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Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Licenciatura em Enfermagem | 2º ano, 2º semestre Pedro Vasconcelos Fevereiro 2018 PEDRO FILIPE VASCONCELOS (enf.pedro.vasconcelos@gmail.com) Bacharelato em Enfermagem (1998) Licenciatura em Enfermagem (2005) Pós-graduado em Intervenção Humanitária e Catástrofe (2010) Mestrado em Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica (2013) Pós-graduado em Gestão de Unidades de Saúde (2016) Serviço de Cardiologia Hospital Egas Moniz (1998) Serviço de Cirurgia Cardiotorácica do Hospital Cruz Vermelha (1999) Serviço de Urgência Hospital São Francisco Xavier (1999) Viatura Médica de Emergência e Reanimação HSFX (2004) Coordenador dos Enfermeiros do CODU (2008) Coordenador do Serviço de Ambulâncias de Emergência (2009) Helicóptero de Emergência Médica (2009) UCIP Hospital São Francisco Xavier (2017) Instituto Nacional de Emergência Médica, SIV Lisboa (2017) Missão Internacional (Timor-Leste, 2007) Exercício ONU (Canjouers, 2009) MCS and Trauma Management Course (Israel, 2010) Estágio de Trauma (Chicago, 2012) Instrutor SBV, SAV e Trauma pelo INEM (2009) Instrutor SBV e SAV pela American Heart Association (2013) Instrutor de TRAUMA pelo International Trauma Life Support (2014) Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte INTRODUÇÃO Como a definimos? Que emoções podem estar associadas? Que factores influenciam as atitudes face à morte? • Idade • Cultura e religião • Experiências prévias • Situação esperada / não esperada Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte INTRODUÇÃO Ao contrário de todas as outras experiências humanas, a morte não é passível de ser treinada ou experienciada; Apenas conhecemos a morte de outro(s) e a vivência de quem morre não nos é dada a conhecer. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte INTRODUÇÃO A morte engloba geralmente duas dimensões: Perda física ou biológica. Perda social. Educar para a morte e o morrer envolve questões tão polémicas como sentimentos, costumes, , religiões, crenças e culturas. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Morrer em casa ou no hospital? • A morte passou do domínio familiar para o domínio dos profissionais de saúde; • 75% dos óbitos ocorrem actualmente em unidades de saúde • “A morte deixou o domicílio e instalou-se no hospital. Morrer deixou de ser um acto íntimo, sereno e em família.” (Frias, 2008) Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte A VIVÊNCIA DA MORTE NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA • O tema “morte” constitui um tabu na sociedade ocidental contemporânea; • Confrontarmo-nos com a morte é confrontarmo-nos com o nosso próprio fim; • Ao protegermo-nos deste confronto, pode haver maior tendência a prestar menos atenção aos que se encontram na fase final da vida. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte A ANSIEDADE FACE À MORTE • A morte física seria o fim do corpo (e do indivíduo), que era entendido como somatório de carne e alma, pela desintegração completa dos átomos que o constituem. • Não há por que temer os deuses nem em vida e nem após a vida. E, além disso, depois de mortos, como não estaremos mais de posse de nossos sentidos, será impossível sentir alguma coisa. Então, não haveria nada a temer com a morte. Epicuro de Samos Grécia Antiga Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte A ANSIEDADE FACE À MORTE • As pessoas geram em vida círculos concêntricos que podem influenciar outros durante anos, às vezes por várias gerações • Esta ideia retira um pouco da sensação de vazio com a morte • A imortalidade ligada à transmissão do “rippling effect” • Exemplos de doentes em que a ansiedade face à morte foi reduzida Irvin D. Yalom Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte O papel do enfermeiro “Os enfermeiros devem ser capazes de avaliar as necessidades da pessoa, bem como as condições e as doenças que as alteram.” Henderson, 2006 • Confiança na equipa clínica • Independência / autonomia • Presença de familiares • O toque / contacto humano • A higiene • Informação e envolvimento nos cuidados prestados Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte O papel do enfermeiro “O enfermeiro, pela sua presença 24h no serviço e pela natureza da sua relação íntima é o interlocutor privilegiado do doente com a família.” Curry, 1995 Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Estadios do processo de aceitação de morte Estadio Sinais Acção do Enfermeiro Negação Não acredita no diagnóstico ou na realidade de morte Escutar; Oferecer suporte emocional; não confrontar a negação; assegurar que não ficará sozinha Negociação “Fará diferença se eu fizer o tratamento?” Aceitar e validar a dificuldade em lidar com esta informação Raiva Frustração e medo Não personalizar; validar as emoções; redirecionar a raiva para as tarefas que a pessoa tem de cumprir Luto Tristeza, sensação de perda e de esmagamento Respeitar; Assegurar que não está só neste processo. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Características Morte inesperada Morte anunciada Idade Qualquer idade, mas mais comum em crianças, adolescentes, adultos jovens e de meia-idade Mais comum em idosos e em pessoas com doença prolongada Momento da morte No momento de doença ou lesão ou poucas horas após o evento Meses ou anos após o diagnóstico Presença dos familiares Habitualmente não estão presentes no momento. Vão chegando gradualmente. Frequentemente presentes no local da morte e conscientes do evento Reacção dos familiares Negação, choque, desorganização, agressividade, medo, desamparo Luto, tristeza Morte anunciada versus morte inesperada Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Nos familiares Morte inesperada Morte anunciada Choque emocional: • Negação; • Raiva; • Pesar intenso; • Procura de culpa ou responsabilidade. Luto antecipado: • Maior preparação para a morte; • Diminui o choque emocional da perda; • Maior fadiga; • Exaustão emocional; • Culpa pelo sentimento de alívio. Morte anunciada versus morte inesperada Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Nos enfermeiros Morte inesperada Morte anunciada • Ausência de relação anterior com o doente ou com os familiares; • Pouca informação relativa à causa de morte; • Associada a “má morte”. • Maior investimento emocional no doente; • Possibilidade de luto; • Maior controlo sobre a morte; • Associada a “boa morte”: face ao sofrimento, a morte é “desejada”. Morte anunciada versus morte inesperada Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Cuidados ao corpo Alguns pontos importantes: • Após a morte, os cuidados ao corpo devem ser a última medida a ser implementada; • A família pode desejar algum tempo junto do seu ente querido, antes que o corpo seja removido, pelo que o Enfermeiro deve facilitar esse desejo sempre que as condições o permitam; • No acondicionamento do corpo, devem ser utilizados sacos de transporte de cadáver de uso único; • O cadáver deve estar sempre identificado; • Na morgue devem existir condições para a higienização das mãos dos profissionais. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Cuidados ao corpo Preparação para o procedimento: 1. Lavar as mãos; 2. Preparar material: • Material para higiene do corpo e barba; • Material para a múmia (algodão, ligaduras, compressas e adesivos); • Etiquetas para identificação de cadáver (quatro); • Luvas, avental e resguardos; • Lençol descartável; • Saco para transporte de cadáver; • Saco para espólio. 3. Garantir a privacidade. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Cuidados ao corpo Sequência das intervenções: 1. Posicionar o corpo em decúbito dorsal, com os membros alinhados; 2. Remover roupa, próteses e outros bens materiais; 3.Colocar resguardos sob o corpo de vido ao risco de perda de fluidos orgânicos; 4. Devem ser preenchidas 4 etiquetas de identificação e cadáver, de preferência colando etiqueta hospitalar no verso e garantindo que esta coincide com a bracelete de identificação hospitalar; As etiquetas devem conter a seguinte informação: serviço, nome completo do falecido, data e hora do óbito, assinatura do enfermeiro); 5. Tapar os olhos do cadáver exercendo ligeira pressão sobre as pálpebras (poderá ser necessária a colocação de compressas); 6. Proceder ao tamponamento dos orifícios naturais com compressas ou algodão, de forma a garantir a contenção de fluidos e líquidos orgânicos; 7. Fixar o maxilar inferior, de forma a fechar a boca, com ligadura de gaze abaixo do queixo; Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Cuidados ao corpo Sequência das intervenções: 8. Prestar cuidados de higiene necessários; 9. Remover drenos, cateteres e efectuar ou refazer pensos que estejam repassados; 10. Juntar os membros superiores e fixá-los com ligadura em volta das mãos, colocando uma das etiquetas de identificação de cadáver; 11. Juntar os membros inferiores e fixá-los com ligadura em volta das mãos, colocando uma das etiquetas de identificação de cadáver; 12. Envolver o corpo num lençol descartável; 13. Acondicionar o corpo em saco de transporte de cadáver, fixando neste as duas outras etiquetas de identificação de cadáver, em pontas opostas do saco após estar fechado; 14. Caso se trate de um óbito de um doente infectado, este deverá ser acondicionado em dois sacos de cadáver devendo a preparação do corpo ser feita com a manutenção das medidas de isolamento que estavam preconizadas antes da ocorrência do óbito. Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Cuidados ao corpo Transporte do cadáver: • O transporte do cadáver para a morgue é geralmente efectuado por um assistente operacional; • O transporte de cadáveres deve ser feito numa maca exclusiva para este efeito; • Nenhum cadáver pode ser encerrado em câmara frigorífica antes de decorridas 6 horas após a constatação de sinais de certeza de morte; • Após estas 6 horas, um assistente operacional deverá colocar o cadáver na câmara frigorífica, tendo o cuidado de identificar a gaveta. Cuidados da família em luto: transmissão de más notícias Licenciatura em Enfermagem | 2º ano, 2º semestre Pedro Vasconcelos Fevereiro 2018 Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias O QUE É UMA MÁ NOTÍCIA? “Qualquer informação que afecta seriamente e de forma adversa a visão de um indivíduo sobre o seu futuro”. Baile, W. F. et Al (2000) Como em qualquer comunicação verbal ou não verbal, a perspectiva do emissor pode ser distinta da perspectiva do receptor. Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias O QUE É UMA MÁ NOTÍCIA? • Tarefa frequente e stressante para profissionais de saúde • Destinada ao doente (novo processo de doença; doença terminal; etc…) • Destinada à família (morte) • Situação esperada/preparada versus inesperada Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias MÁS NOTÍCIAS As pessoas têm o direito a serem informadas. A informação não deve ser restringida, mesmo que se suspeite que esta pode ter um efeito negativo sobre o doente. O conteúdo não deve ser escondido; o que pode e deve ser adequado é a forma com que a informação é transmitida. A forma pode afectar: • A compreensão da informação pelo doente; • O nível de satisfação com os cuidados; • O nível de esperança; • A adaptação psicológica subsequente. Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias MÁS NOTÍCIAS Muitas pessoas desejam ter informações precisas que podem condicionar decisões na sua vida ou nas que dela dependem; Outras pessoas podem responder com atitude de negação, fuga ou minimização do significado Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias BARREIRAS À TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS • Falta de treino do emissor • Stress / ansiedade (tanto do emissor como do receptor) • Características do ambiente como o ruído ou a impessoalidade Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS PROTOCOLO SPIKES 4 Objectivos: 1. Recolher informações do doente 2. Transmitir informações clínicas 3. Proporcionar suporte 4. Induzir a colaboração de estratégias e de um plano para o futuro Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS PROTOCOLO SPIKES 6 Etapas: 1. Setting up the interview (Planeamento da entrevista) 2. Perception (Percepção do receptor) 3. Invitation (Procura de informação pelo receptor) 4. Knowledge (Dando conhecimento e informação ao receptor) 5. Emotions (Abordar as emoções) 6. Strategy and sumary (Estratégia e resumo) Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Setting up the interview (Planeamento da entrevista) • Ensaio mental prévio à transmissão da má notícia • Local privado • Envolver pessoas importantes (não falar com ninguém a sós) • Transmissão na posição de sentado, sem barreiras entre emissor e receptor • Manter contacto visual • Evitar interrupções (desligar telefone de serviço, informar equipa, ..) Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Perception (Percepção do receptor) • Investigar o que o receptor já sabe (“O que já lhe foi dito sobre seu quadro clínico até agora?”) • Corrigir desinformações e moldar a informação que vai ser dada Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Invitation (Procura de informação pelo receptor) • Maioria dos doentes desejam ter plenas informações sobre a sua situação clínica • No entanto, alguns não o fazem – balancear a altura em que a má notícia é transmitida • Nestas situações, questionar o receptor do nível de detalhe que deseja ser informado Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Knowlodge (Dando conhecimento e informação ao receptor) • Transmitir informações objectivas relativas ao exames realizados • Transmitir informações objectivas relativas à situação clínica actual • Dosear a informação e não transmitir toda ao mesmo tempo Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Emotions (Abordar as emoções) • Provavelmente um dos desafios mais difíceis para o enfermeiro • Reacções à má notícia podem ir desde o silencia e ao isolamento como à raiva e à fúria • Ajustamento do status emocional do emissor ao receptor • Até que uma emoção se desfaça, é impossível prosseguir com a transmissão de informação Cuidados da família em luto: Transmissão de más notícias TRANSMISSÃO DE MÁS NOTÍCIAS – PROTOCOLO SPIKES Strategy and summary (Estratégia e resumo) • Apresentar opções de tratamento e metas • Descrever os passos que se seguirão (no caso do óbito, informar a família dos trâmites legais a seguir) Morrer e educar sobre a morte: Cuidados pós morte Negação • Negação da informação que é transmitida; • Procura de argumentos para justificar a impossibilidade da notícia; • Negação como defesa para confronto com a realidade. Raiva • São frequentes sentimentos de raiva e cólera: “Porquê a mim?”, “Porquê o meu filho?”. • A raiva pode ser expressa contra o próprio, o ente querido que morreu, a própria família ou a equipa de saúde. Negociação • A pessoa adopta uma estratégia de negociação “divina”, prometendo mudanças no seu comportamento, ou até mesmo procurandonegociar a sua vida pela vida do ente querido. Depressão • A pessoa confronta-se com a realidade de perda e com as suas consequências e percebe que nada mais poderá fazer para ter o seu familiar de volta. Aceitação • Rendição perante a morte e suas consequências; • Paz necessária para a reorganização da vida familiar e afectiva. Fases do luto (Kubler-Ross)
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