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GERENTES E LÍDERES: ELES SÃO DIFERENTES? Abraham Zaleznik Qual a forma ideal de desenvolver a liderança? Cada sociedade tem sua própria resposta para essa pergunta e cada uma, em sua busca por respostas, define suas mais profundas preocupações sobre os propósitos, as distribuições e os usos do poder. A área de negócios contribuiu com uma resposta à pergunta da liderança através da evolução de uma nova estirpe: o gerente. Simultaneamente, as empresas estabeleceram uma nova ética de poder que favorece a liderança coletiva ao invés da individual, o culto ao grupo e não à personalidade. Embora garanta a competência, o controle e o equilíbrio do poder entre grupos com potencial para rivalidade, infelizmente a liderança gerencial não garante a imaginação, a criatividade nem o comportamento ético na administração dos destinos das empresas. A liderança requer inevitavelmente o uso do poder para influenciar os pensamentos e ações dos outros. O poder nas mãos de um indivíduo implica riscos humanos: primeiro, o risco de achar que o poder é o mesmo que a capacidade de obter resultados imediatos; segundo, o risco de ignorar a diversidade de formas que as pessoas possam acumular poder de maneira legítima; e terceiro, o risco de perder o autocontrole devido à ânsia pelo poder. A necessidade de evitar esses riscos é responsável, em parte, pelo desenvolvimento da liderança coletiva e da ética gerencial. Consequentemente, um conservadorismo inerente domina a cultura das grandes organizações. Em The Second American Revolution, John D. Rockefeller III descreve o conservadorismo das organizações: "Uma organização é um sistema que tem lógica própria e todo o peso da tradição e da inércia. Há uma inclinação em favor das maneiras experimentadas e comprovadas de fazer as coisas e contra correr riscos e ir em busca de novas direções."i A partir desse conservadorismo e dessa inércia, as empresas possibilitam a sucessão através do desenvolvimento de gerentes em vez de líderes individuais. 'Ironicamente, essa ética favorece uma cultura burocrática nos negócios, supostamente nossa última proteção contra as transgressões e controles da burocracia no governo e na educação. Personalidade Gerencial versus Personalidade de Liderança A cultura gerencial enfatiza o racionalismo e o controle. Estejam as suas energias voltadas para metas, recursos, estruturas organizacionais ou pessoas, o gerente é um solucionador de problemas. Ele pergunta: "Que problemas têm de ser solucionados e quais são as melhores formas de obter resultados de modo que as pessoas continuem a contribuir com a organização?" A partir desse ponto de vista, a liderança é simplesmente um esforço prático | 3 | no sentido de direcionar os acontecimentos; e a fim de cumprir a sua tarefa, o gerente precisa que muitas pessoas operem de maneira eficiente em vários níveis de status e responsabilidade. Não é preciso ser gênio nem herói para ser gerente, mas é preciso ser persistente, firme, trabalhar duro, ser inteligente, ter capacidade analítica e, talvez o mais importante, ser tolerante e ter boa-fé. Outro conceito de liderança, no entanto, vincula crenças quase místicas quanto ao que é um líder e supõe que apenas pessoas grandiosas sejam dignas do poder e da política. Nesse caso, a liderança é um psicodrama em que uma pessoa brilhante e solitária tem de ter controle sobre si mesma como pré-requisito para controlar os outros. Esse tipo de expectativa da liderança apresenta um forte contraste com o conceito rotineiro, prático, porém importante de que liderar é gerenciar o trabalho realizado por outras pessoas. Duas perguntas nos vêm à mente. Essa mística da liderança é simplesmente uma reminiscência da nossa infância, da sensação de dependência e do desejo de se ter pais bons e heroicos? Ou é verdade que, não importa o quão competentes os gerentes sejam, a sua liderança fica estagnada devido às suas limitações em visualizar propósitos e gerar valor no trabalho? Impulsionados por propósitos restritos, sem capacidade de imaginação e comunicação, os gerentes perpetuam conflitos em grupo em lugar de transformá-los em desejos e metas mais amplos? Se os problemas exigem grandeza, então o julgamento baseado no desempenho do passado, a seleção e o desenvolvimento de líderes deixam muita coisa ao acaso. Não existem maneiras de treinar "grandes" líderes. Ademais, fora o que deixamos ao acaso, há uma questão mais profunda na relação entre a necessidade de gerentes competentes e a aspiração por grandes líderes. Aquilo que é necessário para garantir que haja pessoas suficientes para assumir responsabilidades práticas pode inibir o desenvolvimento de grandes líderes. Por outro lado, a presença de grandes líderes pode prejudicar o desenvolvimento de gerentes que em geral se tornam muito ansiosos na desordem relativa que os líderes parecem gerar. E muito fácil colocar de lado o dilema de treinar gerentes, embora possamos vir a precisar de novos líderes ou de líderes à custa de gerentes, simplesmente dizendo que há necessidade de pessoas que possam representar ambos os papéis. Mas assim como a cultura gerencial difere da cultura empresarial desenvolvida quando os líderes surgiram nas organizações, gerentes e líderes são tipos de pessoas muito diferentes. A diferença está na motivação, na história pessoal e na maneira como essas pessoas pensam e agem. Atitudes com Relação às Metas Os gerentes tendem a adotar atitudes impessoais, se não passivas, com relação às metas. As metas gerenciais são decorrentes de necessidades, não desejos, por isso estão profundamente arraigadas na história e na cultura da organização. | 4 | Frederic G. Donner, presidente e CEO da General Motors de 1958 a 1967, expressou esse tipo de atitude com relação às metas ao definir a posição da GM com respeito ao desenvolvimento de produtos: "Para atendermos às necessidades do mercado, é preciso reconhecer as novas necessidades e desejos dos clientes com boa antecedência para que tenhamos os produtos certos no momento certo e na quantidade certa." “Nós temos de equilibrar as tendências de preferência com base nos compromissos necessários para fazer um produto final que seja confiável e bonito, que tenha bom desempenho e seja vendido a um preço competitivo no volume necessário. Nós temos de projetar não só os carros que gostaríamos de montar, mas, ainda mais importante, os carros que os nossos clientes querem comprar.” Em nenhum momento essa declaração passa a ideia de que os gostos e preferências dos consumidores se manifestem como resultado daquilo que os fabricantes fazem. Na verdade, através do projeto, da propaganda e da promoção do produto, os consumidores aprendem a gostar daquilo que eles passam a dizer que precisam. Poucos diriam que as pessoas que gostam de tirar fotografias precisam de uma máquina que também revele as fotos. Mas, em resposta a uma necessidade de novidade, conveniência e de um intervalo mais curto entre a ação (tirar uma foto) e o prazer (ver a foto), a câmera Polaroid foi bem-sucedida no mercado. É inconcebível afirmar que Edwin Land tenha reagido às impressões das necessidades dos clientes. Em vez disso, ele transformou uma tecnologia (a polarização da luz) em um produto que se proliferou e estimulou os desejos dos consumidores. O exemplo da Polaroid e Land sugere como os líderes veem as metas. Eles são ativos, não reativos, e formulam ideias em vez de reagir a elas. Os líderes adotam uma atitude pessoal e ativa com relação às metas. A influência exercida por um líder quanto a alterar humores, evocar imagens e expectativas e definir desejos e objetivos específicos determina a direção de uma empresa. O resultado líquido dessa influência muda a maneira como as pessoas pensam naquilo que é desejável, possível e necessário. Conceitos de Trabalho Os gerentes tendem a ver o trabalho como um processo capacitador que envolve uma combinação de pessoas e ideias que interagem para definirestratégias e tomar decisões. Eles ajudam o processo a progredir, calculando os interesses opostos, planejando quando surgem questões controversas e reduzindo as tensões. Nesse processo capacitador, as táticas dos gerentes parecem flexíveis: por um lado, eles negociam e barganham; por outro lado, usam recompensas, punições e outras formas de coerção. As ações de Alfred P. Sloan na General Motors ilustram como esse processo funciona em situações de conflito. No início da década de 1920, quando a Ford Motor Company ainda dominava o setor automobilístico usando, assim como a General Motors, o motor convencional refrigerado a água, Charles Kettering, com total apoio de Pierre du Pont, | 5 | dedicou-se ao projeto de um motor de cobre refrigerado a ar, que, se fosse bem-sucedido, seria um excelente golpe técnico e de marketing para a GM. Kettering acreditava no seu produto, mas os chefes das divisões de fábrica eram contra o novo projeto por dois motivos: primeiro, ele era tecnicamente inconfiável e, segundo, a empresa estava arriscando tudo ao investir em um novo produto em vez de dar atenção à situação atual de marketing. No terceiro trimestre de 1923, após uma série de falsas largadas e depois da sua decisão de recolher os Chevrolet com motor de cobre dos revendedores e clientes, a gerência da GM jogou fora o projeto. Quando Kettering ficou sabendo que a empresa havia rejeitado o motor, ele sentiu-se profundamente desencorajado e escreveu para Sloan que, sem a "resistência organizada" contra o projeto, ele teria sido bem-sucedido e que, a menos que o projeto fosse salvo, ele sairia da empresa. Alfred Sloan sabia muito bem que Kettering estava insatisfeito e tinha a intenção de sair da General Motors. Sloan também sabia que, embora as divisões de fábrica fossem totalmente contra o novo motor, Pierre du Pont apoiava Kettering. Além disso, o próprio Sloan tinha escrito uma carta para Kettering há menos de dois anos, expressando total confiança nele. O problema de Sloan era como manter a sua decisão, manter Kettering na organização (ele era valioso demais para ser perdido), evitar ficar em uma situação desagradável com du Pont e encorajar os chefes das divisões a continuarem a desenvolver linhas de produtos usando os motores convencionais refrigerados a água. As ações de Sloan em face desse conflito revelam muito sobre a forma como os gerentes trabalham. Primeiro, ele tentou renovar a confiança de Kettering, colocando o problema de maneira muito ambígua, sugerindo que ele e o comitê executivo estavam do lado de Kettering, mas que não seria prático forçar as divisões a fazerem algo a que se opunham. Ele colocou o problema como sendo uma questão referente às pessoas, não ao produto. Em segundo lugar, propôs uma reorganização em torno do problema através da consolidação de todas as funções em uma nova divisão que seria responsável pelo projeto, pela produção e pelo marketing do novo motor. Essa solução parecia tão ambígua quanto seus esforços para acalmar os ânimos de Kettering. Sloan escreveu: "Meu plano era criar uma operação-piloto independente sob a jurisdição do Sr. Kettering, uma divisão de automóveis com motor refrigerado de cobre. O Sr. Kettering nomearia o seu próprio engenheiro-chefe e sua equipe de fabricação para solucionar os problemas técnicos de produção."ii Sloan não discutiu o valor prático dessa solução, que incluía colocar toda a responsabilidade gerencial nas mãos de um inventor, mas a verdade é que ele usou esse plano para limitar o seu conflito com Pierre DuPont. Essencialmente, a solução gerencial criada por Sloan limitou as opções disponíveis para os outros. A solução estrutural restringia as opções, limitando até as reações emocionais de forma que as pessoas mais importantes não puderam fazer nada a não ser acatá-la. Ela permitiu que Sloan afirmasse o seguinte em seu memorando para du Pont: "Nós discutimos a questão com o Sr. Kettering esta manhã, e ele concorda plenamente com todas as nossas observações. Ele parece receber as sugestões com entusiasmo e está muito confiante de que, nessa linha, as coisas podem dar certo."iii | 6 | Sloan acalmou os ânimos das pessoas que se opunham ao seu ponto de vista, desenvolvendo uma solução estrutural que parecia conceder algo, mas na verdade só limitava as opções. Assim ele teve condições de autorizar o gerente geral da divisão automobilística, com quem ele concordava, a acelerar o projeto de carros refrigerados a água para a demanda imediata do mercado. Anos depois, Sloan escreveu, evidentemente em um tom irônico: "O carro com motor de cobre refrigerado não deu certo. Seu projeto simplesmente se apagou; eu não sei o porquê.”iv Para fazer com que as pessoas aceitem soluções para seus problemas, os gerentes precisam coordenar e equilibrar continuamente pontos de vista antagônicos. É interessante observar que esse tipo de trabalho tem muita coisa em comum com aquilo que os diplomatas e os mediadores fazem, sendo Henry Kissinger aparentemente um praticante de destaque. O objetivo dos gerentes é equilibrar as forças em busca de soluções aceitáveis como acordos entre valores conflitantes. Os líderes trabalham na direção oposta. Em situações em que os gerentes agem para limitar as opções, os líderes desenvolvem novas abordagens para problemas antigos e abrem as questões a novas opções. Para serem eficazes, os líderes têm de projetar suas ideias em imagens que estimulem as pessoas e só então desenvolver opções que deem substância a essas imagens. A breve passagem de John F. Kennedy pela presidência mostra os pontos fortes e fracos relacionados ao estímulo gerado por líderes em seu trabalho. Em seu discurso de posse, ele disse: “Eu quero que todas as nações saibam, independentemente de serem nossas amigas ou inimigas, que nós pagaremos qualquer preço, suportaremos qualquer fardo, venceremos qualquer dificuldade, daremos apoio a qualquer aliado, ficaremos contra qualquer adversário a fim de garantir a sobrevivência e o sucesso da liberdade.” Essa declaração, várias vezes citada, forçou as pessoas a reagirem além das preocupações imediatas e se identificarem com Kennedy e importantes ideais compartilhados. Em uma análise mais cuidadosa, no entanto, essa declaração é absurda, pois promete uma atitude que, se adotada, como no caso da Guerra do Vietnã, pode ter resultados desastrosos. No entanto, a menos que as expectativas sejam atiçadas e mobilizadas, com todos os perigos de frustração inerentes ao desejo exaltado, novos pensamentos e novas opções nunca seriam sugeridos. Os líderes trabalham a partir de posições de alto risco. Na verdade, em geral, por seu próprio temperamento, eles estão dispostos a buscar riscos e perigos, principalmente quando a chance de oportunidade e recompensa parece ser promissora. Segundo minhas observações, o motivo pelo qual um indivíduo sai em busca de riscos enquanto outro aborda os problemas de maneira conservadora depende mais da sua personalidade do que da escolha consciente. Para aqueles que se tornam gerentes, o instinto de sobrevivência domina a necessidade de correr riscos e, com esse instinto, vem a capacidade de tolerar um | 7 | trabalho rotineiro e prático. Os líderes às vezes reagem ao trabalho rotineiro como se fosse uma calamidade. O Relacionamento com os Outros Os gerentes preferem trabalhar com as pessoas; eles evitam atividades solitárias porque elas os deixam ansiosos. Há muitos anos, eu coordenei estudos sobre os aspectos psicológicos das carreiras. A necessidade de ir em busca de outras pessoas com quem trabalhar e colaborar parecia se destacar como uma característica importante dos gerentes. Quando lhes pedíamos, por exemplo, que escrevessem histórias criativas sobre uma figura (um menino contemplando um violino ou a silhueta de um homem em posição de reflexão), os gerentes enchiam suas histórias de pessoas. A seguir encontra-se um exemplo da história criativa de um gerente sobreo menino que contemplava o violino: "A mãe e o pai insistiam que seu filho tivesse aulas de música para que um dia pudesse se tornar um concertista. O seu instrumento havia sido encomendado e acabara de chegar. O menino está ponderando as alternativas de jogar futebol com os outros meninos ou tocar. Ele não consegue entender como seus pais podem achar o violino melhor do que um gol." "Depois de meses de aulas de violino, o menino já está cheio, seu pai está enlouquecendo e a mãe está disposta a se render, relutantemente, aos seus desejos. O campeonato de futebol já passou, mas um bom jogador da terceira base entrará em campo no próximo campeonato de beisebol." A história ilustra dois temas que esclarecem as atitudes dos gerentes com respeito às relações humanas. O primeiro, como eu sugeri, é buscar atividade com outras pessoas (ou seja, o time de futebol) e o segundo é manter um nível baixo de envolvimento emocional nessas relações. O baixo envolvimento emocional pode ser identificado no uso que o autor faz de metáforas convencionais e até mesmo clichês, assim como na descrição da transformação imediata do conflito potencial em decisões harmoniosas. Nesse caso, o menino, a mãe e o pai concordam em trocar o violino pelos esportes. Esses dois temas podem parecer paradoxais, mas a sua coexistência reforça aquilo que o gerente faz, inclusive a reconciliação de diferenças, a tentativa de conseguir acordos e o estabelecimento de um equilíbrio de forças. A história também demonstra que falta empatia aos gerentes, ou seja, a capacidade de captar intuitivamente os pensamentos e sentimentos dos outros. Analisemos outra história escrita com base na mesma figura por uma pessoa considerada líder por seus colegas: "Esse menino parece ser um artista sincero, profundamente tocado pelo violino, e tem o grande desejo de dominar o instrumento." "Ele parece ter acabado de sair de uma aula prática e estar desanimado por não conseguir produzir os sons que tem certeza que podem ser tirados daquele violino." | 8 | "Ele parece estar prometendo a si mesmo que dedicará o tempo e o esforço necessários para tocar esse instrumento até que esteja satisfeito consigo mesmo e seja capaz de expressar as qualidades musicais que sabe que existem dentro dele." "Com essa determinação, esse menino tornou-se um dos maiores violinistas do seu tempo." A empatia não é simplesmente uma questão de dar atenção às outras pessoas. Também é a capacidade de entender sinais emocionais e torná-los significativos em uma relação. As pessoas que descrevem alguém com palavras como "profundamente tocado", “alguém que tem um grande desejo", está "desanimado" e é capaz de "prometer a si mesmo" parecem ter uma percepção interna que pode ser usada nas relações com os outros. Os gerentes se relacionam com as pessoas de acordo com o seu papel em uma sequência de eventos ou em um processo de tomada de decisão, ao passo que os líderes, preocupados com as ideias, se relacionam de maneira mais intuitiva e empática. A distinção está entre a atenção do gerente à maneira como as coisas são feitas e a atenção do gerente àquilo que os eventos e as decisões significam para os participantes. Recentemente, os gerentes adotaram da teoria do jogo a ideia de que os eventos de tomada de decisões podem ser de um destes dois tipos: a situação ganhar-perder (ou o jogo de soma zero) ou a situação ganhar-ganhar, em que todos os participantes da ação se saem bem. Os gerentes procuram transformar situações ganhar-perder em situações ganhar-ganhar como parte do processo de reconciliar as diferenças entre as pessoas e manter o equilíbrio de forças. Apenas para ilustrar, analisemos a decisão de como alocar recursos de capital entre divisões operacionais de uma grande organização descentralizada. Do ponto de vista superficial, a quantia disponível para distribuição é limitada a qualquer momento. Portanto, presume-se que, quanto mais uma divisão receber, menos haverá disponível para as outras divisões. Os gerentes tendem a ver essa situação (por afetar as relações humanas) como uma questão de conversão: como tornar aquilo que parece ser um problema ganhar-perder em um problema ganhar-ganhar. A partir desse ponto de vista, várias soluções nos vêm à mente. Em primeiro lugar, o gerente concentra a atenção dos outros nos procedimentos, não na substância. Nesse caso as partes envolvidas ficam ocupadas com o problema mais amplo de como tomar decisões, não que decisões tomar. Uma vez dedicadas a um problema mais amplo, essas pessoas têm de apoiar os resultados, pois participaram do processo de formular as regras de tomada de decisões. Como elas acreditam nas regras que formularam, aceitarão as perdas atuais, acreditando que da próxima vez ganharão. Em segundo lugar, o gerente se comunica indiretamente com os subordinados através de "sinais" em vez de "mensagens". Um sinal engloba uma série de posições implícitas, enquanto a mensagem define claramente uma posição. Os sinais não são conclusivos e estão sujeitos à reinterpretação caso as pessoas fiquem chateadas e aborrecidas; as mensagens envolvem a consequência direta de que algumas pessoas realmente não vão gostar do que | 9 | vão ouvir. A natureza das mensagens aumenta a reação emocional e deixa os gerentes ansiosos. Através dos sinais, a questão de quem ganha ou perde em geral fica obscura. Em terceiro lugar, os gerentes jogam a favor do tempo. Eles parecem saber que, com o passar do tempo e a demora para tomar decisões importantes, surgem acordos que acabam com o estímulo das situações ganhar-perder e o "jogo" original será suplantado por situações adicionais. Os acordos significam que se pode ganhar e perder ao mesmo tempo, dependendo do que estiver em jogo. Sem dúvida há muitas outras jogadas táticas usadas pelos gerentes para mudar situações humanas de ganhar-perder para ganhar-ganhar. Mas a questão é que essas táticas se concentram no processo de tomada de decisões em si, que interessa aos gerentes, não aos líderes. Os interesses táticos envolvem custos e benefícios; eles aumentam a intriga burocrática e política e diminuem as atividades diretas e difíceis, assim como as relações humanas calorosas nas organizações. Como resultado, é frequente ouvir os subordinados dizerem que os gerentes são incoerentes, imparciais e manipuladores. Esses adjetivos são decorrentes da percepção por parte dos subordinados de que eles estão unidos em um processo cujo objetivo é manter uma estrutura controlada, racional e imparcial. Em contraposição, as referências aos líderes são recheadas de adjetivos cujo conteúdo emocional é bastante rico. Os líderes atraem fortes sentimentos de identidade e diversidade ou de amor e ódio. As relações humanas em estruturas dominadas por líderes muitas vezes parecem ser turbulentas, intensas e às vezes até desorganizadas. Atmosferas desse tipo intensificam a motivação individual e muitas vezes produzem resultados imprevistos. As Percepções do Ser Em The Varieties of Religious Experience, William James descreve dois tipos básicos de personalidade: pessoas "com uma só encarnação" e os "reencarnados". As pessoas cuja personalidade é do primeiro tipo são aquelas que se adaptaram de forma direta na vida e cujas vidas fluem de maneira razoavelmente pacífica desde o nascimento. Para os reencarnados, por sua vez, as coisas não são fáceis. Suas vidas são marcadas por uma luta contínua no sentido de atingir algum tipo de ordem. Ao contrário das pessoas com uma só encarnação, elas não conseguem simplesmente aceitar as coisas. Segundo James, da mesma maneira, pessoas com essas personalidades têm visões diferentes do mundo. Para uma personalidade com uma só encarnação, a percepção do ser como um guia para a conduta e a atitude vem da sensação de sentir-se em casa e em harmonia com o ambiente. Para o reencarnado, a percepção do ser vem de uma sensação de profundo isolamento. A sensação de pertencer ou estar isoladotem uma importância prática para os tipos de investimento que os gerentes e líderes fazem em suas carreiras. Os gerentes se consideram conservadores e reguladores de uma ordem existente com a qual eles se identificam pessoalmente e que lhes traz recompensas. A sensação de valor próprio do gerente aumenta através da perpetuação e do reforço das instituições existentes: ele cumpre um papel que está em harmonia com os ideais de dever e responsabilidade. William James tinha essa | 10 | harmonia em mente – essa percepção do ser que tem facilidade de fluir para o mundo lá fora e sair dele – ao definir a personalidade das pessoas com uma só encarnação. Os líderes tendem a ser personalidades reencarnadas, pessoas que se sentem isoladas do seu ambiente. Eles podem trabalhar em organizações, mas nunca pertencem a elas. A sua percepção de quem são não depende da participação, dos papéis no trabalho nem outros indicadores sociais de identidade. E essa percepção de identidade pode formar a base teórica para explicar por que determinados indivíduos buscam oportunidades de mudar. Os métodos utilizados para obter mudanças podem ser tecnológicos, políticos ou ideológicos, mas o objetivo é o mesmo: alterar profundamente as relações humanas, econômicas e políticas. Ao levar em conta o desenvolvimento da liderança, é preciso analisar dois cursos diferentes da história da vida: (1) o desenvolvimento através da socialização, que prepara o indivíduo para dirigir instituições e manter o equilíbrio atual das relações sociais; e (2) o desenvolvimento através do domínio pessoal, que encoraja o indivíduo a lutar por mudanças psicológicas e sociais. A sociedade produz seus talentos gerenciais através da primeira linha de desenvolvimento; os líderes são provenientes da segunda. O Desenvolvimento da Liderança O desenvolvimento de todos começa com a família. Cada pessoa passa pelos traumas associados a se separar dos pais e pela dor causada por essa separação. Da mesma forma, todos os indivíduos enfrentam as dificuldades de atingir a autoadaptação e o autocontrole. No entanto, para algumas pessoas, talvez a maioria, a infância traz gratificações adequadas e oportunidades suficientes para que elas encontrem substitutos para recompensas não mais disponíveis. Esses indivíduos, aqueles "com uma só encarnação", identificam-se de forma moderada com os pais e encontram harmonia entre aquilo que esperam e aquilo que conseguem da vida. Mas suponhamos que o sofrimento da separação seja agravado por uma combinação de exigências por parte dos pais e necessidades individuais de modo que uma sensação de isolamento, de ser especial ou de cautela rompa os laços que ligam os filhos aos pais e outras figuras de autoridade. Dada uma tendência sob tais condições, a pessoa se envolve profundamente em seu mundo interior, perdendo o interesse pelo mundo lá fora. Para essa pessoa, a autoestima já não depende apenas de ligações positivas e recompensas reais. Uma forma de autoconfiança toma conta dela junto com expectativas de desempenho e êxito, talvez até mesmo com o desejo de fazer um trabalho muito bom. Essas percepções de si mesmo podem não dar em nada se os talentos do indivíduo forem insignificantes. Mesmo com grandes talentos, não há garantia de êxito, muito menos de que o resultado final seja bom, não ruim. Outros fatores também influem no desenvolvimento. Primeiro, os líderes são como os artistas e outras pessoas-talentos as quais muitas vezes lutam contra neuroses; sua capacidade de agir varia consideravelmente até mesmo em curto prazo, e alguns líderes potenciais perdem a luta. Além da infância, os padrões de | 11 | desenvolvimento que afetam gerentes e líderes envolvem a influência seletiva de determinadas pessoas. As personalidades gerenciais criam vínculos moderados e bem distribuídos. Os líderes, por sua vez, estabelecem, e também rompem, intensos relacionamentos a dois. É comum observar que pessoas muito talentosas, em geral, são alunos indiferentes. Ninguém poderia ter previsto, por exemplo, que Einstein faria grandes descobertas com base em seu histórico escolar medíocre. O motivo da mediocridade obviamente não é a ausência de capacidade. Em vez disso, ela pode ser resultante do ensimesmamento e da incapacidade de prestar atenção nas tarefas comuns. A única maneira de um indivíduo acabar com as preocupações fantasiosas e o ensimesmamento é criar um vínculo profundo com um grande mestre ou outra pessoa que entenda e seja capaz de se comunicar com o indivíduo talentoso. Se os indivíduos talentosos conseguem encontrar o que precisam em um relacionamento a dois depende da disponibilidade de mestres, às vezes substitutos dos pais, capazes de cultivar talentos. Felizmente, quando as gerações se encontram e as autosseleções ocorrem, nós aprendemos mais sobre como desenvolver líderes e como pessoas-talentos as de gerações distintas influenciam umas às outras. Embora aparentemente condenadas a carreiras medíocres, as pessoas que criam um importante relacionamento de aprendizado a dois, em geral, conseguem acelerar e intensificar o seu desenvolvimento. O fato de o indivíduo estar ou não psicologicamente preparado para se beneficiar de um relacionamento desse tipo depende de experiências na vida que forcem essa pessoa a se voltar para dentro. Um bom exemplo é Dwight Eisenhower, cuja carreira precoce no exército dizia muito pouco sobre o seu desenvolvimento futuro. Durante a Primeira Guerra Mundial, enquanto alguns de seus colegas de West Point já estavam vivendo a guerra em primeira mão na França, Eisenhower sentia-se "preso na monotonia e na segurança indesejada da Zona do Interior... que era uma punição intolerável."v Pouco depois da Primeira Guerra Mundial, Eisenhower, na época um jovem oficial um tanto pessimista quanto às suas perspectivas de carreira, pediu transferência para o Panamá a fim de trabalhar sob as ordens do General Fox Connor, um alto oficial que ele admirava. O exército negou o seu pedido. Isso ainda preocupava Eisenhower quando Ikey, o seu primeiro filho, não resistiu a uma gripe. Devido a um senso de responsabilidade para com os seus, o exército então transferiu Eisenhower para o Panamá, onde ele passou a servir sob o comando do General Connor, estando a lembrança do seu filho perdida sempre com ele. Na relação com o tipo de pai que ele gostaria de ter sido, Eisenhower se transformou no filho que tinha perdido. E foi nessas condições que ele começou a aprender com o seu mestre. O General Connor lhe ofereceu – e Eisenhower aceitou de bom grado – um aprendizado excelente sobre as forças armadas. Os efeitos desse relacionamento em Eisenhower não podem ser medidos de maneira quantitativa, mas ao se analisar a sua carreira a partir desse ponto, pode- se ver que a sua importância foi inestimável. | 12 | Mais tarde, Eisenhower escreveria o seguinte sobre Connor: "Conviver com o General Connor foi como fazer uma pós-graduação em forças armadas e ciências humanas com um homem experiente que detinha o conhecimento do homem e de sua conduta. Eu nunca conseguirei expressar de forma adequada a minha gratidão por esse homem. ... Tendo convivido a vida inteira com grandes e bons homens, ele é a figura mais ou menos invisível com quem eu tenho uma dívida incalculável." Algum tempo depois do período de serviço sob o comando do General Connor, veio a virada de Eisenhower. Ele recebeu ordens para estudar na Escola de Comando e Estado-maior de Fort Leavenworth, uma das instituições mais competitivas do exército. Era uma indicação cobiçada, e Eisenhower tirou vantagem da oportunidade. Ao contrário do seu desempenho na escola em West Point, seu trabalho na Escola de Comando foi excelente. Ele se formou como o primeiro da turma. As biografias de pessoas talentosas revelam repetidamente o papel importante de um mestre no desenvolvimento de um indivíduo. Andrew Carnegie devia muito ao seu superior, Thomas A. Scott. Como chefeda Divisão Ocidental da Pennsylvania Railroad, Scott reconheceu o talento e o desejo de aprender do jovem telegrafista. Ao dar a Carnegie cada vez mais responsabilidades e a oportunidade de aprender através da observação pessoal, Scott aumentou a autoconfiança e o senso de êxito de Carnegie. Devido à sua própria força e êxito pessoais, Scott não tinha medo do dinamismo de Carnegie. Pelo contrário: ele encorajava a iniciativa de Carnegie. Os grandes mestres correm riscos. Eles apostam no talento observado em pessoas mais jovens e arriscam o envolvimento emocional no trabalho com seus aprendizes. Nem sempre os riscos compensam, mas a disposição de correr esses riscos parece ser essencial para o desenvolvimento dos líderes. As Organizações Conseguem Desenvolver Líderes? Um mito sobre como as pessoas aprendem e se desenvolvem que parece ter tomado conta da cultura norte-americana também domina o pensamento da área de negócios. O mito é que as pessoas aprendem melhor com seus colegas. Supostamente, a ameaça de avaliação e até mesmo humilhação não existe no relacionamento entre os colegas devido à tendência de identificação mútua e às restrições sociais quanto ao comportamento autoritário entre pessoas em posições iguais. O treinamento pelos pares ocorre de várias formas nas organizações. O uso de forças-tarefas, por exemplo, formadas por colegas de vários grupos ocupacionais interessados (vendas, produção, pesquisas e finanças) supostamente acabam com as restrições de autoridade sobre a disposição do indivíduo de declarar e trocar ideias. Diz a teoria que, consequentemente, as pessoas interagem com maior liberdade, ouvem mais atentamente às críticas e a outros pontos de vista e, finalmente, aprendem com esse intercâmbio saudável. | 13 | Outra aplicação do treinamento pelos pares existe em algumas grandes empresas como a Philips N.V., da Holanda, em que a estrutura organizacional se baseia no princípio de responsabilidade conjunta de dois colegas, sendo que um representa o lado comercial do negócio e outro o lado técnico. Do ponto de vista formal, ambos têm responsabilidade igual pelas operações geográficas ou os grupos de produtos, seja lá qual for o caso. Do ponto de vista prático, pode ser que um dos dois domine o gerenciamento. Contudo, a principal interação se dá entre duas pessoas em pé de igualdade. A principal questão que eu levanto sobre esses arranjos é se eles perpetuam a orientação gerencial e impedem a formação de relacionamento a dois entre altos funcionários e líderes potenciais. Ciente dos efeitos repressores dos relacionamentos entre colegas sobre o dinamismo e a iniciativa individual, outra empresa, muito menor que a Philips, utiliza a responsabilidade conjunta dos colegas para operar as unidades, só que com uma diferença importante. O principal executivo dessa empresa encoraja a concorrência e a rivalidade entre os colegas, recompensando aqueles que saem com mais responsabilidades. Esses arranjos híbridos têm algumas consequências inintencionais que podem ser desastrosas. Não existe uma forma fácil de limitar a rivalidade. Justo pelo contrário, ela permeia todos os níveis da operação e abre caminho para a formação de facções em uma atmosfera de intriga. Uma grande empresa integrada de petróleo aceitou a importância do desenvolvimento de líderes através da influência direta dos altos executivos sobre os mais jovens. O presidente e CEO seleciona regularmente um recém-formado talentoso para trabalhar como seu assistente especial, com quem trabalhará durante um ano. No fim do ano, o jovem executivo fica à disposição para ser nomeado para uma das divisões operacionais, em que assumirá um cargo de responsabilidade em vez de uma posição de treinamento. Esse aprendizado permite que o jovem executivo se familiarize em primeira mão com o uso do poder e com os antídotos importantes para a doença do poder, conhecida como desempenho e integridade com arrogância. O trabalho em relacionamentos a dois, em que há uma diferença formal e reconhecida no poder dos envolvidos, requer muita tolerância com o intercâmbio emocional. Esse intercâmbio, inevitável em situações de trabalho conjunto, provavelmente é responsável pela relutância de muitos executivos quanto a se envolverem em tais relacionamentos. A revista Fortune publicou uma matéria interessante sobre a saída de um executivo-chave, John W. Hanley, da alta gerência da Procter & Gamble, pois passaria a ocupar o cargo de CEO em Monsanto.vi Segundo a sua narrativa, o CEO e presidente da P&G desconsiderou o nome de Hanley para a presidência, nomeando outro vice-presidente executivo para substituí-lo. É evidente que o presidente achou que não conseguiria trabalhar bem com Hanley, que, como ele sabia, era dinâmico, ansioso por experimentar e mudar práticas e desafiava constantemente seu superior. É natural que o CEO tenha o direito de selecionar as pessoas com quem tem afinidade. Mas eu me pergunto se uma capacidade maior por parte dos altos executivos de tolerar os impulsos e o comportamento competitivo de seus subordinados não | 14 | seria saudável para as empresas. Ao menos uma tolerância maior com respeito ao intercâmbio não favoreceria o membro da equipe gerencial à custa de um indivíduo que poderia vir a se tornar um líder. Eu me surpreendo constantemente com a frequência com que os principais executivos sentem- se ameaçados por desafios abertos às suas ideias, como se a fonte da sua autoridade, não das suas ideias específicas, estivesse em questão. Em um caso, um CEO, incomodado pelo dinamismo e às vezes pela rudeza direta de um de seus vice-presidentes de talento, usou vários métodos indiretos, como reuniões em grupo e dicas de diretores de fora, para evitar ter de lidar com esse subordinado. Eu aconselhei o executivo a encarar de frente aquilo que o irritava. Eu sugeri que, através do confronto direto, cara a cara, tanto ele quanto o seu subordinado aprenderiam a entender a distinção entre a autoridade a ser preservada e as questões a serem debatidas. A capacidade de confronto também é a capacidade de tolerar intercâmbios dinâmicos. E essa habilidade não só tem o efeito líquido de acabar com a ambiguidade e o uso de sinais tão característicos das culturas gerenciais, mas também encoraja os relacionamentos emocionais de que os líderes precisam se quiserem sobreviver. Apêndice Comentário Retrospectivo Não faz muito tempo que Bert Lance, diretor de orçamentos e confidente do ex-presidente Jimmy Carter, declarou: "Se não estiver quebrado, não conserte." Esse conselho está de acordo com a forma de pensar dos gerentes. Os líderes veem uma realidade diferente: "Se não estiver quebrado, talvez seja a única oportunidade de consertar." Na disciplina esplêndida do mercado, usar fórmulas do passado para obter êxito hoje espalha as sementes da decadência. O setor automobilístico norte-americano foi citado tantas vezes como o melhor exemplo do efeito suicida de continuar a fazer aquilo que sempre se fez nas águas do sucesso, que a sua história beira o banal. Mas é verdade. Os altos executivos do setor automobilístico, assim como os gerentes de muitos outros setores norte-americanos, não conseguiram entender as lições ilusórias do sucesso, revelando a falha crônica da mística gerencial. Como consequência de tanta confiança na medida prática de continuar a empregar no presente e no futuro as práticas bem-sucedidas do passado, nós enfrentamos o fato assustador de que o item mais exportado pelos Estados Unidos na última década ou mais foi empregos. Nós convivemos com a cruel realidade de que o depósito de habilidades chamado know-how diminuiu. Talvez o mais triste seja o fato de que nossos filhos e netos talvez não tenham a oportunidade de gozar do mesmo padrão de vida que trabalhamos tanto para atingir, muito menos gozar de um padrão de vida melhor como herança das gerações. | 15 | Quando o artigo "Gerentes e Líderes: Eles São Diferentes?"foi publicado pela primeira vez, na revista Harvard Business Review de maio-junho de 1977, os gerentes e teóricos profissionais, inclusive muitos de meus colegas da Harvard Business School, acharam que eu tinha perdido o juízo. As pessoas comuns que fazem parte de uma organização com estrutura e processo superiores não têm um desempenho melhor do que as pessoas superiores que operam em uma organização comum? Para aqueles doutrinados na "mística gerencial", o talento é efêmero, ao passo que a estrutura e o processo organizacional são reais. A possibilidade de que é preciso ter talento para uma empresa funcionar conta menos do que agir sobre essas variáveis que os gerentes acham que entendem e conseguem controlar. O talento é fundamental para o sucesso contínuo no mercado. No entanto, hoje muitas organizações insistem em perpetuar o desenvolvimento de gerentes em vez de líderes. Felizmente, no entanto, talvez esteja havendo uma conscientização. O presidente da IBM, John Akers, deixou a comunidade de negócios boquiaberta ao anunciar que a IBM pretendia abandonar o seu longo caminho de dirigir seu negócio como uma grande empresa. A intenção de Akers é dividir a IBM em várias empresas. Embora a "Big Blue" vá continuar a ser grande segundo a maioria dos padrões, os negócios serão dirigidos através da liderança, não da mentalidade gerencial. A empresa não descansará mais sobre os falsos confortos da economia de escala. Os executivos também não vão se preocupar com a coordenação e o controle, com operações descentralizadas e controles financeiros centralizados. O processo será secundário com relação à substância, e o poder ficará nas mãos dos executivos que forem criativos e, acima de tudo, dinâmicos. Se outras grandes empresas seguirem esse caminho, as empresas dos Estados Unidos poderão ganhar nova energia e sua capacidade de concorrência pode repercutir. Mas se ficarem nas mãos dos gerentes profissionais, as empresas norte-americanas continuarão a ser invadidas pela inércia. Desde a época em que o artigo "Gerentes e Líderes: Eles São Diferentes?" foi publicado pela primeira vez, a estratégia deu um salto para a posição número um da parada de sucessos gerenciais. Nenhum aspecto da vida da empresa é indiferente à estratégia. Todos os problemas levam a soluções estratégicas, desde como posicionar produtos a como remunerar os executivos. Nós temos uma abundância de estratégias de marketing, estratégias de benefícios para os funcionários e estratégias para o desenvolvimento de executivos. Parece que a estratégia substituiu a política de negócios como instrumento conceitual para definir as diretrizes de uma empresa. Ao se fiarem na estratégia, as organizações ignoraram os resultados de maneira geral. A estratégia é um produto do ramo da economia chamado organização industrial, que cria modelos de competição e tenta posicionar os produtos em mercados competitivos através de técnicas analíticas. A reunião dessas posições dos produtos define as declarações de missão e a direção dos negócios. Com a ascendência da organização industrial na década de 1980, os consultores gerenciais prosperaram e a fé na mística gerencial ficou mais forte, apesar do mau desempenho da economia norte-americana. | 16 | A meu ver, o programa que mais influiu na área gerencial nos últimos dez ou 15 anos foi o Lotus 1-2-3. Esse software popular possibilita a criação de planilhas de forma rápida e repetitiva, dotando de forma e linguagem o planejamento estratégico. Com essa metodologia os técnicos podem jogar com testes de hipóteses. O melhor de tudo é que todos que têm acesso a um computador e ao software adequado podem participar dos testes de hipóteses. Ora, se qualquer um pode se tornar um estrategista, poucos podem se tornar criadores e sustentar essa posição. A visão, marca da liderança, não é um produto derivado das planilhas, mas sim um produto da mente, chamado imaginação. E a visão é quase tão importante quanto a estratégia para o sucesso. Os líderes de negócios colocam em prática uma série de fatores imaginados sobre o crescimento das empresas. Esses fatores – a imaginação de marketing, a imaginação de produção e outros tipos de imaginação – são originários de capacidades perceptivas que reconhecemos como talento. Os líderes de talento entendem a importância das anomalias, como necessidades não atendidas dos clientes, operações de produção que podem ser significativamente melhoradas e o potencial das aplicações tecnológicas no desenvolvimento de produtos. É essencial ter imaginação na área de negócios. A imaginação de um líder encoraja os outros a agirem de formas verdadeiramente "transformacionais", usando o termo bem escolhido por James MacGregor Burn. Mas muitas vezes os líderes veem seus talentos como inquietação, um desejo de derrubar os planos dos outros, uma necessidade irresistível de "fazer as coisas melhor". Consequentemente, pode ser que um líder não crie um ambiente de trabalho estável, mas sim um local de trabalho caótico, com grandes altos e baixos emocionais. No artigo "Gerentes e Líderes: Eles São Diferentes?", eu afirmei que uma diferença fundamental entre gerentes e líderes está em seus conceitos de caos e ordem, guardados lá no fundo de suas psiques. Os líderes toleram o caos e a falta de estrutura, por isso estão preparados para deixar as respostas em suspenso, evitando o fechamento prematuro de questões importantes. Os gerentes buscam a ordem e o controle e são quase que compulsivamente viciados em se livrar dos problemas antes mesmo de entender sua importância potencial. De acordo com a minha experiência, raramente as incertezas do caos potencial causam problemas. Pelo contrário, é o ato instintivo de impor ordem no caos potencial que causa problemas para as organizações. Em minha opinião, os líderes de negócios têm muito mais em comum com artistas, cientistas e outros pensadores criativos do que com gerentes. Para que as escolas de administração explorem esse conjunto de disposições e interesses, o currículo deveria se ocupar menos da lógica da estratégia e em impor as limitações dos exercícios de computador e mais de experiências de raciocínio no jogo da criatividade e da imaginação. Se elas conseguirem, irão preparar melhor homens e mulheres excepcionais para cargos de liderança.
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