordinados. Ao sul da 
baía de Delaware, nesta planície litorânea úmida e quente, onde já nos 
encontramos em meio físico de natureza subtropical, estabeleceu-se pelo 
contrário a grande propriedade trabalhada por escravos, a plantation. 
Na mesma altura, mas para o interior, nos elevados vales da cordilheira 
dos Apalaches, onde a altitude corrige a latitude, reaparece novamente a 
colonização por pequenas propriedades. A influência dos fatores natu-
rais é tão sensível nesta discriminação de tipos agrários que ela acaba se 
impondo mesmo quando o objetivo inicial e deliberado de seus promo-
tores é outro. Assim na Geórgia e Carolina, onde nos achamos em zona 
nitidamente subtropical, a intenção dos organizadores da colonização 
(neste caso, como em geral nas colônias inglesas, companhias ou indiví-
duos concessionários) foi constituir um regime de pequenas propriedades 
de área proporcional à capacidade de trabalho próprio de cada lavrador; 
com este critério iniciou-se a colonização e a distribuição das terras. Mas 
frustrou-se tal objetivo, e o plano inicial fracassou, instituindo-se em lugar 
dele o tipo geral das colônias tropicais.
A manufatura do açúcar5
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 82
 Atividades
1. Com base nas citações trabalhadas no capítulo e o excerto do texto complementar, 
discorra sobre como Caio Prado Júnior justifica o estabelecimento da cana-de-açúcar 
como produto de exportação dominante na Colônia.
2. Que tipo de sociedade se configurou no ambiente colonial a partir do estabelecimen-
to da economia açucareira?
3. Que fatores conduziram ao eventual declínio do ciclo da cana-de-açúcar no Brasil?
 Referências 
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009 [1583-1601].
CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: J. Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
2001 [ca.1790-1840].
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
______. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1970.
SIMONSEN, Roberto. História econômica do Brasil – 1500-1820. Brasília: Ed. Senado Federal, 2005.
 Resolução 
1. Conforme ressalta Prado Júnior, em todas as regiões do Novo Mundo onde os euro-
peus buscaram explorar interesses coloniais, precisaram lidar com questões geográ-
ficas, e sobretudo climáticas, que ditavam em grande parte o modelo de ocupação 
que deveria ser implementado para que se obtivesse o máximo possível de ganhos da 
Colônia recém-adquirida. No caso das colônias britânicas de clima temperado, parte 
do que viria a se tornar os Estados Unidos da América, foi possível o estabelecimento 
de unidades agrárias menores, capazes de uma economia agrária mais variada, em 
grande parte baseada em culturas temperadas já conhecidas pelos europeus. Em re-
giões mais quentes, por outro lado, incluindo as regiões tropicais e a porção sul das 
colônias britânicas da América do Norte, esse modelo fracassaria, posto que essas 
áreas só seriam economicamente viáveis se exploradas em larga escala, em grandes 
propriedades, com o uso extensivo de mão de obra e produtos destinados à expor-
A manufatura do açúcar
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
5
83
tação, favorecendo a monocultura. Com base em experiências anteriores no Atlânti-
co e na demanda europeia pelo produto, os portugueses julgaram que o cultivo de 
cana-de-açúcar seria a melhor alternativa para a utilização do território brasileiro.
2. Sendo muito dependente da exploração de trabalho escravo em grandes unidades 
agrárias, essa sociedade se configuraria como altamente estratificada, baseada na 
distinção social entre senhores de engenho e suas famílias e as camadas mais baixas 
da sociedade, compostas por agricultores de menor poder aquisitivo, uma parcela 
de trabalhadores livres e grandes contingentes de escravos. Possuindo influência 
para além do recursos econômicos, os senhores de engenho garantiam para si gran-
de poder político.
3. No século XVII, Portugal enfrentou um série de conflitos com a República Holande-
sa pela supremacia do comércio marítimo internacional, especialmente do lucrativo 
comércio de especiarias. Uma das consequências foi a iniciativa holandesa de estabe-
lecer engenhos na América Central, após o fracasso no estabelecimento de colônias 
no Brasil, onde seria produzido açúcar refinado para concorrer com a exportação lu-
sitana. O resultado foi uma severa perda de competitividade do produto português. 
Com o propósito de restabelecer a lucratividade de seu projeto colonial, Portugal 
redirecionaria seus esforços para a busca de minerais em solo brasileiro, levando a 
sociedade açucareira do litoral a entrar em decadência.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 85
6
Tráfico negreiro e 
escravismo
A história do Brasil colonial está firmemente entrelaçada com a história da escravi-
dão e do tráfico negreiro transatlântico. Tratam-se de narrativas complementares, posto 
que os portugueses tiveram um papel fundamental na inauguração e na manutenção 
desse comércio de seres humanos, em grande parte alimentado pela necessidade de mão 
de obra para o trabalho intenso nas lavouras de monocultura, instaladas em território 
brasileiro para a produção de açúcar.
Posteriormente, quando ocorreu o boom da exploração aurífera e a fonte maior de 
afluência da Colônia se deslocou das fazendas da costa para as Minas Gerais, nova-
mente os escravos seriam uma peça fundamental da economia, forçados a extrair o 
metal das ricas jazidas e a trabalhar na construção das glórias arquitetônicas do bar-
roco brasileiro.
Para além de ser um componentecruel e exploratório dos ciclos econômicos do 
Brasil, a escravidão representou um choque entre sujeitos diversos e irreconciliáveis, 
dada a conjuntura da época. Para os administradores, comerciantes de escravos e colo-
nos portugueses, os africanos e seus descendentes nascidos nas Américas não eram 
seres humanos plenos; assim, qualquer influência cultural proveniente dos escravos 
deveria ser suprimida ou, no máximo, tolerada. Uma permanência histórica desse 
modo de pensar seria certa associação entre ser negro e ser subalterno, algo que sobre-
viveria ao fim da instituição da escravidão. Observar como se desenvolveu a escra-
vidão na Colônia é um exercício fundamental e revelador, em vários sentidos, para 
compreender os desdobramentos sociais e econômicos da formação do Brasil.
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 86
6.1 Caracterização do tráfico negreiro: 
ideologias e justificativas do trabalho cativo
Um dos mitos mais persistentes acerca da formação do Brasil é o que se refere ao país 
como um território de três etnias (europeia, indígena e africana), as quais teriam colaborado 
de forma mútua, maleável e pacífica para a formação de uma cultura quase, senão totalmente, 
igualitária: uma espécie de “democracia racial”. Comparados a seus equivalentes nas colônias 
britânicas e espanholas, os senhores de escravos portugueses seriam amos benevolentes, os 
quais até mesmo se misturavam com seus escravos, que eram “pacíficos” e “conformados”.
Evidente que é necessário cuidado ao se encarar qualquer concepção pronta e sedimen-
tada acerca desse tópico. Para além de afirmações baseadas no senso comum, deve-se com-
preender a escravidão negra no Brasil como uma instituição complexa e por vezes marcada 
por contradições. As relações escravistas mais comuns e recordadas pelo imaginário nacio-
nal são aquelas que se desenvolviam entre os senhores de engenho e a mão de obra cativa 
que colhia e refinava o produto de seus canaviais. No entanto, como aponta João José Reis :
Os escravos, por exemplo, não eram propriedade apenas de grandes senhores 
de engenho e negociantes urbanos — os que poderíamos chamar estritamente 
de “classe dominante” —; seus donos estavam espalhados por diversas classes 
e setores sociais. Havia até escravos que possuíam outros escravos, num desafio 
estranhamente radical ao modelo escravista. (REIS, 1986, p. 14)
Embora as considerações de Reis se refiram à conjuntura do Brasil Imperial, é razoável 
supor que boa parte da estrutura vigente à época da Revolta dos Malês, em 1835, consistia 
de permanências de períodos anteriores, relações havia muito consolidadas no seio de uma 
sociedade paternalista e preponderantemente conservadora, mas forçada a se adaptar às 
contingências locais.
Assim, a escravidão permeava a vida na Colônia em suas mais variadas esferas: na cida-
de, no campo, em praticamente todas as atividades produtivas possíveis e nos mais distintos 
estratos da sociedade. Reis (1986, p. 14) observa que os escravos, junto aos pobres livres, 
muitos de ascendência africana, constituíam a maior parte da população na sociedade baia-
na do século XVIII. Pode-se supor que a aquisição e a manutenção de trabalhadores cativos 
era, mais que um luxo, algo à época considerado essencial à vida em sociedade.
Símbolo dessa convivência do luxo proveniente de uma colônia rica com a condição 
esquálida dos escravos seria a relação entre a casa-grande e a senzala1, algo fortemente 
presente no imaginário nacional e frequentemente idealizada por autores como Gilberto 
Freyre. O historiador defendia a tese de que prevalecera no caso brasileiro um estado de 
harmonia racial, no qual a mestiçagem entre brancos, negros e índios teria sido mais forte 
que as divisões sociais e econômicas que marcaram a sociedade colonial. Idealizações à par-
te, a dicotomia entre os dois espaços – casa-grande e senzala – diz muito sobre as relações 
escravistas (FREYRE, 2003).
1 A própria expressão referente a essa relação seria consagrada por Gilberto Freyre, em sua obra Ca-
sa-grande e senzala, publicada pela primeira vez em 1933.
Tráfico negreiro e escravismo
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
6
87
Nas grandes plantações e casas de negociantes abastados, os escravos não dividiam suas 
acomodações com seus senhores, ficando confinados nas dependências da senzala, palavra 
oriunda do quimbundo sanzala, que designava acomodações rústicas e apertadas nas quais 
os cativos permaneceriam sempre que não estivessem trabalhando, frequentando cultos reli-
giosos ou sendo submetidos a castigos físicos. A casa-grande, em comparação, era um espaço 
de luxo e uma residência senhorial. Para além dos confortos da vida doméstica das elites, sua 
arquitetura era uma expressão física da hierarquia social corrente no Brasil da época.
Mas como se configurou esse estado de coisas? Como a escravidão negra chegou ao 
Brasil colonial e se tornou um traço tão preponderante na formação do território?
Foi no século XV que os portugueses começaram suas primeiras incursões exploratórias 
na África, continente cuja realidade era completamente distinta daquilo a que estavam acos-
tumados. Tal como a Europa, a África era culturalmente diversa e territorialmente dividida, 
havendo inclusive impérios poderosos, como Mali e Songai, que submetiam reinos menores 
ao seu domínio militar e mercantil. Divisões tribais eram quase tão importantes (ou mais 
importantes, dependendo da região) quanto vínculos políticos burocráticos ou de ordem 
estamentária. Havia comunidades que dominavam outras, bem como sociedades diferentes 
que ocupavam os mesmos territórios, desenvolvendo relações com níveis variáveis de hos-
tilidade e cooperação.
Havia também escravidão. Em conflitos tribais, era comum que cativos fossem feitos 
e convertidos em mão de obra forçada. Tradicionalmente, nesses casos a escravidão era 
restrita e os cativos, pouco numerosos. Sua posse era garantia de prestígio em sociedades 
fundamentalmente agrárias, nas quais ter mãos extras para realizar o trabalho nos campos 
garantia um excedente de riqueza.
A primeira mudança nesse modelo de escravidão ocorreria com a expansão islâmica 
no século VII. A influência dos árabes não ficaria limitada à religião e às convenções sociais: 
a formação de caravanas mercantes que ligavam a África ao Oriente Médio criaria amplos 
mercados para especiarias e artigos de luxo, o que incluía escravos. A demanda por mão 
de obra cativa logo aumentaria, instigando os conflitos regionais, e a escravidão familiar se 
converteria em escravidão em larga escala.
A segunda mudança seria trazida pelos europeus. Após a conquista de Ceuta, em 1415, 
os portugueses se sentiam suficientemente confiantes para explorarem a costa ocidental da 
África. Pouco a pouco realizaram avanços consistentes, consolidando sua posição e fazendo 
alianças com governantes locais, que tinham nos escravos seu principal artigo de oferta. À 
medida que os portugueses fortificavam sua posição, estabeleciam feitorias ao longo da 
costa, como o Castelo de São Jorge da Mina, em Gana. Empregadas para reunir mercado-
rias, encaminhando-as então a outros portos, as feitorias reconfiguravam a economia e o 
panorama social das regiões a seu redor. Comunidades inteiras tiveram sua vida econômica 
dirigida completamente para a captura de escravos de outros grupos, e conflitos empreen-
didos com esse fim se converteram em uma atividade corriqueira de subsistência. De polo 
produtor de sal, marfim, peles de animais, malagueta e especiarias, a África se converteria 
em um fornecedor de escravos para um mercado internacional que se revelava insaciável. O 
impacto desse comércio marítimo é incalculável em ambos os extremos do Atlântico.
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 88
No Brasil, tão logo se estabeleceram os primeiros núcleos produtores de cana-de-açú-
car, o emprego de mão de obra escravafoi dado como imprescindível pelos colonos. O pró-
prio reino de Portugal carecia de trabalhadores brancos que suprissem a Metrópole. Tendo 
começado pela exploração de populações indígenas locais, os portugueses buscaram então 
substituir esses primeiros cativos, os “negros da terra”, pelos africanos, embora obstáculos 
tenham se apresentado, conforme aponta Prado Júnior (1970, p. 23):
O processo de substituição do índio pelo negro prolongar-se-á até o fim da era 
colonial. Far-se-á rapidamente em algumas regiões: Pernambuco, Bahia. Noutras 
será muito lento, e mesmo imperceptível em certas zonas mais pobres, como 
no Extremo-Norte (Amazônia), e até o séc. XIX em São Paulo. Contra o escravo 
negro havia um argumento muito forte: seu custo. Não tanto pelo preço pago 
na África; mas em consequência da grande mortandade a bordo dos navios que 
faziam o transporte. Mal alimentados, acumulados de forma a haver um máximo 
de aproveitamento de espaço, suportando longas semanas de confinamento e 
as piores condições higiênicas, somente uma parte dos cativos alcançavam seu 
destino. Calcula-se que, em média, apenas 50% chegavam com vida ao Brasil; e 
destes, muitos estropiados e inutilizados. O valor dos escravos foi assim sempre 
muito elevado, e somente as regiões mais ricas e florescentes podiam suportá-lo.
As regiões mais ricas das quais trata o autor eram centros no coração da vida econômica 
colonial, como a região aurífera das Minas Gerais e os ricos polos açucareiros da faixa costei-
ra da Colônia, com destaque para Recife, Bahia e São Vicente.
Conforme mencionado por Prado Júnior, os escravos africanos eram transportados das 
feitorias portuguesas em navios negreiros, os quais eram abarrotados a fim de se utilizar todo 
o espaço disponível e minimizar as perdas dos comerciantes, posto que já era esperado que 
muitos indivíduos morressem durante o translado. Uma vez que os navios chegavam aos por-
tos brasileiros, os indivíduos cativos eram leiloados de forma semelhante a animais de carga 
e encaminhados para uma ampla gama de funções, que ia do trabalho nas lavouras e minas a 
serviços domésticos, incluindo o cuidado com as crianças dos senhores. Atribuições de escra-
vos urbanos incluíam sair às ruas para vender produtos, bem como para prestar serviços. Os 
ganhos resultantes desses trabalhos eram entregues ao senhor ao fim do dia.
A escravidão era, portanto – especialmente nas grandes cidades e nas grandes proprie-
dades agrícolas –, uma instituição onipresente e, dessa forma, encarada com naturalidade, 
como indispensável para a viabilidade econômica do projeto colonial. Mas não eram ape-
nas os grandes proprietários e os mercadores de escravos que lucravam prodigiosamente 
com sua exploração e venda e que defendiam a instituição escravocrata. Conforme afirma 
Ronaldo Vainfas, o projeto colonizador escravista encontrava amplo suporte entre as classes 
religiosas, que em grande parte constituíam a camada intelectual/letrada da Colônia:
[...] fossem neoplatônicos, estoicos ou escolásticos, os intelectuais cristãos 
da colônia souberam como adaptar o seu ideário a escravidão dos africanos. 
Tráfico negreiro e escravismo
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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89
Legitimaram as relações escravistas e construíram normas atentas à eficiência 
econômica e ao equilíbrio social do sistema. O trabalho, o sustento, a educação 
e a punição foram objetos privilegiados na elaboração de normas de controle – 
persuasivas e coercitivas simultaneamente. (VAINFAS, 1986, p. 151)
Ou seja, dado o estatuto de “normalidade” e “necessidade” que lhe era atribuído, o 
regime de trabalho escravocrata encontrava paralelos na própria condição humana na cris-
tandade. Nessa visão, Deus era um grande senhor ao qual todos devem ser subservientes, 
aceitando seu quinhão de sofrimento com satisfação, como forma de prova de fé e purifica-
ção da alma pela mortificação do corpo. A própria condição de Cristo, torturado e sacrifica-
do pela redenção da humanidade, podia ser empregada como analogia para o escravo, que 
existia para servir. Espalhar o cristianismo e escorar-se nele para suas políticas sempre fora, 
afinal, uma prática do Estado português. Constituía-se e reforçava-se, assim, uma ideologia 
escravista que, pelas vias dos costumes, da religião e do argumento de necessidade econô-
mica, legitimava a escravização de milhares de indivíduos.
Figura 2 – DEBRET, Jean-Baptiste. Execução de castigo para fuga. 1835. Litografia, 28,6 x 24 cm. 
Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindin, São Paulo, SP.
Paralelamente ao raciocínio de matriz religiosa e aos interesses financeiros e coloniais, 
havia a percepção de mundo etnocêntrica dos portugueses, que viam os africanos como 
bárbaros, menos humanos, adeptos de práticas reprováveis e pecaminosas. Escravizá-los 
seria um gesto de misericórdia cristã, dando-lhes a oportunidade de adotar uma vida e mo-
dos mais dignos e corretos. Desse modo, justificavam-se não apenas os trabalhos forçados, 
mas as severas punições aplicadas a escravos insubordinados ou incapazes de atender às 
demandas de produção. Flagelações e outras formas de castigo físico eram consideradas 
admissíveis e fundamentais para a ordem do sistema produtivo.
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 90
6.2 Revoltas e resistência africana: 
o caso de Palmares
Figura 3 – PARREIRAS, Antônio. Zumbi. 1927. Óleo sobre tela, 115,3 x 84,4 cm. Museu Antônio 
Parreiras, Niterói, RJ.
As posturas dos escravos em relação a seu estado de cativeiro e servidão forçada não 
se restringiram à aceitação passiva. Muitas foram as práticas que podem ser compreendidas 
como formas de resistência, ou seja, de confrontação com o sistema escravista. A mais co-
nhecidas envolveram a fuga dos cativeiros ou o ataque aberto a propriedades de senhores, 
mas muitas outras estratégias foram empregadas, conforme comentam Schwarcz e Starling 
(2015, p. 104):
Além das fugas, existiram outras formas de resistência, como o assassinato e 
envenenamento de senhores, suicídios, abortos; escravizados sempre negaram 
sua condição e reivindicaram direitos. Ora, a simples desobediência já retirava 
parte da autoridade do senhor, que dependia, para que a fazenda funcionasse e 
desse lucro, da obediência cega dos trabalhadores. Por outro lado, os escravos 
sabiam dos riscos que corriam: o inimigo era superior em forças, não havia ga-
rantias e, caso fossem descobertos, não teriam nenhuma proteção legal. Por isso a 
luta não podia ser aberta: roubos, assassinatos, suicídios, abortos, insultos, afora 
Tráfico negreiro e escravismo
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
6
91
pequenos e desconcertantes atos de desobediência ou de manipulação pessoal, 
constavam da lista de reações possíveis.
Ou seja, é equivocada a concepção de que o Brasil colonial era um campo harmonioso 
de relações entre diferentes estratos sociais, no qual prevaleciam a mestiçagem e a ordem. 
A ideia de que os submetidos simplesmente aceitavam seu status de dominados, servindo 
sem questionar, deixa de lado muitas complexidades próprias da conjuntura colonial. Ações 
clandestinas contra os senhores e seus meios de produção eram comuns, sendo muitas vezes 
difíceis de detectar ou de imputar a indivíduos específicos, mas ainda assim resultavam em 
perdas econômicas severas ou, até mesmo, morte.
A sabotagem representava um perigo constante, e seu êxito dependia de muito 
pouco: uma chispa de fogo no canavial, o limão cortado em pedaços e esquecido 
nos tachos de cobre onde se cozia o caldo da cana para produção do melado, um 
dente quebrado nos cilindros dentados da moenda – as gigantescas rodas para 
extração do caldo da cana, movidas a água ou por uma junta de bois. Qualquer 
interferência, por insignificante que fosse, era danosa ao fabrico do açúcar e po-
dia pôr a perder toda a produção do engenho, provocando um prejuízo irrepará-
vel ao seu proprietário.(SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 105)
Em outros casos, porém, a postura rebelde tornava-se aberta, mais organizada e agres-
siva em seus métodos, o que ocorreu em diversos pontos do continente onde colonos eu-
ropeus empregavam trabalho forçado. As práticas escravistas brutais da América colonial 
produziram focos de resistência, como os maroons e os palenqueros. No caso brasileiro, as 
comunidades que congregavam escravos fugidos e outros grupos marginalizados eram cha-
madas quilombos, palavra oriunda do idioma quimbundo. Originalmente, o termo designava 
povoamentos ou acampamentos provisórios de comerciantes e soldados, mas na América 
portuguesa adquiriria uma forte carga simbólica, ameaçadora para o status quo escravocrata.
Uma carta do Conselho Ultramarino – órgão responsável pela administração das fi-
nanças e provisões de guerra para as posses além-mar – ao rei de Portugal define como 
quilombo “toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, 
ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles” (apud ALMEIDA, 
1996, p. 12). Desse modo, a definição podia ser muito abrangente, envolvendo comunidades 
de tamanhos variados. Tanto pequenos grupos de escravos fugitivos quanto comunidades 
grandes e bem organizadas seriam igualmente chamadas de quilombos, tendo em comum o 
fator de resistência à hierarquia escravocrata.
Os habitantes dos quilombos denominam-se quilombolas. Geralmente suas comunidades 
se estabeleciam em regiões de difícil acesso, distantes de grandes centros urbanos, em áreas 
de mata ou de geografia complexa. Eram, acima de tudo, refúgios onde os escravos fugidos 
esperavam desfrutar de relativa autonomia social, econômica e religiosa, reproduzindo cos-
tumes originários da África sem represálias, longe da opressão de senhores e líderes religio-
sos. Em momentos e locais específicos, os quilombolas mimetizavam a organização social 
das regiões africanas de onde eram provenientes, o que incluía uma hierarquia encabeçada 
por reis. Ao mesmo tempo em que eram recantos culturais e produtivos, os quilombos eram 
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 92
também focos de insurreição armada, em que integrantes lançavam ataques contra grandes 
propriedades e constituiriam uma ameaça para a ordem vigente.
Muitas comunidades quilombolas existiram ao longo do período colonial e em ciclos 
posteriores, algumas persistindo até os dias atuais e preservando sua herança cultural de re-
sistência. A mais célebre organização do tipo foi provavelmente o Quilombo dos Palmares. 
Situado na região da Serra da Barriga, na Capitania de Pernambuco, Palmares surgiu no fim 
do século XVI, mas atingiu seu apogeu no século XVII, recebendo fugitivos de engenhos da 
Bahia e de Pernambuco, abarcando a região onde hoje é o estado de Alagoas. O quilombo 
era organizado em povoamentos menores, os mocambos, como Dambrabanga, Osenga, 
Subupira e Macaco. Estima-se que, em seu auge, sua população tenha atingido cerca de 
vinte mil habitantes. Praticava-se a agricultura em seus limites, bem como atividades extra-
tivistas e artesanato, e também era realizado comércio com as comunidades vizinhas.
Várias foram as tentativas do governo colonial de reprimir a comunidade rebelde. Em 
1677, o governador Fernão Carrilho acordou uma trégua com o líder político e militar de 
Palmares, Ganga Zumba. Os termos do acordo foram causa de rompimento entre as lide-
ranças quilombolas, que os consideravam desfavoráveis. Ganga Zumba seria sucedido por 
Zumbi, o qual deixaria de lado a estratégia de guerra defensiva adotada até então, organi-
zando uma guerrilha ofensiva aberta contra as propriedades da capitania.
Dada a ameaça que o quilombo se tornara à governança da região, o governador da 
capitania contratou um bandeirante, Domingos Jorge Velho, para liderar uma expedição 
de extermínio contra Palmares. Mesmo contando com experiência de combate, um número 
considerável de homens e até mesmo peças de artilharia pesada, Jorge Velho teve conside-
rável dificuldade para quebrar as defesas quilombolas, que eram relativamente bem orga-
nizadas e bem equipadas. Em 20 de novembro de 1695, o bandeirante conseguiu finalmente 
emboscar Zumbi, que foi morto e decapitado. Esperava-se que sua execução servisse de 
exemplo para outros escravos.
Mesmo após a morte de Zumbi, mantiveram-se outros focos de resistência na região, 
mas desarticulados e muito menores. Nunca mais se formaria outra comunidade rebelde 
e centralizada tão ameaçadora no coração da América portuguesa. Palmares se manteria 
como um símbolo de resistência negra a um regime escravista cruel.
6.3 Costumes e permanências culturais
Trazidos ao Brasil pelo comércio transatlântico para serem o principal motor da pro-
dução agrícola e frequentemente tratados como seres sub-humanos, desprovidos de alma, 
bárbaros incultos e escravos por natureza, os africanos e seus descendentes deixariam mar-
cas indeléveis em nossa cultura. Regiões historicamente ricas, onde a migração de escra-
vos sempre foi intensificada pelos ciclos econômicos, dão mostras visíveis dessa influência, 
como o estado de Minas Gerais. A costa brasileira, por sua vez, mostra fortes marcas na 
culinária, na música e no vestuário, sendo os estados de Maranhão, Bahia, Pernambuco e 
Rio de Janeiro exemplos muito nítidos.
Tráfico negreiro e escravismo
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
6
93
É importante esclarecer que tratar de influência cultural africana é algo delicado. Não 
faz sentido falar em “cultura africana”, assim como não faz sentido falar em “cultura indí-
gena”, posto que o Brasil recebeu escravos oriundos de regiões diferentes da África, indi-
víduos que pertenciam a comunidades distintas, com práticas religiosas, indumentárias, 
percepções estéticas e modelos de relações sociais próprios. Embora houvesse pontos em co-
mum entre esses grupos, havia também diferenças, as quais muitas vezes foram desconside-
radas por mercadores de escravos e senhores, mais interessados no potencial econômico da 
força de trabalho que em suas complexidades culturais. Essa diversidade não escapou aos 
olhos de artistas estrangeiros que viajaram pelo Brasil, como Jean-Baptiste Debret e Johann 
Moritz Rugendas, os quais foram grandes cronistas visuais da escravidão e da diversidade 
étnica no Brasil do século XIX.
Dentre as manifestações mais célebres de influência africana na cultura brasileira, desta-
cam-se a capoeira, arte marcial que incorpora elementos de música e dança, e o intenso uso 
festivo de instrumentos de percussão, genericamente chamados de batuques, que viriam a in-
fluenciar significativamente gêneros musicais nacionais, dos quais o mais famoso é o samba, 
considerado o estilo musical brasileiro por excelência. O Carnaval, talvez a festa popular mais 
conhecida do Brasil, carrega essas influências de forma declarada, ainda que o faça, por vezes, 
de forma idealizada, reforçando estereótipos mitificados sobre a formação do país.
Figura 4 – RUGENDAS, Moritz. Jogo de capoeira ou dança de guerra. 1835. Litografia colorida, 
17 x 24, 6 cm. Museus Castro Maya, Rio de Janeiro, RJ.
Pratos típicos como o acarajé, o vatapá e a cocada são essencialmente de origem africa-
na, tal como o amplo uso de ingredientes como o coco e o azeite de dendê em algumas culi-
nárias regionais. O uso de turbantes e tecidos listrados com um conjunto vasto de ornamen-
tos, associado à figura estereotipada da baiana, é herança dos hauçás e nagôs muçulmanos 
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 94
(grupos de iorubás adeptos da fé islâmica), que adotavam esse vestuário tradicionalmente, 
por influência árabe.
A influência da religião iorubá tradicional, talvez mais do que ocorre com a culinária, o 
vestuário, a capoeira e a música, tornou-se um símbolo de resistência ao ser incorporada em 
formas de culto próprias do continente americano, as quaisservem à importante função de 
reforçar uma identidade afro. Assim como o vodou haitiano e a santería cubana, a umbanda 
e o candomblé são manifestações religiosas que remontam à religião da costa ocidental ain-
da praticada em regiões da Nigéria, do Togo e do Benin. Em vários momentos da história 
brasileira, essas práticas seriam vistas com escárnio, quando não proibidas e perseguidas. 
Sua permanência, todavia, aponta para a importância fundamental do negro na formação 
nacional, desde seu início brutal com o tráfico negreiro.
 Ampliando seus conhecimentos
O Padre Antônio Vieira foi um sacerdote da Companhia de Jesus. Juntamente 
com José Anchieta, Manuel da Nóbrega e Fernão Cardim, é um dos religio-
sos mais conhecidos do Brasil colonial. Notório por seus Sermões, Vieira 
defendia a escravidão, argumentando que ela era um instrumento para 
remover os africanos do paganismo e trazê-los para a cristandade.
Décimo quarto Sermão do Rosário
(VIEIRA, 1945 [1633], p. 261-62)
[...]
Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado: Imitatoribus 
Christi crucifixi – porque padeceis em um modo muito semelhante o que o 
mesmo Senhor padeceu na sua cruz e em toda a sua paixão. A sua cruz foi 
composta de dois madeiros, e a vossa em um engenho é de três. Também 
ali não faltaram as canas, porque duas vezes entraram na Paixão: uma vez 
servindo para o cetro de escárnio, e outra vez para a esponja em que lhe 
deram o fel. A Paixão de Cristo parte foi de noite sem dormir, parte foi 
de dia sem descansar, e tais são as vossas noites e os vossos dias. Cristo 
despido, e vós despidos; Cristo sem comer, e vós famintos; Cristo em tudo 
maltratado, e vós maltratados em tudo. Os ferros, as prisões, os açoites, 
as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isto se compõe a vossa imitação, 
que, se for acompanhada de paciência, também terá merecimento de mar-
tírio. Só lhe faltava a cruz para a inteira e perfeita semelhança o nome de 
engenho: mas este mesmo lhe deu Cristo, não com outro, senão com o 
próprio vocábulo. Torcular se chama o vosso engenho, ou a vossa cruz, 
Tráfico negreiro e escravismo
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
6
95
e a de Cristo, por boca do mesmo Cristo, se chamou também torcular: 
Torcular calcavi solus (“Eu calquei o lagar sozinho”). – Em todas as inven-
ções e instrumentos de trabalho parece que não achou o Senhor outro que 
mais parecido fosse com o seu que o vosso. [...]
 Atividades
1. Em vista do que foi abordado neste capítulo, explique como se justificava a escravi-
dão na Colônia.
2. Discorra sobre a escalada em proporção da economia escravista na África antes do 
contato com os europeus e as mudanças que se seguiram a esse contato.
3. Leia o exerceto do sermão do Padre Antonio Vieira presente no texto complementar. 
O que o texto tem a dizer sobre a postura das autoridades da Igreja católica em rela-
ção às comunidades escravas do Brasil?
4. Discorra sobre as marcas visíveis da influência africana em nossa cultura, apresen-
tando exemplos.
 Referências 
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(Org.). Frechal Terra de Preto: quilombo reconhecido como reserva extrativista. São Luís, 1996. p. 11-19.
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009.
CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: J. Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia, Rio de janeiro, c.1790- c.1840. Rio de 
Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande e senzala. São Paulo: Global, 2003.
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
______. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1970.
REIS, João José. Rebelião escrava no Brasil: a história do Levante dos Malés em 1835. São Paulo: 
Brasiliense, 1986.
Tráfico negreiro e escravismo6
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 96
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloísa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2015.
VAINFAS, Ronaldo. Ideologia e escravidão: os letrados e a sociedade escravista no Brasil colonial. 
Petrópolis: Vozes, 1986. (Coleção História Brasileira, v. 8).
VIEIRA, Padre Antonio. Décimo Quarto Sermão do Rosário. In: ______. Sermões. Porto: Livraria 
Lello & Irmão, 1945 [1633]. v. 11. p. 285-321.
 Resolução 
1. Desde que se estabeleceu o projeto de explorar economicamente a costa brasileira 
pelo cultivo intensivo de cana-de-açúcar, o emprego de mão de obra escrava foi tido 
como indispensável. Tratava-se de uma resposta à ausência de mão de obra livre 
disponível e à necessidade de produzir em larga escala para o mercado exportador.
 Para os colonizadores, a prática podia ser considerada aceitável em face da desumani-
zação dos africanos, alienados por não se conformarem aos parâmetros de cristandade 
e costumes dos europeus. A Igreja, por sua vez, dava suporte à prática escravocrata, 
estimulando os escravos a aceitarem sua condição como uma forma de redenção.
2. O primeiro modelo de escravidão encontrado entre os povos da África Ocidental, 
aonde primeiro chegaram os portugueses, era bastante limitado e essencialmente 
doméstico. A posse de escravos, obtidos pela prática da captura de cativos em con-
frontos tribais ou entre reinos, era um grande símbolo de status, posto que trazia 
comodidades, prestígio e excedentes materiais àqueles que poderiam possuí-los. O 
contato com as caravanas de comércio que ligavam o continente africano ao Oriente 
Médio mudaria essa dinâmica, impondo uma demanda cada vez maior por mão de 
obra escrava.
3. A fala do Padre Antônio Vieira busca traçar paralelos entre o sofrimento de Cristo e 
o dos escravos que trabalhavam nos engenhos, comparando, por exemplo, a nudez, 
os escárnios e os intrumentos de madeira que caracterizam tanto o suplício crístico 
quanto o dos escravos. Até mesmo o uso do termo torcular é comum ao engenho e à 
cruz de Cristo.
 Fica claro que a intenção do Padre é criar uma identificação entre os escravos e Cris-
to, aproximando-os da religiosidade católica, tal como já era feito com os indígenas 
brasileiros. Buscava-se, dessa forma, ampliar o alcance da cristandade portuguesa 
nas Américas, bem como, possivelmente, acalmar ânimos exaltados com relação ao 
regime exploratório de trabalho.
4. A influência africana na cultura brasileira é forte e repercute justamente em alguns 
dos pontos pelos quais essa cultura é historicamente mais conhecida: sua música, 
sua gastronomia e manifestações específicas como o samba, o carnaval e a capoeira.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 97
7
A mineração e o Brasil colonial 
setecentista (séc. XVIII)
A abrangência do território brasileiro que se desdobrava para além da região cos-
teira primeiramente ocupada era tentadora e convidava à exploração. No século XVI, 
os primeiros aventureiros partiram para o interior, o sertão – como viriam a ser conhe-
cidas as regiões distantes do litoral ocupado –, em busca de metais e pedras preciosas.
Apenas no século XVII, no entanto, seria encontrado ouro na região das Minas Gerais. 
A descoberta, em conjunção com o declínio da economia canavieira litorânea, motivaria 
uma verdadeira corrida do ouro, uma migração maciça em direção à região das minas, 
que se tornaria um novo centro econômico e cultural da Colônia. No quadro mais amplo, 
o influxo de riquezas para Portugal permitiria a acumulação de reservas financeiras, 
após sucessivas perdas para outros reinos no campo da economia internacional.
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 98
7.1 Circunstâncias da instituição 
da economia mineradora
Entre o fim do século XVI e o início do XVII, Portugal esteve preso à União Ibérica e às 
políticas da Coroa espanhola. Em 1640, quando os lusitanos se viram finalmente livres dessa 
união e a Coroa de Portugal foi restaurada, a marinha portuguesa se encontrava em estado 
de decadência, tal como seus negócios no Oriente. Assim como o comércio de especiarias 
das Índias, o comércio do açúcar brasileiro precisava competir com o produto holandês. 
A procura de novos recursos nas colônias foi então uma das medidas implementadas por 
Portugal para colocar sua economia novamente em forma. O cultivo do tabaco forneceria 
uma suplementação de renda para a economia canavieira em declínio, e a criação de gado, 
visando à importação de couro para a Europa, também seria um recurso valioso, assim 
como a exploração das drogas do sertão, especiarias e ervas medicinais encontradas no in-
terior do Brasil. O próximo grande ciclo econômico, todavia, não estava na agricultura, na 
pecuária ou no extrativismo vegetal, e sim na mineração.
Se por um lado a União Ibérica havia prejudicado os negócios portugueses, por ou-
tro os aventureiros brasileiros souberam tirar proveito da queda dos limites do Tratado de 
Tordesilhas decorrente da integração das Coroas. Circulando entre os territórios espanhol e 
português na América do Sul, com o propósito de escravizar indígenas e capturar escravos 
fugidos, entradas e bandeiras procuravam também por riquezas minerais. Fernão Dias Paes 
Leme, por exemplo, tornar-se-ia célebre por morrer no sertão brasileiro, em busca de esme-
raldas. Pode-se se supor que vários outros bandeirantes pereceram em razão de doenças 
tropicais ou de confrontos com os indígenas, sem jamais terem tido sucesso na busca por 
ouro, prata e pedras preciosas.
Os metais preciosos tinham preocupado os portugueses desde o início da co-
lonização. As prematuras descobertas castelhanas no México e no Peru incen-
diaram as imaginações, e tornara-se crença arraigada que qualquer território da 
América encerrava necessariamente os preciosos metais. Com a esperança de 
encontrá-los, não foram poucos os aventureiros que desde o primeiro momento 
da ocupação do litoral brasileiro se tinham internado pelo território desconheci-
do. Deles ficariam notícias vagas, pois quase todos se perderam: quando escapa-
vam dos obstáculos de uma natureza agreste, iam acabar às mãos dos indígenas. 
(PRADO JÚNIOR, 1970, p. 37)
Essas riquezas finalmente começaram a ser descobertas na virada do século XVII para 
o XVIII, na região de Minas Gerais. Nas décadas seguintes, outras descobertas seriam feitas 
também no Mato Grosso e em Goiás. Em 1697 foi emitida uma carta régia para o governador 
da capitania do Rio de Janeiro, na qual a Coroa lusa se comprometia a colaborar com 600 
mil réis anuais, a fim de auxiliar no suprimento das expedições. A medida era necessária, 
posto que as primeiras jazidas foram encontradas em regiões carentes de infraestrutura, que 
dificilmente poderiam sustentar autonomamente os exploradores e a mão de obra escrava 
então considerada fundamental para a extração aurífera. Paulistas que se candidatassem a 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
7
99
explorar as novas terras, beneficiando Portugal com um novo influxo de prosperidade, se-
riam recompensados com títulos e honrarias comparáveis aos de um fidalgo. As condições 
estavam assim estabelecidas para uma corrida do ouro na América portuguesa.
Os suprimentos alcançavam os exploradores por meio de expedições fluviais conheci-
das como monções. O nome se referia à época do ano em que tais expedições eram lançadas, 
entre março e abril, período propício para a navegação. As monções eram fundamentais 
para ligar a região de São Paulo aos remotos povoados mineradores no Mato Grosso.
A imagem a seguir mostra uma pintura de Pedro Américo, Partida da Monção, que re-
presenta o carregamento de embarcações rústicas para suprir os trabalhadores das minas. É 
importante frisar que se trata de uma representação posterior, feita em 1897, já como parte 
do processo de formação de uma memória nacional, a qual glorificava o passado, com gran-
de reverência aos eventos considerados cruciais para a formação do Brasil.
Figura 1 – ALMEIDA, Júnior. Partida da Monção. 1897. Óleo sobre tela, color.: 120 x 73 cm. 
Pinacoteca de São Paulo, São Paulo, SP. 
Ao contrário do que ocorrera anteriormente com outras atividades econômicas funda-
mentais à Colônia, a mineração foi, desde o início, uma atividade estritamente regulada pelo 
Estado português, sujeita a normas, tributos e punições rigorosamente estabelecidos. A des-
coberta de novas jazidas de metal devia ser sempre comunicada à intendência de cada capi-
tania, a qual encaminhava funcionários ao local para catalogar e dividir a mina em terrenos, 
que eram então cedidos para interessados que se apresentassem no local e hora marcados 
para a distribuição. Se não começassem a produzir no prazo de quarenta dias, os terrenos 
deveriam ser devolvidos. As concessões, chamadas datas, só poderiam ser vendidas se fosse 
comprovado que o minerador havia perdido todos os seus escravos, o que impossibilitaria 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 100
a exploração. Candidatos que alienassem um terreno pela segunda vez perdiam definitiva-
mente o direito de administrar uma data.
Esse rigor era, para as autoridades lusitanas, fundamental em termos de controle eco-
nômico e social. A potencial riqueza das minas de ouro atraíra um número impressionante 
de pessoas da Metrópole e de outras regiões da Colônia: o surgimento de novos povoados 
em regiões remotas ameaçava produzir uma situação de desequilíbrio, talvez abrindo es-
paço para um clima de desordem e sonegação dos tributos devidos à Coroa. Uma pesada 
taxação era imposta sobre a produção aurífera da colônia, o quinto, correspondendo, como 
sugere o nome, à quinta parte do ouro extraído anualmente.
A cobrança deste quinto do ouro tem uma história longa e agitada. Os minerado-
res naturalmente sempre procuraram se furtar a um tão grande desfalque da sua 
produção; e compreende-se como devia ser difícil a fiscalização. Viveu-se por isso 
nas minas em luta constante: o fisco reclamando e cobrando seus direitos, os mine-
radores dissimulando o montante da produção [...]. (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 38)
Dado que os colonos frequentemente tentavam se evadir do pagamento do quinto, a 
Coroa portuguesa tentou mais de um modelo para impô-lo. Entre 1734 e 1750, por exemplo, 
foi imposto o sistema de capitação, que implicava em uma tributação sobre cada escravo e 
trabalhador livre, ainda que estes apenas tivessem realizado trabalhos preliminares que se 
revelassem infrutíferos, não oferecendo qualquer retorno. Em 1750, no entanto, o Marquês 
de Pombal substituiu o sistema de capitação, fixando o valor da contribuição anual em 100 
arrobas (1.500 quilos) de ouro.
Em todos os casos, quando a Colônia falhava em atender às demandas estipuladas do 
quinto, as autoridades portuguesas compensavam a diferença realizando a derrama, que 
consistia no confisco sistemático de bens de ouro dos colonos até que fosse atendida a cota. É 
evidente que a tendência natural das reservas de minério sempre seria decrescer, causando 
uma inexorável redução na disponibilidade de metal a ser extraído e, consequentemente, 
tornando mais e mais difícil para os colonos brasileiros o cumprimento das demandas go-
vernamentais por ouro.
O ouro era mercadoria muito facilmente escondida graças a seu alto valor em pe-
quenos volumes. E para obviar os descaminhos que apesar de toda fiscalização 
ainda se verificassem, fixou-se uma certa quota [...]. Quando o quinto arrecadado 
não chegava a estas 100 arrobas, procedia-se ao derrame,isto é, obrigava-se a 
população a completar a soma. Os processos para consegui-lo não tinham regu-
lamento especial. Cada pessoa, minerador ou não, devia contribuir com alguma 
coisa, calculando-se mais ou menos ao acaso suas possibilidades [...]. Qualquer 
processo era lícito, contanto que se completassem as 100 arrobas do tributo. 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
7
101
Pode-se imaginar o que significava isto de violências e abusos [...]. Isto durava 
não raro muitos meses, durante os quais desaparecia toda e qualquer garantia 
pessoal. (PRADO JÚNIOR, 1970, p. 39)
Muitos colonos buscavam formas engenhosas de ocultar o ouro coletado para ampliar 
seus ganhos, mas a riqueza das minas também servia ao propósito do engrandecimento 
regional e da formação de uma identidade que se materializou na arquitetura e em outras 
artes visuais. Cidades como Vila Rica (atual Ouro Preto), mais que grandes centros de pro-
dução aurífera, tornar-se-iam símbolos vivos de uma era e da sociedade que dela emergiu.
Também não se pode perder de vista a importância que os africanos escravizados tive-
ram para o desenvolvimento econômico das regiões das minas. Eduardo França Paiva (2002) 
ressalta que muitos dos indivíduos trazidos através do Atlântico possuíam experiência com 
mineração em seu continente de origem, frequentemente tendo maior domínio técnico das 
práticas de extração mineral que seus senhores portugueses.
Esses homens e mulheres africanos, embarcados na Costa da Mina com destino 
ao Brasil, eram tradicionais conhecedores de técnicas de mineração do ouro e do 
ferro, além de dominarem antigas técnicas de fundição desses metais. Eles conhe-
ciam muito mais sobre a matéria que os portugueses, antigos parceiros comerciais 
dos reinos negros da África, vorazes consumidores do ouro desse continente e 
senhores de enorme extensão territorial no Novo Mundo. Ao que parece, o poder 
quase mágico dos Mina para acharem ouro e a sorte na mineração associada a uma 
concubina Mina eram, na verdade, aspectos alegóricos de um conhecimento técni-
co apurado, construído durante centenas de anos, desde muito antes de qualquer 
contato com os reinos europeus da era moderna. (PAIVA, 2002, p. 187)
É importante frisar que mesmo entre os séculos XVIII e XIX, quando a atividade mine-
radora se encontrava em declínio, as regiões mineradoras apresentaram ainda um cresci-
mento populacional e grande importação de escravos. Portanto, é inexata a visão de que a 
região entrou em decadência econômica à medida que o ciclo do ouro se aproximava do fim. 
Tudo indica que as atividades manufatureiras e agropastoris supriam não apenas a grande 
demanda de mercado interno dos mineradores, como também a exportação para outras re-
giões da Colônia, tornando-se, assim, uma atividade econômica fundamental.
Ao compreender como se processou essa diversificação econômica, é possível explicar 
que, após a decadência dos níveis de extração mineral, as economias das regiões não te-
nham esfacelado, com evacuação massiva e surgimento de “cidades fantasmas”. Como se 
pode observar, as condições do estabelecimento da atividade mineradora na Colônia foram 
marcadas por diversas agendas, tensões, contradições e conflitos. Ao longo do ciclo do ouro, 
essas condições produziriam uma sociedade complexa e uma série de conflitos.
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 102
7.2 Conflitos entre os paulistas e os emboabas
A possibilidade de enriquecimento e enobrecimento por meio da exploração de metais 
e pedras preciosas atraiu grandes contingentes migratórios para as regiões auríferas, au-
mentando significativamente a população da Colônia.
Figura 2 – RUGENDAS, Johann Moritz. Comboio de diamantes passando pelo Catete. ca. 1835. 
Gravura, p&b. Biblioteca Digital Luso-Brasileira.
Entre os recém-chegados, havia um grande número de portugueses, o qual aumentava 
progressivamente a cada ano que passava. Era inevitável que se formasse um clima de tensão 
entre os paulistas, que se consideravam exploradores prioritários, por terem sido os primeiros 
a chegar à região, e os migrantes oriundos de outras partes do Brasil Colônia e da Metrópole.
Os paulistas eram predominantemente mestiços, como boa parte dos colonos brasileiros 
à época, e utilizavam amplamente a língua geral, derivada principalmente do tupi antigo 
falado pelas tribos do litoral, com infusões do português, de modo que passaram a utilizar o 
termo pejorativo emboaba para se referir aos recém-chegados, seus competidores na busca por 
ouro. O termo, compressão e adaptação de mboáb ou mbo’ab, é fonte de controvérsia e pode ter 
se originado de uma denominação dada pelos tupis da costa às aves com plumagem em volta 
das patas, o que seria uma referência ao uso de botas pelos migrantes, posto que os paulistas 
frequentemente andavam descalços (SCHWARCZ; STARLING, 2015, p. 12).
Como se pode concluir a partir das explicações já feitas, é fundamental não confundir os 
termos emboaba e português, embora isso seja um equívoco comum. Os antigos bandeirantes 
paulistas, então estabelecidos com apoio da Coroa e buscando melhorar seu status social, 
estavam unidos por suas origens nas imediações de São Paulo de Piratininga. Seus líderes 
provavelmente pensavam em si mesmos como nobres e homens da Coroa, embora adotas-
sem muitos hábitos distintos dos europeus, dormindo em redes e consumindo uma dieta 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
7
103
baseada na caça e nos derivados da mandioca. É possível que esses súditos enobrecidos 
da Capitania de São Vicente tenham hostilizado, sem distinção, quaisquer forasteiros que 
vieram para tirar proveito do ciclo do ouro. Entre estes novos exploradores, havia colonos 
oriundos de outras regiões da América portuguesa, não apenas da Metrópole em si.
No período entre 1700 e 1707, deu-se a fermentação dessas tensões entre paulistas e 
emboabas, envolvendo conflitos menores e tentativas de supressão de um grupo pelo outro. 
A produção de ouro caiu ao longo desses anos, e não foi apenas uma queda esperada em 
decorrência de esgotamento, mas porque os conflitos atrapalhavam os trabalhos.
Em 1708, estourou o conflito aberto, quando uma liderança paulista, Manuel de Borba 
Gato, e uma liderança emboaba, Manuel Nunes Viana, entraram em choque. Assim teve iní-
cio uma guerra de fato, marcada principalmente por emboscadas e tocaias que se tornariam 
folclóricas. Ao fim, os emboabas acabaram adquirindo a vantagem e buscaram desarmar os 
paulistas e instituir uma estrutura administrativa própria. Com seus privilégios perdidos e 
sem condições de prosseguir com a disputa, os paulistas abdicaram da luta. Muitos retor-
nariam a São Paulo; outros se deslocariam para o oeste, em busca de novas jazidas no Mato 
Grosso e em Goiás.
Toda a conjuntura do conflito representou um grande embaraço para a Metrópole, dei-
xando claro que as autoridades lusitanas precisavam ter uma presença mais forte no territó-
rio, de modo a garantir a ordem, evitando-se inquietações entre os colonos, e, acima de tudo, 
manter estável a arrecadação do quinto. A distribuição das datas e a cobrança do quinto pas-
saram então a ser observadas com mais rigor, os limites das capitanias de São Vicente e Rio 
de Janeiro foram redesenhados, dando autonomia à região, que foi convertida na Capitania 
de São Paulo e Minas de Ouro, e São Paulo foi elevada do status de vila ao de cidade.
7.3 A sociedade das Minas Gerais
O fim da Guerra dos Emboabas marcou um novo começo para a região. Terminadas as 
hostilidades e estabelecido um modelo mais forte de exploração econômica, a extração de 
ouro cresceria, tal como a arrecadação. Entre 1740 e 1760, as Minas Gerais se converteram na 
região mais rica do país, o que levou a um deslocamento do poderda região Nordeste para a 
região Sudeste. Em 1763, a capital da América portuguesa seria deslocada de Salvador para 
o Rio de Janeiro, que oferecia um porto muito mais próximo às regiões mineradoras e mais 
conveniente para o transporte do quinto de volta a Portugal.
Prado Júnior (1970, p. 39) compara a corrida do ouro mineira à californiana, que ocor-
reria no século XIX, nos Estados Unidos, ressaltando seu impacto agressivo ao mudar por 
completo a face da América portuguesa:
A mineração teve na vida da colônia um grande papel. Durante três quartos de 
século ocupou a maior parte das atenções do país, e desenvolveu-se à custa da 
decadência das demais atividades. O afluxo de população para as minas é, des-
de o início do séc. XVIII, considerável: um rush de proporções gigantescas, que 
relativamente às condições da colônia é ainda mais acentuado e violento que o 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 104
famoso rush californiano do séc. XIX. Isto já seria o suficiente para desequilibrar 
a vida do país e lhe transformar completamente o aspecto.
O crescimento motivado pelo ciclo do ouro teve consequências irreversíveis. O que po-
deria ter sido apenas um aumento no contingente populacional da Colônia acabou trazendo 
sérias implicações para a esferas locais da cultura e da política. À medida que surgiam novas 
vilas, como São João Del Rei, Mariana e Vila Rica, surgia também um mercado interno, 
uma massa de consumidores que necessitavam de produtos básicos, de modo que o açúcar 
e o gado da Colônia não eram mais reservados apenas para a exportação. E havia mais: à 
medida que setores dessas populações se tornavam ricos, requisitavam luxos comparáveis 
aos de que dispunham as classes altas na Europa.
Assim, foram lançadas as sementes para uma ativa vida artística e cultural. Jovens de 
famílias enriquecidas iam completar seus estudos na Europa e voltavam interessados em 
literatura, filosofia e nas ideias iluministas. Muitos se tornaram escritores, criando uma li-
teratura arcadista brasileira, profundamente interessada em louvar a simplicidade da vida 
no campo e a pureza dos valores pastoris, que eram idealizados pelas tendências estéticas 
setecentistas que predominavam na Europa da época.
As artes visuais também conheceram um período de grande vitalidade. A prosperidade 
proveniente das minas permitiu que surgisse um estilo Barroco típico do Brasil, opulento e 
devocional como o europeu, mas visualmente característico e reconhecível por suas parti-
cularidades. As igrejas barrocas de Minas Gerais, e em particular de Ouro Preto, onde um 
grande número de exemplares da arquitetura colonial encontra-se preservado, são facil-
mente identificáveis pelo contraste entre alvenaria nua e estuque branco, pelos tímpanos e 
frontões ricos em curvas e pela profusão de ouro nas decorações internas.
Figura 3 – Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Ouro Preto, tombada pelo Instituto do 
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Fonte: mtcurado/iStockphoto.
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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105
Além do ouro, os interiores das igrejas eram decorados com pinturas. Havia certamente 
uma carência de mão de obra especializada em comparação com o cenário encontrado na 
Europa, mas o nome do pintor e escultor Manoel da Costa Ataíde, mais conhecido como 
Mestre Ataíde, destaca-se. As obras do artista demonstram técnicas refinadas de pintura, 
como as distorções de perspectiva nas pinturas de teto, que realçam o efeito de verticalidade 
e transmitem a impressão de elevação e ampliação do espaço interno.
Entretanto, o maior expoente do Barroco brasileiro e da arte mineira setecentista per-
manece sendo Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho. Tendo escul-
pido em madeira e em pedra sabão, Aleijadinho foi extraordinariamente prolífico, dando à 
iconografia barroca local traços muito marcantes. Obras como os monumentos aos profetas 
bíblicos, situados no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, tornar-se-iam alguns dos tra-
balhos artísticos mais reconhecidos da História da Arte brasileira.
É importante salientar que, enquanto há uma obra historicamente atribuída a Antônio Francisco 
de Lisboa, a existência da figura de Aleijadinho é colocada em questão por pesquisadores 
como Guiomar de Grammont, devido à carência de evidências documentais sobre o artista 
(GRAMMONT, 2008, p. 85). O valor simbólico dado à produção artística individual é outra ques-
tão de importância nesse caso, uma vez que, naquela época, os artífices não desfrutavam do reco-
nhecimento que posteriormente seria a eles atribuído. A construção do “mito de Aleijadinho” é, 
em grande parte, resultado de um imaginário posterior, de glorificação dos “grandes nomes” da 
história nacional.
Para além do florescimento no campo artístico, havia também os campos da filosofia e 
da política. A infusão de ideias iluministas nos círculos da intelectualidade local não torna-
ria essa sociedade menos conservadora no que tocava às práticas cristãs, patriarcais e escra-
vistas, mas levaria à emergência de um dos movimentos mais importantes de nossa história: 
a Inconfidência Mineira.
Por fim, deve-se ressaltar que a sociedade das Minas era marcada por todas as tensões 
de uma sociedade do Antigo Regime, formada por uma hierarquia rígida e com pouca mar-
gem para mobilidade social. Conforme argumenta Souza (1994, p. 74),
[...] a formação social das Minas apresentava uma camada pequena de homens 
ricos e poderosos; uma camada média de artistas, artesãos, pequenos comer-
ciantes e pequenos mineradores que viviam com dificuldade [...]; uma extensa 
camada de homens livres pobres, quase sempre desocupados ou entregues a 
atividades intermitentes; uma camada numerosa, a maior de todas, de escravos, 
que, ante sua mísera condição de vida, recorriam com frequência à fuga, ao rou-
bo, à violência.
Embora, para muitos, a mineração tenha se apresentado como o caminho para uma as-
censão social que seria inviável na Metrópole, essa possibilidade frequentemente se revelava 
infrutífera, gerando não uma vasta população de colonos prósperos, como se esperava, mas 
uma sociedade marcada por muitas contradições.
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 106
 Ampliando seus conhecimentos
Johann Moritz Rugendas (1802-1858) foi um artista que fez parte da expe-
dição liderada pelo naturalista Georg Heinrich von Langsdorff, a qual 
percorreu o interior do Brasil em 1822. Entre 1827 e 1832, após retornar à 
Europa, o artista publicou o livro Viagem pitoresca através do Brasil, no 
qual expôs diversas litografias produzidas por ele ao longo da viagem.
Viagem pitoresca através do Brasil
(RUGENDAS, 1972 [1835], p. 36-37)
Escavam-se longos canais condutores a fim de trazer a água até o lugar 
que se deseja explorar. Gradis aí colocados retêm as pedras mais grossas, 
deixando passar, com a água, a areia e o pedregulho ou cascalho. Esses 
reservatórios, chamados mundéus, são constantemente remexidos para 
que o ouro, se purifique e, ao depositar-se no fundo, esvazia-se a água 
a qual carrega o cascalho. Pode-se também recolher o ouro, ou melhor a 
areia aurífera, em couros de bois ou cobertores de lã grosseira sobre os 
quais o minério é depositado pelas águas vindas da montanha.
[Os faiscadores] entram na água até a cintura e recolhem a areia do rio 
numa bateia. Remexendo a bateia à superfície da água, deixa-se sair a 
terra e o cascalho, ficando o ouro, mais pesado, no fundo cônico da bateia.
Outros faiscadores preferem amontoar a areia dos rios, fazendo correr por 
cima um pouco de água para retirar as partes mais leves. O restante é 
levado para uma panela chata; aí lava-se e remexe-se esse amontoado de 
areia, fazendo-o passar por cima de um couro de boi; finalmente tudo é 
colocadode novo em uma gamela para uma última lavagem. [...]
História econômica do Brasil
(PRADO JÚNIOR, 1970, p. 40-41)
A ocorrência de rochas matrizes, isto é, grandes concentrações primitivas 
de ouro que resistiram ao processo geológico de desagregação, é no Brasil 
muito rara. E mesmo as concentrações existentes têm um teor aurífero 
baixo. A maior e mais rica mina de ouro do país há poucos anos abando-
nada, a de Morro Velho em Minas Gerais, tinha um teor de 10,4 gramas de 
ouro por tonelada de minério, quando o das minas consideradas de boa 
produtividade nos grandes centros auríferos da atualidade (a Austrália, 
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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107
p. ex.) atinge o dobro daquela taxa. Mas além da raridade e pobreza das 
rochas matrizes, outro obstáculo impediu os mineradores do séc. XVII de 
as explorarem: a sua técnica deficiente. Enquanto se tratou de depósitos 
superficiais de aluvião, não foi difícil extrair o metal. Mas quando foi pre-
ciso aprofundar a pesquisa, entranhar-se no solo, a capacidade dos mine-
radores fracassou; tanto por falta de recursos como de conhecimentos 
técnicos. Tentou-se às vezes, mas raramente, obviar ao primeiro inconve-
niente pela associação de esforços, organizando ligas ou sociedades para 
as quais entravam vários proprietários. Mas isto foi excepcional porque 
faltava o necessário espírito associativo. Quanto às deficiências técnicas, é 
preciso lançar a culpa principal sobre a administração pública, que man-
teve a colônia num isolamento completo; e não tendo organizado aqui 
nenhum sistema eficiente de educação, por mais rudimentar que fosse, 
tornou inacessível aos colonos qualquer conhecimento técnico relativo às 
suas atividades. O baixo nível intelectual na colônia, que não tem talvez 
paralelo na América, não cabe em nosso assunto; mas é preciso lembrá-lo 
porque interfere aqui diretamente com a economia do país. Não resta a 
menor dúvida que a ignorância dos colonos portugueses sempre consti-
tuiu um óbice muito sério oposto ao desenvolvimento de suas atividades 
econômicas; na mineração como nas outras também. Não é aliás apenas 
pelos obstáculos opostos à difusão de conhecimentos que a administração 
entravou o progresso da mineração e apressou sua decadência. O sistema 
geral que adotou ao regulamentá-la contribuiu também consideravel-
mente para isto. Nunca se cogitou seriamente de outra coisa que os quin-
tos, o tributo que os mineradores deviam pagar. Que fosse satisfeito, por 
bem ou à força; o mais não tinha importância. Mas com derrames e tudo, 
o quinto foi minguando; e durante meio século em que o rendimento bai-
xou em Minas Gerais (são os únicos dados de que temos notícias certas, e 
representam aliás a maior parte da contribuição colonial) de 118 arrobas 
em 1754, máximo percebido, para 35 apenas, exatamente cinquenta anos 
depois, não ocorreu sequer uma só vez à administração outra explicação 
que a fraude. Donde as violências referidas acima. Não se deu um passo 
para introduzir na mineração quaisquer melhoramentos; em vez de técni-
cos para dirigi-la, mandavam-se para cá cobradores fiscais. O pessoal com 
que se formavam as intendências eram burocratas gananciosos e legistas 
incumbidos de interpretar e aplicar os complicados regulamentos que se 
destinavam, quase unicamente, a garantirem os interesses do fisco. Não 
se encontra nelas, durante um século de atividade, uma só pessoa que 
entendesse de mineração. E enquanto os mineradores se esgotavam com 
o oneroso tributo que sobre eles pesava, qualquer crítica, objeção ou sim-
ples dúvida era imediatamente punida com castigos severos. [...]
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 108
 Atividades
1. Ao longo do século XVII ocorreu uma transição econômica na Colônia, com o foco 
produtivo mudando da agricultura de plantation para a mineração. Que fatores con-
duziram ao ciclo econômico da mineração? Qual foi o impacto dessa transição para 
a configuração geopolítica da Colônia?
2. Um dos conflitos mais marcantes do período colonial, estimulado, entre outros fa-
tores, pela exploração aurífera do sertão brasileiro, foi a Guerra dos Emboabas, um 
enfrentamento entre os colonos paulistas e os recém-chegados da Metrópole e de 
outras partes da Colônia (os emboabas). O que motivou esse conflito?
3. Os conceitos de quinto, capitação e derrama são fundamentais para compreender 
como era feito o gerenciamento tributário das atividades mineradoras na Colônia. 
Discorra sobre esses conceitos.
4. Com base nos textos complementares do capítulo, explique quais eram os principais 
desafios enfrentados pelos mineradores que trabalhavam na Colônia.
 Referências 
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009.
CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: J. Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
2001 [ca.1790-1840].
GRAMMONT, Guiomar de. Aleijadinho e o aeroplano o paraíso barroco e a construção do herói 
colonial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
PAIVA, Eduardo França. Bateias, carumbés, tabuleiros: mineração africana e mestiçagem no Novo 
Mundo. In: PAIVA, Eduardo França; ANASTASIA, Carla Maria Junho. (Org.) O trabalho mestiço: 
maneiras de pensar e formas de viver – séculos XVI a XIX. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: 
PPGH-UFMG, 2002. p. 187-207.
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
______. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1970.
RUGENDAS, Johann Moritz. Viagem pitoresca através do Brasil. São Paulo: Martins/USP, 1972 [1835].
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloísa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2015.
SOUZA, Laura de Mello e. Opulência e miséria das Minas Gerais. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 74. 
(Coleção Tudo É História).
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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109
 Resolução 
1. O severo declínio do cultivo açucareiro, até então a principal fonte de renda da Colônia, 
foi o primeiro fator, ocasionado pela concorrência com o produto que era produzido 
na América Central por competidores dos portugueses, como ingleses e holandeses. 
Esse declínio motivou a aceleração da busca por novos meios de reavivar a economia 
colonial, todavia, desde o século XVI, já se viam exploradores percorrendo o interior 
da Colônia em busca de outros recursos, o que incluía metais e pedras preciosas.
 No século XVII essa busca começou a dar frutos e as autoridades coloniais passaram 
a se dedicar à exploração sistemática do ouro, o que deslocaria o foco produtivo do 
litoral para o sertão. A região Sudeste, nessa conjuntura, passaria a ter maior rele-
vância econômica e política em relação ao Nordeste. A capital do Estado do Brasil, 
por fim, seria transferida de Salvador para o Rio de Janeiro, que estava mais próximo 
dos centros de mineração.
2. Os paulistas começaram a se deslocar para a região das Minas Gerais a partir de 
1697, motivados pela possibilidade de enriquecimento pessoal e pela promessa de 
elevação social a um status de nobreza comparável ao dos fidalgos portugueses. To-
davia, a possibilidade de enriquecimento pessoal não estava restrita a esses colo-
nos, atraindo também levas maciças de migrantes de outras partes da Colônia e de 
Portugal, os quais logo entraram em conflito com os paulistas pela supremacia na 
exploração das minas.
 O enfretamentosó teria resolução com a intervenção portuguesa, em 1709, que aca-
bou por mudar os limites das capitanias do Rio de Janeiro e de São Vicente, com as 
terras desta última sendo assimiladas à recém-formada Capitania de São Paulo e 
Minas de Ouro.
3. Ao contrário do que havia ocorrido com as atividades econômicas mais relevantes para 
a Colônia até então, como a extração do pau-brasil e a produção açucareira, a produção 
aurífera esteve desde o início sujeita a uma tentativa de controle restrito. As taxações 
impostas em nome da Coroa são expressões claras dessa intenção sistematizadora.
 O tributo chamado quinto constituía da quinta parte da produção anual de ouro da 
Colônia. As autoridades da Metrópole tentaram implementar o tributo de mais de 
uma forma, buscando prevenir casos de fraude e minas improdutivas. Um dos mo-
delos mais expressivos de controle da coleta do quinto foi o sistema de capitação, que 
consistia de uma taxa estabelecida sobre cada trabalhador das minas, fosse ele livre ou 
escravo, independentemente de ter sido frutífero ou não o trabalho investido.
 Por fim, a derrama consistia em um confisco utilizado para equilibrar as contas quando 
o ouro acumulado não correspondia às exigências da Metrópole, podendo ser subtraí-
A mineração e o Brasil colonial setecentista (séc. XVIII)7
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 110
dos bens pessoais de ouro de todos os colonos até que fosse preenchida a cota, a qual, 
nos tempos do Marquês de Pombal, foi fixada em 100 arrobas (1.500 quilos) anuais.
4. Entre as dificuldades mais gritantes estava a própria disponibilidade de minério rico 
em ouro. A principal fonte dos mineradores da Colônia era o ouro de aluvião, o qual 
precisava ser extraído de forma primitiva e ineficiente pelos faiscadores, por meio de um 
processo que envolvia repetidas lavagens e um conjunto bastante limitado de utensílios.
 Um problema apontado por Prado Júnior era a falta de expertise, ou conhecimento 
técnico. Muitos dos mineradores, por sua vez, não possuíam experiência significati-
va com a prática da extração de minério, sendo frequentemente indivíduos oriundos 
de outros ofícios, atraídos apenas pela promessa de riquezas que pudessem ser obti-
das de forma rápida e relativamente fácil.
 Mas não eram apenas os mineradores que sofriam pela falta de conhecimentos 
práticos. Os encarregados das intendências frequentemente não tinham qualquer 
vivência com a exploração aurífera, sendo principalmente burocratas, muitas ve-
zes corruptos, interessados apenas em garantir o fluxo dos ganhos para o fisco. À 
medida que minguavam os ganhos, em decorrência do esgotamento natural das 
jazidas mais superficiais, por exemplo, suspeitava-se sempre de fraude por parte 
dos colonos. Conforme cita Prado Júnior: “Não se deu um passo para introduzir 
na mineração quaisquer melhoramentos; em vez de técnicos para dirigi-la, manda-
vam-se para cá cobradores fiscais”.
 Entretanto, um contraponto à argumentação do historiador, como vimos, é a consta-
tação de que a expertise dos escravizados revelou-se importante para o trabalho nas 
minas, posto que muitos já tinham experiência prévia com a extração de minerais em 
seu continente de origem. Essa descoberta sobre o conhecimento técnico dos traba-
lhadores negros permite revisitar o contexto do ciclo do ouro e repensar concepções 
já sedimentadas, dando novas dimensões à historiografia do período.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 111
8
As revoltas coloniais e as 
contestações políticas
O estabelecimento de uma colônia portuguesa não ocorreu sem tensões de naturezas 
diversas. Carentes de condições para povoar um território vasto e já tendo outras colô-
nias para cuidar no Atlântico, no Oriente e na África, os portugueses tentaram primeira-
mente utilizar o Brasil como fonte de recursos naturais, modelo que precisou ser repen-
sado quando outras Coroas passaram a demonstrar interesse na ocupação do território. 
Ambos os modelos produtivos adotados a partir de então, a plantation açucareira 
e a mineração, exigiam grandes contingentes de escravos e eram estabelecidos num 
contexto de redes de comunicação problemáticas, administrações ausentes e insufi-
ciências técnicas que tornavam os processos produtivos mais caros e menos eficientes. 
A conjuntura do trabalho escravo, por sua vez, resultava em revoltas e confrontos, por 
vezes de larga escala. A chegada de levas maciças de migrantes da metrópole durante 
a “corrida do ouro” do século XVIII tornaria esses problemas cada vez mais evidentes, 
produzindo também um cenário de conflito entre os habitantes livres da colônia. A 
resposta de Portugal seria, então, a imposição de um governo mais centralizado, orga-
nizado e restritivo, o que viria a causar insatisfação entre os colonos brasileiros.
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 112
8.1 Conjuntura das contestações políticas
O século XVIII traria muitas mudanças para a vida na Colônia. Na esteira da restaura-
ção de sua monarquia, Portugal estava em uma situação econômica difícil. Tendo perdido 
recursos e inclusive parte de sua marinha após décadas atado à União Ibérica, o Estado 
português precisava maximizar seus ganhos e restaurar seu prestígio. Assim, os lusitanos 
buscariam implementar políticas mais coesas de povoamento, organização e tributação das 
colônias. A criação do Conselho Ultramarino, em 1642, tinha justamente esse propósito: 
centralizar a administração colonial e uniformizar as políticas a serem implementadas nas 
possessões do Brasil, do Oriente, da África e do Atlântico.
Essas reformas impactariam severamente a vida política na colônia brasileira. Foram 
impostos limites aos poderes das câmaras municipais, que anteriormente haviam concen-
trado todo o poder político, regulamentando e fiscalizando os ofícios, o comércio e ações 
militares. As sessões das câmaras eram presididas por juízes ordinários, eleitos pelos co-
lonos, os quais seriam então substituídos por juízes de fora, nomeados pelo rei português. 
A função desses novos juízes seria garantir que, na remota Colônia, se fizesse valer a lei 
portuguesa, garantindo que os interesses da Metrópole não fossem feridos.
Crucial para essa transição foram as ideias iluministas sobre política e economia. Em 
Portugal, influências desse pensamento seriam sentidas durante o reinado de D. José I (1714-
1777), caracterizado por inúmeras reformas, em meio a um período hoje conhecido como 
Reformismo Ilustrado. As reformas ilustradas foram políticas imperiais empregadas pelas 
monarquias ibéricas com vista ao fortalecimento de suas posições e à concentração de poder. 
O representante mais importante do Reformismo português foi Sebastião José de Carvalho 
e Melo, 1º Conde de Oeiras e Marquês de Pombal (1699-1782), que atuou como Secretário 
de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra de D. José I, entre 1750 e 1755, e também 
como Secretário de Estado dos Negócios Interiores do Reino, de 1756 a 1777.
Considerado o chefe efetivo do governo, Pombal implementou mudanças como a abo-
lição da escravatura nas Índias Portuguesas e o fim da perseguição aos cristãos novos, su-
primindo em grande parte o poder da Inquisição. Aliás, as reformas de Pombal visavam 
suprimir o poder da Igreja em favor da formação de uma sociedade iluminista, pautada 
pelos valores da racionalidade e da agregação de aspectos do pensamento liberal. Por outro 
lado, havia questões administrativas, e não apenas filosóficas, em jogo: o clero constituía, 
em muitos aspectos, um poder paralelo muito forte nas possessões ibéricas, quase como um 
poder concorrente ao da Coroa. 
Inclusive as medidas educacionais de Pombal, que buscariam distanciar os mecanis-
mos de formação básica das instituições eclesiásticas, foram questionadas. No Brasil, es-
sas reformas seriam sentidas principalmente no estabelecimento de um regime rigoroso de 
As revoltas coloniais e ascontestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
8
113
tributação e na supressão dos jesuítas. Das medidas pombalinas que mais impactaram na 
Colônia, destacam-se:
• a intensificação da fiscalização da exploração de ouro;
• a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1759;
• a criação de escolas laicas;
• a abolição das capitanias hereditárias, também em 1759, reestruturando signifi-
cantemente a organização territorial em vigor desde o século XVI, que se tornaria 
algo mais semelhante a um modelo provincial de governo;
• a transferência da capital de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763.
8.2 Tensões provinciais, conflitos de 
fronteira e revoltas nativistas
As inquietações de natureza política que fervilhavam na América portuguesa do pe-
ríodo não eram influenciadas apenas por questões filosóficas e administrativas oriundas 
da Europa, mas também pelos confrontos orgânicos que afligiam as regiões limítrofes das 
colônias, forçando Portugal e Espanha a um impasse em suas terras no Novo Mundo.
Os limites territoriais da Colônia passariam por sucessivas tensões ao longo dos sécu-
los XVII e XVIII. Durante todo o domínio da União Ibérica, bandeirantes constantemente 
cruzaram a linha estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas em busca de escravos e riquezas, 
tirando proveito da fusão das Coroas de Espanha e Portugal. Após a restauração da Coroa 
lusitana, povoados foram estabelecidos no atual Sul do Brasil, a fim de assegurar uma par-
cela do lucrativo comércio da Bacia do Rio Prata, como Desterro (1658), Rio Grande (1737), 
Porto Alegre (1742) e Sacramento (1678).
Os interesses expansionistas de Portugal, nas fronteiras da América portuguesa, resul-
tariam em atritos com a Espanha. Sucessivos tratados foram assinados entre as duas Coroas 
a fim de sanar essas disputas: a princípio, os Tratado de Lisboa, em 1681, o Tratado de 
Utrecht, em 1715, e o Tratado de Madrid, em 1750. Este último cedia boa parte do territó-
rio brasileiro atual aos portugueses, de acordo com o princípio de que a posse da terra era 
de Portugal com base em sua ocupação e uso. Pelo mesmo tratado, porém, Portugal cedia 
a colônia de Sacramento à Espanha, lançando as bases para o futuro território uruguaio. 
Os subsequentes Tratado de Santo Idelfonso, em 1777, e o Tratado de Badajoz, em 1801, 
viriam a ratificar os contornos dos domínios coloniais lusos e espanhóis na América do Sul, 
constituindo de forma decisiva o futuro territorial do Brasil em formação.
No entanto, esse território português, cada vez mais amplo, consolidado e marcado 
por limites muito semelhantes aos do Brasil atual, também seria afligido por confrontos 
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 114
internos. Disputas entre os colonos e as autoridades responsáveis pela gerência desses do-
mínios e de suas riquezas resultariam em sucessivas revoltas.
Talvez o primeiro levante contra a autoridade portuguesa tenha sido a organização da 
Confederação dos Tamoios, uma aliança de povos tupis do litoral apoiada pelos franceses, 
que lançou ataques contra as posições portuguesas em 1562. Entretanto, esse levante foi pa-
cificado pela mediação diplomática de duas lideranças jesuíticas: Manuel da Nóbrega e José 
de Anchieta. Seria, contudo, a partir do século XVII que ocorreria uma cadeia de revoltas na 
Colônia, em grande parte motivadas pelas ondas de mudanças que atingiam a Metrópole na 
Europa, repercutindo na vida econômica dos colonos.
As primeiras revoltas somavam o fator econômico, visto que eram lideradas por elites 
locais, principalmente latifundiários do açúcar proprietários de escravos, a um crescente 
elemento nativista, um sentimento de fidelidade à Coroa, de orgulho e unidade, que emer-
giu principalmente após a expulsão dos holandeses. A união necessária para enfrentá-los 
em batalha havia criado pela primeira vez certo senso de identidade entre os colonos, que já 
acumulavam gerações estabelecidas na costa atlântica, por vezes vendo Portugal como uma 
realidade demasiadamente distante. Esse mesmo senso despertaria ainda insatisfação quan-
do os colonos sentiram que estavam sendo prejudicados economicamente ou preteridos em 
favor de comerciantes e burocratas portugueses, bem como de colonos recém-chegados. 
Outra interpretação pode trazer ainda um terceiro fator à discussão: a insatisfação dos 
colonos viria, de seu ponto de vista, de uma quebra do pacto entre vassalos e soberanos nas 
relações entre Colônia e Metrópole. As revoltas teriam sido, assim, manifestações dos colo-
nos contra aquilo que viam como injustiças, mas não tentativas de romper com a autoridade 
real portuguesa. 
As principais revoltas dessa fase inicial foram a Aclamação de Amador Bueno (1641), 
a Revolta de Beckman (1684), a Guerra dos Emboabas (1707-1709), a Guerra dos Mascates 
(1710) e a Revolta de Vila Rica (1720).
A Aclamação de Amador Bueno ocorreu em São Paulo. Os paulistas se sentiam profun-
damente negligenciados pelo projeto colonial da Metrópole. A economia local era em grande 
parte estimulada pela livre atuação das bandeiras, que atacavam missões e escravizavam os 
índios que as ocupavam, e pelo contrabando com a região do Rio da Prata. Quando teve fim 
a União Ibérica e a monarquia portuguesa foi restaurada, os paulistas temiam perder esse 
comércio, sentindo-se também prejudicados com a proibição da escravidão indígena, pro-
mulgada pela Coroa, que muito lucrava com as taxas sobre o tráfico negreiro no Atlântico. A 
resposta dos locais foi tentar aclamar como rei de São Paulo um rico capitão local chamado 
Amador Bueno. Entretanto, após a Restauração, Amador jurou lealdade ao novo rei portu-
guês, no que foi seguido pelas elites paulistas, que não tinham poderio econômico ou militar 
para confrontar a Metrópole na época.
As revoltas coloniais e as contestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Em 1684 ocorreria a Revolta de Beckman, no Maranhão, motivada, em um primeiro 
momento, pela disputa entre os colonos e os jesuítas. Os colonos locais desejavam escravizar 
os índios para suas plantações, posto que os gastos envolvidos na luta contra os holandeses 
os haviam tirado a capacidade de arcar com a compra de escravos africanos. Entre outros 
fatores, o domínio que os holandeses exerciam sobre o comércio de escravos nesse período 
veio também a limitar o acesso à mão de obra oriunda da África. 
Todavia, em seu intento de escravizar as populações indígenas, os colonos contavam com 
a oposição da Companhia de Jesus, que buscava atrair os indígenas para suas reduções, con-
vertendo-os. Uma vez convertidos, em princípio, eles não poderiam mais ser escravizados.
A esses fatores se somou a insatisfação resultante das condições, consideradas injus-
tas, estabelecidas pela Companhia de Comércio do Estado do Maranhão, uma companhia 
mercante que exercia o monopólio de compra e venda da produção maranhense. Assim, 
quando o governador se encontrava ausente, os ricos irmãos Manuel e Tomás Beckman, 
acompanhados por outros proprietários, depuseram o capitão-mor e assumiram o controle 
da capitania, formando uma junta de governo. Durante sua gestão, expulsaram os jesuítas e 
a Companhia de Comércio e enviaram um emissário a Portugal, portando suas reclamações. 
O movimento findou com a nomeação de um novo governador, Gomes Freire de Andrade. 
As decisões da junta foram revogadas, e os líderes da rebelião foram mortos em 1685. O go-
verno português acalmou os ânimos dos colonos pondo fim à Companhia de Comércio do 
Maranhão, mas os jesuítas puderam voltar à capitania e trabalhar como antes.
Em 1709 eclodiu a Guerra dos Emboabas, que foi uma luta pelo controle das minas de 
ouro recém-descobertas em Minas Gerais. A disputa se deu entre os bandeirantes paulistas e 
os emboabas, os colonos vindos de outras partes do Brasil e de Portugal. A guerra terminou 
com a vitória dos emboabas e uma postura mais rígidade Portugal em relação à administra-
ção da economia aurífera na Colônia.
A Guerra dos Mascates, de 1710 a 1711, ocorreu em Pernambuco e foi um confronto de 
interesses entre os proprietários que compunham a aristocracia canavieira de Olinda e os co-
merciantes de Recife, conhecidos como “mascates”. Isso porque esses últimos, muitas vezes 
recém-chegados da Metrópole, eram vistos como forasteiros e arrivistas que prejudicavam 
os interesses econômicos dos primeiros.
A decadência da cultura açucareira, que precisava então concorrer com a produção 
holandesa e a inglesa na América Central, levou os senhores de engenho ao declínio, de 
modo que acabaram por contrair dívidas com os comerciantes portugueses de Pernambuco, 
onde estavam sediados os detentores do monopólio sobre o escoamento da produção local. 
No entanto, Olinda ainda tinha sua própria câmara municipal, o que lhe dava autoridade 
administrativa sobre Recife.
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 116
Quando o rei D. João V elevou Recife ao status de vila, em 1709, a pedido dos mascates, 
proporcionando autonomia política em relação a Olinda, tiveram início as inquietações. O 
governador, simpático aos mascates, sofreu um atentado, o que o levou a tomar medidas 
rígidas contra os olindenses, que iniciaram um levante em 1710, invadindo o Recife, onde 
derrubaram o pelourinho e depuseram o governador, o qual fugiu para a Bahia. Assumindo 
como governador, o bispo Manuel Álvares da Costa anistiou os rebeldes. Havia então um 
projeto de emancipação política de Pernambuco, que seria declarada república, ao estilo do 
regime adotado por Veneza, na Itália. A revolta foi suprimida com a chegada de Felix José 
Machado, o novo governador nomeado. Machado ordenou a prisão dos líderes e ratificou a 
nomeação de Recife como vila, convertendo-a na capital da capitania. O levante se revelaria 
importante, ainda, por introduzir o conceito de possível ruptura com a ordem colonial, in-
cluindo a inviolabilidade da autoridade dos reis. 
Segundo Schwarcz e Starling (2015, p. 141),
[...] apesar de a sedição de 1710 ter sido um conflito municipal, as ideias se mo-
vimentaram além de Pernambuco. Os sediciosos de Olinda conjugaram pela pri-
meira vez na América portuguesa independência a autogoverno e declararam 
preferir a forma republicana ao governo dos reis. Cerca de sessenta anos depois, 
o termo “autogoverno” já fazia parte do vocabulário político da colônia – e era 
utilizado com incômoda frequência, para infelicidade da metrópole. 
Em 1720, ocorreria a Revolta de Vila Rica ou Revolta de Filipe dos Santos, motivada 
pelas condições de vida precárias e pela criação das casas de fundição, que monopolizavam 
a conversão do ouro em barras, a fim de que fosse devidamente “quintado”, ou seja, que 
recebesse o desconto referente ao quinto exigido pela Coroa. Permitia-se, assim, que apenas 
ouro em barras circulasse legalmente, evitando-se a sonegação e o contrabando. 
Além disso, tal como ocorria em Pernambuco, o comércio de gêneros alimentícios, uten-
sílios e roupas era monopólio dos portugueses, os quais supostamente cobravam mais por 
seus artigos à medida que os ganhos da mineração se tornavam mais evidentes. O levante 
foi então promovido por mineiros influentes, que adotaram como principal líder Filipe dos 
Santos Freire. Os rebeldes invadiram a câmara e exigiram que seu pleito fosse atendido; do 
contrário, não deporiam as armas.
No quadro Julgamento de Filipe dos Santos (Figura 1), o artista Antonio Parreiras apresen-
tou uma interpretação da revolta, numa ação bem posterior, já em um contexto republicano. 
Nessa conjuntura (a Primeira República), havia uma demanda por narrativas grandiosas 
que tratassem da consolidação de uma identidade nacional, contribuindo para uma história 
“mítica” do país. Enquanto os levantes ocorridos em séculos anteriores tratavam de reivin-
dicações locais, que não refletiam uma emancipação nacional do domínio português, para o 
imaginário republicano essa perspectiva mítica seria de grande importância.
As revoltas coloniais e as contestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Figura 1 – PARREIRAS, Antonio. Julgamento de Filipe dos Santos. 1923. Óleo sobre tela, color.: 83 
x 149 cm. Museu Antonio Parreiras, Niterói, RJ. 
O governador de Minas, Conde de Assumar (1717-1721), anunciou ao povo das Minas 
que atenderia às exigências dos revoltosos, mas logo organizou um contingente de cavalaria, 
os “Dragões”, e avançou sobre Vila Rica com grande violência. Todos os líderes do levante 
foram presos e Filipe dos Santos, que não possuía títulos ou grande riqueza e era o principal 
representante dos mineiros das camadas mais baixas da sociedade, foi enforcado e esquar-
tejado. A revolta, que tinha uma motivação econômica, mas não emancipacionista, seria um 
prenúncio da Inconfidência Mineira, a qual, décadas depois, ocorreria na mesma região.
8.3 Revoltas emancipacionistas
A segunda fase das revoltas se caracterizaria não mais pela imposição apenas de in-
teresses econômicos ou disputas locais entre “nativos” e “forasteiros”, mas por tentativas 
deliberadas de promover a dissidência em relação ao domínio português. 
Assim como as primeiras rebeliões, as revoltas emancipacionistas constituíram um qua-
dro complexo e heterogêneo, devendo cada contexto ser observado segundo um conjunto 
de especificidades locais. Embora a ideia de Brasil ainda não existisse, de modo que não se 
pode falar em uma nítida intenção de “libertar a Colônia”, esses movimentos, cada qual 
em sua conjuntura específica, atuaram de forma localizada, buscando obter autonomia em 
relação ao Estado português.
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 118
No todo, os movimentos tiveram maior amplitude em relação aos anteriores, envolve-
ram mais grupos de interesses e ocorreram em uma convergência de fatores cruciais (embo-
ra conjunturas específicas tenham sido afetadas de forma heterogênea):
• a ascensão das ideias iluministas no continente americano, instigando os inte-
lectuais locais a valorizarem os princípios de liberdade individual e igualdade 
entre os indivíduos;
• a decadência do modelo comercial baseado em artigos de luxo e matérias primas, 
fundado principalmente no poderio de grandes companhias, que tinham controle 
quase absoluto sobre o escoamento de produtos para o mercado;
• um modelo capitalista manufatureiro que emerge no seio da primeira Revolução 
Industrial, na Inglaterra, privilegiando o liberalismo e a concorrência, em oposição 
aos monopólios comerciais das companhias e às normativas de controle mercantil 
estabelecidas pelos Estados europeus. Esse pensamento ia diametralmente contra 
o princípio do Pacto Colonial, que restringia o comércio colonial às trocas feitas 
entre Colônia e Metrópole, não podendo legalmente envolver interesses externos 
a esse binômio. A ordem do dia era a produção em massa, que alimentaria o livre 
comércio, caracterizado pela abertura de mercados e pela competitividade entre 
diferentes fornecedores.
Assim, ao mesmo tempo em que se proliferavam os princípios de igualdade jurídica entre 
os homens livres, emergia também o capitalismo tal como viria a se configurar em suas ca-
racterísticas mais convencionais. Para os colonos, tornava-se premente a necessidade de esta-
belecer um modelo de governo soberano, que rompesse com os desmandos e a velha estrutura 
de poder de Portugal, tanto quanto a necessidade de maximizar os ganhos locais, criando uma 
economia forte e independente, baseada nesses novos princípios do comércio externo.
A partir da segunda metade do século XVIII, a Inglaterra ascendeu à liderança euro-
peia, movida pela produção industrial de têxteis e metais em uma escala nunca antes vista. 
Enquanto isso, os reinos da Península Ibérica entravam em severo declínio. Incapazes de 
fazer atransição de um padrão mercantilista, controlado pelas estruturas absolutistas de 
seus Estados, para um modelo capitalista, não tinham capacidade para competir na nova 
realidade econômica internacional.
Em 1776, os ideais iluministas teriam seu primeiro efeito geopolítico de significância 
irreversível, quando as Treze Colônias britânicas obtiveram sua independência do Reino 
Unido e se declararam a República dos Estados Unidos da América, sendo assim o primeiro 
território colonial a se libertar de sua metrópole nas Américas. Em 1789, na França, a mo-
narquia seria derrubada com base nos mesmos ideais, em uma revolução movida pelo lema 
“Liberdade, Igualdade, Fraternidade”.
A convergência do pensamento contrário ao Antigo Regime, surgido na França, com o 
pensamento capitalista moderno, surgido na Inglaterra, repercutiria também no Brasil, desen-
cadeando três movimentos que buscavam libertação dos vínculos coloniais: a Inconfidência 
Mineira (1789), a Conjuração Baiana (1798) e a Revolução Pernambucana (1817).
As revoltas coloniais e as contestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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119
A Inconfidência Mineira1 foi gestada nas Minas Gerais, onde o regime português era 
sentido de forma mais agressiva, principalmente nos monopólios comerciais e nas pesadas 
taxações impostas sobre a rica economia baseada no ouro. Incrivelmente opulenta após anos 
de exploração mineral, a região tornou-se um ambiente de intensa vida artística e cultural, 
com uma classe média emergente que não buscava apenas poder econômico e influência 
política, mas também distinguir-se por ser esclarecida e intelectualizada, como as elites pa-
lacianas europeias do mesmo período.
O grupo dos inconfidentes que articularam a conspiração era composto principal-
mente por intelectuais, muitos dos quais haviam sido educados na Europa. Indivíduos 
como Domingos Vidal Barbosa, que havia estudado na França, e José Álvares Maciel, que 
concluíra seus estudos na Inglaterra. Muitos outros membros das classes mais abastadas 
de Minas Gerais aderiram à causa, como os poetas Claudio Manoel da Costa e Tomás 
Antônio Gonzaga e o alferes Joaquim José da Silva Xavier, conhecido como “Tiradentes”. 
Os nomes mais proeminentes da Inconfidência Mineira, é válido ressaltar, ocupavam posi-
ções importantes na estrutura colonial da época, atuando como burocratas, por vezes como 
desembargadores e juízes de fora.
O sucesso da Revolução Americana alimentava a inquietação mineira, já atiçada por 
conta da administração considerada negligente, da ineficiência das intendências e da cons-
tante demanda por mais ouro por parte dessas autoridades, que defendiam apenas os inte-
resses da Coroa, sem pensar nos limites produtivos da região e sem permitir a instalação de 
manufaturas ou estradas que dessem mais autonomia à região. 
Os rebeldes planejavam fundar um Estado independente de Portugal, adotando um 
modelo republicano de governo, o qual teria sua sede em São João Del Rei. Libertas Quae Sera 
Tamen, “Liberdade ainda que tardia”, um verso do poeta romano Virgílio, seria estampado 
na bandeira republicana. No entanto, deve-se ressaltar que, embora defendessem valores 
revolucionários para a época, os inconfidentes, como membros de uma elite exploradora 
dos recursos das minas, não tinham uma intenção clara de abolir a escravidão.
Limitando-se às salas de reuniões de intelectuais de classes altas, a Inconfidência seria 
incapaz de se conectar com grupos populares e não chegaria a se materializar em ações prá-
ticas antes de ser descoberta por meio da delação de um participante, Joaquim Silvério dos 
Reis. O visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais à época, condenou à prisão 
parte dos envolvidos, alguns deles por degredo, e outros à morte. Destes últimos, a maioria 
teve sua pena comutada, sendo Tiradentes o único efetivamente executado por crime de 
lesa-majestade.
A Inconfidência Mineira apontava para uma tendência maior: a instabilidade interna 
do império português. Através das colônias emergiam diversos focos de insatisfação com 
as exigências fiscais e a postura limitante da Metrópole para com os colonos dos territórios, 
os quais, governados por uma autoridade distante, sentiam-se furtados de um governo que 
1 É importante frisar que, tendo início em 1788 e sendo desarticulada em 1789, a Inconfidência Mineira 
antecedeu a eclosão da Revolução Francesa. A conspiração ocorrida em Minas, portanto, não foi ins-
pirada pelo ocorrido na França. Ambos os eventos ocorreram à luz do pensamento que se difundia na 
Europa e nas colônias da época.
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 120
defendesse os interesses da população. Em 1798 seria deflagrada uma segunda revolta de 
caráter emancipacionista: a Conjuração Baiana, ou Revolta dos Alfaiates.
Ao contrário da Inconfidência Mineira, a Conjuração Baiana contava com o apoio das 
classes populares, principalmente de soldados rasos e trabalhadores urbanos, como os alfaia-
tes. À época, a Bahia passava por um renascimento agrícola, com os latifúndios dos outrora 
grandes senhores de engenho recuperando a velha força; para os pequenos produtores, que 
dependiam da agricultura de subsistência, por outro lado, essa retomada representava uma 
crise. Os trabalhadores urbanos também sofriam com a severa alta de preços dos gêneros bási-
cos nas cidades, e a capitania estava em polvorosa com manifestações de indignação popular.
O cenário global parecia apontar um contexto favorável para os revoltosos. Não apenas 
havia precedentes de sucesso nas antigas colônias britânicas e na França, como também nos 
eventos em progresso no Haiti, onde escravos se revoltaram entre 1791 e 1804, expulsando 
os colonizadores franceses e estabelecendo um Estado soberano.
A maçonaria também esteve envolvida, propagando ideias liberais e instigando o 
movimento entre os baianos. Tal como os inconfidentes mineiros, os conjurados da Bahia 
buscavam conquistar a independência do domínio lusitano, estabelecendo um regime de 
autonomia produtiva e livre comércio, mas incluíam em sua agenda também a abolição da 
escravatura. Em específico, o intento do levante era constituir uma república democrática 
na capitania da Bahia.
Cipriano Barata, um médico que atuava com as camadas mais humildes da população, 
foi um dos difusores dessas ideias, instigando os populares à ação. Por meio da distribuição 
de panfletos, o movimento propagava ideias radicais para a época, como a igualdade dos 
homens perante a lei, independentemente de raça ou proveniência social, o que, efetivamen-
te, implicava na supressão dos privilégios das classes dominantes da capitania.
Apesar do apoio oriundo de mais de uma fonte – intelectuais da maçonaria e camadas 
populares –, o movimento manteve-se em grande parte limitado à capital, Salvador, com-
pondo-se principalmente de artesãos, como alfaiates e sapateiros, os quais eram muitas ve-
zes negros, mulatos libertos ou descendentes de escravos. A distribuição dos panfletos, que 
fora um eficiente mecanismo de difusão, acabaria por conduzir as autoridades aos suspeitos 
de sedição. A maioria das lideranças seriam condenadas à execução ou à humilhação públi-
ca, por meio de flagelação, antes de serem punidos com o cárcere ou o degredo. Cipriano 
Barata, apesar de ser um dos maiores difusores e mentores intelectuais do movimento, foi 
absolvido, embora tenho sido preso novamente mais tarde.
Apesar dos reveses, as ideias liberais persistiam na Colônia, em grande parte porque 
se aliavam facilmente aos problemas sociais locais para fermentarem a revolta. Em 1817, 
a Corte portuguesa já se encontrava relativamente bem estabelecida em território carioca, 
após se retirar de Portugal para escapar das forças invasoras de Napoleão Bonaparte e che-
gar ao Brasil, em 1808. Em Pernambuco, já atingida por uma crise econômica devido à in-
capacidade de competir com a produção de algodão dos EUAe a de açúcar da Jamaica, a 
necessidade de contribuir com os pesados impostos para a manutenção da Corte carioca era 
fonte de grande insatisfação.
As revoltas coloniais e as contestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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121
A propagação das ideias iluministas pela maçonaria foi novamente crucial para que o 
evento da Revolução Pernambucana atingisse as proporções que alcançou. Em março de 
1817, militares amotinados assumiram o controle do quartel, em Recife, para logo tomar 
a cidade, forçando o governador a se render. Domingos José Martins, Antônio Carlos de 
Andrada e Silva e Frei Caneca estabeleceram um governo provisório, com contornos repu-
blicanos, separando os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Alguns impostos foram 
abolidos, assim como foram instituídas as liberdades de imprensa e de culto. A escravidão, 
no entanto, foi mantida.
Os revoltosos tentaram estender o alcance do movimento, enviando emissários para as 
províncias vizinhas, instigando-as também à revolta, mas a conclamação resultou infrutífe-
ra. Buscando suprimir a revolta antes que ela se tornasse algo maior e com consequências 
mais graves, Dom João VI enviou uma expedição militar maciça a Pernambuco. Os revolto-
sos sofreram sucessivas derrotas e o embate se prolongou até 1818, quando penas severas 
foram impostas, incluindo diversas prisões.
Uma das principais consequências do levante foi o desmembramento da Comarca de 
Alagoas da Província de Pernambuco, de modo que esta última formasse sua própria pro-
víncia, a título de recompensa da parte de Dom João VI, posto que as elites alagoanas ha-
viam se mantido leais à Coroa durante o curso dos eventos. A perseverança dos princípios 
emancipacionistas e liberais no Brasil também serviu para comprovar que Portugal teria 
dificuldades em manter seu império em terras americanas, o que pode ter sido um ponto a 
favor para a concretização da independência, que viria anos depois.
 Ampliando seus conhecimentos 
Professor de Gramática Latina na Vila do Rio das Contas, Moniz Barreto 
foi um dos mentores intelectuais da Conjuração Baiana. Os versos apre-
sentados a seguir, do poema referido como “Igualdade e Liberdade”, 
foram atribuídos ao professor por um indivíduo então interrogado pelas 
autoridades portuguesas, Lucas Dantas de Amorim Torres, em 1798, 
embora o próprio Moniz tenha afirmado que recebera sua cópia do poema 
de “um moço de Pernambuco” (TAVARES, 1975, p. 45).
Trecho de poema atribuído a Francisco 
Moniz Barreto d’Aragão (ca. 1798) 
(In: TAVARES, 1975, p. 46-47)
Igualdade e liberdade
No sacrário da razão
As revoltas coloniais e as contestações políticas8
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 122
Ao lado da sã Justiça
Preenchem o meu coração.
[...]
Se este dogma for seguido,
E de todos respeitado,
Fará bem aventurado
Ao povo rude e polido.
E assim que florescido
Tem da América a Nação!
[...]
 Atividades
1. Qual foi a extensão do impacto das reformas pombalinas na Colônia?
2. As revoltas coloniais se dividiram em duas fases principais, desencadeadas por mo-
tivos particulares, apesar de terem alguns elementos em comum. Discorra a respeito 
desse tema.
3. Leia os versos do poema “Igualdade e Liberdade”. Discorra sobre as ideias a que faz 
referência Francisco Muniz Barreto de Aragão, ao tratar de “Igualdade e liberdade/ 
No sacrário da razão/ Ao lado da sã Justiça”.
 Referências 
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CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: J. Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
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FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
2001 [ca.1790-1840].
As revoltas coloniais e as contestações políticas
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
______. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1970.
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloísa Murgel. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2015.
TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada na Bahia em 1798: a conspiração dos 
alfaiates. São Paulo: Pioneira, 1975.
 Resolução 
1. Iluminista e liberal em seu modo de pensar, e sendo o chefe efetivo do governo por-
tuguês, era grande o poder reformador que Pombal tinha em suas mãos. Eliminando 
a influência dos jesuítas, impactava severamente o modelo educacional vigente. Ao 
criar as companhias de comércio, ele estabelecia monopólios e limitava significa-
tivemente a margem dos ganhos dos colonos. Ao determinar um sistema claro de 
contabilização do ouro coletado para “quintá-lo”, também reduzia os ganhos prove-
nientes da mineração. Por fim, a mudança da capital de Salvador para o Rio de Ja-
neiro resultaria num agressivo deslocamento do eixo econômico principal da região 
Nordeste para a Sudeste. Pode-se argumentar que, indiretamente, as reformas pom-
balinas, por seu rigor, fomentariam revoltosos na Colônia, cada vez mais desejosos 
de autonomia econômica e administrativa.
2. A primeira fase das revoltas foi movida essencialmente por inclinações econômicas 
e nativistas. Os colonos nativos sentiam-se lesados pelos altos impostos devidos à 
Coroa, bem como pela necessidade de adquirir bens de primeira necessidade de 
companhias de comércio monopolizadoras, as quais cobravam preços abusivos por 
seus produtos. Sentiam-se também lesados na medida em que colonos recém-chega-
dos, fossem eles arrivistas buscando explorar ouro ou comerciantes das companhias, 
pareciam estar passando por cima de seus direitos.
 As revoltas da segunda fase, embora fossem ainda motivadas em grande parte por 
interesses econômicos, iam além, instigando a separação dos territórios locais da 
Metrópole portuguesa em resposta aos altos tributos e à falta de autonomia comer-
cial e manufatureira.
3. Nos versos são expressas ideias relacionadas aos valores defendidos por inconfiden-
tes, que deflagaram movimentos como a Inconfidência Mineira e a Conjuração Baia-
na no século XVIII, propagando valores liberais/iluministas em nome de um Estado 
soberano na América portuguesa, livre da tirania da metrópole. 
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 125
9
Ideias iluministas e a 
Inconfidência Mineira
Em fins do século XVII, despontaram os primeiros teóricos que, com ideias revo-
lucionárias, lançariam as bases do que estava por vir: o século XVIII, ou Século das 
Luzes, período marcado por uma mudança no pensamento europeu. As ideias ilu-
ministas, divulgadas por meio de panfletos, livros e em discussões em círculos inte-
lectuais, logo se propagariam, alcançando também o Novo Mundo. A instituição da 
monarquia absoluta seria colocada em questão, assim como a supremacia das institui-
ções religiosas e a aceitação do status quo como uma ordem natural e desejável.
Esse foi, sobretudo, o tempo da busca pelas “luzes” do conhecimento, em oposi-
ção às “trevas” da ignorância, levando à ideia de esclarecimento. Em 1783, no texto 
Resposta à pergunta: Que é esclarecimento?, o filósofo Immanuel Kant caracterizou o 
esclarecimento como a saída do homem de um estado no qual ele não pode atingir seu 
entendimento sem ser dirigido por outros. Trata-se, portanto, de um período que veria 
a valorização do conhecimento e do indivíduo.
Conceitos outrora vistos como problemáticos por questionarem a autoridade 
vigente se tornariam valores almejados, como: liberdade de expressão, liberdade inte-
lectual, liberdade de culto, democracia, direito à propriedade privada e separação entre 
Igreja eEstado. A busca pela razão se tornaria o mais alto desses valores, ditando uma 
nova ordem, cada vez mais livre das velhas amarras sociais. É importante, certamente, 
matizar essa visão, já que esses valores estavam sujeitos a interpretações diversas e, em 
diferentes contextos, foram incorporados aos imaginários europeus e americanos com 
variações locais.
Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira9
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 126
Esse novo modo de pensar passava por uma visão de mundo progressivamente mais 
burguesa, advinda de uma camada média que angariava cada vez mais poder econômico, 
mas que se ressentia de não ter representação política e de ser tributada em nome da manu-
tenção de instituições por ela consideradas arcaicas e opressivas, como a nobreza hereditária 
e o alto clero.
A confluência de vários fatores, como a emergência de focos de insatisfação social e 
política e o surgimento de um pensar mais laico, individualista e avesso à velha ordem, 
eventualmente reunia grupos de interesses. Esses grupos muitas vezes se posicionavam pela 
derrocada de poderes dominantes, o que conduziu à Revolução Americana nas colônias 
britânicas na América do Norte, em 1776, e à Revolução Francesa, em 1789, na Europa.
Dado o fluxo de livros, produtos e pessoas, era inevitável que essas ideias se propagas-
sem até a América ibérica, onde, somando-se a problemas conjunturais e um senso geral 
de falta de representação, produziriam ondas de inquietação entre os colonos, entre eles, 
as elites ricas, intelectualizadas e educadas na Europa que viviam nas capitanias do Brasil.
9.1 A influência das ideias iluministas
Embora a divulgação do conhecimento fosse precária à época, os séculos XVI e XVII já 
haviam sido palco de diversos desenvolvimentos no campo das ciências, como os trabalhos 
de Copérnico (1473 -1543), Vesalius (1514 -1564), Bacon (1561 -1626), Newton (1643 -1727), 
Kepler (1571 -1630) e Galileu (1564 -1642). O desenvolvimento da imprensa de tipos móveis, 
por Johannes Gutenberg (1398 -1468), seria crucial para permitir que esses trabalhos fossem 
veiculados em uma escala sem precedentes, ampliando o alcance do público letrado – as elites 
econômicas das metrópoles europeias e das colônias – ao conhecimento de matriz científica.
Assim, o Iluminismo emergiu na esteira de uma série de inovações no modo como as 
elites intelectuais europeias viam o mundo. No coração dessas inovações jazia o raciona-
lismo, segundo o qual a razão é a fonte maior de todo o conhecimento, uma visão que se 
consolidou a partir dos postulados de filósofos como René Descartes (1596 -1650), Baruch 
Spinoza (1632 -1677) e Gottfried Leibniz (1646 -1716).
Alimentado por essas fontes intelectuais, o pensamento iluminista floresceria na França, 
representado por uma variedade de expoentes do pensamento político e jurídico. Pensadores 
de obras e reflexões amplas e complexas conquistariam notoriedade por sistematizar ques-
tionamentos no período. Montesquieu (1689 -1755) traria ao debate sobre a natureza das leis 
a ideia de que estas se constituíam entre particularidades e tensões geográficas, e não estri-
tamente por meio de articulações teológicas ou racionalistas. Cético em relação ao absolu-
tismo monárquico e ao domínio clerical, o autor advogava pela separação dos três poderes 
(Executivo, Legislativo e Judiciário), o que deveria garantir que o poder monárquico fosse 
regulado, e não absoluto. Essa divisão se tornaria um princípio fundamental das constitui-
ções democráticas mundo afora. Rousseau (1712 -1778) se colocou contra a noção de que 
os monarcas eram designados por Deus, postulando que o mandato de um governante era 
na verdade de natureza contratual, de modo que o regente tinha compromissos para com 
Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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127
seu povo, podendo ser colocado em questão caso não cumprisse sua parte. Pessimista em 
relação aos efeitos do poder centralizador, Rousseau argumentou a favor de um modelo de 
contrato social republicano, baseado em uma participação política que não fosse limitada 
apenas à aristocracia. Voltaire (1694 -1778) (retratado na Figura 1), por sua vez, defendia o 
livre comércio, em favor de uma economia que não sofresse intervenção direta do Estado, 
e também as liberdades civis, ou seja, a ideia de que todo cidadão deve possuir liberdade 
de crença, expressão e associação. Voltaire e muitos de seus contemporâneos se tornariam 
notórios em razão de seus ataques à influência da Igreja sobre os assuntos do Estado e à exis-
tência de grupos privilegiados pelo poder instituído: especificamente, a nobreza e o clero, 
ambas instituições cujas raízes se encontravam no passado feudal da Europa. 
Como se pode observar, esses pensadores orbitavam em torno dos princípios liberais, 
que se espalhariam pela Europa continental e pelas colônias. Assim, uma linha de pensa-
mento de “ideias francesas” veio a se difundir mais amplamente, alcançando, inclusive, a 
América portuguesa.
Figura 1 – LARGILLIÈRE, Nicolas de. Voltaire. 1724-1725. Óleo sobre tela, color.: 80 x 65 cm. 
Museu Carnavalet, Paris.
A atitude dos governos europeus com relação a esses pensadores “esclarecidos” variou 
enormemente. Em vários locais onde se mostrou possível conciliar e cooptar alguns princí-
pios iluministas à ordem monárquica e à religião, os próprios monarcas seriam considera-
dos déspotas esclarecidos, como Frederico II da Prússia, Leopoldo I da Toscana e Catarina 
II da Rússia. No caso da Península Ibérica, esses governantes se tornariam conhecidos pelo 
Reformismo Ilustrado.
A monarquia britânica, por sua vez, com o poder monárquico limitado pela implanta-
ção do parlamentarismo – resultante da experiência republicana e da circulação de muitos 
dos princípios do Iluminismo em revoluções ocorridas no decorrer do século XVII –, era 
relativamente tolerante com a propagação do pensamento iluminista. A Coroa francesa, no 
entanto, era abertamente hostil às ideias inovadoras que pudessem representar uma ameaça 
à ordem vigente.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 128
Assim, enquanto os filósofos franceses – que desenvolveram um forte senso crítico em 
relação ao poder monárquico e eclesiástico – seriam submetidos a medidas repressivas como 
o encarceramento, os escoceses David Hume e Adam Smith se tornariam indivíduos respeita-
dos nos círculos intelectuais dominantes da época. Voltaire declararia que “Nous nous tournons 
vers l’Écosse pour trouver toutes nos idées sur la civilisation” (“Nós nos voltamos para a Escócia 
para encontrar todas as nossas ideias sobre a civilização”) (apud THOMAS, 2010, p. 54).
Em Portugal, o reinado mais associado à ideia de reformismo ilustrado é o de Dom 
José I (1750 -1777), em grande parte devido às reformas instituídas pelo secretário de 
Estado do Reino (cargo análogo ao que viria a ser o de primeiro-ministro em governos 
parlamentaristas), o Marquês de Pombal. O Estado português era ainda firmemente li-
gado a suas raízes como reino defensor da fé católica, onde as ordens religiosas tinham 
o monopólio sobre as instituições educacionais e o Santo Ofício era uma presença do-
minante na vida de seus súditos. Desarticular o poder eclesiástico e seus defensores em 
Portugal foi, assim, uma das metas que Pombal seguiu com mais fervor, efetivamente 
expulsando os jesuítas dos domínios portugueses, encerrando a perseguição aos judeus 
pela Inquisição portuguesa e instituindo tribunais civis em lugar dos religiosos.
Pombal viria a ser considerado um estrangeirado, isto é, um defensor de ideias estran-
geiras, que buscava estender ao território português as tendências crescentes no restante da 
Europa, principalmente na França. Outros estrangeirados, como o diplomata nascido no Brasil 
Alexandre Gusmão, o padre e pedagogo Luís António Verney e o médico e polímata António 
Nunes RibeiroSanches, delineavam um novo cenário intelectual lusófono, menos clerical e 
tradicionalista, mais próximo do que se via entre os franceses, escoceses e prussianos.
Esse cenário, todavia, não se desenvolveu livre de tensões. As reformas pombalinas, 
apesar de amplas e de atenderem muitas das paixões liberais crescentes entre os setores 
mais educados da sociedade portuguesa, foram marcadas por episódios violentos de repres-
são, prisões, execuções e exílio de opositores. Uma tentativa de assassinato contra o rei José 
I resultou no Processo dos Távora (1758 -1759), um julgamento que terminou nas execuções 
públicas de diversos membros da família Távora, acusados de orquestrarem o incidente.
A insatisfação também fervilhava entre os setores liberais da população da América 
portuguesa. A Colônia já havia sido palco de revoltas anteriormente, geradas sobretudo por 
atritos entre setores concorrentes no negócio que florescia da mineração, como a Guerra dos 
Emboabas (1707-1709), ou entre grupos de colonos e a autoridade da Metrópole, envolven-
do questões como a escravidão indígena e os altos preços que as companhias de comércio 
impunham a gêneros básicos, como a Aclamação de Amador Bueno (1641), a Revolta de 
Beckman (1684) e a Guerra dos Mascates (1710). A Revolta de Vila Rica (1720), todavia, foi o 
primeiro prenúncio de inquietações mais profundas. Revoltados com o estabelecimento das 
casas de fundição, coração do sistema de cobrança implementado por Portugal para garan-
tir que todo ouro produzido na Colônia fosse devidamente fundido, selado e tributado, os 
mineiros se posicionaram contra o governo, sendo derrotados em seguida.
Pombal reforçaria com particular rigor os dispositivos para a fiscalização e a tributação 
do ouro extraído na região das Minas Gerais. Essa cobrança tinha um longo histórico de 
abuso e insatisfação popular, e as autoridades portuguesas já haviam tentado regulamentar 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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129
a cobrança do quinto, de várias maneiras. O sistema de capitação havia sido particularmente 
controverso, impondo uma taxa “por cabeça” sobre cada escravo da capitania, independen-
temente de terem ou não obtido frutos em seu trabalho. Esse sistema foi gradativamente 
substituído pela cobrança via casas de fundição. Buscando obter ainda mais controle sobre 
o sistema, Pombal estabeleceu a meta para o quinto em cem arrobas (ou 1500 quilogramas) 
anuais de ouro. Caso a demanda não fosse atendida, havia a ameaça constante da derrama, 
o confisco compulsório de bens de ouro dos colonos de posses até que se atingisse a cota do 
quinto. Qualquer procedimento era lícito com o propósito de atingir a cota, o que resultava 
em uma genuína ameaça à segurança dos colonos.
Naturalmente, a exploração aurífera, baseada em um recurso natural não renovável, 
começou a declinar com o passar dos anos. A queda na produtividade era frequentemente 
atribuída ao contrabando ou à ociosidade dos colonos, o que tornava cada vez mais próxima 
a implantação da derrama, por anos adiada pelas autoridades portuguesas, enquanto os 
colonos ricos e educados das Minas Gerais adquiriam dívidas progressivamente maiores 
com a Coroa. Em 1777, o governo seria passado a Maria I, que ficaria conhecida na memória 
social constituída sobre o período como Maria, a Louca. Ela reverteu muitas das medidas de 
seus antecessores, mas manteve as políticas severas no que tocava à exploração da Colônia.
Muitos dos colonos haviam recebido uma educação europeia e entrado em contato com 
o pensamento iluminista de matriz republicana e liberal. As ideias liberais em uma forma 
de governo republicana conquistariam maior amplitude e repercussão quando, em 1776, 
representantes de treze das colônias britânicas na América do Norte assinaram a Declaração 
da Independência, um documento fortemente influenciado por princípios iluministas, no 
qual a recém-fundada república dos Estados Unidos América proclamava seu desligamento 
do Império Britânico.
Com a Revolução Americana, constituía-se o primeiro Estado independente do con-
tinente americano, bem como a primeira aplicação concreta das ideias iluministas em um 
projeto político. Encorajados pelo sucesso das colônias britânicas, os colonos da América 
ibérica também começariam a fomentar suas próprias revoltas separatistas.
9.2 O caso da Inconfidência Mineira
Embora não tenha sido tão abrangente quanto a Conjuração Baiana (1798) ou a 
Revolução Pernambucana (1817), a Inconfidência Mineira seria escolhida como um evento 
fundador em meio à sedimentação de nossa República, proclamada em 1889. A construção 
de uma tradição nacional a partir da Inconfidência, no sentido mais amplo, e da figura de 
Tiradentes, em particular, fundamentaria uma mitologia edificadora para a política republi-
cana brasileira, na passagem do século XIX para o XX.
Entretanto, a conjuração mineira não foi a primeira revolta na região. Além da Revolta 
de Vila Rica, em 1720, outros levantes ocorreram. Apenas no reinado de Dom José I, mar-
cado pela gestão controladora do Marquês de Pombal, eclodiram conspirações sediciosas 
em várias regiões das Minas Gerais: em Curvelo, entre 1760 -1763 e novamente em 1776, em 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 130
Mariana, em 1769, e em Sabará, em 1775. Em 1776, o governador D. Antônio de Noronha 
dirigiu-se a Pombal em uma carta, expressando sua preocupação diante do envolvimento de 
padres de Minas nos eventos conspiratórios:
Me horrorizam tanto as sacrílegas, blasfemas e sediciosas palavras que temera-
riamente proferiu o primeiro clérigo, as quais se provam dos autos, que me não 
animo a convocar os ministros desta capitania para uma junta, onde as mesmas 
sediciosas palavras se hão de fazer públicas nos termos do processo e da defesa 
que se deve dar dos réus [...]. (apud SOUZA, 2006, p. 105)
O envolvimento de religiosos pode ter sido motivado pela insatisfação que emergira 
da repressão aos jesuítas no reinado de José I, confundindo-se ainda com as inquietações de 
ordem econômica e intelectual que agitavam a Colônia. As Minas Gerais do século XVIII não 
eram uma região periférica e pobre. Próspera em razão da exploração aurífera, a capitania 
era um ambiente de agitação artística e intelectual. Talvez o traço mais importante dessa 
sociedade foi a emergência de uma pequena elite burguesa que, mais do que amealhar ri-
quezas e influência, buscava se sobressair pelo refinamento cultural.
Assim, o cenário estava armado para um ambiente de conspirações, posto que muitos in-
divíduos egressos das famílias mais ricas haviam sido educados na Europa e expostos a ideias 
iluministas. José Joaquim Maia e Barbalho estudou em Coimbra e se graduou médico em 
Montpellier, na França, Domingos Vidal Barbosa Lage estudou na França e José Álvares Maciel 
concluiu seus estudos na Inglaterra. Ao retornar ao Brasil, esses intelectuais encontraram um 
solo fértil para reflexões sobre liberalismo econômico, republicanismo e independência.
Entretanto, as ideias iluministas se propagavam por outras vias, como panfletos tradu-
zidos parcialmente, livros importados ilegalmente e até mesmo por fontes orais, em regiões 
portuárias – como no caso dos marinheiros vindos de fora. Círculos de debates e reuniões 
difundiam essas ideias e fomentavam uma atmosfera de revolta, valendo-se da insatisfa-
ção com os tributos elevados e as constantes acusações de ineficiência e corrupção contra a 
administração. Muitos outros membros das classes mais abastadas de Minas Gerais aderi-
ram à causa, como os poetas Claudio Manoel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, e o alferes 
e dentista Joaquim José da Silva Xavier, o “Tiradentes”, acusado posteriormente de ser um 
dos mais ativos divulgadores da causa e fomentar o levante. Formava-se, assim, o núcleo da 
conjuração: os inconfidentes.
Os inconfidentes almejavam fundar um estado soberano,independente de Portugal, o 
qual seria uma república no molde estadunidense, com São João Del Rei como capital. Seu 
lema, eternizado na atual bandeira do estado de Minas Gerais, era Libertas Quae Sera Tamen 
(“Liberdade ainda que tardia” em latim), um verso do poeta romano Virgílio.
Assim como no caso dos revolucionários das colônias britânicas, não é correto supor 
que os valores de liberdade e igualdade defendidos pelos inconfidentes se estendiam a toda 
a população da Colônia. Os conjurados eram em sua maioria “homens de posses”, depen-
dendo significativamente de mão de obra escrava para a manutenção de sua riqueza. Sua 
agenda era libertar o território da influência estatal e do controle econômico português, o 
que não incluía abolir o regime escravocrata vigente.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Esse fator, aliás, é relevante. A inconfidência foi um movimento limitado às classes al-
tas, e, dentro desse grupo maior, aos círculos intelectuais interessados em valores “estran-
geirados”. Para que pudesse se materializar como uma efetiva ruptura1, carecia de força 
entre as camadas populares, e este apoio não chegaria, ao menos não a tempo. O levante 
ainda estava sendo incubado nas salas de reuniões das elites intelectuais mineiras quando 
um de seus participantes, Joaquim Silvério dos Reis, delatou os correligionários às autori-
dades lusitanas.
O visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais à época, instituiu uma devassa, 
colhendo depoimentos a fim de encarcerar e punir os envolvidos. O movimento foi debela-
do por completo em 1789. Dos inconfidentes que foram capturados, alguns foram enviados 
para o degredo perpétuo na África, outros ao exílio temporário e uma parte foi condenada 
à morte. Entretanto, a maioria daqueles que receberiam a pena capital teve sua pena comu-
tada, sendo apenas encarcerados.
A Inconfidência Mineira adquiriu poderoso sentido simbólico para a história brasilei-
ra posterior, sendo apossada eventualmente por grupos de interesses, os quais buscavam 
figuras que representassem uma primeira forma de resistência à autoridade portuguesa. A 
pintura Jornada dos Mártires (Figura 2), de Antônio Parreiras, produzida em 1928, durante 
o período republicano, evidencia o papel importante que os inconfidentes, representados 
como “mártires” da liberdade, desempenhariam no imaginário brasileiro.
Figura 2 – PARREIRAS, Antônio. Jornada dos Mártires. 1928. Óleo sobre tela, color.: 200 x 381 cm. 
Fundação Museu Mariano Procópio, Juiz de Fora, MG.
1 É importante ressaltar que não se aplica aqui o termo revolução, posto que, no século XVIII, a expres-
são revolução era associada a seu sentido astronômico, qual seja, o de uma volta completa, incluindo um 
retorno a uma ordem previamente existente – e não o de uma ruptura que inicia uma nova ordem. Pos-
teriormente, com base no pensamento francês, o termo adquiriria um sentido mais semelhante ao atual.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 132
9.3 As reconfigurações do império português
Tiradentes, considerado aquele que mais difundia e vocalizava entre os populares as 
críticas dos conjurados, foi o único cuja condenação à morte foi mantida, julgando-se que 
havia cometido crime de lesa-majestade. O alferes foi enforcado e esquartejado publica-
mente em 1792, com grande estardalhaço e espetacularização, a fim de que observadores se 
sentissem desencorajados a imitar a postura republicana e sediciosa do executado.
Embora seja discutível qual era a extensão da influência individual de Tiradentes no 
movimento inconfidente, assim como é discutível que seu papel tenha sido especialmente 
relevante em comparação ao de outros membros de maior prestígio, como Tomás Antônio 
de Gonzaga (1744 -1810) e Inácio José de Alvarenga Peixoto (1742 -1792), sua execução pú-
blica contribuiu para convertê-lo em um símbolo máximo de revolta popular contra os des-
mandos da metrópole portuguesa e de esclarecimento e valores revolucionários diante de 
uma monarquia tirânica. A historiografia do início do período republicano buscaria reavivar 
a memória da Inconfidência, apesar de esta ter sido um movimento que morreu antes de se 
concretizar, bem como eternizar Tiradentes como seu símbolo maior. Artistas brasileiros 
como o classicista Pedro Américo, autor do quadro Tiradentes esquartejado (Figura 3), e o 
modernista Cândido Portinari sedimentariam sua imagem como um dos primeiros heróis 
nacionais reconhecidos como tal.
Figura 3 – AMÉRICO, Pedro. Tiradentes esquartejado. 1893. Óleo sobre tela, color.: 270 x 165 cm. 
Fundação Museu Mariano Procópio, Juiz de Fora, MG.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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Todavia, o cenário de revolta não estava restrito às Américas: tratava-se de uma conjun-
tura internacional. A transição do século XVIII para o XIX representou, em muitos sentidos, 
um período ameaçador para a monarquia portuguesa. A colônia americana, grande fonte 
de lucros para a Coroa, revelara-se um ambiente inquieto e suscetível a revoltas, após anos 
de exploração predatória e poucos investimentos em uma burocracia eficiente e capaz de 
atender às demandas dos colonos.
No palco europeu, em 1789, a Revolução Francesa derrubara a dinastia reinante, a 
Casa de Bourbon, substituindo-a por um governo revolucionário e republicano. Em 1804, 
a Revolução deu lugar a um novo monarca, mas não nos moldes tradicionais do Antigo 
Regime: o líder militar Napoleão Bonaparte se declarou imperador da França e lançou su-
cessivas campanhas contra seus vizinhos, buscando colocar toda a Europa sob seu domínio.
Os portugueses, em razão de sua antiga aliança política e militar com a Inglaterra, vi-
ram-se diretamente no caminho de Bonaparte, que buscava fechar todos os portos europeus 
para os ingleses, tentando eliminar o poderio destes no continente. Quando os franceses 
avançaram sobre Portugal, a família real portuguesa, os Bragança, bem como todos os agre-
gados de sua Corte, transferiram-se, com o apoio dos ingleses, para sua colônia do outro 
lado do Atlântico. Em um episódio incomum na história das relações entre metrópoles e 
colônias, o Rio de Janeiro se tornou a nova capital do Império Português.
A vinda da Família Real para o Brasil, em 1808, seria tão crucial para a Metrópole – que 
entrou em uma fase de declínio e em estado de guerra para defender sua soberania contra os 
ataques napoleônicos – quanto para a Colônia. Em função dessa transferência, o Rio de Janeiro 
passaria a abrigar o trono real e receberia escolas superiores e outras instalações comuns às 
grandes cidades europeias, além de finalmente abrir seus portos às nações aliadas – à época, 
principalmente embarcações do império britânico. Essa mudança marcaria a fase mais acen-
tuada da crise do modelo colonial e o início da transição para a independência brasileira.
 Ampliando seus conhecimentos 
Excerto da carta-denúncia de Basílio de Brito 
Malheiro do Lago, Vila Rica, 15-04-1789
(AUTOS..., 1976)
Ilmo. e Exmo. Sr. Visconde General.
V. Excia. me ordenou que lhe desse escrita a parte que já lhe dei de pala-
vra: de que eu tinha notícia em como algumas pessoas suscitavam nesta 
Capitania rebelião contra V. Excia., e igualmente contra o Estado e a 
mesma Soberana; e que lhe declarasse eu tudo o que tivesse alcançado em 
matéria tão importante como esta; e ainda o que eu presumisse dos sedi-
ciosos e seus projetos; que tudo lhe manifestasse, o que faço obedecendo 
Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira9
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 134
à ordem de V. Excia., declarando primeiro que não quero que sirva de 
culpa a qualquer pessoa o que eu desconfio por algumas interferências, 
sem que V. Excia. venha no pleno conhecimento por outras vias. Já passa 
de seis meses que me acho nesta Capital de Vila Rica,aonde vim do Serro 
Frio, a dependência das desordens em que está a minha casa, como V. 
Excia. muito bem sabe; já era passado algum tempo que eu estava nesta 
vila, chegou a ela, vindo do Serro Frio, onde também é morador, Manoel 
Antônio de Morais, e veio a ser hóspede do Sargento-Mor José Joaquim 
da Rocha; e enquanto o dito Morais estava nesta Vila, ia eu algumas vezes 
falar com ele à casado tal Rocha, para saber notícias do Serro, por ter eu 
lá todo o me estabelecimento; achei na mesma casa muitas vezes, con-
versando com o Rocha e o Morais, o Alferes do Regimento Pago, José 
Joaquim, por alcunha o Tiradentes, e como era princípio do governo de 
V. Excia., e costumamos povos deste País analisar as ações dos Senhores 
Generais, e em todos os Governos há descontentes, achava eu, e alcan-
çava no dito Alferes grande descontentamento, e algumas vezes lhe ouvi 
dizer formais palavras: “se todos fossem do meu ânimo! mas lá está a 
mão de Deus” — e se ficava; e depois me disse o Morais, à porta do tal 
Rocha indo eu passando de caminho, estas palavras: “o Tiradentes anda 
morto por fazer um levante”; e como eu já levo dito que desconfiava do 
Tiradentes, e porque de natureza abomino tudo o que é traição, seja contra 
quem for, quanto mais em matéria tão circunstancial, repreendi o Morais, 
e lhe disse que semelhantes palavras ninguém as proferia, que eu as não 
queria ouvir; suspendeu-se o Morais, e eu fui andando e não soube mais 
cousa alguma; mas fiquei com uma desconfiança muito grande, maior-
mente porque sempre conheci, desde que vim para a América, nos nacio-
nais dela, interno desejo de se sacudirem fora da obediência que devem 
prestar os seus legítimos Soberanos, mas antes patenteiam uma interior 
vontade de fazerem do Brasil uma república livre, assim como fizeram os 
Americanos Ingleses. [...]
Tenho exposto a Vossa Excelência tudo o que tenho alcançado, pela obri-
gação que tenho de vassalo, e o sou muito leal e honrado; e além da obri-
gação de vassalo, por natureza sou apaixonado pelo meu Príncipe, pelos 
meus Generais e por todo o homem de bem.
Eu não quero outro prêmio, por qualquer trabalho que possa ter em utili-
dade do Estado, mais do que a minha Soberana e Vossa Excelência conhe-
çam que sou o vassalo mais leal que podem desejar nestas conquistas, 
das quais me desejo ver fora delas pela inconstância que vejo nos seus 
habitadores.
Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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135
Lembro-me mais: Que um moço do Rio das Mortes, digo das Congonhas 
do Campo, que andou em Coimbra e diz que está para ir para Portugal a 
ler no Desembargo do Paço para se despachar, cujo moço é filho do G.M. 
das Congonhas do Campo Manuel José de tal, a este moço ouvi dizer que 
um moço chamado Claro de tal, ou fulano Claro, o qual é sobrinho do Pe. 
Carlos Correia, vigário de São José do Rio das Mortes, e mora em Taubaté 
na Capitania de São Paulo; o tal Claro, disse o outro, que apanhara o 
Cônego Luís Vieira, o Coronel Alvarenga, o Dr. Cláudio, o Dr. Gonzaga, 
o Tiradentes e outros, a falarem um levante que está para se fazer nas 
Minas; e o Claro já foi para Taubaté; e julgo que o mandariam os tais para 
ele não falar alguma coisa; e o outro das Congonhas viu o Tiradentes, e 
eu também vi e julgo que viu a maior parte da gente de Vila Rica, comum 
a lista de todas as almas que tem esta Capitania, que o Tiradentes trazia 
na algibeira e a mostrava sem temor. E era perto de quatrocentas mil pes-
soas divididas pelas suas respectivas classes, brancos, pardos, e negros, 
machos e fêmeas; esta lista parece-me que lha deu o Sargento-Mor José 
Joaquim da Rocha; e quando o Tiradentes a mostrava dizia aflito: “Ora 
aqui tem todo este povo açoitado por um só homem, e nós a chorarmos 
como os negros, ai, ai; e de três em três anos, vem um e leva um milhão, 
e os criados levam outro tanto; e como hão de passar os pobres filhos 
da América? Se fosse outra nação já se tinha levantado”; a isto disse o 
tal moço das Congonhas: “Vosmecê fala assim em levante? Se fosse em 
Portugal, Deus nos livre que tal se soubesse”, ao que o Tiradentes res-
pondeu cheio de paixão: “Não diga levantar, é restaurar”, e repetiu umas 
poucas de vezes estas palavras; eu mesmo as ouvi. [...]
 Atividades
1. Pesquise e discorra sobre as bases do ideário iluminista, como este se configurou, 
quais eram seus postulados centrais e qual foi seu alcance na Europa e nas Américas.
2. Quais foram os antecedentes e as motivações da Inconfidência Mineira?
3. Com base no excerto da carta de Basílio de Brito Malheiro do Lago, qual é a ideia que 
se pode ter da relação entre a autoridade monárquica e seus súditos?
4. Qual é a imagem que a carta-denúncia passa acerca de Tiradentes?
Ideias iluministas e a Inconfidência Mineira9
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 136
 Referências 
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aftermath of an epidemic in London. Londres: McFarland & Co., 2010.
 Resolução 
1. Estimulado pela revolução científica que havia se iniciado no século XVII, o pensa-
mento iluminista era também fundamentado pelo desejo das classes médias euro-
peias de ampliar seu lugar em um mundo rigidamente governado pelos estamentos 
da nobreza e do clero. Os pensadores esclarecidos pregavam a igualdade entre os 
homens e a separação entre Igreja e Estado e defendiam a instalação de um Estado 
de Direito que promovesse a abolição dos privilégios.
 Em 1776, a propagação dos ideais iluministas, na conjuntura do impulso pela auto-
nomia econômica, culminou na independência das colônias britânicas na América da 
Grã-Bretanha, constituindo o primeiro país a se libertar de sua Metrópole nas Améri-
cas. Em 1789, na França, a monarquia seria derrubada com base nos mesmos ideais, 
em uma revolução movida pelo lema “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”.
 Na América portuguesa surgiria o mesmo ímpeto liberal e esclarecido contra a mo-
narquia e pela autonomia econômica, instigado pelo sucesso da Revolução Ame-
ricana, materializando-se na forma de conjurações, das quais a mais célebre foi a 
Inconfidência Mineira.
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
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2. Entre os séculos XVII e XVIII, vários levantes haviam eclodido na Colônia, expondo 
focos de descontentamento com a autoridade portuguesa, como, por exemplo, a Re-
volta de Vila Rica e as Inconfidências de Curvelo. Esses levantes haviam sido moti-
vados principalmente pelos modelos de gestão tributária adotados pela Metrópole, 
fixando o valor do quinto em cem arrobas anuais de ouro, e pela profunda depen-
dência dos colonos de artigos importados, minando sua independência econômica.
 Muitos dosindivíduos mais ricos da Colônia tinham interesse no desenvolvimento 
de uma economia local forte e livre da influência portuguesa, haja vista que eram 
educados nos valores iluministas, sendo egressos de universidades europeias ou 
influenciados por sujeitos com esse panorama acadêmico, o cenário social das Mi-
nas Gerais estava significativamente inclinado à concatenação de uma revolta de 
caráter separatista.
3. A lingua obsequiosa deixa claro que o depoente deseja se distanciar de forma abso-
luta de qualquer envolvimento com os inconfidentes, declarando: “Tenho exposto 
a Vossa Excelência tudo o que tenho alcançado, pela obrigação que tenho de vassa-
lo, e o sou muito leal e honrado; e além da obrigação de vassalo, por natureza sou 
apaixonado pelo meu Príncipe, pelos meus Generais e por todo o homem de bem”. 
Sua posição é a de vassalo do rei, leal à sua majestade e profundamente crítico de 
qualquer postura republicana, separatista ou mesmo que sugira ofensa à autoridade 
real. A postura do autor da delação indica o que seria uma conduta padrão do súdito 
legalista no período em que o absolutismo monárquico estava em seu auge.
4. Tiradentes é apresentado na denúncia como um agitador social, que se pronunciava 
diante de grandes grupos de pessoas, sem temor de deixar clara sua posição con-
trária ao domínio português sobre a Colônia, questionando suas ações como au-
toritárias e fomentando uma revolta como aquela que havia sido promovida pelos 
“americanos ingleses”.
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 139
10
Crise do sistema colonial
Começando no século XVII, as revoluções burguesas abalariam de forma indelével 
a esfera política e cultural da Europa e das colônias. Entre 1642 e 1688, o Reino Unido 
passou por dois movimentos dessa natureza, a Revolução Puritana e a Revolução 
Gloriosa, ao cabo dos quais era um reino significativamente mudado: a monarquia, 
outrora o poder absoluto, encontrava-se severamente limitada pela influência de um 
parlamento. O direito à propriedade privada e os princípios de uma carta de direitos 
civis e de uma economia não mais regida pelo Estado sugeriam, ao olhar contemporâ-
neo, a emergência de uma nova Europa, na qual a burguesia ganharia cada vez mais 
terreno em detrimento da velha ordem.
Na virada para o século XVIII, ainda no Reino Unido, novos desenvolvimentos 
tecnológicos levariam à primeira Revolução Industrial. O liberalismo econômico que 
caracterizava a transição de um modelo mercantilista para um modelo capitalista era 
movido pela iniciativa individual e seu desejo de ampliar a produtividade e alimentar 
grandes mercados.
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 140
Esse impulso individualista e liberal não era um caso isolado, manifestando-se nos dis-
cursos de vários pensadores europeus do período. Os mesmos burgueses, que ampliavam 
seus lucros com o comércio e a incipiente indústria que começava a revolucionar as atividades 
produtivas, exigiam também mais direitos e mais voz política. Esse desejo por mais direitos ia 
de encontro ao caráter repressivo da maioria das monarquias europeias. Filósofos iluministas 
do século XVIII, como Montesquieu e Voltaire, colocariam em questão a infalibilidade dos 
monarcas e defenderiam sistemas políticos de caráter republicano ou novos modelos organi-
zacionais e de exercício de poder, como a monarquia constitucional. Alguns desses pensado-
res iluministas defendiam a abolição de privilégios nobiliárquicos e eclesiásticos em prol das 
liberdades civis, da separação entre Igreja e Estado e do liberalismo econômico.
O ideário iluminista se espalharia também para as colônias e, em 1776, as Treze Colônias 
da América do Norte se rebelariam contra sua metrópole, defendendo justamente os valores 
da representação política, das liberdades civis e do liberalismo. O resultado da Revolução 
Americana seria a criação da República dos Estados Unidos da América. Em 1789, seria a 
vez da revolta eclodir na França. A Revolução Francesa derrubaria a dinastia monárquica 
dos Bourbon, inaugurando uma nova era de conflitos no Velho Mundo.
No Brasil, orientadas pelos mesmo ideais, conforme referenciado nos capítulos ante-
riores, seriam gestadas a Inconfidência Mineira, em 1789, e a Conjuração Baiana, em 1798. 
Embora vários desses movimentos tenham sido abafados ou desarticulados, sua ocorrência 
deixava claro que uma transição irreversível na ordem política e econômica estava em curso 
e que, tal como as metrópoles europeias, as colônias não eram mais as mesmas.
10.1 Rumos da economia 
A sociedade constituída pelos colonos portugueses no Brasil buscava em grande parte 
mimetizar a sociedade da Metrópole, com uma divisão rigorosa de estamentos sociais que 
colocava os donos de terra – os senhores – no topo, os quais concentravam riquezas, meios 
de produção, prestígio social e poder político. Colonos livres com menor poder econômi-
co estavam à mercê dos senhores, frequentemente estabelecendo com eles uma relação de 
clientelismo, na qual arrendavam terras para sobreviver ou, ainda que tivessem suas pró-
prias propriedades, dependiam da aparelhagem desses grandes donos de terra para proces-
sar seus produtos.
Todavia, a realidade brasileira não podia ser uma réplica exata daquela de Portugal, da-
das as suas peculiaridades. Desde o início do processo de colonização, a Coroa portuguesa 
encontrou dificuldades para atrair colonos ao novo território. As diferenças climáticas, os 
supostos perigos do Novo Mundo, exacerbados no imaginário lusitano por ideias cristaliza-
das do período, e as dificuldades colossais de firmar unidades produtivas “do zero” eram 
fatores desencorajadores.
No começo da colonização, quando a principal atividade econômica era a extração de 
pau-brasil, a carência de colonos não era um grande problema, pois o produto, extraído 
pelos indígenas, era obtido por meio de um sistema de escambo, pouco custoso e altamente 
Crise do sistema colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
10
141
lucrativo para os europeus. À medida, porém, que outros europeus se revelavam interessa-
dos em tirar proveito das riquezas naturais do novo território, Portugal precisava ocupá-lo 
de modo a poder assegurá-lo. Como os lusos já haviam tido sucesso com seu experimento 
açucareiro nas ilhas do Atlântico, optou-se por implementar o mesmo modelo nas posses 
americanas. Para suprir a eminente carência de mão de obra, o trabalho escravo seria empre-
gado, primeiramente imposto aos indígenas, depois aos africanos, trazidos via uma rede de 
tráfico com a qual muitos portugueses enriqueceram.
A presença dos indígenas, a população nativa do território cuja humanidade era colo-
cada em questão pelos europeus, dada a diferença que havia entre suas sociedades tradi-
cionais e os costumes de origem europeia, sempre foi matéria de conflito entre os colonos. 
Por um lado, Portugal, como nação cristã e que tinha em seu catolicismo missionário parte 
relevante de sua identidade como reino, teria a obrigação de buscar converter povos gentios, 
trazendo-os para o “seio de Cristo”. Por outro lado, se esses povos fossem convertidos, se-
riam elevados ao estatuto de seres humanos plenos e não poderiam ser escravizados.
Assim, os interesses religiosos e econômicos entravam em conflito. Enquanto as ordens 
religiosas, especialmente os jesuítas, despendiam esforços consideráveis para evangelizar 
os povos nativos e reuni-los em reduções, expedições conhecidas como “entradas” e “ban-
deiras” cruzavam o interior do território capturando-os e escravizando-os. Ao partir para os 
sertões com o propósito de prear escravos, os bandeirantes estariam no coração da expansão 
territorial da América portuguesa e da diversificação econômica da Colônia, empurrando 
cada vez mais para oeste os limites do Tratado de Tordesilhas e buscando as drogas do ser-
tão e metais e pedras preciosas.
O tráfico negreiro se apresentaria como solução paraesse impasse, ao menos na costa 
do país. Embora a escravidão indígena tenha continuado a existir de forma regular em vá-
rias regiões do país até o fim do período colonial, a escravidão negra se tornaria a norma 
predominante, sendo uma rica fonte de lucro para vários comerciantes portugueses e a es-
pinha dorsal da exploração agrícola na costa atlântica.
No litoral predominava então o cultivo intensivo de cana-de-açúcar para refino e exporta-
ção, sempre acompanhado, em menor escala, pelo cultivo de gêneros de exportação de menor 
importância, como o algodão e o tabaco, ou de subsistência, como a mandioca. A criação de 
gado era incompatível com o cultivo das plantations e, portanto, ativamente desencorajada 
pelas autoridades portuguesas. Era, todavia, uma atividade econômica fundamental e alta-
mente aplicável na Colônia, posto que demandava pouca mão de obra, apesar de requerer 
vastas extensões de terra. Consequentemente, a pecuária extensiva se tornaria uma atividade 
intensamente desenvolvida no interior da colônia, exercendo papel fundamental na ocupação 
e ampliação das fronteiras portuguesas na América. O gado era muitas vezes gerido por uma 
mão de obra livre e mestiça, o que produziria uma rede de sociabilidades distinta daquela vis-
ta nos grandes centros. Como retratariam artistas posteriores, essa população interiorana era 
em grande parte composta por “índios civilizados”, semelhantes aos bandeirantes, os quais, 
apesar de sentirem-se súditos portugueses, preservavam costumes, hábitos, alguns nomes 
próprios, toponímia e outros caracteres linguísticos de origem indígena.
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 142
Figura 1 – DEBRET, Jean-Baptiste. Charruas civilizados. 1834. Litografia, p&b: 24 x 33,5 cm. 
Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, São Paulo, SP.
Gestada nos latifúndios canavieiros de capitanias como Pernambuco, Bahia e São Vicente, 
a sociedade colonial que se constituiria nos maiores centros populacionais da América por-
tuguesa seria baseada na reverência aos grandes senhores de engenho, que detinham a terra 
e a força de trabalho escrava, combinação da qual emanava a riqueza açucareira.
Formou-se assim uma sociedade profundamente hierárquica e baseada na dominação e 
no clientelismo, extremamente dependente de vastos contingentes de mão de obra e da de-
manda externa pelos produtos de sua monocultura. Quando os mercados europeus começa-
ram a adquirir açúcar de outros fornecedores, como os holandeses e ingleses, em detrimento 
do produto português, a sociedade dos engenhos começou a periclitar. A Metrópole se for-
çava a buscar novas alternativas econômicas para manter a Colônia economicamente viável.
Mesmo quando o foco da Colônia começou a ser revertido para a atividade mineradora 
nas regiões das Minas Gerais e do Centro-Oeste brasileiro, mudando por completo a natu-
reza da atividade predominante (de agricultura de plantation para extrativismo mineral), 
preservou-se a essência funcional das operações coloniais: o trabalho escravo. Com efeito, a 
capitação, um dos modelos de tributação que a metrópole portuguesa tentou implementar 
para garantir o fluxo contínuo de ouro da Colônia, baseava-se justamente na tributação “por 
cabeça” dos escravos, forçando o minerador a pagar as cotas em questão, independente-
mente de seu contingente ter obtido sucesso na exploração das jazidas ou não.
Paralelamente crescia a pecuária, que ocupava os sertões brasileiros, sendo dirigida 
ativamente para suprir não apenas os mercados europeus, mas o mercado interno que se 
formava nas Minas Gerais, à medida que mais e mais colonos chegavam de outras partes do 
Brasil ou de Portugal, em uma verdadeira corrida pelo ouro.
O suprimento de alimentos e artigos essenciais para os mineiros era um grande negócio 
entre os séculos XVII e XVIII, e, embora a maior parte da população mineira jamais tenha 
Crise do sistema colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
10
143
enriquecido significativamente com a extração de ouro, esses comerciantes se tornaram 
prósperos cobrando preços que, de tão elevados, estariam na lista de situações que ocasio-
naram sucessivos levantes na região. Mesmo quando o ciclo do ouro começou a declinar, 
com a produção das minas sendo esgotada, a exploração do gado nos sertões se manteria 
uma atividade econômica fundamental para a Colônia.
O impacto do ciclo do ouro, aliás, foi além da região das Minas Gerais, influenciando 
na configuração geopolítica da Colônia como um todo. Salvador, outrora sede da América 
lusitana, tornara-se um porto insatisfatório para o escoamento do quinto a ser embarcado 
anualmente para Portugal, de modo que a capital foi deslocada para um porto mais conve-
niente: o Rio de Janeiro.
Entretanto, mesmo em um contexto de prosperidade econômica e de sucesso, o sistema 
estava sujeito a problemas externos e internos, como a competitividade de outros mercados, 
a carência de suprimentos e o tipo de governo imposto na América portuguesa, fatores que 
contribuíam para o clima de insatisfação entre os colonos. Tensões econômicas, em particu-
lar, seriam um aspecto decisivo para o crescimento dessa insatisfação. Conforme argumen-
ta Novais (1989), o modelo colonial implementado pela Metrópole, marcado pela intensa 
exploração econômica e pela tentativa de governar à distância, impondo valores europeus 
e percepções de hierarquia social oriundos de Portugal, seria marcado por contestações. À 
medida que a economia local sofria e os habitantes da América portuguesa se sentiam preju-
dicados pela gestão metropolitana, o sistema colonial dava mostras de crise.
10.2 Novas relações de poder e sociabilidade
Figura 2 – DEBRET, Jean-Baptiste. Vista do Largo do Paço no Rio de Janeiro. ca. 1830. Litografia, 
color. Museu de Arte do Rio, Rio de Janeiro. 
 
Os rumos da economia ditaram em grande parte os modelos de sociabilidades na 
Colônia. A vida rústica dos vaqueiros, espalhados em grupos esparsos pelo sertão, por 
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/b/bf/Pa%C3%A7o_Imperial_1830.jpg
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 144
exemplo, produziu uma mentalidade que se perpetuaria no imaginário brasileiro mesmo 
após o fim do período colonial, estimulando a expansão territorial para o Oeste, sua ocu-
pação e exploração econômica. De forma semelhante, os bandeirantes, que percorriam o 
interior em busca de riquezas e escravos, tornar-se-iam heróis mitificados e exploradores 
sem os quais o país não teria sua configuração atual.
Um dos mais marcantes desses modelos de sociabilidade desenvolvidos no período co-
lonial foi certamente o da sociedade açucareira. Por muito tempo a principal região produ-
tora de riquezas da Colônia, inclusive alvo de disputas entre portugueses e holandeses, foi o 
atual Nordeste brasileiro, onde vigoravam as relações de poder fundadas na “casa-grande”. 
Essas relações se erguiam sobre o poder que os senhores de engenho tinham de adquirir e 
dirigir escravos, controlar a terra e o aparato produtivo e influir na política local.
Entretanto, o enriquecimento de certos setores da população da capitania das Minas 
Gerais mudaria radicalmente esse estado de coisas, como no caso da formação de uma elite 
educada com valores europeus, que desejava reelaborar as ideias iluministas vigentes na 
França em solo brasileiro, e o deslocamento da capital para o Rio de Janeiro, em 1763.
Embora uma página importante da história colonial brasileira – o confronto com os 
franceses – tenha se desenrolado nesse palco, o Rio de Janeiro não foi a região de expres-
são econômica ou política mais importante para a Colônia por boa parte de sua história. 
Ao longo do século XVI, a cidade foi principalmente uma área de extração de pau-brasil, 
sendo implantadas unidades canavieiras posteriormente e ao longo do século XVII. A ca-
pital da América portuguesa era então Salvador, na capitania daBahia, e as capitanias de 
Pernambuco e São Vicente, que comandavam uma produção açucareira mais relevante, es-
tavam à frente na condução da economia colonial.
Tudo isso mudaria com a chegada do século XVIII, com a aparelhagem da região do Rio 
de Janeiro, a fim de que se convertesse num porto efetivamente capaz de receber escravos 
e escoar ouro e outros produtos em larga escala. A cidade florescente atraiu a atenção de 
piratas: o corsário francês Jean-François Duclerc tentaria saqueá-la em 1710, mas fracassou 
porque os portugueses haviam sido notificados do avanço de sua frota, vencendo-a com 
facilidade; porém, em 1711, o porto, considerado inexpugnável, foi tomado pela esquadra 
de René Duguay-Trouin, que manteve o governador refém e a cidade sob seu controle por 
dois meses.
Não obstante as tensões, o período que se seguiu seria de crescimento consistente. 
António Gomes Freire de Andrade (1685 -1763), que foi governador do Rio de Janeiro de 1733 
a 1763, entre os reinados de D. João V (1706 -1750), o Magnânimo, e D. José I (1750 -1777), o 
Reformador, implementou diversas melhorias na cidade. O governador Freire de Andrade 
ordenou a construção de uma estrutura mais sofisticada, de cal, cantaria e tijolos, para tra-
zer água potável do Rio Carioca: o chamado Aqueduto da Carioca, também conhecido como 
Arcos da Lapa, que se tornaria uma das estruturas mais marcantes da arquitetura carioca.
Freire de Andrade também encomendou a construção de conventos, entre os quais 
o Convento da Ajuda, posteriormente demolido, e de dois estabelecimentos para a agre-
miação de intelectuais: a Academia dos Felizes e a Academia dos Seletos. Ambas, porém, 
Crise do sistema colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
10
145
tiveram vida curta. Além disso, o governador permitiu a António Isidoro da Fonseca estabe-
lecer, em 1747, a primeira tipografia da cidade, embora esta tenha sido fechada no mesmo 
ano, devido a uma proibição das autoridades da Metrópole contra a produção de materiais 
impressos na Colônia.
Essa nova capital se desenvolveria como um novo espaço de poder, de certa forma mais 
cosmopolita. Crescendo com mais força em um momento em que novos princípios de civiliza-
ção do pensamento iluminista se alastravam pela Europa e pelas colônias, esse espaço urbano 
era marcado por um ímpeto intenso de modernização, infusão de novas ideias e europeização.
Estrangeiros de passagem pelo porto no século XVIII, principalmente ingleses, como 
John Barrow, aliados de longa data da Coroa portuguesa, evidenciaram uma admiração 
pela beleza natural e pelas riquezas que a região era capaz de produzir e enviar ao exterior:
Embora eu deva me esforçar para esboçar uma noção geral dos atributos dessa 
parte da costa brasileira, estou plenamente consciente de que qualquer descrição 
que eu possa empregar transmitirá uma ideia inadequada da grandiosidade e da 
beleza da região àqueles que nunca tiveram a oportunidade de vê-la. (BARROW, 
1806 apud BRITO, 2008, p. 37)
Outros relatos, menos gentis em natureza, como o de James George Semple Lisle, ain-
da que apresentem certo teor abrasivo de crítica àquilo que percebem como potencialida-
des econômicas não aproveitadas de forma plena, mostram admiração em relação ao que 
a Colônia e a cidade têm a oferecer. Lisle, embora critique a “preguiça dos habitantes”, o 
que afirma ser “uma barreira insuperável”, comenta favoravelmente sobre a diversificação 
econômica que encontrou:
As principais produções da região são algodão, café, madeiras tingidoras, açú-
car, couro, ouro e tabaco. Com isso eles enchem cento e cinquenta ou duzentos 
navios que costumavam reunir-se anualmente na Bahia de Todos os Santos e de 
lá continuavam sua viagem a Portugal. [...] produz cristal aqui de grande volume 
e beleza e que oferece ao oculista as melhores lentes para os espetáculos. Há tam-
bém uma espécie de algodão, que, a partir de sua aparência sedosa, é chamada 
de silky cotton, mas sua escassez o exclui do comércio. (LISLE, 1800 apud BRITO, 
2008, p. 69)
Contando, assim, com uma variedade de produtos de exportação, incluindo os miné-
rios, devidamente “quintados”, trazidos do interior, a cidade impressionava por dispor de 
ruas retas e pavimentadas – um “luxo”, ausente mesmo em muitas cidades europeias à épo-
ca –, bem como pela abundância de lojas grandes e bem supridas de produtos estrangeiros, 
principalmente os de origem britânica.
As instalações públicas eram descritas ora como excepcionalmente limpas, ora como 
carentes de cuidados por parte dos habitantes. O difícil acesso ao pão não passou des-
percebido, posto que o trigo precisava ser trazido de fora a altos custos, o que o tornava 
um bem de consumo acessível apenas às classes altas, caro até mesmo para indivíduos de 
classe média e totalmente ausente na dieta dos pobres. Uma variedade de frutas, por vezes 
muito doces ou insípidas na opinião dos estrangeiros (assim como a carne, considerada 
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 146
magra e insossa), estava disponível em grande quantidade, e a farinha de mandioca era 
o item básico para a alimentação quotidiana de todos, sendo frequentemente o único ali-
mento à disposição dos escravos.
Os escravos, aliás, eram uma presença dominante. Contrário ao que poderia ditar o sen-
so comum, eles não estavam restritos aos campos de cultivo, engenhos, senzalas das gran-
des fazendas e cozinhas dos senhores ricos da urbe. Famílias de colonos humildes contavam 
com seus próprios escravos, os quais viviam nas mesmas instalações que os donos. Com 
frequência eram soltos ao longo do dia, a fim de se dirigirem às ruas e praças da cidade para 
vender produtos, especialmente alimentos, ou prestar serviços de barbearia, voltando a seus 
senhores ao entardecer, para entregar-lhes os ganhos obtidos em um dia de trabalho. Nas 
residências humildes, de madeira, taipa e palha, senhores e escravos dormiam em condições 
igualmente básicas, com mobiliário parco, consistindo especialmente de esteiras e estrados, 
sentando-se ao chão para fazer as refeições.
Essas relações, especialmente registradas nos maiores centros urbanos, oferecem vis-
lumbres das complexidades de uma economia escravista sob a esfera da influência portu-
guesa. Guardadas as proporções locais, pois nem todos os povoamentos da América por-
tuguesa possuiriam populações escravizadas comparáveis em número, ou mesmo nível, de 
concentração de riqueza, o clientelismo e a configuração patriarcal das unidades familiares 
eram dominantes território colonial afora. As tensões sociais decorrentes de conflitos de 
ordem religiosa, racial e social seriam sentidas em toda parte, intensificadas pela adoção de 
modelos de gestão e organização social portugueses, os quais, em grande parte, eram pre-
servados, adaptando-se pouco às particularidades da Colônia. Essas tensões contribuiriam 
para a crise do modelo até então vigente.
10.3 Demandas locais e crise do sistema colonial
Não era apenas a precariedade material que se fazia notar na capital da Colônia. A 
riqueza que emanava de um ciclo econômico bombástico, mesmo em seus anos de declí-
nio, nas décadas finais do século XVIII, ocupava seu lugar. O ouro e as pedrarias estavam 
presentes nos interiores das residências da elite, embora a atividade dos artífices lapidários 
fosse ocasionalmente proibida na Colônia, exceto com expressa autorização real. Artistas 
experientes, com efeito, eram raros, o que acabava sendo um fator restritivo para o embele-
zamento da cidade do Rio de Janeiro.
Os minérios também apareciam na decoração das igrejas e dos mantos rendados dos 
santos que eram sustentados com grande pompa nos ritos públicos, embora a qualidade 
da pintura e da escultura fosse frequentemente caracterizada como primária. Certo caráter 
supersticioso, aliás, seria atribuído por esses observadores à população fluminense, e por 
extensão à brasileira, dado seu apego às tradições católicas, ao volumede igrejas e conven-
tos no conjunto da arquitetura urbana e à onipresença dos santos na vida comum.
Para além das sociabilidades mais evidentes, as inquietações sociais também se torna-
vam visíveis aos observadores externos, como nota John Barrow, afirmando ter passado a 
Crise do sistema colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
10
147
noite em um domicílio com “pouca ou nenhuma mobília [...] em estrados de madeira de 
bambu, sem roupa de cama, sem colchão e sem cortinas” (apud BRITO, 2008, p. 59). O autor 
afirma que se tratava de uma das residências de um rico senhor de escravos, cuja plantação 
produzia vários gêneros de valor comercial, 
mas sua maneira de viver, tão distante quanto somos capazes de julgar, era des-
tituída de todo tipo de conforto [...]. Ele [o senhor] reclamou angustiosamente da 
opressão que os habitantes da América do Sul sofriam da pátria mãe e também 
que os monopólios, as proibições e as taxas entravaram o comércio e a agricul-
tura e destruíram o espírito de empreendimento. Ele manifestou a insatisfação 
de ter se tornado tão submisso em relação aos fardos impelidos aos brasileiros e 
falou das restrições às quais eles eram obrigados a se submeter, de modo que não 
ficaria surpreso, segundo disse, se os brasileiros fizessem enfim o mesmo que 
seus irmãos do norte do continente e, para acabar com a opressão portuguesa, 
declarassem independência. (BARROW, 1806 apud BRITO, 2008, p. 59-60)
Essa era, portanto, uma sociedade em estado de efervescência, na qual as relações de 
poder eram mais complexas e sutis do que o senso comum poderia dar a entender. O desejo 
de modernizar e “europeizar” a cidade, criando um conjunto estrutural mais diversificado, 
organizado e esteticamente agradável, além de culturalmente mais refinado, convivia com 
as tradições e atitudes supersticiosas de um povo ainda firmemente católico. Também convi-
viam, ao mesmo tempo, a riqueza que vinha da terra e a insatisfação de classes médias, que 
eram impedidas de ter acessos aos mesmo luxos que seus pares europeus, em razão dos tribu-
tos e restrições tidos como injustos, tal como no caso de senhores de escravos que exploravam 
intensamente o trabalho de seus cativos, sem que isso, no entanto, os tornasse tão ricos quanto 
almejavam, de forma a equipararem-se às elites da Metrópole. Essas tensões, somadas à difi-
culdade progressivamente maior de gerenciar um território tão complexo como um projeto de 
exploração econômica, marcariam o declínio do projeto colonial português na América.
Ao fim do século XVIII, a América portuguesa era uma unidade territorial complexa e 
de proporções colossais. Gerir esse imenso território não era apenas uma fonte de dividen-
dos, mas também de impasses. Inumeras revoltas já haviam estourado através da Colônia 
antes mesmo da eclosão de revoltas emancipacionistas, como a Inconfidência Mineira e a 
Revolta dos Alfaiates. Os colonos, cuja atuação constituía a base dos lucros da Coroa portu-
guesa na América, tornavam-se cada vez mais insatisfeitos com sua falta de voz e de auto-
nomia comercial, as tributações elevadas e os altos preços de inúmeros artigos de primeira 
necessidade que precisavam ser importados, haja vista que sua produção em território co-
lonial era proibida.
Do século XVI ao XVIII, Portugal conduziu seu projeto colonial como um projeto de 
exploração. O Brasil fora, em primeiro lugar, um jardim natural para a extração de madeiras 
nobres, convertendo-se a seguir em um amplo espaço reservado à agricultura e à pecuária 
de exportação. Por fim, as jazidas de ouro foram exploradas sistematicamente, em muitos 
casos até a exaustão.
A Metrópole havia se beneficiado consideravelmente dessa relação de exploração, mas 
a Colônia existia, em grande parte, à margem, um espaço de exploração econômica agressiva 
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 148
que abria brechas às contestações dos colonos. Raramente esses colonos dispuseram de con-
fortos comparáveis aos que podiam ser encontrados nas grandes cidades da Europa ou do 
status das elites continentais europeias. Restrições eram frequentemente impostas a seus 
empreendimentos. Somados à emergência do ideário iluminista na Europa, demandando 
representação política, liberdade e autonomia econômica e lançando reverberações nas co-
lônias, esses fatores pesavam sobre as relações de poder entre os territórios americanos e 
suas metrópoles.
Desse modo, não foi um único fator que levou à crise do sistema colonial; muitas foram 
as complexidades envolvidas na decadência do domínio metropolitano sobre a América 
portuguesa. O território da Colônia se revelara uma posse valiosa para geração de riquezas, 
mas havia pouco espaço para a autogestão. Oficiais do Estado eram acusados de favoreci-
mento e corrupção, e a carga tributária era muitas vezes considerada escorchante e abusiva. 
Tensões sociais fervilhavam em uma sociedade em grande parte composta por escravos li-
bertos e trabalhadores livres que careciam de representação. Mesmo os maiores povoamen-
tos locais dispunham de uma infraestrutura precária em comparação com seus equivalentes 
europeus, embora a tradição buscasse impor os mesmos parâmetros de comportamentos e 
relações sociais. Em diversos sentidos, o sistema colonial encontrava dificuldades em conci-
liar estruturas sociais e valores do “Velho Mundo” com a complexa conjuntura da América 
portuguesa.O território colonial começava a transição para um novo modelo de governo e 
de sociedade, sempre equilibrando precariamente a tradição e o novo e negociando perma-
nências e rupturas.
 Ampliando seus conhecimentos 
A narrative of the British Embassy to China1
(ANDERSON, 1795 apud BRITO, 2008, p. 7-11)
[...]
Nessa manhã, ainda cedo, Sir George e Sr. Staunton, acompanhados pelo 
Sr. Barrow e um cavalheiro português, empreenderam uma pequena 
excursão pela região. Ao mesmo tempo eu aproveitei a oportunidade de 
visitar o lugar que sigo agora descrevendo, conforme minha capacidade 
de observação me permitir.
A cidade, que é por alguns chamada de São Sebastião e por outros de Rio 
Janeiro, fica do lado oeste do porto que tem esse mesmo último nome, 
numa localidade de baixa altura e quase que cercada por montes que, 
por retardarem a circulação do ar, fazem do lugar bastante danoso à 
1 Excerto de: ANDERSON, Aeneas. A narrative of the British Embassy to China. Dublin: Prin-
ted by William Porter, 1795. Cap. 1. 
Crise do sistema colonial
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 
10
149
constituição dos europeus. Seu tamanho é expressivo, tendo de leste a 
oeste cerca de quatro milhas em comprimento, e cerca de duas milhas de 
amplitude do norte para o sul. As ruas são, pela falta de praças, regula-
res e uniformes, cruzando-se em ângulos retos: são bem pavimentadas, 
repletas de lojas de toda ordem, além de compostas por casas igualmente 
bem construídas e adaptadas ao clima. No centro da cidade, frente à praia, 
fica o palácio do Vice-rei: trata-se de uma construção grande, comprida e 
estreita, sem atrativos externos, mas contendo uma sucessão de aposen-
tos nobres e espaçosos. Esse prédio tem apenas dois andares, sendo o de 
baixo designado aos funcionários domésticos e de menor categoria, e no 
de cima ficam os aposentos do Vice-rei; é construído de pedra áspera, 
rebocado com cal e coberto por telhas. A capela do Vice-rei é um edifício 
cuidado, perto do palácio, mas separado dele. As ruas são não só espaço-
sas apropriadas, mas também notáveis pela limpeza, muitas delas con-
tendo uma variedade de lojas e depósitos que são dignos de cidades da 
Europa. Há um costume aqui que deveria ser imitado em todos os lugares 
de grande transação comercial, que é o de todas as pessoas da mesma 
profissão ocuparem a mesma rua, ou a mesma área; raramente sabe-se 
de alguma exceção. Da população desse lugar não pude obter nenhuma 
afirmação apurada, mas a julgar pelo tamanho da cidade e porobserva-
ções em geral que pude fazer, pode-se considerar, penso eu, sem exagero, 
um total de duzentas mil almas. As pessoas, católicas romanas, são muito 
ligadas às cerimônias de sua religião, que cultuam com muita supersti-
ção. As igrejas são muito numerosas e ostentadoramente decoradas. Nos 
festivais de seus patronos, esses edifícios são ricamente adornados e bela-
mente iluminados. De fato, alguns deles foram iluminados tão esplendi-
damente durante nossa estada que ofereciam um espetáculo estonteante, 
de modo que lembravam mais festas do que atos de devoção paroquial. 
Perto do centro da cidade, em um promontório imponente, há um obser-
vatório público dotado de um aparato astronômico.
Os habitantes ostentam bastante através de suas vestimentas e todo tipo 
de gente tem o hábito de considerar espadas essenciais em suas apari-
ções públicas, nem mesmo as crianças estão isentas do porte de tal arma 
ornamental. A vestimenta das damas lembra de certo modo as das mulhe-
res europeias, exceto no que diz respeito ao ornamento da cabeça. Seus 
cabelos são esticados para trás e adornados com flores artificiais, contas e 
plumas, fantasticamente arranjadas; atrás cai em variados cachos trança-
dos e mesclados com fitas de várias cores, sendo que cada trança termina 
em uma rosa feita de fitas. Eles também usam uma grande manta de seda 
caída solta para trás sob forma de cauda que é segurada por um servo 
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História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 150
enquanto outro segura uma sombrinha para proteger do sol o rosto de sua 
senhora. As fêmeas do Brasil são geralmente de cútis pálida, mas têm uma 
certa delicadeza que faz delas objetos muito agradáveis, e a afabilidade de 
suas maneiras aumenta a agradabilidade de seus atrativos pessoais.
O comércio desse lugar é muito grande e é fonte de grande riqueza para 
os habitantes, bem como para a nação-mãe. Os muitos artigos que são de 
lá exportados são os mesmos produzidos em partes dos assentamentos 
portugueses no Brasil. Os ancoradouros são bem grandes e peculiarmente 
espaçosos; estávamos muito impressionados em observar a destreza com 
que os escravos carregavam e descarregavam as barcaças ao longo dos 
mesmos. O arroz, do qual grande quantidade pareceu ser exportada desse 
assentamento, estava todo contido em couro cru de boi.
[...]
A noroeste da cidade há um aqueduto estupendo que é um objeto de inco-
mum curiosidade. Tem a forma de uma ponte, tem oitenta arcos e, ao 
menos em algumas partes, tem cento e cinquenta pés de altura, podendo 
ser visto de diferentes pontos de vista, o que causa um efeito peculiar, che-
gando aos poucos acima das maiores construções da cidade. Essa imensa 
cadeia de arcos estende-se ao longo de um vale e une os montes que o for-
mam. A finalidade com que se fez tal construção é clara, já que ela leva a 
água de fontes perpétuas, à distância de cinco milhas, para a cidade, onde, 
por meio de canos plúmbeos, é conduzida a um grande e elegante reser-
vatório na praia, em frente ao palácio do Vice-rei. Essa água é da melhor 
qualidade e é ademais tão abundante que não só proporciona o necessário 
para todas as vontades dos habitantes, como também reabastece os navios 
que vêm ao porto – um elemento muito necessário.
O estabelecimento militar em Rio Janeiro fica em uma base muito distinta. 
Os soldados são não só bem vestidos e disciplinados, como também têm per-
missão de gozar de todos os privilégios dos cidadãos. Isso parece ser uma 
política do governo português, muito sábia aliás, pois faz com que a situação 
dos soldados na colônia seja ao mesmo tempo confortável em si, e respeitável 
em seu caráter, além de, até certo ponto, como imagino, ser fonte de vanta-
gens financeiras. Assim, a lealdade e zelo dos soldados são felizmente asse-
gurados em uma localidade tão importante por seu valor, e onde a vigilância 
e a fidelidade daqueles que a guardam se torna mais necessária por conta 
da grande distância entre a mesma e a nação mãe. Se seu pagamento é feito 
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proporcionalmente de acordo com o serviço que fazem nessa colônia ou se 
eles têm alguma regalia, não sei dizer, mas certamente parecem estar em um 
estado de relativa prosperidade que não se percebe em nenhum outro grupo 
de soldados que vi, ou dos quais ouvi. O número de tropas em Rio Janeiro, 
incluindo cavalaria e infantaria, chega a ser de vinte mil homens, e as milícias 
somam não menos que o dobro disso. [...]
 Atividades
1. Que fatores levaram o projeto colonial a um estado de crise, do ponto de vista eco-
nômico?
2. De que maneiras a crise do sistema colonial levou a mudanças nas relações de poder 
e sociabilidades na Colônia?
3. No século XVIII, o Rio de Janeiro passou por uma fase intensa de crescimento e di-
versificação de atividades. O que levou a essas mudanças?
4. Com base no texto de Anderson Aeneas citado por Brito (2008) e outros excertos do 
capítulo que apresentam uma visão estrangeira sobre o Rio de Janeiro, discorra sin-
teticamente sobre o discurso apresentado por esses relatores vindos de fora.
 Referências 
AUTOS de Devassa da Inconfidência Mineira. Brasília: Câmara dos Deputados; Belo Horizonte: 
Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1978.
BRITO, Danilo Lopes (Org.). O Rio de Janeiro do século XVIII no olhar dos viajantes ingleses: tradu-
ções. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2008.
CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. São Paulo: Hedra, 2009.
CASCUDO, Luís da Câmara. Geografia do Brasil holandês. Brasil: José Olympio, 1956.
COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não-proprietários de escravos no Brasil. 
São Paulo: MGSP, 1992.
______. Nota sobre a não existência de modos de produção coloniais. São Paulo: IPE-FEA/USP, 1985.
FRAGOSO, João Luís; FLORENTINO, Manolo. O Arcaísmo como projeto: mercado atlântico, socie-
dade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
2001 [ca.1790-1840].
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial. São Paulo: HUCITEC, 
1989.
Crise do sistema colonial10
História do Brasil: do início da Colonização às Conjurações 152
PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo – colônia. São Paulo: Companhia das 
Letras, 2011.
______. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1970.
SOUZA, Laura de Mello e. Norma e conflito: aspectos da história de Minas no século XVIII. Belo 
Horizonte: Ed. da UFMG, 2006.
TAVARES, Luís Henrique Dias. História da sedição intentada na Bahia em 1798: a conspiração dos 
alfaiates. São Paulo: Pioneira, 1975.
 Resolução 
1. Como uma colônia de exploração fundada para atender aos interesses econômicos 
do Reino de Portugal, o Brasil passou por diversos ciclos econômicos, os quais foram 
implementados visando ao máximo ganho possível para a Metrópole, e não neces-
sariamente o estabelecimento de uma infraestrutura forte e saudável que garantisse 
autonomia financeira e o bem-estar dos colonos. As próprias condições impostas 
pelo território – a geografia e o clima tropical em boa parte da Colônia, muito di-
versos daqueles de Portugal, além da relativa ausência de estruturas prévias que 
facilitassem a ocupação – tornavam a colonização pouco convidativa a voluntários 
lusitanos, de modo que os esforços para tornar o projeto colonial economicamente 
viável passavam por uma pesada dependência dos latifúndios monocultores volta-
dos à exportação e ao uso de mão de obra escrava em larga escala. 
2. No fim do século XVIII a Colônia se convertera em uma unidade territorial que era 
tão imensa quanto problemática. Desde o século XVI, Portugal a gerira como um 
projeto de exploração, usando-a primeiro como polo de extração de madeiras nobres 
e depois para a agricultura e a pecuária de exportação, antes de agir sistematicamente 
para explorar suas reservas auríferas ao máximo possível. Tudoisso foi feito, todavia, 
em prol da Metrópole, havendo, até a aurora do século XVIII, poucos esforços para 
tornar a Colônia um espaço atrativo para os próprios colonos. Raramente se permitiu 
que estes tivessem estruturas essenciais ou confortos comparáveis aos da Europa, 
tampouco deu-se a eles a liberdade para realizarem seus empreendimentos ativa-
mente. Somados à emergência do ideário iluminista na Europa, demandando repre-
sentação política, liberdade e autonomia econômica, esses fatores pesavam sobre as 
relações de poder na Colônia, produzindo revoltas.
3. Para que o ouro produzido nas Minas Gerais fosse devidamente tributado, ou seja, 
submetido ao quinto, cota da Coroa, era necessário que dispusesse de um porto con-
veniente, por meio do qual as cargas fossem enviadas a Portugal com maior agili-
dade. Salvador, que era a capital administrativa, comercial e eclesiástica do país, 
estava muito distante para poder cumprir esse papel, de modo que o Rio de Janeiro 
começou a ser devidamente equipado para a tarefa.
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 Precisando dar conta da saída de ouro e outros bens e da chegada de escravos para 
abastecer o mercado interno, o porto do Rio começou a crescer. A cidade foi subme-
tida a vários melhoramentos e ampliações, adquirindo uma imagem mais europeia. 
Uma carta régia transferiu oficialmente a capital para Rio de Janeiro em 1763, embo-
ra Salvador tenha preservado muito de sua importância regional. 
4. O relato de Aeneas Anderson chama atenção, assim como os registros de outros 
ingleses que visitaram a Colônia no século XVIII, por fornecer um olhar externo, 
o qual capta minúcias da vida fluminense que talvez não interessassem ou fossem 
dadas por obviedades aos olhos de um observador português. Anderson, assim 
como outros estrangeiros, traçou pararelos com a Europa de sua época, ressaltan-
do as peculiaridades climáticas e do relevo que lhe parecem desagradáveis, tratan-
do com admiração das dimensões da cidade e do contingente populacional que a 
ocupa. A organização e a limpeza do espaço urbano também são destacadas por 
Anderson, bem como a arquitetura e o caráter ostentoso dos interiores das igrejas 
e do vestuário dos habitantes e a forte religiosidade católica, repleta de rituais 
cotidianos. O inglês ainda se mostra impressionado com o modo como a cidade 
garante a manutenção de suas forças militares, com seus soldados bem vestidos e 
com as regalias de que estes dispõem, de modo a assegurar sua lealdade. No todo, 
Anderson parece impressionado e decidido a transmitir a ideia de que se trata de 
uma cidade que, apesar de problemas e questões cunjunturais, é comparável a 
muitas das urbes europeias.
História do Brasil: do Início da Colonização às Conjurações
M
aristela Carneiro
Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6308-6
9 788538 76308 6

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