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92 Unidade II Unidade II 5 EM BUSCA DE RECURSOS DE INTERVENÇÃO 5.1 Preparando psicologicamente os atletas 5.1.1 Influências externas no preparo psicológico de atletas Entre as influências externas no preparo psicológico de atletas, podemos citar as seguintes: torcida, uso de drogas, doping, influência de pais, técnicos, dirigentes, patrocinadores, empresários e empresas. Como vimos, o desempenho do atleta sofre interferência de fatores psicológicos (motivação, atenção, percepção e concentração, entre outros) e de fatores socioambientais. Para que seu trabalho seja eficiente e eficaz, é preciso que o psicólogo do esporte considere toda essa dinâmica de forças que interagem continuamente. As pessoas lidam de diferentes maneiras com vitórias e derrotas, com torcidas a favor ou contra, com a pressão de pais, técnicos e dirigentes, com a exigência de patrocinadores e com o apelo das drogas que circundam o meio esportivo, especialmente o de alto rendimento. Consideremos, pois, algumas dessas influências externas no preparo psicológico de atletas. A torcida Figura 40 – Os torcedores A torcida exerce papel fundamental na carreira de um atleta. Suas mudanças são bruscas ao longo de uma partida, apoiando ou vaiando em questão de segundos. A torcida corresponde ao espectador que apresenta prejulgamentos, muitas vezes não se importando com o bem‑estar físico e emocional do atleta e/ou da equipe. O tipo de torcida e/ou torcedor e sua atuação são fatores que interferem 93 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE de maneira direta e indireta nos atletas. Em sua composição estão familiares, torcida organizada, espectadores, telespectadores, imprensa, técnico e companheiros, entre outros. Há indivíduos e equipes esportivas que só conseguem obter êxito em competições quando se deparam com o público adversário e passam a jogar não com a equipe adversária, e sim em função desse público situado fora do setor de jogo. Por isso, o entendimento do papel do torcedor e de seu comportamento também tem sido objeto de estudos no meio esportivo. Como as ações dos atletas, as manifestações dos torcedores também resultam da interação de múltiplos fatores: personalidade, nível cultural, expectativas, papéis sociais, experiências anteriores e por aí vai. Mudanças bruscas no comportamento de torcedores, causadas por distintos fatores, podem conduzir à agressividade. Figura 41 – Torcida: multiplicidade e diversidade No espetáculo esportivo encontramos três tipos de torcedor: • Torcedor racional: é aquele que estuda o esporte independentemente do time para o qual torce. Entende sobre técnica e tática, sabe o nome dos atletas e da equipe técnica, entende os posicionamentos do técnico e da equipe durante a disputa, acompanha os treinamentos, a transição de jogadores etc. Para ele o esporte fica à frente do próprio time e muitas vezes é solicitado a atuar como consultor profissional de clubes e setores da mídia. • Torcedor espectador: é aquele cuja torcida se limita a seu time e ao momento da partida. Ele não é muito afetado pela vitória ou pela derrota, pois o jogo, o time e o esporte não interferem em seu cotidiano. São apenas motivo de lazer, entretenimento e recurso de integração social. • Torcedor paixão: é aquele para quem o jogo é motivo de satisfação e de suporte social. Ele não torce com racionalidade, pois seu entusiasmo, sua paixão e sua excitação são tão fortes que o levam a renunciar a qualquer outra atividade. Esses sentimentos, por vezes verdadeiras declarações de amor, podem se traduzir em atitudes agressivas quando o atleta e/ou a equipe 94 Unidade II não apresentam os resultados esperados. Esses sentimentos se inflamam ainda mais quando suas reações são compartilhadas pelo grupo. Para que uma torcida organizada se torne criminosa basta que reúna os seguintes ingredientes: • paixão; • grupo; • emoções; • propósito/tarefa (torcer: incentivar, vaiar); • momento pelo qual a equipe passa (final de campeonato); • atitudes dos jogadores em campo; • atitudes imorais, supostamente permitidas; • impunidade; • pouca estrutura; • pouco entretenimento; • pouca segurança inteligente; • altos salários dos jogadores como argumento para que haja maior cobrança por parte dos torcedores, o que supõe, muitas vezes, diferenças de classes sociais; • situação socioeconômica do país. Embora a quantidade exata de cada um desses ingredientes exija mais estudos, é inegável que a torcida exerça influência sobre a performance do atleta. Entre os fatores dessa influência se incluem os seguintes: • Quantidade de torcedores: mais torcedores, maior influência. • Proximidade física/estrutural entre atletas e torcedores: torcedores mais próximos dos atletas participam mais. Os atletas conseguem ouvir exatamente o que os torcedores dizem, podendo até mesmo “olhar nos olhos” deles. No caso de alguns esportes, e sendo esse tipo de influência considerada na arquitetura de palcos esportivos, procura‑se colocar os torcedores o mais próximo possível dos atletas, privilegiando a estrutura de arena em lugar da estrutura de estádio. 95 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE • Proximidade de parentesco entre atletas e torcedores/histórico familiar: quanto maior o grau de parentesco, maior a influência dos torcedores sobre os atletas. • Torcida incentivadora: intensifica a autoconfiança dos atletas. • Torcida exigente: tende a promover estresse nos atletas, gerando desmotivação ou provocando desequilíbrio emocional. • Jogar dentro ou fora de “casa”: o fato de jogar dentro ou fora de “casa” pode ser incentivador ou não, dependendo do jogador e de variáveis da situação de um campeonato. • Nível esportivo do atleta: atletas mais experientes, mais dotados de atenção e concentração durante as partidas sofrem menor influência dos fatores mencionados. • Estímulo diante do público adversário: há jogadores e equipes esportivas que somente conseguem obter êxito em competições quando se deparam com o público adversário – jogam mais em função desse público, situado fora do setor de jogo, do que em função da equipe adversária. • Presença de observadores: pode prejudicar a performance dos jogadores por interferir em habilidades atléticas que requerem coordenação complexa, movimentos executados com precisão e concentração intensa. De acordo com Singer (1997), o desempenho de atletas em nível inicial de aprendizagem é prejudicado pela torcida; o desempenho de atletas em estágio intermediário de aprendizagem é levemente prejudicado, ou favorecido, pela ação da torcida; e o desempenho de atletas de alto nível técnico e psicológico ou não é influenciado pela torcida ou é favorecido por ela. Atletas que apresentam desequilíbrio físico e emocional diante da torcida podem ser beneficiados pela ação de um psicólogo. Observação É importante utilizar recursos que auxiliem o atleta a selecionar fatores que o ajudem no desenvolvimento global do esporte. Por exemplo, a técnica, a tática e o trabalho em equipe são pilares a serem construídos desde a iniciação esportiva. Diante das manifestações da torcida, a atenção seletiva favorece o desempenho. A atenção seletiva, capacidade de ignorar informações irrelevantes e se ater às mais importantes, favorece a concentração e o uso eficaz das habilidades motoras. Quanto menores as informações que disputem a atenção, menor será a quantidade de conexões nervosas exigidas para a realização de determinada tarefa, 96 Unidade II o que reduz o desgaste energético. Os focos de atenção são definidos em função do interesse, o que pode ocorrer de modo involuntário. Por exemplo, quando em meio a muitas pessoas ouvimos nosso nome sendo mencionado, automaticamente voltamos nossa atenção para o que está sendo dito ou para quem está dizendo. Distintos estímulos advêm continuamente de mais de um sentido – visão, audição, olfato, paladar, tato –, cabendo ao sistema nervoso central triar as informações mais relevantes. A atenção seletiva favorece a memorizaçãoe o aumento de precisão em diversas habilidades. O alto nível de atenção observado durante o processo de aprendizagem é mantido durante mais tempo se houver interesse pela tarefa e boas condições ambientais. A automatização de um movimento aprendido faz com que a atenção tenda a diminuir. Quanto maior o tempo de preservação do foco de atenção, menores os riscos de errar. No entanto, durante um jogo, as muitas interferências simultâneas – torcida, adversários, pensamentos aleatórios – determinam a redução do nível de atenção. Por isso, para aumentar o poder da atenção seletiva de um atleta, é importante dialogar com ele sobre os pontos que mais exigem foco e lhe propiciar treinamento adequado. Lembrete A atenção seletiva deve ser praticada nas diferentes fases do treinamento para que a automatização liberte o atleta de preocupações relativas às variáveis externas. Vejamos alguns exemplos dessas práticas: • Durante o treinamento podemos selecionar um objeto com cor específica e predominante, pedindo ao atleta para que quantifique todos os objetos que perceber. Ao final do tempo estipulado, solicita‑se a ele recordar os objetos vistos, partindo de objetos diversos, especificando a seguir objetos relacionados ao esporte e especificando, logo depois, a relação desses objetos com metas e objetivos esportivos. Concluídas essas tarefas, solicita‑se ao atleta novamente para que recorde todos os objetos, com ênfase no objeto com destaque, para verificar se deixa algum deles escapar da contagem. Este é um recurso para eleger um único estímulo e dar foco a ele, o que aprimora a capacidade de atenção seletiva. • Durante o treinamento o atleta é solicitado a realizar determinada ação – chutar ao gol, driblar, cabecear, dar uma virada olímpica na natação, trocar de bastão em um revezamento – sendo solicitado, ao mesmo tempo, a prestar atenção em outras ocorrências simultâneas – o que um torcedor está dizendo, uma música, a cor de uma bandeira, o posicionamento de outros atletas. Pede‑se ao atleta para dedicar o máximo de atenção à habilidade principal, a fim de executar a tarefa na melhor performance possível. Ao final, pede‑se ao atleta para que faça um resumo de tudo o que viu. A atenção seletiva é a principal chave para a abertura da porta que dá acesso ao foco principal, sem que haja desvio desse foco por situações irrelevantes. Esse treino contribui para melhorar a performance e para evitar reações indesejáveis como agressões físicas e morais a adversários. 97 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Exemplo de aplicação Nos esportes a torcida é uma variável externa de caráter condicionante. Reflita sobre recursos a serem utilizados pelo psicólogo esportivo para detectar aspectos positivos e negativos da ação da torcida sobre os atletas. Uso de drogas A recuperação de um atleta que tenha se viciado em drogas ou álcool é importante para incluir em seu perfil a capacidade de superação e para apresentá‑lo como modelo social. Observação Perante casos de uso de anabolizantes, as atuações da psicologia alinhadas com as atuações das equipes técnicas evidenciarão questões relativas ao bem‑estar físico e emocional e questões éticas relativas à superação de limites. Embora comprovado que a prática esportiva não seja garantia de distanciamento do mundo das drogas, o esporte é a grande saída de qualquer situação prejudicial a uma pessoa, pois mobiliza uma gama de hormônios e neurotransmissores responsáveis por determinadas sensações e emoções. O controle da liberação de hormônios no organismo permite ter maior controle do comportamento. Infelizmente, o uso de drogas é usual no meio esportivo. Muitos atletas de alto nível já declararam terem feito uso de drogas ilícitas, como maconha, heroína, diferentes inalantes, cocaína, LSD, ecstasy, além do uso indiscriminado de anabolizantes, álcool e tabaco. Por sua vez, o uso de qualquer droga ou medicamento para aumentar o desempenho é considerado doping, o que fere o espírito esportivo e promove desigualdade de condições entre os atletas, além de proporcionar grandes riscos à saúde. A prática esportiva pode oferecer a saída do mundo das drogas, quando o jogo se apresenta como fonte de prazer e de distração em competições amadoras, bem como quando a sensação de bem‑estar produzida após a prática esportiva substitui o prazer das sensações provocadas pelo uso de substâncias psicoativas. Entretanto, no alto rendimento, o anseio por vitória, por reconhecimento social e por estabilidade financeira aumenta a possibilidade de busca de atalhos por serem elevadas as cargas de treinamento e de estresse impostas aos esportistas profissionais. Esportistas solicitados a justificarem o consumo indiscriminado de drogas e anabolizantes apontaram os seguintes motivos para o uso: • Melhorar o desempenho. • Aumentar o volume de massa muscular. 98 Unidade II • Fortalecer músculos e ossos. • Aumentar o transporte de oxigênio para ativar tecidos. • Evitar dores. • Estimular o corpo. • Relaxar. • Reduzir peso. • Ocultar o uso de outras drogas. O esporte tende a criar relação de confiança entre a equipe técnica e o atleta, o que é fundamental para um melhor desempenho. Mas, apesar disso, alguns atletas se sujeitam a atividades sem questionamento algum e acabam induzidos a ingerir anabólicos. A relação entre drogas e esportes vem de longa data. Algumas substâncias, como a anfetamina e os anabólicos esteroides, foram difundidas após a Segunda Guerra Mundial para melhoramento da capacidade de combate dos soldados, por reduzirem a fome, as dores e a sensação de fadiga, além de acelerarem o processo de recuperação muscular. A testosterona e medicamentos como a nandrolona, também utilizados na Segunda Guerra Mundial, logo chegaram ao meio esportivo como fator adjuvante para ganho de massa muscular. Esses estimulantes são substâncias que agem diretamente sobre o sistema nervoso central, intensificando a ação do sistema cardíaco e do metabolismo. Anfetaminas, cocaína, efedrina e cafeína são usadas para obtenção de efeitos análogos aos da adrenalina, e com o aumento da excitação ocorre também a ampliação da capacidade de tolerância ao esforço físico e a redução do limiar da dor. Exemplos de esportes nos quais encontramos atletas que fazem uso dessas substâncias são: basquete, ciclismo, vôlei e futebol. Analgésicos narcóticos, substâncias representadas pela morfina e petidina, são derivados do ópio e atuam no sistema nervoso central reduzindo dores. A redução da sensação de dor pode ser prejudicial aos atletas, porque uma lesão perigosa será agravada sem o alerta da dor. Essas substâncias são usadas em esportes que exigem muita resistência, como a maratona e o triátlon. Os anabolizantes são derivados da testosterona, o hormônio masculino. Quando um atleta os consome pode ganhar força, potência e maior tolerância ao exercício físico. São substâncias usadas em todos os tipos de esporte e por pessoas que optam por acelerar o processo de conquista de um corpo mais musculoso. A eritropoetina, hormônio que aumenta a quantidade de glóbulos vermelhos (hemácias) no sangue, favorece um transporte maior de oxigênio para as células. Todavia, tem por efeitos colaterais a hipertensão arterial, o risco de infartos, de embolia pulmonar e de convulsões. É a droga mais usada por ciclistas, triatletas, maratonistas e outros praticantes de esportes de resistência. É importante salientar que a opção por indução hormonal exógena e pelo uso de outros anabólicos e medicamentos causam ao organismo muito mais efeitos prejudiciais do que benéficos. Os anabolizantes agem 99 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE nas fibras musculares provocando maior retenção hídrica e de nitrogênio, o que favorece a síntese proteica e faz com que as fibras aumentem de tamanho e proporcionem maior resistência e volume ao músculo. Doping Figura 42 – Medalhas O doping resulta do uso de substâncias ilícitas utilizadas para aumentar a performance esportiva. Taissubstâncias podem ser de ordem farmacológica, hormonal, genética, sanguínea ou exteriorizada. Todos os anos a Agência Mundial Antidoping (WADA, em inglês) publica a lista atualizada de substâncias proibidas para os atletas. As punições vão de uma simples advertência à possibilidade de exclusão do atleta. As substâncias farmacológicas e hormonais proibidas são classificadas em cinco grupos principais: • estimulantes (cafeína, anfetaminas e cocaína); • narcóticos e analgésicos (hormônio adrenocorticoide e cortisona); • anabolizantes (beta‑2‑agonistas, HCG, GH, insulina etc.); • diuréticos (furosemida, hidroclorotiazida, manitol etc.); • hormônios peptídicos e análogos. O doping genético resulta de terapia gênica para alterar o DNA e provocar a formação de uma substância dopante no próprio corpo sem necessidade de ingestão ou de injeção de substâncias proibidas. Esse tipo de doping, invisível e muito eficaz, tem sido objeto de pesquisas cujos resultados já indicam recursos para detectá‑lo. O doping sanguíneo promove aumento da quantidade de hemoglobina no sangue. Geralmente é feito de maneira exógena: uma quantidade de sangue do atleta é retirada e reservada em lugar refrigerado. Próximo ao dia da competição, esse sangue injetado promove expressivo aumento do número de hemácias, o que possibilita maior transporte de oxigênio, aumentando a eficiência do desempenho. 100 Unidade II No doping exteriorizado são adotados recursos tecnológicos para melhoramento do rendimento, como a famosa pele de tubarão, utilizada por nadadores na confecção de macacões que facilitam a aerodinâmica em corredores de curta distância, os tênis que aumentam a propulsão vertical do salto etc. Muitos desses recursos foram proibidos pelas respectivas confederações de esportes, por aumentarem a desigualdade entre participantes das competições, da qual decorrem brigas entre patrocinadores, clubes e atletas. Os dopings são utilizados no período pré‑competitivo, durante a competição ou no período pós‑competitivo. Atualmente, muitos atletas de elite estão mais preocupados em não serem pegos em exames antidoping do que em utilizarem substâncias proibidas. Ao psicólogo esportivo compete zelar sempre pelo bem‑estar do atleta, o que inclui a inibição da prática de doping. Figura 43 – O método boosting Saiba mais Os filmes relacionados a seguir ajudam a entender melhor a interferência do doping no mundo esportivo: A CORRIDA do doping. Direção: Paulo Markun. 2016. 90 min. ÍCARO. Direção: Bryan Fogel e Mark Monroe. 2017.121 min. A MENTIRA de Armstrong. Direção: Alex Gibney. 2013. 124 min. O doping encontra‑se presente mesmo quando o atleta visa apenas a superação dos próprios limites, colocando em segundo plano a vitória, como acontece com mais evidência em atletas paraolímpicos, entre os quais cresce cada vez mais o número de atletas dopados. Isso seria um sinal de final dos tempos 101 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE em relação ao espírito esportivo? A competição que visa à superação dos próprios limites demonstra sinais de fraqueza diante do esporte reabilitador. O chamado boosting (do inglês, impulso, impulsionando) está em ascensão entre os atletas paraolímpicos. Por meio desse método, atletas paraplégicos têm recorrido ao estrangulamento de sua genitália, à fratura de dedos do pé e à compressão de órgãos do abdômen. Sem sentir dores nessas partes do corpo, tornam‑se capazes de intensificar a circulação sanguínea, diminuir o cansaço e melhorar seu desempenho em até 10% nas provas de resistência, como as de longas distâncias percorridas, características ao atletismo em cadeira de rodas. O estudo que descreve o boosting em atletas com elevado grau de lesão medular foi elaborado por onze especialistas em fisiologia e medicina do esporte de centros de pesquisa no Canadá, Estados Unidos, Brasil, África do Sul, Austrália e Europa (BHAMBHANI et al., 2010). Um atleta pego em um exame antidoping receberá a principal punição, visto ser considerado responsável por suas condições físicas. Lembrete A prática do doping pode ingressar na vida de um atleta sem que ele perceba. Compete ao psicólogo esportivo oferecer orientações sobre as consequências fisiológicas, psicológicas, sociais e profissionais dessa prática. Influência de pais, técnicos e dirigentes É preciso que a relação entre pais, técnicos e dirigentes seja harmoniosa, para fortalecer os laços de confiança e a formação do atleta em valores morais e éticos. Porém, muitas vezes, essa harmonização é abalada por um jogo de interesses extracompetição, que faz com que o atleta se torne um objeto de manipulação decorrente de ambições e ganância. Normas impostas pelos clubes e posteriormente quebradas pelos próprios cartolas que as definiram geram confusão nos atletas. O protecionismo muitas vezes ocasionado pelo valor de mercado de um atleta pode afetar toda a equipe. As chamadas estrelas do time, embora ovacionadas pelos torcedores, imprensa, patrocinadores e agenciadores, devem receber o mesmo tratamento oferecido aos outros componentes, respeitada sempre a ordem justa e hierárquica. No futebol é muito comum os atletas desrespeitarem ordens estabelecidas pelos técnicos, principalmente quando se veem protegidos pelos dirigentes dos clubes nos quais estão atuando. Isso pode provocar raiva, inveja e até mesmo relacionamentos falsos no meio esportivo. Regras de conduta mantidas e cobradas pela cúpula de uma instituição demonstram organização, cooperação e respeito diante de todos os componentes da equipe. Ao psicólogo do esporte compete 102 Unidade II analisar ocorrências internas e externas ao âmbito esportivo e atuar de modo que o atleta não se torne alvo de valores externos ao mundo dos esportes, como valores políticos, por exemplo. A orientação dada aos pais e técnicos, com base na análise de seu comportamento, irá ajudá‑los na adoção de atitudes e comportamentos a serem preservados em suas relações com o atleta, principalmente na fase de iniciação esportiva. Compete ao psicólogo orientar os treinadores a não sobrecarregarem os atletas e a não considerarem apenas o atleta/aluno, mas também a influência de seus familiares e da equipe que o circunda. A figura a seguir ilustra algumas das relações passíveis de serem estabelecidas entre pais e técnicos, principalmente em período pré‑competição e durante a própria competição. Se a família (representada na figura pelo pai) do atleta é de tipo motivador quanto às cobranças pela vitória ou por bom desempenho, é importante que o técnico adote um nível pacífico de exigência. Se, por outro lado, a família do atleta é de tipo pacífico quanto às cobranças pela vitória ou por bom desempenho, é importante que o técnico adote um nível motivador ou cobrador de exigência. Se a família do atleta é de tipo cobrador de alta performance e deposita suas elevadas expectativas sobre o atleta/aluno, sem muitos escrúpulos, é importante que o técnico adote um nível pacífico de exigência. Pai motivador Pai pacífico Pai cobrador Técnico motivador Técnico pacífico Técnico cobrador Figura 44 – Orientação sobre formas de atuar na relação estabelecida entre familiares e técnicos Influência de patrocinadores, empresários e empresas No âmbito dos atletas de elite, e em menor grau no âmbito dos atletas de base, há uma indústria ansiosa por se promover. Um atleta de elite destacado por suas atuações profissionais torna‑se alvo do interesse de patrocinadores, dirigentes e empresários diversos, dispostos a explorar seus resultados em benefício próprio. O uso de atletas como objetos e/ou máquinas de fazer dinheiro é evidente no âmbito do esporte de alto nível. A imposição de patrocinadores busca justificativa em altos salários e bonificações que ludibriam e encantam os atletas e respondem a anseios de familiares e amigos. Fama e estabilização financeira precoce são o sonho de inúmeros jovens que se arriscam, motivados por ofertas tentadoras. Atletas transformados em produtocomercial passível de compra e venda, de marketing e de jogos políticos se tornam produtos altamente rentáveis para a mídia, pois possibilitam o aumento da audiência em programas de televisão e da venda de jornais e revistas. Podem ser transformados em heróis nacionais, anti‑heróis ou mesmo vilões em questão de poucos minutos. Deslumbrados pela fama e pelo poder, podem se esquecer de sua responsabilidade social, que inclui servir de modelo identificatório. 103 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Frequentemente os atletas se sujeitam a exposições sem medir consequências futuras, acarretando uma inversão de valores. Figura 45 – Inversão de valores: representação de um esporte patrocinado por uma marca de cigarros Atualmente o poder da mídia esportiva é tão grande que pode alterar datas e horários de jogos a serem transmitidos pelos meios de comunicação e pode também influenciar na escalação de times em troca da valorização popular de atletas, clubes e patrocinadores. Essa relação entre patrocinadores, empresas e empresários exerce influência direta e indireta sobre o atleta e sobre a equipe técnica. Técnico EmpresasPatrocinadores Empresários Figura 46 – Pressão sofrida por técnicos esportivos Por outro lado, é preciso ser justo e lembrar que a relação com a mídia não se restringe a lágrimas e exploração, pois o apoio por ela oferecido é importante para diversos esportes, contribuindo para a manutenção ou recuperação de clubes esportivos, para a garantia de salários e bonificações aos atletas e à equipe técnica, para a divulgação do esporte e de ações sociais vinculadas a sua prática, para o patrocínio exponencial do crescimento do esporte, e para o apoio às iniciativas de introdução à atividade física, que reduzem o risco do sedentarismo e de suas consequências nefastas, sendo imprescindível ao bem‑estar das pessoas. A transformação do esporte em espetáculo apresenta, pois, um lado positivo e outro negativo. 104 Unidade II 5.2 Programa de treinamento psicológico Figura 47 – Momento de visualização O programa de treinamento psicológico é desenvolvido ao longo de três etapas: formação, treinamento e aplicação. Durante a etapa de formação é realizada a aprendizagem de técnicas úteis para o desenvolvimento de habilidades psicológicas por meio de exercícios que atendem às necessidades do esportista. Essa formação educacional é negligenciada por muitos atletas, principalmente por falta de informações ou por serem consideradas desnecessárias. Tal negligência se apoia na opinião de que essa formação acarreta perda de tempo, na crença de que tais habilidades são inatas e não demandam aprendizagem, na suposição de que esse tipo de treinamento é utilizado apenas com atletas que apresentam problemas de comportamento, no mito de que somente atletas de elite utilizam essas técnicas por serem supostamente muito apuradas e de difícil execução, ou, simplesmente, a negligência decorre do fato de esse tipo de treinamento ser considerado inútil. Durante a etapa de treinamento é realizado o ajuste das técnicas ao desenvolvimento de determinadas habilidades psicológicas tendo por objetivo o aumento da funcionalidade, da automatização e da integração dos procedimentos à rotina de treino e de competição. Nesta etapa, o esportista é preparado para a prática de uma imaginação limpa e apurada e para a aquisição perfeita da técnica, sendo sua autonomia reforçada para que se sinta capaz de contar consigo mesmo. Durante a etapa de aplicação são utilizadas, nas competições, as técnicas aprendidas. Para o êxito de um programa de treinamento psicológico é recomendável que o psicólogo esportivo opte pela realização de uma etapa preliminar à da tríade formação‑treinamento‑aplicação, durante a qual sensibilizará os atletas para a influência psicológica no desempenho esportivo e para a importância da consciência das próprias emoções e sensações físicas no bom desempenho. 105 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE O treinamento geralmente é realizado de modo individual, a fim de permitir a melhor observação de variáveis psicológicas e do rendimento esportivo, incluindo um longo período de observação do atleta em seu próprio ambiente. Esse período de pré‑intervenção, de avaliação do nível inicial de determinada habilidade, é seguido do período de intervenção, durante o qual são realizadas mudanças. A estrutura de uma única sessão de treinamento psicológico compreende três fases: briefing, sessão prática e de briefing. Durante o briefing o psicólogo conversa com o atleta para avaliar o que deverá ser visualizado e para estabelecer com ele o consenso de que o treinamento fortalecerá um aspecto considerado falho em específico. Durante a sessão prática o atleta é convidado a visualizar o que foi discutido, inicialmente com apoio do psicólogo e depois sem esse apoio, visando à aquisição de autoconfiança e de segurança no uso da imaginação. Durante a fase denominada de briefing, realizada logo após a sessão prática, o psicólogo dialoga com o atleta a respeito de como transcorreu o processo de imaginação. Tratará de verificar se houve interferência de outros pensamentos, se os pensamentos foram sempre positivos em relação à execução da tarefa e se houve detalhamento no processo de visualização. Entre as habilidades esportivas incluídas em um programa de treinamento psicológico incluem‑se as seguintes: • Estabelecimento de metas. • Relaxamento. • Dinamização ou autoativação. • Diálogo interno positivo. • Concentração. • Atenção. • Aprendizagem. • Aperfeiçoamento de habilidades. • Controle de estados emocionais como ansiedade, estresse e medo. • Aquisição, prática e refinamento de habilidades motoras específicas. • Fortalecimento da motivação. 106 Unidade II • Modificações no nível de ativação e nos estados emocionais. • Repetição de estratégias táticas. • Simulação imaginativa de situações competitivas e aumento da autoconfiança. • Aperfeiçoamento das qualidades artísticas de gestos esportivos. • Gestão da fase de convalescença – emprego, por parte de atletas lesionados, de imagens mentais de cura, de diminuição da dor, de objetivos de curto, médio e longo prazos, e de habilidades técnicas e táticas passíveis de utilização para evitar uma degradação muito grande da capacidade esportiva. • Reabilitação física e emocional e resiliência. Como se estabelece uma relação psicopedagógica entre o treinador e o atleta durante a aprendizagem de novas técnicas e de recursos para controle de emoções que possam interferir negativamente nos momentos de estresse, é recomendável recorrer ao arsenal teórico‑técnico da psicologia do esporte, essencialmente voltada para o contexto esportivo e para a otimização do rendimento. Nesse processo de aprendizagem mostram‑se úteis os exercícios da imaginação para a obtenção de um melhor desempenho esportivo. Durante o treinamento de habilidades psicológicas convém utilizar recursos da imaginação: imaginar‑se e sentir‑se desempenhando determinadas atividades faz com que sejam ativados, embora em menor intensidade, os mesmos impulsos neuromusculares produzidos durante a execução do movimento. Saiba mais Nas fontes referidas a seguir há boas informações sobre treinamento psicológico: GODTSFRIEDT, J.; ANDRADE, A.; VASCONCELLOS, D. I. C. Treinamento mental no tênis: revisão sistemática da literatura. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Porto Alegre, v. 36, n. 2, p. 577‑586, jun. 2014. GOMES, A. R. Competências psicológicas e preparação mental de atletas de andebol. In: ARRAYA, M.; SEQUEIRA, P. (eds.). Andebol: um caminho para o alto rendimento. Lisboa: Visão e Contextos, 2012, p. 361‑399. O HOMEM que mudou o jogo. Direção: Bennett Miller, 2011. 133 min. 107 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Diversas teorias sobre a eficácia da visualização/imaginação na aprendizagem e no rendimento esportivo foram formuladas por diferentes teorias psicológicas, das quais mencionaremos algumas a seguir: • Teoria psiconeuromuscular:afirma que a visualização produz, por meio de imagens mentais, uma atividade muscular mínima que deixa traços nas células musculares, sendo tais traços conservados para serem utilizados na execução concreta do movimento. • Teoria da aprendizagem simbólica: afirma que a visualização opera como um sistema que traduz para as pessoas como se dá o movimento. O fato de repetir mentalmente uma ação permite que o indivíduo se familiarize com a tarefa a ser executada e aumente suas chances de realizá‑la concretamente de modo satisfatório. • Teoria bioinformacional: afirma que as imagens mentais são conjuntos de proposições (afirmações) armazenadas no cérebro, que favorecem o desempenho nas atividades esportivas. • Teoria da equivalência funcional: postula que a visualização se apoia na mesma rede neural utilizada para a percepção do ambiente concreto e para o controle motor. Segundo esta teoria, duas perspectivas ou pontos de vista podem ser adotados pelos atletas, de acordo com suas características pessoais ou com o tipo de tarefa realizada para a imaginação. A perspectiva interna, ou de primeira pessoa, é aquela segundo a qual o indivíduo imagina uma câmera posicionada em sua cabeça e a atividade sendo executada da mesma forma que na vida real. Essa atividade enfatiza o ponto de vista do agente da ação, sendo que nada fora do seu campo normal de visão será enxergado. Já na perspectiva externa, ou perspectiva de terceira pessoa, tudo se passa como se uma câmera fixa estivesse sendo segurada por outra pessoa (um observador externo), e o indivíduo vê a si mesmo realizando a tarefa a partir de um ponto de vista situado fora de seu corpo, ou a partir de um vídeo. A capacidade de visualização demanda dois atributos fundamentais: vividez das imagens mentais e nível de controlabilidade. Ou seja, quanto mais real for a visualização, em termos de cores, texturas e velocidade de execução, mais funcional ela será. Uma imagem mental é mais bem vivenciada quando dotada de alto grau de nitidez e realismo. O atleta deve incorporar na imagem, além dos elementos visuais – ideia que a palavra visualização já evoca –, os aspectos sensoriais cinestésicos, auditivos e os estados emocionais. As imagens mentais devem se parecer ao máximo com as imagens reais. A controlabilidade corresponde à capacidade de manipular as imagens de modo que elas façam aquilo que o indivíduo deseja que façam. O aperfeiçoamento da habilidade de visualização requer que o esportista, antes de tudo, se habitue com a atividade de criar imagens mentais. O treino é iniciado com a visualização de imagens de objetos familiares, imagens simples e estáticas, e prossegue com a visualização de imagens de movimentos próprios e de outras pessoas. Durante a fase inicial do treinamento são realizados diversos tipos de manipulação da imagem: mudanças do ponto de observação de um objeto; mudanças de cor, tamanho 108 Unidade II e peso (propriedades do objeto), manipulações espaciais, rotações de um objeto assimétrico (como uma raquete) e mudanças de perspectiva. Assim sendo, para que o treino mental tenha êxito, é preciso que o atleta apresente iniciativa própria, compreensão e conhecimento do método; confiança no treinador e no psicólogo esportivo; utilize sua individualidade e não tente representar outra pessoa durante a visualização; seja disciplinado no treinamento físico e tenha uma aprendizagem condizente com o princípio da economia de funções cognitivas, ou seja, que a visualização exija cada vez menos esforço de concentração e ocorra da melhor maneira possível. A conquista de um alto grau de visualização a ser utilizada segundos antes da execução de determinadas tarefas beneficiará a realização de outras atividades da vida diária que exigem superação de situações difíceis, tais como exames, entrevistas e reuniões importantes. Muitos atletas de elite podem se beneficiar do treinamento mental. Por exemplo, Ayrton Senna, piloto de Fórmula 1, era mestre em visualizar as corridas. Logo que chegava em um autódromo caminhava por toda a pista. Depois, no hotel, visualizava cada metro da pista, a forma de guiar, os trinta pontos de ultrapassagem, as freadas etc. Utilizava esse recurso, entre outros, na obtenção do sucesso. Todo treinamento mental deve estar de acordo com o treinamento físico e com suas necessidades. É preciso lembrar que este treino, como qualquer outro, para que seja eficaz, demanda tempo e disciplina na prática dos exercícios. A visualização/imaginação não é o único recurso de treinamento mental. Há outros recursos, entre os quais a meditação e a hipnose, que vêm se destacando no cenário esportivo profissional. Figura 48 – Representação simbólica do cérebro sob efeito de hipnose A hipnose é uma técnica de indução de transe (relaxamento semiconsciente), aplicada sem que o paciente perca o contato sensorial com o ambiente. Promove alterações da percepção sensorial e 109 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE de funções intelectuais superiores, ocasionando hiperamnésia e alteração da atenção e de funções motoras. Essa técnica foi desenvolvida e utilizada pelos russos há mais de cem anos, sendo bastante aplicada em soldados durante a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais. Embora seu uso seja questionável do ponto de vista ético‑moral, não implica diretamente violação das regras e dos códigos olímpicos. O estado de alteração da consciência estabelecido pela hipnose simula o sono, mas a pessoa não dorme quando hipnotizada. Como prova disso, o resultado do eletroencefalograma (EEG) de pessoas sob hipnose indicou estarem em estado de vigília, e não de sono. Não se sabe concretamente como a hipnose altera funções cerebrais, mas uma das teorias mais aceitas é a de que ela afete mecanismos da atenção, em uma região do cérebro denominada substância reticular ascendente (SRA), localizada na parte basal (tronco cerebral). Essa área é responsável por funções relativas ao sono, ao estado de vigília e pela percepção sensorial. É uma região continuamente bombardeada por estímulos provenientes dos órgãos dos sentidos, e sua inibição leva a estados de sonolência e de desligamento sensorial. Pode‑se afirmar que 90% das pessoas são suscetíveis à hipnose. As técnicas de hipnose aplicadas ao esporte têm por objetivo inserir “gatilhos” na mente subconsciente dos atletas, que serão automaticamente disparados em momentos predeterminados, nos quais a atividade a ser desempenhada deve ser executada. Tais técnicas consistem em conduzir a pessoa a um estado de relaxamento profundo, durante o qual os “gatilhos” são inseridos pelo profissional visando aos objetivos escolhidos pelo hipnotizado. Esse recurso pode melhorar a realização de atividades físicas e dietas, e também aumentar a concentração nos estudos. Ainda, as hipnoses de regressão podem contribuir para o desbloqueio de eventos negativos, causadores de sofrimento psíquico, transtornos ou desconfortos. Em muitas ocasiões a hipnose vem sendo usada não apenas como mero recurso coadjuvante ou complementar, mas como o principal instrumento no desenvolvimento de potenciais. O corpo responde a liberações de neurotransmissores que ocorre com base em pensamentos, e já foram descritas numerosas utilidades clínicas da hipnose para o melhoramento do desempenho de atletas. Essa técnica deve ser aplicada somente por hipnólogos, com o consentimento do atleta. Muitos psicólogos esportivos buscam formação e especialização em hipnose, sinal de ser esse mais um recurso de intervenção disponível no meio esportivo. A busca incessante pelo melhor desempenho tem gerado o aumento do número de recursos utilizados para esse fim, que certamente serão remodelados com o passar dos anos, vindo a originar outros, cada vez mais capazes de suprir as intensas demandas inerentes aos novos desafios do esporte. A relação entre tecnologia e limites do corpo humano é alvo de debates acadêmicos e empíricos no universo da psicologia esportiva, sendo absolutamente necessárioque o psicólogo esportivo esteja sempre informado sobre as normas legais adotadas pelas entidades desse setor e pelas organizações profissionais. 110 Unidade II 6 ÂMBITOS DE ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO DO ESPORTE 6.1 Atuando no âmbito escolar Figura 49 – Educação física escolar Como aplicar a psicologia do esporte na área escolar? Essa área de atuação do psicólogo esportivo, relativamente nova, nos coloca diante das seguintes questões: • Qual o real significado da educação física competitiva na comunidade escolar? • Qual o grau de interferência dessa prática no desenvolvimento do aluno? • Como agem e o que pensam os profissionais envolvidos com a questão? • Sendo um dos componentes curriculares nas escolas, a Educação Física tem atingido seus objetivos pedagógico‑educacionais? • Os componentes psicológicos e sociais largamente debatidos em nossos livros acadêmicos têm sido considerados na prática pedagógica? • As ideias apoiadas em valores sociais vêm sendo aplicadas? • Em que espaços vem sendo trabalhada a igualdade de aprender e de jogar? • A interação entre os alunos interfere no desempenho escolar e esportivo de cada um deles? • Para melhor contribuir com o bem‑estar físico e emocional dos alunos o psicólogo esportivo tem o direito de acessar o mundo de exercícios por eles realizados na escola e fora dela? 111 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE 6.1.1 A tríade da psicologia esportiva Para que estas e outras perguntas formuladas por psicólogos esportivos que atuam em âmbito escolar possam ser respondidas, convém recorrer a um conceito muito útil: o da tríade da psicologia esportiva, constituída pelo aluno, por sua família e sua escola. O ideal é que a tríade composta por esses três agentes interligados por objetivos comuns articule e harmonize ações para conquista do bom desempenho escolar. O triângulo que a representa tem o aluno ocupando o posto mais importante: o vértice superior desse triângulo; enquanto representantes da família e da escola ocupam os vértices inferiores, conforme ilustrado na figura a seguir. Compete ao psicólogo contribuir para que haja equilíbrio das forças presentes nessa interação humana. Aluno Família Escola Psicólogo do esporte Figura 50 – Tríade da psicologia esportiva em âmbito escolar Esse âmbito de atuação do psicólogo demanda saberes de psicologia educacional e escolar; psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem; e psicologia da personalidade, além de conhecimento dos processos de ensino. A relação estabelecida pelo psicólogo esportivo com os alunos, seus pais e professores lhe possibilita identificar a participação desses agentes socioeducacionais. Desprovido de tal conhecimento, o psicólogo esportivo terá reduzida a eficácia de sua ação e receberá pouco reconhecimento como profissional. Vemos, pois, que ele é chamado a atuar como mediador das interações aluno‑familiares‑professores, especialmente durante os jogos escolares (esportes e disciplinas associadas). Muito importante é reconhecer o que a escola entende por esporte: jogo‑festa, alegre e participativo? Recurso de interação social por meio de encontros de diversão, com o objetivo de estimular interações? Jogo de competição baseado em rendimento, técnicas e iniciação esportiva precoce? Por ocasião das competições o psicólogo do esporte favorecerá a reflexão de alunos, familiares e professores sobre as dificuldades encontradas para que haja participação crítica dos envolvidos com a prática esportiva competitiva. Há propostas pedagógicas que removem a competição de atividades 112 Unidade II nas quais ela é exigida. Tais propostas são questionáveis: elas seriam mesmo passíveis de aplicação e são recomendáveis? Omitir a competição em sociedades como a nossa, na qual a competição está no cerne de sua estrutura, não seria criar um ambiente artificial que contribuirá para provocar ou acentuar desajustes, marginalização e conflitos? Por outro lado, é certo que nós, educadores, não podemos antecipar no universo infantil responsabilidades, exigências, deveres e atitudes próprias do universo adulto. Por meio do esporte as crianças podem tornar‑se mais críticas, criativas e responsáveis e podem aprender a competir, a trabalhar em equipe, a respeitar o próximo e a lidar com vitórias e fracassos. É recomendável que o psicólogo esportivo escolar proponha atividades esportivas criativas, com os próprios alunos propondo as regras. Exemplo de aplicação A atuação do psicólogo esportivo ainda é muito tímida no âmbito escolar. Reflita sobre diferentes possibilidades de sua atuação na escola, seja nas atividades de extensão extraclasse, seja nas aulas de Educação Física. 6.2 Atuando no âmbito da recreação No âmbito da recreação, da prática de atividades físicas desenvolvidas em tempo livre por pessoas de diversas faixas etárias, o psicólogo esportivo busca compreender as pessoas e ajudá‑las a utilizar estratégias para melhorarem seu desempenho social e competitivo. Comumente um atleta se comporta de determinado modo em jogos de caráter profissional e de outro modo em jogos de caráter recreativo, e a observação dessas diferenças fornece informações importantes sobre o comportamento desse atleta em situações adversas. Informado desses aspectos de sua natureza, o atleta poderá reunir melhores condições para aprimoramento de sua performance. Observações relativas a comportamentos reveladores de egoísmo, tendência à dominação, preconceitos e discriminações, agressividade, empatia, apatia, timidez, extroversão, sociabilização, serão apresentadas ao atleta a título de feedback. Evidentemente, os parâmetros utilizados na análise de fatores pessoais de um atleta não são os mesmos utilizados na análise de fatores pessoais de participantes de atividades de recreação, por exemplo. A agressividade ou a apatia, por exemplo, têm distintos significados se manifestas em um jogo de lazer ou em um jogo profissional. Cabe lembrar que a análise de comportamentos não se restringe a um atleta ou grupo de atletas, e sim a todas as pessoas que interferem de um modo ou outro no processo de desenvolvimento físico e emocional de uma equipe, o que inclui análise socioeconômica e cultural. 6.3 Atuando no âmbito da reabilitação Acredita‑se que a cada ano milhões de adultos e crianças sofram lesões decorrentes da prática esportiva. Pessoas que apresentam mais estresse têm mais lesões relacionadas ao esporte e ao exercício. Segundo Weinberg e Gold (2006), embora fatores físicos sejam a causa primária de lesões esportivas, fatores psicológicos também podem contribuir para elas. Ao lidarem com limitações decorrentes de 113 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE lesões físicas, os profissionais de educação física consideram fatores psicológicos além dos físicos entre as causas das lesões e utilizam recursos de recuperação. Figura 51 – Lesão esportiva Para a recuperação de esportistas, é preciso considerar tanto os aspectos de reabilitação emocional – baixa autoestima, frustrações, medos e evitações, entre outros fatores emocionais – quanto a reabilitação física de lesões osteomusculares. Uma concepção holística de pessoa é fundamental para aplicações nesse âmbito de atuação. Diariamente muitos atletas são lesionados, e o psicólogo esportivo é chamado a atendê‑los. Por que ocorrem lesões? A literatura mostra que fatores de personalidade e níveis de estresse estão diretamente relacionados à incidência de lesões em atletas de alto nível e atletas amadores. Em relação aos fatores de personalidade, os pesquisadores buscam entender se traços como autoconceito, introversão, extroversão e inflexibilidade são significativamente relacionados com a ocorrência de lesões. Por exemplo: atletas com baixa autoestima apresentam maior número de lesões? Níveis elevados de estresse aumentam a incidência de lesões? O aumento do estresse reduz as taxas de atenção e concentração levando à execução de movimentos que podem causar novas lesões. Além disso, esses erros também podem sercometidos pelo excesso de repetições mal executadas ou mal planejadas durante os treinamentos e competições, situações nas quais o próprio estresse competitivo aumenta as chances de erro por exagero ou má execução. Atenção e concentração reduzidas, associadas ao aumento de tensão muscular, podem fazer com que o esportista lesionado considere a si mesmo como esportista destituído de valor. Isso ocasiona sentimentos e emoções semelhantes aos vivenciados por pessoas que enfrentam morte iminente. Em tais condições, praticantes de exercícios e atletas frequentemente experimentam forte sentimento de pesar, processado em cinco estágios: negação, raiva, negociação, depressão e reorganização. 114 Unidade II Embora nem todos os esportistas submetidos a tais circunstâncias passem por todos os cinco estágios e alguns nem sequer apresentem esse padrão hierárquico de respostas emocionais, convém considerar essa possibilidade. Outras reações psicológicas passíveis de ocorrer são as seguintes: perda de identidade, medo, ansiedade, falta de confiança e diminuição de desempenho. É preciso identificar o quadro de reações emocionais de um esportista em tais condições para lhe oferecer tratamento apropriado. Ivleva e Orlick (1991) desenvolveram um estudo sobre estratégias psicológicas de reabilitação de lesões. Compararam atletas de recuperação rápida de lesões no joelho e no tornozelo (menos de cinco semanas) com atletas que, sob as mesmas circunstâncias, haviam tido recuperação lenta (mais de 16 semanas). Os pesquisadores realizaram entrevistas que avaliaram atitude, perspectiva, estresse, controle do estresse, apoio social, diálogo interior positivo, visualização da cura, estabelecimento de metas e crenças. Verificaram que atletas com recuperação rápida usavam mais estratégias de estabelecimento de metas, diálogo interior positivo e (em menor grau) visualização da cura do que atletas de recuperação lenta. Isso sugere que fatores psicológicos desempenham papel importante na recuperação de lesões. Basicamente, o tratamento da lesão deve incluir recursos psicológicos para favorecer a cura e acelerar a recuperação. Atletas que confiam nas possibilidades de tratamento e recuperação alcançam resultados mais eficazes. Observação É responsabilidade do psicólogo do esporte adotar procedimentos apropriados: manter contato com a pessoa lesionada; instruí‑la sobre a lesão e o processo de recuperação; ajudá‑la a desenvolver habilidades psicológicas específicas de controle; orientá‑la sobre o modo de lidar com retrocessos; incentivá‑la a buscar apoio social e, acima de tudo, aprender com ela. 6.4 Atuando no âmbito de esportes de rendimento A atuação na área de esportes de rendimento demanda identificação de fatores externos e internos que interferem diretamente na performance e no desempenho do atleta e/ou da equipe. A avaliação de fatores externos – condições institucionais e grupais, valores ético‑morais da cultura institucional – e de fatores internos – características pessoais do atleta – demandam do psicólogo esportivo um estudo cuidadoso para definição de um processo de preparo para o enfrentamento de situações de estresse nos treinamentos, durante as competições e fora delas. Para melhor compreensão dessa dinâmica, convém retomarmos o conceito de tríade da psicologia esportiva, desta vez situando no ápice da pirâmide o atleta e, na base, seus familiares e amigos, o treinador e a instituição que o abriga. Observemos a figura apresentada a seguir. 115 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Aluno Família Instituição Psicólogo do esporte Figura 52 – Tríade da psicologia esportiva no âmbito de esportes de rendimento É preciso que o psicólogo esteja preparado para harmonizar as forças advindas dos três vértices da tríade, e isto não é tarefa fácil, pois sempre há interferência de múltiplas fontes promotoras de desestabilização emocional, durante todo o processo evolutivo de equilíbrio emocional. Esses fatores de desequilíbrio acham‑se representados na figura a seguir. Aluno Família Promessas Salá rio $ Compromisso Patr ocin ador $$$ Dirig ente s Instituição Psicólogo do esporte Incongruência de ideias Figura 53 – Tríade da psicologia esportiva – dinâmica de forças no âmbito dos esportes de rendimento Além dos fatores representados na figura, todos presentes no cotidiano de atletas de alto rendimento, há muitos outros, o que demanda do psicólogo um detalhado conhecimento de todas as forças atuantes sobre o atleta. A obtenção desse conhecimento exige um grau de confiança mútua entre atleta e 116 Unidade II psicólogo esportivo que leva tempo para ser estabelecida e somente se estabelece se houver empatia entre ambos e se ambos estiverem disponíveis para o diálogo. A frequência e os motivos dos encontros dessa díade favorecem, dificultam ou impedem a formação do necessário vínculo que tornará eficaz a ação do psicólogo. Um fato que poderá dificultar a formação de vínculo é o relativo à frequente troca de atletas nos clubes e mesmo nos países. E outro fato importante a ser considerado é que o psicólogo não atua sozinho: ele integra uma equipe multidisciplinar, sendo preciso que compartilhe informações com os demais integrantes da equipe para que haja uma melhor consistência no trabalho a ser desenvolvido. Evidentemente, por motivos éticos, nem todas as informações obtidas podem ser compartilhadas, o que exige do psicólogo discernimento suficiente para triar o que pode e deve compartilhar e reservar para si informações a ele confiadas e que não podem nem devem ser compartilhadas. Psicólogos bem formados sabem que toda avaliação – de habilidades motoras, de aptidões físicas e cognitivas, de aspectos emocionais – está sujeita a erros, por isso cuidam para realizá‑la com boa margem de segurança, visando a uma aplicabilidade o mais fidedigna possível. Reconhecidas as próprias limitações como avaliador e o fato de que as pessoas adotam muitas vezes um estilo de resposta conhecido como “falso bom”, o psicólogo bem formado tratará de lidar com essas variáveis. Por exemplo: um atleta, temendo que seu técnico saiba o quanto ele fica nervoso antes das competições, ao ser submetido a testes de ansiedade anteriores à competição responde falsamente para parecer calmo, frio e imperturbável. Algumas regras desse tipo de intervenção psicológica são simples: • buscar conhecer e compreender cada atleta individualmente; • estabelecer diálogo autêntico com os atletas e com demais integrantes da equipe multiprofissional; • não se basear exclusivamente em resultados de testes; • respeitar a ética profissional de psicólogos, mantendo sigilo relativo a aspectos que não devem ser compartilhados; • fornecer à equipe todas as informações passíveis de serem compartilhadas; • realizar atendimentos individuais e grupais. De modo geral, concluída a avaliação do atleta, que certamente inclui dados sobre atenção, percepção e concentração, os psicólogos do esporte definem estratégias para a conquista de alto desempenho. Entre as principais estratégias se incluem as seguintes: • Utilizar planos específicos para aumento da autoconfiança, preparando o atleta para lidar com adversidades que possam surgir durante a competição. 117 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE • Implementar rotinas geradoras de condições para lidar com circunstâncias incomuns e evitar distrações antes e durante as competições e para se manter concentrado no que é exigido como desempenho imediato, bloqueando eventos e pensamentos irrelevantes. • Implementar as seguintes rotinas: — antes da competição, repetir afirmações positivas, autossugestivas; — concentrar‑se no que é controlável, sem se preocupar com os outros competidores; — desenvolver detalhados planos de competição; — regular a própria ansiedade. Saiba mais Os livros e textos a seguir podem ajudar na compreensão do conteúdo apresentado até o momento: BARRETO, J. A. Psicologia do esporte para o atleta de alto rendimento. Riode Janeiro: Shape, 2003. CANTÓN, E. El área profesional de la psicología del deporte. In: DOSIL, J. D. (ed.). El psicólogo del deporte: asesoramiento e intervención. Madri: Síntesis, 2007. DOSIL, J. D. (ed.). El psicólogo del deporte: asesoramiento e intervención. Madri: Síntesis, 2007. p. 39‑50. Disponível em: https://pt.scribd.com/ document/395499970/El‑Psicologo‑del‑Deporte‑Asesoramiento‑e‑ Intervencion‑Joaquin‑Dosil‑pdf. Acesso em: 22 jul. 2020. WEINBERG, R.; GOULD, D. Fundamentos da psicologia aplicada ao exercício e ao esporte. Porto Alegre: Artmed, 2006. 6.5 Atuando na atenção básica em saúde Desde sua criação pelo Ministério da Saúde, em 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) foi implantada no Sistema Único de Saúde (SUS) com o objetivo de implementar tratamentos alternativos à medicina baseada em evidências na rede de saúde pública do Brasil, através do SUS. 118 Unidade II A ampliação de ofertas conduziu ao atual conjunto de 29 modalidades de práticas integrativas e complementares, entre as quais as seguintes: • arteterapia; • biodança; • dança circular; • dança sênior; • dinâmica energética do psiquismo; • fitoterapia e plantas medicinais; • homeopatia; • hortas comunitárias; • medicina antroposófica, que inclui a prática de euritmia; • medicina tradicional chinesa (que inclui acupuntura, meditação e práticas corporais, como o tai chi chuan); • medicina tradicional indiana (ayurveda); • musicoterapia; • naturopatia; • oficina de memória; • osteopatia; • quiropraxia; • reiki; • relaxamento; • shantala; • teatro do oprimido; 119 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE • terapia comunitária; • terapia de florais; • termalismo; • ioga. Figura 54 – Meditação Solicitado a nos oferecer uma descrição sucinta da meditação, Hernan Maximilian Rolim de Vilar, psicólogo clínico, mestre em Ciência da Religião e monge budista, em informação verbal fornecida em 30 de maio de 2020, contribuiu com as informações apresentadas a seguir. Segundo Goleman e Davidson (2017, p. 14), “meditação é uma palavra abrangente para uma miríade de variedades da prática contemplativa, assim como esporte se refere a uma ampla gama de atividades atléticas”. Cebolla, Campayo e Demarzo (2016, p.19) correlacionam meditação com o termo inglês mindfulness, comumente traduzido por “atenção plena”, e apresentam a seguinte definição: “Mindfulness é o traço ou estado mental de estar intencionalmente atento à experiência presente”. Uma condição para sua prática é aceitar os acontecimentos sem julgamento de valor sobre o que ocorre. Referindo‑se à compreensão do psiquismo, Ricard e Singer (2018) contrapõem ao conhecimento gerado no ocidente pela psicologia o conhecimento gerado no oriente pelo budismo. No ocidente, fatos marcantes foram a criação de um laboratório de estudos da consciência por William James, em 1875, e a busca de compreensão do psiquismo e de fenômenos da consciência característica da terceira força da psicologia, inaugurada em 1962, por Abraham Maslow. Como vemos, o conhecimento teórico desse tema, construído pela psicologia no ocidente, data, quando muito, de menos de 200 anos, enquanto o conhecimento empírico construído pelo budismo no oriente data de 2500 anos. 120 Unidade II No budismo encontramos métodos práticos para “realizar uma transformação gradual das emoções, do temperamento e dos traços de personalidade”: a mente devidamente treinada é capaz de fazer emergir o que há de melhor no potencial humano – “capacidades humanas inatas permanecem em estado latente a menos que façamos alguma coisa para levá‑las ao ponto de funcionamento ótimo” (RICARD; SINGER, 2018, p. 13‑14). Segundo Campayo e Demarzo (2015, p. 20), mindfulness é um exercício da atenção que pode ser aprendido e praticado por meio de técnicas que nos possibilitem: • evitar a distração e a atenção multifocal; • permanecer centrados no presente, deixando fora de foco eventos passados ou futuros; • exercitar a intencionalidade, isto é, praticarmos nossa volição; • assumir uma atitude ativa de curiosidade perante a experiência vivida no agora, em detrimento de uma atitude passiva ou resignada; • manter essa qualidade de atenção por período de tempo suficiente para que ela se transforme em concentração; • perceber fenômenos por meio das emoções e de outros recursos mentais, além do meio utilizado usualmente: o da percepção sensorial; • (re)conhecer a verdadeira “realidade dos fenômenos”. Estudos sobre a utilização do mindfulness na área da saúde em geral e da saúde mental em particular demonstraram haver distintos resultados tanto no tratamento de dor crônica e no controle da intensidade da dor, quanto no atendimento a casos psiquiátricos de depressão e ansiedade e nos casos de perda de funções psicossociais e de qualidade de vida. Intervenções baseadas em mindfulness para o tratamento de dor crônica apresentaram‑se moderadamente eficazes com resultados positivos a longo prazo (VEEHOF et al., 2015). Estas informações fornecidas por Vilar nos levam a concluir que mindfulness é recurso de grande utilidade, tanto para psicólogos do esporte e profissionais de educação física quanto para os usuários de seus serviços, seja na área da educação, seja na área da saúde. No Brasil essa prática integra a PNPIC no SUS. Também vêm sendo incluídas entre as práticas integrativas e complementares algumas atividades realizadas em grupo para acompanhamento complementar à saúde: grupos de bordadeiras; de caminhadas; de cuidadores de Alzheimer; de idosos; de prosa com mulheres; de terapia e arte; de contação de histórias; de suporte mútuo. Oração a Deus e busca de benzedeiras também são apontadas como estratégias popularmente utilizadas para o autocuidado. 121 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Basta percorrer essa lista para facilmente identificar práticas que podem ser conduzidas por profissionais de educação física, integrados ou não a equipes interdisciplinares. Todo profissional da saúde pode trabalhar com práticas integrativas e complementares no SUS, o que inclui profissionais de educação física e psicólogos do esporte. Inserir‑se nesse âmbito de ação é participar de um projeto coletivo que visa atender às seguintes necessidades: • ausência de efeitos colaterais; • empoderamento e responsabilização dos usuários; • promoção de saúde; • redução da frequência de transtornos mentais comuns, da medicalização e de custos para os usuários do SUS. Convém enfatizar que por ocasião do surgimento do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) no SUS os profissionais de educação física foram inseridos no serviço de atenção básica. Ao criar a Política Nacional de Promoção da Saúde, o Ministério da Saúde definiu como um dos eixos prioritários o incentivo a práticas corporais e atividades físicas, indispensáveis para a promoção da saúde e para a prevenção e controle de doenças crônicas, especialmente as cardiovasculares. Profissionais de educação física e psicólogos do esporte são especialmente necessários nas esquipes interdisciplinares que atuam nas estratégias de saúde da família (ESF). Observação Para ampliar conhecimentos sobre este fértil e promissor campo de atuação sugerimos o acesso ao sistema Google Acadêmico para consulta de artigos publicados sobre o tema. A título de exemplo, apresentamos uma prática incluída entre as práticas integrativas e complementares: a euritmia, modalidade de dança baseada no conhecimento antroposófico de ser humano. Na euritmia os movimentos são coreografias realizadas por um indivíduo ou por um grupo ao som de música instrumental produzida ao vivo (KIRCHNER‑BOCKHOLT, 2016). Figura 55 – Espetáculos de euritmia 122 Unidade II A euritmia é uma modalidade de dança que vem sendo desenvolvida desde 1912, com base na antroposofia. Seus movimentos são coreografias realizadas individualmente ou em grupo, para expressar música instrumental tocada ao vivo e/ou linguagem poética. A palavra euritmiavem do grego eurythmia, que significa equilíbrio de forças. Utilizada em processos educacionais e terapêuticos, essa modalidade de dança visa dinamizar forças atuantes no corpo humano. Saiba mais Para mais informações sobre euritmia, sugerimos a seguinte leitura: SOCIEDADE ANTROPOSÓFICA NO BRASIL. O que é euritmia. 2016. Disponível em: http://www.sab.org.br/portal/euritmia/91‑euritmia. Acesso em: 23 jul. 2020. E para mais informações sobre meditação, prática igualmente incluída entre as práticas integrativas e complementares, sugerimos o seguinte vídeo com explicações sobre o “mecanismo” da meditação, de Tatiane Vasconcelos (médica psiquiatra) e Hernan Maximilian Rolim de Vilar (monge budista, psicólogo clínico e mestre em Ciência da Religião): VASCONCELOS, T.; VILAR, H. Meditação e ansiedade. Cuidadamente, [s.d.]. Disponível em: https://youtu.be/RvJ7HXNoizw. Acesso em: 23 jul. 2020. 7 PRÉ‑REQUISITOS PARA ATUAR EM GRUPOS E EQUIPES 7.1 Conhecimentos básicos de estrutura e dinâmica de grupos 7.1.1 Tópicos de psicologia social Figura 56 – Indivíduos em interação 123 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE A psicologia social é o ramo da psicologia que estuda, basicamente, o comportamento dos indivíduos quando estão em interações sociais. Essa área da psicologia surgiu recentemente, no século XX, como campo de interação da psicologia com as ciências sociais – sociologia, antropologia, geografia, história, ciência política. Por exemplo, da interação da psicologia com a etnologia (ramo da antropologia) resultou a etnopsicologia, que considera os aspectos sociais, históricos e culturais dos fenômenos psicológicos. Ao realizar um balanço do estado atual da psicologia social, nos âmbitos nacional e internacional, Maria Cristina Ferreira (2010) registra sua evolução na América do Norte, na Europa e na América Latina, na qual particulariza a recente produção brasileira. Vimos que, ao longo da história da psicologia, houve grande pluralidade e multiplicidade de abordagens teóricas. O mesmo ocorreu no âmbito de cada área específica dessa ciência, e com a psicologia social não teria sido diferente. Os estudos e pesquisas foram reunidos em dois grandes conjuntos, um dos quais reúne aqueles cuja ênfase recai nos indivíduos e outro cuja ênfase recai na relação estabelecida entre indivíduos. Dessa classificação resultam duas modalidades de psicologia social: • Psicologia social psicológica. • Psicologia social sociológica. Vejamos melhor o que significa isso. A psicologia social psicológica privilegia a vida intrapsíquica do indivíduo: seus pensamentos, sentimentos e comportamentos quando ele se encontra diante da presença real (ou imaginada) de outras pessoas. Em outras palavras, a psicologia social psicológica enfatiza aquilo que se passa na interioridade dos indivíduos, seus processos intraindividuais que determinam o modo pelo qual eles respondem a estímulos sociais. A psicologia social sociológica, por sua vez, privilegia a experiência social adquirida pelo indivíduo ao longo de suas diversas participações em diferentes grupos sociais. Em outras palavras, a psicologia social sociológica enfatiza os fenômenos observáveis em grupos e coletividades. Entre os principais temas de estudo da psicologia social, estão incluídos os seguintes: atitudes, relações entre funções cerebrais e cognição social (neurociência social), processos coletivos que ocorrem em grupos de todos os portes, desde os processos próprios de relações interpessoais que envolvem somente dois participantes; processos próprios dos grupos, instituições e comunidades; até atingir os processos próprios das redes sociais, sejam elas presenciais ou virtuais. O que o campo da psicologia social pode oferecer de melhor aos profissionais de educação física? Parece‑nos que, dessa área da psicologia, o mais útil para você, querido aluno, é a aquisição de alguns conhecimentos sobre estrutura e dinâmica de grupos. O estudo de grupos é indispensável a profissionais que integram ou muito possivelmente virão a integrar equipes multi e interdisciplinares de trabalho e àqueles que trabalharão junto a grupos. 124 Unidade II Ao tratarmos de particularidades da estrutura e dinâmica dos grupos, ingressamos em vasto território da psicologia, pois, havendo uma multiplicidade de abordagens teóricas, das quais decorrem distintas sugestões práticas, nós, autores deste livro‑texto, nos vemos obrigados, mais uma vez, a eleger temas cujo estudo possa ser útil a você. Para darmos andamento à abordagem desse tema, vamos recorrer mais uma vez ao já mencionado Enade Psicologia: material instrucional específico, produzido pela UNIP. Nesse material, vemos que sociólogos e psicólogos elaboraram muitas definições de grupo, uma das quais de uso frequente: basicamente, grupo é um conjunto de pessoas que desempenham distintos papéis para que possam atingir, juntas, um ou mais objetivos comuns. Cada grupo é um todo dinâmico, é como um organismo coletivo, de modo que qualquer alteração em algum de seus elementos repercute nos demais elementos e no sistema como um todo. Além disso, num grupo bem conduzido, a produção coletiva é sempre maior e melhor que a soma das produções individuais de seus membros. Durante a convivência e a realização de trabalhos em conjunto, vão se sucedendo processos grupais, e essa dinâmica psicossocial proporciona aos integrantes do grupo o compartilhamento de representações, de crenças e de conhecimentos; o desempenho de múltiplos papéis e o sentimento de pertença grupal. Esses benefícios do grupo podem favorecer o desenvolvimento, o autoconhecimento e a elevação da autoestima de seus integrantes. Diversas modalidades de intervenção grupal compõem o repertório de profissionais da saúde, da educação, de organizações de trabalho, de sistemas jurídicos, de instituições e de comunidades. Múltiplas estratégias de análise e de intervenção nos processos grupais são tradicionalmente utilizadas por coordenadores, facilitadores e moderadores de grupo para adequar os indivíduos a interesses corporativos ou para favorecer exercícios cooperativos de ação grupal, quando se tem em vista a promoção da autonomia de sujeitos e de coletividades. O trabalho grupal demanda compatibilidade entre as condições do contexto, os objetivos da estratégia adotada e as necessidades dos participantes do grupo. Figura 57 – Unidade na diversidade 125 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE Assim, da vasta diversidade de estratégias grupais utilizáveis em distintos contextos profissionais, é preciso que a escolha dos procedimentos a serem adotados se apoie em uma cuidadosa avaliação da situação e dos objetivos da intervenção, para que se possa escolher o tipo de intervenção mais adequado aos objetivos e demandas do grupo e à necessidade dos indivíduos que o compõem. Há diversas modalidades de grupo. Entre elas, é de nosso particular interesse neste contexto o grupo operativo, proposto por Enrique Pichón‑Rivière (1977, p. 42) e por ele definido como um “conjunto de pessoas reunidas por constantes de tempo e espaço, articuladas por sua mútua representação interna, que se propõe, implícita ou explicitamente, uma tarefa, que constitui a finalidade do grupo”. Os grupos operativos têm por objetivo a realização de uma tarefa. Lembrete Para situarmos a contribuição de Enrique Pichón‑Rivière em seu contexto teórico, podemos retornar à Introdução, onde apresentamos o panorama histórico da psicologia e as principais áreas de atuação dos psicólogos. Eduardo Frias (2020) nos lembra que Pichón‑Rivière descreve o sujeito como emergente de uma trama complexa de relações sociais em que ocorrem internalizações recíprocas (vínculos) e relações sociais (nexos). Este autor também descreve o indivíduo como um ser que se movimenta em um drama interno enquanto participa de vários dramas externos. E, baseado em seus conhecimentos de psicanálise, Pichón‑Rivière explica que as pessoas com quem um indivíduo se relaciona se inscrevemem sua interioridade, por meio de um progressivo processo de internalização das múltiplas e sucessivas experiências vividas nessas interações. Múltiplas imagens, originadas de múltiplos objetos internalizados, se articulam na subjetividade do indivíduo, sistema interno que compreende habitat e grupo interno, isto é, compreende um cenário e, nele, personagens em relação, segundo um script ou argumento, como numa obra teatral. Composto Como antropófago Faço de pedaços das pessoas que amo e odeio Partes de mim mesmo. E_FR!@s Fonte: Frias (2013). Foi possível entender esse conceito de Pichón‑Rivière? Para tornar mais inteligível sua maneira de compreender o indivíduo colocado em relação social, basta considerarmos que cada um de nós representa vários papéis sociais ao interagir com outras pessoas: cada um de nós é filho; pai ou mãe; trabalhador em determinado lugar, exercendo determinadas funções; amigo; comprador; vendedor, e assim por diante. Essas interações podem ser entendidas como se cada um de nós, sem perda da própria unidade identitária, estivéssemos representando diversos papéis nos palcos de teatro determinados por cada contexto. 126 Unidade II Pichón‑Rivière vai além ao propor que nossa interioridade é habitada por personagens em interação, havendo contínua comunicação entre os dramas vividos por esses personagens internos e os dramas vividos por nós em nossas interações sociais. Figura 58 – Estabelecendo nexos Às relações significativas estabelecidas entre os seres que habitam nossa interioridade Pichón‑Rivière dá o nome de nexos, e às relações significativas por nós estabelecidas com outras pessoas em nosso dia a dia dá o nome de vínculos. O fato de os personagens internos não serem estáticos e de interagirem justifica a denominação grupo interno. Graças a um complexo dinamismo de introjeção e projeção de imagens, no cenário interno, a realidade externa é reconstruída, com maior ou menor grau de distorção, já que o sujeito transforma dados da realidade externa ao interpretar a experiência: configura‑se, assim, a trama argumental interna (argumento interno). Estando em grupo, as pessoas compartilham tempo, lugar e campo psicológico. Formam vínculos, manifestam emoções, têm vivências, expressam ideias e ideais. Os integrantes de um grupo interagem por meio de um complexo mecanismo de atribuição e assunção de papéis. A mútua representação interna (internalização recíproca) é o processo por meio do qual cada integrante de um grupo reconstrói em sua interioridade a trama de relações de que participa no meio social. Para lidar com obstáculos e dificuldades próprias de nossa vida cotidiana, é preciso, entre outras coisas, superar obstáculos e dificuldades nas relações que nossos personagens internos estabelecem entre si. Esse trabalho a ser realizado na esfera subjetiva de cada um de nós é pré‑requisito para podermos lidar de modo eficiente e eficaz com o que ocorre externamente, em nossas relações sociais. Assim, para lidar com obstáculos e dificuldades próprias de nosso fazer profissional, é preciso que, além dos recursos teórico‑técnicos propostos por Pichón‑Rivière e outros pensadores da psicologia, possamos superar nossa dificuldade para lidar com determinadas questões. Pode ocorrer, por exemplo, que a educação que recebemos nos tenha levado a sentir antipatia, medo ou 127 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE aversão por pessoas diferentes de nós. Diferentes por pertencerem a outra classe social, ou a outro segmento étnico‑racial, ou por terem orientação de gênero distinta daquela que consideramos a única correta ou, ainda, por serem pessoas velhas, gordas, portadoras de algum tipo de deficiência, por estarem morrendo, e assim por diante. Estereótipos negativos e preconceitos sempre têm raízes profundamente arraigadas em nós, demandando revisão. E eis que em nossa prática profissional nos vemos diante da necessidade de interagir com pessoas que, em nossa interioridade, em nosso cenário interno, são representadas como aversivas ou desprezíveis ou aterrorizantes. Lembrete A percepção de si é tarefa exigente a ser realizada na subjetividade de um profissional da educação física, de um psicólogo e de qualquer profissional chamado a oferecer cuidados a alguém. Quanto ao desenvolvimento de grupos de trabalho, quer utilizemos a técnica de grupos operativos, quer utilizemos outra, vale fazer algumas observações. A vida de grupos e de equipes de trabalho se desenvolve em conformidade com as seguintes etapas: • formação; • conflito; • normatização; • desempenho; • desintegração. Figura 59 – Para interagir em grupo é preciso compartilhar um código linguístico comum 128 Unidade II As etapas do processo grupal nem sempre obedecem exatamente à sequência enunciada, porque podem ocorrer retornos às etapas anteriores antes do avanço para etapas seguintes. O conhecimento das etapas dos processos grupais nos dá a conhecer que os períodos de turbulência fazem parte desses processos. Para melhor entendimento, as etapas de formação, conflito, normatização, desempenho e desintegração de uma equipe de trabalho acham‑se descritas a seguir. Durante a etapa de formação têm início os contatos interpessoais e o reconhecimento mútuo dos integrantes do grupo. Nessa etapa, o objetivo coletivo é identificado e são estabelecidas as regras de tempo, lugar, papéis e funções. Durante essa etapa da vida grupal não ocorrem disputas pelo poder no interior da equipe, pois os indivíduos ainda se locomovem em meio às incertezas relativas às responsabilidades, aos papéis de cada um e ainda não reconhecem a si mesmos como membros do grupo. Durante a etapa de conflito, nitidamente marcada pela incerteza, os membros do grupo já estão identificados. Tem início então o processo de ajustes relativos às tarefas que serão realizadas, a decisão de quem fará o que, e de que maneira. Durante essas negociações, os integrantes do grupo podem redefinir regras. As lideranças começam a emergir, o que poderá determinar a ocorrência de disputa pelo poder de condução do grupo, e pequenos poderes começam a ser divididos e disputados entre os membros. Isso não implica, necessariamente, litígios, pois, apesar de serem esperadas discordâncias, as negociações podem ocorrer sem hostilidades. Durante a etapa de normatização, a energia da equipe se concentra nos processos de coesão grupal, de identificação dos membros do grupo e de maior proximidade entre eles. Também têm início o compartilhamento de sentimentos e percepções e o intercâmbio de informações. Aumenta a tolerância frente às divergências. A concordância explícita com os objetivos do grupo se inclui entre as características desta etapa. As lideranças, já aceitas, definem junto com os integrantes do grupo papéis e funções, bem como normas de desempenho. Durante a etapa de desempenho, as tarefas são executadas. Já ultrapassada a etapa de normatização, durante a qual foram estabelecidas relações mais próximas, foram compartilhados percepções e sentimentos, bem como houve aumento da coesão grupal, a energia do grupo se volta agora para a realização de atividades. Ainda que possa haver oscilações ao longo do percurso, esta é a fase de ouro da produtividade grupal. A desintegração é a última etapa do processo grupal. Tendo sido atingidos os objetivos do grupo, sua existência passa a ser desnecessária. É importante assinalar que, nas equipes permanentes de trabalho, durante essa etapa pode ocorrer a renovação de metas e de recursos, bem como a substituição de membros. Nem todo grupo é operativo. Outra modalidade de grupo bastante frequente é o grupo de encontro, no qual os fatores socioafetivos predominam sobre os fatores sócio‑operativos. De fato, há trocas socioafetivas nos grupos operativos, assim como há tarefas a serem realizadas nos grupos 129 PSICOLOGIA APLICADA AO ESPORTE de encontro, sendo a principal delas o encontro humano. Mas, sem dúvida alguma, as equipes são grupos operativos inseridos
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