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1 FACULDADE DAMÁSIO DE JESUS FELIPE SANCHES MARTORELLI DIREITO PENAL DO INIMIGO São Paulo 2016 2 FELIPE SANCHES MARTORELLI DIREITO PENAL DO INIMIGO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Damásio de Jesus como requisito para a obtenção do título de Pós-Graduação em Direito Penal e Processual Penal ORIENTADOR: PROFESSORA MS. MARIA FERNANDA SOARES MACEDO São Paulo 2016 3 MARTORELLI, Felipe Sanches Direito Penal do Inimigo. / Felipe Sanches Martorelli São Paulo, 2016 69 f. Referências: p. 66-69. Trabalho de Conclusão de Curso (Pós-graduação em Direito Penal e Processual Penal) – Faculdade Damásio de Jesus, 2016, São Paulo. 1. Direito Penal. Direito Penal do Inimigo. Direito Penal do Inimigo Aplicado. Processo Penal do Inimigo. I. Título 4 FELIPE SANCHES MARTORELLI DIREITO PENAL DO INIMIGO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Damásio de Jesus como requisito para a obtenção do título de Pós-Graduação em Direito Penal e Processual Penal Aprovado em BANCA EXAMINADORA PROFESSORA MS. MARIA FERNANDA SOARES MACEDO FACULDADE DE DIREITO DAMÁSIO DE JESUS PROFESSOR FACULDADE DE DIREITO DAMÁSIO DE JESUS _______________________________________________________________ PROFESSOR FACULDADE DE DIREITO DAMÁSIO DE JESUS 5 Aos meus pais e irmã que sempre me apoiaram em todos os momentos. 6 AGRADECIMENTOS Primeiramente, gostaria de agradecer à Professora Ms. Maria Fernanda Soares Macedo pela orientação que tornou possível a conclusão da presente monografia. Também aos professores do curso Damásio, a quem tenho o privilégio de prestigiar desde a graduação, nos cursos para aprovação na OAB, na presente Pós-graduação e nos cursos regulares para futura aprovação em concurso. Ao professor Alexandre Rocha Almeida de Moraes, por suas aulas ministradas na Pós que nos colocavam para pensar e despertaram em mim a vontade de saber sempre mais. Aos meus amigos da Pós, com quem tive o prazer de participar dos seminários e discutir sobre os mais variados temas de direito penal ou não. E por fim, à minha família, pai, mãe e irmã, pelo apoio incondicional e por servirem de alicerce nos momentos difíceis e de companhia nos momentos felizes. À minha namorada, Carolina, que tanto me incentivou, apoiou e perdoou as frequentes ausências nos finais de semana. 7 RESUMO Este trabalho tem como objetivo estudar a Teoria do Direito Penal do Inimigo. Para isso, serão estudados os alicerces da teoria, passando da história do direito penal e cidadania até as teorias da pena que deram origem à teoria de Jakobs. Depois, analisaremos as suas características e aplicação nos sistemas legais brasileiro e internacional. Finalmente, definiremos o inimigo e o cidadão, segundo Jakobs e apresentaremos uma forma de processo penal excepcional que deve ser aplicada ao inimigo. Palavras-chave: Direito penal do inimigo, teorias da pena, inimigo, cidadania, processo penal, Gunther Jakobs. 8 ABSTRACT This work aims to study the theory of the Criminal Law of the Enemy. To make it possible, we will study the foundations of the theory, going through the history of criminal law and citizenship to the theories of punishment that gave rise to the theory of Jakobs. After this, we will look at the characteristics of this school of thought and its application in the legal system, both national and international. Finally, we will study who is the enemy and the citizen treated by Jakobs, and then we will present a form of exceptional criminal proceedings that should be applied to the enemy. Keywords: Criminal Law of the Enemy, theories of punishment, enemy, citizenship, criminal process, Gunther Jakobs. 9 SUMÁRIO 1 - INTRODUÇÃO ............................................................................................ 10 2 – PANORAMA HISTÓRICO .......................................................................... 13 2.1 – O Direito Penal e a História do Direito ................................................. 13 2.2 – A Cidadania.......................................................................................... 15 2.3 – Os Períodos do Direito Penal ............................................................... 18 2.4 – Direito Penal e a Pena ......................................................................... 21 2.4.1 – O Princípio Da Legalidade ............................................................. 22 2.5 – Teorias Legitimadoras .......................................................................... 28 2.5.1 – A Teoria Retributiva da Pena ......................................................... 28 2.5.2 – A Teoria da Prevenção .................................................................. 31 2.5.3 – O Funcionalismo ............................................................................ 33 2.6 – O Direito Penal do Autor ...................................................................... 36 3 – O DIREITO PENAL DO INIMIGO ............................................................... 38 3.1 – As Velocidades do Direito Penal .......................................................... 38 3.2 – A Teoria do Direito Penal do Inimigo .................................................... 39 3.3 – O Cidadão ............................................................................................ 47 3.4 – O Inimigo .............................................................................................. 49 4 - O DIREITO PENAL DO INIMIGO APLICADO ............................................. 52 4.1 – Ordenamento Jurídico Brasileiro .......................................................... 52 4.1.1 – Lei de Crimes Hediondos ............................................................... 52 4.1.2 – Regime Disciplinar Diferenciado .................................................... 53 4.2 – Legislação Estrangeira ......................................................................... 55 4.2.1 – Estados Unidos .............................................................................. 56 4.2.3 – Europa ........................................................................................... 57 5 - O PROCESSO PENAL DO INIMIGO .......................................................... 59 6 - CONCLUSÃO ............................................................................................. 63 7 – BIBLIOGRAFIA .......................................................................................... 66 10 1 - INTRODUÇÃO A presente monografia foi elaborada para estudar a teoria do Direito Penal do Inimigo, desenvolvida e defendida pelo jurista alemão Gunther Jakobs no fim do século XX. Para a análise da teoria, o estudo se concentrou em alguns institutos basilares do direito penal. Primeiro, estuda-se a história do direito penal e como ele se relaciona com a sociedade, estudo que se faz importante, na medida em que entendemos o direito penal como uma norma basilar da sociedade na qual está inserido. Depois, estuda-se a cidadania, conceito importante na teoria dde Jakobs e que deve ser explicado de maneira introdutória para que se possa melhor identificar as ideias trazidas pelo jurista. Além da cidadania, vemos também a evolução histórica do Direito Penal, seus períodos e as diferentes formas de tratar a pena, estudando-se, inclusive, o princípio da legalidade e seus derivados. Ainda falando sobre a pena,para melhor análise da teoria do Direito Penal do Inimigo, o presente trabalho focou nas teorias que deram origem ao pensamento aqui estudado, veremos primeiramente a teoria retributiva da pena, que constitui a função da pena como retribuir o mal causado pelo agente; depois a teoria da prevenção da pena, que dita que a pena deverá ser aplicada para prevenir que outros delitos ocorram, também veremos o funcionalismo, segundo o qual a pena deve ser aplicada com uma função essencial para a conservação da sociedade. Logo após, apresentamos as ideias que constituem o chamado Direito Penal do Autor, que leva em conta as características de um agente para puni-lo, ao contrário do Direito penal do Fato, que leva em conta o fato cometido. Este estudo se faz importante, pois o direito penal do inimigo está impregnado com ideias que se baseiam no direito penal do autor. 11 Depois, passamos o foco para o estudo da teoria do Direito Penal do Inimigo, explicando como surgiu a teoria, quais são seus aspectos e seus motivos de existir, ressaltando as diferenças da teoria com o Direito Penal do Cidadão, apresentado também por Jakobs. Durante esta explicação, estudaremos as chamadas velocidades do direito penal, na qual o direito penal do inimigo está inserido como a terceira velocidade. Este conceito de velocidades foi elaborado por Silva-Sanchéz que leva em conta o tempo que o Estado leva para punir um criminoso e se suas garantias são respeitadas durante o processo. Para finalizar a exposição da teoria, define-se o cidadão e o inimigo, na visão de Gunther Jakobs. Esta definição é muito importante, pois é ela que permite identificar quais motivos e razões permitem que um indivíduo seja tratado como inimigo ou cidadão e qual a forma do direito penal que deve ser aplicada a este indivíduo. Depois de definido o inimigo, aparece um novo estudo importante, que diz respeito ao Direito Penal do Inimigo aplicado, que se faz importante ao definir como a teoria se aplicaria em um ordenamento jurídico, explicando e trazendo exemplos de institutos na legislação brasileira e estrangeira que se aproximam da teoria formulada por Jakobs. Vale ressaltar que estes institutos são aqueles que seguem um padrão de imediatismo e severidade, valendo-se da supressão de garantias e adiantamento da punibilidade. Por fim, depois de analisadas todas as características materiais da teoria aqui apresentada, deve-se focar no estudo do chamado Processo Penal do Inimigo. Conforme apresentaremos, as peculiaridades da teoria ora apresentada se mostram incompatíveis com o Direito processual penal comum, e por isso, surge o processo penal do inimigo, como uma derivação, de caráter excepcional e que possui características peculiares, justificadas pela necessidade de aplicar normas materiais também de caráter excepcional, sem se preocupar se as normas constitucionais e processuais sejam inteiramente respeitadas. 12 Após tal explanação acerca do assunto, a presente monografia é encerrada apresentando-se as conclusões do autor sobre o assunto. 13 2 – PANORAMA HISTÓRICO 2.1 – O Direito Penal e a História do Direito O estudo do Direito Penal está intimamente relacionado ao estudo da sociedade. Desta forma, pode-se dizer que, com a evolução do homem e de sua convivência em sociedade, o direito penal sempre acompanhou de perto tal evolução, passando por diversas transformações. Tanto é assim, que quando se estuda nas universidades a matéria denominada de “História do Direito”, a maior parte do que se vê, são matérias e dispositivos de direito penal que eram aplicados em determinadas sociedades, como no Código de Hamurabi, Manu, ou até mesmo nas próprias Ordenações do Reino, aplicadas aqui no Brasil, em comparação aos dispositivos atuais. Neste contexto, é fácil perceber que o direito penal se trata na verdade de um reflexo da sociedade na qual é aplicado, isto porque conforme surgem e se aperfeiçoam as relações humanas, o direito penal deve se adaptar a estas transformações. E assim o faz, através de diversas teorias e correntes que devem ser sempre estudadas tendo como espelho a sociedade em que se aplicam. O entendimento de Magalhães Noronha ajuda a exemplificar tal ideia: “A história do Direito Penal é a história da Humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou. (...) A pena, em sua origem, nada mais foi que vindita, pois é mais que compreensível que naquela criatura, dominada pelos instintos, o revide à agressão sofrida devia ser fatal, não havendo preocupações com a proporção, nem mesmo com sua justiça. Em regra, os historiadores consideram várias fases da pena: a vingança privada, a vingança divina, a vingança pública e o período humanitário. Todavia deve advertir-se que esses períodos não se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro desaparece logo, ocorrendo, então, a existência concomitante dos princípios característicos de cada um: uma fase penetra a outra, e, durante tempos, esta ainda permanece a seu lado.”1 Assim, podemos fazer a seguinte comparação entre duas sociedades e a forma como o direito penal é aplicado. 1 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal: Introdução e Parte Geral. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 1978. v. I. p. 29. 14 Segundo o professor André Estefam, nas Ordenações Filipinas “As penas impostas eram, em sua maioria, cruéis: morte precedida de tortura, morte para sempre, mutilação, marca de fogo, açoite, degredo, entre outras”2. Tanto é assim que, em 1792, sob vigência das ordenações Filipinas, Tiradentes foi condenado à chamada morte para sempre como podemos observar no seguinte trecho de sua sentença: “Portanto condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Sebolas aonde o Réu teve as suas infames práticas e os mais nos sitios (sic) de maiores povoações até que o tempo também os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infamia deste abominavel Réu (...)”.3 Hoje, conforme o artigo 5º, inciso XLVII da Constituição Federal de 1988, não podem existir penas de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados e nem penas cruéis4, o que demonstra a evolução do direito penal, de acordo com a sociedade na qual está inserido. A partir de tal análise, entende-se que, conforme a evolução da sociedade, alteram-se os padrões do que pode ser considerado como condutas aceitáveis. Tanto é assim, que com o passar do tempo, o direito penal passa a ser um limite para o convívio social, além de funcionar como forma de proteção ao bem jurídico individual e coletivo. Ao entender que o Direito Penal está sempre em mutação conforme a mudança das relações sociais, devemos considerar que o Direito Penal possui um papel muito importante como base da sociedade. Tanto é assim que, em toda sociedade constituída, existe uma norma penal que tem como2 Estefam, André. Direito Penal, Parte Geral, 5a edição, São Paulo, Saraiva, 2016. Material disponibilizado como apoio na Pós-graduação da Faculdade de Direito Damásio de Jesus. 3 Trecho da Sentença de Tiradentes. Disponibilizado como apoio na Pós-graduação da Faculdade de Direito Damásio de Jesus. 4 BRASIL. Constituição Federal, 1988. 15 papel proibir as condutas inadequadas naquele meio e estabelecer a punição para os transgressores da norma. A partir dessa explanação, podemos passar à análise da cidadania que, assim como o Direito Penal, é inerente à sociedade e, portanto, se desenvolve e adapta conforme o meio na qual está inserida. 2.2 – A Cidadania Para o estudo da Teoria do Direito Penal do Inimigo, faz-se muito importante o estudo da própria cidadania, já que esta serve como base fundamental para o pensamento de Jakobs, que inclusive afirma existir uma separação do Direito Penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo. Para que possamos nos aprofundar no estudo, importante trazer a ideia de Jaime Pinsky: “Cidadania não é uma definição estanque, mas um conceito histórico, o que significa que seu sentido varia no tempo e no espaço. É muito diferente ser cidadão na Alemanha, nos Estados Unidos ou no Brasil (para não falar dos países em que a palavra é tabu), não apenas pelas regras que definem quem é ou não titular da cidadania (por direito territorial ou de sangue), mas também pelos direitos e deveres distintos que caracterizam o cidadão em cada um dos Estados-nacionais contemporâneos. Mesmo dentro de cada Estado-nacional o conceito e a prática da cidadania vêm se alterando ao longo dos últimos duzentos ou trezentos anos. Isso ocorre tanto em relação a uma abertura maior ou menor do estatuto de cidadão para sua população (por exemplo, pela maior ou menor incorporação dos imigrantes à cidadania), ao grau de participação política de diferentes grupos (o voto da mulher, do analfabeto), quanto aos direitos sociais, à proteção social oferecida pelos Estados aos que dela necessitam.5” A partir de tal ideia, já podemos concluir que a cidadania, assim como o próprio direito penal é um conceito, cujas características e forma se desenvolvem e adaptam a cada meio social na qual é inserido e que pode variar de uma época para outra. 5 PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). História da Cidadania. 4. Ed. São Paulo: Contexto, 2008, p. 09. 16 Tanto é assim, que Pinsky afirma de forma muito elucidativa que o conceito e a prática de cidadania se alteram ao longo do tempo e não possui uma definição padrão aplicada a qualquer sociedade em qualquer tempo. Em razão dessa característica, o conceito de cidadania sofre diversas mutações com o decorrer da história e com certeza, ainda sofrerá tais mutações na sua constante busca por se adaptar à sociedade. Outro entendimento que ajuda a reforçar que a cidadania é como uma identidade de cada povo, desenvolvida de acordo com a evolução das relações sociais e dos direitos que ali foram se aperfeiçoando, é o de José Murilo de Carvalho: “O surgimento sequencial dos direitos sugere que a própria ideia de direitos, e, portanto, a própria cidadania, é um fenômeno histórico. O ponto de chegada, o ideal da cidadania plena, pode ser semelhante, pelo menos na tradição ocidental dentro da qual nos movemos. Mas os caminhos são distintos e nem sempre seguem linha reta. Pode haver também desvios e retrocessos, não previstos por Marshall. O percurso inglês foi apenas um entre outros. A França, a Alemanha, os Estados Unidos, cada país seguiu seu próprio caminho. O Brasil não é exceção. Aqui não se aplica o modelo inglês. Ele nos serve apenas para comparar por contraste. Para dizer logo, houve no Brasil pelo menos duas diferenças importantes. A primeira refere-se à maior ênfase em um dos direitos, o social, em relação aos outros. A segunda refere-se à alteração na sequencia em que os direitos foram adquiridos: entre nós o social precedeu os outros.6” Contudo, apesar da ideia de que cada país e cada sociedade possuem o seu próprio conceito de cidadania, existem fatos históricos que colaboraram com o desenvolvimento e a consolidação da cidadania. Tais marcos históricos se relacionam com as primeiras grandes batalhas sociais que trouxeram alguma proteção aos direitos das pessoas e a proteção à própria dignidade da pessoa humana. Nas palavras da Professora Maria Fernanda Soares Macedo: “As Revoluções (Inglesa, Americana e Francesa) foram marcos de extrema importância para a proteção dos seres humanos, bem como na expansão de seus direitos. Dentre as inúmeras conquistas para a consagração dos direitos (em plano individual e coletivo), são de vital 6 CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 13. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 11-12. 17 importância a igualdade, a liberdade e a universalidade dos mesmos para os indivíduos.7” Ainda sobre o assunto, o Professor Humberto Barrionuevo Fabretti leciona: “Entretanto, não se nega que o produto dessa revolução é uma “cidadania liberal”, que apesar de ter sido o primeiro passo para romper com o binômio soberano-súdito, onde o último só tinha deveres e o primeiro direitos, era ainda uma cidadania completamente limitada e excludente, que diferenciava entre “cidadãos ativos” e “cidadãos passivos”, “cidadãos com posse” e “cidadãos sem posse”, não atingindo o seu valor universal para a totalidade dos homens em termos de igualdade. Já forjado um conceito, ainda que restritivo, de cidadania, houve uma boa cooperação dos Estados Unidos da América para o seu aperfeiçoamento, especialmente por relacioná-lo, visceralmente, à idéia de liberdade. Liberdade essa que deve ser compreendida como um mecanismo de defesa individual tanto em relação ao Estado quanto em relação aos outros indivíduos. Entretanto, é com a Revolução Francesa em 1789, especificamente com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que a cidadania ganha sua forma mais perfeita, mas ainda passível de enorme aperfeiçoamento imposto pela evolução histórica.8” Desta forma, traçado o referido panorama histórico, quando falamos em cidadania durante o presente estudo, devemos estabelece-la como um conceito amplo, como um conjunto de direitos e deveres dos membros de determinada sociedade perante o Estado e perante os outros cidadãos9. Quando tratamos de cidadania, portanto, devemos focar nos direitos que tal cidadania garante ao cidadão, como a liberdade, igualdade e dignidade da pessoa humana, limitados pela participação do próprio Estado. Assim podemos destacar o seguinte entendimento de Maria Victoria de Mesquita Benevides: “Os direitos da cidadania, também filiados à mesma experiência histórica, são aqueles estabelecidos pela ordem jurídica de um determinado Estado e, juntamente com os deveres, restringem-se aos seus membros; os direitos do cidadão englobam direitos individuais, políticos e sociais, econômicos e culturais e, quando são efetivamente reconhecidos e garantidos podemos falar em “cidadania democrática”, a 7 MACEDO, Maria Fernanda Soares. Direito penal do inimigo e cidadania: polos opostos. Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico)- Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012. 8 FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Direito Penal Do Inimigo: uma análise sob os aspectos da cidadania. Tese (Direito Penal) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008, p. 135-136. 9 Durante o presente trabalho, estudaremos o cidadão em um capítulo específico. 18 qual pressupõe, também, a participação ativa dos cidadãos nos processos decisórios da esfera pública.10” Assim, partindo do pressuposto de que a cidadania engloba direitos e deveres, voltaremos aoestudo das bases do Direito Penal, que serviram como pilar para a teoria a ser estudada no presente trabalho. 2.3 – Os Períodos do Direito Penal O Direito Penal passou por diversos períodos, entre eles se destaca o período primitivo, no qual segundo Bernardino Alimena, as legislações previam uma extraordinária abundância de penas cruéis que castigavam não somente os culpados, mas também as demais pessoas de sua família11. Tratava- se de um período em que as vinganças (divina, posteriormente a privada e, por último a pública) eram admitidas. A Vingança Divina era profundamente ligada com misticismos e crenças em seres e forças sobrenaturais. Nesse período, quando um integrante da sociedade praticava um crime, o próprio grupo ao qual ele pertencia, com medo de uma retaliação dos deuses, tratava de aplicar uma pena, com o objetivo de purificar o infrator e o grupo e assim acalmar a ira dos deuses. Já a Vingança Privada passa a ter um caráter pessoal, pois a vítima ou seus familiares revidavam o injusto que lhes foi cometido. Nesse período tomou força a Lei de Talião, que previa justamente a máxima “olho por olho, dente por dente”. Por fim, a Vingança Pública surgiu com a finalidade de fortalecer a existência do próprio Estado e do Soberano. Esse período é extremamente importante para o Direito Penal, pois segundo Jímenez de Asúa, somente pode- 10 BENEVIDES, Maria V. M. Cidadania, direitos humanos e democracia. In: Universidade Presbiteriana Mackenzie. Faculdade de Direito. Diretório Acadêmico João Mendes Júnior. Fronteiras do direito contemporâneo. São Paulo, 2002. p. 111. 11 ALIMENA, Bernardino. Introdução ao Direito Penal. Editora Rideel. São Paulo, 2006. P. 24. 19 se falar em pena a partir da fase pública, pois antes as manifestações punitivas não passavam de vinganças coletivas, guerras e vinganças privadas12. Depois desse período, durante a Idade Média, surgiu o chamado Direito Penal Comum Europeu, que nada mais é do que uma mistura dos Direitos Penais Romano, Germânico e Canônico. O Direito penal romano, separava os crimes em crimina publica, quando se tratavam de crimes públicos e delicta privada, quando atingiam interesses particulares. Contudo, no que se refere às penas, segundo Gianpaolo Smanio e Humberto Fabretti: “Roma adotou em grande escala as penas exterminadoras. Aos patrícios, a pena de morte era realizada por decapitação, aos plebeus, por meios degradantes e cruéis, como a crucificação13” Já o Direito penal germânico sustentava que o direito era na realidade a paz, e aquele que cometia qualquer crime, perturbava tal paz. Tal desrespeito à paz poderia ser pública, quando ofendia a comunidade e privada quando ofendia uma só pessoa e seus familiares. Os primeiros crimes eram punidos com a perda da paz, equivalente ao exílio, já os segundos, com a vingança privada. Por fim, o Direito Penal canônico marcou um período em que se buscava acabar com a vingança privada, aumentando a aplicação da vingança pública. Surgiram as primeiras ideias de penitência e caridade pelo agente. A mistura de todos esses períodos, portanto, resultou no Direito Penal Comum Europeu, pode ser definido como um período marcado pela arbitrariedade e crueldade das penas, nas palavras de Aníbal Bruno: “Sob o regime desse Direito, nos vários países, nesse longo e sombrio período da história penal, o absolutismo do poder público, com a preocupação da defesa do príncipe e da religião, cujos interesses se confundiam, e que introduziu o critério da razão de Estado no direito penal, o arbítrio judiciário, praticamente sem limites, não só na determinação da pena, criavam em volta da justiça punitiva uma atmosfera de incerteza e justificado terror. Justificado por esse regime injusto e cruel, assente sobre a iníqua desigualdade de punição para nobres e plebeus, e o seu sistema repressivo, com a pena capital 12 Asúa, Luiz Jimenes de. Tratado de Derecho Penal. Tomo I. Editorial Losada. Buenos Aires. 1950. p. 210 13 SMANIO, Gianpaolo Poggio e FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Introdução ao Direito Penal: Criminologia, Princípios e Cidadania. São Paulo. Atlas, 2010. p. 17. 20 aplicada com monstruosa freqüência e executada por meios brutais e atrozes, como a forca, fogueira, a roda, o afogamento, a estrangulação, o arrastamento, o arrancamento das vísceras, o enterramento em vida, o esquartejamento; as torturas, em que a imaginação se exercitava na invenção dos meios mais engenhosos de fazer sofrer e multiplicar e prolongar o sofrimento; as mutilações, como as de pés, mãos, línguas, lábios, nariz, orelha, castração; os açoites; as penas propriamente infamantes, e onde a pena privativa de liberdade, quando usada, se tornava hedionda pelas condições em que então se executava. A situação agravava-se pelas condições do processo, com a falta de publicidade, ausência de defesa e os meios inquisitoriais com que se procurava estabelecer a culpabilidade. Praticamente, o acusado caminhava sempre para a condenação: arrancava-se dele, por meio da tortura, a confissão, mesmo de fatos que não cometera, ou se confirmava a sua culpabilidade pelo processo absurdo das ordálias14”. Contudo, com o surgimento do período humanitário, passou-se a criticar o modelo Absolutista e suas políticas, não só no âmbito penal, mas também os privilégios que o sistema trazia à determinadas pessoas. As penas cruéis e de morte passaram a ser duramente criticadas. O principal autor desse período foi o italiano Cesare Beccaria, que se baseou no contrato social ao escrever sua obra, criticando as práticas cruéis aplicadas pelos sistemas anteriores, a obscuridade das leis e a subjetividade dos julgamentos, além de estabelecer duras críticas à tortura como forma de obtenção da confissão, à pena de morte e às sanções cruéis. Neste livro, nas palavras de Smanio e Fabretti, o autor: “(...) Investe contra o uso das leis em favor das minorias; a falta de proporcionalidade entre os crimes e as penas; a falta de clareza das leis, especialmente o pretexto de “consultar o espírito da lei”; a tortura como método de obtenção de confissão; o costume de se pôr a cabeça a prêmio; a pena de morte e as sanções cruéis. Defende, ainda, a moderação das penas; a necessidade de a lei estabelecer precisamente quais seriam os indícios que justificariam a prisão do acusado; a descriminalização de alguns delitos e a sua contribuição mais importante: a necessidade de previsão legal dos delitos e das penas, o princípio da legalidade, eternizado no brocardo nullum crimen, nulla poena sine lege.15” De acordo com o que foi anteriormente explanado, podemos notar que, após o período Humanitário, que tem como marco a publicação da obra “Dos Delitos e Das Penas”, de Cesare Beccaria, a pena passou a ter um papel 14 BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Tomo I. 3. Ed. Editora Forense. Rio de Janeiro. 1967. p. 88. 15 SMANIO, Gianpaolo Poggio e FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Introdução ao Direito Penal: Criminologia, Princípios e Cidadania. São Paulo. Atlas, 2010. p. 26-27. 21 fundamental na sociedade e no direito penal, motivo pelo qual passamos a estudá-la. 2.4 – Direito Penal e a Pena Podemos destacar a pena como uma resposta do Estado a uma conduta reprovável, ou seja, uma conduta que está em desacordo com a Norma Jurídica do meio na qual o agente está inserido. Segundo o entendimento de VON LISZT, em tradução livre: "Direito Penal é o conjunto de regras jurídicas, estabelecidas pelo Estado, que associam ao crime cometido, a pena como sua legítima consequência16”. Além disso, o entendimento do filósofo alemão Hegel, nos mostra que a ordem jurídica é a aparição do anseio coletivo, ou seja, quando um agente pratica uma conduta que vaicontra o interesse do coletivo, faz-se importante a pena criminal como forma de afirmar o direito e negar a vontade do agente. Nesse sentido, ensina Hegel que “O mal não é o crime, mas a existência real de uma negação da liberdade, que, sem a pena, continuaria existindo17”. Elucidando este assunto, Luiz Moreira e Eugênio Pacelli de Oliveira: Se uma vontade livre, expressão de liberdade, é coagida ou violentada, esssa ação (coação e violência), abstratamente, deveria ser considerada injusta. Por isso, se o Direito é a afirmação da liberdade, estruturado em um Estado voltado para a realização ética da coexistência, o injusto, definido como crime, é a negação da liberdade, devendo submeter, por isso mesmo, a uma outra coação, que, do mesmo modo, implique a sua destruição conceitual. Daí se afirmar que a pena seria o movimento dialético da reafirmação do Direito lesado.18 Do acima explicitado, pode-se concluir que o Direito Penal e a pena têm a função principal de proteger as expectativas de comportamento que são essenciais para a manutenção da vida coletiva em sociedade e assim, de forma 16 HASSEMER, Winfried y MUÑOZ CONDE, Francisco. Introdución a la Criminologia, pág. 226. 17 (HEGEL. Princípios da filosofia do direito. Tradução Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 2000,p.89.) 18 MOREIRA, Luiz e OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Direito Penal do Inimigo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. xviii 22 indireta, proteger a própria vigência da norma. Além disso, o Direito Penal deve proteger os bens jurídicos propriamente positivados pelo Direito (como a vida, patrimônio, e integridade física). Por esse motivo, tendo em vista esse caráter abstrato da pena e a sua amplitude de conceitos, sentidos e objetivos, os estudiosos passaram a apontar várias correntes que buscavam a melhor aplicação da pena. Passaremos ao estudo das teorias da pena que foram mais importantes para o desenvolvimento da teoria de Jakobs. 2.4.1 – O Princípio Da Legalidade Antes de tratar das teorias da pena propriamente ditas, faz-se necessário o estudo do Princípio da Legalidade que, como já visto, foi uma das contribuições mais importantes de Cesare Beccaria em seu livro “Dos Delitos e Das Penas”. Naquela oportunidade, o autor exigia que as normas fossem utilizadas com mais transparência e que os crimes e penas só poderiam existir com prévia cominação legal. No Brasil, o princípio da Legalidade foi positivado pela primeira vez na Constituição Imperial de 1824 e, posteriormente, no Código Criminal do Império19. Essa foi a primeira manifestação do hoje já consagrado Princípio da Legalidade, princípio expressamente previsto no Artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e também no Artigo 1º do Código Penal: Art. 5 (...) XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal20; Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal21. Em verdade, essa ideia já havia sido exposta e muito se discute quanto ao surgimento do princípio da Legalidade. Existem autores que entendem 19 ESTEFAM, André. Direito Penal, Parte Geral, 3a edição, São Paulo, Saraiva, 2013. 20 BRASIL. Constituição Federal, 1988. 21 Brasil. Código Penal, 1940 (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art1 23 que a ideia principal deste princípio já era utilizada na Idade Média e surgiu pela primeira vez na Magna Carta em 1215. Nesse sentido, Smanio e Fabretti explicam: “Ensina-nos Jiménez de Asúa, que apesar de sua formulação em latim, o referido princípio não é de origem romana e teve suas primeiras manifestações durante a Idade Média, quando o homem aspirou um pouco de segurança. Aponta, ainda, o mestre espanhol, que o documento originário de onde se retira o princípio para aplicação em matéria penal é a Magna Carta inglesa, conquistada de João sem Terra, pelos nobres, em 1215, especialmente no artigo 39, que tinha a seguinte redação: “Nenhum homem livre será detido, preso ou perderá suas posses, ou proscrito, ou morto de qualquer forma; nem poderá ser condenado, nem poderá ser submetido a prisão, senão pelo julgamento de seus iguais ou pelas leis do país”.22” Também é este o entendimento de Magalhães de Noronha, que destaca em sua obra: “Direito penal liberal. Reação ao princípio. Consagra o Código, no art. 1º, o apotegma do direito penal liberal – nullum crimen, nulla poena sine praevia lege, síntese, como já se viu (n. 21), da parêmia formulada por Feuerbach. É o princípio da legalidade ou da reserva legal. Aponta-se como sua origem a Magna Carta do Rei João, em 1215. Asúa, porém, reivindica para o direito ibérico a prioridade, dizendo já em 1188, nas cortes de Leão, pela voz de Afonso IX, se concedia ao súdito o direito de não ser perturbado em sua pessoa ou bens, ‘antes de llamado por cartas a mi cúria para estar a derecho, según lo que ordenare mi cúria; y si no se comprobara la delación o el mal, el que hizo la delación sufra la pena sobredicha y además pague los gastos que hizo el delatado em ir y volver”23 Contudo, grande parte dos autores entende que tal princípio possui fundamento no contrato social, trazido pelo iluminismo da Revolução Francesa e não na Magna Carta. Esse é por exemplo o entendimento de Santiago Mir Puig, quando afirma que o foco atual de proteção de tal princípio difere do foco de proteção daquilo que foi ilustrado na Magna Carta24. Tal ideia de que o princípio é trazido pelo iluminismo também é defendida por Luiz Luisi: “Todavia, é a partir da pregação dos teóricos do chamado iluminismo que realmente surge como real apotegma político o princípio da Reserva Legal. Ele tem seu fundamento histórico como lucidamente ensina a H. H. Jescheck, na teoria do contrato social do iluminismo. Pregando esta teoria à construção do Estado como se tivesse origem em um contrato 22 SMANIO, Gianpaolo Poggio e FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Introdução ao Direito Penal: Criminologia, Princípios e Cidadania. São Paulo. Atlas, 2010. p. 138. 23 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. São Paulo: saraiva, 1991, p. 67. 24 MIR PUIG, Santiago. Derecho Penal: parte general. 6. ed. Barcelona: Reppertor, 2002, p. 111. 24 social, faz do Estado um mero instrumento de garantia dos chamados direitos do homem. A missão do Estado praticamente se limita a proteção efetiva desses direitos. Nascido com a preocupação de reagir ao absolutismo monárquico, o iluminismo preconiza a limitação do poder do Estado, garantindo ao cidadão uma faixa de ação. Ou seja: somente não é lícito aquilo que a lei proíbe. Dentre esses direitos se insere o da Reserva Legal, ou seja: somente a lei, e anteriormente ao fato, pode estabelecer que este constitui delito, e a pena a ele aplicável. Diversos pensadores iluministas como consectário natural de seu ideário, sustentam a necessidade da contenção do arbítrio judicial, e a submissão do Juiz à lei, pois só esta pode estabelecer o que é antijurídico e a sua sanção. Nesse sentido são conhecidos os textos pertinentes de F. Bacon, S. Puttendorf, C.L. Secondat de Montesquieu, e de T. Hobbes, um partidário da teoria do contrato social, mas para justificar o absolutismo.25” Contudo, independente desta polêmica acerca do surgimento da ideia basilar do princípio da Legalidade, a verdade é que foi a partir da obra de Beccaria que este passou a ser mais difundido, estudado e aplicado em todo o mundo, já que esta obra iniciou uma busca por defender os direitos humanos no âmbito penal. Como já explicamos aqui, o Direito, na época em que Beccaria lançou seu livro, era voltado à proteção da nobreza, sem se preocupar com o tratamento que era dado àspessoas comuns. Tanto é assim, que as penas cruéis e capitais eram muito comuns e geralmente aplicadas pelo próprio nobre a quem as Leis protegiam. Então, pode-se concluir que o Princípio da Legalidade surgiu como uma busca à uma maior segurança jurídica. Uma luta contra o absolutismo na hora do julgamento, já que sem Lei, qualquer pena poderia ser aplicada, já com a Lei, a pena aplicada seria prévia e expressa, o que garantiria maior segurança ao agente que seria julgado, ao invés de ficar à mercê de seu julgador. Além disso, ainda falando da segurança jurídica conferida pelo princípio aqui estudado, devemos destacar que para Beccaria, a segurança devia se pautar em três eixos principais, que são a legalidade, a proporcionalidade e o utilitarismo. 25 LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2003, p. 19. 25 A legalidade, como já explicado “mostrava que uma pena só poderia ser imposta se prevista em lei, não cabendo ao juiz estipular de forma arbitrária a pena que entendesse ser cabível26”. A proporcionalidade, por sua vez, tem como objetivo que exista uma correspondência proporcional entre a conduta do agente e a pena a ele imputada, impedindo que crimes diferentes e de gravidades distintas tivessem a mesma punição. Nas palavras do próprio Beccaria: “Deve haver, pois, proporção entre os delitos e as penas. Se a geometria fosse adaptável às infinitas e obscuras combinações das ações humanas, deveria existir uma escala paralela de penas, descendo da mais forte para a mais fraca, mas bastará ao sábio legislador assinalar os pontos principais, sem alterar-lhes a ordem, não cominando, para os delitos de primeiro grau, as penas do último”.27 Já o eixo utilitarista é aquele que prevê que a pena deve ter um caráter útil, servindo como exemplo para outros, mas, entretanto, sem servir como uma mera vingança do passado, mas sim oferecer uma perspectiva para o futuro. Outro autor cuja contribuição foi importantíssima para a concretização deste princípio foi o alemão Ludwig Anselm Feuerbach, a quem é atribuída a fórmula do atualmente conhecido princípio da legalidade que prevê o “nullum crimen, nulla poena sine lege”. Contudo, como bem explicam os professores Fabretti e Smanio, o brocardo não foi utilizado por Feuerbach da maneira que o conhecemos hoje, mas sim dividindo-se o princípio maior em três princípios derivados, o “nulla poena sine lege”, o “nulla poena sine crimine” e, por fim, o “nullum crimen sine poena legali”, que podemos destacar da seguinte forma: “Saliente-se que esse postulado deriva de três fórmulas que, segundo Hungria, são originárias do penalista alemão: nulla poena sine lege (necessidade da existência de uma lei penal para aplicação da pena), nulla poena sine crimine (só poderá haver a incidência de uma pena em caso da prática de uma conduta delitiva, ou seja, busca-se apenar não os estados ou as simples condições existenciais do ser humano, mas os 26 SIQUEIRA, Martha Maria Guaraná Martins de. A flexibilização do princípio da legalidade no tribunal penal internacional – Recife: O Autor, 2011. Disponível em: http://repositorio.ufpe.br/bitstream/handle/123456789/15651/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Martha %20Guaran%C3%A1.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em 27 de setembro de 2016. 27 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: RT, 1999, p.38-39. 26 fatos que porventura venham a ser por ele praticados) e o nullum crimen sine poena legali (o fato legalmente ameaçado é condicionado pela pena legal, pois o mal, como conseqüência jurídica necessária, é ligado a uma violação do direito através da lei.28” Desta forma, tendo analisado o surgimento do Princípio da Legalidade, devemos passar ao estudo de seus desdobramentos jurídicos. Segundo o professor André Estefam: “O efetivo respeito ao princípio da legalidade demanda não só a existência de uma lei definindo a conduta criminosa. Exige, também, que a Lei seja anterior ao ato; que se trate de Lei em sentido formal interpretada restritivamente; e, por fim, que a Lei tenha conteúdo determinado.29” Da análise do que foi exposto, podemos concluir que o princípio da Legalidade se divide em quatro princípios menores: Princípio da Anterioridade da Lei (lege praevia); princípio da Reserva Legal (lege scripta); proibição de Analogia in malam partem (lege stricta); taxatividade da Lei ou Mandato de Certeza (lege certa). 2.4.1.1 – Princípio da Anterioridade O primeiro Princípio menor que iremos tratar é o da anterioridade, segundo o qual, a Lei deve ser anterior ao fato. É evidente que não seria possível dar segurança jurídica para o agente se a Lei pudesse ser elaborada depois do fato. É importante destaca que não basta a existência da Lei, mas esta deve estar em vigor para que seja respeitada a Legalidade. Nesse sentido, explica Maurício Antonio Ribeiro Lopes que: “Anterioridade corresponde imediatamente à ideia de que uma Lei incriminadora, para que possa ser aplicada a um fato, deve estar em plena vigência antes do cometimento do delito apenado”30. 28 SIQUEIRA, Martha Maria Guaraná Martins de. A flexibilização do princípio da legalidade no tribunal penal internacional – Recife: O Autor, 2011. Disponível em: http://repositorio.ufpe.br/bitstream/handle/123456789/15651/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Martha %20Guaran%C3%A1.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em 27 de setembro de 2016. 29 ESTEFAM, André. Direito Penal, Parte Geral, 3a edição, São Paulo, Saraiva, 2013. 30 LOPES, Maurício A. R. Princípio da Legalidade Penal. Revistas dos Tribunais. 1994. p. 81 27 2.4.1.2 – Princípio da Reserva Legal Para que se respeite a legalidade, o segundo princípio menor a ser observado é o da Reserva Legal, segundo este princípio, somente a Lei escrita, promulgada e de acordo com a Constituição Federal é que pode criar tanto os crimes quanto suas respectivas penas. Importante destacar aqui, que o direito consuetudinário, ou seja, aquele baseado nos costumes não pode ser utilizado como base para uma punição criminal, mas pode sem dúvida servir como base para as Leis que definem uma conduta como crime. 2.4.1.3 – Princípio da Proibição da Analogia in Malam Partem O terceiro princípio menor a ser estudado é o da Proibição da Analogia in malam partem. A analogia consiste em uma forma de integração da norma jurídica pela qual utiliza-se uma norma existente, para solucionar um caso concreto para o qual não existe uma regulamentação expressa. Logo, a analogia in malam partem é aquela que torna mais gravosa a situação do agente, por criar um fato criminoso ou agravar a situação da sua pena. Tal tipo de analogia não pode ser tolerada, por quebrar a segurança garantida pelo princípio maior da Legalidade. Cabe salientar, no entanto, que qualquer analogia que beneficie o agente é aceita. 2.4.1.4 – Princípio da Taxatividade O último princípio menor que integra o princípio da Legalidade é o Princípio da Taxatividade, segundo o qual o conteúdo de toda norma deve ser determinado, para que seja possível que o seu destinatário tenha conhecimento da norma, entenda o seu conteúdo e, ainda, possa agir de forma a respeitar aquela norma. 28 Não é permitido que se crie os chamados tipos penais vagos, que são aqueles tipos penais que possuem uma construção extremamente genérica. Isso ocorre, pois, um tipo penal vago, que criminaliza uma conduta indeterminada violaria a segurança jurídica que se busca com o princípio da Legalidade. Tanto é assim que explica Luiz Luisi sobre a taxatividade: “Sem esse corolário, o princípio da legalidade não alcançaria seu objetivo, pois de nada vale a anterioridade da lei, seesta não estiver dotada de clareza e da certeza necessárias, e indispensáveis para evitar formas diferenciadas, pois arbitrárias na sua aplicação, ou seja, para reduzir o coeficiente de variabilidade subjetiva na aplicação da Lei.31” Após esse estudo sobre a Legalidade, passemos a estudar as teorias legitimadoras da teoria de Jakobs. 2.5 – Teorias Legitimadoras Quando do estudo da teoria da pena, esta geralmente é dividida pela doutrina em três grandes grupos. O primeiro diz respeito às teorias absolutas ou retributivas, depois temos as teorias relativas ou preventivas e, por fim, decorrente da junção das duas anteriores, as teorias mistas ou ecléticas. Para o presente estudo, iremos focar nas teorias retributivas e absolutas, pois ambas estão presentes na teoria do Direito Penal do Inimigo apresentada por Gunther Jakobs. 2.5.1 – A Teoria Retributiva da Pena As teorias absolutas, são aquelas em que a pena possui estritamente a função de retribuir um mal causado, como ensina o professor Humberto Fabretti: 31 LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2003. p. 24 29 “São consideradas absolutas todas aquelas teorias que atribuem à pena uma fundamentação moral e a reconhecem como um fim em si mesma, ou seja, como um castigo, uma retribuição pelo cometimento do crime”32 Tendo observado tal pensamento, pode-se observar que as teorias absolutas ou retributivas se preocupam com o passado para justificar a aplicação da pena. Ela será necessária toda vez que alguém praticar um mal injusto, como forma de retribuição. A teoria retributiva da pena se baseia na ideia de que a pena deve ser aplicada como retribuição, ou seja, um castigo a ser aplicado ao agente em razão de sua conduta reprovável. Todo o mal injusto causado pelo autor de um delito deve ser retribuído, em forma de um mal justo, a ele próprio por meio da aplicação da pena. Dois grandes pensadores que eram adeptos dessa corrente eram Kant e Hegel que, apesar de divergirem em relação aos fundamentos da teoria, tinham um pensamento parecido no sentido de que a pena não deve proporcionar a ressocialização do condenado ou a restauração da ordem e paz social, mas sim deve castigá-lo para retribuir-lhe o mal causado. Immanuel Kant defendia que o agente que se manifestasse por meio de uma conduta contra o regramento legal não merecia ser titular do direito de cidadania. Em razão de tal desmerecimento, o agente deveria ser punido pela prática da ação delituosa. Kant entendia que a pena não podia ter traço e nenhuma função de útil e sim que esta devia ser sempre utilizada como forma de castigar o agente. Tal ideia pode ser confirmada com base na leitura do seguinte trecho: A pena judicial (poena forensis), distinta da natural (poena naturalis), pela qual o vício se castiga a si mesmo, e que o legislador não tem sequer em conta, nunca pode servir apenas de meio para fomentar outro bem, quer para o próprio delinqüente, quer para a sociedade civil, mas sempre lhe deverá ser imposta, só porque cometeu um delito; de facto, o homem nunca pode ser manejado como simples meio para os propósitos de outrem (...)33. 32 FABRETTI, Humberto Barrionuevo: Direito Penal Do Inimigo: uma análise sob os aspectos da cidadania. 2008. Tese (Direito Penal) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008. 33 KANT, Immanuel. Metafísica dos costumes: parte 1. Tradução para o português de Artur Morão. Lisboa: Edições 70. p.146. 30 A função da pena, segundo Kant tem caráter vingativo, pautado na busca de se fazer a justiça, de qualquer maneira. Tanto é assim que Kant defende a Lei de Talião e exclui de seu entendimento qualquer outra função da pena, seja ela utilitarista, preventiva, ressocializante ou reintegradoras: Só a lei do talião (ius talionis) pode oferecer com segurança a qualidade e a quantidade do castigo, mas, claro está, no seio do tribunal (não no teu juízo privado); todos os outros oscilam de um lado para o outro e não se podem adequar ao ditame da pura e estrita justiça, porque pelo meio se imiscuem outras considerações.34 Hegel por sua vez defende que a questão da pena não está relacionada com a Justiça, mas sim com a própria razão. Nesse sentido, entende que o delito é uma negação do direito, ou seja, uma negação à norma perante a qual o indivíduo está submetido em sociedade. Para Hegel, o agente merece um castigo, pois violou o sistema jurídico no qual está inserido. Desta forma, uma punição contra o agente violador do direito e da própria estrutura social é sim uma forma de restabelecer o direito lesionado: O princípio conceitual de que toda a violência destrói a si mesma possui a sua real manifestação no fato de uma violência se anular com outra violência. É assim que se torna jurídica, de maneira não só relativa, quando se dão tais e tais condições, mas necessária, quando é aquela segunda violência que suprime a primeira35. Da leitura das ideias acima mencionadas, podemos concluir que a finalidade da pena, nessa corrente é essencialmente retributiva, sem que lhe seja atribuído nenhum outro caráter. Assim, a pena é o mal justo que é infligido ao agente que praticou um mal injusto, como forma de reparação do dano por este causado. A retribuição da pena serve aqui para reparar o mal causado pelo agente e não propriamente serve para reparar o dano. Contudo, tal ideia de retribuição oferece uma certa segurança jurídica, já que o mal justo será utilizado para reparar o mal injusto de maneira proporcional. 34 Idem. p. 147. 35 HEGEL, G.W.F. Princípios da filosofia do direito. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 2003. Passim. p. 84. 31 É impossível que se tenha uma pena extremamente gravosa para uma conduta menos grave, já que nesse caso, a retribuição seria dotada de excesso. O professor André Estefam sintetiza bem a premissa dessa teoria em sua obra: “Para Kant, adepto dessa teoria, mesmo se uma sociedade voluntariamente se dissolvesse, ainda assim o último assassino deveria ser punido, a fim de que cada um recebesse a retribuição que exige sua conduta. Nota-se, então, que a base das teorias absolutas encontra-se no passado, que demanda reparação.36” 2.5.2 – A Teoria da Prevenção As teorias preventivas, por sua vez, são aquelas dotadas de um caráter útil, ou seja, entendem que a pena não pode ter caráter meramente retributivo e tem que ter algum efeito prático útil. Nessa corrente, o efeito prático é o da prevenção. A pena deve servir como exemplo, para que se previnam novos crimes, o que nos leva à ideia de que essas teorias se baseiam no futuro para justificar a aplicação da pena, ou seja, esta somente se justifica e será aplicada, quando tiver caráter preventivo. A presente teoria estudada foi elaborada como uma resposta às teorias retributivas acima explicadas, já que estas não conseguiram atender ao seu objetivo e reduzir ou amenizar o número de crimes. Neste contexto, surgiu a teoria preventiva. A teoria da prevenção nos leva a entender que a pena serve basicamente para proteger a expectativa normativa, isto é, restaurar a confiança de determinado grupo social no sistema de direito, que foi enfraquecido diante do cometimento de um delito. Daí pode-se afirmar que esta teoria visa proteger a própria vigência das normas. Além disso, como já estudamos, segundo a teoria preventiva, a pena passa a ter um caráter útil, que tem como função evitar novas lesões à 36 ESTEFAM, André. Direito Penal, Parte Geral, 3a edição, São Paulo, Saraiva, 2013. 32 norma. Essa teoria afasta por completo qualquer resquício dosistema vingativo, e passa a fortalecer o sistema utilitarista. Como leciona Mir Puig: (...) mudou-se o ponto de partida: a pena não se dirige somente aos delinqüentes eventuais, pois não se trata de inibir sua possível inclinação ao delito, mas sim a todos os cidadãos, posto que tem por objeto confirmar sua confiança à norma37 É importante ressaltar que esta teoria se subdivide em duas: a primeira delas é a prevenção geral positiva, que se dirige para toda a sociedade e serve como um inibidor da prática do crime para todos os cidadãos. A segunda é a prevenção especial positiva que é dirigida especialmente ao agente que cometeu um delito, tendo como objetivo principal fazer com que o agente, tendo sentido a pena na pele, não volte a delinquir. Contudo, a teoria de Jakobs exclui a teoria da prevenção especial positiva, pois como veremos mais adiante, para Jakobs, o destinatário da teoria do Direito Penal do Inimigo é aquele que sempre volta a praticar delitos, ou seja, é um criminoso habitual e sempre voltará a delinquir, independentemente da pena que lhe foi aplicada. Portanto, a vertente da teoria da prevenção que é importante destacar nesse estudo é a Teoria da Prevenção Geral Positiva, que tem como objetivo formar uma diretriz de prevenção baseada na intimidação. Pode-se dizer que a pena tem como objetivo intimidar o indivíduo para que este se afaste da prática delitiva. O jurista alemão Gunther Jakobs, adepto desta teoria, nos ensina que toda sociedade é baseada nas interações dos indivíduos que a constituem. Trata-se de um sistema social no qual todo delito é uma violência à organização da sociedade e ao bem-estar coletivo. Desta forma, a pena deve ser um exemplo para que os integrantes da sociedade confiem e respeitem a existência e aplicação da norma jurídica oriunda daquele sistema social. 37 PUIG, Santiago Mir. El derecho penal en el estado social y democrático de derecho. Barcelona: Ariel Derecho,1994. Apud MARQUES, O. H. Duek. Fundamentos da Pena. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2000. p. 105. 33 Tanto é assim, que trazemos a compreensão de Günther Jakobs: No Direito Penal não se trata de modo primário de se prevenir delitos – disso há de ocupar-se principalmente a polícia – mas sim de uma reação frente ao delito que assegure que a fidelidade ao ordenamento jurídico se mantenha como atitude natural da maioria das pessoas, para que as vítimas potenciais possam ter certeza de que não só têm direito a exercer seus direitos, mas ainda poderão exercê-los ficando incólumes, a menos que se localizem às margens da sociedade. Por conseguinte, os destinatários da pena não são somente – nem sequer o são em primeira linha – o autor em questão e outros delinquentes que já tenham tendência a cometer o fato, mas sim as pessoas fiéis ao ordenamento, ou seja, a grande massa destas: devem conservar sua fidelidade ao Direito e sua confiança na norma. Fala-se de prevenção geral positiva porque não se pretende alcançar a intimidação da generalidade de pessoas, senão a manutenção da norma como esquema de orientação, prevenção, porque se persegue um fim, precisamente, a manutenção da fidelidade à norma, e isso, concretamente, respeito da sociedade em seu conjunto, por isso, prevenção geral38. Jakobs ainda acrescenta: Nessa medida, parece que a prevenção geral positiva ao menos também implica na intimidação de autores potenciais, é dizer, prevenção geral negativa, só que não se fala dela diretamente, senão de seu efeito de produzir fidelidade à norma, e de seu reflexo na confiança da norma por parte de outros sujeitos. Dito de outro modo, se a pena mantém a confiança na norma, deve produzir medo ou convicção, e só nesse caso manterá a confiança na norma39. Para concluir a apresentação da presente teoria, podemos utilizar o mesmo exemplo apresentado na teoria da retribuição: segundo a teoria da prevenção, se uma sociedade se dissolvesse, o último assassino não deveria ser punido, pois a pena não atingiria o seu objetivo útil de prevenir que novos delitos fossem praticados, já que não existe mais sociedade. 2.5.3 – O Funcionalismo Outra teoria que influenciou o pensamento de Jakobs foi a teoria funcionalista. Segundo esta corrente, pode-se dizer que toda sociedade deve ser baseada na comunicação que ocorre entre os seus membros. 38 JAKOBS, Günther. La pena estatal: significado e finalidad. Tradução de Manuel Cancio Meliá Bernardo Feijoo Sanchez. Navarra: Aranzadi, 2006. p. 144 e seguintes. 39 Idem. p. 148 e seguintes. 34 Esta comunicação pode ser evidenciada também pela norma jurídica, assim, se a norma falhar, ou for ineficiente, não será possível manter a comunicação e a sociedade ficará desestabilizada. O sistema funcionalista, portanto, estabelece que cada conduta isolada. Quando inserida em um meio social, funciona para abastecer e manter o próprio sistema social. Pode-se dizer, ainda, que cada conduta funciona como um modo de regulação da sociedade e a junção de todas as condutas de todos os membros do coletivo fortalece a comunicação de que precisa a sociedade. No âmbito penal, o funcionalismo prevê que a pena deve possui funções, ou seja, junto com o caráter punitivo da pena, esta deve trazer funções que ajudem de qualquer forma para a manutenção e o pleno funcionamento da sociedade. A teoria funcionalista defendida por Jakobs, no entanto, surge como um funcionalismo sistêmico, muito diferente e mais radical do que o funcionalismo defendido por Roxin. O funcionalismo apresentado por Roxin defendia que a principal função do direito penal é tutelar os bens jurídicos mais importantes, sendo que fica a cargo do legislador e do próprio intérprete a escolha de tais bens, baseados nos princípios reguladores do Direito Penal. Já o funcionalismo de Jakobs era mais radical e se baseava na ideia de que o direito penal tem o escopo de proteger a própria vigência da norma e da ordem jurídica e que os bens jurídicos principais deviam ser tutelados, mas de maneira indireta, já que o mais importante a ser protegido é a norma que contém a proteção aos bens jurídicos. Para que tal objetivo de proteger a norma pudesse ser alcançado, Jakobs entende que é necessário fazer uma separação nas funções da pena, entendendo que ela pode ser dotada de um caráter confirmador ou de um caráter preventivo. Sobre estas divisões, como bem observou o Prof. Humberto Barrionuevo Fabretti: 35 “O efeito confirmador se dirige a pessoas, ou seja, aos partícipes da comunicação “considerados como possuidores de disposição jurídica, e mais, se dirige absolutamente a todas as pessoas. Sendo assim, o dano penal que se inflige ao autor não é para produzir medo, compaixão ou qualquer outro estado psíquico, mas traz apenas um significado, que é a afirmação da norma como comunicação válida. De forma diversa ocorre com as funções latentes, de efeitos preventivos e intimidatórios, pois para Jakobs acostumar-se a ser fiel ao direito ou deixar-se intimidar, não são reações pessoais, haja vista que as pessoas não precisam de habitualidade ou intimidação, pois são participantes da comunicação, dotadas de disposição jurídica, somente se dirige mediante habitualidade e intimidação o carecedor, por si próprio, de disposição jurídica, ou seja, o indivíduo que se divide entre a apetência e a inapetência. Desta forma, considera Jakobs que a pena determinada de forma jurídico-estatal é insuficiente em alguns casos, pois não é só a norma que precisa de uma segurança cognitiva, mas também a pessoa, ou seja, junto da certeza de que a ninguém é permitido matar, deve-se dar, também, certa garantia cognitiva de que muito provavelmente ninguém vá matar” 40. Deste contexto, conclui-se que toda conduta queé praticada por um membro de determinada sociedade deve respeitar a ordem jurídica à qual este indivíduo se submete, para que exista a chamada “segurança cognitiva”, cujo papel é fundamental, na medida em que garantirá que a norma não s torne ineficaz. A fim de melhor entender o significado de segurança cognitiva, nas palavras de Jakobs: “Sem embargo, a expectativa de um comportamento correto não pode ser mantida contrafáticamente de modo ilimitado; mas ainda: não deve ser mantida ilimitadamente, já que o Estado há de procurar uma vigência real do Direito, pelo que deve proceder contra os quebrantamentos do Direito cuja próxima comissão já se percebe. Uma expectativa normativa dirigida até uma determinada pessoa perde sua capacidade de orientação quando carece de apoio cognitivo prestado por parte dessa pessoa. [...] para ser real o Direito não só deve oferecer orientação aos potenciais autores senão também às potenciais vítimas; dito com um exemplo, em uma sociedade em que nenhuma pessoa ousa mover-se livremente por medo da delinqüência, o direito à liberdade de movimentos não é real, visto de qualquer maneira. Para poder fazer uso de seu direito a pessoa não só necessita de segurança normativa, vale dizer, a consciência de que exerce seu direito e de que, em caso de ser perturbada, esse fato se imputará ao perturbador e não a ela mesma como temeridade; pelo contrário, esta certeza normativa, se se pretende que verdadeiramente dirija a conduta, deve contar com um apoio cognitivo, dito de outro modo, não deve ser demasiada elevada a probabilidade de que se converta em vítima na ocasião do exercício de seus direitos”.41 40 FABRETTI, Humberto Barrionuevo: Direito Penal Do Inimigo: uma análise sob os aspectos da cidadania. 2008. Tese (Direito Penal) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008. 41 JAKOBS, Günther. La pena estatal: significado e finalidad. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernardo Feijoo Sanchez. Navarra: Aranzadi, 2006. p. 141 e ss. 36 A segurança cognitiva é, portanto, fundamental para a plena vigência da ordem jurídica, pois gera uma total observância das regras por parte das pessoas e garante a comunicação social, mantendo, desta forma, a organização da sociedade. 2.6 – O Direito Penal do Autor A teoria do Direito Penal do Inimigo que abordamos no presente estudo tem uma ligação muito forte com o denominado “Direito Penal do Autor”. Esta modalidade de direito penal permite que a punição recaia sobre a personalidade do indivíduo, ou seja, aquilo que o indivíduo é ou representa e impede que a punição se dê em razão dos fatos cometidos, como é o direito penal do fato, comumente adotado. Pode-se dizer que tal medida se trata de uma antecipação da punibilidade, já que se entende o indivíduo como perigoso e que a ele deve ser imposta pena de maneira a impedir que ele cometa qualquer ato delituoso. É uma tentativa de paralisar a natureza criminosa do indivíduo. Nesse sentido explica Eugênio Raúl Zaffaroni: “Ainda que não haja um critério unitário acerca do que seja o direito penal do autor, podemos dizer que, ao menos em sua manifestação extrema, é uma corrupção do direito penal, em que não se proíbe o ato em si, mas o ato como manifestação de uma “forma de ser” do autor, esta sim considerada verdadeiramente delitiva. O ato teria valor de sintoma de uma personalidade; o proibido e reprovável ou perigoso seria a personalidade e não o ato.”42 O direito penal do autor permite punir de forma mais severa os indivíduos que, em razão de sua personalidade, ou seja, seus costumes de vida e seu comportamento social representam uma ameaça aos padrões estabelecidos pela sociedade e que compõem o sistema social. Esse direito penal do autor está ligado ao direito penal do inimigo, pois Jakobs não pretende punir o criminoso pelo fato que ele praticou, mas sim 42 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 37 em razão de sua personalidade desvirtuada e que representa uma ameaça à organização social, como podemos extrair do texto a seguir: “A culpabilidade do agente não é ponderada pelo direito penal do inimigo. Basta que sua personalidade adeque-se ao padrão do inimigo, está eleito o autor como objeto do direito penal, e não como sujeito de direitos a ele subordinado. Assim sendo, verifica-se que o intento precípuo do direito penal do inimigo é neutralizar o agente fático ou potencialmente nocivo, independentemente de conduta ou bem jurídico a ser protegido, o que se acredita não ser justificável como forma de reintegração da norma supostamente violada, mesmo que subjetivamente. Desta feita, reitera-se não haver sustentáculo suficiente na tese de Jakobs que justifique a punição exacerbada e a relativização de direitos e garantias individuais contra uma suposta proteção de uma norma que, ainda no campo hipotético-dedutivo, pode nem mesmo vir a ser violada”.43 Da análise do trecho acima exposto, podemos inferir a íntima relação do direito penal do autor com o direito penal do inimigo, já que Jakobs se baseia naquela teoria para caracterizar o inimigo e puni-lo. Ainda sobre esta relação, vejamos: “Na doutrina tradicional, o princípio do direito penal do fato o princípio do direito penal do fato se entende como aquele princípio genuinamente liberal, de acordo com o qual devem ser excluídos da responsabilidade jurídico-penal os meros pensamentos, isto é, rechaçando-se um Direito Penal orientado na atitude interna do autor. (...) O direito penal do inimigo não é compatível, portanto, com o direito penal do fato”.44 Em mesmo sentido, Eduardo Demetrio Crespo entende que: “Cabe afirmar que o chamado “Direito Penal do Inimigo”, toda vez que fixa seus objetivos primordiais em combater a determinados grupos de pessoas, abandona o princípio básico do Direito Penal do fato, convertendo-se em uma manifestação das tendências autoritárias do já historicamente conhecido como “Direito Penal de autor”.45 Depois de analisarmos todas as teorias que de alguma forma embasaram o pensamento de Jakobs e estão presentes na teoria do Direito Penal do Inimigo, passemos ao estudo desta. 43 MOHAMED, André Nascimento. O Direito Penal do Autor no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em: <http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/1semestre2010/trabalhos_12010/andremo hamed.pdf>. Acesso em: 23 de set. de 2016 44 JAKOBS, Günther. La pena estatal: significado e finalidad. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernardo Feijoo Sanchez. Navarra: Aranzadi, 2006. 45 CRESPO, Eduardo Demetrio. Do direito penal liberal ao direito penal do inimigo. In: BRITO, Alexis, Augusto Couto de; VANZOLINI, Maria Patrícia (Coord.) Direito penal: aspectos jurídicos controvertidos. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 43. 38 3 – O DIREITO PENAL DO INIMIGO 3.1 – As Velocidades do Direito Penal Para a análise da teoria do direito penal do Inimigo, devemos primeiramente analisar a ideia das velocidades do Direito Penal, trazida por Jesus María Silva Sanchéz, na qual ele dividiu o direito penal em três velocidades, baseado no tempo que o Estado precisa para punir o autor de uma infração, além de levar em conta a supressão de suas garantias. Segundo essa ideia, quanto maior for a velocidade do direito penal, mais rápida é a resposta e a atuação do Estado na punição e aplicação da pena. Por este motivo, podemos classificar as velocidades levando em consideração o tempo que leva para que o agente seja punido. Na primeira velocidade, chamada também de Direito Penal Clássico, o Estado se apresenta de maneira mais lenta para punir o agente, possibilitando que a prisãoocorra apenas com o final do processo. Assim, o tempo entre o cometimento do delito e a punição é mais longo, o que permite garantir que o acusado tenha muitas garantias, já que será punido a penas altas. Já na segunda velocidade, chamada também de Direito Penal Consensual, o Estado se apresenta de maneira mais rápida para punir, sem esperar que se atinja o final do processo, mas aplicando penas mais brandas, como as medidas não privativas de liberdade. Essa velocidade permite relativizar e flexibilizar garantias fundamentais, princípios e normas penais, para que se garanta que o agente seja punido de maneira mais rápida, mas com penas brandas. Na terceira velocidade, conhecida como Direito Penal do Inimigo, objeto de estudo deste trabalho, o Estado se apresenta de maneira imediata para punir o agente, impondo-lhe a prisão e suprimindo suas garantias. É uma modalidade em que o agente terá penas altíssimas e quase nenhuma garantia, que surgiu como uma junção das velocidades anteriores, tendo em vista que 39 aplica as penas altas da primeira velocidade, enquanto suprime as garantias como feito na segunda. 3.2 – A Teoria do Direito Penal do Inimigo Jakobs expôs a teoria do Direito Penal do Inimigo pela primeira vez no ano de 1985, no Congresso dos Penalistas Alemães realizado em Frankfurt. A teoria chamou bastante atenção em razão da severidade com a qual tratava o direito penal, admitindo até a antecipação das punições na tentativa de combater a criminalidade. Na ocasião, o próprio Jakobs criticou fortemente a teoria, dizendo que “O direito penal de inimigos otimiza a proteção de bens jurídicos, o direito penal de cidadãos otimiza esferas de liberdade46”. Jakobs admitiu, entretanto, que a teoria do Direito Penal do Inimigo pudesse, eventualmente, ser adotada em caráter excepcional: “Certamente são possíveis situações, que talvez ocorram inclusive neste momento, em que normas imprescindíveis para um Estado de liberdades perdem seu poder de vigências se se espera com a repressão até que o autor saia de sua esfera privada. Mas então o direito penal de inimigos também só pode ser legitimado como um direito penal de emergência que vige excepcionalmente. Os preceitos penais a ele correspondentes devem por isso ser estritamente separados do direito penal de cidadãos, preferivelmente também na sua apresentação externa.”47 A seguir, podemos ver diferentes trechos da palestra de Jakobs que demonstram como o autor apresentou e criticou a teoria por ele exposta: “O tema que irei tratar designa um problema: o da incriminação do estado prévio a uma lesão, pensada como foi dada, de um bem jurídico. Ao problema citado dedicarei a primeira e mais extensa parte de minha palestra. Posto que a conclusão rezará que consideráveis porções das incriminações antecipadas que se encontram no StGB não podem ser legitimadas em um Estado de liberdades, seguirá uma segunda e mais breve seção em que tratarei de estabelecer a ilegitimidade da incriminação de condutas que têm lugar no estado prévio não poderia 46 JAKOBS, Günther. Incriminação no estado prévio à lesão de um bem jurídico. Tradução de André Luis Callegari. Fundamentos do direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 47 Idem. 40 ser neutralizada pela proteção de bens jurídicos antecipados como a paz jurídica, a segurança pública, um clima favorável ao direito etc.”48 “Em um Estado de liberdades estão isentas de responsabilidade não apenas as cogitações, e sim toda a conduta que se realize num âmbito privado e, também, toda conduta externa que seja per se irrelevante. Um cidadão somente se converte em autor se ultrapassa o limite que acaba de ser indicado e se comporta de um modo perturbador, é dizer, se é atribuída atualmente a configuração de âmbitos de organização alheios.”49 É importante ressaltar que nesse momento da primeira apresentação da Teoria, Jakobs não queria que ela fosse aplicada em lugar nenhum, mas sim demonstrar o quanto a teoria era incompatível com um Estado Democrático de Direito. Nesses termos, o Professor Humberto Fabretti explica: Mas o importante nesse momento é salientar que Jakobs não deseja o Direito Penal do Inimigo, pelo contrário, o combate exaustivamente, sustentando, inclusive, sua incompatibilidade com o Estado Democrático de Direito, como quando afirma que “A existência de um direito penal de inimigos, portanto, não é sinal de força de um Estado de Liberdades, e sim um sinal que esta forma simplesmente não existe.”50 Contudo, durante a chamada Conferência do Milênio, que ocorreu em Berlim, no ano de 1999, Jakobs novamente apresentou a Teoria do Direito Penal do Inimigo, passando a legitimá-la e apartando as críticas anteriormente feitas por ele. Sobre essa mudança de pensamento, o Professor Fabretti novamente explica muito bem: “Em 1999, Jakobs surpreendeu o mundo acadêmico quando, na chamada Conferência do Milênio, em Berlim, abandonou a crítica que havia feito em 1985 e passou a legitimar o Direito Penal do Inimigo, desenvolvendo doutrinariamente a possibilidade e a necessidade de existência de dois “Direitos Penais”, um destinado à “pessoa/cidadão” – Direito Penal do Cidadão; e outro destinado à “não-pessoa/não- cidadão”, ou seja, ao inimigo – Direito Penal do Inimigo. Nessa oportunidade Jakobs esboçou os fundamentos e as características do Direito Penal do Inimigo quando afirmou que a este não havia nenhuma alternativa, motivo pelo qual a ciência do Direito Penal teria a tarefa de “separar o que circula sobre o nome de direito penal, ou seja, submeter à discussão o complemento do direito penal através de um direito de combate ao inimigo”. Apesar de ter sido a primeira vez em que Jakobs legitimou o Direito Penal do Inimigo, não foi a única, pois não obstante todo o espanto causado e as manifestações contrárias, o professor alemão publicou diversos outros textos onde aperfeiçoa sua teoria.”51 48 Idem. 49 Idem. 50 FABRETTI, Humberto Barrionuevo. Direito Penal do Inimigo: uma análise sob os aspectos da cidadania. Dissertação de Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie.São Paulo. 2008,p.61. 51 Idem. 41 Da leitura do trecho apresentado, podemos observar que o autor claramente defendeu que o Direito Penal fosse separado em dois subgrupos, sendo eles o Direito penal do Cidadão e o Direito Penal do Inimigo, baseando tal diferença de tratamento no fato de que o inimigo deve ser considerado como um verdadeiro inimigo do estado e, portanto, não poderia ser comparado ou tratado como um cidadão. Para fortalecer essa ideia, Jakobs defende que haveria a necessidade de, por meio do direito penal, “separar o que circula sobre o nome de direito penal, isso é, submeter à discussão o complemento do direito penal através de um direito de combate ao inimigo52”. Nas palavras do próprio Jakobs: “O Direito Penal conhece dois pólos ou tendências em suas regulações. Por um lado o tratamento com o cidadão, esperando-se até que se exteriorize sua conduta para reagir, com o fim de confirmar a estrutura normativa da sociedade, e por outro o tratamento com o inimigo, que é interceptado já no estado prévio, a que se combate por sua periculosidade53.” Para justificar a sua teoria, o autor apresenta uma forma de funcionalismo que, como já vimos, e como ele mesmo apresenta “se concebe como aquela teoria segundo a qual o Direito Penal está orientado a garantir a identidade normativa, a garantir a constituição da sociedade54”. Assim, pode-se concluir que Jakobs apresenta a sociedade como uma organização baseada na livre interação entre os seus membros. Como a comunicação é a base para o funcionamento de qualquer sociedade, Jakobs acrescenta que todo cidadão é dotado de uma função social que, em conjunto com as outras,
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