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UNICATHEDRAL CENTRO UNIVERSITÁRIO CATHEDRAL CURSO DE DIREITO ADEMIR MACIEL DOS SANTOS O USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ALUNOS DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE BARRA DO GARÇAS-MT Barra do Garças – MT Março – 2020 ADEMIR MACIEL DOS SANTOS O USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ALUNOS DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE BARRA DO GARÇAS-MT Artigo Científico elaborado sob a orientação da Profª. Esp. Gricyella Alves Mendes Cogo, para obtenção do título de Bacharel em Direito, do UniCathedral – Centro Universitário. Barra do Garças – MT Março – 2020 UNICATHEDRAL CENTRO UNIVERSITÁRIO CATHEDRAL CURSO DE DIREITO A Banca Avaliadora, abaixo assinada, __________________________, com a nota _____, o Artigo: O USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ALUNOS DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE BARRA DO GARÇAS-MT ADEMIR MACIEL DOS SANTOS como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. BANCA AVALIADORA Profª Esp. Gricyella Alves Mendes Cogo (Assinatura por extenso do Membro Convidado) Barra do Garças – MT Março – 2020 __________________________________ 1 Acadêmico do curso de Direto do UniCathedral – Centro Universitário. 2 Especialista em Direito e Processo do Trabalho e Direito Previdenciário. Professora do UniCathedral – Centro Universitário. O USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ALUNOS DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE BARRA DO GARÇAS-MT Ademir Maciel dos Santos 1 Gricyella Alves Mendes Cogo 2 RESUMO: Trata-se de artigo voltado ao uso de drogas, lícitas e ilícitas, por crianças e adolescentes matriculados na rede pública de ensino da cidade de Barra do Garças – MT. Pretendeu-se entender os motivos para o primeiro uso, a relação familiar, a aceitação social e a omissão estatal. Trouxe também, de modo específico, o uso do narguilé, como nova modalidade de substância que pode causar dependência e que é altamente consumida entre os jovens atualmente. Além de pesquisa bibliográfica, o trabalho utilizou-se de pesquisa semiestruturada para buscar informações diretamente com os jovens, tentando se entender quais os motivos determinantes para o consumo de quaisquer desses produtos. Do mesmo modo analisou-se as legislações local, estadual e nacional que tratam do tema. Dessa análise pretendeu se observar quais as possíveis consequências para os próprios jovens que fazem uso dessas drogas, e as penalidades para a família que introduz ou permite o uso e também para os comerciantes que fornecem ou deixam à disposição esses entorpecentes aos menores de 18 anos. Por fim, o artigo tece conclusões com base na bibliografia e na pesquisa semiestruturada, com o intuito de produzir informações que sejam pertinentes para o enriquecimento acadêmico e do público em geral. O assunto em questão é complexo, merece atenção e estudos mais aprofundados. PALAVRA CHAVE: Drogas. Crianças e Adolescentes. Uso e Consumo. 1. INTRODUÇÃO O uso de drogas é considerado um problema a nível mundial. No Brasil é um assunto sempre muito polêmico, principalmente quando se fala sobre o uso por crianças e adolescentes em idade escolar. A discussão gera desconforto e incômodo, isso quando se debate a questão, já que na maioria das vezes todos evitam falar sobre a temática, como se o problema fosse desaparecer sozinho. O consumo de drogas por jovens em idade escolar pode atrapalhar o rendimento do estudante, trazendo consequências para todo futuro acadêmico do usuário. Como se não fosse suficiente todos os problemas sociais que por si só já acompanham o vício. Além de ser um tema delicado, o uso de drogas por crianças e adolescentes levanta sempre muitas dúvidas, algumas das quais tentou se responder com esse trabalho, cujo tema é: O uso de drogas lícitas e ilícitas por alunos das escolas de Barra do Garças – MT. Respondendo ainda, ao seguinte questionamento: O que leva o jovem barra-garcense a experimentar drogas lícitas ou ilícitas em sua infância ou adolescência? Importante ressaltar que há proibições que precisam ser observadas no que se refere à venda de determinadas substâncias a crianças e adolescentes. A Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA) traz em seu bojo a vedação à comercialização de qualquer substância que possa causar dependência física ou psíquica a menores de 18 anos. Entretanto, percebe-se que faltam eficácia e efetividade a norma jurídica em questão. Esse ponto de reflexão traz ainda mais dúvidas, como por exemplo, os motivos da omissão estatal, o porquê da aceitação social, e os motivos da conivência dos pais. Para se chegar a uma resposta foi utilizado nesta pesquisa de natureza básica a forma de abordagem qualitativa e procedimento de pesquisa documental. Quanto aos objetivos, foi utilizado o método descritivo. Também se utilizou de pesquisa comparativa, para que fosse feito o confrontamento entre as escolas públicas regulares e as escolas que 5 trabalham com educação de jovens e adultos, tentando se observar a taxa de usuários, a idade do primeiro contato e a pré-disposição familiar para o consumo. Quanto aos procedimentos técnicos foram utilizadas fontes bibliográficas e estudos doutrinários visando encontrar opiniões e análises sobre o tema. Para tanto, utilizou-se das pesquisas de Mayra Costa Martins, Doutora em Ciências no Programa Psiquiatria da EERP- USP (2011), e Sandra Cristina Pillon, Doutora em Ciências no Programa Psiquiatria e Psicologia Médica da UNIFESP (2003). Além disso, foi feito estudo de caso, por meio de pesquisa semiestruturada diretamente com os estudantes nas diversas modalidades e tipos de ensino. De mais a mais, utilizou-se do método indutivo para se fazer a análise das famílias dos alunos envolvidos no tema, utilizando-se ainda o método de procedimento comparativo, para identificação de como poderiam ser elaboradas as políticas públicas que garantam o efetivo combate aos ilícitos e tratamento dos usuários. Quando se trata de crianças e adolescentes, percebe-se que esse grupo é, preponderantemente, instigado, induzido ou auxiliado por pessoas próximas ou da própria família, a fazer uso dessas substâncias. Diante disso, um dos principais problemas no enfrentamento ao uso de entorpecentes por crianças e adolescentes é como agir frente às famílias, aos usuários, e sobre como tratá- los. Há quem defenda que é caso de se aumentar a punição diminuindo-se, por exemplo, a maioridade penal. É o caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 04/2019, de autoria do senador Marcio Bittar que pretende a diminuição da maioridade penal para 16 anos. No entanto, na contramão dessa medida, foi aprovada a Lei 13.840/2019 que trata o uso de drogas como caso de saúde pública e institui dentre outras medidas a possibilidade de internação compulsória para tratamento dos dependentes. Utilizou-se, como contexto legal, a Lei 11.343/06 (Lei de Drogas), a qual trouxe um novo conceito de usuário de drogas que necessita de atenção e cuidados para sua reinserção social. Seja qual for a bandeira defendida, este tema merece atenção especial do Estado, da sociedade, da escola e principalmente da família. Esse Artigo se justifica por ser a cidade de Barra do Garças – MT considerada uma cidade universitária e possuir uma quantidade significativa de jovens. Esses jovens estão hoje expostos a todo tipo de drogas, lícitas e ilícitas, e muitas vezes em idade impúbere. As escolas, local de maior concentração de crianças e adolescentes, acabam se transformando em ponto estratégico de quem lucra com as drogas (lícitas ou ilícitas) e no meio desse alvo estão os menores. 6 2. O USO DE DROGAS POR ALUNOS DAS ESCOLASDE BARRA DO GARÇAS - MT O combate às drogas é um problema a nível mundial. Esse problema vem crescendo ao longo dos anos. No Brasil há diversas ações governamentais no intuito de prevenir e reprimir o uso de entorpecentes, mas ainda ineficazes. A legislação que trata das drogas no Brasil é a Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006 (Lei de tóxicos). Essa norma traz, em seu bojo, a definição legal de drogas logo no artigo 1º, parágrafo único, que diz: Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes. Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. (BRASIL, 2006). Percebe-se que apesar de conceituar legalmente o que são drogas, que a lei é omissa no que diz respeito a quais são as drogas e seus princípios ativos, considerando-se assim como uma norma penal em branco. Significa dizer que se faz necessária outra norma para explicar e listar quais são as substâncias que são consideradas drogas. Essa norma complementar foi trazida ao ordenamento jurídico por meio da portaria 344 do Ministério da Saúde. É nesta norma de extensão que se encontram todas as substâncias que, caso apreendidas em mãos alheias, sem a devida autorização, trazem consequências penais e extrapenais para o autor desse fato. A lei de drogas inovou ao trazer ao ordenamento jurídico pátrio a ideia de lei despenalizadora, que se preocupa com a educação e a prevenção e não apenas com a punição dos usuários. O artigo 28 da referida lei discorre sobre as medidas despenalizadoras para quem consome drogas, conforme abaixo: 7 Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. (BRASIL, 2006). Entretanto, essa lei, na prática, serve apenas para liberar o usuário mediante compromisso de participação nas medidas despenalizadoras aplicadas pelo juiz. Essas medidas dificilmente são cumpridas pelos usuários, que acabam retornando ao vício. O problema das drogas vai muito além do crime, é um caso de saúde pública e de educação familiar. O uso de drogas, por jovens no Brasil, está balizado principalmente em três alicerces básicos: o desconhecimento, a complacência dos pais e a omissão estatal. Em primeiro lugar, as informações a respeito dos efeitos do uso reiterado dos entorpecentes ainda são escassas aos jovens; em segundo lugar, a falta de estrutura familiar adequada e muitas vezes de instrução dos pais; e por último, na omissão promovida pelos agentes públicos, que por vezes percebem a prática de infrações penais envolvendo jovens consumindo drogas (lícitas e ilícitas) e nada fazem. Outrossim, quando se discute sobre o uso de drogas por menores, na grande maioria das vezes, refere-se apenas às drogas ilícitas. Contudo, sabe-se que hoje o consumo das drogas lícitas ganha cada dia mais adeptos e cada vez mais espaço entre os jovens. Essa informação foi comprovada por uma pesquisa feita pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), considerada a maior já realizado no Brasil, que trouxe o álcool como a droga mais consumida. O estudo em questão foi realizado em mais de 300 municípios brasileiros e concluiu que: (...) “a prevalência do uso de bebidas alcoólica nos últimos 30 dias, na população brasileira, foi de 30,1% - o que representa aproximadamente 46 milhões de habitantes. A prevalência do consumo em binge foi 16,5%, correspondendo a aproximadamente 25 milhões de habitantes. (BASTOS, 2017, p. 79). A expressão binge trazida pelo estudo é definida como beber em uma única ocasião cinco ou mais doses, para homens, ou quatro ou mais doses, para mulheres. Depreende-se 8 claramente, por meio dos resultados obtidos pela FIOCRUZ, que o álcool é a droga mais consumida atualmente no Brasil. Ficando, inclusive, bem à frente da segunda, que é o tabaco. A Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas) redefiniu a forma de tratamento dispensado aos usuários de drogas, rompendo com a forma criminalista e preconceituosa anteriormente utilizada. Para efetivação das políticas públicas, essa lei criou planos de ações e medidas que deverão ser tomadas pelo Estado a fim de se combater os ilícitos. Dentre as medidas a serem adotadas, esse diploma legal instituiu o Plano Nacional de Políticas sobre Drogas, que tem entre seus objetivos: Art. 8º-D. São objetivos do Plano Nacional de Políticas sobre Drogas, dentre outros: (Incluído pela Lei nº 13.840, de 2019) I - promover a interdisciplinaridade e integração dos programas, ações, atividades e projetos dos órgãos e entidades públicas e privadas nas áreas de saúde, educação, trabalho, assistência social, previdência social, habitação, cultura, desporto e lazer, visando à prevenção do uso de drogas, atenção e reinserção social dos usuários ou dependentes de drogas; (BRASIL, 2006). Por meio da leitura deste dispositivo, fica clara a intenção do legislador em promover ações de interdisciplinaridade e integração aos programas instituídos pelo poder público, com o fim de se combater o uso de drogas. No entanto, essa norma se mostra ineficaz por sua má implementação na prática. Não obstante todo o aparato legislativo a respeito do tema, há ainda uma discussão sobre a possível descriminalização do uso de drogas para consumo próprio no poder judiciário. Estava marcada para o dia 06 de novembro de 2019 a audiência no Supremo Tribunal Federal (STF) encarregada de tratar do assunto. No entanto, o presidente do STF, Ministro Dias Toffoli, excluiu a discussão do calendário de julgamento da corte. 2.1 A PRIMEIRA VEZ O primeiro uso de drogas por crianças e adolescentes no Brasil ocorre, normalmente, dentro de casa, acompanhado dos pais, amigos ou vizinhos, são as chamadas drogas lícitas. Destarte, o uso por menores de idade é negligenciado, tolerado e muitas vezes incentivado por quem deveria protegê-los. No país existe uma cultura de consumo de drogas lícitas, e isso interfere, principalmente, na formação dos jovens em idade escolar, que estão em fase de 9 desenvolvimento físico, mental, social e espiritual, conforme o artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), in verbis: Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (BRASIL, 1990). Nota-se claramente a preocupação legislativa com esse grupo, considerado frágil, e que denota proteção específica do Estado. Importante destacar que a legislação brasileira protetiva desse grupo hipossuficiente é considerada umas das melhores do mundo, esbarrando, contudo, na ineficiência e falta de efetividade da norma. A proteção em questão pode ser encontrada com a leitura do mesmo diploma legal, em seu artigo 81, onde está a vedação à venda de qualquer substância que possa causar dependência a menores de 18 anos, ainda que usada de forma indevida. Em seu artigo 81, in verbis: Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adolescente de: I - armas, munições e explosivos;II - bebidas alcoólicas; III - produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida; IV - fogos de estampido e de artifício, exceto aqueles que pelo seu reduzido potencial sejam incapazes de provocar qualquer dano físico em caso de utilização indevida; V - revistas e publicações a que alude o art. 78; VI - bilhetes lotéricos e equivalentes. (BRASIL, 1990). A legislação definiu claramente que esses produtos não deveriam entrar em contato com as crianças e adolescentes. Entretanto não é isso que se vê na prática, quando comerciantes dos mais variados segmentos fornecem todo tipo de produto aos jovens, desde que estes tenham dinheiro para pagar. Apesar da norma proibitiva posta, há diversos casos de violação. Pode-se perceber que, não raras às vezes, amigos, familiares, comerciantes, dentre outros, colocam ao alcance dos jovens inúmeras substâncias proibidas. 10 Ademais, sabe-se que fornecer de qualquer forma drogas, ainda que lícitas para menores de 18 anos é crime, sujeitando os infratores às consequências jurídicas trazidas pelo artigo 243 do ECA: Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica: (Redação dada pela Lei nº 13.106, de 2015). Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave. (BRASIL, 1990) Contudo, a penalidade é subestimada e parece não assustar quem comercializa ou repassa produtos e substâncias que causam dependência a crianças e adolescentes. Esse comportamento demonstra aceitação social da conduta pela maioria, que ignora o cometimento desse crime. A consequência disso é o número cada vez maior de consumidores, e usuários cada vez mais jovens. Mayra Costa Martins, Doutora em Ciências no Programa Psiquiatria da EERP-USP (2011), e Sandra Cristina Pillon, Doutora em Ciências no Programa Psiquiatria e Psicologia Médica da UNIFESP (2003) dizem que “Quando os vínculos primários são fortes, as chances de o adolescente exibir comportamento antissocial são menores do que quando os vínculos com os pais não existem ou são fracos” (MARTINS; PILLON, 2008, p. 1113). Portanto, levando-se em consideração que esse pode ser um dos motivos para o uso de drogas, ainda assim não traz certeza sobre como pode ser feito o enfrentamento. Em qualquer roda de discussão surgem argumentos sobre como deve ser feito o combate ao uso de drogas no país. Porém, são sempre insipientes, sem nenhuma base científica ou estudo a respeito, apoiados quase sempre no senso comum. 2.2 O USO DE NARGUILÉ O narguilé chegou ao Brasil trazido pelos árabes e se tornou muito popular, em especial após a novela o clone, exibida pelo canal da TV aberta rede Globo, que exibia várias pessoas fazendo uso do produto. Hoje é uma febre entre os jovens de todo Brasil, e em Barra do Garças não é diferente, podendo, inclusive, serem encontrados vários pontos de comércio, chamados de lounge ou tabacaria, especialmente para seu uso. 11 Apesar das proibições, no que diz respeito a expor crianças e adolescentes a produtos que possam causar dependência química, isso parece não assustar e nem surtir efeito na prática. Na cidade de Barra do Garças, alvo deste trabalho, vê-se crianças e adolescentes, em vários pontos da cidade, fazendo uso do famoso narguilé. De acordo com o dicionário Aurélio online, narguilé é um “cachimbo turco, índio ou persa, composto de um fornilho, um tubo longo e um vaso cheio de água perfumada, que o fumo atravessa antes de chegar à boca”. (AURÉLIO, 2019). Os efeitos do uso de narguilé podem ser bem piores do que os do cigarro comum, já que os usuários acabam inalando mais toxinas pelo tempo de uso. Segundo Stella Regina Martins, médica especialista em Dependência Química (UNIAD/UNIFESP, 2003) com ênfase em Controle do Tabagismo, diz que: A maneira pela qual se fuma com um narguilé é completamente diferente da forma pela qual se fuma um cigarro. Com um narguilé, os fumantes inalam produtos da combustão do carvão utilizado no aquecimento do tabaco, bem como o próprio fumo do tabaco; a fumaça é resfriada e parece ser mais suave e mais fácil de inalar, pois ela passa através da água. A maneira pela qual um indivíduo fuma com um narguilé (frequência de tragadas, profundidade da inalação e duração da sessão de fumo) afeta as concentrações de toxinas absorvidas pelo fumante. (MARTINS, 2014, p. 107). Diante de tão grave ameaça aos jovens, não parece que as autoridades estão precipuamente engajadas em combater os locais que ofertam esses produtos aos menores, deixando os proprietários de lounge e tabacarias tranquilos para continuarem seus comércios da forma que bem entendam. Ao contraponto dessa situação, na capital do estado de Mato Grosso – Cuiabá – foi sancionada a Lei municipal 6.284/2018 para regulamentar especificamente a proibição da utilização do narguilé em locais públicos, ou onde haja concentração de pessoas. Essa norma buscou restringir o uso aos ambientes feitos exclusivamente para essa prática, ou seja, as tabacarias. A lei ainda vai além, quando proíbe a frequência ou permanência de menores de 18 (dezoito) anos nesses estabelecimentos, culminando multa de até R$ 500,00 (quinhentos reais) aos comerciantes infratores, ou aos pais dos menores. Em âmbito nacional, a prática do uso do narguilé também está em discussão no Congresso Nacional. O deputado Capitão Augusto (PR-SP) é autor do Projeto de Lei 9.566/18 que tramita na Câmara dos Deputados, e que em seu texto traz a expressa proibição da comercialização do narguilé aos menores de 18 (dezoito) anos. O Projeto de Lei também 12 prevê a inclusão expressa do produto no rol de substâncias proibidas aos menores constantes na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e Adolescente – ECA). Outro ponto relevante do Projeto de Lei diz respeito à possível aplicação de multa que pode variar entre R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais), bem acima do valor previsto atualmente na lei da capital do estado de Mato Grosso. Contudo, sabe-se que para que essa norma tenha eficiência e eficácia é necessária a total aderência dos pais, amigos e familiares que convivem com os jovens. Outrossim, a população, infelizmente, parece não se importar com o uso dessa substância, guardando todas as suas preocupações para as drogas ilícitas. E ainda assim, aqueles que têm maior preocupação veem o uso desta e de outras drogas como falta de punição e de leis mais severas. Carolina Christoph Grillo, Doutora em Ciências Humanas (Antropologia Cultural) pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013), Frederico Policarpo, Doutor em Antropologia pelo Programa de Pós- Graduação em Antropologia Universidade Federal Fluminense (PPGA/UFF) e Marcos Veríssimo, Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Universidade Federal Fluminense (2013), dizem que: O “problema das drogas” vem complicando-se de tal forma que a opinião pública parece concordar que sua “solução” deva passar pela vigente suspensão dos direitos civis de uma série de indivíduos, fundamentando-se no bem maior almejado, que é o combate às substâncias proibidas. (GRILLO; POLICARPO; VERÍSSIMO, 2011, p. 146). Nota-se que existem diversos problemas relacionados ao uso de drogas que devem ser estudados. O Brasil, no critério de combate ao uso de drogas, ainda precisa evoluir para buscar soluções que tragam eficácia e efetividade na aplicação das políticas públicas. 2.3 PESQUISA SEMIESTRUTURADA: Resultados e Discussão A fim de se conhecer os estudantes usuários e compreender o que os levou ao primeiro contatocom o mundo das drogas, foi feito um levantamento de dados utilizando-se com base em uma pesquisa semiestruturada. Foram elaboradas 09 (nove) questões objetivas que continham até 05 (cinco) alternativas de respostas para cada uma. 13 As perguntas e as possíveis respostas foram cuidadosamente escolhidas pelo pesquisador com a intenção de conhecer a idade, a classe social, a estrutura familiar e o tipo de educação dos jovens estudantes da rede pública de ensino da cidade de Barra do Garças – MT. Antes de ser aplicada a pesquisa, foi feita uma palestra para explicar o conceito de drogas e sua definição legal, bem como as consequências jurídicas e o fundamento e finalidade das perguntas. Com o propósito de obter a máxima sinceridade dos entrevistados, a pesquisa foi desenvolvida em caráter facultativo, utilizando-se do aplicativo Google Doc, por meio do Google Drive, ou seja, aplicada totalmente empregando-se da tecnologia de planilhas da empresa Google, que, além de garantir o anonimato aos respondentes, auxilia o pesquisador preparando de forma automática e virtual os gráficos de pizza. Como resultado da proposta, obteve-se 330 (trezentos e trinta) respostas aos questionamentos propostos. Essas respostas foram separadas em dois grupos, um que seria utilizado e outro que seria dispensado. O critério para pertencer a cada grupo foi etário, de modo que, quem contava à época da pesquisa com 18 (dezoito) anos completos ou mais foram descartados, por estarem fora do objeto de estudos deste trabalho. A primeira pergunta da pesquisa, que possibilitou essa divisão, foi justamente sobre a faixa etária dos respondentes. Com a divisão das respostas que seriam utilizadas e das que seriam descartadas, criou-se um grupo de 274 (83%) respondentes utilizados e 56 (17%) respondentes descartados, conforme gráfico 01 em anexo. Importante ressaltar que todos os estudantes estavam na faixa etária dos 15 (quinze) aos 17 (dezessete) anos, ou seja, todos eram adolescentes prestes a entrar na fase adulta de suas vidas. O segundo questionamento foi a respeito de que tipo de escola os entrevistados faziam parte, pública ou privada. Contudo, as escolas privadas não quiseram participar da pesquisa e rejeitaram a proposta do pesquisador. Com isso, todos os entrevistados (100%) eram de escolas da rede pública estadual de ensino de Barra do Garças – MT, conforme se verifica no gráfico 02 em anexo. O próximo questionamento (gráfico 03, em anexo) dizia respeito à etapa de ensino na qual os jovens estavam inseridos, e praticamente todos 272 (99%) eram alunos do ensino médio, e apenas 02 (1,0%) do ensino fundamental. Outro dado interessante da pesquisa, que pode ser observado na próxima pergunta feita aos estudantes (gráfico 04, em anexo), é que menos da metade dos pesquisados – 125 (46%) – conviviam com família tradicional, ou seja, composta por pai e mãe, o restante – 149 (54%) – conviviam com outras pessoas, ou com família monoparental, isto é, apenas pai ou apenas mãe. 14 A renda dos entrevistados (gráfico 05, em anexo) foi o fator com maior índice de distribuição entre as opções de respostas, sendo que, foi o único questionamento que utilizou todas as cinco (05) alternativas de respostas possíveis para esse quesito. A renda com maior incidência foi a opção “de R$ 2.000,00 (dois mil reais) até menos de R$ 4.000,00 (quatro mil reais”, que obteve 87 (32%) das respostas. Seguida pela opção “de R$ 1.000,00 (mil reais) a menos de R$ 2.000,00 (dois mil reais)”, que obteve 76 (27%) de respostas positivas. A sexta pergunta foi trazida com o intuito de descobrir se a incidência das drogas estaria ou não ligada ao trabalho dos jovens. Com isso, conseguiu-se que 182 (66%) dos jovens entrevistados não trabalham, contra 92 (34%) dos que trabalham (gráfico 06, em anexo). Nota-se que até esse momento a intenção do pesquisador era conhecer o perfil socioeconômico dos jovens e a estrutura de suas famílias. O sétimo item da pesquisa (gráfico 07, em anexo) foi o primeiro a adentrar no tema das drogas, questionando os jovens se alguém no seu núcleo familiar utilizava algum tipo de droga, seja ela lícita ou ilícita. Antes da entrevista foi orientado aos respondentes que deveriam responder com base apenas nos integrantes de sua residência. A resposta, como já esperada, tendeu para a maior parte dos jovens respondendo positivamente a esse questionamento, com 174 (64%) sim, e 100 (36%) não. O próximo questionamento é preocupante (gráfico 08, em anexo). Cuidou-se de saber se os jovens já usaram algum tipo de droga, lícita ou ilícita, e com que idade fizeram esse uso. Do total de 274 entrevistados, apenas 95 (35%) disseram nunca terem utilizado nenhum tipo de droga, ou seja, 179 (65%) dos jovens já haviam experimentado algum tipo de droga, lícita e ilícita. A idade com maior preponderância para o primeiro uso foi dos 12 (doze) aos 15 (quinze) com 88 (32%) das respostas positivas. A segunda idade com maior incidência foi dos 15 (quinze) aos 17 (dezessete) com 76 (28%) de respostas positivas. Finalizando, com 15 (5%) de respostas positivas, a idade antes dos 12 (doze). Esses números revelam que os jovens têm contato muito cedo com o mundo das drogas e esse comportamento pode ser levado para a vida adulta, tornando-os dependentes para o resto da vida. A última pergunta da entrevista (gráfico 09, em anexo) tratou especificamente do uso de narguilé, pois, por sua alta incidência entre os jovens, o pesquisador quis dar enfoque especial a esse quesito. 144 (53%) dos entrevistados declararam nunca ter feito uso do produto, enquanto que 130 (47%) responderam já ter utilizado. Dentre as idades do primeiro uso, a maior convergência de uso – 68 (25%) – ocorreu na faixa etária atual dos adolescentes, dos 15 aos 17. 15 Observa-se, no tocante ao uso de drogas lícitas e de acordo com a percepção do pesquisador, que os adolescentes não sentiam culpa por utilizar os produtos, e nem mesmo achavam o seu comportamento socialmente inadequado, denotando a aceitação social, principalmente do álcool. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS As drogas são um problema que todos os países do mundo enfrentam. Elas podem ser divididas em dois grupos, as lícitas e as ilícitas. As primeiras são aquelas regulamentadas, ou seja, existe autorização do Estado para que as pessoas comercializem, desde que respeitem regras básicas para isso. Já as segundas, são proibidas de serem comercializadas, constituindo ilícito penal para quem descumpra essa norma. Essa proibição, no entanto, não é absoluta e cabem algumas exceções, como por exemplo, em caso de tratamento de doenças degenerativas, com autorização prévia e expressa. No Brasil, foram criadas leis e mecanismos para coibir o uso e o tráfico de qualquer tipo de produto ou substância que cause dependência, física ou psíquica. A preocupação é maior no caso dos menores de 18 anos, considerados vulneráveis pelas leis protecionistas. Nesses casos não há diferenciação para drogas lícitas e ilícitas, sendo todas elas vedadas às crianças e adolescentes. Contudo, não é isso que é observado na prática na cidade de Barra do Garças – MT, onde crianças e adolescentes podem ser vistas fazendo uso de tais substâncias. O índice de uso é maior para as drogas lícitas, álcool e tabaco. Nesses casos as drogas são vendidas sem medo pelos comerciantes do município. Conforme se observa nos resultados da pesquisa semiestruturada o uso de drogas lícitas é algo comum e corriqueiro entre os jovens da cidade de Barra do Garças – MT. A prática tornou-se socialmente aceita e nem mesmo os agentes de segurança pública agem em face dos ilícitos. Ainda de acordo com os resultados da pesquisa os fatores familiares podem ser considerados como um gatilho para a entrada e permanência dos jovens no mundo das drogas, lícitas ou ilícitas. Observa-se que quanto mais bem estruturadafor a família maior será a possibilidade de proteção do jovem. Portanto, as ações sociais e estatais devem estar voltadas à proteção e aos cuidados da família como um todo. Devem-se criar mecanismos para conscientização dos familiares 16 sobre os malefícios do vício. Sendo essa a melhor maneira de se evitar o primeiro uso e o consequente envolvimento dos jovens no mundo das drogas. 4. REFERÊNCIAS BASTOS, Francisco Inácio Pinkusfeld Monteiro et al. III Levantamento Nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira. 2017. BRASIL. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Lei de tóxicos. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em 20 de set. de 2019. BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da criança e do adolescente. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em 21 de set. de 2019. DICIONÁRIO AURÉLIO. Dicio: Dicionário online de português. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/narguile/>. Acesso em 21 de set. de 2019. GRILLO, Carolina Christoph; POLICARPO, Frederico; VERISSIMO, Marcos. A" dura" e o" desenrolo": efeitos práticos da nova lei de drogas no Rio de Janeiro. Revista de Sociologia e Política, v. 19, n. 40, p. 135-148, 2011. MARTINS, Stella Regina et al. Experimentação de e conhecimento sobre narguilé entre estudantes de medicina de uma importante universidade do Brasil. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 40, n. 2, 2014. MARTINS, Mayra Costa; PILLON, Sandra Cristina. A relação entre a iniciação do uso de drogas e o primeiro ato infracional entre os adolescentes em conflito com a lei. Cadernos de Saúde Pública, v. 24, p. 1112-1120, 2008. 5. ANEXOS 17 GRÁFICO 01 GRÁFICO 02 274 83% 56 17% QUANTOS ANOS VOCÊ TEM? ATÉ 12 ANOS INCOMPLETOS 12 A 14 15 A 17 18 OU MAIS 330 100% QUAL O TIPO DE ESCOLA VOCÊ ESTUDA? PÚBLICA PRIVADA 18 GRÁFICO 03 GRÁFICO 04 2 1% 272 99% QUAL O TIPO DE ENSINO? FUNDAMENTAL MÉDIO EJA 125 46% 97 35% 25 9% 27 10% COM QUEM VOCÊ VIVE? OS DOIS PAIS APENAS PAI, OU APENAS MÃE AVÓS OUTROS 19 GRÁFICO 05 GRÁFICO 06 35 13% 76 27% 87 32% 52 19% 24 9% QUAL A RENDA MÉIDA DA SUA FAMÍLIA? TODOS OS INTEGRANTES DA CASA. MENOS DE R$ 1.000,00 DE R$ 1.000,00 A MENOS DE R$ 2.000,00 DE R$ 2.000,00 A MENOS DE R$ 4.000,00 DE R$ 4.000,00 A R$ 8.000,00 ACIMA DE R$ 8.000,00 92 34% 182 66% VOCÊ TRABALHA? SIM NÃO 20 GRÁFICO 07 GRÁFICO 08 174 64% 100 36% NA SUA CASA ALGUÉM UTILIZA DROGAS LÍCITAS OU ILÍCITAS? EX.: ÁLCOOL, TABACO, DROGAS ILÍCITAS. SIM NÃO 15 5% 88 32% 76 28% 95 35% COM QUANTOS ANOS VOCÊ EXPERIMENTOU DROGAS, LÍCITAS OU ILÍCITAS, PELA PRIMEIRA VEZ? EX.: ÁLCOOL, CIGARRO, DROGAS ILÍCITAS. ANTES DOS 12 12 AOS 15 15 AOS 17 18 OU MAIS NUNCA 21 GRÁFICO 09 4 1% 58 21% 68 25% 144 53% COM QUANTOS ANOS VOCÊ USOU NARGUILÉ PELA PRIMEIRA VEZ? ANTES DOS 12 12 AOS 15 15 AOS 17 18 OU MAIS NUNCA USEI
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