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Teoria do Direito Penal do Inimigo de Günther Jakobs

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O DIREITO PENAL DO INIMIGO SEGUNDO GÜNTHER JAKOBS*
Por AMIR ROBERTO SALMEN
Para entendermos um pouco de que maneira GÜNTHER JAKOBS formula sua
teoria do Direito Penal do Inimigo temos que fazer uma análise sobre os componentes estruturais e
as bases de sua teoria.
Para Günther Jakobs a finalidade do direito penal nasce a partir da teoria de HEGEL,
segundo a qual “a ordem jurídica é a manifestação da vontade geral”. Quando alguém comete um
delito, segundo as palavras de HEGEL esse alguém NEGA a vontade geral. A vontade geral forma a
ordem jurídica e quando alguém comete um delito esse delinquente nega a vontade geral, e a partir
desse pensamento, para HEGEL, surge a pena criminal para por sua vez NEGAR a vontade do
delinquente. O delinquente nega a vontade geral e a pena nega a vontade do delinquente.
Nas palavras de HEGEL:
“A PENA É A NEGAÇÃO DA NEGAÇÃO DO DIREITO”, por isso a pena surge
como forma da manutenção da vigência do contrato social. A pena surge para reafirmar essa
vontade geral, a ordem jurídica.
A teoria de Gübther Jakobs se baseia nas teorias dos sistemas de Niklas Luhmann. 
Para Niklas Luhmann o direito é uma estrutura que orienta a sociedade e as normas
seriam uma generalização dessas expectativas.
Para a teoria das expectativas as sociedades modernas são complexas e para diminuir
essas complexidades criam-se sistemas. Uma das criações desse sistema é a EXPECTATIVA. A
expectativa é aquilo que você espera que aconteça e por isso você deposita uma confiança no outro.
Por exemplo, quando você vai a um espetáculo de teatro você cria uma expectativa de que os atores
irão atuar conforme o enredo proposto, ou seja, você confia que o outro irá agir dentro das regras
estabelecidas. Assim, para NIKLAS o direito tem que criar mecanismos para que a sociedade possa
continuar acreditando nessas expectativas.
Essa é a teoria dos sistemas de NIKLAS que se divide em duas espécies:
expectativas cognitivas e expectativas normativas. A diferença entre elas está ligada na reação da
defraudação ou frustração da expectativa. A sua expectativa pode ser defraudada e a diferença entre
elas está na maneira como vamos reagir a essa defraudação. Daí surgem 2 hipóteses:
1ª) ou se muda o comportamento humano diante de uma defraudação de uma
expectativa, ou
2ª) se mantém a expectativa da norma.
Na expectativa cognitiva nós temos uma relação do homem com a natureza, por
exemplo, uma casa que desaba em uma inundação por força da natureza. De maneira que, diante de
uma frustração da expectativa cognitiva ocorre uma mudança no comportamento humano, ex: uma
casa desabou por inundação, então muda-se o comportamento humano construindo outra casa.
De maneira diferente são as expectativas normativas. Nesta nós temos a relação do
homem com os demais integrantes da interação social. Como se reage a uma defraudação de uma
expectativa normativa? Se aplica uma sanção penal como forma de manutenção dessa expectativa.
Quando alguém comete um delito se aplica uma sanção penal como forma de demonstrar a todo
mundo daquela sociedade que eles podem seguir suas vidas normalmente confiando na expectativa
de que não mais haverá prática de crimes.
A isso NIKLAS chamou de EXPECTATIVA CONTRAFÁTICA, isto é, o Estado
aplica uma sanção penal para demonstrar a todos na sociedade que eles podem seguir suas vidas
normalmente na expectativa de que não mais serão praticados crimes. Então surge a sanção penal
como manutenção do modelo do contrato social.
A partir daí JAKOBS começa a delinear sua tese. Para ele o que existe é a chamada
PREVENÇÃO GERAL POSITIVA, dizendo que “o que direito protege não é um bem jurídico, o
que ele protege são as expectativas normativas para a construção da sociedade”. Para JAKOBS o
bem jurídico não é um dano potencial à vida, ao patrimônio, a integridade física, o bem jurídico é a
vigência da norma, portanto, o direito penal se preocupa com a vigência da norma, isto é, se eu
pratico um crime estou violando a vigência da norma. Assim, para JAKOBS o mandamento
normativo “não é não viole um bem, é não viole o seu papel de cidadão fiel ao direito, não viole a
vigência da norma”. E ele demonstra sua teoria com o seguinte exemplo: em uma tentativa
incruenta mesmo sem atingir o bem jurídico vida a pessoa vai ser condenada por tentativa de
homicídio, e isso demonstra que o que foi violado foi a norma vigente e não o bem jurídico..
Assim, segundo JAKOBS o crime é a negação da vigência da norma e a pena é a
negação da negação da vigência da norma (vai de encontro com o pensamento de HEGEL).
As bases contratualistas sedimentam a teoria de JAKOBS. Quais são os argumentos
contratualistas (Rousseau, Immanuel Kant, Thomas Hobbes).
Rousseau dizia que o malfeitor que ataque o direito social deixa de ser membro do
Estado.
Para esses pensadores todo delinquente é um inimigo do Estado e portanto deverá ser
excluído da sociedade.
Thomas Hobbes exclui o delinquente do contrato social mas o mantém como
cidadão. Para Hobbes, o delinquente deve ser mantido em seu status de pessoa (ou de cidadão), a
não ser que cometa delitos de “alta traição”, os quais representariam uma negação absoluta à
submissão estatal, então resultando que esse indivíduo não deveria ser tratado como “súdito”, mas
como “inimigo”.
Immanuel Kant preconizava que quem não se deixa obrigar pela constituição cidadã
deve ser tratado como inimigo e não como pessoa.
Tendo como base os contratualistas com arrimo nas idéias de Kant, é em Hobbes que
ela se identifica com mais força. Hobbes via o inimigo como aquele que rompe com a sociedade
civil e volta a viver em “estado de natureza”, que para o filósofo é o estado de guerra. Neste sentido,
JAKOBS reconhece a existência de dois direitos penais. Um direito penal do cidadão e outro direito
penal do inimigo.
No direito penal do cidadão nós temos pessoas que não cometem crimes de maneira
persistente, cometem um erro, um desvio na sua conduta, não persistem e não tem habitualidade no
crime, e por isso mantém sua condição de cidadão.
No direito penal do inimigo temos pessoas que fazem do crime uma habitualidade,
um estilo de vida e por isso devem ser tratados como inimigos.
Assim, segundo JAKOBS o direito penal pode proceder de duas formas. Pessoas que
cometem um erro, sem habitualidade, o estado espera eles agirem cometendo um crime para aplicar
uma pena e reafirmar o direito.
Já do outro lado, existem pessoas que querem destruir o ordenamento jurídico, e
neste caso o estado não pode tratá-los como cidadãos mas como inimigos do estado porque
destroem a vigência da norma. O Estado não espera elas agirem, deve agir antes, o inimigo deve ser
neutralizado. É o direito penal do autor em detrimento do direito penal do fato. É a periculosidade
do agente que interessa e não a culpabilidade.
A idéia é neutralizar o inimigo antes que ele possa agir com habitualidade,
profissionalismo. Quem não presta uma segurança cognitiva mínima de que vai se adequar às
normas legais não pode ser tratado como pessoa.
Vai além, JAKOBS sustenta a exclusão do inimigo, deve ser excluído da sociedade, o
reconhece como não-pessoa.
O ser humano é o resultado do processo natural. A pessoa é um produto social, ela é
uma unidade ideal de direitos e deveres. A pessoa é a destinatária das expectativas normativas
(Niklas Luhmann).
Quem são os inimigos para JAKOBS. São pessoas que participam de crime
organizado, terrorismo, crimes sexuais e imigração ilegal.
Por sua vez, SILVA SANCHES alega que as características dos inimigos do estado
são a reincidência, a habitualidade, o profissionalismo e as organizações criminosas.
No direito penal do inimigo a finalidade é a manutenção da vigência da norma, é a
neutralização do inimigo não-pessoa.
Daí surgea necessidade da criação de um direito penal diferenciado nas suas regras,
normas e princípios e se reconhece algumas medidas excepcionais, porém, legais. Essa tese para
JAKOBS tem caráter excepcional e necessita adoção de algumas medidas penais e outras
processuais-penais.
Medidas penais adotadas ao inimigo: a) proliferação de crimes de risco
desvinculados de qualquer lógica de lesividade; b) aumento de criminalização de atos preparatórios;
c) agravação das penas dos crimes independentemente de qualquer proporcionalidade; d)
desproporcionalidade das penas; e) numerosas leis que se denominam leis de combate (ao crime
organizado, ao tráfico de drogas).
Medidas processuais-penais: a) restrição de garantias e direitos processuais aos
imputados; ex: cerceamento de defesa; b) alargamento dos prazos de prisão preventiva; c)
ampliação dos prazos de prisão policial para investigação, ex: aumento da prisão temporária nos
crimes hediondos; d) previsão de crimes sem nenhum motivo; e) inversão do ônus da prova; f)
generalização de métodos de investigação e provas excepcionais, ex: interceptação telefônica pela
PM, busca e apreensão noturna, agente infiltrado, etc; g) normas de direito penitenciário que
recrudescem as condições de classificação dos internos, ex: RDD; h) normas que limitam a
concessão do livramento condicional, ex: crimes hediondos 2/5 e 3/5.
* Base de informações extraídas da palestra ministrada pelo professor Gabriel Habib

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