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A LIGAÇÃO LÓGICA DAS IDÉIAS Os Estudos da Linguagem, principalmente a partir da década de 80, passaram a “pesquisar o que faz que um texto seja um texto” (KOCH, 2001, p. 14). Assim, além de se voltarem para a textualidade, passaram a enfocar questões sobre como se adquire a capacidade de produzir e reconhecer textos. Nesses estudos, o objeto texto passou a ser tomado como uma totalidade de significação, não sendo mais compreendido como uma mera soma de frases e palavras que se analisam isoladamente. A partir desse período, a ciência da linguagem tem buscado descrever e compreender fatores responsáveis pela textualidade, ao mesmo tempo em que se dedica a tentar desvendar como se estabelecem nos indivíduos tanto a competência como os diferentes níveis de desempenho textual. A coesão textual, ao lado de outros fatores reconhecidos como constituintes da textualidade, tais como a coerência, a informatividade, a situacionalidade, a intencionalidade, a intertextualidade, a aceitabilidade, é um foco de observação importante para os estudos da análise e produção textual. A coesão é o processo através do qual busca-se “costurar” uma frase à outra. Quando escrevemos um texto, temos a preocupação de “amarrar” a frase seguinte à anterior, para que o vínculo entre elas se mantenha; caso contrário, teremos uma seqüência de frases sem sentido, sucedendo-se umas às outras sem muita lógica, sem nenhuma coerência. Trataremos aqui da constituição da coesão seqüencial e da coesão referencial. Como elementos de coesão seqüencial, há recursos específicos como a paráfrase, o uso de marcadores de progressão textual que instauram “etapas de texto” e dos marcadores de articulação, tais como conjunções e conectores em geral. Já a coesão referencial trata das substituições, das pronominalizações, das repetições, das definitivizações e das elipses. RECURSOS DE COESÃO SEQUENCIAL 1. ARTICULADORES O encadeamento lógico das idéias de um texto se estabelece mediante o uso de articuladores (também chamados de nexos, de conectores ou de conetivos), que são advérbios, conjunções e preposições. As relações de sentido que as idéias mantêm entre si são de diferentes tipos. Observe: (1) Revisei a matéria em casa e procurei explicações adicionais com o professor. 2 (2) Revisei a matéria em casa ainda que precisasse descansar após um dia exaustivo. (3) Revisei a matéria em casa porque pretendo alcançar bom resultado na avaliação final. (4) Revisarei a matéria em casa desde que não receba visitas inesperadas à noite. (5) Ou revisarei a matéria em casa ou irei ao cinema com um grupo de amigos. Em (1), o articulador e adiciona duas idéias a favor de uma mesma conclusão: as explicações adicionais somam-se à revisão da matéria. Já em (2), o nexo ainda que marca a oposição entre duas idéias: a necessidade de descanso após um dia exaustivo não é suficiente para impedir a revisão da matéria em casa. Em (3), o conector porque relaciona uma causa – o desejo de alcançar bom resultado – a uma conseqüência – a revisão da matéria. Em (4), o conetivo desde que introduz uma condição que precisa ser satisfeita – não receber visitas – para que a idéia anterior – revisar a matéria – seja verdadeira. Por fim, em (5), os articuladores ou … ou relacionam duas idéias que apresentam alternância entre si: a revisão da matéria e a ida ao cinema com os amigos. Há, dessa forma, diferentes tipos de relações a serem estabelecidas entre as idéias, como se vê a seguir: 1.1 RELAÇÃO DE ADIÇÃO Os articuladores relacionam idéias que se adicionam a favor de uma mesma conclusão. Os principais articuladores são e, nem, ainda, também, além disso, não só … como, tanto … como, entre outros. (6) “Victor Vivan, de sete anos, desequilibrou-se do cavalo e foi arrastado por cerca de 300 metros, segunda-feira”. (Zero Hora, 16.02.2005, capa) (7) “A vitória inesperada do pernambucano Severino Cavalcanti (PP) não só expõe a fragilidade das relações do governo com o Congresso como coloca em xeque toda a articulação política do Planalto”. (Santos, Klécio, Zero Hora, 16.02.2005, p. 5) 1.2 RELAÇÃO DE OPOSIÇÃO Os conectores articulam proposições que se opõem de alguma forma. Trata-se dos articuladores mas, porém, contudo, todavia, no entanto, entretanto, não obstante, embora, ainda que, mesmo que, apesar de que, entre outros. (8) “É claro que não há receita para aprimorar os sentidos, mas você pode se inspirar no poeta português Fernando Pessoa (1888-1935), que resumia de um jeito simples a influência de estímulos e impressões em sua vida”. (SAÚDE! é vital, jan. 2005, p. 64) (9) “Embora muitos adolescentes e adultos voltem a estudar e o abandono não seja, desse modo, definitivo, o certo é que desperdiçam um tempo precioso e acentua-se a disparidade entre idade e série cursada”. (Zero Hora, 23.09.2003, p. 14) 1.3 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE 3 Duas proposições se combinam: uma expressa a causa que acarreta determinada conseqüência, presente em outra. São articuladores de causalidade porque, pois, já que, uma vez que, visto que, como, tão … que, tanto … que, por isso, entre outros. (10) “O otorrinolaringologista ainda confirmou que a intervenção transcorreu sem imprevistos. O pólipo obstruía a respiração e foi retirado. O local foi cauterizado e não será preciso usar tampão, pois não há sangramento, explicou Almeida”. (Correio do Povo, 06.02.2005, capa) 1.4 RELAÇÃO DE EXPLICAÇÃO Os articuladores que, porque e pois introduzem uma explicação ou uma justificativa de algo anteriormente enunciado. Dessa forma, o segundo enunciado justifica o conteúdo do primeiro. (12) “O problema é sério porque, se não for tratado, pode modificar o sistema imunológico e prejudicar o desenvolvimento físico e cognitivo”. (SAÚDE! é vital, jan. 2005, p. 18) 1.5 RELAÇÃO DE CONCLUSÃO Os articuladores assim, dessa forma, então, logo, pois, por conseguinte, portanto, entre outros, introduzem um enunciado (B), que estabelece uma conclusão em relação a um enunciado anterior (A). (13) “Como – apesar da evasão e da repetência – se vem expandindo o atendimento nos dois níveis, o principal diferencial há de ser a qualidade do ensino ministrado. Não basta assim democratizar a educação”. (Zero Hora, 23.09.2003, p. 14) (14) “O superávit das contas externas e a redução do endividamento público e da inflação correspondem exatamente às nossas expectativas iniciais. Portanto, tenho de estar satisfeito pelo fato de tanto o diagnóstico quanto o tratamento terem sido corretos”. (Meirelles, Henrique, Veja, 19.01.2005, p. 11) 1.6 RELAÇÃO DE CONDICIONALIDADE Há um enunciado que expressa uma condição que precisa ser satisfeita para que o outro enunciado seja verdadeiro ou factível. Os principais articuladores são se, caso, desde que, contanto que, entre outros. (15) “A primeira dica é simplesmente namorar também sua profissão. Se seus pais possuem um conhecido que exerça uma profissão, peça permissão para acompanhá-lo por algumas semanas para sentir como é seu dia-a-dia”. (Kanitz, Stephen. Os 50 melhores artigos. 2003. p. 33) 4 (16) “A maioria dos pais se preocupa bastante quando os filhos não mostram ambição, mas nem todos se preocupam quando os filhos quebram a ética. Se o filho colou na prova, não importa, desde que tenha passado de ano, o objetivo maior”. (Kanitz, Stephen. Os 50 melhores artigos. 2003. p. 4) 1.7 RELAÇÃO DE FINALIDADE Uma das proposições do período explicita o meio para se atingir determinado fim, expresso na outra proposição. Trata-se dos articuladores para, para que, a fim de, a fim de que, com o intuito de, entre outros. (17) “Ao contrário do que ocorre no futebol, educadores populistas não aceitam que na educação se selecionem os alunos mais promissores e se dêem a eles as condições para que desabrochem seus talentos”. (CASTRO, Claudio de Moura, Veja, 19.01.2005, p. 24) (18) “Os animadores da Dream Works® usam estações de trabalho HP e servidores Linux para aumentara colaboração, reduzir os tempos de renderização e baixar os custos gerais permitindo que fiquem livres para inventar admiráveis mundos novos de animação, com seus ogros e as princesas que os amam”. (Veja, 19.01.2005, p. 115) 1.8 RELAÇÃO DE COMPARAÇÃO Para se estabelecer uma comparação, é necessário que haja pelo menos dois elementos entre os quais se estruturará o jogo comparativo. Os principais articuladores são como, assim como, tão … como, tanto … quanto, mais … que, menos … que, entre outros. (19) “Descobri que o quartzo-rosa ajuda a curar mágoas. Como ele, outras pedras podem equilibrar nossas energias”. (Bons Fluidos, mar. 2004, p. 59) (20) “Não tolero tão bem o frio quanto a maioria das pessoas” . (Bons Fluidos, mar. 2004, p. 62) 1.9 RELAÇÃO DE CONFORMIDADE Há duas proposições, sendo que o conteúdo de uma está em conformidade com o que se afirma em outra. Trata-se dos articuladores como, conforme, consoante, de acordo com, segundo, para, entre outros. (21) “Os de mola duram mais. Outra vantagem é que, mais arejados, tendem a esquentar menos. São mais caros, mas, segundo os fabricantes, vêm barateando e ganhando mercado”. (Veja, 19.01.2005, p. 100) (22) “Como explicou a nutricionista Isa de Pádua Sampaio, da Universidade Federal de São Paulo, apesar de serem hipercalóricos, os carboidratos presentes nesses alimentos têm alto índice glicêmico”. (SAÚDE é vital, jan. 2005, p. 14) 5 1.10 RELAÇÃO DE TEMPORALIDADE Localizam-se no tempo ações, eventos ou estados de coisas. Os principais articuladores são quando, sempre que, toda vez que, depois que, mal, enquanto, à medida que, à proporção que, entre outros. (23) “O aposentado Flávio Gonçalves dos Santos, de 55 anos, se auto-intitula um incentivador da única filha, Ana Paula, nove anos. Na hora de estudar em casa, nada começa até que pai e filha estejam juntos, normalmente em volta da mesa da cozinha”. (Zero Hora, Caderno Meu Filho, 07.02.2005, p. 3) (24) “A tensão apertou? Antes de explodir e – mau – se arrepender depois, experimente pingar duas gotas de óleo essencial de camomila na palma das mãos”. (SAÚDE! é vital, jan. 2005, p. 65) 1.11 RELAÇÃO DE ALTERNÂNCIA As proposições que estabelecem entre si uma relação de alternância podem expressar exclusão ou inclusão de idéias. Trata-se dos articuladores ou, ou … ou, ora … ora, seja … seja, entre outros. (25) “Férias é sempre um bom tempo para iniciar o hábito da leitura ou tentar introduzir a leitura em crianças que dizem não gostar de ler”. (Zero Hora, Caderno Meu Filho, 07.02.2005, p. 4) (26) “Casar com a filha do dono da empresa, arrumar emprego público, ter padrinho político ou obedecer piamente às ordens do chefe eram, em linhas gerais, os caminhos para o sucesso no Brasil”. (Kanitz, Stephen, Veja, 04.03.98) Exercícios: 1. Relacione as orações abaixo por meio de articuladores de modo a manter o sentido entre elas. I. O carro enguiçou. II. As tentativas de consertá-lo resultaram infrutíferas. III. Não pudemos chegar na hora combinada. I. O filho estava levando o pai à loucura. II. O filho não tinha consciência disso. III. O filho desrespeitava as regras sociais.. 6 I. A realidade deve ser aceita como é. II. Devemos nos conformar com a realidade. IV. A realidade não pode ser modificada. 2. No período: Sem que tenha esse documento nas mãos, nada poderei fazer, qual o valor da conjunção destacada? (a) causa (b) finalidade (c) conseqüência (d) adversidade (e) condição 3. Em qual dos períodos abaixo existe uma relação de oposição entre as orações? a) É uma pessoa querida, tanto que agradou a todos. b) Sairíamos cedo, caso não estivesse chovendo. c) Como ele fala muita besteira, todos o afastam. d) Minha rua anda movimentada, embora esteja em obras. e) Ela trabalhe muito, conforme nos disse a mãe. 4. Observe os períodos: I. Cada um colhe como semeia. II. Ele tem se comportado como um imbecil. III. Como o ladrão estivesse armado, ninguém ousou reagir. Considerando que o autor das frases quis estabelecer na I uma relação de conformidade entre as orações; na II, uma relação de causa e conseqüência e na III uma relação de explicação, estão corretos os períodos: a) I e II b) somente I c) II e III d) I e III e) somente o II
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