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01 texto ANTROPOLOGIA aulas 1 e 2

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1
ANTROPOLOGIA – conversas preliminares
Luiz Antonio S. Cabreira
I – INTRODUÇÃO. 1.1 Breve histórico. II – ANTROPOLOGIA FÍSICA. 2.1 Evolução humana. 2.2 O cérebro humano. 2.3 Conhecimento e adaptabilidade. III – ANTROPOLOGIA CULTURAL. 3.1 Heranças do Homo Sapiens. 3.2 Cultura. 3.2.1 Cultura material e não material. 3.2.2 Funções da cultura. 3.2.3 Existem culturas superiores? 3.2.4 Cultura estudada e cultura vivenciada 3.3 Homo culturalis. 3.3.1 Diversidade cultural e meio ambiente. 
I - INTRODUÇÃO
	Algumas questões parecem permanecer, a despeito de todo o avanço da humanidade. Quem somos? Quem são nossos antepassados mais distantes? Somos uma descendência comum em relação aos demais primatas? O que herdamos de nossos ancestrais? Quais são nossas características distintivas? Por que os grupos sociais são tão diferentes no tempo e espaço geográfico? Como surgiram a religião, a família, os costumes e as convenções sociais? O que a linguagem humana, a história oral e escrita podem nos ensinar a respeito de nossa própria humanidade e vida social? Ocorrerão mudanças significativas em nossa estrutura física, cognitiva e societária no futuro? Somos especiais? Certamente outras questões poderiam ser aqui colocadas, perguntas que fazem parte das “andanças” da Antropologia.
O que significa antropologia? Etimologicamente a palavra deriva de dois termos. O primeiro é “antropos” (ἂνθρωπος), palavra que vem do grego e significa “homem”, no sentido mais amplo da palavra, ou seja, diz respeito à humanidade, ao gênero humano, racional, eu e você, com todas as possibilidades e capacidades inerentes a este animal político (zoon políticos). O segundo termo é “logos”, (λὀγος), termo também derivado do grego e que merece um olhar mais atento. Muitos traduzem “logos” por estudo. Não é só isso. O termo indica um alcance muito maior que apenas estudar; sinaliza a idéia de “razão”, faculdade intelectual, bom senso, “essência”, “raiz” (PEREIRA, 1976). Nesse sentido indica a busca de um conhecer as coisas em profundidade, racionalmente, humanamente, identificando sentido e significados do que está sendo colocado como objeto de estudo. Assim, se unirmos as duas palavras antrpopos+logos, antropologia, teremos uma palavra que indica uma busca por compreender profundamente, racionalmente, ontologicamente, a realidade do ser humano, da humanidade.
A Antropologia “é uma disciplina que investiga o desenvolvimento das sociedades humanas assim como as diferenças entre elas” (CORRÊA, 2013). Pode-se dizer, preliminarmente, que a antropologia 
[...] procede de uma certa concepção de mundo ou de um modo original de colocar questões, ambos descobertos por ocasião do estudo de fenômenos sociais que não são necessariamente mais simples (como se costuma tender a crer) do que os que se apresentam na sociedade do observador, mas que – em razão das grandes diferenças que manifestam em relação a estes últimos – evidenciam certas propriedades gerais da vida social, que os antropólogos tomaram como objeto. [...] a antropologia é uma ciência em devir, [...], na imensa maioria dos casos, a antropologia social se encontra associada a outras disciplinas e, dentre as ciências sociais, é na companhia da sociologia que a encontramos com mais freqüência, [...]. Trata-se, porém, de uma situação provisória, [...]. ( LÉVI-STRAUSS, 2008, p.368-369)
	Nesse sentido, a Antropologia não se configura como uma área do conhecimento isolada e autossuficiente. Ao contrário, se apóia em pesquisas realizadas por outras disciplinas, como a História, Geografia, Biologia, Anatomia, Genética, Economia, Psicologia e, especialmente, a Sociologia, como assinalou Lévi-Staruss (2008), e ainda a lingüística e a arqueologia. Dessa forma, inicialmente, é possível dizer que a antropologia pretende produzir um quadro o mais claro e científico possível das sociedades humanas (CORRÊA, 2013), em conjunto ou com o apoio de outras áreas do conhecimento..
	Um ramo especial da Antropologia é a Arqueologia, dedicada ao estudo das culturas e sistemas sociais, culturalmente construídos, já não existentes, bem como a relação de tais culturas com outras culturas. Pense em como sociedades préhistóricas e algumas sociedades antigas como Grécia, Roma, Creta, Pérsia exerceram influência sobre a nossa sociedade (MONTAGU, 1977).
1.1 Breve histórico
	A ciência antropológica é recente e está fragmentada em diversas escolas, entre elas, o Evolucionismo, o Funcionalismo e o Estruturalismo (COSTA, 1987). Diz Laplantine: 
A gênese da reflexão antropológica é contemporânea à descoberta do Novo Mundo. O Renascimento explora espaços até então desconhecidos e começa a elaborar discursos sobre os habitantes que povoam aqueles espaços. A grande questão que é então colocada, e que nasce desse primeiro confronto visual com a alteridade, é a seguinte: aqueles que acabaram de serem descobertos pertencem à humanidade? [...] Notamos que se, no século XIV, a questão é colocada, não é de forma alguma solucionada. Ela será definitivamente resolvida dois séculos mais tarde. Nessa época é que começam a se esboçar duas ideologias concorrentes [...]: a recusa do estranho apreendido e partir de uma falta, cujo corolário é a boa consciência que se tem sobre si e sua sociedade; a fascinação pelo estranho cujo corolário é a má consciência que tem sobre si e sua sociedade (2000, p.37-38).
Essas duas ideologias estão retratadas no debate seiscentista entre o dominicano Las Casas, que defende a figura do bom selvagem e do mau civilizado, e o jurista Sepulvera, defensor da ideia do mau selvagem e do bom civilizado. O século XVII excluirá a razão do louco, a criança, o selvagem, enquanto figuras da anormalidade. Mas, será no século XVIII que constituirá “o projeto de fundar uma ciência do homem, isto é, de um saber não mais exclusivamente especulativo, e sim positivo sobre o homem” (LAPLANTINE, 2000, P.54). As revoluções industrial e francesa produzem um novo mundo, colonizador e civilizador. É neste ambiente histórico que a Antropologia torna-se disciplina autônoma, “a ciência das sociedades primitivas em todas as suas dimensões (biológica, técnica, econômica, política, religiosa, lingüística, psicológica” (op. cit, p.63). Surge a antropologia moderna e o pensamento evolucionista. O “selvagem do século XVIII, tornou-se o primitivo, isto é, o ancestral do civilizado, destinado a reencontrá-lo” (op. cit. p.65). No século XX, Franz Boas (1858-1942) e Bronislaw Malinowski (1884-1942) fundaram a etnografia ou pesquisa de campo etnográfica. Mas, segundo Laplantine (2000) “a antropologia precisava ainda elaborar instrumentos operacionais que permitissem construir um verdadeiro objeto científico” (op. cit., p.85). Emile Durkheim (1858-1917), e Marcel Mauss (1872-1950) “forneceram à antropologia o quadro teórico e os instrumentos que lhe faltavam ainda” (op. cit., p.88). Assim, se consolida a maturidade da antropologia como ciência autônoma, que observa diretamente e estuda com espírito científico os comportamentos sociais do Homo Sapiens Sapiens, em sua caminhada adaptativa e criativa, ao longo do tempo, em meio aos desafios da natureza e da convivência com o ecossistema, com a sociedade que construiu e as relações interativas integradoras ou conflitantes com o outro.
Quanto às primeiras correntes antropológicas e seus personagens principais, pode-se citar: o evolucionismo ou darwinismo social (século XIX), a escola funcionalista (século XX) e o estruturalismo de Claude Lévi-Strauss. Entre seus personagens principais mencione-se Lewis Henry Morgan, Franz Boas, Bronislaw Malinowski, Émile Durkheim, Ferdinand Tönnies, Alfred Reginald Radcliffe-Brawn, Raymond Firth, entre outros.
A Antropologia, inicialmente, no século XIX, sofreu forte influência do darwinismo social, inserida numa “concepção de ‘sociedades primitivas’ como sobrevivências de um passado remoto da humanidade” (COSTA, 1987, p.90), cuja perspectiva comparativa prevalecia. O antropólogo, nesta fase, se incumbiria de descrever as sociedades do passado, enquanto os sociólogosestudariam as sociedades modernas, buscando desvendas suas leis gerais e sua evolução linear. Talvez esta conceituação e diferenciação entre o “primitivo” e o “complexo”, tão presente nos conceitos durkheimianos de “consciência coletiva” e “divisão do trabalho social”, possam ser indícios europeus de uma tentativa de justificativa da dominância e de uma suposta superioridade das sociedades industrializadas sobre as demais, não industrializadas.
A corrente funcionalista surgiu no século XX, diferentemente da visão evolucionista da sociedade, concebe o “princípio de que cada sociedade deveria ser analisada em si mesma” (COSTA, 1987, p.93), por meio de um novo método de pesquisa: a observação participante, que envolvia um contato direto com os grupos pesquisados. A sociedade e as sociedades deixaram de ser uma evolução linear e crescente, para se tornar, cada sociedade, “um todo integrado de aspectos que respondem a problemas de sobrevivência enfrentados por todos os homens em todos os lugares” (op. cit, p.94). Há quem afirme que o funcionalismo “não soube revelar e criticar com precisão as mudanças provocadas pelo colonialismo nas sociedade afro-asiáticas”, no entanto, teria aberto “as portas para o relativismo cultural: a idéia básica de que cada sociedade é diferente” (op. cit., p.97). Ainda no século XX, surge o estruturalismo de Claude Lévi-Staruss, que nega que “a noção de estrutura, básica para a compreensão de qualquer sociedade, se identifique com dados empíricos” (op. cit., p.99), antes, é comparável à estrutura de um edifício, não visível, mas, responsável pela sustentação dos elementos observáveis que dela fazem parte. Só que, diverso da estrutura de um prédio, que é estática, a estrutura social não seria estática, mas, apresentaria, “em cada momento formas de equilíbrio instável – ou como afirma Lévi-Strauss, ‘cíclico’ – numa solução provisória de suas contradições internas” (op. cit, p.102).
Antropologia Social se defronta com questões contemporâneas, como a miséria, o analfabetismo e o alfabetismo funcional, as taxas de mortalidade infantil, o crescimento demográfico, o terrorismo, a geopolítica mundial, os preconceitos e divergências étnicas e raciais, religiosas e ideológicas, as emancipações de grupos específicos (mulheres, homossexuais, idosos, deficientes físicos etc.), a urbanização e desconcentração rural, a tecnocracia e o agronegócio, a economia de subsistência, as desigualdades em vários níveis entre as sociedades, a sustentabilidade do ecossistema controlado pelo modelo capitalista, o individualismo egóico dos grupos sociais, etc.
	Para o antropólogo Ashley Montagu (1977), a ciência do homem, atualmente, está dividida em duas partes principais: a Antropologia cultural, tida como uma ciência social, e a Antropologia física ou biológica, considerada uma ciência natural (CORRÊA, 2013). A primeira se debruça sobre o estudo das culturas do homem, dos elementos comuns e as causas de suas diferenças, a origens e as formas que assumem o comportamento humano nas sociedades organizadas; analisa as relações institucionais, as convenções e seus costumes, a religião e a lingüística (histórias orais), entre outros temas. Tradicionalmente a antropologia cultural estuda os povos iletrados, no entanto, hoje, já existem estudos de povos mais adiantados tecnologicamente. A Antropologia física é um ramo da Antropologia que faz um estudo comparativo da evolução do Homem, a partir de nossos ancestrais, como ser físico-anatômico e biológico. Busca compreender, científica e racionalmente, a evolução humana, nossa origem, as “diferenças raciais” e étnicas, observa o comportamento dos primatas, entre outras atividades, sempre com o fito de desvendar o mistério que cerca nossos ancestrais (MONTAGU, 1977). 
São considerados especialistas da Antropologia Física: a) paleoantropólogos – estudam a origem e evolução do homem “antigo” (paleo); b) primatologista – visam compreender a anatomia comparada dos primatas; c) antropólogos físicos em geral – analisam o crescimento , fisiologia, bioquímica, hereditariedade etc; d) antropólogos físicos aplicados – buscam a mensuração do homem (anatomia, fisiologia) para determinar, por exemplo, equipamentos próprios para a indústria; e) antropólogos físicos constitucionais – analisam a relação entre forma do corpo e a moléstia/ personalidade/ grupo étnico etc. (MONTAGU, 1977)
	Diferentemente da Antropologia Física, a Antropologia cultural estuda as culturas produzidas pelo Homem. “O antropólogo cultural se interessa por todas as formas que assume o comportamento humano social nas sociedades organizadas” (MONTAGU, 1977, p.15). Verifica os elementos comuns entre culturas e as causas de suas diferenças. Tradicionalmente estuda os povos iletrados, antigos, no entanto, atualmente alguns antropólogos estudam povos mais adiantados tecnologicamente e, até, aparecem inseridos em ambientes institucionais como empresas, hospitais e escolas, etc., produzindo estudos sobre a realidade vivida pelo Homem nestes ambientes. São chamados antropólogos aplicados, que utilizam seus métodos especiais a compreensão de problemas práticos da indústria, do governo etc., investigam relações sociais em hospitais, paciente-médico, prevenção de doenças mentais etc., atuam junto com psiquiatras estudando culturas de diferentes sociedades, estudam a cultura da pobreza nas sociedades modernas, entre outras funções (MONTAGU, 1977).
São interesses dos antropólogos culturais: a) a relação das culturas socializadas com o tipo de personalidade que apresentam; b) os aspectos das culturas de diferentes povos (instituições, religião, cultura material etc); c) estudo de tribos; d) a aplicação de seus métodos especiais a problemas práticos da indústria, do governo etc.; e) as relações sociais em hospitais, paciente-médico, prevenção de doenças mentais etc.; f) estudos conjuntos com psiquiatras sobre culturas de diferentes sociedades; g) a cultura da pobreza nas sociedades modernas (MONTAGU, 1977).
II – ANTROPOLOGIA FÍSICA
Quais as nossas origens biológicas? Eis uma questão pertinentes à Antropologia Física.
2.1 Evolução humana
Uma das grandes inquietações da humanidade é saber qual a sua origem e descendência. Os pontos de vista criacionista e evolucionista continuam debatendo a respeito, influenciados por paradigmas vigentes, a visão religiosa ou teológica, e a visão cientificista. A antropologia física traz alguns dados significativos, descritos em um vídeo da National Geographic, intitulado “Homem Macaco”. Segundo o documentário estamos geneticamente muito próximos dos grandes símios – o orangotango, o gorila e o chimpanzé. Então, o que nos difere? O que há no 1,6% do nosso DNA que nos torna humanos e nos difere dos símios? O próprio documentário aponta duas mutações como decisivas na separação do Homem, em relação aos símios. A primeira mutação teria ocorrido a mais de 2 milhões de anos, e alterou a constituição dos músculos da mandíbula, proporcionando a possibilidade do aumento significativo do tamanho do nosso cérebro. A segunda mutação teria acontecido bem mais cedo, algo em torno de 300 a 100 mil anos, uma mutação num gene humano, que teria possibilitado o desenvolvimento da fala e da comunicação por meio da linguagem. Estas duas mutações teriam permitido o distanciamento do Homem em relação aos demais animais. Por meio destas mutações produzimos cultura, que foi inovada e transmitida aos descendentes. Atualmente a cultura humana permitiu avanços notáveis, no entanto, nem sempre favoráveis ao Homem, às suas relações interpessoais, ao meio ambiente e à sustentabilidade do Homem e da natureza, já que existe uma dependência recíproca entre eles.
Estudos novecentistas, na região de Aramís, Etiópia, desvendaram um pouco mais o mistério das origens do ser humano. Foi descoberto um esqueleto de um hominídeo com cerca de 4.400.000 de anos, denominado Ardipithecus Ramidus, uma fêmea de pequena estatura, com crânio muito pequeno, singulares, de forma preênsil, diferente dos atuais seres humanos edos símios, mãos sem marcas de nós nos dedos, metacarpos curtos, como o Homo Sapiens, o que lhes garantiu um andar ereto, ou seja, um animal bípede, com pélvis semelhante às mulheres atuais (DISCOVERY CHANNEL, 2012). Os ossos deste novo hominídeo só foi datado graças a utilização de análises de rochas e sedimentos anteriores e posteriores à sua época, em que se utilizou a amostra de argônio para uma datação mais precisa, que chegou aos 4.400.000 anos, muito anterior aos ossos da hominídeo “Lucy”, um Australopithecus Afarensis, datado de cerca de 3.000.000 de anos, também com andar ereto como Ardi. O meio ambiente de Ardi era composto de uma vasta floresta, com muitos animais, entre eles, pássaros, morcegos, macacos, suínos etc.. Ardi vivia, andando em terra ou se agarrando às árvores com seu pé preênsil, sobrevivendo numa ambiente hostil e desafiador. 
Ardi não evoluiu de um chimpanzé pré-histórico. Existiam muitos símios na época, convivendo no mesmo ambiente arbóreo das florestas pré-históricas etíopes. Era uma forma transicional singular, única, bípede, uma nova luz na evolução na humanidade.
A bipedalidade e a existência de caninos pequenos marcaram uma característica existente em toda a evolução da humanidade. Porque teria ela adotado a bipedalidade? É sabido que o andar ereto é uma forma estranha de locomoção, é única no reino animal, e uma definitiva diferença entre o Homo Sapiens e os demais animais. Trata-se de uma parte intrigante da biologia animal. Qual a vantagem de andar ereto? Talvez, explicam os cientistas que participaram do projeto que descobriu o Ardipithecus que isto pode derivar de uma estratégia reprodutiva. É provável que as uniões entre machos e fêmeas estejam ligadas a troca de comida e sexo, na capacidade reprodutiva da fêmea e na capacidade de proteção e sustentação da prole pelo macho. Neste caso as fêmeas poderiam preferir os machos com maior destreza bípede, capaz de angariar maior quantidade de alimento e de sustentar a prole.
Atualmente, já se tem notícia da descoberta de ossos de hominídeos com mais de 5 milhões de anos, denominados Ardipithecus Kadabba, que significa “pai antigo”. Todas estas descobertas dão continuidade ao interesse humano por suas origens, já identificados em mitos de origem, encontrados em diversas civilizações e culturas antigas, até a construção de teorias científicas, como foi a produzida pelos estudos de Charles Darwin. A hipótese da origem africana do Homem moderno, que teria ali evoluído, por volta de 140 e 300 mil anos atrás e, depois, migrado e se adaptado nas várias regiões do planeta, e substituído os hominídeos que já se encontravam ali, restando apenas um derradeiro espécime homo, o sapiens sapiens (BURNIE, 2008) é apenas uma das muitas teorias sobre a evolução humana.
2.2 O cérebro humano
Ainda não descobrimos nossas origens e as razões de nossa evolução com plena certeza, mas, sabemos que nos diferenciamos, em muito, dos demais animais, em razão de um cérebro privilegiado. Como salienta Robert Winston, no documentário intitulado “The Human Body”, produzimos ferramentas e artefatos, que possibilitaram o domínio da natureza, adquirimos habilidades manuais impressionantes com nosso polegar oponível e os sulcos dos dedos, ficamos eretos e adotamos a bipedalidade, desenvolvemos a linguagem, a memória operacional e de longo prazo, transmitimos nossas herança cultural aos descendentes, produzimos uma sociedade organizada e expandimos as dimensões do córtex cerebral. 
O cérebro dos primeiros hominídeos era pequeno. Mas o Homo erectus, com seus 850-1000 cm³, teria sido o primeiro a controlar o fogo e a caça coletiva. É provável que uma mutação genética em sua mandíbula tenha lhe proporcionado o início da expansão significativa do córtex cerebral, que lhe garantiu conquistas nunca antes imaginadas. O Homo sapiens, com um potente cérebro teria cristalizado nossa vida social, a linguagem e elementos culturais relevantes. 
O cérebro humano representa um grande capítulo na evolução da humanidade. Por meio dele produzimos conhecimento e estabelecemos cultura; é onde pensamos e sentimos, um todo que maior que as suas partes, e constrói consciência, talvez o maior de nossos atributos, como salienta Winston:
Por milhões de anos o cérebro e o corpo humano evoluíram para enfrentar desafios mais complexos. Aprendemos a manipular ferramentas. Fizemos uso do sentido visual e desenvolvemos uma memória potente. Dominamos a linguagem (uma forma bem mais eficiente de trato social). Já podemos construir uma imagem detalhada do cérebro evoluído. O cerebelo responsável pelos movimentos automáticos. O fundo do cérebro para a visão. O córtex frontal para a memória. [...] Mas ainda falta algo nesse mapa. É a misteriosa coisa que faz de você o que é e eu o que sou. Os cientistas chamam de consciência. [...] A consciência é o maior dos atributos do cérebro. Na verdade é muito difícil defini-la. [...]. A consciência é parte de todo o cérebro. [...] Parece que as capacidades mais refinadas do cérebro, memória, percepção e emoções estão igualmente ligadas a um formidável todo. Mas há algo além disso? [...] sempre haverá perguntas que ficarão sem resposta. [...] acredito que muito do que nos torna humano será para sempre um mistério até mesmo espiritual. Chamo isso de alma (BBC, 2011).
Seríamos especiais? Esta consciência e esta alma, em meio à complexidade de uma sociedade rodeada de interesses, manipulações políticas, desigualdades sociais e preconceitos de toda a espécie, étnicas, raciais e religiosas, é indicado por alguns, como Winston, no documentário da BBC (2011), como notório divisor entre nós e os demais seres vivos no planeta. Para Hauser, da Universidade de Harvard, “um fosso profundo separa nosso intelecto da espécie animal” (JUNIN, 2013). Para Darwin, seríamos animais com habilidades cognitivas que nos diferencia dos demais face à nossa evolução superior, fruto de uma seleção natural decorrente de nossa capacidade de adaptação e domínio do meio ambiente (DARWIN, 2008). No entanto, nem todos concordam com Darwin ou Winston, de que sejamos “especiais” e diferenciados em termos de espécie, mais do que apenas em grau. Para Paranhos, “nossas funções são todas, sem exceção, reprodutíveis, incluindo as que nos parecem exclusivamente nossas. É apenas uma questão de tempo. E portanto não, não somos nada especiais. O hiato aparente entre nós e as amebas (ou robôs) é só isso mesmo – aparente” (2013, p.34)
	Evoluímos em muitas direções, desenvolvemos nossas potencialidades fisiológicas e cognitivas, seja como seres especiais ou como parte da família dos animais terrestres. Já falam na possibilidade de viver num mundo “onde o cérebro humano se libertará, enfim, de sua sentença de prisão de milhões de anos, cumprida, desde tempos imemoriais, numa cela orgânica constritiva e limitada, vulgarmente conhecida como corpo” (NICOLELIS, 2011, p.26). Em meio a esta extensa discussão um ponto deve ser considerado: especiais ou não, a sobrevivência do ser humano depende da saúde de nosso “οίxός”, nosso planeta, com sérias esferas de degradação. Talvez a grande tarefa, hoje, seja recuperar a sanidade ao planeta, antes mesmo de continuarmos nossa impetuosa caminhada tecnológica em busca de “facilidades” digitais e a imortalidade por meio do desvelar de nosso código genético. Salvar o planeta e nossas interações: eis um próximo passo necessário na evolução da humanidade e, talvez, uma prova de nossa condição de seres “especiais”.
2.3 Conhecimento e adaptabilidade
	A origem e desenvolvimento do ser humano ainda é um mistério. Idealizado em mitos e religiões, e mais hodiernamente pelos estudos científicos, este tem sido um dos questionamentos da humanidade. Como sobrevivemos? É uma questão ainda não respondida completamente. No entanto, parece saudável a ideia de que chegamos até aqui, como Homo Sapiens Sapiens, atravessando um processo evolutivo que incluiu diversos ancestrais, entre eles, o Adipithecus Ramidus, com 4.400.000 de anos e o Australopithecus Afarensis, com mais de2 milhões de anos, hominídios com um cérebro com dimensões próximas do chimpanzé. Produzimos conhecimento, ferramentas e artefatos, cultura, dominamos a natureza, etc. (BURNIE, 2008). Nos adaptamos. Talvez estas sejam as chaves de nossa sobrevivência.
	Duas teorias sobre a evolução humana podem ser destacadas: a primeira entende a evolução como um processo linear, sequencial, em que cada hominídeo produziu um avanço, que propiciou a emergência de um novo ser, mais desenvolvido e adaptado ao meio, culminando com o Homo Sapiens Sapiens. Outros pesquisadores defendem a existência de vários hominídeos, alguns vivendo simultaneamente numa mesma época e espaço geográfico como, por exemplo, a coexistência entre o Homo habilis e o Homo erectus, ou a convivência, pacífica ou não, entre o Homo neanderthalensis e o Homo sapiens. Alguns entendem que o Homem atual seria o derradeiro humano, o sobrevivente, que teria suplantado os demais hominídeos “andantes” então existentes. Seríamos descendentes de um grupo de migrantes nômades, que se aventuraram para o norte europeu e as demais regiões do planeta, se adaptando às condições regionais e suas adversidades. O último antropo sobrevivente e adaptado. Os demais hominídeos teriam sido extintos pelo próprio Sapiens ou pelas condições do ecossistema (DISCOVERY CHANNEL, 2012)
	O ser humano teria alcançado esse processo evolutivo devido a vários fatores, talvez até algumas mutações, na mandíbula, que possibilitou a expansão do córtex na caixa craniana humana, e no gene “Fox P2” como assinala o documentário da National Geoghrafic, denominado “The Huma Ape”. Além destes fatores destaque-se o fato de produzirmos conhecimento e comunicarmos tais conhecimentos às novas gerações, que, por sua vez, os recebem e os atualizam. Conhecimento e adaptabilidade, decorrentes de um cérebro poderoso, projetaram a humanidade ao topo da cadeia animal e nos distinguiu deles.
O mito da criação, registrado no livro de Gênesis, das escrituras sagradas de judeus e cristãos, fala do conhecimento e da adaptabilidade ao meio inóspito, da seguinte maneira:
[...] “Podes comer de todas as árvores do Jardim. Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia em que comeres terás que morrer”. [...] Ao homem, ele disse: “Porque escutaste a voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te proibira de comer, maldito é o solo por causa de ti! Com sofrimento dele te nutrirás todos os dias de tua vida” [...]. Disse Iahweh: “Se o homem já é como nós, versado no bem e no mal, que agora ele não estenda a mão e colha também da árvore da vida, e coma e viva para sempre” E Iahweh Deus o expulsou do jardim do èden. (Genesis 2: 16-17; 3:17; 22-23a).
O conhecimento se distingue da mera informação ou da reação instintiva ao meio ambiente. Representa uma relação entre o sujeito cognoscente e o objeto cognoscível, uma relação e um produto, que fica armazenado no cérebro, por meio de uma memória de longa duração que permite avançar o saber. Não fosse o conhecimento produzido, transmitido e atualizado entre as gerações, talvez a humanidade não tivesse alcançado todos os avanços sociais, culturais, tecnológicos e políticos que o fizeram uma forma distinta de todos os demais animais que habitam ou já habitaram o planeta.
A adaptabilidade não significa apenas o amoldar-se ao meio e ficar circunscrito a ele, mas, dominá-lo, modificá-lo e superá-lo. Parece certo que a distinção dos humanos se liga à sua criatividade, decorrente do conhecimento acumulado por seu cérebro privilegiado, bem como à sua capacidade de peregrinar e se fixar em outras regiões da terra, adaptando-se à ela. Somos sapiens “andantes”, caminhantes, desbravadores; bípedes adaptados ao meio, portadores de uma inteligência que lhes outorgou a possibilidade do milagre da sobrevivência diante dos desafios, lutas e privações, que exigem “o suor do rosto” e a inteligência pensante como requisitos para a sobrevivência. Como salienta a metáfora no título de um dos livros de Rubem Alves: “ostra feliz não faz pérola” (ALVES, 2008), ou seja, sem luta e inteligência inovadora não existe avanço significativo. Ecce Homo.
III – ANTROPOLOGIA CULTURAL
O que herdamos de nossos antepassados, além de características anatômicas e biomecânicas? Eis uma questão pertinente à Antropologia cultural
	Um dos elementos distintivos entre o ser humano e racional, “especial” ou não, e os demais animais presentes no ecossistema, é o fato de produzir artefatos, ferramentas, que modificam o ambiente e criam um outro mundo, que não existia até então, ao longo do tempo e espaço geográfico, produtos concretos, como panelas e computadores, e abstratos, como idéias, leis e instituições sociais. É difícil imaginar a existência humana sem costumes, linguagem, escrita, máquinas, descobertas e revoluções etc. Toda esta vasta produção humana, criada nestes muitos anos de evolução da humanidade, é o que se denomina cultura. 
3.1 Heranças culturais do Homo Sapiens
	
Como assinalado anteriormente a Antropologia se divide em duas grandes áreas: a física e a cultural. Esta última se mostra mais preocupada com a questão da herança cultural herdada que desvendar a origem biológica do Homo Sapiens. Assim, cabe à antropologia cultural identificar as características culturais herdadas de nossos ancestrais. Quais seriam estas características? A seguir, são indicadas algumas delas:
A) Produtor de conhecimento. 
Quais as características culturais herdadas de nossos antepassados préhistóricos?
Pergunta difícil, ampla demais, por isso, necessita de uma delimitação que, inicalmente focalize algumas características fundamentais do ser humano que vive inserido numa sociedade complexa, situada num tempo histórico e cultural por ele produzidos. Não se pode negar, preliminarmente, que essa discussão trata de um animal que produz conhecimento, de vários tipos – vulgar, filosófico, religioso e científico -, visto que sem o conhecimento produzido e armazenado nas consciências provavelmente não seria possível a existência de um homem que se modifica e transforma o meio em que vive.
O ato de conhecer que insere o indivíduo na realidade em que vive. Talvez pelo conhecimento se tenha iniciado sua distinção dos demais animais. O uso dessa ferramenta – o conhecimento – lhe permitiu criar o mundo e transformá-lo constantemente para o bem ou para o mal, conspirando a favor ou contra a condição humana. O homem usa o conhecimento, enquanto ser egóico ou solidário, de várias maneiras e para diversos fins, manipulando o conhecimento como desejar, produzindo o contexto ou lugar – o ethos - em que irá viver. São os seus atos que construirão o mundo em que vive. O conhecimento é a alavanca da história, mas, é o ser humano que decidirá que pedra deseja mover, e como isso deverá ser feito.
B) Gregário.
O homem não é um ser isolado e acabado. Caçador nômade ou agricultor fixado na terra, figuras que formam os ícones da velha disputa entre Cain (lavrador/ produtor) e Abel (pastor de ovelhas), o Homem estabeleceu sua condição por meio da troca de suas forças individuais, que unidas e organizadas sob uma dada hierarquia conseguiu aplacar os ataques dos inimigos, sejam eles animais ou outros grupos; por isso, até hoje, as identidades grupais ou grupos sociais continuam exercendo tanta influência na vida dos indivíduos. O isolamento social tende à inadaptação aos padrões socais e, às vezes, à demência.
Fixando padrões de comportamento, sociais e legais, e laços comuns, o homem gregário conseguiu garantir uma identidade e a segurança derivada do sentimento de pertencer, fazer parte de uma comunidade, estratificada, dividida em status e papéis sociais. Fruto dessa vida gregária emergiu as sementes institucionais que geraram a família, o grupo religioso, a escola, o estado, enfim, as primeiras instituições da sociedade, presentes até hoje. 
O animal coletivo viu surgir uma sociedade cuja origem, natural ou contratual, se caracterizou por um processo contínuo de modificações no tempo e no espaço, acompanhando ou promovendoa construção do humano social. Em constante transformação, por meio do conhecimento, adquiriu novas concepções de mundo, modificou suas idéias, aprendendo, criando, destruindo e reconstruindo a mundo social. O homem pensante está sempre em construção. Somente a morte pode fazê-lo cerrar as portar do conhecer. Até o último dia de sua vida continua mergulhado no ato de conhecer.
C) Criativo e artificial. 
O Homem é um animal criativo e artificial. Os demais animais reproduzem ao longo do tempo e espaço as determinações oriundas de seus impulsos instintivos, sem alterações históricas. O cão late hoje do mesmo modo que os cães dos fenícios. O agir dos demais animais não se alteram, pelo menos não na mesma dimensão que ocorre entre os animais humanos. De modo diverso, o Homem produz novos materiais, cria novas concepções de mundo, fabrica novas condições de existência e, historicamente, evolui por meio da produção cultural. Inventa novas formas de agir, formaliza costumes que se modificam, desaparecem ou assumem aspectos radicalmente diversos dentro de uma mesma sociedade ou entre elas, no tempo histórico e no espaço geográfico. Pense, por exemplo, nos hábitos alimentares, na forma de instituição do casamento, no vestuário imposto pela moda. O homem é artificial, cria, produz além da natureza, e se instala num mundo, culturalmente relativo e construído.
D) Político (Aristóteles). 
Aristóteles, no livro “A Política”, traz a idéia do homem como um animal político (Zoon políticos). Afirma que “aquele que for incapaz de viver em sociedade, ou que não tiver necessidade disso por ser auto-suficiente, será uma besta (fera) ou um deus, não uma parte do Estado” (Aristóteles, 1999, p.147). O animal político, concebido pelo filósofo grego, é aquele feito para viver na pólis (cidade-estado ou comunidade política), que é dotado ou composto de cidadania, pertencente a uma organização social civil, revelando assim “a intenção teleológica do filósofo na caracterização do sentido último da vida do homem: o viver na pólis, onde o homem se realiza como cidadão (politai)” (RAMOS, 2004, p.01). Nesse sentido “o bem do indivíduo é da mesma natureza que o bem da Cidade, mas este ‘é mais belo e mais divino’ porque se amplia da dimensão do privado para a dimensão do social” (REALE, 1990, p.208).
O homem cidadão, mais que um animal gregário, é um ser no mundo, livre para escolher e tomar decisões, se organizar politicamente, compartilhar de um processo de integração com o mundo permeado de instituições (Estado, família, Escola, religião, empresa, etc.) e valores (liberdade, igualdade, solidariedade, etc.) que consolidam as estruturas sociais, entendida como “um conjunto inter-relacionado de posições dentro da organização social” (CHARON, 2002, p.64). Ele está no mundo e o mundo social está dentro dele, e ambos transitam num estado de reciprocidade ou de trocas constantes, um influenciando a construção do outro e vice-versa. Vivencia e experimenta uma realidade individual, uma realidade coletiva e uma realidade supra coletiva, advindos da emergência da globalização que injeta padrões de alcance cultural espaço-temporal mais amplos, prefigurados em gostos musicais, hábitos alimentares, moda globalizados, como por exemplo, o rock and roll, o hambúrguer e o tênis. O animal político globalizado pode pertencer ao mundo utópico, real e ao mundo virtual.
Esse animal político articula seus destinos, manipula e é manipulado, é capaz de promover a cidadania e a não cidadania. Numa dimensão mais extensiva, premedita e antecipa procedimentos e comportamentos alheios, fomenta idéias que se concretizam em ações que viabilizem a satisfação de seus interesses particulares ou coletivos. Estratégia e tática comportamentais, simulações e planos de controle social, desejo pelo poder, liberdade, solidariedade, bem como sentimentos de amor e ódio, prazer, luxúria, inveja, amizade e desconfiança, guerra e paz, decorrem do ser político, livre ou não, identificado por Aristóteles.
E) Mutante. 
O ser humano, culturalmente construído, é capaz de mudar com o passar do tempo e apresentar modos de vida diferentes, conforme o lugar que habita. Tomando como exemplo a forma de locomoção, enquanto os demais animais continuam utilizando as próprias patas para ir de um lugar para o outro, o homo sapiens vem desenvolvendo novas maneiras de locomoção, cada vez mais rápido, fazendo com que sua existência se altere constantemente. As descobertas científicas, por exemplo, vão alterando os hábitos alimentares da população mundial, incorporando novos hábitos alimentares. Enfim, o homem que sabe, e sabe que sabe, é um ser mutante, na medida em que sofre alterações em sua vida individual e coletiva – muda no tempo cultural e no espaço geográfico. O que hoje é importante pode não sê-lo amanhã. Só os loucos e insanos completamente não sofrem as pressões das mudanças do cotidiano social. Somos seres mutantes. A mudança é o motor do avanço da civilização. A história dos homens é uma história de mudanças.
3.2 Cultura
A produção de conhecimento permitiu ao Homem uma distinção especial em relação aos demais animais: O Homo Sapiens produz conhecimentos, cristaliza-os na vida social, transmite-os aos seus descendentes que, por sua vez, os ampliam em novas invenções e tecnologias, artefatos e ideias nunca antes sonhadas. O Homem produz cultura, para o bem e para o mal, para a igualdade e a diferença, riqueza e pobreza da humanidade.
Preliminarmente entende-se necessário fazer uma primeira distinção entre a definição sociológica do termo cultura daquela que aparece na linguagem do senso comum. Popularmente cultura é tida sinônimo de erudição pessoal, dotes intelectuais ou hábitos refinados. “Na linguagem sociológica, cultura é tudo o que resulta da criação humana” (VILA NOVA, 1992, p.43). A música clássica, erudita, por exemplo, é um elemento cultural tal qual a música caipira, cada qual com valorações distintas entre os grupos sociais aos quais estejam inseridas. 
	 Malinowski definiu cultura como “a criação cumulativa do homem” (apud KOENIG, 1982: 59), ou seja, um universo que compreende “artefatos, bens, processos técnicos, idéias, hábitos e valores herdados” (OLIVEIRA, 1996: 88), que vão se somando á extensa lista de criações humanas, constituindo-se uma parte importante na formação da sociedade e de seu desenvolvimento ao longo das gerações e da história da humanidade. Portanto, cultura é tudo que se cria além da natureza já criada. O lápis, por exemplo, é a somatória de madeira, grafite, artesanato, tecnologia e uma idéia funcional.
Acompanhando o pensamento de Lakatos (1985, p.137)
a cultura, portanto, pode ser analisada, ao mesmo tempo, sob vários enfoques: Idéias (conhecimento e filosofia); crenças (religião e superstição); valores (ideologia e moral); normas (costumes e leis); atitudes (preconceito e respeito ao próximo); padrões de conduta (monogamia, tabu); abstração de comportamento (símbolos e compromissos); instituições (família e sistemas econômicos); técnicas (artes e habilidades) e artefatos (machado de pedra, telefone).
	A cultura é um fenômeno ligado à própria necessidade humana e pode ser encontrada desde o surgimento da civilização humana, nas gravuras em cavernas de nossos ancestrais mais remotos, nas pirâmides do Egito, nas estátuas e filosofia gregas, nos rituais religiosos medievais, na indústria sob o sistema capitalista, etc., registrando a história da caminhada da humanidade ao longo do tempo e do espaço. É um ambiente peculiar ao homem.
	É possível encontrar várias formas de organização social entre os diversos animais não-humanos, como os macacos, os insetos, os peixes, etc., apresentando o que se poderia chamar ‘divisão do trabalho’, ‘hierarquia social’, ‘poder político’. “Mesmo admitindo como social a vida desses animais, qual a diferença entre sua ‘sociedade’ e a sociedade do homem?” (VILA NOVA, 1992:39). Uma resposta breve e simples é a cultura. Padrões culturais humanos são instáveis e flexíveis, artificiais - criados pelo homem -, e extremamentecomplexos.
A cultura, que é um processo social e não biológico, essencialmente, decorre de herança social, socialização, depende da educação, sistemática ou não, elaborada nas escolas ou nas ruas, na família ou na rida de amigos. 
3.2.1 Cultura material em não material
	A cultura pode ser dividida em material e não material (ÁVILA, 1981; LAKATOS, 1985, 1999; FERREIRA, 1988; VILA NOVA, 1992; JOHNSON, 1997). A cultura material “consiste em coisas materiais, bem tangíveis, incluindo instrumentos, artefatos e outros objetos materiais, fruto da criação humana e resultante de determinada tecnologia” (LAKATOS, 1985: 139). Cultura não-material “refere-se a elementos intangíveis da cultura, que não têm substância material. Entre eles encontram-se as crenças, conhecimentos, aptidões, hábitos, significados, normas, valores” (idem). A lança e escudos primitivos (artefato bélico), a feijoada brasileira (alimento), a bermuda (vestuário), a casa de madeira (habitação), o computador (máquina), a cruz (artefato religioso), etc, são exemplos de cultura material; a crença na reencarnação, o sentimento de nacionalismo, o significado da lei, e devoção á um clube de futebol, etc., são exemplos de cultura não-material. “A distinção entre cultura material e não-material, contudo, deve ser encarada como uma classificação puramente nominal, para fins analíticos, pois, na realidade, são domínios interdependentes da cultura total” (VILA NOVA, 1992: 44).
Um diploma legal, como o Código Penal, por exemplo, apresenta cultura material - livro -, e cultura não-material - normas e valores legais. Juntas, cultura material e não-material formam, de modo interdependente, uma parte da cultura jurídica como um todo.
As sociedades produzem suas imagens sobre objetos, pessoas e idéias pertencentes à sua própria cultura, bem como de culturas alheias. Esta criação de imagens nem sempre correspondem totalmente à realidade, gerando os estereótipos.
O estereótipo é uma crença rígida, excessivamente simplificada, não raro exagerada, aplicada tanto a uma categoria inteira de indivíduos como a cada indivíduo na mesma. (...). A crença em que as pessoas que trabalham em assistência social são indolentes é um estereótipo, como também a crença de que homens não sabem cuidar de crianças” (JOHNSON, 1997, p.93).
Os estereótipos são importantes na construção do preconceito, da opressão, da discriminação e de processos de representação da realidade social, sejam eles negativos ou positivos. De fato, nem todo paulista é trabalhador, nem todo mineiro é cauteloso, nem todo político é desonesto, embora esses sejam estereótipos bastante difundidos.
3.3.2 Funções da Cultura
	Para Vila Nova a cultura tem como função evidente satisfazer necessidades humanas. “Quando o homem faz um instrumento de caça, é impelido pela necessidade de alimento; quando confecciona um casaco com peles de animais, é levado pela necessidade de se proteger do frio” (VILA NOVA 1992: 46).
Além de possibilitar a satisfação das necessidades humanas, a cultura também aparece como um elemento de limitação dessa satisfação, por meio de formas estabelecidas como corretas na sua cultura. O estabelecimento de normas, padrões e costumes, como os horários de atividades, os hábitos alimentares, as crenças e as leis mostram o quanto a cultura “molda as inclinações animais mais elementares do homem através da regulamentação da satisfação de necessidades” (idem). E isso é, obviamente, artificial e fruto da imposição social, que pode decorrer de vários interesses, como os interesses de classe, por exemplo.
	Para Vila Nova, “além de possibilitar a satisfação das necessidades humanas e de limitar normativamente essa satisfação, a cultura também cria necessidades para o homem. [...]. Um grande número de necessidades do homem é criado pela cultura e por ele assimilado através da socialização” (1992, p.47). O autor cita como exemplo o vestuário, que poderia ser visto como uma proteção aos rigores do clima, complementarmente cumpre a função moral associada ao decoro. Os avanços da tecnologia - televisão, celular, computador - oferecem ao indivíduo a noção de que a vida só é possível com o auxílio destes, e que suas necessidades só podem ser satisfeitas com a intervenção desses equipamentos.
	Vila Nova ainda acrescenta:
Além dessas funções, tem ainda, uma função claramente simbólica. Estar na moda quanto ao vestuário significa obedecer às normas referentes a essa área da vida social e, ao mesmo tempo, satisfazer uma necessidade estética cultural. [...] já que mesmo a observância de normas se torna uma necessidade quando estas são suficientemente assimiladas pelos indivíduos” (VILA NOVA, 1992, p.47).
O indivíduo que reza e pede perdão na confissão, se relaciona com os símbolos do perdão assimilado pela socialização e assegura a garantia de absolvição de seus pecados, uma vez que atende às determinações culturais; satisfaz assim, a norma - que é externa - e a uma necessidade psíquica originada na cultura - que está interiorizada - obtendo assim um sentimento de equilíbrio e harmonia com seu meio cultural. A cultura concretiza, então, os significados sociais e estabelece os indivíduos e grupos dentro do ambiente social (LAKATOS, 1985).
A observância das imposições normativas da cultura confere ao indivíduo o sentimento de pertencer ao grupo e, uma vez assimilados os valores culturais, estes se tornam uma necessidade a ser satisfeita, mesmo que isto implique em “alguma forma de violação da condição natural do homem” (VILA NOVA, 1992, p.47), quando, por exemplo, se usa paletó e gravata em ambientes abafados e quentes, exemplo “do caráter arbitrário da cultura” (idem).
3.3.3 Existem Culturas Superiores?
	Segundo Vila Nova, “não existem culturas superiores nem inferiores, mas apenas diferentes. Não se pode afirmar que a cultura de determinada sociedade seja superior ou inferior a outra” (1992: 45). Cada sociedade apresenta a sua própria riqueza, bem como suas deficiências e restrições. O indivíduo pode estar mais adaptado numa determinada cultura, o que poderá propiciar-lhe uma imagem mais favorável à cultura que está inserido, em detrimento das demais, que podem ser sentidas como inferiores ou não.
	As culturas sofrem processos de construções históricas distintas. Não existem duas culturas iguais. Assim, não se pode avaliar uma cultura pelos valores de outra, como assinala Vila Nova: “Nenhuma cultura pode ser compreendida a partir da ‘lógica’ de outra, pois cada cultura possui sua própria ‘lógica’.” (VILA NOVA, 1992, p.45).
Os conceitos de nações “centrais” e “periféricas”, ou de países “desenvolvidos” e “subdesenvolvidos” (COSTA,1987), identificam a ideia de culturas dominadas e dominantes sob certo aspecto, como o econômico, por exemplo, mas isso não implica em inferioridade ou superioridade cultural. Há, ainda, a ideia evolucionista de uma linha de desenvolvimento que diferenciaria as sociedades primitivas e atrasadas das sociedades complexas e desenvolvidas (LAPLANTINE, 2000), o que justificaria certa noção de superioridade e inferioridade entre nações “centrais” e “periféricas”. No entanto, a cultura da dominância ou a dependência, em algum grau, não se confunde com cultura superior ou inferior. 
	As culturas apresentam certa especialização. O Brasil é exportador do samba, do carnaval e do futebol, por exemplo. Em cada cultura encontramos áreas mais desenvolvidas, bem como áreas de atrofia, em que determinada realidade não funciona adequadamente ou mesmo está extinta ou inexistente. A cultura ocidental é rica em desenvolvimento tecnológico, mas não consegue apresentar o mesmo nível de aperfeiçoamento do autocontrole mental, como se verifica entre os orientais, como a Índia, por exemplo.
	Embora se possa imaginar uma cultura ideal, como aquela retratada no filme ‘Horizonte perdido’, cada sociedade traz consigo seus modos de agir, pensar e sentir próprios e um estágio de evolução que possibilita a seus integrantes, membros dessa cultura, determinado conforto material e bem-estar psíquico, por exemplo,adequados àquela sociedade. 
Outro dado relevante é o fato da oferta dos benefícios sociais, não serem distribuídos de modo homogêneo, de modo a atingir todos os seus integrantes, gerando desigualdade e exclusão social dentro do próprio contexto cultural. Lyra Filho (1996) salienta a necessidade de acreditar e cultivar o direito de todos, que os grupos minoritários tenham garantido o seu ‘direito à diferença’, antes que um rolo compressor os esmague.
	O normal e o patológico são conceitos relativos a cada cultura (ROSA, 1980). Tudo o que é aceito pela maioria, estabelecido pelos costumes e pelas normas, que é considerado corriqueiro e necessário, que se repete ou está dentro de uma freqüência média, de modo geral, é visto como realidades normais, daquilo que Durkheim denominou consciência coletiva. O que atravessa os limites dessa normalidade é considerado patológico. Um fato normal em determinada cultura pode não sê-lo em outra como, por exemplo, os hábitos alimentares.
3.2.4 Cultura estudada e cultura vivenciada
	Se cada cultura tem um espaço existencial próprio, para que esta seja compreendida, necessário se faz ser conhecida profundamente, por dentro, além de uma mera prospecção literária, por mais rigorosa e criteriosa em seus métodos investigativos. Um mesmo evento, ocorrido num dado contexto social, pode ser vivenciado de modo diferente pelos integrantes daquela cultura ou reinterpretado em época posterior à sua ocorrência. Como salienta Lévi-Strauss:
Um estudo etnográfico, por melhor que seja, jamais transformará o leitor em indígena. A Revolução de 1789 vivida por um aristocrata não é o mesmo fenômeno que a Revolução de 1789 vivida por um sans-culotte, e nem uma nem outra corresponde, de modo algum, à Revolução de 1789 pensada por Michelet ou por Taine (2008, p.31).
Nesse sentido, parece recomendável uma atitude de respeito, tolerância e humildade diante de culturas outras, diferentes, e a absoluta isenção de preconceitos e interpretações apressadas que as tipifiquem como certas ou erradas, melhores ou piores, superiores ou inferiores. Pior ainda são as visões estereotipadas, visto que estas são irmãs mais novas do preconceito e da intolerância.
3.3 Homo culturalis 
	O Homo sapiens sapiens parece não ter apresentado novas mutações ou mudanças significativas em sua estrutura físico-anatômica nos últimos 35.000 anos, no entanto, é possível observar a presença de alterações em seu perfil social, na medida em que foi sofrendo a passagem do tempo e das alterações culturais ocorridas em cada período de sua história. Trata-se de mudanças culturais que deram ao homo novos adjetivos em sua constituição.
	O primeiro traço herdado foi, exatamente, a sapiência, a consciência de si
	O sapiens, com a emergência das narrativas de Homero, faz emergir o Homo miticus
	O Homo culturalis hodierno vive num contexto social que se constitui um quadro bastante líquido, como diria Bauman, em que mudanças acontecem cada vez mais rapidamente e os indivíduos vão se amoldando aos novos contornos da sociedade de consumo. A partir dessa realidade, será tratado, sociológica e antropologicamente, de dois temas de grande abrangência e atualidade: a diversidade cultural e o meio ambiente e a questão do individualismo na contemporaneidade.
3.3.1 Diversidade cultural e meio ambiente
	Um dos aspectos mais interessantes da cultura criada pelo Homem é o fato de que ela não é a mesma em todos os lugares e em todos os tempos. Pelo contrário, a cultura humana é uma manifestação plural da grande riqueza instituída ao longo da história da humanidade. A organização social humana se distingue na medida em que só ele forma uma sociedade baseada em algo mais que a herança do instinto, ou seja, por meio de processos culturais, que variam no tempo e no espaço. Ao contrário dos demais animais, ao Homem foi possível construir ferramentas sofisticadas, produzir idéias e sonhos, inovar conhecimentos aprendidos e conduzi-los a novas gerações que, por sua vez, as reatualizam. O Homem criou mundos por meio de sua arte, da escrita, da linguagem, dos símbolos, de ideologias, de valores imanentes e transcendentes, produzidos e reinventados a todo o tempo, em todo lugar em que se instala. 
	A seguir, será enfocado a questão da visão cultural sobre o meio ambiente, ao longo do tempo e de algumas culturas. 
	Na antiguidade, anterior ao surgimento da filosofia, na Grécia do século V a.C, o ser humano estava destituído de conhecimento científico e, diante das relações existentes no ecossistema, perplexo, criou respostas à suas indagações sobre a natureza por meio de supostas forças “mágicas” e inexplicáveis. Surgiu, então, o mito, como possibilidade explicativa dessa realidade chamada natureza (physis) e do universo (cosmo). Desde a Ilíada e a Odisseia de Homero, que datam dos últimos anos do século IX a.C., surgem relatos fantásticos tentando aproximar os homens e os deuses, moradores do Olimpo; com HESÍODO (XIII AC), aparecem as teogonias e cosmologias, criando personagens espetaculares e estórias que tentavam explicar e justificar o cosmo. Exemplo desta fase é Stonehenge, este conglomerado de pedras, artificialmente construído a mais de 3000 anos atrás, provavelmente erguido para fins religiosos, de culto à natureza, localizado na planície de Salisbury, no sul da Inglaterra; um período da história da humanidade em que o Homem produziu uma cultura animista, cosmológica, sustentada por teogonias e relatos fantásticos sobre o mundo e a realidade. O estudo destas estórias cosmológicas repleta de divindades denomina-se mitologia (ARANHA, 1993).
	A natureza era respeitada como divina, mãe sagrada, repleta de deuses que detinham força para apaziguar e controlar por meio de rituais e explicações, fixadas em cada cultura. Por isso, segundo Aranha (1993), os primeiros modelos de construção do real são de natureza sobrenatural. No mundo primitivo tudo é sagrado e nada é natural. Os mitos visavam: a) Acomodar e tranqüilizar num “mundo assustador”, ou seja, explicar a realidade; b) Fixar modelos exemplares e atividades significativas. Ligar-se aos deuses e ancestrais (ritos) c) Revitalizar e reviver o sagrado no presente cotidiano. O sagrado sempre presente. Os ritos, por sua vez, deveriam: a) inserir o indivíduo no mundo, b) fazer as coisas funcionarem, c) proteger do “mundo assustador” e d) purificar e reequilibrar a condição social e sobrenatural. Exemplos destes ritos primitivos até hoje são perceptivos em rituais de nascimento, morte, passagem, sacrifícios rituais etc. 
	O meio ambiente era sentido e percebido como algo sagrado e respeitado, capaz de exercer controle sobre o Homem, dominá-lo ou extingui-lo. Sem outras formas de explicações, além da mitologia, a natureza foi divinizada como ser ou seres supremos, a serem reverenciados em religiões animistas e mitológicas. Ecologia era uma questão religiosa.
	Os pré-socráticos, que sucederam e superaram o pensamento mitológico, buscavam o arquê, o elemento essencial na própria natureza. Para Tales de Mileto (624-556 aC) esse elemento era a agua, para Anaxímenes de Mileto (585-528 aC), o Ar, para Pitágoras (580-497 aC), os números, a matemática. Demócrito e Leucipo traziam a idéia de atomismo. Mas foi com a emergência da especulação racional, filosófica, prefigurada nos pensadores Sócrates, Platão e Aristóteles, que a natureza e o cosmo (ecossistema) deixaram de ser sagrados e o Homem passou a ser objeto central da reflexão humana. Ecologia passou a ser uma questão ontológica, e a verdade buscada na interioridade humana (ARANHA, 1993).
	A Idade Média foi construída sob o domínio do cristianismo institucionalizado romano, por volta do século IV d.C, momento em que a Europa enxergou a natureza como criação de Deus, como tudo o mais. Ecologia no medievo europeu, entre os séculos X a XV aproximadamente, foi uma questão submissa à teologia e à filosofia tutelada e aprovada pelo dogma cristão do catolicismo romano. A ecologia voltou a ser uma questão religiosa, no entanto, diferente da antiga era animista,pois, agora aparecia submissa ao criador único do universo, ao pensamento universalizado da Igreja cristã, no entanto, um mistério ao homem leigo do medievo.
	A cultura ocidental européia desenvolvida até então trouxera a natureza como uma força a ser respeitada, por vezes reverenciada, inserida nos costumes e nas produções realizadas pelo Homem. Os animais serviam como transporte e alimento, bem como as frutas, verduras e legumes. A madeira proporcionava abrigo e ferramentas, tais quais os objetos extraídos das fontes minerais, que colocam à sua disposição martelos, foices, lanças, flechas, espadas, armaduras, ferraduras, etc., que facilitavam o progresso da humanidade. O meio ambiente era uma fonte inesgotável de riquezas, ao mesmo tempo, que representava uma força “mágica”, apaziguada pelos rituais religiosos. O Homem se vestia, lutava, se alimentava, morava, rezava, morria, envolto por um meio ambiente diácono e dominador.
	A Renascença promoveu o rompimento com essa visão passiva em relação à natureza e seu domínio sobre a humanidade. O pensamento dogmático-religioso foi cedendo, na Europa dos anos seiscentistas em diante, para uma nova forma de pensar a realidade e construir a cultura do Homem. As descobertas marítimas, as reformas protestantes, a formação dos estados nacionais, o avanço das artes e literatura, as descobertas tecnológicas e científicas etc., consolidaram uma nova ordem social e cultural, agora baseada na Ciência como âncora do conhecimento. no processo de industrialização européia, na visão político-econômico da classe capitalista-burguesa, com seu modelo econômico liberal e o fim do império do poder religioso (Igreja). 
	Parte da cultura produzida a partir de então também rompeu com a religião. As artes e a produção, as ciências e as práticas cotidianas, os costumes e as regras do trato social passaram a ser elaboradas em outras matrizes ou paradigmas, que instituem novas relações sociais entre o homem e a natureza, com o outro e consigo mesmo. O Homem passou a buscar a liberdade de pensamento, fato que lhe conferiu novas construções culturais, entre elas, a eleição da indústria e da ciência como as novas alavancas do progresso da humanidade. Nomes como Augusto Comte, Herbert Spencer, Karl Marx, entre outros, vislumbrarão novos limites culturais para a sociedade moderna e contemporânea. 
	A questão ecológica, principalmente durante a primeira fase da Revolução Industrial, foi predatória e impiedosa. A Ciência estava lá, instalada, para dominar a natureza e submetê-la ao Homem. Nem mesmo Deus poderia vencer a força da racionalidade científica, estampavam os jornais quando do lançamento do transatlântico Titanic; em um folheto publicitário de 1910, da White Star Line, sobre o Titanic, alegava que ele fora "concebido para ser inafundável. Apesar dessa consciência de domínio pleno das forças da natureza, o grande transatlântico afundou na madrugada do dia 16 de abril de 1912. A consciência ecológica era muito distante da ideia de escasses dos materiais ofertados pela natureza. Não havia motivo para pensar em proteção do meio ambiente ou em energia renovável. O mundo e a natureza estavam dominados pela Ciência. Nada mais a ela restaria do que se submeter à inteligência e racionalidade do ser humano. A palavra de ordem era seguir adiante, no espírito do liberalismo de Smith e Ricardo e consolidado pela filosofia positivista de Augusto Comte. Ecologia era uma palavra desconhecida nos inicios do século XX.
	Arent, ao falar mais especificamente do cientista, diz que se trata de um homo faber, e “ísso acontece antes de mais nada porque ele é quem concebe e fabrica modelos” ( apud DUPUY, 1996, p.23). Este é fabricante de cultura, de um modelo capitalista, neoliberal, invadido pelas máquinas, pela tecnologia e pela Ciência, mas também, imerso numa sociedade em crise com o meio ambiente e diante de um planeta finito, construído numa escala de produção baseada num sistema linear. Na pauta da cultura contemporânea está a possibilidade de criar um sistema sustentável, “verde”, ecológico, com consumo consciente e políticas públicas e comerciais não predatórias, sem resíduos tóxicos e a partir de energia renovável. Um sistema que não destrua as pessoas e o meio ambiente em prol do lucro. Será possível?
	Após duas grandes guerras mundiais novecentistas, um período de extrema recessão nos anos 1920 e o início do que ficou conhecido como “guerra fria”, a natureza começou a sofrer seus primeiros golpes mais severos: atividade extrativista desmedida, exploração e consumo dos derivados do petróleo, máquinas poluindo o ambiente e substituindo o homem em suas funções laborais, até a emblemática explosão nuclear em Hiroshima e Nagazaqui, as experiências na região de biquini, os defensivos agrícolas e as armas químicas. A natureza começou a dar sinais de sua fragilidade e escasses. Ecologia e desenvolvimento sustentável começaram a ser questões presentes na vida humana, enquanto reflexão sobre e para a nossa sobrevivência e do planeta. A cultura humana se adaptou à ciência e tecnologia, superou e domou as forças naturais, no entanto, sem deixar de sofrer os resultados de suas ações e relações com o meio em que vive. Ecologia passou a ser uma questão de sobrevivência da humanidade no século XXI.
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* Luiz Antonio Sobreiro Cabreira é mestre em educação, com formação em teologia e pedagogia, especialização em ciências humanas e sociais. Atualmente é professor na Universidade do Oeste Paulista – São Paulo, Brasil.

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