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INICIAÇÃO AOS ESPORTES COLETIVOS - COMPLETO

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INICIAÇÃO AOS 
ESPORTES COLETIVOS 
ROGÉRIO DA CUNHA VOSER 
 
 
 
 
 
 
 
 
2020 
 
 
 1 
 
 
SOBRE O AUTOR 
 
 
 
DOUTOR EM CIÊNCIAS DA SAÚDE NA PUCRS, EM 2006. MESTRE EM CIÊNCIAS DO 
MOVIMENTO HUMANO PELA ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA UFRGS, EM 1998. 
ESPECIALISTA EM CIÊNCIAS DO FUTEBOL E DO FUTEBOL DE SALÃO PELAS 
FACULDADES INTEGRADAS CASTELO BRANCO CENTRO EDUCACIONAL DE REALENGO, 
EM 1990. LICENCIADO EM EDUCAÇÃO FÍSICA PELA ESEF-UFPEL, EM 1988. GRADUADO 
EM FISIOTERAPIA PELA ULBRA, EM 1999. ATUALMENTE É PROFESSOR ASSOCIADO 
NÍVEL 2 DA ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA, FISIOTERAPIA E DANÇA DA UNIVERSIDADE 
FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL . AUTOR DOS LIVROS INICIAÇÃO AO FUTSAL: 
ABORDAGEM RECREATIVA; ANÁLISE DAS INTERVENÇÕES PEDAGÓGICAS EM 
PROGRAMAS DE INICIAÇÃO AO FUTSAL; A CRIANÇA E O ESPORTE: UMA PERSPECTIVA 
LÚDICA; FUTSAL: PRINCÍPIOS TÉCNICOS E TÁTICOS; FUTSAL E A ESCOLA: UMA 
PERSPECTIVA PEDAGÓGICA; FUTEBOL: HISTÓRIA, TÉCNICA E TREINO DE GOLEIRO; 
ENSINO DOS ESPORTES COLETIVOS: UMA ABORDAGEM RECREATIVA; PIBID NA 
EDUCAÇÃO FÍSICA: UMA PROPOSTA METODOLÓGICA E PRÁTICAS PARA O ENSINO DO 
ESPORTE NA ESCOLA E FUTSAL: ENSINO ATRAVÉS DOS JOGOS DE INTELIGÊNCIA E 
CAPACIDADE TÁTICA. 
 
 
 2 
 
Sumário 
Introdução.............................................................................3 
1 Aspectos pedagógicos das atividades físico-desportivas 
aplicadas às crianças.............................................................4 
2 O treinador de jovens atletas..........................................13 
3 A ética no esporte.............................................................26 
4 Fatores determinantes da ansiedade em competições de 
iniciação esportiva...............................................................37 
5 A técnica e a tática............................................................46 
6 Atividades práticas...........................................................54 
7 Planejamento das aulas e treinos...................................71 
 
 
 
 
 3 
 
Introdução 
Neste início de século, o fenômeno esportivo infantil tem sido motivo de muitos 
estudos e questionamentos, tanto no que diz respeito aos seus ideários, como em relação a 
sua função pedagógica e sociopolítico-cultural. Sob esta perspectiva, é possível observar a 
influência preponderante da participação da escola e da família no processo de adesão do 
jovem à prática do esporte e da atividade física. 
Buscando contribuir para a melhoria da nossa sociedade, seja de forma lúdica, por 
meio de jogos e brincadeiras; pela prática de algum esporte; ou de qualquer tipo de 
atividade física, a educação física tem como missão de promover o desenvolvimento de 
habilidades motoras, a interação social e educação dos indivíduos de forma a garantir-lhes 
uma participação ativa e voluntária em atividades físicas e esportivas ao longo de suas 
vidas. Da mesma forma, deve propiciar vivências e experiências de solidariedade, 
cooperação e superação; valorizando suas práticas esportivas, danças e jogos nos 
conteúdos dos seus programas, bem como ser meio de desenvolvimento da cidadania. 
Para que isto acima ocorra, se faz necessário a utilização de uma pedagogia que 
consiga contemplar tais benefícios. A evolução do conhecimento e da pesquisa no campo 
da pedagogia do esporte, em especial das modalidades coletivas, indica que ainda ocorram 
a utilização de modelos tradicionais, cuja especificidade aponta para um trato 
excessivamente “técnico”. Neste modelo, o aluno “aprende para jogar”, priorizando o 
ensino da técnica por meio da interferência direta do professor em suas ações. 
Em contraposição, a tendência atual das novas abordagens prioriza o ensino da 
tática, considerando as experiências vividas e os interesses dos alunos. Estas atividades 
focam no “jogar para aprender”. Neste e-book, pretende-se dar um embasamento teórico 
sobre temas importantes que estão presentes na iniciação aos esportes; também 
apresentando atividades práticas e de planejamento. 
 
 
 
 
 
 
 
 4 
CAPÍTULO 1 
Aspectos pedagógicos 
das atividades 
físico-desportivas 
aplicadas às crianças
1
 
 
 
 
1 Colaborou na elaboração deste capítulo: 
 Francisco Xavier de Vargas Neto, professor, PHD em Filosofia e Ciências da Educação em Barcelona. 
 5 
 
1 Introdução 
O fenômeno esportivo infantil tem sido neste início de século, motivo de muitos 
estudos e questionamentos tanto no que diz respeito a seus ideários como em relação a 
sua função pedagógica e sociopolítico-cultural. 
Nesse contexto, pode-se observar a influência e a participação dos profissionais da 
Educação Física, conjuntamente com os pais, como fatores determinantes no processo de 
aderência, permanência e até de abandono esportivo do jovem iniciante. 
É sabido o quanto será benéfica para a criança a sua participação em atividades 
físico-desportivas, seja pelo aspecto de saúde como também por se tratar de importante 
meio de interação social, entre outros tantos. 
Este estudo irá discorrer sobre importantes temas relacionados aos aspectos 
pedagógicos na prática esportiva infantil. 
2 Possibilidades pedagógico-formativas das atividades 
físico-desportivas 
As atividades físico-desportivas, entendidas como atividades naturais de 
movimento, jogo e confrontação, são, conforme Vargas Neto (1995), elementos básicos 
para a educação das pessoas, e possuem funções altamente pedagógicas que podem incidir 
no desenvolvimento equilibrado e harmônico do ser humano. 
Vargas Neto relata que se pode desenvolver um profundo trabalho educativo, 
humanizante e integrador com as atividades físico-desportivas, que tanto representam 
uma alternativa gratificante como uma compensação da opressão da vida atual, pois o 
esporte torna possível a expressão e a satisfação de muitos desejos que o mundo moderno 
desperta, mas também reprime, como já comentado. 
O reconhecimento universal do êxito e do fracasso no esporte, e especialmente no 
esporte coletivo, é um elemento essencial de comunicação e, como consequência, de 
educação. Fora do esporte, ou das atividades físico-desportivas, o raio de ação dentro do 
qual os seres humanos podem atuar sem limitações e projetar sua personalidade é cada 
vez menor. Diante de uma situação tão calamitosa de repressão da liberdade corporal, 
essas atividades oferecem possibilidades de realização para qualquer pessoa disposta a 
superar o sedentarismo. Essas possibilidades ativas e comunicativas afetam 
principalmente os que participam dinamicamente da prática do esporte. Alguns autores, 
inclusive, sustentam que os espectadores, cujo número é maior do que o dos participantes, 
beneficiam-se dos espetáculos esportivos no que diz respeito à comunicação. 
Existem sólidas convicções – devido à experiência pedagógica e às sucessivas 
reflexões culturais e filosóficas – sobre a conveniência e a utilidade da prática de 
 6 
atividades físico-desportivas. Por essa razão, os educadores não duvidaram nunca de que a 
prática de um esporte ensina a superar as dificuldades da vida. “O esporte é um dos meios 
e metas da humanidade em seus incessantes esforços por superar-se. Sua unicidade reside 
na intimidade entre os acontecimentos físicos de nosso corpo e suas repercussões sobre 
nossas mentes” (JOKL, 1964, p.477). 
Segue afirmando o mesmo autor: “O interesse da cultura física pelo cultivo e 
aperfeiçoamento dos recursos motores do indivíduo aplica-se tanto ao corpo como à 
mente da qual se originam” (p.478). 
Parece demonstrado que a melhora técnico-desportiva incide sobre parâmetros não 
físicos da pessoa (a capacidade cognitiva, a afetividade, a maturidade da personalidade, a 
confiança em si, as relações sociais e a canalização da agressividade poderiam ser bons 
exemplos). Esses argumentos reforçam e consolidam o aspecto educativo do esporte. 
Os valores alcançados atravésdo jogo esportivo – como a interiorização das regras, 
a colaboração, a aceitação da autoridade, a disciplina, a iniciativa, a superação de si mesmo 
– configuram uma constelação de condutas positivas, construtivas e integradoras que se 
encontram presentes no sistema de valores que cada um assume para si mesmo e com sua 
maneira de viver. Além disso, essas práticas ajudam na formação da pessoa humana em 
sua adaptação à vida em geral e a assumir hierarquicamente os valores. 
Por esse motivo, o educador físico-desportivo deve interessar-se pelo 
aperfeiçoamento da pessoa como tal. Mas, para isso, deve adequar-se à realidade de cada 
indivíduo, descobrindo quais são suas aptidões e seus limites. Essa mesma prática físico-
desportiva, com a alternância de êxitos e fracassos, serve de pauta ao educador, para 
avaliar as condições, capacidades e limitações pessoais de ordem física e mental dos 
educandos. O descobrimento intencionado das tensões que o esporte impõe é 
principalmente de ordem mental. 
Estudiosos como Cagigal (1985) opinam que nas atividades físico-desportivas 
encontramos parte das grandes motivações e atitudes que impulsionaram historicamente 
os comportamentos do ser humano: em primeiro lugar, o lúdico – a intencionalidade de 
sua ação está no atrativo do intranscendente e festivo, ainda que sujeito a algum tipo de 
norma; a questão principal não é ganhar, e sim passar bem e aproveitar –, em segundo 
lugar, o agonístico – entendido como ciência e arte de combate, intencionalidade 
competitiva, luta contra algo, alguém ou si mesmo. Aos componentes lúdico e agonístico, 
Seirul-Lo (1992) agrega um terceiro, ou seja, o eronístico, cujo valor devemos buscar no 
gosto e no prazer da realização (não na acepção sexual da escola psicanalítica). É uma 
forma prazerosa de se enfrentar as atividades corporais, pois o instrumento do esportista 
é seu próprio corpo, fonte de hedonismo tanto físico-biológico como mental. 
Sendo comportamentos inatos ao ser humano, podem, portanto, ser cultivados e 
desenvolvidos através da educação, fundamentalmente por parte da educação físico-
desportiva. A história da humanidade parece demonstrar que todos esses 
comportamentos enriqueceram o ser humano e contribuíram para a sua formação global, 
favorecendo, entre outras, as seguintes habilidades: 
 7 
2.1 Habilidades intelectuais 
• Passagem das operações concretas ao pensamento hipotético-dedutivo, com o 
desenvolvimento dos processos mentais de compreensão, análise e síntese. 
2.2 Habilidades afetivo-sociais 
• Integração do indivíduo ao grupo ou ao meio; 
• Necessidade orgânica e social de realizar exercício físico; 
• Conhecimento de suas reais possibilidades e interesses; 
• Criatividade; 
• Autoconhecimento e sua independência. 
2.3 Habilidades físico-motoras 
• Percepção do próprio corpo, do espaço e do tempo; 
• Tomada de decisões e resolução de problemas físicos; 
• Domínio de habilidades e destrezas físicas. 
 
Por tudo isso, valorizamos muito positivamente a potencialidade educativa das 
atividades físico-desportivas em todas as etapas da vida, especialmente na infância e 
adolescência, por se tratar de etapas mais plásticas e receptivas, que ajudam a configurar 
os comportamentos e estilos de vida adulto. Como consequência, as instituições 
educativas, principalmente, deveriam integrar as práticas lúdicas e físico-desportivas de 
forma sistemática e coerente, com a finalidade de possibilitarem um desenvolvimento 
saudável e harmonioso, proporcionando a vivência de experiências motoras – base do 
desenvolvimento intelectual –, facilitando a elaboração da identidade e da própria 
imagem, e a aquisição das capacidades necessárias para dominar os problemas relacionais, 
assim como os de integração social. 
3 Aspectos positivos da prática de atividades físico-
desportivas infantis 
Para a maioria dos pais, a prática de atividades físico-desportivas é uma 
necessidade. Um estudo francês sobre esse tema (DANSE; LAMBERT, apud DURAND, 
1988) revela que 95% dos pais é a favor da prática esportiva de seus filhos, e 86% pensam 
que essas atividades são tão importantes quanto as intelectuais. Da mesma forma, em uma 
 8 
pesquisa encomendada pelo jornal esportivo francês L’Equipe, ficou claro que 67% dos 
entrevistados são partidários da prática esportiva diária na escola. Em relação à classe 
médica, a opinião não é diferente das anteriores: observa-se que 99% dos pediatras 
franceses consideram positiva a prática esportiva infantil, reduzindo, no entanto, essa 
aceitação para 74% quando a iniciação se dá antes dos sete anos de idade (MANDEL; 
HENNEQUET, apud DURAND, 1988). 
Atualmente, para os médicos e professores de Educação Física, a prática das 
atividades físicas e esportivas contribui positivamente também no combate à 
“degeneração hipocinética”, entendida como uma carência relativa de movimento. Tal 
doença caracteriza-se pela diminuição da capacidade funcional de vários órgãos e sistemas 
(LAMB, 1985). Infelizmente, essa enfermidade, que até bem pouco tempo afetava somente 
os adultos, está se estendendo hoje em dia também às crianças, como bem assegura 
Seibold (1974) quando afirma que a vida em um mundo muito civilizado as torna 
preguiçosas e cômodas perante o tempo, uma vez que são liberadas dos esforços físicos, e 
há cada vez menos espaço e estímulos aos jogos livres infantis. Nesse momento, é 
necessário fazer referência aos aspectos negativos da televisão, ao desenvolvimento dos 
jogos eletrônicos, bem como à tendência das máquinas e dos computadores de executarem 
as tarefas cotidianas antes destinadas ao ser humano; influência essa que, segundo Toffler 
(1980), deverá acentuar-se nos próximos anos. 
Munné e Codina (1992) entendem que todo esse contexto colabora para manter as 
crianças fisicamente inativas, gerando deformações da coluna vertebral, aumentando seus 
hábitos consumistas e sua passividade perante as mensagens subliminares transmitidas 
pela TV. Contudo, como diz Scully (1990), nossos corpos não estão adaptados a esse nível 
de inatividade que a tecnologia do século XX nos permite desfrutar. 
Seguindo as ideias de Cotta (apud HAHN, 1988), em geral, o esporte fomenta na 
criança e no adolescente a maturidade, o crescimento e o desenvolvimento. Porém, 
acrescenta que só é perigoso o esporte de alto rendimento quando especificamente 
realizado na idade infantil. Desse modo, é quase unânime o consenso de recomendar a 
prática esportiva na infância, ainda que muitos entendam que ela possa provocar 
problemas se iniciada muito cedo ou quando estiver totalmente voltada para a 
competição. 
A afirmação de Thomas (apud PERSONNE, 1987) parece ser suficientemente clara 
quando diz que a aventura esportiva é um enriquecimento possivelmente insubstituível. 
Por outro lado, salienta que os caminhos que conduzem aos pódios e às marcas deveriam 
ser traçados sobre as bases de um patrimônio cultural-esportivo-humanista, respeitando o 
adolescente com o fim de nunca esquecer o menino ou menina, futuros homem e mulher 
que estão por trás do esportista. 
Diferentes autores e quase a totalidade dos professores de Educação Física 
concordam com a afirmação de que durante as primeiras etapas do aprendizado esportivo 
é que se devem estabelecer as bases do futuro rendimento, sem jamais buscar o 
rendimento imediato. 
 9 
Como se pode ver, é necessário que se aplique ao menor um modelo de esporte que 
não busque o êxito pelo êxito, nem resultados para um futuro imediato, nunca esquecendo 
que esse modelo de esporte deve estar adaptado às reais necessidades, características e 
possibilidades de seus praticantes. Só assim poderemos afirmar que, no esporte infantil, 
prevalece o objetivo principal de contribuir com a formação integral da pessoa humana. 
4 A criança, a saúde e a prática desportiva 
As práticas esportivas competitivas iniciadas precocemente e mal-orientadas podem 
ocasionar enormesprejuízos à saúde das crianças. Habitualmente, são detectados 
problemas ósseos, articulares, musculares, cardíacos e emocionais, dependendo da 
especialidade esportiva; sobretudo aquelas tecnicamente mais complexas, que, visando à 
automatização e ao aperfeiçoamento do movimento, empregam um grande número de 
repetições de gestos técnicos. O estudioso Personne (1987) comprovou que um praticante 
de ginástica olímpica pode realizar, ao longo de uma temporada, mais de 8.000 saltos 
(impacto altamente traumatizante para as articulações); um atleta de saltos ornamentais 
executa mais de 14.000 saltos; um arremessador de dardo, 6.000 arremessos por ano. 
Já o pesquisador Ferrandis (1994) verifica que, nas corridas de rua, em que crianças 
e adolescentes são estimulados a participar, um corredor de maratona, durante a prova, 
executa por volta de 30.000 impactos do calcanhar contra o solo. Nesses impactos, ele 
pode chegar a aplicar uma força de até seis vezes o peso de seu corpo. No voleibol, sabe-se 
que um cortador pode chegar a 150 saltos por partida, nos quais seus pés atingem uma 
altura superior a um metro, e o impacto de chegada ao solo pode ser de até dez vezes o 
peso de seu corpo. 
Devemos pensar também nos anos de preparação, duração e intensidade do 
treinamento para chegar a esse nível. É uma carga demasiadamente forte para o ombro e 
as articulações dos membros inferiores. 
O grande problema desse tipo de risco reside no impacto e na similitude dos gestos, 
principalmente se nos referimos a crianças em pleno processo de desenvolvimento. Com 
relação aos riscos do tipo psicológico (saúde mental) em crianças competidoras, foram 
encontrados níveis anormalmente altos de ansiedade, estresse e frustração. Tudo isso 
também se evidencia em conhecidos casos de talentos esportivos com futuro promissor 
que hoje se sentem martirizados internamente por fracassos e desilusões, consequentes 
de maus resultados em competições. 
De qualquer forma, a resposta psicológica mais preocupante é aquela que alguns 
autores chamam de “infância não vivida”, resultado da alta dedicação aos treinamentos, 
exigida principalmente em algumas modalidades esportivas, podendo chegar a várias 
horas por dia, durante todos os dias da semana, além da atividade escolar. Kunz (1994) 
detectou que isso pode provocar uma formação escolar deficiente e, pior, leva a criança 
esportista a participar menos das brincadeiras e dos jogos do mundo infantil, atividades 
essas que são indispensáveis ao pleno desenvolvimento de sua personalidade. Cabe aqui 
também lembrar que muitos pais, na ânsia de satisfazerem suas frustrações esportivas de 
 10 
infância, sobrecarregam emocionalmente seus filhos, trazendo enormes prejuízos de 
ordem psicológica, que, muitas vezes, podem levar inclusive ao precoce abandono 
esportivo. 
Como foi visto, é necessário despender cuidados especiais para com os nossos 
pupilos, principalmente no que diz respeito aos objetivos que queremos desenvolver com 
a prática desportiva, pois ser atleta não significa ser saudável. 
Assim, os profissionais envolvidos nesse período de formação esportiva deverão 
utilizar-se de procedimentos pedagógicos eticamente corretos que venham ao encontro 
das necessidades e capacidades da criança. 
5 Aspectos relacionados ao desenvolvimento motor 
 
Ao nascer, o ser humano apresenta muitas estruturas ainda não totalmente 
desenvolvidas, em nível cerebral, neural ou motor. O processo de maturação dessas 
estruturas ocorre de forma lenta e progressiva, e seu gestual vai se diversificando e 
tornando-se complexo com o passar do tempo. Para cada etapa do período de 
desenvolvimento infantil existem aspectos relevantes acerca do comportamento psíquico 
e motor que determinam a mecânica e a plástica do movimento executado (OLIVEIRA, 
1998, p. 40). Para maior compreensão do desenvolvimento motor, apresentaremos a 
seguir a ampulheta de Gallahue (1996). Essa ampulheta favorece a observação das 
atividades desenvolvidas nas devidas épocas, aplicando-as no cotidiano, no campo 
recreativo e no campo esportivo, mostrando seu caráter competitivo, formativo e 
educacional. É importante salientar a fase dos movimentos fundamentais e a fase de 
movimentos relacionados às habilidades esportivas, uma vez que apresentam as faixas 
etárias de interesse para o nosso estudo. A fase dos movimentos fundamentais é aquela 
em que eles estão inseridos no dia a dia da criança, constituindo-se em um padrão comum 
e simples, caracterizado por movimentos básicos, como corridas, rolamentos, saltos, giros, 
entre outros. São atividades desprovidas de intenção sistematizada, sendo esses 
movimentos relacionados com a necessidade de interação do ser humano. A quarta fase da 
ampulheta, relacionada às habilidades esportivas, caracteriza-se por movimentações mais 
específicas, normalmente identificadas com determinado esporte que, por vezes, não se 
constitui de movimentos comuns, requerendo experiência motora anterior. 
 
 11 
 
Figura: Ampulheta de desenvolvimento de Gallahue (1996). 
 
De acordo com Oliveira (1998), pode-se afirmar que a aprendizagem motora 
depende do processo de amadurecimento estabelecido nas fases do desenvolvimento 
motor e que se concretiza por meio da relação recíproca entre o ser humano e o ambiente. 
Segundo o autor, essa capacidade de interação é possível devido aos mecanismos 
perceptivos e proprioceptivos existentes no ser humano, funcionando como “porta de 
entrada” das informações. O mesmo autor afirma, ainda, que a interação ser humano-
movimento-ambiente promove contínuas alterações no comportamento, sejam motoras, 
sejam psíquicas. 
Abaixo Oliveira (1998) discorre sobre os níveis de especialização esportiva iniciada 
para diferentes idades: 
Etapa de incorporação: Situa-se entre 11 e 13 anos e consiste no aprendizado básico 
da modalidade. Todo alicerce técnico vai ser construído por meio dele. Não há, ainda, a 
preocupação com a performance (rendimento). É importante que sejam trabalhados os 
seguintes aspectos: ritmo dos movimentos específicos; posições e movimentações 
corporais básicas; capacidade de identificação das áreas demarcadas (quadra, praça 
esportiva, piscina, área de combate, etc.); adaptação aos materiais; e aprendizado das 
regras específicas. 
Etapa de aperfeiçoamento: Situa-se entre 13 e 16 anos, sendo que nessa etapa o 
indivíduo se aprimorará tanto física como mentalmente, ampliando o ciclo de 
aprendizagens essenciais. De forma geral, essa etapa abrange os seguintes aspectos: 
aumento gradativo da velocidade de execução e coordenação dos movimentos específicos; 
atitudes e movimentos corporais mais complexos; domínio total do material esportivo; 
 12 
compreensão e interpretação das regras; e desenvolvimento da tática de jogo ou da 
estratégia de competição. 
Etapa de eficiência: Vai dos 16 aos 18 anos e caracteriza-se por definições no âmbito 
da especialização esportiva. Até esse momento, a criança não deveria ser tratada como 
atleta. Busca-se, nessa etapa, a eficácia dos gestos, ou seja, a aplicação correta, consciente e 
consistente. Para tanto, deve-se considerar os seguintes aspectos: domínio tanto da 
técnica como da tática do jogo; condições físicas ideais para o início do rendimento 
esportivo; treinamentos específicos durante grande parte do tempo; e preocupação com a 
eficácia e a perfeição das atitudes esportivas. 
Etapa de rendimento: É a última etapa da especialização esportiva; fase em que o 
indivíduo já pode ser considerado um atleta; busca-se o alto nível, no qual se destacam os 
seguintes itens: treinamentos sistematizados; preparação física intensa; exigências 
cognitivas (tomada de decisão, tempo de reação); elevado senso de elaboração e tático; e 
busca de vitória e conquista de competições. 
De modo geral, alguns aspectos deverão estar presentes no ensino esportivo para as 
idades iniciais: 
 base motora com controledo gesto motor e consolidação do conhecimento 
do próprio corpo, principalmente no ambiente de jogo; 
 desenvolvimento físico geral e específico; 
 vivências amplas relacionadas à técnica e à tática de jogo em diferentes 
situações, possibilitando o desenvolvimento do raciocínio, da tomada de 
decisão, da observação e da antecipação das situações que ocorrem durante 
o jogo; e 
 a consciência da importância do grupo, aliada à sua habilidade individual, 
controle dos fatores de ansiedade e respeito às leis do jogo. 
6 A pedagogia no ensino das atividades físicas e do esporte 
infantil e suas intervenções 
Para melhor esclarecer as ideias citadas anteriormente sobre a iniciação e o 
processo de aprendizagem das atividades físico-desportivas aplicadas a crianças, 
iniciamos com as palavras de Telema (1986), afirmando que devemos ter em mente que a 
atividade esportiva por si só não educa; seus efeitos educativos dependem da situação 
criada, especialmente em relação aos aspectos de interação social e ao clima afetivo-
emocional e motivacional existente. Essas condições dependem de diversos fatores, entre 
os quais a intervenção do educador nos parece fundamental. 
As principais tendências pedagógicas expressas no âmbito da educação formal, 
como nos fala Balbinotti (1997, p.86), podem ser denominadas e definidas como 
reprodutivistas e construtivistas. A concepção reprodutivista (tradicional) é aquela que 
 13 
prioriza as capacidades intelectuais, situando-as como primeiro e mais relevante objetivo 
na formação do homem. Seus procedimentos didáticos enfatizam processos normativos 
que visam a uma disciplina rígida. A tônica dessa concepção educativa é uma exposição de 
conhecimentos por parte do professor dirigidos a educandos ouvintes e passivos, bem-
comportados e estáticos. 
Para o mesmo autor, a concepção construtivista pressupõe estratégias de 
intervenção pedagógica manifestadas através da integração entre educação intelectual e 
corporal e de um conceito de autoconstrução. Isso significa que o processo de elaboração 
do conhecimento se dá com a participação e a intervenção ativa do indivíduo em todas as 
atividades de aprendizagem. A complexidade do processo de construção do conhecimento 
exige que o professor exerça o papel de agente estimulador dessas relações de interação, 
nas quais o indivíduo passa a ser um agente ativo. 
A prática pedagógica, segundo Shigunov e Pereira (1993), é um problema central da 
ação educativa para todos os contextos sociais e fatores envolvidos, tanto em âmbito de 
intervenção pedagógica como do conteúdo ou da relação. 
A capacidade de intervenção pedagógica, como afirma Carreiro da Costa (1988, apud 
SHIGUNOV; PEREIRA, 1993, p.16), “é não só uma realidade desejável como imprescindível; 
ela só ganha verdadeiro sentido pedagógico quando exprime uma metodologia de ensino 
consentânea com as características da atividade humana”. 
Para Bordenave e Pereira (1983), na relação professor-aluno, o problema reside no 
fato de não contarmos ainda com suficiente conhecimento teórico e pesquisa para 
determinar quais as características pessoais que mais influenciam a aprendizagem, e de 
que maneira o fazem. 
Enquanto não forem estudados e evidenciados os elementos mais importantes da 
intervenção pedagógica do professor, tanto nos aspectos instrucionais quanto nos afetivos, 
devemos entender que a relação pedagógica não será promovida nem concretizada com 
toda a sua força formativa. 
As novas tendências pedagógicas para a educação física infantil visam, hoje, 
proporcionar que a criança experimente as várias possibilidades de movimentos corporais 
a partir de sua criatividade e autoconstrução. Nessa abordagem, ela participa 
intensamente das decisões de todo o processo educativo. 
A educação a ser exercida pelo professor, segundo Finger (1971), deverá obedecer a 
uma pedagogia e a uma metodologia que, além de permitirem a solução e a previsão de 
situações decorrentes da aprendizagem e da prática do jogo, respeitem os interesses da 
idade. 
Sabemos também que, para alcançar nossas metas no meio educativo, além de 
termos o conhecimento profundo ou até mesmo uma vivência da prática esportiva, é de 
suma importância possuirmos um conhecimento mais amplo a respeito do grupo que será 
trabalhado. Isso requer pesquisas e estudos nas áreas diretamente envolvidas com nosso 
trabalho (VARGAS NETO; VOSER, 2001). 
 14 
Por exemplo, quando se desenvolve um trabalho de iniciação esportiva para 
crianças na faixa etária entre 6 e 12 anos, deve-se estar atento a algumas questões 
pedagógicas que envolvem o processo ensino-aprendizagem (VOSER, 1999b): 
• O corpo, nessa fase, é o referencial da percepção, o meio pelo qual a criança absorve o 
mundo e manifesta sentimentos, sensações e até mesmo opiniões. 
• O professor deve desenvolver os aspectos do esquema corporal, do equilíbrio, da 
lateralidade, da organização do corpo no espaço e no tempo, da coordenação motora grossa e 
fina, não esquecendo o que é característico na idade: correr, saltar, lançar, transportar, 
trepar, rastejar e rolar. 
• Deve ser oportunizada uma variedade de experiências motoras, bem como um contato com 
vários tipos de objetos em diferentes espaços, proporcionando, assim, a conscientização do 
próprio esquema corporal. 
• No período escolar é possível realizar um trabalho integrado com as demais disciplinas, 
fazendo uso da interdisciplinaridade. 
• Toda atividade em forma de recreação é mais atrativa para as crianças. O lúdico e o brincar 
são tão importantes para elas quanto respirar, comer e dormir. 
• Torna-se importante elaborar atividades de acordo com o interesse das crianças, 
observando e não permitindo as manifestações de cansaço, impaciência e desinteresse. 
• A linguagem utilizada deve ser objetiva e de fácil compreensão. 
• As atividades desenvolvidas deverão propiciar a sociabilização, a integração e a 
autoestima. 
• É importante que o professor estimule as crianças à criação e à organização das atividades 
sem, é claro, perder o controle da turma. Ele poderá usar as seguintes perguntas: “Quem 
consegue...?”, “Quem é capaz de...?”, “Quem sabe outra maneira de...?”. 
• Deverá ser mantida a motivação da turma e o seu interesse pelas atividades, sabendo a 
hora de trocá-las. 
• O educador deve transmitir o gosto de aprender e de se aperfeiçoar, principalmente para 
despertar o interesse da criança pela prática esportiva. 
• É necessário que os alunos se sintam seguros e desinibidos para participar de todas as 
atividades. Será oferecido um ambiente livre de tensões, mantendo, assim, um clima 
propício para a aprendizagem. 
• Serão incentivados principalmente os alunos que têm dificuldades, elogiando-os a cada 
conquista e deixando para aqueles que possuem mais facilidade o compromisso de auxiliar 
na transmissão da sua experiência. 
• A individualidade de cada criança deve ser respeitada. Deve-se, também, estar atento à 
progressão dos exercícios, partindo sempre do mais fácil ao mais difícil, e do simples para o 
complexo. 
• É preciso avaliar o desenvolvimento psicomotor dos alunos que são mais desenvolvidos 
fisicamente, mas que, na realidade, possuem a mesma capacidade mental das outras 
 15 
crianças de sua idade. É necessário estar atento à maturidade motora e mental (emocional) 
das crianças. 
• Faz-se necessário dar atenção a fatores externos que possam interferir no andamento do 
trabalho proposto. O maior exemplo a ser citado é a pressão que os pais exercem sobre 
seus filhos ao tentar satisfazer seus próprios desejos de infância ou projetando um futuro 
promissor para a criança no esporte. É indicado conversar com os pais e mostrar o que 
esse tipo de ação pode acarretar na criança. 
Para concluir, lembramos que a criança não é um adulto (atleta) em miniatura, e o 
treinador ou professor, além de sua tarefa técnica, também tem responsabilidade 
pedagógica com o futurodo jovem a ele confiado. 
7 Modelos de ensino esportivo 
Embora existam vários modelos de ensino, este artigo optará pela análise daqueles 
que prevalecem nos programas de iniciação esportiva. Portanto, dando seguimento às 
reflexões, utilizou-se a classificação de Heinila (apud FERREIRA, 1984) sobre o processo 
de ensino em Educação Física. Tal classificação foi utilizada no Brasil por Ferreira (1984); 
a autora elabora e acrescenta indicadores e referenciais para um esquema conceitual, 
denominado matriz analítica, a fim de realizar uma crítica à realidade do ensino da 
educação física infantil. 
Para essa autora, o modelo de reprodução em educação física é caracterizado pela 
atitude acrítica tanto da realidade interna constituída pelas experiências que o aluno 
adquire quanto pelas condições econômicas, sociais e culturais que constituem a realidade 
externa. Nele, o esporte é valorizado como paradigma ideal de educação, reproduzindo os 
padrões sociais da classe dominante. Nesse sentido, os objetivos educacionais servem para 
conservar e reforçar as diferenças entre as classes sociais. O modelo de reprodução 
também assume o esporte como foco do sistema de ensino e tem como fonte de 
informação as técnicas, as habilidades esportivas e o conhecimento dos mecanismos 
psicofisiológicos do treinamento esportivo. Sua fonte de normas e sanções provém da 
performance e das vitórias esportivas, das competições e das classificações por 
desempenho. O professor é visto como o controlador de atividades, treinador e técnico 
preocupado em fazer do aluno um atleta em potencial, ou seja, seu objeto de treinamento. 
As metodologias empregadas têm sua referência em modelos ideais de execução, 
predominando procedimentos diretivos. Finalmente, no que diz respeito ao critério de 
avaliação, há um predomínio de caráter somativo. 
O modelo de transformação, por sua vez, é caracterizado pela atitude de reflexão 
sobre a realidade, modificando a percepção que o indivíduo tem de suas experiências e do 
mundo que o cerca. 
Nessa perspectiva, a educação física é sempre processo, realimentado pela prática 
consciente dos sujeitos sobre a realidade esportiva, numa concepção dialética, 
favorecendo a aprendizagem e a avaliação dos resultados. 
 16 
Desse ponto de vista, o professor explora situações de conflito que levam o aluno a 
perceber a realidade de forma múltipla e a si mesmo como agente dessa realidade. Assim, 
o foco do ensino é o educando, capaz de decifrar o mundo que o cerca. A perspectiva de 
transformação tem como fonte de informação o conhecimento funcional da natureza do 
homem e como fonte de normas e sanções um amplo processo de negociação com as 
crianças, partindo de seus interesses, necessidades e motivações. 
Conseguir-se-ia, assim, articular um sistema de disciplina intrínseco ao processo. O 
professor, nesse enfoque, é visto como facilitador e orientador das atividades, preocupado 
em estimular uma participação maior e mais consciente dos alunos em todos os níveis. 
As metodologias empregadas têm um caráter mais ativo e estimulante; utilizam 
procedimentos diversificados, dirigidos a motivar os diferentes níveis de aspiração dos 
alunos, com um predomínio dos processos indiretos de ensino (iniciativa centrada no 
aluno). Finalmente, com relação ao principal critério de avaliação, haverá uma ênfase 
sobre a avaliação do tipo formativa. Isso significa que a preocupação existente é a de 
disponibilizar informações qualitativas em relação ao domínio e não aos objetivos, 
permitindo a devida colaboração e participação crítica do próprio aluno. 
Os modelos citados por Heinila e Ferreira têm auxiliado diversos estudos a detectar 
as ambiguidades entre as ideias e ações educativas dos professores em programas de 
iniciação esportiva. Isso se confirma nos estudos de Brauner (1994), ao analisar as 
intervenções pedagógicas em programas de iniciação ao basquetebol, e Voser (1999a), nos 
estudos em escolinhas de futsal, quando ambos observam uma prática pedagógica 
tradicional, centrada na competição, no êxito e na seletividade, incidindo numa iniciação 
precoce. 
Esses achados trazem grandes preocupações e traduzem a realidade no mundo do 
esporte infantil. 
8 Métodos de ensino na educação física 
e no esporte 
Todos os professores, em suas atividades de ensino, devem ter conhecimento do 
processo de aprendizagem e dos métodos de ensino a serem aplicados. Por muito tempo, 
ao abordarmos o tema dos métodos de ensino em educação física, logo eram referenciados 
os métodos global, parcial e misto. 
Tais métodos serviram de inspiração para muitas pesquisas em que, na maioria das 
vezes, os pesquisadores comparavam um método ao outro na tentativa de descobrir qual 
apresentaria maior êxito e eficácia no ensino da educação física. Posteriormente, outros 
termos e métodos foram surgindo, tais como global em forma de jogo, confrontação, série 
de jogos, entre outros tantos. 
Na verdade, a palavra “método” refere-se ao caminho a ser percorrido para alcançar 
os objetivos propostos. 
 17 
Com base na didática, cada professor, partindo de diretrizes metodológicas seguras 
e atualizadas, pode e deve organizar seu próprio método. O bom professor é aquele que 
busca constantemente um método melhor e mais adequado a seus alunos, respeitando a 
realidade, o momento e, principalmente, suas características individuais. 
É importante salientar que cada método tem suas vantagens e desvantagens, mas 
todos são operacionais, e nenhum é desprezível. 
Algumas dicas importantes para o sucesso no desenvolvimento da aula, segundo 
Voser e Giusti (2015b): 
• estabelecer vínculo afetivo com os alunos; 
• transmitir apoio e segurança; 
• usar o reforço positivo; 
• manter a motivação; 
• trabalhar com as diferenças, assegurando a participação de todos os alunos; 
• promover a convivência entre meninos e meninas; 
• estimular a interdisciplinaridade; 
• contemplar, por meio da metodologia indicada no período de iniciação, as características, 
necessidades e interesses da criança. O lúdico, a recreação e as atividades pré-esportivas 
são bem-indicados; 
• atentar para a adaptação da criança ao jogo, permitindo a sua relação com o espaço, com a 
bola, com os colegas e com os adversários; 
• enfatizar as capacidades motoras; 
• mostrar-se organizado, apresentar os objetivos no início da aula e sempre finalizar com 
atividades calmantes, tais como brincadeiras, alongamento e, principalmente, conversa 
final abordando os fatos ocorridos (positivos e negativos). Ao final, os alunos devem ajudar 
o professor a recolher o material utilizado na aula; 
• explicar e demonstrar a atividade, quando necessário; 
• participar efetivamente das atividades; 
• incentivar os alunos à criação e à reformulação de regras; 
• considerar o contexto e o interesse da turma; 
• perceber quando a atividade perdeu a motivação ou quando o grau de exigência está muito 
elevado. Trabalhar do simples para o complexo, do fácil para o difícil; 
• manter reuniões periódicas com os demais professores e os pais, apresentando a 
metodologia utilizada. 
 
 18 
9 Esporte da escola 
A Constituição Brasileira de 1988, no seu art. 217, prevê que os recursos públicos 
sejam prioritariamente destinados à promoção do esporte educacional. A Lei nº 9.615/98, 
batizada como “Lei Pelé”, regulariza o esporte no país, caracterizando o esporte 
educacional como aquele praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de 
educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a 
finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o 
exercício da cidadania e a prática do lazer. 
Ainda a Carta Internacional da Educação Física e do Esporte da UNESCO (1978) 
descreve: “Todo ser humano tem o direito fundamental de acesso à educação física e ao 
esporte, que são essenciais para o pleno desenvolvimentoda sua personalidade. A 
liberdade de desenvolver aptidões físicas, intelectuais e morais, por meio da educação 
física e do esporte, deve ser garantido dentro do sistema educacional, assim como em 
outros aspectos da vida social”. 
Neste sentido, o esporte pode e deve ser utilizado como ferramenta para o 
desenvolvimento da cidadania, conforme assinala a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 
Nacional (LDB). No entanto, muitas vezes se observa que os professores de Educação 
Física não vislumbram todas as possibilidades que devem ser exploradas durante a prática 
dos esportes (VOSER, GIUSTI, 2015a). Infelizmente, as escolas ainda desenvolvem um 
projeto de educação física ultrapassado e sem qualquer respaldo didático-pedagógico para 
envolver o aluno das séries iniciais, acompanhando-o até o ensino médio. A situação é tão 
séria que algumas escolas ainda não têm professores de educação física na educação 
infantil e fundamental, etapas em que sua importância é indiscutível, pois é entre os 7 e os 
12 anos de idade que se estabelece a base motora (VOSER, GIUSTI, 2015b). 
O esporte tem de ser visto em sua dimensão mais ampla, principalmente no que se 
refere aos ganhos atitudinais, aos valores que estão presentes no esporte, como disciplina, 
respeito às regras, aos colegas, ao adversário, saber ganhar e perder, solidariedade, 
superação, autoconfiança, autonomia, entre outros tantos. É por meio da participação 
social e da cooperação com os colegas que a criança passa a praticar princípios 
democráticos e a ter uma vivência coletiva. 
O que se observa segundo geralmente no ambiente da escola são a aplicação de dois 
modelos: um primeiro, onde o professor apenas ministra algum alongamento e 
aquecimento e, em seguida, larga a bola para os alunos jogarem, “largobol”; e um segundo, 
onde é aplicado um modelo analítico de ensino, com o foco no aprendizado da 
técnica/gesto motor, repetições, seletividade, exclusão, e pela aplicação do jogo com as 
regras institucionalizadas. Geralmente são caracterizadas por atividades com longas 
colunas com pouca interação, cooperação e desenvolvimento da capacidade cognitiva 
(VOSER, 2018). 
O esporte da escola por sua vez deve preconizar a formação integral do 
aluno/cidadão, devendo propiciar a participação de todos, estimulando a inclusão e a 
diversidade. Estas aulas devem ser alegres e desafiadoras. Nossa convicção é que a escola 
 19 
deve ser transformadora. O ensino dos esportes prepara para a vida. A prática dos 
esportes ensina à criança noções básicas de cidadania, de respeito às regras, a trabalhar 
coletivamente, a ganhar e perder. 
Para o esporte tornar-se fator de emancipação individual e, consequentemente, 
coletiva, alguns preceitos devem ser respeitados, como: 
1. Inclusão de todos: criar condições, possibilidades e oportunidades para que as 
crianças e os jovens tenham acesso à prática esportiva; 
2. Construção coletiva: elaborar e desenvolver, juntamente com os educandos, os 
programas pedagógicos para levar em consideração suas necessidades e expectativas; 
3. Respeito à diversidade: reconhecer e respeitar as diferenças dos alunos em 
relação à etnia, ao gênero, ao biótipo, além de repertórios e habilidades. 
4. Educação integral: ser meio de aprendizagem equilibrada, além da dimensão 
física, como desenvolvimento das capacidades psíquica, afetiva e social; 
5. Rumo à autonomia: compreender a prática esportiva como ação emancipatória 
para a formação de um cidadão ativo, crítico e criativo. 
 
Para finalizar, julgo que é possível construir, ao longo de todos os anos escolares, 
uma proposta pedagógica que, além de desenvolver no aluno os aspectos específicos do 
futsal, possibilite seu crescimento como ser humano. Esta proposta deve estar alicerçada 
ao projeto político pedagógico da escola e, principalmente, ser contextualizada à realidade. 
10 Considerações finais 
Os estudiosos dos temas que envolvem a criança na participação de atividades 
físico-desportivas são unânimes ao afirmar a necessidade da criança em participar de 
atividades de movimento. Destacam, porém, que a maioria dos profissionais usa de 
metodologias com altos graus de exigência, trazendo prejuízos de caráter físico, emocional 
e, por muitas vezes, um abandono precoce nessas atividades de movimento, 
principalmente as esportivas. 
Deve-se ter em mente que a criança não é um adulto em miniatura; portanto, é 
necessária uma proposta pedagógica que seja eficaz quanto às necessidades e aos 
interesses da criança. 
Julgo, por meio de minhas experiências, que é possível construir e aplicar uma 
proposta pedagógica que, além de desenvolver seus aspectos físicos e técnicos, possibilite 
à criança o seu crescimento como ser humano. 
Por fim, espero ter contribuído, através destes referenciais teóricos, com aqueles 
que admiram e acreditam em um esporte infantil pedagogicamente orientado. 
 20 
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metodológica construtivista aplicada ao treinamento de jovens tenistas. Revista Perfil. 
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 21 
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Alegre: Penso, 2015b. 
 
 
 
 
 22 
 
CAPÍTULO 2 
O treinador de jovens atletas 
 
1 Papel do treinador na participação do jovem no esporte 
O treinador esportivo de crianças desempenha um papel central e decisivo no 
desenvolvimento esportivo da criança. Sua função é das mais difíceis, mas também pode 
ser das mais gratificantes. 
O relacionamento entre professor e aluno, ou treinador e atleta, é um dos pontos 
mais importantes do processo de formação do indivíduo. Dentro desse processo de 
relação, os treinadores desempenham papel de pais, amigos, conselheiros e, para muitos, 
de ídolos e exemplos de vida. O treinador é visto como um exemplo dentro e fora da 
quadra. 
Tutko (apud ABREU, 1993) sustenta que existe uma grande variedade de 
personalidades na profissão de treinador. Sentimentos como desgosto, glória e êxito em 
 23 
sua relação com o atleta produzem uma atmosfera que pode convertê-lo num influente 
construtor do caráter ou num modelador da personalidade do praticante. 
Os treinadores sabem que muitas conquistas e vitórias caem no esquecimento, o que 
prova que não é o triunfo que conta, e sim a forma como ele foi obtido. Sobre isso, 
podemos acrescentar as seguintes palavras: 
 
(...) o treinador deve-se conduzir de tal modo que sirva aos praticantes de 
ontem como uma recordação agradável de sua juventude; aos praticantes 
de hoje, como um exemplo de sacrifício, de dedicação e de dignidade, e aos 
praticantes de amanhã, como uma esperança a mais em seu futuro. 
(GUILHERME, 1975, p.5) 
Cabe destacar as afirmações de Counsilman (1984), as quais sustentam que, no 
período crucial de incrementar o estímulo competitivo, o jovem precisa de um mestre 
compreensivo que demonstre algo mais do que capacidade de organização e 
conhecimentos de mecânica dos movimentos – por mais essenciais que sejam tais fatores 
para um técnico eficiente. Um técnico de grupos jovens, na concepção do autor, deve ser 
selecionado não por ser ambicioso ou conseguir bons resultados, mas principalmente por 
saber compreender os jovens e conduzi-los. 
Para Hahn (1988), o treinador é o elo da união entre a criança e o esporte. O autor 
deixa claro que a responsabilidade pedagógica do treinador é mais importante que seu 
papel na direção do treinamento tecnomotriz, ao basear-se no princípio de que as falhas 
elementares nunca se superam totalmente durante os primeiros processos de 
treinamento. Hahn adverte que os treinadores necessitam de uma teoria de treinamento 
com crianças e que, se por um lado buscam a evolução objetivada do rendimento, por 
outro devem levar em conta as necessidades e os interesses da criança. 
Conforme sua personalidade, o técnico pode agir e ser visto diante da sociedade de 
várias maneiras. Hendry (apud CRATTY, 1983), em suas pesquisas, segundo depoimentos 
de atletas e demais técnicos, encontrou que o técnico ideal seria aquele indivíduo estável, 
sociável, criativo, inteligente, que assume riscos calculados, é confiante e seguro. Aquele 
que poderia tranquilamente manter o controle em situações tensas e adversas do esporte. 
A interação entre técnicos e atletas vai depender principalmente das necessidades e 
das personalidades dos envolvidos. Isso pode influenciar a performance do atleta tanto 
positiva como negativamente quando não existir correspondência com as necessidades 
requeridas ou sobrarem estímulos inadequados (MACHADO, 1997). 
Outro ponto extremamente importante a que o treinador de jovens deve estar 
atento é com sua relação com os pais. Muitas vezes, na angústia de satisfazer seus próprios 
desejos de infância ou projetar para seus filhos um futuro promissor no esporte, os pais 
exercem uma pressão muito grande na criança e, por vezes, até mesmo acabam 
atrapalhando toda metodologia do professor/treinador (VOSER, 1999). Por isso, são 
necessárias eventuais reuniões com os pais para lhes apresentar a proposta metodológica 
 24 
do trabalho a ser desenvolvido, bem como ressaltar-lhes a importância que eles têm 
dentro desse processo. 
A seguir, alguns lembretes. 
• O treinador deve doar-se naquilo que está fazendo. Deve lembrar que ninguém consegue 
obter grandes conquistas sem ter feito sacrifícios pessoais. 
• Deve ser um líder, um aglutinador; deve passar segurança e confiança a seus comandados. 
• Deve estar preparado psicologicamente para receber as críticas e todas as pressões que 
ocorrem normalmente nos treinos e jogos. 
• Todo treinador deve saber ouvir seus atletas e conhecer suas angústias, dificuldades e 
metas (canal de comunicação). 
• Deve ouvir a opinião dos atletas com relação a questões referentes ao treinamento, mas o 
grupo deve estar ciente que a decisão final é dele. 
• Deve apresentar e aplicar seus critérios; critérios diferentes desmobilizam o grupo e dão 
chance para a insegurança. 
• Deve manter-se atualizado, estar apoiado nas ciências do desporto (inovar). 
• Deve saber trabalhar em equipe multidisciplinar); para tanto, deve ter conhecimento nas 
áreas que ajudarão a atingir os resultados. 
 
 
 
 
 
 
 25 
 
Referências 
ABREU, R. C. de. Análise do fenômeno do drop-out em nadadores de 12 a 15 anos de ambos 
os sexos no estado de Minas Gerais. Dissertação de Mestrado da UFMG, Belo Horizonte, 
1993. 
COUNSILMAN, J. E. A natação, ciência e técnica para a preparação de campeões. 2.ed. Ibero-
Americano, Rio de Janeiro: 1984. 
CRATTY, B. J. Psicologia no esporte. Rio de Janeiro: Prentice-Hall, 1983. 
GUILHERME, A. À beira da quadra: conhecimentos úteis aos dirigentes, treinadores e atletas. 
Belo Horizonte: Gráfica Aimorés, 1975. 
MACHADO, A. A. Agressão e ansiedade em esportistas adolescentes. In: BURITI, M. de A. 
(org.). Psicologia do esporte. Campinas: Alinea, 1997a, p.67-90. 
VOSER, R. C. Iniciação ao futsal: abordagem recreativa. Canoas: ULBRA, 1999. 
 26 
 
CAPÍTULO 3 
A ética no esporte
2
 
 
 
 
 
2 Colaborou na elaboração deste capítulo: 
 Francisco Xavier de Vargas Neto, professor, PHD em Filosofia e Ciências da Educação em Barcelona. 
 27 
1 Introdução 
Este artigo visa percorrer alguns tópicos de extrema relevância sobre a ética no 
esporte, assim como trazer algumas reflexões e discussões importantes com relação a 
esse tema, que é atual e necessita de aprofundamentos que discorram sobre a situação 
do desporto atual e sua vital importância para a formação pessoal e social dos 
indivíduos. Sabemos que a tarefa não será fácil, pois trata-se de uma abordagem pouco 
discutida até então pela Educação Física e por outras áreas afins do conhecimento. 
Apesar de reconhecermos as dificuldades encontradas na busca de um referencial 
teórico com consistência e profundidade, procuraremos, a partir de nossas experiências 
dentro do desporto de rendimento, como atletas e técnicos, trazer pontos interessantes e 
contribuições principalmente para os jovens que estão iniciando aparticipação no meio 
esportivo. 
2 Conceito de ética 
Um pouco de história ajuda a compreender a necessidade que o homem moderno 
sente de pensar uma ética que possa fundar cientificamente a moralidade da vida humana. 
A ética e a moral muitas vezes são confundidas. A palavra ética tem sua raiz no termo 
grego ethos, que significa costume, comportamento, caráter; a palavra moral tem origem 
em mores, termo em latim que significa costume. Tanto ética quanto moral diz respeito ao 
conjunto dos costumes tradicionais de uma sociedade, valores referenciais de conduta 
para os seus membros, qualificando o bem e o mal, o certo e o errado, o lícito e o ilícito. 
Enquanto a moral corresponde ao conjunto de valores e regras que norteiam o 
nosso comportamento nas relações sociais, a ética diz respeito à reflexão sobre os diversos 
atos praticados nas coletividades e sua relação com o bem comum. A ética é a ciência que 
estuda as relações do homem com a moral. Só ela é capaz de distinguir o que é certo do 
que é errado. A sociedade sem ética é uma sociedade sem organização, sem liberdade e 
sem transparência. 
Quando refletimos sobre a “questão ética”, não podemos esquecer que se trata de 
uma das questões fundamentais do domínio da filosofia, cuja preocupação dominante é 
tentar determinar a finalidade da vida humana. Quando abordamos as questões éticas, 
logo pensamos na liberdade, na responsabilidade pessoal e também no conjunto de leis e 
normas que orientam a atividade humana. 
Para o filósofo e professor Santin (1995a), o problema ético tem suas raízes mais 
profundas nas misteriosas forças que regem, unem e entrelaçam o jogo do homem e o jogo 
do mundo. O mesmo autor ainda afirma que o problema ético propriamente dito surgiu 
tardiamente, quando a pergunta que o homem se fazia, “Como devo agir”, transformou-se 
numa série de outras dúvidas que exigem esclarecimentos. 
O homem passou a indagar-se sobre “Como posso julgar a minha ação e a dos 
outros?”, “Em nome de que critérios ou valores faço tais julgamentos?”, “Como posso saber 
 28 
que os valores, os princípios que norteiam minha ação e a dos outros são bons, 
verdadeiros e justos?”. 
Santin (1995a) afirma que o problema ético ocorre como um processo de teorização 
em busca de fundamentos legitimadores e justificadores das práticas morais. 
Conforme Araújo (1990, p.40), 
 
(...) a ética visa à denúncia crítica e desmistificadora de todas estruturas 
sociais que deformam, deterioram e mutilam o reconhecimento da 
dignidade, a par de uma lúcida reflexão para criar e propor novos estilos 
de vida para uma existência melhor. 
 
Não podemos esquecer que a ética, devido ao avanço da ciência na sociedade 
moderna, cada vez mais se aproxima do homem na busca de autenticidade de todo 
discurso e de toda ação (SANTIN, 1995b). 
3 A ética no desporto 
A ética do desporto é parte de uma problemática que abrange todos os domínios da 
atividade humana. De certo modo, postula o retorno às origens da prática desportiva e ao 
espírito que tinha em suas características a lealdade, o fair play, a justiça, a igualdade de 
oportunidade, o respeito pela pessoa do adversário. 
A defesa da ética desportiva confunde-se, pois, com a defesa do próprio fenômeno 
desportivo, sendo, por esse motivo, responsabilidade de todos e do Estado, em particular. 
Decorre desse princípio a necessidade permanente de aperfeiçoar a legislação tendente a 
prevenir e a punir as manifestações antidesportivas, resignadamente a violência associada 
ao desporto, à dopagem, corrupção e qualquer forma de discriminação social. 
Aparentemente, não parece ser uma tarefa difícil falar de ética no desporto em nosso 
país. Os exemplos de falta de ética estão na mídia com frequência quase que diária. 
Podemos citar como exemplos fatos já ocorridos no futebol brasileiro, como o caso 
Luxemburgo, o contrato da Nike com a CBF, as falsificações de idades (o famoso “gato”), o 
desmanche da torcida organizada Gaviões da Fiel por motivo de violência, sonegação de 
impostos pelos clubes, os casos de doping e tantos outros envolvendo os nossos ídolos do 
esporte. 
4 O desporto de rendimento e a ética 
Nossa função na universidade, como formadores de futuros profissionais de 
Educação Física, é de fornecer esclarecimento intelectual e de assumir o dever da 
informação, ao relatar os fatores positivos e também os possíveis perigos e riscos de 
 29 
muitas práticas esportivas quando mal-orientadas e direcionadas a outros rumos que não 
condizem com o esporte. Não podemos ser meros espectadores neutrais de situações que 
escondem, escamoteiam e ameaçam a substância humana do desporto, pois o significado 
humano e educativo do desporto, como afirma Bento (1990, p.38), “é garantido quando 
cada um rende o mais que pode sem sentir que isso é uma obrigação imposta pelo 
exterior; quando cada um assume mais do que é capaz, mas simultaneamente esgota as 
suas possibilidades de empenhamento esportivo”. 
Quando orientado para a finalidade de produzir rendimento, o sistema do desporto 
conduziu o desportista a perder sua posição de sujeito e transformar-se em objeto, num 
produto visível, mensurável e valorável. Determinou que o seu corpo fosse instrumento de 
apresentação do rendimento do sistema. O atleta depende economicamente dessa relação e 
sabe que tem um tempo de atividade profissional reduzido, fatos que influenciam o respectivo 
comportamento ético e o sujeitam a manobras que muitas vezes o prejudicam biologicamente, 
alterando a verdade das suas capacidades; na competição, nem sempre a lealdade e a 
solidariedade são valores primordiais na relação com os respectivos competidores. Muitas 
vezes em nossa história observou-se que o desporto foi assumido como forma de afirmação de 
modelos políticos sociais, e os jogos internacionais foram tomados como cenários dessa 
afirmação. Conforme Grande, nesses casos “A ética (...) foi subvertida, os atletas usados como 
bandeiras ideológicas e os resultados interpretados segundo interesses que pouco tinham que 
ver com o desporto em si mesmo” (1990, p.20). 
Ainda segundo Grande, 
(...) empresas e universidades, através do marketing esportivo, têm 
buscado investir no esporte como veículo de aproximação com a 
comunidade em busca da relação de fidelidade com sua marca. Para 
tanto, profissionalizam seus atletas e exigem deles a dedicação total aos 
objetivos correspondentes, em que a necessidade da vitória se sobrepõe 
a qualquer outro objetivo. (1990, p.21) 
 
Para que o desporto possa assumir as funções prescritas nos seus princípios, não 
basta torná-lo tecnicamente mais perfeito; é preciso torná-lo mais humano. No centro do 
desporto deve estar sempre o homem como sujeito e como motivo primeiro da prática 
desportiva. 
É sabido que o desporto é um dos mais poderosos instrumentos de cultura e 
intercâmbio, de conhecimento e de convívio entre os povos. Para tanto, ele deve ser 
tratado como fenômeno ético. 
Tendo em vista a imensa abrangência que o tema abarca, a seguir optamos por 
discutir dois tópicos do que julgamos ser atualmente a maior problemática nos aspectos 
que envolvem a ética e o desporto de rendimento. 
 
 30 
4.1 O doping no esporte 
As notícias sensacionalistas sobre o doping no esporte de alto rendimento têm feito 
com que o fato seja conhecido por todos. Os grandes ídolos flagrados, os casos de mortes 
precoces, bem como inesperados relatos e publicações de ex-esportistas, fazem com que 
muitos treinadores, pedagogos e professores de Educação Física preocupem-se com a 
abrangência do fato. 
Em 1990, a publicação Desporto, ética, sociedade (BENTO; MARQUES, 1990) 
relatava, em vários de seus artigos, os diversos problemas e consequências do uso de 
substâncias químicas utilizadas por competidores. 
Por outro lado, o artigo intitulado As dimensões inumanas do esporte de rendimento 
(KUNZ, 1994) qualifica como inaceitável ouso de substâncias proibidas como também 
desqualifica o treinamento especializado precoce. 
A questão ética prende-se ao fato comprovado de que o doping oferece uma grande 
vantagem àqueles que o utilizam, e que mesmo um talento natural, por melhor que seja, 
sem ele dificilmente conseguirá destacar-se no alto nível. 
Nessa perspectiva, poderíamos discutir a questão das medalhas conquistadas sob 
suspeita de doping. 
A revista Veja publicou, em janeiro de 1998, um artigo intitulado “Medalhas sujas”, 
no qual questiona muitos resultados alcançados em olimpíadas e campeonatos mundiais 
pela extinta Alemanha Oriental: são 103 casos no atletismo e 86 na natação (masculino e 
feminino). 
A pergunta é: como ficam os recordes obtidos nessas competições? Diga-se de 
passagem que alguns desses recordes ainda estão em vigor. E os atletas que competiram 
estritamente dentro do regulamento e poderiam ter vencido (ou legalmente venceram) 
essas provas, como ficam? A questão é absolutamente ética. 
O que preocupa é o fato de que cada vez mais os atletas de diversas modalidades 
têm se valido de meios ilícitos para auferir vantagens nas diversas competições, 
atendendo assim interesses de forma escusa. 
Algumas substâncias são controladas nos exames antidoping; contudo, cada vez 
mais surgem estudos que desenvolvem mecanismos para mascarar e dificultar a 
possibilidade de identificar o uso de substâncias proibidas, as quais, embora favoreçam 
durante a competição, posteriormente podem produzir tremendos prejuízos à saúde dos 
atletas. 
Passamos a citar algumas substâncias proibidas e os riscos para a saúde decorrentes 
de seu uso: 
- EPO (eritropoietina) – produz crescimento dos órgãos internos, e nas mulheres produz 
aumento dos pelos da face. O uso contínuo pode levar à pressão alta; 
 31 
- Betabloqueadores (acebutolol, alprenolol, nadolol, oxprenolol, propanolol e sotalol) – 
provocam dificuldades na respiração; 
- Esteroides corticoides (dexametasona e hidrocortisona) – produzem diabetes, glaucoma e 
problemas musculares; 
- Analgésicos (buprenorfina, heroína, dextromoramida, metadona, morfina, pentazocina e 
petidina) – causam problemas respiratórios, náusea e dependência; 
- Diuréticos (acetazolamida, bumetanida e clortalidona) – causam desidratação, falência do 
fígado e cãibras; 
- Estimulantes (anfetamina, cafeína, cocaína, efedrina e salbutamol) – podem causar queda 
de pressão, batimento cardíaco irregular e dependência; 
- Esteroides anabólicos (nandrolona, testosterona, estanozolol e mesterolona) – provocam 
aumento do colesterol, impotência e esterilidade, entre outros problemas. Seu uso vem se 
tornando cada vez mais frequente entre os jovens em academias de musculação e por 
atletas em todo o mundo, apesar de todas as recomendações médicas em contrário e do 
rigor das leis de controle de dopagem. 
Essas substâncias são derivadas da testosterona, um hormônio sexual masculino 
que é fabricado pelos testículos. No homem, a testosterona é produzida durante a vida 
inteira, mas principalmente entre os 11 e 13 anos. Tem, como funções principais, a 
descida dos testículos para dentro dos escrotos, o crescimento dos testículos e do pênis, 
a distribuição dos pelos, participação no crescimento ósseo, desenvolvimento da 
musculatura após a puberdade. Daí a definição de esteroides anabólicos (crescimento e 
desenvolvimento) e androgênicos (caracteres sexuais masculinos). 
Os medicamentos sintéticos à base de testosterona aumentam as propriedades 
anabólicas e reduzem as propriedades androgênicas. Por causa desse efeito anabólico, os 
atletas passaram a usá-lo para aumentar a massa muscular, o que leva a um aumento da 
força. Os atletas interessados nesse ganho rápido de força muscular aumentam a 
quantidade de proteínas na alimentação e realizam um supertreinamento. Assim, os 
músculos retêm uma quantidade maior de proteína, hipertrofiam e, portanto, ficam mais 
fortes. Esse aumento da massa muscular diminui a massa de gordura, e o peso do 
indivíduo aumenta, porque o músculo pesa mais que a gordura. Entretanto, os atletas, no 
desespero de melhora rápida da massa e da força, e na incessante luta por melhorar seus 
recordes, acabam por usar doses elevadas, algumas vezes com exagero. Em certos casos, 
as doses são tão altas que os músculos acabam ficando refratários a qualquer hipertrofia. 
Os riscos ocasionados são, no homem, impotência, problemas no fígado, descontrole 
hormonal masculino, e, na mulher, descontrole menstrual. 
Kunz (1994) relata casos da antiga Alemanha Oriental, onde se aconselhavam doses 
anuais de até 1.000mg em atletas adultos. Havia, porém, competidores que chegaram a 
ultrapassar 3.000mg/ano. Um caso assustador é da atleta arremessadora de peso Haidi 
Krieger, que, com 18 anos, chegou a ingerir 2.590mg/ano. 
 32 
Na mulher, o uso dessas substâncias, principalmente antes e durante a puberdade, 
produz parada de crescimento, aspecto masculino, engrossamento da voz, aumento da 
distribuição dos pelos e aumento do clitóris. 
No homem, os efeitos secundários são: aumento das lesões traumatológicas dos 
tendões e dos ligamentos, porque o desenvolvimento dos músculos não é acompanhado do 
desenvolvimento dessas estruturas; diminuição da estatura; lesões do fígado, como 
hepatite e câncer; redução do tamanho dos testículos, redução na produção dos 
espermatozoides e lesões graves da próstata. 
A reversibilidade de qualquer desses efeitos negativos depende da quantidade 
usada, do tempo de uso, de características metabólicas individuais e da extensão das 
lesões. As modalidades que mais têm utilizado esse método são o halterofilismo, lutas, 
remo, atletismo e ciclismo. 
4.2 A especialização esportiva precoce 
O tema é de certa forma recente3, porém tem recebido algumas críticas de parte de 
alguns profissionais realmente preocupados com um esporte educativo e formador. O fato é 
o seguinte: quem quiser alcançar resultados internacionais em competições precisa, além de 
estar submetido a uma equipe técnica multidisciplinar, começar o treinamento altamente 
especializado já em idades muito precoces. 
Nesse aspecto, em algumas modalidades específicas (ginástica olímpica e rítmica 
desportiva, natação, judô, etc.) o treinamento especializado precoce assume 
características de extrema intensidade. 
Segundo Meinberg (1990), “os críticos receiam que as crianças praticantes de 
desporto se vejam privadas da sua verdadeira infância, dado que o desporto de 
rendimento requer um enorme dispêndio de tempo” (p.74). Como se pode ver, são 
objeções éticas e morais em relação ao esporte de alto rendimento praticado por crianças. 
Vargas Neto (1995; 1997a; 1997b; 1997c; 1997d; 1998; 1999a; 1999b) e Vargas 
Neto, Vargas e Voser (1999; 2000), em alguns estudos, apresentam questões éticas 
relativas à criança envolvida em atividades esportivas desde muito cedo. Ainda que sejam 
muitos os benefícios da prática esportiva infantil, não devemos esquecer os riscos a que 
está sujeita a criança praticante do esporte de rendimento. Os riscos estão agrupados em 
quatro grandes áreas, a saber: 
- Riscos de tipo físico – estão relacionados à saúde corporal da criança e têm a ver com 
lesões ósseas, articulares, musculares e cardíacas; o problema é relativo ao imenso número 
 
3 Nem tão recente, pois os filósofos gregos já se preocupavam com os jovens atletas que, após vencerem 
competições olímpicas em suas categorias, jamais voltavam ao pódio como adultos. 
 
 33 
de repetições dos gestos técnicos que visam ao aperfeiçoamento e à automatização do 
movimento4. 
- Riscos de tipo psicológico – são relativos ao estado mental e de conduta dos sujeitos. Nesse 
aspecto, nas crianças foram encontrados níveis extremamente altos de ansiedade, estresse 
e frustração. Os maus resultados em competições causam desilusões e abandono, e hojese 
estuda a questão da “infância não vivida”, em que se têm relatos de ex-atletas que dizem 
não se lembrar de brincadeiras e de sua época infantil. Como pedagogos, sabemos da 
importância do brincar e do lúdico na formação do caráter e no desenvolvimento integral 
da personalidade da criança. 
 - Riscos de tipo motriz – a especialização precoce conduz a uma importante falta de base 
poliesportiva, ocasionando uma provável impossibilidade de prática futura de outra modalidade, 
observada nos automatismos motores extremamente rígidos adquiridos por esses atletas. 
- Riscos de tipo esportivo – como a especialização é precoce, não se pode saber quais as 
características (físicas, técnicas, psíquicas, motrizes, etc.) do futuro atleta de elite. Pode esse mesmo 
atleta, no futuro, não apresentar as condições exigidas para aquele determinado esporte. 
Outro aspecto importante é o que diz respeito às conquistas de títulos e marcas 
durante a infância. Um estudo de Kunz (1983) determinou que esses resultados não 
garantem sucesso quando o atleta se torna adulto. 
Em sua tese doutoral que trata sobre esporte e saúde, Vargas Neto (1995) faz um 
apelo às autoridades políticas e esportivas no sentido de que se consolide uma legislação 
própria que regule e controle, basicamente, o número máximo de horas de treinamento de 
crianças, a intensidade e os objetivos desse mesmo treinamento e a formação e a 
qualidade do ensino da pessoa responsável por essas atividades. Seria igual ao que ocorre 
no controle por parte do Estado de outros aspectos, tais como: ingresso de menores no 
trabalho, o número máximo de horas na escola, a segurança dos brinquedos e a higiene 
dos produtos alimentícios. 
De toda essa exposição, acreditamos poder entender as dúvidas geradas quanto aos 
aspectos éticos e morais da especialização esportiva precoce. 
5 Considerações finais 
Ao finalizar este ensaio, queremos expor que o nosso estudo não pretende apontar 
preceitos definitivos, mas indicar caminhos e reflexões para se agir eticamente nas 
práticas esportivas. O tema que abordamos gera muita controvérsia no mundo esportivo; 
as posições normalmente encontradas são antagônicas. De um lado, dirigentes esportivos, 
empresários e industriais do esporte e alguns técnicos não demonstram qualquer tipo de 
 
4 Os números assustam: um praticante de ginástica pode executar 8.000 saltos por temporada; um arremessador de 
dardo, até 6.000 arremessos; em saltos ornamentais, pode-se chegar a 14.000 saltos; nas maratonas, o corredor 
executa 30.000 impactos do calcanhar contra o solo; no voleibol, são 150 saltos de mais de um metro de altura, 
causando um impacto na chegada ao solo de até dez vezes o peso do corpo. São dados relativos a atletas de alto 
nível. Calculando quantitativamente em relação à criança, chegaremos a números próximos a esses. 
 
 34 
preocupação com os aspectos éticos e morais anteriormente abordados. Entretanto, 
existem profissionais, quase sempre com formação acadêmica, que divergem e criticam os 
mecanismos e os processos utilizados por instituições e pela mídia em relação ao esporte 
de alto rendimento. 
Em razão disso, esperamos ter contribuído e estimulado outros profissionais a 
investir em pesquisas e estudos nessa área, que necessita de discussões e reflexões em 
maior profundidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 35 
Referências 
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 36 
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Educação Física no espaço de expressão da língua portuguesa: passagem para o novo 
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Lazer. Escola Superior de Educação Física, Universidade Federal de Pelotas. Pelotas/RS, 
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______. Os benefícios e os malefícios da prática esportiva infantil. Revista Sprint ano XIX, 
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 37 
 
CAPÍTULO 4 
 
Fatores determinantes 
da ansiedade em 
competições de 
iniciação esportiva
5
 
 
 
5 Colaboraram na elaboração deste capítulo: 
 Aline Nogueira Haas, doutora em Medicina e Cirurgia – Faculdade de Cádiz, Espanha. 
 Max de Mello Campani, graduado em Educação Física pela ULBRA Canoas. 
 38 
 
1 Considerações iniciais 
Para melhor estudar os transtornos ansiosos, devemos tentar definir o termo ansiedade. 
Do latim anxietate, ansiedade tem várias definições nos dicionários não técnicos: aflição, 
angústia, perturbação do espírito causada pela incerteza, relação com qualquer contexto de 
perigo, etc. Levando-se em conta o aspecto técnico, devemos entender ansiedade como um 
fenômeno animal que ora nos beneficia, ora nos prejudica, dependendo de sua

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