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Disciplina: Direito Civil Aplicado II Aula 2: Relações de Parentesco Apresentação: Não somente em nosso país, mas em diversas culturas, a noção de família é muito ampla. Quantas vezes chamamos aquele amigo querido de primo, ou uma amiga de longa data de nossos pais, de tia? No entanto, a noção jurídica de parentesco é mais restrita do que a noção cultural e social que temos desse parentesco. Nesta aula, vamos aprender sobre as relações de parentesco. Vamos avaliar quem são efetivamente parentes. A identificação das relações de parentesco terá consequências em diversos campos da vida, pública e privada. Assim, é importante saber quem são os parentes de determinada pessoa, e ainda, saber classificar a espécie de parentesco envolvida, bem como contar o grau de parentesco existente entre duas pessoas. É a relação de parentesco que determinará o direito de alimentos, direitos sucessórios etc. Objetivos: Compreender a noção jurídica de parentesco em comparação com a visão social de família; Identificar as espécies de parentesco; Compreender a contagem de graus e linhas de parentesco. Conceito Falar das relações familiares é tema recorrente não somente em termos sociais, mas também a respeito das consequências jurídicas dessas relações. O nome técnico que se dá a essas relações familiares é parentesco. Podemos dizer, portanto, que parentesco é o vínculo jurídico que une duas pessoas da mesma família, seja porque elas descendem uma da outra, seja porque descendem de um mesmo tronco comum. Apesar de falarmos da descendência de uma pessoa da outra, ou da descendência de duas pessoas de um mesmo parente comum, o parentesco não é derivado exclusivamente dos vínculos biológicos que unem uma família, daí o art. 1593 do Código Civil determinar que "O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem". Atenção Podemos dizer que o parentesco é considerado natural quando as pessoas são unidas pelo vínculo de sangue, enquanto as demais causas determinantes de parentesco, como a adoção, as reproduções assistidas heterólogas, ou mesmo o vínculo de socioafetividade determinam o parentesco chamado civil, ou de outra origem. Parentesco natural ou civil Antes de tratar das diversas causas de estabelecimento do vínculo de parentesco, que de certa forma se confundem com as causas determinantes da filiação, é muito importante lembrar do princípio de igualdade entre os filhos, perpetrado no art. 227, do § 6º, da Constituição Federal, determinando que "os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação". 1998 Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil, saudada como uma constituição que valoriza o indivíduo e promove a dignidade da pessoa humana, fica proibido o uso de qualquer designação discriminatória, como as que eram utilizadas no passado para identificação de filhos ilegítimos. Todos os filhos são iguais perante a lei! Devem ter os mesmos direitos e devem ser tratados com igualdade. Não pode ser feita qualquer diferença entre os filhos nascidos da relação de casamento, ou de adoção com aqueles oriundos da relação de casamento. Atenção Nem todas as situações que socialmente são consideradas distinções entre os filhos, aos olhos da Lei serão consideradas discriminações entre os filhos. Atividade Questão 1: João tem três filhos, Carolina, Gustavo e Guilherme, que são trigêmeos. Desde o nascimento dos filhos, João demonstra claramente mais afinidade com o filho Guilherme, apesar de tratar a todos os filhos com o mesmo zelo. Já adultos, Guilherme é o filho mais apegado ao pai. Diante de tais fatos, João resolve deixar 50% de todo seu patrimônio a Guilherme por testamento. Os outros filhos podem se insurgir contra o testamento, por violação do princípio da igualdade dos filhos? Origem da Filiação Família (Fonte: Shutterstock) Origem biológica A origem da filiação pode ser biológica ou não. Quando a filiação tem origem biológica, podemos dizer que, geneticamente, o filho é descendente do pai e da mãe. Ou seja, além de ser pai ou mãe, os pais são também genitores da criança. São geneticamente ascendentes. A origem biológica pode ser determinada pela reprodução por meios naturais, através de relações sexuais entre o pai e a mãe, ou ser derivada de reprodução assistida, nesse caso denominada reprodução assistida homóloga. A reprodução assistida homóloga é aquela em que é feita a reprodução assistida por técnicas médicas, mas sendo usado material genético do pai e da mãe. Nestes casos, há coincidência entre o genitor (pai ou mãe biológicos) e a figura do pai e da mãe. Outras origens do parentesco Quando o Código Civil menciona o parentesco por outra origem, estão englobados na expressão "outra origem" o parentesco derivado das reproduções assistidas heterólogas, o parentesco derivado da adoção e também da afetividade. Mais adiante vamos conversar um pouco sobre multiparentalidade. Reprodução assistida heteróloga A reprodução assistida heteróloga acontece quando o casal, seja de homem e mulher, de dois homens ou de duas mulheres decide ter um filho, mas depende do material genético de outra pessoa para a realização da técnica de reprodução assistida. Nesse caso, é comum que, em relação aos pais, o filho seja juridicamente de ambos, mas geneticamente filho somente de um deles. Podemos dizer que ambos são pai ou mãe, mas somente aquele que utilizou seu material genético é genitor. Assim, só haverá relação de parentesco do filho com os pais, ou aqueles que se determinaram pais. O eventual doador de material genético não terá vínculo de parentesco com a criança. Geneticista (Fonte: Shutterstock) Adoção É o instituto pelo qual o ordenamento jurídico cria o vínculo de filiação entre duas pessoas. O propósito da adoção, segundo Oliveira (2018), é "imitar a filiação natural", criando uma filiação civil. A adoção no Brasil pode ser feita tanto de pessoas menores como pessoas maiores, sendo a adoção regulada por lei especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente, cujas normas de adoção foram alteradas pela Lei 12.010/2009. Para que a pessoa possa adotar alguém não será relevante seu estado civil, possibilitando que o adotante seja pessoa solteira, casada, viúva, ou vivendo em união estável, desde que atenda às necessidades do adotado, como propiciar um ambiente familiar adequado. É necessário, consoante o que determina o art. 42, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente que o adotante seja 16 anos mais velho do que o adotado, tendo em vista a natureza do instituto cujo objetivo é recriar uma situação de filiação. O filho adotivo, como já insistimos deve ser considerado simplesmente filho, não devendo haver qualquer designação que o diferencie do filho biológico. Inclusive no registro de nascimento constará a filiação, sem que faça parte qualquer informação de que se trata de filho adotivo. Família (Fonte: Shutterstock) O parentesco original daquela pessoa só persistirá em sigilo no Registro Civil de Pessoas Naturais para fins de manutenção dos impedimentos de casamento com a família biológica. Saiba mais Atualmente, no Brasil, conforme determina o art. 50, do Estatuto da Criança e do Adolescente, devem existir dois cadastros, um de pessoas dispostas a adotar, e outro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados, e as adoções devem seguir rigorosamente esses dados conjugados, evitando fraudes e tráfico de crianças. Parentesco socioafetivo e pluriparentalidade A ideia de afetividade no direito de família é tema que ganhou mais espaço de debate com a evolução social e jurídica da família, deixando de se considerar importante para a constituição de vínculos somente o vínculo biológico ou aquele estabelecido legalmente pela adoção, como antes. A partir da maior valoração da afetividade, começou-se a discutir se os laços afetivos de uma pessoa criada como filha de outra, sem queexistisse filiação biológica deveriam ter menos valor do que a filiação biológica. Exemplo Imagine que um homem crie uma criança até os 12 anos de idade acreditando ser seu filho, quando descobre, enfim, que aquela criança é filha de outra pessoa. A pergunta que nos resta é: o que deve prevalecer, o vínculo biológico daquela criança ou os laços afetivos que ela formou com quem acreditava ser seu pai? O grande valor que se estabelece em torno da afetividade na família, faz com que a ordem jurídica não só reconheça a filiação socioafetiva, mas também, diante da igual importância que a verdade biológica e a filiação biológica possuem, passou-se a reconhecer a possibilidade da chamada pluriparentalidade. A pluriparentalidade, como o nome indica, permite que se reconheça o parentesco afetivo de A com B, sem que seja necessário desconstituir ou não reconhecer o parentesco biológico. Desta forma, aproveitando nosso exemplo, é possível que seja reconhecido o parentesco biológico da criança com o pai biológico, sem ser desconstituído o parentesco com o pai que o criou que será mantido como pai socioafetivo. A possibilidade de pluriparentalidade ou multiparentalidade foi reconhecida pelo STF, no Recurso Extraordinário 898.060/SC, de relatoria do Ministro Luiz Fux, aprovando-se a tese de que "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro publico, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios". Linhas e graus de parentesco Bem, depois de entendermos de que forma pode se constituir o parentesco, é importante conhecer o grau de parentesco existente entre duas pessoas, bem como se trata de parentesco em linha reta (ascendentes e descendentes) ou linha colateral. A espécie e o grau de parentesco existente entre duas pessoas serão responsáveis por estabelecer importantes efeitos jurídicos, como impedimentos de casamento, direito a alimentos recíprocos, direitos sucessórios etc. O parentesco se classifica em linhas e graus. Parentesco em linha reta É aquele em que uma pessoa é descendente da outra, são pais e filhos, avós e netos, bisavós e bisnetos etc. Existe uma descendência efetiva entre os dois. A contagem de graus na linha reta se dá pelo número de gerações existentes entre as duas pessoas. Desta forma, pai e filho são parentes em linha reta de primeiro grau, pois somente uma geração separa pai e filho. Do mesmo modo contaremos o grau de parentesco entre avó e neto. Sendo certo que duas gerações existem entre avó e neto, o grau de parentesco existente entre ambos é de duas gerações, é certo também que avó e neto são parentes em linha reta de segundo grau. Parentesco em linha colateral Pode ser identificado como o parentesco existente entre duas pessoas que não descendem uma da outra, mas de um ancestral comum, ou como tecnicamente se afirma em Direito, descendem de um tronco comum. Exemplo Para melhor entender, podemos pegar o exemplo de nossos primos. Normalmente, você e seus primos são inclusive da mesma geração, não existindo nenhuma descendência um do outro, mas ambos descendem de um mesmo tronco, têm uma mesma origem, possuem um ancestral comum. No caso dos primos, o primeiro ascendente comum entre eles será o avô ou avó. Na linha colateral, por não se tratar de ascendentes diretos um do outro, a contagem de graus ocorrerá de forma um pouco diversa da contagem de graus da linha reta, não bastando, portanto, simplesmente contar o número de gerações existentes entre dois parentes. Apesar da base da contagem de graus, também na linha colateral ser a contagem do número de gerações, essa contagem deverá ser feita da seguinte forma: Inicialmente, deverá ser identificado o primeiro ascendente em comum entre os parentes que você pretende definir o grau de parentesco. Identificado o primeiro ascendente comum, partindo de um dos ascendentes, devemos contar o número de gerações subindo até o primeiro ascendente em comum e descendo até o parente colateral. Exemplo João tem uma prima Maria e uma irmã Giovana. Qual o grau de parentesco de João com Giovana e o grau de parentesco de João com Maria? Para saber o parentesco de João e sua prima Maria, é necessário estabelecer o primeiro ascendente em comum entre eles. Se João e Maria são primos porque o pai de João é irmão do pai de Maria, o primeiro ascendente em comum é o pai dos seus pais. Imagine que o pai de João seja Antenor, que também é pai de Giovana. Antenor tem um irmão, Marcelo, filho do mesmo pai, Manoel. Marcelo tem uma filha, Maria. Para contar o grau de parentesco entre João e a prima Maria, deve-se contar o número de gerações, passando pelo primeiro ascendente em comum, conforme o diagrama abaixo: Giovana é parente colateral de João em 2º grau. E Maria é parente colateral de João em 4º grau. Parentesco por afinidade É regulado pelo art. 1.595, do Código Civil, e pode ser definido como o vínculo que une cada cônjuge ou companheiro aos parentes do outro cônjuge. Assim, se os pais de seu marido ou de sua mulher, são parentes em linha reta de seu marido ou sua mulher, podemos dizer que seus sogros (pais de seu marido ou mulher) são seus parentes em linha reta. Da mesma forma, a contagem de grau de parentesco é a aquela estabelecida entre marido ou mulher em relação ao seu respectivo parente. Se o irmão de seu marido ou de sua mulher é parente colateral de segundo grau dele ou dela, será seu parente colateral de segundo grau por afinidade. O parentesco por afinidade, contudo, tem limitações bem estabelecidas. O parentesco por afinidade na linha reta existirá sem limitação de graus, porém, na linha colateral só existe em relação aos irmãos do cônjuge ou companheiro. O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro. Código Civil, art. 1.595, § 1º Para finalizar nossa aula, é importante lembrar que com o fim do casamento ou da união estável, seja por morte, ou por divórcio, estará extinto o parentesco por afinidade colateral, existente entre o cônjuge ou companheiro e o irmão do outro cônjuge ou companheiro. No entanto, esse parentesco não se extinguirá na linha reta. Daí se afirmar, popularmente, que as sogras sempre serão sogras! Atividade Questão 1: Quais dos parentes abaixo relacionados correspondem afinidade de linha reta: a) primos, sobrinhos e tios. b) enteados, sogros e cunhados. c) sogros e enteados. d) filhos e genros. Atividade Questão 2: Julgue as afirmativas abaixo como verdadeiras ou falsas. I. A adoção é vínculo de parentesco, cuja existência afasta o parentesco socioafetivo. II. A multiparentalidade permite que sejam reconhecidos ao mesmo tempo, para a mesma criança, um pai biológico e um pai socioafetivo. III. O pai biológico terá sempre mais direitos do que o pai socioafetivo. É correto afirmar: a) todas as alternativas estão corretas. b) as alternativas I e II estão corretas. c) todas as alternativas estão erradas. d) a alternativa II está correta. Atividade Questão 3: Em virtude de grande desastre em sua família, que vitimou a maiorias de seus familiares, Marina foi criada por sua tia-avó Margarida, irmã mais nova de sua avó Josefina. Podemos afirmar que Marina e sua tia-avó Margarida são: a) parentes de linha reta de quarto grau. b) parentes de linha colateral de terceiro grau. c) parentes de linha colateral de quarto grau. d) não são parentes, pois a lei limita o parentesco colateral ao quarto grau. Referências GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de Direito Civil. v. VII. São Paulo: Saraiva, 2018. OLIVEIRA, J. M. Leoni Lopes. Direito Civil. Família. São Paulo: Gen Forense, 2018. Próximos Passos Regras gerais dos regimes de bens no casamento e na união estável; Regimes de comunhão: universal, parcial e participação final dos aquestos; Regimes de bens sem comunhão: separação total de bens convencional e separação total de bens obrigatória. Explore mais Consulte o Provimento 63/2017 do CNJ <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3380 . > Acesso em: 08 jun. 2018. http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3380%20.
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