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NEGOCIAÇÃO Débora Frizzo 2NEGOCIAÇÃO SUMÁRIO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFTEC Rua Gustavo Ramos Sehbe n.º 107. Caxias do Sul/ RS REITOR Claudino José Meneguzzi Júnior PRÓ-REITORA ACADÊMICA Débora Frizzo PRÓ-REITOR ADMINISTRATIVO Altair Ruzzarin DIRETORA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (NEAD) Lígia Futterleib Desenvolvido pelo Núcleo de Educação a Distância (NEAD) Designer Instrucional Sabrina Maciel Diagramação, Ilustração e Alteração de Imagem Igor Zattera, Sabrina Maciel Revisora Ana Clara Garcia TIPOS DE CONFLITOS E VARIÁVEIS INDIVIDUAIS E AMBIENTAIS DOS CONFLITOS 3 Visões e Tipos de Conflitos 5 Características Comportamentais de pessoas potencializadoras de conflitos 9 A GESTÃO DE CONFLITOS E O PERFIL DO BOM GESTOR DE CONFLITOS 11 Características Comportamentais do Bom Negociador 13 ESTRATÉGIAS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS 21 Exercício de Síntese das Ideias 27 Referências Bibliográficas 29 3NEGOCIAÇÃO “O CONFLITO NÃO É ENTRE O BEM E O MAL, MAS ENTRE O CONHECIMENTO E A IGNORÂNCIA”. BUDA Para começar nossos estudos, antes mesmo da introdução, va- mos ler uma historinha para “entrarmos” em sintonia com o espírito da nossa disciplina de Negociação! Um dia, um pensador indiano fez a seguinte pergunta a seus discí- pulos: “Por que as pessoas gritam quando estão aborrecidas?” “Gritamos porque perdemos a calma” disse um deles. “Mas, por que gritar quando a outra pessoa está ao seu lado?” Questionou novamente o pensador. “Bem, gritamos porque desejamos que a outra pessoa nos ouça”, retrucou outro discípulo. E o mestre volta a perguntar: “Então não é possível falar-lhe em voz baixa? ” Várias outras respostas surgiram, mas nenhuma convenceu o pen- sador. 4NEGOCIAÇÃO Então ele esclareceu: “Vocês sabem porque se grita com uma pessoa quando se está aborre- cido? O fato é que, quando duas pessoas estão aborrecidas, seus corações se afastam muito. Para cobrir esta distância precisam gritar para poderem escutar-se mutuamente. Quanto mais aborrecidas estiverem, mais forte terão que gritar para ouvir um ao outro, através da grande distância. Por outro lado, o que sucede quando duas pessoas estão enamoradas? Elas não gritam. Falam suavemente. E por quê? Porque seus corações estão muito perto. A distância entre elas é pequena. Às vezes estão tão próximos seus corações, que nem falam, somente sussurram. É isso que acontece quando duas pessoas que se amam estão próximas. ” Por fim, o pensador conclui, dizendo: “Quando vocês discutirem, não deixem que seus corações se afastem, não digam palavras que os distanciem mais, pois chegará um dia em que a distância será tanta que não mais encontrarão o caminho de volta”. 5NEGOCIAÇÃO INTRODUÇÃO Bem vindos alunos, ao nosso Ebook de Negociação. Aqui você encontrará subsídios para compreender e gerir uma das mais frequentes questões que se impõe a gestores e profissionais de todas as áreas: a gestão de conflitos. Para isso, precisará compreender e aprender a identificar os fatores (quase sempre muito complexos e sutis) que interferem no surgimento e desdobramentos dos conflitos, bem como a manejar os mesmos, de forma que possam funcionar como um elemento de aprendizagem e desenvolvimento organizacional. A nossa disciplina chama-se Negociação, pois o foco sempre será os conflitos no contexto dos ambientes de trabalho nas diferentes áreas dos nossos cursos. Um gestor de Recursos Humanos indubitavelmente precisa aprender a negociar, visto que, lida diariamente com pessoas e seus conflitos; um gestor que atua na área de comércio exterior e logística também precisa aprender a negociar, uma vez que, também será um gestor de equipes e, além disso, se envolverá em negociações comerciais e organizacionais, como é o caso de um administrador, o qual lida com conf litos em grande parte de seu tempo, cotidianamente. E, até mesmo engenheiros de produção, dedicados à organização de processos, certamente se depararão com conflitos em suas equipes o tempo todo. Entretanto, é importante salientar que tudo o que for apresentado aqui o ajudará, também, na gestão de conflitos em todas as esferas de sua vida, pois como veremos mais adiante, os conflitos são componentes inevitáveis da vida e das inte- rações humanas. Dessa forma, a vida do ser humano, considerado um ser social, é marcada pela inevitabilidade das interações sociais de todos os tipos, e, nesse sentido, negociar não é uma escolha. Para Leitão, Fortunato e Freitas (2006), uma questão primordial é que 6NEGOCIAÇÃO os seres humanos se tornam humanos a partir do convívio com os outros humanos, a partir das interações ocorridas em seu processo de socialização, ou seja, o indivíduo surge e se desenvolve a partir de relacionamentos. Neste contexto, os autores relatam que a importância dada às relações parte do pressuposto de que as necessidades e interesses das organizações são as necessidades e interesses dos indivíduos de forma coletiva. E dentre as várias relações que se estabelecem como formas de socialização, uma das mais importantes na vida do ser humano moderno, é a relação de trabalho, em todas as suas formas. Consequentemente, no contexto das relações de trabalho, os conflitos podem ser fonte de aprendizado e satisfação, ou fonte de sofrimento e improdutividade. Portanto, gerir conf litos não é uma opção. É, antes sim, uma estratégia de sobrevivência e de desenvolvimento profissional e social. Hoje, é até mais do que isso, é um diferencial competitivo para a construção e manutenção de uma carreira bem-sucedida e de uma vida harmônica na esfera privada. Desse modo, espera-se que você se dedique ao entendimento do que vem a ser conflitos e sobre as melhores formas para lidar com os mesmos. Além disso, espera-se que ao longo da disciplina você, além de aprender intelectualmente, engaje-se numa ref lexão sobre si mesmo, sobre seus conflitos (tanto na esfera profissional como na privada) e sobre as diferentes maneiras que tem usado para fazer a gestão dos mesmos. Aproveite a oportunidade para se desenvolver como um revolvedor de conflitos. Há duas frases, cuja autoria é desconhecida, mas que são muito pertinentes para usarmos como bússola ao estudarmos conflitos. Use-as como lema de vida: Eu preciso ser a solução, e não o problema! Seja o inteligente da situação! 7NEGOCIAÇÃO TIPOS DE CONFLITOS E VARIÁVEIS INDIVIDUAIS E AMBIENTAIS DOS CONFLITOS Neste capítulo, vamos estudar as diferentes formas de classificar os conflitos e compreender as variáveis que interferem nos mesmos, no seu surgimento, na sua manutenção e no seu desfecho. Existe uma ampla literatura sobre os diferentes tipos de conflitos que existem nos diferentes ambientes de trabalho. A palavra conflito vem do latim conflictus, que significa choque entre duas coisas, embate de pessoas, ou grupos opostos que lutam entre si, ou seja, conflito é alguma espécie de embate 8NEGOCIAÇÃO entre duas forças contrárias, sendo que ambas visam sua vitória sobre a outra. Uma questão fundamental que deve ser compreendida aqui no começo do nos- so estudo é a visão que nós, indivíduos, temos dos conflitos. Geralmente, quando escutamos a palavra conflito, temos uma reação inicial negativa e de rejeição, pois ela sempre está associada às coisas e even- tos negativos, aos problemas, às crises, às dificuldades, entre outros. Conf lito sempre nos remete a algo ruim, que nos exigirá esforço e nos trará problemas. Pois bem, o primeiro passo da nossa aprendi- zagem deve ser “desmontar” essa ideia, deixar de lado essa postura preconceituosa, que nos impedirá de nos tornarmos bons negociadores. Precisamos substituir, em nossos modelos mentais, a ideia negativa do conflito, por uma ideia mais adequada: o conflito, por si só, não é bom nem ruim, não é negativo, nem positivo. Ele será bom ou ruim, negativo ou positivo, dependendo da maneira pela qual as pessoas lidarão com ele, dependendo da sua gestão. Para avaliar um conf lito, precisamos “olhar” para elede maneira contextualizada, com- preendendo seus desdobramentos e a ma- neira pela qual ele foi gerido. Historicamente, as pessoas sempre tentaram evitar os conflitos, evitar o seu surgimento e, quando diante de um con- flito, agir rápida e precipitadamente para abafá-lo. Isso porque sempre se entendeu que o conflito é como um sinal de que algo está indo mal, que algo de ruim irá acon- tecer e, portanto, os conflitos precisam ser eliminados. Ainda hoje, escutamos gesto- res e profissionais que falam, orgulhosos: “na minha empresa, ou no meu setor, ou na minha equipe, não existem conflitos”! Esperamos que até o final desta leitura você entenda os equívocos que estão em- butidos numa frase assim! Atualmente, numa postura mais interacionista e adequada a contempora- neidade, a partir das teorias comportamen- tais, compreende-se que os conflitos são inevitáveis. Onde há pessoas há conflitos, porque os indivíduos divergem em seus pontos de vista, em seus comportamentos, em seus modelos mentais, em sua perso- nalidade, enfim, em tudo. O conf lito é decorrente da variabilidade humana. Em uma organização, em um setor, em um grupo, a completa ausência de conf litos é uma utopia. Uma utopia por sinal inde- sejável, pois se não há conflitos, não há mudanças, não há aprendizagem, não há engajamento. As pessoas já estão mortas e estão ali somente de corpo presente. Matos (2014) salienta essa nova postura diante dos conflitos, visto agora como fonte de crescimento e inovação nas organizações, refere que: analisar e administrar conflitos, é justamente uma das principais tarefas dos gestores atuais. Como cita Lederach, (2012, p.31), “o conflito pode ser enten- dido como o motor da mudança, como aquilo que mantém os relacionamentos e as estruturas sociais honestas, vivas e dinamicamente sensíveis às necessidades, aspirações e ao crescimento do ser huma- no”. Nesse sentido, a questão estraté- gica e fundamental não será a presença ou ausência de conflitos, mas sim o seu manejo adequado, de modo que o próprio conflito possa se tornar uma ferramenta de gestão. Moscovici (2009), ressalta também 9NEGOCIAÇÃO que o conflito tem muitas funções positi- vas, prevenindo a estagnação decorrente do equilíbrio constante da concordância, estimulando o interesse e a curiosidade pelo desafio da oposição, descobrindo os problemas e demandando sua resolução. O conflito funciona, como uma raiz de mu- danças pessoais, grupais e sociais, também sendo uma oportunidade de desenvolvi- mento pessoal e organizacional. Convencidos de que estamos sobre os benefícios que os conf litos e sua boa gestão podem trazer para a vida das pes- soas e das organizações, vamos falar um pouco sobre os diferentes tipos e visões de conf litos que existem. É importante conhecer os diferentes tipos para que as in- tervenções com os mesmos sejam eficazes. Visões e Tipos de Conflitos Aqui em nosso material, vamos utilizar dois termos para nos referirmos aos conflitos: funcionais e disfuncionais. Iremos chamar de conf litos funcionais aqueles que acontecem nos ambientes de trabalho e que, devido a uma boa gestão dos mesmos, engendram mudanças po- sitivas e produtivas em tarefas, processos ou relacionamentos interpessoais. São os conflitos que tem como consequência al- guma forma de melhoria ou aprendizado. Normalmente, são os conflitos ligados a algum tipo de discordância em tarefas e processos. Já, os conf litos disfuncionais são aqueles que surgem e que desde o seu surgimento, não acarretam a promoção de melhorias ou aprendizado. Mesmo quando são geridos de forma adequada, provocam perda de tempo, drenam a ener- gia dos envolvidos, desgastam as relações interpessoais e não agregam nada de novo aos envolvidos. Geralmente são conflitos ligados a questões pessoais, e não a discor- dâncias em tarefas e processos. São aqueles conflitos ligados a antipatias individuais, dificuldades individuais de relacionamen- to, o famoso “não vou com a cara dele!”. Quando pensamos na gestão dos confli- tos disfuncionais, torna-se fundamental identificar se ele é desse tipo desde o seu começo, para que possa ser gerido da ma- neira mais rápida e ágil possível, de modo que não acarrete muitos danos aos envol- vidos e ao ambiente. Diríamos até que, é um dos “segredos” de gestão, até mesmo identificar quando o conflito disfuncional merece atenção ou manejo, ou quando a negligência em relação a ele será a melhor estratégia (vou fazer de conta que nem estou percebendo que isso está acontecendo, porque não merece nosso esforço e atenção!). Então, sintetizando: Conflitos Funcionais Conflitos até desejáveis, saudáveis, que promovem mudanças, melhorias e aprendizados em tarefas, pessoas e re- lacionamentos. Não devem ser evitados, mas sim manejados adequadamente. Po- deríamos ser mais ousados e dizer que estes conflitos são desejáveis, que devem ser, conforme o momento pelo qual a or- ganização ou grupo passa, até estimula- dos, pois revigoram a realidade e trazem novas soluções para a realidade. As tão famosas organizações que aprendem ou dentro das modernas teorias de gestão, os conflitos funcionais devem ser vistos como momentos de crises que aceleram o 10NEGOCIAÇÃO desenvolvimento organizacional. Conflitos Disfuncionais Conflitos ligados a dificuldades de relacionamento interpessoal dos envolvi- dos, ligados a antipatias e emoções das pessoas. Não agregam valor nenhum aos envolvidos, somente geram perda de tem- po, foco e energia. Outro ponto importante a ser salientado é que conflitos disfuncio- nais podem ser causados quando estamos lidando com pessoas de diferentes culturas, de diferentes contextos socioeconômico e cultural. As diferenças culturais, étnicas, religiosas e sociais acarretam diferentes percepções de mundo e diferentes conjun- tos de valores que pautam as condutas. Por exemplo, um profissional brasileiro pode se conflitar com outro profissional de ori- gem asiática, em função do seu conjunto de valores, dos seus hábitos, e dos seus comportamentos, que poderão influenciar em alguma transação comercial. Em outro exemplo, um profissional pode entrar em conflito com um colega de trabalho porque ele respeita determinado dia da semana, no qual não pode trabalhar, em função de sua crença religiosa. Se esses dois exemplos acontecerem, estaremos diante de conflitos disfuncionais. Por quê? As pessoas irão modificar seus hábitos e crenças em função do conflito? Claro que não! Então, o con- f lito só irá desgastar a relação e qualquer negociação será impossível. Dessa maneira, dizemos que o con- f lito é disfuncional e deve ser evitado ou “abafado”. Falando sobre a diferença entre con- f litos funcionais e disfuncionais, já men- cionamos outra classificação dos conflitos, que segue abaixo: Conflitos de Relacionamentos São os confrontos que surgem quan- do as pessoas têm, entre si, dificuldades de relacionamento interpessoal, causadas por inúmeros fatores ligados as suas difi- culdades; limitações comportamentais e emocionais. Quase sempre são conflitos disfuncionais, que não geram mudanças 11NEGOCIAÇÃO positivas para os envolvidos. Um exemplo típico desse tipo de conflito está na frase: “meu santo não bateu com o dela!” Segundo Moscovici (2009) este tipo de conf lito drena a energia das pessoas envolvidas, afeta seu bem-estar físico e psicológico, podendo até mesmo causar danos no seu funcionamento psicológico e profissional. Ele desgasta, corrói as relações e ameaça a convivência pacífica futura dos envolvidos. São motivados por antipatias, desafetos, preconceitos, discriminações e intolerância diante das inúmeras diferenças que existem entre os seres humanos. Outa classificação que pode nos aju- dar a compreender os conflitos é a seguinte (Carvalhal e outros, 2006): Conflito Intrapsíquico ou Intraindividual Nossa personalidade é praticamente um ringue de uma luta constante. As três partes quea compõe, id, ego e superego, estão constantemente em conflito, lutando por interesse antagônicos, com vontades opostas (Schultz & Schultz, 2002). Por- tanto, o ser humano é um ser que carrega dentro de si, o tempo todo, um conflito inconsciente entre suas vontades, entre diferentes caminhos a seguir. Esse conflito individual, de todos, poderia ser conside- rado a origem primeira da existência dos demais conflitos. Se as pessoas carregam dentro de si um conflito, cuja resolução resulta na sua singularidade, como seria possível a convivência entre duas ou mais pessoas sem que surgissem conflitos? Conflito Interindividual São todos os conflitos que aconte- cem externamente, podendo ser entre as pessoas e entre grupos diferentes. Também podem ser entre diferentes organizações (como por exemplo, uma matriz e suas filiais). São causados pela existência de di- ferentes e opostos objetivos, ideias, valores, métodos de trabalho, crenças, sentimen- tos, propósitos, perspectivas, entre outros. Podendo ser funcionais ou disfuncionais. Um autor clássico da gestão, Chia- venato (2009), quando fala sobre conflitos, diz que existem três condições que podem desencadear os conflitos dentro das orga- nizações, sejam elas quais forem. • Diferenciação de atividades ou maior especialização: com o cres- cimento e sofisticação das organi- zações são criados, dentro delas, grupos diversos e específicos, es- pecialistas em determinadas áreas ou tarefas. Com essa maior especi- ficação, os grupos passam a perceber as mesmas questões de diferentes perspectivas, desenvolvendo lingua- gens e objetivos próprios e são esses objetivos e perspectivas que, ao se diferenciarem uns dos outros, ten- dem a desencadear conflitos. • Recursos Compartilhados: como normalmente os recursos, de todos os tipos (humanos, materiais, fi- nanceiros, espaço físico), disponíveis nas organizações, são escassos ou limitados e são divididos entres os diferentes setores ou áreas, também, quando uma área ou setor utiliza, ou é percebido como utilizando mais 12NEGOCIAÇÃO desses recursos, há a tendência de surgirem desavenças e conflitos de rivalidade e competição ente os gru- pos. Isso explica aquilo que o senso comum costuma falar sabiamente: “quando acaba o dinheiro, começam as brigas! ” Importante destacar aqui, as situações nas quais as pessoas não estão com os chamados fatores hi- giênicos (Robbins, 2006) atenden- do suas necessidades, quando estão insatisfeitos com os recursos físicos e materiais disponíveis para e exe- cução de suas tarefas. São exemplos dessas situações aqueles ambien- tes nos quais as pessoas trabalham em espaços muito pequenos, nos quais precisam dividir recursos e materiais (canetas, computadores, impressoras, mesas, gavetas, etc). Essas situações podem potenciali- zar conflitos, causando estresse nos envolvidos. Outro exemplo típico, que pode potencializar conf litos, são aquelas situações nas quais os líderes disponibilizam seu tempo e atenção de maneira muito desigual para suas equipes, sendo percebido como favorecedor de uma delas em detrimento das demais. • Atividades interdependentes: no interior das organizações todos os indivíduos ou grupos, em maior ou menor grau, dependem uns dos ou- tros. Na medida em que um setor ou indivíduo não pode dar continui- dade em suas atividades, sem que o outro tenha realizado a sua parte, podem surgir conflitos pela falta de harmonia nos ritmos, propósitos ou prioridades. Quando uns se sentem prejudicados pelos outros, mesmo que não haja a intenção consciente de causar prejuízo aos demais, os embates podem surgir rapidamente. Outra variável, importantíssima no surgimento de conf litos é a questão da comunicação (Matos, 2014). Seja a ina- bilidade de comunicação entre os indiví- duos que são colegas de trabalho, seja a presença de ruídos de comunicação entre os diferentes setores, e entre as diferentes posições hierárquicas da organização, seja a falta ou precária comunicação entre as 13NEGOCIAÇÃO lideranças e seus líderes, dificuldades na transmissão de mensagens são um “barril de pólvora”, pronto a explodir e se trans- formar em conflitos ameaçadores para a produtividade individual e organizacional. Problemas na comunicação interna são potecializadores de situações conflitivas. Esses problemas, quando não solucionados pelos gestores, são resolvidos de maneira informal pelos membros da organização, de forma improvisada e desorganizada, o que, por sua vez, acaba acarretando em mais conflitos. Essas situações acima, precisam ser conhecidas, pois, uma vez presentes nos ambientes organizacionais, devem ser diagnosticadas para que intervenções de gestão de conflitos possam ser eficazes, com a devida agilidade e rapidez. Características Comportamentais de pessoas potencializadoras de conflitos Existem pessoas que são verdadeiros criadores e propagadores de conflitos. Pos- suem, em sua vida profissional, trajetórias marcadas pelo envolvimento constante em conflitos de todos os tipos, funcionais e disfuncionais. Pessoas assim, dificilmente serão bons negociadores e, além disso, são pessoas que potencializam, agravando, ou ampliando os conf litos interpessoais e intergrupais. Geralmente possuem duas características, que são complementares: Autocracia: as pessoas que são dog- máticas, cheias de verdades absolutas pelas quais pautam sua conduta e que, em con- sequência disso, são autoritárias em seus comportamentos, tendem a gerar muitos conflitos, na maior parte das vezes, dis- funcionais. Isso ocorre porque são intole- rantes, pouco amistosas para com as ideias alheias, são carregadas de preconceitos e estereótipos e agem de modo que todos tenham para com ela uma atitude servil de obediência e não contestação. Qualquer discórdia com uma pessoa assim tende a se ampliar e gerar conflitos. Baixa autoconfiança e autoestima: pessoas com crenças internas de incapa- cidade de obter êxitos e sucessos e que carregam no seu interior sentimentos de baixo valor e amor próprio tendem a cau- sar e potencializar conflitos. Isso, porque qualquer discordância ou posição diferen- te da sua é percebida como afronta a si mesmo, uma dúvida quanto ao seu valor e capacidade. A variabilidade e infinita possibilidade de perspectivas diferentes, que podem gerar os conflitos nos diversos ambientes, são percebidas pelas pessoas assim como uma ofensa a si mesmo. Veremos mais adiante, que uma das estratégias de resolução dos conflitos mais eficaz é a negociação. A pessoa com baixa autoestima é incapaz de negociar. Negociar pressupõe considerar os pontos de vista e os argumentos do oponente tão válidos como os próprios. A pessoa com baixa autoesti- ma é incapaz disso, porque ela considera o ponto de vista do outro não como uma coisa válida, mas sim, como uma afronta aos seus pontos de vida. O fato de ela ser insegura, frágil e pouco convencida acer- ca do seu valor (o que é resultado de sua autoestima baixa) faz com que se sinta ultrajada e ofendida com as ideias dos ou- tros, percebidas como afrontas ou ofensas, 14NEGOCIAÇÃO mesmo que esta não seja a intenção do seu oponente. Portanto, quanto mais baixa a autoestima de uma pessoa, menos ela es- tará apta para considerar pontos de vista diferentes dos seus. Essas duas características, isolada- mente ou em conjunto, estão presentes em pessoas que são “viciadas” em conflitos, em várias esferas da vida (profissional, pessoal, afetiva). Talvez por terem desenvolvido uma postura muito competitiva para lidar com a vida, é como se elas estivessem cons- tantemente numa gincana ou num ringue, precisando testar suas capacidades e provar sua superioridade e valor. Relativizar as coisas ou “perder” a vitória sobre os outros é uma ameaça inaceitável para este tipo de pessoa. A vida é um campeonato que sempre precisa ser ganho, a qualquer custo! Agora, antes de seguirmos adian- te,pare e pense! Faça uma autorref le- xão sobre si mesmo e sobre a maneira de como reage e lida com as diferentes perspectivas que as pessoas têm das coi- sas e como que diferem das suas. Analise se você se “encaixa”, em alguma medida, nas características anteriores. Para você, a vida é uma eterna brincadeira de “cabo de guerra”! Essa reflexão é fundamental para seu aprendizado sobre negociação de conf litos. Bons pensamentos! 15NEGOCIAÇÃO A GESTÃO DE CONFLITOS E O PERFIL DO BOM GESTOR DE CONFLITOS Neste capítulo, estudaremos as formas mais adequadas de gerir os diferentes tipos de conflitos e as características imprescindíveis a serem desenvolvidas pelos profissionais que querem aprender a manejar os conflitos. Quando falamos em gestão de conf litos, temos duas abordagens complementares: podemos enfatizar as técnicas ou ferramentas de negociação ou podemos enfatizar os ne- gociadores. Sem dúvida alguma, a segunda abordagem é a mais profunda e mais eficaz. De nada adiantam técnicas de 16NEGOCIAÇÃO negociação se elas forem mal aplicadas ou distorcidas pela inabilidade de quem as está utilizando. Por isso, neste segundo capítulo, iremos enfatizar com maior re- levância os aspectos individuais envolvidos nos conflitos, ou seja, a pessoa envolvida no conflito e na sua negociação. De quem é a responsabilidade de gerir os conflitos: de acordo com Mosco- vici (2009), a responsabilidade maior pela gestão dos conflitos é sempre do líder, pois ele, em tese, seria a pessoa melhor prepa- rada para tal tarefa e quem tem efetiva- mente essa responsabilidade. Como apon- tam HARGREAVES & FINK (2007), os líderes sustentáveis tem a preocupação de promover o aprendizado constante em suas equipes e, considerando, como ex- posto no capítulo anterior, que o conflito pode ser essencialmente uma situação de aprendizagem, os líderes não podem deixar de aproveitar os conflitos para gerá-los da forma mais produtiva possível. Equipes nas quais os líderes não conseguem gerir conflitos ou que, simplesmente, por suas inabilidades, não os gerem, encontrare- mos trabalhadores infelizes, estressados e desgastados. Os conf litos, sejam eles funcionais ou disfuncionais, vão ganhando força, tamanho, consumindo o tempo e a energia dos envolvidos, tornando-se um verdadeiro obstáculo para a produtividade das pessoas. No entanto, podemos dizer que to- das as pessoas que trabalham em determi- nada organização, têm a responsabilidade de saber gerir os conflitos nos quais estão envolvidas, compreendendo seus motivos e procurando formas produtivas de resol- vê-los. Uma vez que, já entendemos um pouco acerca dos conf litos, percebemos que a sua melhor gestão exige dos profis- sionais envolvidos e das pessoas que estão “em lida” com ele, uma série de caracte- rísticas pessoais, de modo que os conflitos possam se tornar realmente funcionais. Ou seja, promover a evolução, o apren- dizado e o desenvolvimento individual e organizacional. Poderíamos dizer que quem deseja lidar de maneira adequada com os conflitos que surgem ao seu redor, e que deseja também não ser uma pessoa geradora ou potencializadora de conflitos, precisa, necessariamente, desenvolver sua inteligência emocional (Salovey, 2007). O desenvolvimento da inteligência emo- cional torna a pessoa apta a lidar com as particularidades individuais, com as ad- versidades e com as demandas da vida de uma forma amistosa e empática, de modo que os conflitos sejam pouco estimulados ou bem geridos. A inteligência emocional é com- posta de 05 componentes, ou habilidades. São elas: 1. Autoconsciência: habilidade de reconhecer e entender seu tempe- ramento, suas emoções e iniciati- vas, assim como seus efeitos nos outros. A marca dessa habilidade é a apresentação de um senso de autoconfiança, uma autoavaliação realista e senso de humor para com os próprios defeitos. 2. Autodisciplina: habilidade de con- trolar ou redirecionar impulsos e temperamentos desordenados. É 17NEGOCIAÇÃO uma propensão a protelar julgamen- tos e pensar antes de agir. A pes- soa que consegue fazer isso desperta confiança e integridade e está apta a lidar com as incertezas. 3. Motivação: é uma paixão pelo tra- balho por razões que vão além do dinheiro ou poder ou posição. É uma propensão a perseguir metas com energia e persistência. 4. Empatia: é a capacidade de entender o modo de ser emocional das outras pessoas. A pessoa com esta habili- dade tem facilidade em construir e manter relacionamentos e conse- gue se sensibilizar com as questões alheias. Essa é a habilidade mais facilmente reconhecida, todos sen- tem quando estão diante de uma pessoa empática. 5. Habilidade Social: é a capacida- de de gerenciar relacionamentos e desenvolver uma ampla e significa- tiva rede de relações interpessoais. A pessoa com essa habilidade tem um amplo repertório de condutas e sabe utilizá-las com f lexibilida- de, de acordo com as demandas de seu ambiente social. É fundamental para o profissional que vai lidar com pessoas e gerenciar equipes. Na ver- dade, essa habilidade é a culminação de todas as outras habilidades da inteligência emocional. Para aprender a gerir conf litos, o profissional deve desenvolver, em sequên- cia, essas 05 habilidades. Ele poderá fazer isso sozinho, lendo, estudando sobre o tema, procurando conversar com seu líder sobre isso, pedindo feedback ao seu líder e seus liderados, sobre seu modo habitual de manejar conflitos, ou ainda se envolvendo em um processo de coaching. Além disso, vale elencar um rol de características que precisam estar presentes em quem quer ser um bom negociador. Salientando que estas características são consequência do desenvolvimento das cin- co habilidades da inteligência emocional. E que essas características estão presentes, tanto no bom negociador, quanto nas pes- soas que agem no ambiente de trabalho de forma a não criar ou estimular conflitos desnecessários. Características Comportamentais do Bom Negociador Visão sistêmica: o bom negociador precisa desenvolver uma visão sistêmica, global das circunstâncias nas quais está envolvido. Não deve concentrar sua aten- ção somente em um aspecto da situação ou problema, mas sim em todo o contexto, nos antecedentes e nas consequências do conflito. Com isso, ele conseguirá captar mais informações da realidade e avaliar de maneira menos precipitada e reducionista a melhor ação para lidar com o conflito. Isso evita, por exemplo, resolver um con- flito sem entender que, em determinados momentos, determinadas soluções, no fu- turo, podem criar ou potencializar novos conflitos. Boa capacidade de escuta: é funda- mental saber escutar de forma empática, de 18NEGOCIAÇÃO modo que se possa compreender realmente as mensagens de todos os envolvidos nos conf litos e, com isso, conhecer bem as vaiáveis que estão em ação, de modo a escolher a forma mais adequada de gerir o conflito. É muito comum ouvirmos, nas organizações, a frase pejorativa: “ele não escuta ninguém, ele não consegue escutar!” Pessoas assim, não conseguem resolver os conflitos, porque não conseguem levar em conta os interesses dos outros, assim, não conseguem negociar. Linguagem verbal adequada: a utilização de uma linguagem verbal cla- ra, objetiva, adequada às características do interlocutor, são fundamentais para a negociação. O uso de palavras, jargões ou termos profissionais que, por questões culturais, sociais, culturais ou econômicas, não são compreensíveis ao interlocutor, comprometem a negociação. É preciso identificar o próprio estilo comunicacio- nal, que pode ser agressivo, passivo, ma- nipulador ou assertivo (Matos 2014). O estilo agressivo é marcado pelo tom de voz alto, interrompe os outros, faz gestos brus- cos, e sua fala é percebida como um ataque aos outros. Essa pessoa costuma gritar, não só com sua voz, mas com todo seu corpo. O estilo passivo é nervoso e inquieto,e evita a comunicação, fugindo inclusive do contato visual. O estilo manipulador é dissimulado e mostra que não tem relação nenhuma com o conflito, sendo vítima das outras pessoas. Parece ser um verdadeiro ator e não desperta confiança nos seus interlocutores. Já, o assertivo, que é o es- tilo desejável de um bom negociador, tem sempre uma opinião própria e a defende de forma clara e convicta, respeitando a opinião dos outros. Não deixando dúvidas quanto as suas posições, o que leva a evitar mal-entendidos, expectativas frustradas e equívocos na negociação. Esse estilo de comunicação assertivo gera confiança no interlocutor e é o ideal para ser usado nos momentos de negociação. Portanto, a assertividade é uma habilidade que pode e deve ser desenvolvida por quem quer negociar de maneira produtiva. Aqui, precisamos nos deter um pouco mais sobre a assertividade, uma habilidade social de comunicação verbal fundamental para o bom negociador. Va- 19NEGOCIAÇÃO mos a um exemplo: digamos que você está no intervalo de almoço do trabalho, que dura 1 hora. E, após almoçar, você lembrou que precisa passar no supermercado para comprar um produto que necessita muito usar à noite e que não terá tempo de ir ao supermercado entre sair do trabalho e en- trar na faculdade a tempo de não se atrasar. Olha no relógio e pensa que, se for ágil e rápido, conseguirá passar no supermercado rapidamente agora, antes de retornar para o expediente do turno da tarde. Então, vai ao supermercado, pega o produto e se dirige rapidamente ao caixa. Chegando lá, na fila do caixa, atrás de você, uma senhora idosa, com ótima e saudável aparência, que também tem poucos produtos na sua cestinha lhe toca as costas e lhe pede o seu lugar na fila, porque afinal, ali não há caixas preferenciais para idosos e ela entende que você deveria ceder seu lugar. Se você fizer isso, chegará atrasado no trabalho. Diante dessa situação você tem três alternativas de atuação, uma agressiva, uma passiva e outra assertiva. Se você tem uma atitude e lingua- gem passiva, você concede seu lugar na fila para a senhora, chega atrasado no trabalho e fica o tempo todo, desde o supermercado até o final do expediente se sentindo mal, injustiçado e sente até mesmo uma certa raiva da senhora. O passivo não age, não fala na hora em que as coisas acontecem, mas guarda rancores que podem afetar sua saúde. Se você tem uma atitude agressiva, olha com olhar furioso para a idosa, se sente ultrajado com o pedido e lhe nega, acrescentando a negação insultos e até mesmo usa voz alta, totalmente desne- cessária para a ocasião. Conforme o grau do estilo agressivo, acaba tendo uma al- teração emocional, totalmente despro- porcional para a ocasião e sua relevância. Essa é a “pessoa quente”, que veremos a seguir. Com essa reação acalorada ainda pode sofrer consequências negativas, com o envolvimento de terceiros na situação, potencializando o conf lito, que na ver- dade era só uma situação de conflitos de interesses. Agora, se você é assertivo, que é a postura mais desejável, você calmamente explica para a senhora que até gostaria de lhe ceder o lugar, mas que isso lhe acarre- tará um prejuízo no trabalho, explica toda sua situação em relação ao horário, explica que só tem um produto e que fará o mais rápido possível para que logo chegue a vez dela. Sendo assertivo, você expõe com calma e confiança seu ponto de vista e sua situação claramente, de forma sincera, sem ferir os interesses ou sentimentos do outro. Se sua habilidade verbal assertiva for acompanhada de uma comunicação não verbal amistosa, com um sorriso e olhos nos olhos, por exemplo, até conseguirá conquistar a simpatia da senhora. Enfim, todos deveríamos ser as- sertivos, não importando as habilidades e estilos do nosso interlocutor. Muitos conflitos disfuncionais seriam evitados e muitos sentimentos negativos que corro- em a vontade e a motivação das pessoas deixariam de surgir se treinássemos mais nossa assertividade. Linguagem não verbal amistosa: através da linguagem não verbal – posição do corpo, tom e volume de voz, expressão 20NEGOCIAÇÃO facial, direcionamento do olhar, movimen- tos de braços, pernas, mãos e cabeça – po- demos reforçar ou contradizer aquilo que expressamos pela linguagem verbal. Ela é parte fundamental do nosso estilo comuni- cacional. Portanto, se quisermos negociar, nosso corpo também precisa comunicar esta intenção, com uma postura, gestos, olhar e voz receptivos e amistosos. Olhos nos olhos, uma face serena ou levemente sorridente, e movimentos de aproximação com braços e mãos dizem que a negociação é nosso objetivo e que não precisamos ser percebidos pelo nosso interlocutor como alguém ameaçador ou inimigo. Autoconfiança: para negociar, para compreender os conflitos como oportu- nidades de melhoria, para não se sentir explorado ou contrariado por uma ne- gociação, as pessoas precisam estar com sua autoconfiança em níveis adequados. Com baixa autoconfiança, a tendência é a pessoa se sentir explorada, subjugada e humilhada em uma negociação, mesmo que não haja nenhum elemento concreto real, indicando isso. Essas sensações e per- cepções são típicas de pessoas com baixa autoconfiança, cujas crenças acerca de si mesmo giram em torno de sentimentos de inferioridade e incapacidade. É como se negociar fosse a confirmação externa e concreta de uma crença interna de incapa- cidade de obter êxitos e sucessos. Desse modo, cuidar de si mesmo, torna-se uma tarefa fundamental do bom negociador, de modo que percepções negativas de si mesmo não prejudiquem, de forma in- consciente, suas negociações. Como cuidar de si mesmo: aprenda a se auto observar, procure ajuda de um psicólogo, de um coaching, de um mentor, converse com seus líderes, solicitando feedback sobre seu desempenho e comportamento, leia, estude, relacione-se. Katz (1955), em seu trabalho clássi- co sobre as habilidades humanas, traz um conjunto de habilidades humanas funda- mentais, técnicas humanas e conceituais, que vão ser muito importantes para cons- truirmos o perfil do negociador efetivo. No conjunto de habilidades técnicas do bom negociador vamos ter: racionalida- de, objetividade, foco e investigação. Essas habilidades significam a capacidade de não deixar que a negociação seja levada pelo oponente para aspectos pessoais. Além disso, significa a capacidade de centrar, o tempo todo, a discussão em aspectos centrais e relevantes para a negociação, não se deixando distrair por temas para- lelos e irrelevantes para o debate em pauta. Outro aspecto que pode distrair o bom negociador é tratar de exemplos isolados, de temas, de episódios ou acontecimentos muito particulares, que não servem como exemplo e não permitem generalizações. Também, precisa saber desenvolver a habi- lidade técnica de utilizar métodos, táticas e ferramentas de negociação. No conjunto de habilidades huma- nas, vão estar as habilidades sobre as quais já conversamos muitas vezes ao longo desse nosso estudo, as capacidades e relaciona- mento interpessoal adequado, a capacidade de ser uma pessoa agregadora, isto é, de facilitar a aproximação e os vínculos entre as pessoas. Também entram aqui, a capa- cidade de se expressar com desembaraço e saber ouvir atentamente. Outro aspecto, é entender um pouco o ser humano, os 21NEGOCIAÇÃO determinantes do comportamento humano e suas af lições. O bom negociador precisa saber inspirar confiança e um sentimento de confiabilidade e de alívio de tensões às pessoas. Também estão incluídas a capaci- dade de ter certo grau de sugestão e poder de influência sobre os outros, o que muitas vezes é chamado de liderança. E depois, o bom negociador apre- senta ainda as habilidades conceituais, ou seja, possui habilidade analítica, de dominar e inf luenciar a estratégia, a cul- tura organizacional e o modelo gerencial adotado, e, dealguma forma, inf luenciar também as situações externas, o cenário mais amplo da organização, onde está in- serido. A intuição também aparece aqui como uma outra habilidade importante, a capacidade de enxergar e sentir diferen- tes situações, diferentes pontos de vista, capacidade de pensar em termos de con- sequências futuras. Enfim, a habilidade de usar a intuição para enxergar o todo do conflito, o que é quase uma arte! Da mesma forma, junta-se a isso, a habilidade de ser um tanto quanto criati- 22NEGOCIAÇÃO vo, inovador, trazendo ideias e posiciona- mentos inéditos quando estes forem uma boa solução para os embates, sem medo do novo e do diferente. E, por fim, ter uma capacidade de sintetizar, sumarizar as situações, de modo a poder ver questões amplas de um modo objetivo, rápido e eficaz, e ter um bom nível de raciocínio lógico, isto é, a capacidade de apresentar os seus argumentos de uma forma simples e clara ao entendimento dos outros. Vimos até aqui como são extensas as qualidades ou atributos ou virtudes de um bom negociador. Dessa maneira, observa-se que é hora de parar e pen- sar mais. Visto que, ao longo da leitura acerca dessas habilidades, você, para- lelamente a leitura, foi capaz de avaliar estas virtudes em si mesmo: elas estão presentes no seu repertório comporta- mental, não estão presentes, precisam ser desenvolvidas, precisam ser desco- bertas…. Enfim, qual o estado da arte dessas virtudes em si mesmo? Nesse momento, vamos pensar numa das ha- bilidades em especial. Você já ouviu ou leu sobre essa ha- bilidade de comunicação chamada asser- tividade, sobre a qual falamos? Avalie sua assertividade nas suas interações. Desenvolva-a! Peça feedback às pesso- as que conhecem você, sobre seu estilo comunicacional e acerca do quanto você é assertivo. Pense muito sobre isso! Não há negociação sem assertividade! Esperamos que a sua ref lexão ante- rior tenha sido feita com a seriedade devida e que ela possa lhe oferecer subsídios para o desenvolvimento de um perfil bom de negociador, que conforme já discorremos aqui, é item de sobrevivência no mundo dos negócios hoje. No entanto, continuaremos mais um pouco a falar sobre o assunto. Em um dos periódicos clássicos da administração, a Revista HSM Management (2009), traz um artigo sobre negociação, uma aborda- gem muito interessante e útil para todos nós que estamos estudando conf litos: o paradoxo quente x frio. Vamos entender esta abordagem para que ela nos ajude não somente na resolução de conf litos, mas no próprio evitamento dos conflitos dis- funcionais. No ambiente organizacional, em qualquer tipo ou tamanho ou ramo de organziação, vamos encontrar as pessoas quentes e as pessoas frias. Vamos descobrir as principais diferenças entre estes dois perfis. Salientamos aqui, que isso não é uma “rotulação” das pessoas, mas uma prática descrição que nos auxiliará a lidar com conflitos. O artigo também propõe duas formas de resolução de conflitos, uma quente e outra fria. Elas estariam baseadas em duas formas cognitivas de resolução de conflitos pela mente humana, uma quente, mais ligada a reações emocionais do nosso cérebro e mente, e outra fria, ligada as áreas mais racionais e evoluídas do ser humano. PESSOAS QUENTES Existem pessoas quentes, que sempre trazem para a pauta temas quentes, seja lá qual for a situação, o ambiente ou pessoas a sua volta. Os temas quentes tendem a gerar conflitos, e muitos, diversas vezes desne- cessários. São temas sobre os quais não se pode ter dados objetivos, são temas controversos, difíceis de serem submetidos a testes de veracidade, com dados objetivos. Esses temas diferem entre as pessoas de acordo com seus valores, crenças e propósitos, dependendo de tudo o que mais se encontra arraigado nas pessoas. Exemplos de temas quentes, são os tradicionais temas polêmicos: política, sexualidade e religião. Eles ten- dem a despertar discussões ou conflitos passionais, carregados de muitas emoção, que tendem a se tornar rapidamente discussões com ataques pessoais e ofensivos. As pessoas quentes gostam de levantar polêmicas desnecessárias e improdutivas. Os temas quentes, normalmente, trazem para os debates questões de alto impacto para os envolvidos, colocando em jogo posições e opiniões fundamentais para os indivíduos, tais como suas opções sexuais, sua religião e suas preferências políticas. Além disso, essas pessoas usam o que o artigo chama de “sistema quente” de resolução de conflitos. É uma forma passional, acalorada para a resolução, baseada na solução a curto prazo, imediata. Em situações de pressão e estresse, essa busca emocional de uma solução ou resposta rápida, a todo custo, é muito apreciada pelas pessoas quentes. Essas soluções são guiadas pelo lema das pessoas quentes em um conflito: “Continue, vá em frente!”, não importando nada, a não ser, vencer o conflito. Antes de mais nada, um esclarecimento: o termo pessoas frias não tem nada a ver com o que o senso comum fala sobre pessoas frias. Isso não possue relação nenhuma com o fato de ser uma pessoa fria emocionalemnte, sem afeto, sem expressão emocional. Feita a ressalva, vamos entender o que são pessoas frias para a questão da gestão dos conflitos. O termo pessoas frias, discorre a respeito dos indivíduos que trazem para as di- cussões temas acessíveis, relativamente objetivos e submetíveis a testes de interpretações diferentes. Assim como, colaboram com temas para os grupos, que são em grande parte, compar- tilhados em termos de valores e crenças. Portanto, dirigem as discussões em graus moderados, pacificamente, baseado-se na argumentação e não em discussões passionais. São temas muito relavantes, práticos, que geram discussões funcionais e produtivas. Não criam polêmicas, que por mais dicutidas que sejam, não levam a lugar algum. São assuntos que, num curto prazo, podem ser esclarecidos com a análise de fatos e dados, sem gerar discussões acaloradas. Na busca da resolução dos conflitos, essas pessoas frias, obviamente, utilizam o sistema frio de busca de soluções. Ana- lisam, ponderam, buscam fatos e dados objetivos, mantêm a emoção sob controle. Também, procuram fatos objetivos, usam muito a ref lexão, e claro, para que possam fazer tudo isso em meio a um conflito, utilizam o autocontrole, já exposto ante- riormente, quando falamos sobre inteligência emocional. Outra característica das pessoas frias, é que elas conseguem gerenciar o próprio eu, exatamente o que uma pessoa com inteligência emocional faz. Assim, quando em meio a um debate, conversa, ou conflito, a pessoa fria sente que emoções estão sendo des- pertadas, ela consegue prestar atenção nelas, identificá-las e gerenciá-las, o que quase sempre significa, controlá-las. E esse processo de autogestão não é feito depois, ou em outro momento, quando estiver “sentado numa poltorna”, é feito no momento em que a pessoa está debatendo ou conversando, na hora em que está vivendo o conflito. A pessoa faz uma ref lexão na ação e no momento de agir. Ao invés de ir em frente, ela consegue parar, avaliar a situação e o que está sentindo, e procura outras interpretações para tudo o que está acontecendo com ela e ao seu redor. Essa capacidade de autogestão, traduz-se em outras duas capacidades: a primeira é a capcidade de gerenciar as conversas, de modo a conduzí-las para temas produtivos, e a capacidade de gerenciar relacionamentos no ambiente organizacional. Essas pessoas desenvolvem a capacidade de observar colegas, supe- riores e subordinados; e por segundo a capacidade de se deixar conhecer, que é a capacidade de desenvolver um espírito de confiança fundamentada (não confiança cega). Sabem dedicar seu tempo a duas questões básicas: seuas tarefas e as pessoas que estão ao seu redor, conhecendo-as. PESSOAS FRIAS 25NEGOCIAÇÃO E agora, claro, a pergunta inevi- tável para vocês, caros alunos: vocês são pessoas quentes ou frias??Agora, após estudarmos as carac- terísticas individuais que impactam na boa capacidade de gestão dos conf litos, vamos conhecer as principais posturas ou estratégias de resolução de conf litos que podem ser estudadas. Certamente, essa questão das formas de resolução de conflitos não se esgota aqui. Existe uma ampla literatura acerca do tema, que pode e deve ser estudada por você. Vamos tentar aqui, mostrar as principais posturas que um profissional pode adotar. É relevante destacarmos dois aspectos: que você per- ceba, a partir de uma autorref lexão, qual a estratégia que comumente usa para lidar com os conflitos com os quais você se de- para; e que compreenda que, dependendo do tipo e do contexto dos conflitos, cada estratégia pode ser considerada mais ade- quada do que a outra. Isso quer dizer que não existe a estratégia certa para resolver conflitos. O caminho mais eficaz na so- lução dos conflitos é justamente ser capaz de adotar uma atitude f lexível, avaliando o contexto do surgimento dos mesmos, dos seus envolvidos, o desfecho desejado, e após essa avaliação sistêmica, adotar a mais adequada. ESTRATÉGIAS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS Aceitação ou Resignação A aceitação é uma estratégia de re- solução de conflitos marcada pela ausência de competição ou tentativas de negociação. Diante de um embate ou conflito, a pessoa abre mão imediatamente de seu ponto de vista, objetivo ou interesse, em prol do ponto de vista, objetivo ou interesse do seu oponente. No senso popular, a pessoa abre mão e perde pelo seu oponente, aceitando os pontos de vista, objetivos ou interesses do outro como superiores ou dominantes ao seus. Num primeiro momento, a aceita- ção pode parecer a estratégia mais frágil e improdutiva para se lidar com os con- f litos, pois a pessoa “sai perdendo” com o uso dela. Entretanto, é preciso fazer uma distinção entre dois tipos de aceitação: quando a aceitação é uma opção ou uma escolha estratégica, ou quando ela é a única alternativa possível para a pessoa. Dito de outra forma, é preciso distinguir quando se escolhe perder, ou quando se perde por questões de incapacidades e limitações. Em algumas situações conflituosas, quando se precisa preservar, acima de tudo, a relação interpessoal com o oponente (pensando no futuro das próximas inte- rações com ele, que precisam ser mantidas) e quando a temática envolvida no conflito não é por demais, relevante a ponto de ensejar uma competição ou negociação, a aceitação ou resignação diante do ponto de vista do outro, pode ser a melhor forma de resolver um embate ou conflito. Diante dessas duas circunstâncias, escolher por “perder” pode ser a opção mais produtiva, que economizará tempo, energia e recur- sos. Mas vejam que, nesses dois casos, perder é uma escolha, avaliada de antemão, resultado de um processo de tomada de decisão diante da avaliação da situação 26NEGOCIAÇÃO conflitiva. É como se disséssemos: “não vale a pena, por este motivo, se desgastar numa competição ou negociação!” Essa situação faz jus aquela famosa frase, que diz que precisamos escolher as batalhas nas quais entrar. Há batalhas que não valem a pena entrar, e o profissional precisa desenvolver a capacidade de perce- ber quais são elas e agir com a flexibilidade necessária para assumir uma postura de resignação. Importante salientar nova- mente que esta estratégia só será utilizada por pessoas com inteligência emocional, autoconfiantes, e seguras, para as quais a opção da resignação não significa uma afronta ou uma ameaça pessoal. Por outro lado, diferentemente da aceitação exposta acima, quando a aceita- ção ou negociação são usadas porque são a única opção que a pessoa sabe utilizar diante de um conflito, elas ganham um caráter de negligência. Nesse caso, aceitar porque não se sabe negociar, ou se sente incapaz de negociar ou competir, torna- -se um grande problema de gestão, que pode levar a um aumento dos conflitos, a perda de autoridade pelo líder, perda da coesão do grupo, ao enfraquecimento da imagem de um gestor, enfim, a uma série de situações que são improdutivas em um ambiente organizacional. Nes- se sentido, gestores submissos, seja aos seus superiores, ou aos seus subordinados, causam graves danos à produtividade de suas equipes. A longo prazo, inviabilizam até mesmo sua permanência no cargo ou função, pois essa atitude de negligência, diante dos conflitos, torna as pessoas, as equipes e os processos um amontoado de coisas, de pessoas fazendo coisas sem ob- jetivos e propósitos comuns. Tudo aquilo que se deve evitar na gestão de conflitos. Competição A competição é considerada, a prio- ri, uma estratégia não muito adequada para a solução de conflitos. Competir, significa insistir em vencer o outro, em impor suas vontades e pontos de vista até que o outro se considere vencido, derrotado. Competi- ção significa um ganhar e outro perder. A competição pode ser considera uma moda- 27NEGOCIAÇÃO lidade de interação com os outros marcada pela agressividade e hostilidade (Palmieri & Branco, 2004). Em cenários e contextos muito competitivos, tais como o que vive- mos na atualidade do mundo corporativo, podem justificar ou até exigir este tipo de estratégia para resolver os embates. A competitividade tem sido até estimulada, sendo considerada uma atitude louvável por parte de gestores e profissionais de várias áreas. Transformou-se quase num item de sobrevivência. No entanto, é preciso ter ciência, de que competir traz danos a longo prazo para o ambiente, para os climas organi- zacionais e para as relações interpessoais, que se transformam num efeito colateral da competição e podem ameaçar futuras possibilidades de negociação. Uma vez que um profissional é considerado como competitivo pelos seus pares e superiores, as interações com ele passam a ser marca- das por níveis maiores de desconfiança e hostilidade, o que pode acirrar os confli- tos ao seu redor e, o que era para ser uma estratégia de gestão de conflitos, passa a ser uma prerrogativa de suas relações no ambiente do trabalho, tornando tenso, insalubre e improdutivo. Por outro lado, pode-se considerar a competição como uma estratégia válida e necessária para a resolução de conflitos apenas em algumas situações: quando se trata de uma situação de crise na qual você tem absoluta certeza de estar com a me- lhor alternativa para a solução de algum problema; quando você tem certeza que seu oponente não tem capacidade ou co- nhecimentos suficientes para levar adiante uma negociação; ou quando está diante de momentos de perigo ou crise que po- dem ameaçar algo ou a sobrevivência de algo ou alguém. Por exemplo, se você está negociando, enquanto gestor de uma em- presa, com o setor de recursos humanos, a demissão de alguém que cometeu uma falta grave e cuja permanência compromete a integridade e coesão de uma equipe, não há como negociar. Você é a favor da demissão e o setor de recursos humanos é desfavorável. Como gestor, você talvez deverá competir até que aceitem seu ponto de vista. A demissão precisa ser feita, pois se não ocorrer, os objetivos da equipe podem ser comprometidos. Aqui, a palavra de ordem é: f lexi- bilidade. Saber tornar decisões pautadas em informações reais e f lexibilizar o uso de comportamentos competitivos, sem causar desgastes na própria imagem e nas relações interpessoais parece ser a melhor escolha para os profissionais que desejam construir e manter uma carreira profissio- nal sustentável. Negociação Negociação pode ser definida como uma interação socialmente motivada en- tre indivíduos ou grupos com interesses divergentes, que procuram conciliar esses interesses concorrentes sem sacrificar os interesses individuais (Sobral, 2009). A negociação tem sido a estratégia de resolução de conf litos mais madura, mais eficaz, que traz melhores resultados e menos danos, na maioria das situaçõesconflitivas. Na negociação, que pode durar o tempo que for necessário, dependendo da 28NEGOCIAÇÃO situação, cada parte do conflito expõe sua opinião, ou necessidade, ou ponto de vista e, através da conversa dialógica e da argu- mentação, vão trocando informações, até que cheguem num consenso, numa aliança de interesses. Nessa aliança, os interesses individuais de ambas as partes acabam por ser parcialmente atendidos, naquilo que vulgarmente se chama “ganha-ganha”. Por ouro lado, alguns interesses indivi- duais acabam sendo deixados de lado, em prol do interesse que se pretende chegar a um desfecho produtivo. Na negociação, a concessão é peça fundamental. Quem não consegue ceder e conceder, não consegue negociar. Existe na literatura sobre negocia- ção, uma ampla descrição das etapas da negociação, mas que, na verdade, podem ser resumidas em duas etapas somente. Algumas vezes as pessoas podem fazer estas etapas intuitivamente, de maneira automática, sem se darem conta, mas elas são, de qualquer maneira, fundamentais para que a negociação seja bem-sucedida. Nomearemos, aqui, as duas etapas de pre- paração e ação: 1. Preparação ou Sondagem: esta fase acontece antes da negociação propriamente dita, ou seja, antes de estarmos frente a frente com o oponente. É uma fase de estudo e de sondagem “do terreno”, de busca e organização de informações sobre seu oponente e seus objetivos. Nesta fase, você deve fazer uma ref lexão para ter claro em sua mente qual seu estilo de negociação e qual o estilo de negociação e comunica- ção do seu oponente. Quem é ele; Como ele é; Quais seus objetivos; enfim, é preciso recolher o máximo de informações sobre quem estará do outro lado da negociação. Também é importante conhecer o contexto todo da negociação e todos os fatores que podem inf luenciar o processo. Na negociação, informação é uma arma de batalha. Jamais se vai para uma negociação despreparado. Tam- bém nessa fase você deve listar, e ter bem claro em sua mente, quais os seus objetivos e metas com a ne- gociação, qual sua margem para a negociação, o que pode ceder, e o 29NEGOCIAÇÃO que jamais pode ceder, quais os seus limites, quais as vantagens mínimas que espera e o quanto poderá ceder. Organizar todas essas informações de algum modo é fundamental. Use o recurso que mais se adequa ao seu estilo de comunicação: escreva, faça esquemas, faça um mapa mental, grave um áudio, enfim, registre de algum modo todas as informações que você transformará em exercício na próxima parte, a ação. Por exemplo, se você irá negociar preço com um cliente, precisará conhecer a oferta dos seus concor- rentes, as necessidades e a situação econômica do seu cliente, qual a margem que ele tem para negociar, quais os prazos dele, qual o seu “ jei- to” de lidar com os fornecedores, quais seus pontos fracos, seus gostos. Nesse caso, será importante traçar um mapa que represente todo o ce- nário no qual você irá atuar. 2. Ação: como o próprio nome já diz, a segunda fase é a ação, que acontece quando você está na frente do seu oponente. Nessa fase, você falará, irá expor seus argumentos e objetivos, vai escutar ativamente, vai contra- por argumentos, vai confrontar e ou clarificar as ideias do seu oponen- te, irá questionar, avaliar, sintetizar opiniões e pontos de vista. Também, irá fazer ajustes nos seus objetivos iniciais. Perceba que nessa fase o uso das habilidades de comunicação verbal e não verbal é crucial para o sucesso da negociação. E, por fim, você irá avaliar o resultado final, o quão satisfatório foi e se ainda há um espaço para mais negociações. Importante lembrar que a fase da ação inicia com aquilo que chama- mos vínculo ou “rapport”. Antes de começar a falar, mas já fazendo parte da ação, você deve dar-se a conhecer o seu oponente e conhecê-lo, abor- dar assuntos amenos, cotidianos, “quebrar o gelo”, criar um clima de simpatia e abertura. A duração dessa fase depende muito das característi- cas do seu oponente, do seu perfil e do tempo de que ele dispõe. É pre- ciso não errar na mão nessa fase de abertura. Algumas pessoas gostam de ficar por minutos conversando sobre amenidades, outras são mais pragmáticas e querem ir logo ao ponto, algumas guardam seu tem- po para esse momento, outras estão com pressa e vão criar antipatia se você demorar muito para começar a tratar do assunto em questão. É preciso, nessa fase inicial, ficar aten- to aos sinais não verbais emitidos pelo cliente, eles vão lhe comunicar quando e como “entrar no assunto” a ser negociado. Além disso, você não deve negli- genciar as duas etapas, você deverá sem- pre, ao longo da negociação, estar aberto a mudanças e reavaliações. Negociação é um processo, sempre vivo, sempre sujeito a surpresas e ajustes. Nesse sentido, f lexi- bilidade novamente surge como a palavra mestre para um bom negociador. Além de compreender os dois passos da negociação, precisamos compreender 30NEGOCIAÇÃO que na capacidade de negociar entram em jogo muitas variáveis individuais dos negociadores. Além das já expostas no capítulo anterior, fatores inconscientes dos envolvidos, tais como sentimentos de cul- pa, generosidade, confiança interpessoal e intrapessoal, interferem na capacidade de negociar. Dessa maneira, fatores da cultura organizacional da instituição na qual a negociação está acontecendo tam- bém inf luenciam seu curso. E agora, falando em negociação, vamos a uma reflexão fundamental para vocês, futuros profissionais. Pense e responda: você considera a mentira e o engano ferramentas toleráveis e úteis na negociação? Para negociar, muitas pessoas po- dem pressupor que seja necessário esconder fatos, blefar, omitir informações ou mi- nimizá-las, ou ainda otimizá-las, espe- cialmente no mundo corporativo. Sobral (2009) aponta que vários autores dizem que, apesar de reconhecerem que com- portamentos oportunistas e enganosos podem trazer vantagens de curto prazo na negociação, a ética e a honestidade sempre devem prevalecer na negociação, mesmo que aparentemente possam colocar o ne- gociador numa situação de vulnerabili- dade em relação ao seu oponente. Numa negociação, a honestidade traz melhores resultados e evita consequências de custos muito elevados, tais como a rigidez ou dificuldades em futuras negociações, o desgaste da relação com o oponente (com quem se precisará, ou possivelmente, fa- zer uma nova negociação no futuro), a criação de uma reputação profissional e imagem negativa, e uma possível escalada do conflito com o seu recrudescimento. Enfim, para todos os autores que estudam negociação, ser honesto, aberto e confiável é uma estratégia de resposta sempre ra- cional. E isso é especialmente importante num cenário de incertezas futuras como o mundo contemporâneo no qual vivemos e nele precisamos aprender a negociar. Mentira e engano, apesar de serem práticas comuns nos cenários dos negócios, não são mais práticas aceitáveis e sustentáveis. Quem mente e engana, aparentemente leva vantagens a curto prazo. Vivemos numa cultura pragmática, especialmente no mundo dos negócios, que é permissiva em relação à mentira e ao engano. Sim, estas posturas trazem vantagens rápidas, mas não sustentáveis. Pessoas com valores mais orientados ao bem-estar coletivo, que valorizam a benevolência em detrimento do poder, com certeza tendem a conside- rar como inaceitáveis práticas eticamente questionáveis, como o blefe, a mentira e o engano. Dica de leitura: Na negociação você precisa estar apto a “ler” o seu oponente, ou seja, a identificar e utilizar todos os sinais não verbais que ele lhe envia para regular seu próprio comportamento. Isso é crucial para o sucesso da mesma. Por isso, vai aí uma dica preciosa de leitura, o livro “O Corpo Fala”, de Weil e Tompakow. 31NEGOCIAÇÃO Perceba que, estamos falando de, além de estratégias de negociação, de pos- turas éticas dos gestorese profissionais, ou seja, de uma ref lexão que deve servir de plano de fundo para todas as práticas profissionais de todos nós. Assim sendo, encerramos nosso es- tudo sobre os conf litos com a pergunta fundamental: o quanto aprendemos sobre os conflitos e sobre suas formas de gestão, enquanto promotores do desenvolvimento individual e organizacional? Tudo o que aprendemos e fazemos em gestão deve ter estes dois planos de fundo, que são conver- gentes: o desenvolvimento das pessoas e o desenvolvimento das organizações. Dessa forma, fazer das pessoas e das organizações seres mais produtivos e sustentáveis, não esquecendo, que para isso, devemos agir sempre que estivermos diante de, ou em um conflito. Quase finalizando, retome as fra- ses bússolas do começo do nosso estudo e pense sobre elas. Agora, elas lhe soam diferentes, o que significa isso em termos de ações e comportamentos concretos que você pode adotar diante dos conflitos da vida? Reflita!!! Eu preciso ser a solução, e não o problema. Seja o inteligente da situação! Exercício de Síntese das Ideias Vamos fazer um exercício de ref le- xão: adiante você encontra um link para um breve vídeo, que conta a lenda: “Os sábios Cegos e o Elefante”. Sua atividade é a seguinte: assista o vídeo e escreva um texto relacionando a mensagem transmi- tida com a capacidade de estabelecer boas negociações. O vídeo fala de um aspecto funda- mental, que muitas vezes esquecemos ao tratar dos conflitos, que deve ser sempre levado em conta pelo negociador, e sobre o qual falamos anteriormente aqui na apos- tila. No seu texto, você deverá explicitar qual é este aspecto. Link ( https://www.youtube.com/watch?v=PTa_ weeOPP4 ) https://www.youtube.com/watch?v=PTa_weeOPP4 32NEGOCIAÇÃO Por último, numa alusão quanto a “ref lexão da poltrona” que o artigo es- tudado anteriormente, da Revista HSM Management traz, vamos “sentar na pol- trona” para uma observação. Queremos que você, que estudou uma disciplina de Negociação inteira, elabore uma ref lexão, consideração séria e comprometida sobre seu aprendizado real. Comparando você com você mesmo, você no início e no fi- nal dessa disciplina, o que você aprendeu. Aprender significa não somente conhe- cer, adquirir conhecimentos, mas sim, ser capaz de usar estes conhecimentos para transformar suas ações no seu ambiente de trabalho. Por isso, perguntamos, o que irá efetivamente mudar no seu comportamen- to, nas suas atitudes, agora que falamos tanto em conflitos e sua gestão. Você irá mudar algo em seu comportamento. Ou, pelo menos, deseja mudar! Você deverá ter percebido que usamos muitos conceitos para estudar a negociação, mas o tempo todo, com o auxílio dos livros e artigos sobre o tema, percebemos que a principal ferramenta para a negociação é e sempre será você mesmo, com suas habilidades, técnicas e comportamentais. Então, em seu presente e daqui para frente, ao longo do seu curso de graduação, seja ele qual for, você precisa desenvolver o hábito de se autogerenciar. Esta não é uma tarefa fácil, não aprendemos a fazê-la durante nosso de- senvolvimento, mas ela é fundamental, segundo mostram todos os artigos sobre o tema, negociação. Se você não se conhe- cer, conhecer seus pensamentos, crenças, valores, emoções, você não conseguirá negociar, nunca! Você poderá estudar e decorar falas, técnicas, palavras chaves, jargões da negociação, mas tudo cairá por terra em suas mãos na hora na qual você se deparar com uma situação de estresse ou pessoa na qual precisa negociar. Encare essa tarefa de aprender a se autogerenciar como um amadurecimento profissional, que será, com certeza, o grande e único diferencial competitivo que você poderá ter em seu ambiente de trabalho. Essa capacidade lhe trará, como consequência, amadurecimento psicológico e segurança emocional. Nem todos chegamos na vida adulta e na mesa de trabalho portando esta segurança emocional. Nossos medos, nossa timidez, nossas raivas, nossas frustrações, nossas experiências de fracasso profissional e na vida, nossas carências, podem, muitas vezes, abalar nosso alicerce interior e nos transformar em “pessoas quentes”, que são o problema, ao invés de serem a solução nas equipes das quais fazem parte. Após nosso estudo você deverá per- ceber que negociar depende de tudo isso que foi escrito acima. E todos nós, inde- pendente da área, da função, da idade, da vontade, devemos querer aprender a negociar. Muitos dizem que negociar é uma arte. Colocamos no plano da arte questões subjetivas quando a autogestão entra em cena. Aprenda a se gerenciar, aprenda a gerenciar sua ferramenta de trabalho mais valiosa, você mesmo. Com isso, você estará trilhando o gratificante caminho do desenvolvimento pessoal, e contribuindo com o desenvolvimento de sua organização, seja ela uma grande em- presa, uma multinacional, uma estatal, ou o mercadinho da esquina. Todos estamos aqui para que todas as empresas sobrevi- vam e cresçam! 33NEGOCIAÇÃO ARAÚJO, Silvia Maria de; BRI- DI, Maria Aparecida; MOTIM, Benilde Lenzi. Sociologia: Um Olhar Crítico. São Paulo: Contexto, 2009. BERGAMINI, Cecília Whitaker. Motivação nas Organizações. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1997. CARUSO, David, R; SALOVEY, Peter. Liderança com inteligência emo- cional. Liderando e administrando com competência e eficácia. M. Books do Brasil Editora Ltda. São Paulo, 2007. FRANÇA, Ana Cristina Limongi. Práticas de Recursos Humanos-PRH: Conceitos, Ferramentas e Procedimentos. 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TIPOS DE CONFLITOS E VARIÁVEIS INDIVIDUAIS E AMBIENTAIS DOS CONFLITOS Visões e Tipos de Conflitos Características Comportamentais de pessoas potencializadoras de conflitos A GESTAO DE CONFLITOS E O PERFIL DO BOM GESTOR DE CONFLITOS Características Comportamentais do Bom Negociador ESTRATÉGIAS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS Exercício de Síntese das Ideias Referências Bibliográficas
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