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Psicomotricidade 
Educação especial e inclusão social 
 
"Educar é construir, é libertar o ser humano das cadeias do 
determinismo ...". (Paulo Freire) 
 
 
 
Circulação Interna 
 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
0 
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O “diferente” foi sempre visto ao longo da história como um sujeito que devia ser enquadrado ou 
normalizado. Seu corpo e seus comportamentos foram sempre motivo de discriminação, rejeição ou 
abandono. Entretanto, desde a Declaração de Salamanca, discutimos espaços e formas de inclusão dos 
“diferentes". 
A Psicomotricidade - cujas bases em sua origem são profundamente reeducativas - surgiu focando 
sua atenção nas técnicas disciplinadoras de movimento, da percepção e da organização espaço-temporal, 
entre outras. Com esse olhar, marcou o imaginário social como representação de uma ciência cujo 
objetivo era desenvolver ações pela via do treinamento e das metodologias comportamentais durante um 
certo período. 
Com a crescente complexidade das teorias cognitivas, das neurociências e das teorias da 
afetividade (consciente e inconsciente), principalmente, passou-se a discutir mais objetivamente a 
integração dessas funções na formação do sujeito e da sua corporeidade. Assim foi possível construir um 
renascimento da psicomotricidade, ultrapassando os modelos reducionistas associacionistas e de 
treinamento de habilidades. 
Acreditamos que nenhuma disciplina se ocupe tanto dessas questões quanto a psicomotricidade, 
cuja influência na construção da subjetividade e da corporeidade vem sendo, cada vez mais, discutida de 
forma interdisciplinar e transdisciplinar. 
Particularmente, consideramos relevante no campo psicomotor o estudo da interação entre a 
imagem e o esquema corporal. Trata-se de conceitos e objetos precisos da psicomotricidade, cada vez 
mais discutidos na contemporaneidade. Poderíamos mesmo afirmar que a psicomotricidade é, provavel-
mente, a ciência mais sintonizada com os desafios impostos pela pós-modernidade, ou como alguns 
preferem, modernidade contemporânea. 
Quando as disciplinas e seus mestres não dialogavam interdisciplinarmente e 
transdisciplinarmente, os nossos mestres já o faziam, em especial Henri Wallon, Paul Schilder e 
Ajuriaguerra. E isso ainda na primeira metade do século XX. E esse olhar tem nos servido como guia. 
Os trabalhos aqui apresentados marcam a originalidade e o esforço de profissionais que buscaram 
nas discussões mais atuais sobre educação especial, inclusão social e psicomotricidade fugir de velhos 
paradigmas e apostar no sujeito que está presente, naqueles que sofrem com a discriminação ou o 
abandono, familiar ou social. Foi nesse sentido que propusemos um desafio aos autores: apresentar 
alternativas psicomotoras incorporadas às novas demandas sociais. 
Como definição de psicomotricidade, podemos descrever a adotada pela Sociedade Brasileira de 
Psicomotricidade, que afirma ser “a ciência que tem como objeto de estudo o homem mediante seu corpo 
em movimento e em relação ao seu mundo interno e externo. Está relacionada ao processo de maturação, 
no qual o corpo é a origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. É sustentada por três 
conhecimentos básicos: o movimento, o intelecto e o afeto. Psicomotricidade, portanto, é um termo 
empregado para uma concepção de movimento organizado e integrado, conforme as experiências vividas 
pelo sujeito cujo ação é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização." 
(www.psicomotricidade.com.br) 
Os próprios conceitos de educação especial e inclusão social são produtos de muitas discussões. 
Como os estudantes terão oportunidade de estudar nestes artigos, as fronteiras desses campos nem sempre 
são tão precisas e bem definidas. Elas interagem, tocam-se, em uma busca incessante para encontrar 
outras saídas a todos que se encontram envolvidos com novas perspectivas indusivas: os sujeitos 
propriamente ditos, suas famílias, os profissionais de saúde e de educação, as instituições, como um todo, 
as políticas de saúde pública e os estudantes desse vastíssimo campo. 
 
 
 
 
Prefácio 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
1 
http://www.psicomotricidade.com.br/
Biblioteca online - sem valor comercial, proibida a reprodução e venda 
 
 
Educação e Saúde são áreas indissociáveis no atendimento a pessoas com necessidades especiais, 
sobretudo os portadores de deficiências ou demais condições orgânicas que afetam a aprendizagem e o 
desenvolvimento global. A articulação e a complementaridade das ações dessas duas áreas são premissas 
básicas para o desenvolvimento global e a promoção da qualidade de vida desses indivíduos. No entanto, 
na prática cotidiana, observa-se de modo geral pouca integração entre os profissionais da saúde, de um 
lado, e os professores e os demais profissionais da educação, de outro. 
A ausência de diálogo entre a saúde e a educação é sentida intensivamente em termos sistêmicos 
na formulação das políticas e ações governamentais de atenção à pessoa com deficiência, que, em nosso 
país se apresentam muitas vezes desconectadas, replicadas, ou até mesmo superpostas. Esse 
distanciamento também se faz presente na disponibilidade e na organização da prestação de serviços 
terapêuticos e educacionais. Mesmo considerando que o atendimento a pessoas com necessidades 
especiais, na maioria dos casos, envolve diferentes especialistas, nem sempre esses profissionais atuam de 
forma integrada. Em outras palavras, embora o trabalho com essa clientela seja por princípio de natureza 
multidisciplinar, verifica-se com frequência uma fragmentação de serviços, em que cada profissional 
considera sua área prioritária, até quando atuam no mesmo espaço institucional. A mesma situação ocorre 
na esfera da formação profissional acadêmica, uma vez que, na grande maioria das universidades 
brasileiras, via de regra, não há troca de saberes e experiências entre os diferentes cursos. Isso é muito 
grave, pois significa que haverá pouca oportunidade de mudança desse quadro a curto ou médio prazo, já 
que os futuros profissionais continuarão a se formar com uma postura fragmentada e 
“superespecializada”. 
A primeira parte deste módulo envolve textos de natureza mais teórica, que trazem subsídios para 
a compreensão do que é psicomotricidade, e como essa proposta se insere na perspectiva da educação 
especial e inclusiva. Alguns capítulos desse conjunto enfatizam a importância de intervenção precoce, 
enquanto outros se detêm mais no aspecto da inclusão social, aprofundando a discussão sobre o 
significado do que é ser um indivíduo portador de deficiência, bem como as marcas do estigma que esse 
diagnóstico invariavelmente confere. A imagem e o esquema corporal de pessoas com deficiências, 
aspectos fundamentais do trabalho com a psicomotricidade, também são alvos de aprofundamento nesse 
primeiro grupo de textos. A segunda parte volta-se mais para as práticas terapêuticas e educacionais e, 
nesse momento, podemos apreciar a experiência daqueles que desenvolvem propostas inovadoras e atuais 
para o trabalho com essa população, ao focalizar o sujeito, e não sua deficiência. Considero essa pers-
pectiva da maior importância, visto que geralmente as discussões acadêmicas ficam restritas a questões 
teórico-conceituais, e pouco se transmite sobre o modelo como efetivamente se deve trabalhar com essa 
clientela.Entre os temas abordados, destacam-se os relatos de experiências com indivíduos portadores de 
diferentes necessidades especiais, tais como: deficiência visual, surdez, deficiência mental, autismo, 
paralisia cerebral e outras síndromes, as quais se reportam a propostas de psicomotricidadee estimulação 
precoce, educação física, atividades aquáticas, bem como trabalhos voltados para as artes cênicas, teatro e 
dança. 
Se apresentam tanto as modalidades clínicas, o acompanhamento terapêutico e a atenção 
primordial como sua aplicação em nível escolar. Nesse contexto, também se destacam discussões sobre 
inteligência e criatividade, sobre o espaço corporal, afetivo e social, e ainda a questão tão desafiadora para 
a atualidade que é o fracasso escolar, e como a psicomotricidade pode interferir nesse processo. A 
existência de uma equipe multidiscíplinar ou multiprofissional em uma instituição ou centro de 
atendimento não garante necessariamente que o trabalho desenvolvido seja integrado ou interdisciplinar. 
Pois não basta que um grupo de profissionais se reúna para discutir um caso, em que cada um apresenta 
sua visão e o tipo de atendimento a ser prestado ao cliente. Para que se possa causar um impacto real no 
desenvolvimento do indivíduo, é preciso que, a partir dos diferentes olhares e avaliações sobre o caso, se 
trace uma estratégia de atendimento integrada e se estabeleçam conjuntamente as prioridades terapêuticas 
e educacionais. 
Apresentação 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
2 
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Capítulo I 
Deficiência e Eficiência: Quem é o Sujeito? .... ............................................................................ 
Atividade de síntese............................................................................................................. 
 
Capítulo II 
A Imagem e o Esquema Corporal do Sujeito com Necessidades Especiais .......................... ........ 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo III 
Tendências Futuras da Educação Inclusiva .... .............................................................................. 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo IV 
Psicomotricidade e Deficiência Visual: Estimulação Precoce .. ................................................... 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo V 
Uma Experiência com Crianças Surdas ................................................................................ ........ 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo VI 
Psicomotricidade versus Síndrome de Down versus Escola Inclusiva: 
Uma Boa Parceria? .......................................................................................................... ............. 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
 Capítulo VII 
Autismo e Inclusão Escolar: Os Limites e as Possibilidades pela Psicomotricidade - 
Uma Abordagem Corporal além da Cognitividade ... .................................................................. 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo VIII 
A Psicomotricidade no Trabalho Interdisciplinar com a Criança Portadorade Síndrome: 
Por uma Mudança de Olhar ...... ................................................................................................... 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo IX 
Atenção Primordial Estruturando um ser .... ................................................................................ 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo X 
Inteligência, Criatividade, Movimento e Espaço: Apreciando nossas diferenças........................ 
Atividade de Síntese............................................................................................................ 
 
Capítulo XI 
Fracasso Escolar: Exclusão & Inclusão ............................................................................... ......... 
Atividade de Reflexão......................................................................................................... 
 
Atividades Avaliativas......................................................................................................... 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
3 
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INTRODUÇÃO 
 
O presente capítulo tem por objetivo prover uma discussão introdutória a respeito das relações 
entre psicomotricidade, educação especial e educação indusiva. Iniciarei com uma definição do que 
considero o objeto psicomotor para, então, explorar sua relação com a deficiência e a eficiência, a 
exemplo do que sugere o título do capítulo. 
Parto do princípio, apoiada na literatura sobre inclusão e educação especial, de que a constituição 
do sujeito no mundo de hoje não é, a priori, deficiente ou eficiente, mas torna-se tal ou qual, mediante: (a) 
processos de internalização de valores socioculturais (VYGOTSKY, 1998a, 1998b) e (b) mecanismos de 
produção e legitimação de poderes e de identidades e grupos identitários (SAWAIA, 1999). Assim, ao 
estabelecer o objeto da psicomotricidade como ponto de partida, eu o estou considerando a compreensão 
das diversas teias de relações que definirão como o sujeito se percebe e ao mundo, e como este o percebe. 
Diversos autores da psicologia descreveriam essas teias acontecendo de maneiras variadas, como, 
por exemplo, pela mediação e internalização (VYGOSTKY), pela interação entre sujeito e objeto 
(PIAGET), pela modelagem (BANDURA), por processos de reforço (SKINNER), por processos 
inconscientes (FREUD) e assim sucessivamente. 
Considero a abordagem que melhor contribui para chegar ao cerne de interesse do presente texto 
seja a de Vygostky, porque contempla tanto mecanismos psicológicos quanto socioculturais da 
constituição do sujeito. Na teoria vygotskiana, o sujeito é constituído a partir de teias de relações 
psicológicas e socioculturais. Rego (1997: 58) provê uma conveniente síntese do que aqui defendo: 
(...)torna-se impossível considerar o desenvolvimento do sujeito como um processo previsível, 
universal, linear ou gradual. O desenvolvimento está intimamente relacionado ao contexto soci- 
ocultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica (e dialética) através de 
rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas reorganizações por parte do indivíduo. 
Assim, dependendo da cultura a que pertence, e dos valores que esta mesma prioriza, sua subje-
tividade se construirá a partir desta ou daquela identidade grupai e cultural e, igualmente, as afetará. 
Smolka e Góes (1993, apud REGO, 1997: 62), por sua vez, são ainda mais felizes ao resumirem 
esse aspecto da teoria vygotskiana da seguinte maneira: 
O desenvolvimento envolve processos, que se constituem mutuamente, de imersão na cultura e 
emergência da individualidade. Num processo de desenvolvimento que tem caráter mais de revolução que 
de evolução, o sujeito se faz como ser diferenciado do outro mas formado na relação com o outro: 
singular, mas constituído socialmente e, por isso mesmo, numa composição individual mas não 
homogênea. 
Assim, no processo de internalização de valores - que chamei acima de aspecto (a) -, verificado 
na mediação do sujeito pela educação doméstica, escolar e social de cada ser humano, bem como pelos 
valores que perpassam as instituiçõessociais às quais cada sujeito pertence (família, escola, associações 
religiosas, políticas, grupos de lazer e outros), verifica-se também a construção sociocultural de um 
padrão imagético que pode ou não corresponder àquilo em que se tornará o “corpo psicomotor”. Em 
outros capítulos do presente livro, esse assunto será mais detalhadamente tratado. Cabe, entretanto, frisar 
CAPÍTULO I 
DEFICIÊNCIA E EFICIÊNCIA: Quem é o Sujeito? 
 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
4 
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no presente capítulo que, quando não há a correspondência ou quando a correspondência é do tipo 
negativo (permeada pela desvalorização das características em que se constituiu o corpo psicomotor), o 
risco de exclusão desse sujeito tende a ser maior. 0 que nos leva ao aspecto (b), levantado no início deste 
capítulo, conforme veremos no parágrafo seguinte. 
Os mecanismos de produção e legitimação de identidades serão acionados e atenderão a certos 
interesses (de grupos) e funções (sociais) de acordo com o momento histórico em que se vive e a forma 
como as relações de poder e dominação são estruturadas. Sawaia (1999: 9), ao discutir a dialética 
inclusão/exclusão sob uma perspectiva psicossociológica, diz-nos: 
A dialética inclusão/exclusão gesta subjetividades específicas que vão desde o sentir-se incluído 
até o sentir-se discriminado ou revoltado. Essas subjetividades não podem ser explicadas unica-
mente pela determinação econômica; elas determinam e são determinadas por formas diferen-
ciadas de legitimação social e individual, e manifestam-se no cotidiano como identidade, 
sociabilidade, afetividade, consciência e inconsciência. 
A conseqüência concreta de tais mecanismos, assim parece, é a geração de identidades variadas, 
que serão mais ou menos priorizadas conforme os valores de uma dada época e cultura. Mas mais do que 
isso: dependendo de como a própria noção de identidade seja aplicada e considerada por dados grupos, 
ela mesma pode servir de instrumento de legitimação e/ou justificação de variadas práticas de exclusão. É 
Sawaia (1999: 121) quem aponta que “a identidade(...) tem um subtexto paradoxal”, referindo-se à: 
qualidade discriminadora da referência identitária, que transforma a luta pelo direito à diferença 
em condenação ou obsessão pela diferença, tanto coletiva quanto individual. Nesta perspectivada 
relação com a alteridade e a defesa do direito à diferença transformam-se em luta contra o outro, 
como ocorreu com parte dos movimentos pela cidadania, que substituíram os dos anos 60(.„). 
Muitos desses movimentos, ao mesmo tempo que apresentaram avanços em termos de conquistas 
sociais, transformaram-se em comunidades defensivas ou agressivas... (op. cií : 122). 
Odiscurso predominante do mundo globalizado de hoje prima pela igualdade entre sujeitos e pelo 
respeito às diferenças. Isso significa dizer que os valores de cada sujeito da cultura se diferenciam e 
precisam ser reconhecidos. O valor como ser humano, entretanto, independentemente da identidade que 
lhe é peculiar, tem de ser um só, e também reconhecido. Nada no mundo, nenhum motivo ou justificativa, 
é suficiente para atribuir valor diferenciado ao ser humano. Somos todos humanos. Ponto final. Por isso, 
valemos igualmente. Ninguém vale nem mais nem menos do que o outro. Mesmo que uns tenham mais 
do que outros (mais olhos, mais dinheiro, mais status, mais comida, mais religiões, mais qualquer coisa). 
Mesmo que uns façam mais ou melhor do que outros. Nem assim. Porque fazer e ter são, no mundo 
desigual em que hoje vivemos, construtos sociais bastante convenientes para classificar pessoas e atribuir-
lhes valores diferenciados. Tem-se algo em relação a outros que têm a mais ou a menos. Faz-se algo em 
relação a outros que façam mais ou façam menos. Fica explícita na maneira como usamos e significamos 
esses verbos uma conotação comparativa que gera uma escala de valores. Uma maneira tão cinicamente 
“naturalizada” de conceber o ser humano e, com isso, atribuir-lhe valor diferenciado. Não era para ser 
assim. Simplesmente valemos o mesmo, e muito, porque somos. Mas é isso o que acontece? A lógica do 
capital permite, de fato, a igualdade de valor entre seres humanos? 
 
DEFICIÊNCIA E/OU EFICIÊNCIA - DE QUE(M) FALAMOS? 
 
Em outras palavras, o sujeito se constitui e constrói sua imagem como tal a partir de relações 
familiares, culturais e sociais, mas também legais. Paradoxo - ao mesmo tempo que precisa da definição 
legal para garantir a conquista de espaços políticos, instaura-se, com a definição mesma, a formalização 
de uma “identidade deficiente". 
Se, por um lado, semanticamente, a constituição dessa identidade pressupõe um sentido pejora-
tivo, de falta, de impedimento; por outro lado, é essa mesma falta, esse mesmo impedimento, que 
garantirá ao "grupo” de deficientes um poder político que lhes permita mobilizar-se em torno de suas 
demandas - e, em geral, consegui-las, como se vem percebendo com mais visibilidade pelo menos nos 
últimos dez anos. Haja vista o reconhecimento da Libras (Língua Brasileira de Sinais) como a língua 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
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natural dos deficiêntes auditivos e sua respectiva cultura; ou, ainda, a proposta atualmente em discussão 
(não sem polêmicas) do Estatuto dcf Pessoa com Deficiência; ou, ainda, a proliferação de Organizações 
Não Governamentais em torno do tema das deficiências, para citar apenas alguns exemplos. Que se deixe 
claro: todas as iniciativas são absolutamente justas e necessárias. Mas há seus “poréns”, e é disso que 
pretendo tratar agora com uma experiência pequena, mas significativa, que vivi em 2005. 
Em março desse ano, estive na índia, no III North-South Dialogue, convidada a ministrar uma 
conferência e participar, dentre outras coisas, da criação da Aliança Global pela Inclusão. Nitidamente, 
desde 2001, quando aconteceu o I North-South Dialogue (também na índia, e em que também estive 
presente), houve uma mudança significativa nos grupos líderes dos rumos do evento. Pessoas com 
deficiências físicas e motoras ali estavam, liderando e demandando seus direitos e intitulando-se repre-
sentantes dos deficientes do mundo, pelo fato de serem deficientes. Até aí, não havia nenhum problema, 
se não fosse pelo fato de não existir um grupo de deficientes e, sim, diversos grupos, com demandas e 
especificidades bastante diferenciadas. Mas os deficientes ali presentes, além de participar da construção 
do texto da Aliança Global pela Inclusão (como deveria mesmo ser), mostraram-se firmemente dispostos 
a ressignificar, em nome de todos os deficientes do mundo, o conceito de deficiência e, ao mesmo tempo, 
marcar, no texto da aliança, um foco especial na deficiência. 
Um dos argumentos marcantes defendidos a respeito dessa ressignificação - e compartilhados por 
todos ali presentes, deficientes ou não - era o de que a condição de deficiente não implica a não- 
participação desses sujeitos como cidadãos e militantes no mundo. 0 que dificulta que exerçam sua 
cidadania é a maneira pejorativa como a deficiência é vista ainda em todo o mundo - como um impedi-
mento, uma incapacidade “natural”. Por isso defendiam que, se desconstruirmos essa “naturalidade” e 
reconhecermos que, em dados momentos da vida, por quaisquer motivos, todos podemos ser impedidos 
de exercer nossa cidadania, então todos seriamos, de certa maneira, “deficientes”. Em outras palavras, a 
deficiência é proposta aqui em uma conotação bem mais ampla - de exclusão. 
A pergunta que não calou, em minhas reflexões e polêmicas que causei ao longo do 
evento,entretanto foi: se todos somos potencialmente “excluíveis”, por que então delimitar o texto deuma aliança que se supõe ser global e pela inclusão (que jamais se resumiu a um grupo e, sim, refere-se a 
lutas contra processos de exclusão)? Não estaríamos ali, de certa maneira, privilegiando uns em 
detrimento de outros, ao ressaltar um grupo em um texto que deveria ser de tamanha importância? E, 
conseqüentemente, não estaríamos promovendo uma certa exclusão? Afinal, aspirar a ter privilégios já é, 
em si, uma forma de se manter a lógica dos privilégios (B00TH, 2005) - o que, conseqüentemente, 
alimenta a desigualdade, a injustiça e a não-garantia dos direitos humanos, que são de todos. 
 
Retomando o ponto central 
 
O exemplo anterior me pareceu pertinente a este texto na medida em que, conforme afirmei no 
início, considero o objeto psicomotor como a compreensão das diversas teias de relações que definirão 
como o sujeito se percebe e ao mundo, e como este o percebe. Em outras palavras, o objeto psicomotor 
não se restringe a um corpo físico mas também a aspectos ligados à subjetividade desse corpo, que, por 
sua vez, tem uma identidade construída nessas teias de relações. Mais ainda: as percepções que se fazem 
inspiram práticas e mobilizações que, por vezes, correm o risco de reproduzir aquilo, mesmo que seus 
sujeitos combatem: as exclusões. O exemplo dado procurou apresentar uma dessas teias, em que corpos-
sujeitos-grupos identitários, com base em como se percebem e como o mundo os percebe (e ainda, como 
pensam que o mundo os percebe), movimentam-se, articulam-se e firmam-se em um processo contínuo e 
político de busca e garantia de seus direitos - direitos esses que, por sua vez, só podem ser reconhecidos e 
garantidos quando há o “reconhecimento oficial", instituído, do sujeito - e/ou o grupo identitário a quem 
tais direitos se refiram. 
Entretanto, como dito anteriormente, no processo dialético entre inclusão e exclusão, a cons-
tituição e a firmação de tais grupos (quaisquer que sejam, e por mais justo que seja) acabam por 
reproduzir a própria lógica da exclusão. Dito de outra forma, cabe perguntar: A que se destina o 
“destaque” que dados grupos adquirem quando são postos em evidência (tal como no mencionado 
exemplo da Aliança Global pela Inclusão)? Destina-se, como já apresentado, entre outras coisas, à 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
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garantia de direitos, mas também a ganhos de espaços políticos e poder. Ora, uma vez que alguns grupos 
adquirem mais poder e evidência do que outros, reinstala-se a discriminação, ainda que a intenção 
expressa não seja essa, conforme temos testemunhado ao entrar em contato com a mobilização de alguns 
grupos excluídos nas últimas décadas. Esses grupos (negros, deficientes, mulheres, para citar alguns) 
afirmam ter como propósito, entre outras coisas, o ganho de um espaço político que resulte na criação e 
reformulação de políticas (outrora reconhecidas como de discriminação positiva, hoje comumente 
chamadas de políticas de ações afirmativas) que digam respeito às suas igualmente justas demandas. Não 
obstante, podemos com isto identificar alguns problemas, como veremos a seguir: 
.O primeiro problema é que tais políticas costumam ser feitas em caráter emergencial, confir-
mando uma tradição brasileira de superformulação e subimplementação das mesmas (SANTOS, 
1995), ou seja, por falta de uma elaboração de estratégias de implementação de nossas políticas, a 
sustentabilidade e a continuidade das políticas ficam, assim, comprometidas e à mercê da 
mudança da ideologia político-partidária. 
. O segundo problema é que a hegemonia grupal tem como consequência a imposição de valores 
que trarão como resultado novos excluídos por assim dizer, dado que as políticas reformuladas ou 
criadas a favor dos excluídos de antes certamente deixarão de fora outros grupos que não se 
enquadrem nos “padrões” ali descritos, e que, por isso mesmo, passam a ser excluídos. Com isso, 
um processo de desvalorização de sujeitos e grupos identitários se inicia - ou continua. Mudam-se 
os nomes dos excluídos, mas não se termina com as exclusões. 
É nesse sentido que pensar a inclusão em educação requer a compreensão das teias de relações 
mencionadas anteriormente. Para tanto, faz-se necessário compreender que inclusão é processo, e como 
tal igualmente constituído por - e constituinte de - redes. No tocante à educação especial, particularmente 
após a Declaração de Salamanca (1994), o conceito de inclusão provocou ao menos duas grandes 
mudanças nesse universo, conforme já discuti em textos anteriores: quanto ao seu alunado e quanto a seu 
foco de ação. 
Quanto ao alunado, fica claro que, se antes já havia dúvidas quanto a ele sempre ser definido em 
termo de deficiências, agora essa dúvida dá lugar à certeza de que não há esse limite: no contexto da 
proposta de educação inclusiva, que, por sua vez, ressignifica a educação especial dentro da proposta de 
educação para todos, a educação especial deve atender todos os alunos. Isso implica redimensioná-la para 
fazer parte do sistema educacional como um todo, o que, por sua vez, justifica as críticas encontradas na 
própria declaração, a respeito de sua organização como um sistema à parte, que contém legislação e 
medidas legais e financeiras próprias. 
Quanto ao foco de ação, a conseqüência é clara: se o alunado potencialmente por qualquer 
indivíduo, a oferta educacional não pode estar centrada apenas em torno do lidar com as deficiências. Ela 
deve ser equacionada para buscar o rompimento de barreiras que impeçam o estudante de aprender. Essas 
barreiras podem se dar de aspectos inerentes ao próprio estudante, como também por causa de aspectos 
sociais e econômicos, e ainda, em razão da má organização do próprio sistema educacional que, 
exagerando suas características de padronização, desconsidera as particularidades de cada caso presente 
na escola. 
Pelo exposto, venho compartilhando com Booth e Ainscow (1998) a seguinte idéia sobre inclusão 
vista em sua íntima relação com as diversas exclusões do cotidiano humano: “inclusão e exclusão como 
processos ao invés de eventos” (p. 194). Estes autores ainda vão além ao defini-las respectivamente como 
“processos de aumento e redução da participação de alunos do currículo, da cultura, das comunidades 
locais e das escolas regulares” (p. 194). Para eles, “qualquer escola real, em qualquer tempo, reflete um 
complexo interjogo de forças indusivas e exdudentes, atuando em indivíduos e grupos de alunos” (p. 
194). 
Em outras palavras, 
inclusão não é a proposta de um estado ao qual se quer chegar. Também não se resume na simples 
inserção de pessoas deficientes no mundo do qual têm sido geralmente privados. Inclusão é um 
processo que reitera princípios democráticos de participação social plena. Neste sentido, a 
inclusão não se resume a uma ou algumas áreas da vida humana, como, por exemplo, saúde, lazer 
ou educação. Ela é uma luta, um movimento que tem por essência estar presente em todas as áreas 
da vida humana, inclusive a educacional. Inclusão refere-se, portanto, a todos os esforços no 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
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sentido de garantia da participação máxima de qualquer cidadão em qualquer arena da sociedade 
em que viva, à qual ele tem direito, e sobre a qual ele tem deveres. (SANTOS, 2003, p. 81) 
A significação prática dos aspectos aqui levantados parece clara: há de reformular (como sempre 
foi necessário) nossas posturas, nossas concepções e algumas possíveis formas como nos organizamos 
para “receber” a todos. Na verdade, cabe mesmo questionar se temos de fato nos organizado. Referimo-
nos a várias formas de organização. A organização “por dentro”, ou seja, aquela que tocaprofundamente 
nossas concepções mais arraigadas a respeiito do outro, ou mesmo, de termos o despojamento para frear 
nossos primeiros impulsos e refletir sobre se temos, verdadeiramnete, alguma concepção consciente a 
respeito desse outro diferente. E, se a temos, verificarmos se estamos cristalizados nela, ou se ela é 
flexível para abranger e abraçar mudanças internas estruturais. 
Falamos também da organização social, da qual todos somos partes e construtores. Como temos 
nos posicionado perante ela? Temos assumido nosso papel de atores sociais, ou temos preferido nos 
reclinar na poltrona e observar o mundo acontecer como se fôssemos espectadores? Se assim agimos, não 
apenas nos reclinamos, como também “declinamos” da perspectiva de transformar a sociedade, entre 
outras possibilidades. 
A primeira dimensão diz respeito: 
(...) à criação de comunidades estimulantes, seguras, colaboradoras, em que cada um é valorizado, 
como base para o maior sucesso de todos os estudantes. Ela se preocupa com o desenvolvimento 
de valores inclusivos, compartilhados entre todo o staff, educados e responsáveis, e que são 
passados a todos os novos membros da escola. Os princípios derivados nas escolas de culturas 
inclusivas orientam decisões sobre as políticas e as práticas de cada momento de forma que a 
aprendizagem de todos seja apoiada através de um processo contínuo de desenvolvimento da 
escola. (BOOTH et alii, 2000, p. 45) 
Por sua vez a dimensão pública refere-se à preocupação em 
Assegurar que a inclusão esteja presente no bojo do desenvolvimento da escola, permeando todas 
as políticas, de forma que estas aumentem a capacidade de uma escola em responder à diversidade 
dos estudantes. Todas as formas de apoio são consideradas juntas em uma estrutura única, e são 
vistas da perspectiva dos estudantes e seu desenvolvimento, ao invés de serem vistas da 
perspectiva da escola ou das estruturas administrativas do órgão responsável pela organização da 
educação. (BOOTH et alii, 2000, p. 45) 
E a dimensão das práticas liga-se em fazer com que o cotidiano das instituições educacionais 
(...) reflita as culturas e políticas de inclusão da instituição [e] (...) assegurar que todas as atividade 
de sala de aula ou extracurriculares encorajam a participação de todos os estudantes e baseiam-se 
em seus conhecimentos e experiências fora da instituição. O ensino e o apoio são integrados na 
orquestração da aprendizagem e na superação de barreira à aprendizagem e à participação. O staff 
mobiliza recursos dentro da instituição e nas comunidades locais para sustentar uma 
aprendizagem ativa para todos . (BOOTH et alii, 2000, p. 45) 
Essas três dimensões, compreendidas em seu conjunto e identificadas nas instituições, podem 
servir como um potente instrumento de análise que nos permita levantar indicadores de inclusão e de 
exclusão em um dado contexto. E assim o fazendo, podemos criar estratégias de combate às exclusões, 
tanto no sentido preventivo como no sentido “curativo”. 
Em um artigo recentemente publicado, Santos (2003) dizia que 
(...) pesquisas internacionais sobre experiências bem-sucedidas de inclusão (Unesco, 2001) têm 
mostrado cada vez mais que por vezes as grandes soluções escondem-se nas estratégias mais 
simples - como, por exemplo: (a) variar com uma certa constância os diferentes tipos de 
agrupamento dos alunos em aula; (b) utilizar um sistema rotativo de monitoria entre os alunos, de 
forma que se ajudem entre si (e conseqüentemente ao professor) naqueles assuntos em que se 
saiam melhor; (c) diminuir o tempo de trabalho com um mesmo assunto - sem necessariamente 
variar o tema, observando o grau de concentração dos alunos, o que também evita a indisciplina; 
(d) preparar atividades variadas sobre um mesmo assunto para uso simultâneo por alunos que 
manifestem diferentes interesses (ex.: enquanto um grupo se engaja em pesquisar sobre o tema 
“adição”, outro se engaja em construir exercícios sobre adição, outro prepara uma peça teatral 
improvisada sobre o tema, e ainda outro simplesmente resolve fazer exercícios já prontos de 
adição, e assim por diante). A lista poderia ser extensa! Os resultados dessas atividades também 
poderiam - e devem! - ser compartilhados em momento grupai mais amplo, com toda a turma. 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
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Práticas assim construídas implicam uma mudança cultural na instituição, bem como de suas 
respectivas políticas, que fariam com que a instituição escolar e seus próprios sujeitos avaliassem pelo 
menos quatro grandes aspectos pertinentes ao universo educacional: suas concepções sobre educação, 
avaliação, formação de cidadãos (e de seus respectivos professores) e de currículo. 
No tema educação, há de se definir o seu sentido. Estamos educando para a transformação ou 
para a continuação, por exemplo? 
Do tema avaliação, podemos extrair questionamentos, como por que, quem e como avaliar? Qual 
é o sentido da avaliação? Ela pode ser padronizada, global, aplicável igualmente a todos? Seria essa uma 
prática justa, dado que cada um é diferente e possui sua singularidade? Sua própria concepção, em 
resumo, precisaria ser alterada. Essa questão também foi discutida em texto anterior de 2003. Eu dizia: 
Ao invés de permanecermos na tradicional forma de vê-la [a avaliação] como um produto a ser 
fornecido pelo aluno, fruto de uma suposta aprendizagem ao longo de cujo processo ele é 
comparado aos seus colegas e considerado acima ou abaixo do “normal”, ou “na média”, ele 
passa a ser co-agente da construção de seu próprio conhecimento e, conseqüentemente, co- 
participante nos processos avaliativos - não só de si mesmo como também do(a) professor(a) e do 
próprio processo ensino-aprendizagem. 
Além disso, a avaliação inclusiva é diversificada: são oferecidas várias oportunidades e formas 
diferentes do aluno mostrar como está se saindo ao longo do processo educacional. Se o aluno apresenta 
dificuldade em sua expressão escrita, por exemplo, a instituição educacional provê formas alternativas 
mediante as quais ele possa complementar sua expressão e mostrar o resultado de seu processo 
educacional (por exemplo, oralizando). 
Essa forma de avaliar possibilita que um processo de negociação entre aluno e professor se 
instaure na relação pedagógica, o que, por sua vez, apenas enriquece a experiência educacional de ambas 
as partes. 
Em resumo, avaliação deveria ter como ênfase o desenvolvimento e a aprendizagem do estudante, 
em que a mesma seja entendida como processo permanente de análise das variáveis que interferem no 
processo de ensino e aprendizagem, para identificar potencialidades e necessidades dos alunos e 
condições da instituição educacional para atender a tais aspectos. 
Da mesma maneira, ao falar na formação de seres humanos (e daqueles que os educam), caberiam 
questões referentes a como educar e para que fazê-lo. Educamos como em um sistema militar, 
padronizando regras a todos, como se todos fossem seguir a mesma ordem espontaneamente, como se o 
mundo fosse homogêneo? Ou poderíamos partir do princípio da heterogeneidade entre nós e, com isso, 
tornarmos nossas culturas, políticas e práticas mais flexíveis e abertas a um redimensionamento? 
E que dizer das práticas curriculares? Há um currículo único? Deve ser ele limitado, como 
tradicionalmente se diz, em uma concepção de “grade”, que de fato nos “engrada”, como em uma camisa-
de-força? Ou poderia ter ele uma concepção mais ampla, flexível, cuja possibilidade de construção de um 
processo ensino-aprendizagem que manifestasse verdadeiro interesse por parte dos atores envolvidos 
fosse possível? Aqui, compartilho a idéia de Silva (1999): 
Num cenário pós-crítico o currículo pode ser todas essas coisas, pois ele também é aquilo que 
dele se faz, mas nossa imaginação está livre para pensá-lo de outrasformas, para vê-lo de perspectivas 
que não se restringem àquelas que nos foram legadas pelas estreitas categorias da tradição (pág. 147). 
Até porque, como diz Giroux (1997, PAULIN0 & SANTOS, 2004: 2342), 
o discurso curricular, com todas as suas variações, é uma forma de ideologia que tem íntima 
relação com questões de poder, principalmente quando estas estruturam as relações sociais em 
torno de considerações de gênero, raça e classe (pág. 169). 
Enfim, as discussões sobre cada um desses aspectos mereceriam, por si mesmas, um capítulo à 
parte, o que não constitui nosso objetivo por ora. Mas, que fique claro: é essencial que esses e outros 
aspectos não se percam de vista. Daí a importância de trabalhar com as dimensões aqui propostas 
(culturas, políticas e práticas de inclusão em educação). 
 
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COSTURANDO: PSICOMOTRICIDADE, INCLUSÃO E EDUCAÇÃO 
ESPECIAL 
 
Este capítulo se propôs iniciar uma discussão sobre o sujeito da (d)eficiência e as relações entre 
psicomotricidade, educação especial e inclusão em educação. Para tanto, enfatizamos um conceito de 
objeto psicomotor que prime não apenas por uma concepção tradicional de psicomotricidade, mas 
também política: um corpo-sujeito-identidade, vivendo em um dado contexto e em certo momento 
histórico, sendo (ou não) incitado a uma ação política de transformação. 
Em seguida, procurei mostrar como que, mesmo dentro de um movimento supostamente a favor 
da inclusão de todos (como teria sido a Conferência sobre a Aliança Global pela Inclusão), certos privilé-
gios são batalhados politicamente por alguns grupos, os quais, vencendo em suas posições, marcam seus 
“territórios" e mantêm assim a lógica da exclusão e da reprodução de relações desiguais de poder. 
Nesse contexto, procurei afirmar ainda que inclusão (especialmente em educação) só tem sentido 
se for efetivamente voltada para todo e qualquer cidadão que esteja em situação ou risco de exclusão. E 
mais: tentei alertar para o fato de que políticas puras e simplesmente feitas em caráter emergencial, com o 
intuito (consciente ou não) de “calar certas vozes”, apenas abrem espaços para que outras vozes, ainda 
não “descobertas”, comecem a aparecer. 
A esta altura, o leitor poderá perguntar a si mesmo se não há saída - se tudo se remete ao “jogo” 
do poder e da reprodução da lógica da exclusão; se nada mais há de fazer. E aqui replico: ao contrário. Há 
muito de fazer. O primeiro passo é reconhecermos que esses riscos estão presentes em cada decisão, 
passo ou atitude de nossa vida pessoal, social e política. Nossa maior tarefa é não deixar que a lógica ou 
as políticas de exclusão (mesmo aquelas travestidas em políticas de ações afirmativas) se cristalizem e se 
eternizem. O mundo é movimento - as coisas precisam andar; políticas, mais ainda. 
Nesse sentido, o segundo passo é reconhecermo-nos como parte integral e integrante de toda essa 
movimentação e atuarmos como os fazedores de história que, querendo ou não, somos. Ao nos omitirmos 
quanto a certos assuntos e causas, fazemos história. Ao nos pronunciarmos, também. 0 silêncio é tão 
fazedor de história quanto o grito. 
Entretanto, ao silenciarmos e nos omitirmos, podemos estar dizendo sim a algo que nos colocará 
do lado de baixo da roda-viva. Mesmo sendo ela uma roda - portanto sempre havendo a possibilidade de 
trocas de posições - a questão é: Será que o mundo precisa ser uma roda-viva? Será que não podemos 
contribuir para encerrarmos esse movimento - erroneamente compreendido como natural - de “uns caírem 
e outros subirem" e torná-lo menos desigual, menos injusto? Podemos. Devemos. E isto só acontece 
quando nos conscientizamos de que nossos corpos são sujeitos com identidades e pertencentes a grupos 
identitários cuja movimentação e mobilização faz a diferença. Não a diferença que se eterniza em 
posturas e mecanismos legais radicais e, sim, a diferença do movimento contínuo, da revisão cotidiana 
daquilo mesmo em que cremos e somos. A diferença que faz com que, respondendo ao título deste 
capítulo, possamos sem susto, dizer que o sujeito da (d)eficiência podemos ser todos nós 
 
.REFERÊNCIAS 
 
1. BOOTH, Tony. Conferência proferida no III North-South Dialogue, Nova Délhi, Índia, de 27/2/2005 a 4.3.2005. 
2. BOOTH, T. et alii.Index for Inclusion- Developing Learning and Participation in Schools. Bristol: CSIE, 2000. 
3. GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes 
Médicas, 1997. 
4. PAULINO, Marcos Moreira & SANTOS, Mônica Pereira dos. Anais do VI Colóquio sobre questões curriculares - II 
Colóquio Luso-brasileiro sobre questões curriculares - Currículo: Pensar, sentir e diferir. Agosto de 2004. pp. 2340-2356. 
5. REGO, Teresa Cristina. Vygotsky - uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes. 1997. 
6. SANTOS, Mônica Pereira dos. Integration Policies in a Brazilian Southeastern Capital: Formulation, Implementation and 
Some Comparisons with Four Other European Countries. Tese de doutoramento, Institute of Education, University of London, 
1995. 
7. _______. “Formação de professores no contexto da inclusão”. Paradoxa- Projetivas Múltiplas em Educação 
- Ano IX - n. 15/16 - 2003 - ISSN 1415-3963 -jan.dez.2003. 
8. _______. “O papel do ensino superior na proposta de uma educação inclusiva”. Revista Movimento - Revista da 
Faculdade de Educação da UFF - n. 7, maio de 2003 - pp. 78-91. 
Textos extraídos Do Livro Psicomotricidade educação especial e inclusão social de Carlos Alberto Ferreira e Maria Inês Barbosa Ramos 
 
10 
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9. SAWAIA, Bader (org.). As artimanhas da exclusão -análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis: Vozes, 
1999. 
10. SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 
1999. 
11. UNESCO/Ministry of Education and Science of Spain Final Report - World Conference on Special Needs Education: 
Access and Quality. Salamanca, Espanha, 7-10 jun. de 1994. 
12. UNESCO. Open Files on Inclusive Education -support materiais for managersand administrators. Unesco, 2001. 
13. VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Pensamento e linguagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a. 
14. _______. VYGOTSKY, Lev Semenovitch. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins ontes, 1998b. 
 
ATIVIDADES DE SÍNTESE: 
 
1- Comente a seguinte afirmação no âmbito da educação especial: 
“(...) o discurso curricular, com todas as suas variações, é uma forma de ideologia que tem íntima relação com questões de poder, 
principalmente quando estas estruturam as relações sociais em torno de considerações de gênero, raça e classe.” 
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2- À partir das discussões levantadas neste capítulo formule 2 estratégias que você considere eficientes de 
combate às exclusões. 
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INTRODUÇÃO 
 
Para pensar a imagem e o esquema corporal do sujeito com necessidades especiais, é preciso, 
antes de tudo, perguntar quem é esse sujeito “especial” e o que são necessidades especiais. Será que existe 
um sujeito que é especial ou todos somos especiais de alguma forma, dependendo da situação e das 
condições em que nos encontramos? Há necessidades especiais ou toda necessidade é especial e 
específica, uma vez que demanda por satisfação? 
O conceito de necessidade traz, como qualquer outro conceito, em virtude da polissemia dos 
signos, suas contradições: ou remete àquilo que é indispensável, essencial (portanto, necessário), ou à 
falta do que é necessário (privação, precisão, pobreza, falta de). Assim, o acesso ao necessário ou estar 
privado dele nos conduz à noção de inclusão/exclusão vista em sua ambigüidade. Segundo Sawaia 
(2002), “analisar a ambiguidade da exclusão é captar o enigma da coesão social sob a lógica da exclusão 
na versão social, subjetiva, física e mental”. Por isso, temos de avaliar a lógica da identidade como um 
modo de ser, expressar e sentir que recai sobre a arquitetura da diferença. E de que maneira a diferença 
nos afeta? Como as diferenças se constituem e de que forma alteram, interferem na imagem e no corpo 
dos sujeitos em ação - especialmente, nos portadores de alguma deficiência? Pensar, sentir, agir de manei-
ra diferente significa operar no mundo não hegemonicamente. 
A visão de mundo hegemônica pressupõe padrões que negam a diferença e, inevitavelmente, 
implicam discriminações, indicam caminhos de exclusão/inclusão, que revelam as relações de poder - 
estar incluído ou excluído - estabelecidos no processo histórico-social. Incluir e excluir são frutos da 
dinâmica fundada nas relações sociais. O homem, diferentemente do animal, não é um ser natural, mas 
um ser de necessidades, desejos, anseios que determinam sua interferência na realidade para que suas 
demandas sejam atendidas, o que configura justamente o processo histórico da humanidade. Então, se 
toda prática é uma construção histórica, que história desejo para a humanidade? Talvez essa seja a 
pergunta a iniciar o processo de inclusão social. 
Para responder a essa questão, lançamos mão da ambigüidade do termo “discriminar”. Discri- 
mina-se para diferençar, distinguir, discernir ou para separar, extremar. Distinguir significa perceber a 
diferença, fato que impõe uma tomada de atitude diante dela. Pode-se, então, aceitá-la, incorporando-a 
como uma maneira diversa de estar no mundo. Porém, pode-se igualmente rejeitá-la. O fato é que a forma 
como nos apropriamos do conceito irá interferir na aceitação ou na rejeição às diferenças. Ou nos 
colocamos a serviço da manutenção de padrões preestabelecidos - que excluem muitos para incluir alguns 
-, ou nos posicionamos contra, hegemonicamente em favor da diversidade. 
Uma segunda questão a ser esclarecida trata da conceituação de imagem e esquema corporal. Para 
muitos autores, esses conceitos se eqüivalem. No entanto, cabe distinguir alguns pontos para sinalizarmos 
sobre qual abordagem será enfatizada neste artigo. Em uma perspectiva introduzida por Levin (1995), 
pode-se pensar que a imagem corporal diz respeito a uma subjetividade, a uma condição do não avaliável, 
daquilo que cada um entende como sendo seu eu, consciente e/ou inconsciente. 0 esquema corporal é 
compreendido, nesta ótica, como uma função de representação de seu próprio corpo, daquilo que 
podemos perceber e avaliar e que se articula às noções clássicas de Henri Wallon, ou seja, a 
propriocepção, a interocepção e a exterocepção. Como exemplo, pode-se avaliar a coordenação global, 
mas não a percepção inconsciente de si mesmo. Essa perspectiva é muito relevante para nosso estudo, 
porque traz uma dimensão de subjetividade que está para além do corpo, pois se encontra 
primordialmente constituída pelo desejo do outro: o organismo não se confunde com o sujeito. 
Mariana, 26 anos, chega ao consultório trazida por seus pais. Apresenta uma história de paralisia 
cerebral e necessita de cadeira de rodas para se deslocar. A demanda terapêutica é aprender a escrever e 
CAPÍTULO II 
A Imagem e o Esquema Corporal do 
Sujeito com Necessidades Especiais 
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ajudá-la no processo de aprendizagem. A jovem é apresentada como de “raciocínio lento” e com muita 
dificuldade de compreensão. Na primeira sessão, pareceu não ter nenhum interesse pela vida, nem por 
aquele trabalho que ora iniciava. De acordo com nossa conduta clínica, iniciamos as sessões por uma 
avaliação cognitiva no campo da organização do pensamento e da linguagem. O resultado - apesar de seu 
desinteresse - foi excelente. Nada havia que revelasse nenhuma dificuldade aprendizagem. No entanto, 
sua postura depressiva (babando, cabeça arqueada etc.) parecia traduzir-se como um retardomental. 
Diante do diagnóstico, surpresa e incredulidade dela e da família. Mariana podia ir muito além do que se 
supunha, do que ela mesma havia construído para si. Passando a dominar o processo visomotor e 
significante da leitura, mudou radicalmente sua postura, chegava sorridente e, a cada dia, trazia uma 
novidade. Passou a interessar-se pelas coisas do mundo, em especial, a filosofia. A cada sessão, uma nova 
Mariana, renovada, reconhecida, trazia textos e passava a interessar-se pelo computador. Um novo mundo 
se abria. Ingressou em um projeto universitário de “inclusão” como ouvinte. Mariana não pode prestar 
vestibular porque não escreve em virtude da sua paralisia. O pensamento brilhante esbarra nas amarras 
das barreiras institucionais. Mariana continua a lutar; primeiro os diagnósticos que associavam a paralisia 
cerebral a um retardo mental, depois à resistência da família e dela própria para acreditar em suas 
potencialidades e as desenvolver e, por fim, à sociedade que a impede de prosseguir porque não escreve, 
apesar de pensar. Uma sociedade em que muitos pensam que sabem escrever e muito poucos conseguem 
pensar. A imagem forja o esquema e necessita de uma nova imagem, vinda de um terapeuta, um 
mediador, para construir novas possibilidades de ser. 
Outras leituras não menos importantes sobre a noção de imagem e esquema corporal privilegiam 
a experiência corporal como constituinte da percepção de si, desde o período de gestação, passando pelo 
nascimento e concretizando-se em uma perspectiva intersubjetiva entre o bebê e o ambiente e defendem a 
idéia de uma imagem corporal inconsciente e primária na constituição do ser. Assim, a ótjca da 
experiência inscrita na memória do corpo produz uma criação de si e do mundo, muito primitiva, qüe se 
transforma pela capacidade potencial e primitiva de imaginar, criar e fantasiar. Em certo sentido, as 
imagens criam o esquema representacional do corpo. (WINNICOTT, 1978,1990) 
Os conceitos que serão utilizados nesse texto dizem respeito a uma terceira via de compreensão 
dos processos de construção da imagem e do esquema corporal. Eles são constituídos na ótica históri- co-
social, como uma construção dialética produzida na relação do indivíduo com o campo da linguagem, dos 
signos e do social. O organismo e a linguagem forjam a subjetividade e a corporeidade como processos de 
sobrevivência biológica e cultural. Corpo e campo social interagem, produzindo novas subjetividades, em 
que o inconsciente emerge como aquele não submetido à linguagem, em oposição aos dois primeiros 
apresentados. Em síntese, partimos da perspectiva vygotskiana (principalmente), que entende o processo 
imaginário como fundante da consciência (VYGOTSKY 1997, FERREIRA, 2002) e que se constrói na 
relação estabelecida entre a experiência e a realidade. 
Retomando o ponto inicial de nossa reflexão, passamos a analisar a imagem e o esquema corporal 
como consequência das construções históricas das identidades. O ser aceito reflete uma imagem de 
satisfação, de adequação, de se ser sujeito de si mesmo, o que gera o sentimento de fazer parte, de estar 
incluído, de potência diante da vida e do corpo. Ao passo que o não ser aceito - se não representa uma 
opção, mas uma imposição - resulta em uma imagem de defeito-, de menos valia, impropriedade, o que 
suscita uma postura de incômodo e sofrimento diante da não participação dos padrões eleitos como 
aceitáveis e valorizados como adequados. 
O processo inclusão/exclusão tem de ser visto em toda sua complexidade e requer que não se 
passe à margem dos problemas sociais, econômicos, psicológicos, educacionais, filosóficos da atualidade 
rumo à conquista de uma sociedade menos injusta e exdudente. 
Uma sociedade inclusiva pressupõe sistemas indusivos: o educacional, o de saúde, o de legislação 
e direitos humanos, o de moradia, o de lazer etc. O processo de inclusão pretende um novo olhar sobre a 
sociedade, que pretende modificações estruturais no sistema para que as necessidades de todos os sujeitos 
sejam atendidas. A inclusão repousa em princípios, como ética; aceitação e respeito às diferenças; 
valorização das diversas formas de sentir, pensar e agir no mundo; acesso aos bens e serviços disponíveis; 
aprendizagem que garanta o pleno desenvolvimento; procura inquieta por novas possibilidades de ação 
que elevem a qualidade e o bem-estar social. 
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Seguindo esse mesmo contorno, uma educação inclusiva tem como propósito a garantia para 
todos de uma educação de qualidade, que assegure o pleno desenvolvimento do seu alunado. Mas antes 
de abordarmos esse tema - o da educação inclusiva -, vamos refletir sobre o impacto da diferença sobre os 
corpos. 
 
AS IMAGENS, OS CORPOS E OS COMPORTAMENTOS 
 
Tanto na intimidade como nos espaços públicos, o cidadão incorpora um turbilhão de imagens 
veiculadas como modelos ideais de comportamento. Cenas na televisão, imagens publicitárias, publica-
ções jornalísticas ou “científicas” figuram o que é ou não valorizado como certo ou errado, adequado ou 
inadequado, normal ou patológico. Essa hegemonia da imagem e do comportamento corresponde à 
degradação do status do sujeito que não se adapta à categoria da supremacia visual. Assim, o silêncio se 
instala nas relações interpessoais, as nuanças cedem lugar às mensagens unívocas e mesmo brutais, 
porque preconceituosas e exdudentes. Essa visão de mundo é incapaz de pensar o espaço comum, pois 
reduz a coletividade à satisfação de interesses particulares, em que só alguns são selecionados para 
usufruir a liberdade e a felicidade. Porém, nossa existência seria tomada de grande tristeza se não fosse o 
poder de fazer uso da liberdade de transformação, que nos é legada pela prática da opção - opção em 
aceitar ou não o que é imposto e ditado pelo poder dominante e, assim, inaugurar algo de novo. 
A liberdade não consiste apenas em agir, mas na ação consciente em direção a um objetivo claro 
e bem definido. Ser livre é colocar algo em movimento, fazer cessar um processo mal assentado, deses- 
tabilizar o que aí está - certezas e verdades -, instaurando um novo processo de edificação sustentado por 
novas bases capazes de suprimir a distância entre o individual e o plural. Adotar passivamente o que nos é 
imposto é perder a liberdade, deixar de nos reconhecer naquilo que fazemos ou assumimos como 
comportamentos. Todo objeto com o qual nos relacionamos, todo abrigo1 no qual vivemos deve ser 
objeto de nosso sonho, de tal forma que possamos dizer: é meu corpo que se prolonga nele. O espaço 
público tem de ser de todos, onde cada um de nós possa viver plenamente, segundo nossas necessidades e 
possibilidades. 
No entanto, para que a liberdade possa ser tomada como objeto de transformação, é preciso 
compreender o modo como o poder se exerce nas práticas cotidianas, apontando tanto para seus efeitos 
sobre os corpos quanto as formas de internalização das condutas, o que nos permitiria agir com mais 
criticidade e autonomia e, portanto, produzir novas e diferentes significações. Lembrando Foucault, as 
novas significações são produzidas a partir da indignação diante do vivido, o que permite desconstruir as 
verdades existentes e educar o olhar e o sentir para novas maneiras de pensar e agir. 
Elias nos oferece a compreensão de como hábitos e comportamentos diferentes são incorporados 
pelos sujeitos. Quando trata do processo civilizador, mostra que os manuais de condutas e as conversas 
entre os interlocutores assumiam o lugar de cultivar sentimentos de repugnância e de vergonha diante de 
comportamentos até então aceitos, mas que precisavam ser transformados em atitudes “menos bárbaras” e 
“mais civilizadas”. Comentando sobre os manuais da época: 
(...) é muito claro que esse tratado tem precisamente a função de cultivarsentimentos de vergo-
nha. (...) A maneira como a ansiedade é despertada nos jovens, a fim de forçá-los a reprimir o 
prazer, de acordo com o padrão de conduta social, muda com a passagem dos séculos. (...) a 
referência a anjos da guarda é usada durante muito tempo como instrumento para condicionar 
crianças. Diminui um pouco quando “razões higiênicas” e de saúde recebem ênfase e se pretende 
obter um certo grau de controle dos impulsos e das emoções. Essas razões higiênicas passam, 
então, a desempenhar um papel importante nas idéias dos adultos sobre o que é civilizado. 
(ELIAS, 1994:140) 
A identidade, herdada das matrizes conceituais modernas, carrega em si a ambição de pureza, de 
individualidade, de particularidade. Essa idéia alastrou-se por todo o corpo da construção social, 
dificultando o encontro com o outro. E, assim, a identidade passou a ser um lugar insensível à diversida-
de, carente do confronto com o outro. No seu registro exdudente, a noção individualista moderna evita 
tudo aquilo que possa advir do mundo imprevisível da diferença, da ousadia do outro, parecendo dispor 
1 O termo “abrigo” se refere, aqui, às crenças, às certezas e às verdades, assumidas por nós como visões de mundo que guiam as práticas sociais. 
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de uma segurança inabalável, sem admitir que a identidade da vida, da história, da nação, do grupo, do 
indivíduo se alimenta e vive dos seus outros, de suas diferenças. 
O modelo da racionalidade, à medida que se converteu em ideologia, passou a produzir uma 
espécie de desestabilização, por estar impedida de dar conta de situações-limite, dos intervalos ou das 
margens, por estar submersa nos esquemas interpretativos institucionalizados. Assim, essa noção indi-
vidual de identidade protegida pela ciência moderna, pela filosofia, pela psicologia, pela sociologia, pela 
pedagogia não conseguiu evitar sua perda de alteridade e de legitimidade. Verifica-se então a “desco-
berta” da diferença; abre-se passagem para os nossos outros - muitas vezes, silenciados, desconheci dos, 
evitados. A partir desse novo olhar, o vigor da diferença ganha contornos e se infiltra na vida social. Já 
não é mais possível negar as diferenças, falar em individualidade: o desgaste e o sofrimento diante das 
formas nas quais querem meter os sujeitos, detonam a emergência de uma nova organização social, na 
qual a identidade aparece como um (re)fazer e um (re)fazer-se contínuo. 
Um exemplo da intolerância à diferença é o caso de Anna, jovem de 14 anos, 1,65m, 104kg. 
Anna, diante da imagem negativa e inadequada da obesidade, começa a apresenta um quadro de 
retraimento social, oscilando entre a timidez e a tristeza. Passa a não querer ir à escola, a não se relacionar 
com pessoas fora de seu seio familiar, a ter medo de ir à rua. Chega ao consultório arredia e assustada, 
revela não ter o desejo de estar ali e, ao ser indagada sobre qual seria o seu desejo, expressa ser o de fazer 
amigos. Questionada sobre qual seria a dificuldade em fazer amigos, responde: “Não me aceitam como eu 
sou - gorda não gostam de mim, não me acham legal. Eu tenho vergonha porque todo mundo me olha 
como se eu fosse uma coisa muito horrível. Quando eu saía e tinha de pegar ônibus, eu ficava muito 
nervosa se eu ia passar ou não na roleta. Ser gorda é terrível”. O sentimento de inadequação gera em 
Anna a sensação de fracasso, fazendo com que ela se feche em um círculo restrito de relações, excluindo-
a das relações sociais mais amplas. Quando Anna se refere ao seu desejo, revela, em primeiro lugar, a 
necessidade de ter amigos e não a necessidade de emagrecer. A imagem da obesidade cria uma 
identificação com a inferioridade em relação àqueles que são eleitos como elegantes e belos, levando 
Anna a uma atitude de retração e de não-movimento no mundo, descaracterizando sua condição de sujeito 
dinâmico e histórico. 
Isso quer dizer que a emergência da identidade depende da experiência e do olhar do sujeito no 
mundo e sobre o mundo. Nesse sentido, a linguagem pode dar ao sujeito a possibilidade de relacionar- se 
com o mundo, com as coisas do mundo. No entanto, a linguagem não pode ser apreendida como um 
sistema de normas fixas e abstratas ou, simplesmente, atividade verbal, mas como o lugar das interações 
sociais de onde os sentidos emergem e passam a interferir no olhar desses sujeitos sobre si, sobre os 
outros e sobre o mundo. O homem é um ser social, e a linguagem, o instrumento da rede de relações que 
produzem a cultura e a história. A linguagem é toda e qualquer forma de expressão, está presente na vida 
de diferentes maneiras, na arte, na música, no cinema, nos gestos, nas roupas, no olhar, na emoção, no 
sonho, no silêncio, na violência, enfim, nas situações concretas de vida e nas relações subseqüentes 
advindas da prática dialógica. 
Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, 
coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis etc. A palavra está 
sempre carregada de um conteúdo ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos as 
palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós ressonâncias ideológicas ou con-
cernentes à vida. (BAKHTIN, 1992: 95) 
A expressão só tem sentido se for tomada entre o conteúdo - o. que faz parte da subjetividade - e a 
objetivação exterior - a quem e a que se dirige. Ela é determinada pelo fato de proceder de alguém e pelo 
fato de que se dirige a alguém, configurando-se como produto da inter-relação entre o interlocutor e o 
ouvinte, definindo-se, apenas e somente, em relação ao outro. Qualquer que seja a enunciação, ela é 
socialmente dirigida, expressando uma necessidade de engajar-se em um intercâmbio significativo com o 
mundo e com os outros. É, na verdade, como nos mostra Winnicott, “o terreno em comum das relações 
afetivas” (WINNICOTT, 1975: 79). Relações afetivas são encaradas, aqui, como tudo aquilo que afeta o 
outro e a nós mesmos. 
Outro exemplo de como o conceito determina a ação pode ser ilustrado com o caso de Luiza em 
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uma interação com sua professora e os outros que ecoa no interior de cada um deles e nos espaços das 
relações sociais. Dia de prova. Luiza responde à primeira questão e entrega a prova. A professora 
contesta, dizendo conhecer que ela sabia as respostas. Luiza mantém sua posição. Próxima prova, 
nenhuma questão respondida. A mãe de Luiza é chamada à escola e questionada se algo diferente estaria 
acontecendo: uma separação, dificuldades financeiras, mudanças radicais. Nada de novo. A professora diz 
para a aluna: “Se você continuar assim, vai tirar zero em tudo”. A aluna retruca: “E o que é que tem? Meu 
irmão só tira nota baixa e eu adoro ele”. No outro dia, a mãe de Luiza informa ter conversado com a filha 
e ter descoberto seu “desinteresse” pelos estudos. Dias antes, Luiza havia solicitado à professora que 
copiasse um dever para ela, a professora negou, alegando que ela não precisava de ajuda. Luiza reclamou 
que ela ajudava Andressa, uma colega de classe. A professora justifica que Andressa era muito lenta e, se 
não fosse ajudada, não poderia fazer o dever em casa. 
Se tomarmos a justificativa da criança para os zeros que levaria (“Meu irmão só tira nota baixa e 
eu adoro ele") e o fato de a professora ajudar os que não têm tão bom desempenho, é possível que Luiza 
tenha lançado mão da lógica de que é preciso “ir mal” para ser cortejada e premiada. Essa situação mostra 
que a linguagem não apenas designa os elementos da realidade, mas também fornece formas de ordenar 
essa realidade em categoriasconceituais que irão interferir diretamente nos comportamentos 
subseqüentes. Os comportamentos são produto da comunicação entre os sujeitos que configuram a 
história da humanidade. A partir da inserção no contexto cultural, da interação com membros de seu 
grupo e da participação em práticas sociais, as pessoas incorporam as formas de comportamento 
consolidadas na experiência que se moldam no decorrer da vida em sociedade. 
Assim, a construção do sujeito (seus modos de sentir, pensar e agir) baseia-se na experiência que 
se acumula em um espaço e em um tempo específicos - o sujeito integrado em uma dada cultura 
estabelece critérios que orientam os comportamentos e as visões de mundo - e na vivência imediata, cuja 
impressão é assimilada às pressas, produzindo efeitos imediatos no pensamento de cada um e 
evidenciando as marcas deixadas pelas “coisas" na ação que gera o futuro. 
A marca deixada pelas coisas na subjetividade pode ser facilmente percebida quando refletimos 
sobre a hiperatividade, forma de atuar no mundo que vem sempre carregada de muitos aspectos negativos. 
Uma criança hiperativa acaba sendo permanentemente regulada pelo desejo daqueles que com ela 
convivem, dificultando a construção de regras de auto-regulação. 
Esse é o caso de Sílvio, 7 anos, considerado bastante inteligente, muito agitado e pouco tolerante 
às regras. Na escola, notas ótimas, mas comportamento duvidoso, pois acaba de fazer o dever com muita 
rapidez e investe o tempo restante em perambular pela sala e falar com os amigos. Por isso, a professora 
está sempre chamando sua atenção: “Vá sentar, não atrapalhe o fulano, vê se não faz barulho, olhe a 
confusão que você está criando, não vê que você está atrapalhando, olhe derrubou tudo de novo...”. Em 
casa, não é muito diferente: “Pare de correr, vá fazer o que sua mãe está mandando, pare de implicar com 
seu irmão, não faça tanto barulho, não mexa nisso, você precisa aprender a não derramar o leite...”. 
Qualquer palavra dirigida a Sílvio vem carregada de um conteúdo simbólico negativo e destina-se ao 
controle do corpo do menino sob a égide do pensamento do outro. No entanto, Sílvio só pode construir 
novas possibilidades de ação se tiver espaço para ver-se, ele mesmo, como o sujeito de seu próprio desejo 
- regulador de sua ação em direção ao outro — nessas interações com o mundo e com os outros. 
Os comportamentos humanos são frutos de um processo de desenvolvimento que envolve a 
interação do sujeito com o meio físico e social em que vive. Tal interação se dá pela mediação possibili-
tada por dois tipos de elementos: os instrumentos e os signos. Os instrumentos regulam a ação do homem 
sobre os objetos, e os signos, a ação sobre o psiquismo. O signo é o que nos possibilita substituir o real 
por representações, permitindo-nos uma abstração do tempo e do espaço presentes - lembrar das coisas 
mesmo na ausência delas mesmas, fazer planos, imaginar, ter intenções. E os sistemas de representação 
da realidade são socialmente construídos. É o grupo cultural que fornece as formas de perceber e de 
organizar o real. Os sistemas simbólicos permitem, além da comunicação entre os homens, a 
internalização de significados, a percepção e a interpretação de objetos, situações e fatos presentes no 
mundo. 
A partir de sua inserção em um dado contexto cultural, das relações que estabelece com os 
membros de seu grupo familiar e da sua participação em práticas culturais, a criança incorpora as formas 
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de comportamento e vai se constituindo como pessoa, formando sua identidade, e assim orienta sua ação 
no mundo. Sob essa ótica, tanto a interação e a interlocução entre os sujeitos quanto a formação dos 
conceitos serão os mediadores das aprendizagens e das relações subseqüentes. Mesmo antes do 
nascimento, a criança já carrega o peso das expectativas que os pais têm em relação a ela. A partir daí, 
estabelecem-se as inter-relações que irão dar forma ao sujeito; configura-se o interjogo de papéis que 
definirá cada sujeito, cada família, cada grupo social. Todos - pai, mãe, criança, educadores... sujeitos 
sociais - cada qual desempenha seu papel na estruturação de seu grupo, contribuem para a construção de 
significados que constituirão a esfera cultural e o mundo interno de cada um. 0 indivíduo introjeta nas 
experiências os significados, a partir dos vínculos que estabelece com as pessoas. 0 mundo interno é 
constituído por um processo de progressiva internalização dos objetos e dos vínculos, cujo processo se 
encontra em permanente interação com o mundo exterior e interfere constantemente na constituição da 
identidade e da autonomia do indivíduo. 
A ação humana funda-se na cooperação entre indivíduos. A forma como homens, mulheres, 
crianças, jovens participam na vida determina o que pensam. Mas, como obviamente nem todos agem da 
mesma forma e não pensam da mesma maneira, geram-se crenças distintas e, portanto, verdades 
diferentes. A partir da experiência social, traços ideológicos podem ser percebidos mediante mecanismos 
de identificação e de diferenciação. Quando nos identificamos e nos diferenciamos, confirmamos aquilo 
que se considera a verdade, embora, muitas vezes, não se assemelhe à verdade do outro. Segundo Chaui 
(1972:17), a operação intelectual de criação de universais é própria da ideologia. Muitas vezes, essa 
ideologia é assumida por nós sem ser percebida conscientemente, fazendo com que idéias e valores sejam 
aceitos como verdades absolutas, como universais. Essa universalidade de idéias e valores confirma que 
nossos atos têm uma realidade exterior representada em condutas e significados que devem ser avaliados 
de forma crítica e questionadora se o objetivo for a transformação. 
Mais uma vez, recorremos a Bakhtin para ressaltar o valor da palavra na coloração da verdade: 
Os enunciados exprimem e realimentam a ideologia do cotidiano. (...) A ideologia do cotidiano se 
expressa por meio de cada um de nossos atos, gestos ou palavras, permitindo que os sistemas 
ideológicos constituídos cristalizem-se a partir dela [a palavra]. (...) Só a corrente da interação 
social fornece à palavra a luz de sua significação. (...) Ignorar a natureza social e dialóqica do 
enunciado é apaqar a profunda liqação que existe entre a linquagem e a vida. (BAKHTIN, 
1992:130,131) 
Bakhtin nos chama à atenção para o caráter ideológico do enunciado e propõe que o conteúdo da 
realidade se expressa nos próprios objetos, gestos, olhares, movimentos, constituindo-se em signos de 
uma dada situação histórica e cultural. Afirma que todo signo é construtor e constituidor dos aconte-
cimentos históricos e sociais e das subjetividades fundadas na dinâmica da cultura. 
Por exemplo, a condição de inclusão ou de exclusão do sujeito não diz respeito somente à 
identificação de seus limites e de suas possibilidades de ser e agir, mas também à identificação com 
modelos expressos em um “inconsciente” social e político coletivos. Isso quer dizer que a mídia, as 
informações veiculadas pelos meios de comunicação, os sistemas ideológicos não param de interferir na 
construção das subjetividades e, conseqüentemente, dos comportamentos delas advindos. 
Isso nos lembra Márcio - 16 anos, morador da comunidade do morro da Mineira, em Santa 
Teresa, participante de um projeto de rodas de leitura - que, após a leitura da fábula de Esopo “A raposa e 
a máscara”, comenta: “Mas para a gente ser alguém não basta ter coisas dentro da gente, tem que parecer 
por fora também, senão a gente é chamado de otário”. Márcio revela em sua fala a dor e o sofrimento dos 
que se sentem excluídos por não terem acesso aos bens de consumo valorizados na sociedade e nas 
imagens de sucesso. É claro que ele entende o valor da ética e das condutas, mas também conhece 
claramente os mecanismos

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