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Introdução à Sociologia: Surgimento e Especificidades

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Aula 1 - Introdução à Sociologia
Objetivo: Apresentar o surgimento da disciplina e o específico do campo disciplinar da Sociologia.
Olá, está tudo bem com você? Bem-vindo/bem-vinda a esta nova disciplina: Sociologia Geral e da Religião. Como campo disciplinar específico a Sociologia é relativamente recente. Alguns dos seus fundadores também tinham estudos em outras áreas do saber. As perguntas que eles fizeram e as abordagens propostas contribuíram para a criação de uma nova área de estudos. Nesta aula queremos dar um panorama desse surgimento.
A Sociologia é uma ciência que estuda as sociedades humanas e os processos que interligam os indivíduos em associações, grupos e instituições. Para ilustrar, ainda que de forma caricaturada, se você fosse estudar o indivíduo isoladamente, uma das ciências indicadas para fazê-lo seria a Psicologia. Para estudar grupos específicos, a Antropologia é uma boa opção. Agora, se você quer analisar os fenômenos que ocorrem quando vários indivíduos se encontram em grupos de tamanhos diversos, e interagem no interior dos mesmos, a Sociologia se apresenta como um ferramental teórico muito rico.
Antes da Sociologia constituir-se em disciplina, alguns teóricos poderiam ser considerados como precursores, como Maquiavel (1469 - 1527) e Montesquieu (1689 - 1755). Há outros que recuam ainda mais no tempo e consideram que os esforços para entender a sociedade e o seu desenvolvimento desde a Antiguidade poderiam ser considerados Sociologia, e dessa forma, ela seria uma das mais velhas e inclusivas de todas as ciências. Exageros à parte, foi somente em meados do século XIX que o estudo científico dos fatos humanos em sociedade começou a se constituir efetivamente como Sociologia. Como nessa época os métodos das ciências naturais exerciam grande influência, essa fase inicial é dominada pelo método das ciências naturais. Deve-se destacar que um grupo de pesquisadores ficou inquieto, defendendo a necessidade de se trabalhar as questões sociais a partir de metodologia própria, isto é, de algo que considerasse a experiência humana e não de algo externo ou determinístico. Em meio a essas tensões, um novo campo do saber começou a emergir.
A história da Sociologia não pode ser contada sem considerar a história europeia, o berço do seu surgimento. A Europa estava passando por  transformações sociais, culturais, econômicas, etc., e para as novas questões se necessitavam respostas à altura. A partir de modelos teóricos desenvolvidos pelas ciências naturais, especialmente o proposto pelo cientista inglês Charles Darwin, surge uma nova forma de pensar: evolucionista. 
O darwinismo defende que a seleção natural pressiona as espécies no sentido da sua adaptação ao ambiente, obrigando-se a se transformar continuamente com a finalidade de se aperfeiçoar e garantir a sobrevivência. Para se adaptar criam-se formas mais complexas e avançadas de vida, que possibilitam, pela competição natural, a sobrevivência dos seres mais aptos e evoluídos. Aplicada à nascente Sociologia, tivemos o darwinismo social. Segundo essa corrente, as sociedades se modificam e se desenvolvem de forma semelhante, segundo um mesmo modelo e que tais transformações representam sempre a passagem de um estágio inferior para outro superior, em que o organismo social se mostraria mais evoluído, mais adaptado e mais complexo. Esse tipo de mudança garantiria a sobrevivência dos organismos – sociedades e indivíduos – mais fortes e evoluídos.
Essa forma de pensar acabou produzindo um comportamento negativo, conhecido como etnocentrismo*. Ocorre quando um determinado indivíduo ou grupo de pessoas, que têm os mesmos hábitos e caráter social, discrimina outro, julgando-se melhor, seja pela sua condição social, pelos diferentes hábitos ou manias, ou até mesmo por uma diferente forma de se vestir. Na história, acreditando na superioridade de sua cultura, os europeus intervieram nas formas tradicionais de vida existentes nos outros continentes, procurando transformá-las. Eles percebiam a África, Ásia, América e Oceania como “fósseis vivos”, “primitivos” e atrasados. Tais sociedades foram reorganizadas nos moldes capitalistas. Essa visão distorcida em relação a povos de outra cultura ainda persiste, como o que se pode ver em relação aos  povos indígenas, refugiados, imigrantes, entre outros.
A explicação aparentemente “científica” que justificava a intervenção europeia em outros continentes era incapaz de explicar as dificuldades pelas quais passava a Europa. Já naquela época os frutos do progresso não eram igualmente distribuídos e nem todos participavam das benesses da civilização. Inúmeros movimentos de reivindicação de camponeses e operários provam isso. Como consequência podemos dizer que a transposição de conceitos físicos e biológicos para o estudo das sociedades e do comportamento humano promoveu desvios interpretativos graves, perpetuando preconceitos e interesses particulares. As diferentes culturas não constituem uma espécie biológica.
Essas ideias tiveram boa aceitação no século XIX, época de expansão europeia sobre o mundo, e permaneceram vivas e atuantes depois da Segunda Guerra Mundial, supostamente como justificativa para libertar as nações mais fracas das forças conservadoras, implantando modelos mais avançados de vida política e econômica. As relações entre etnias e nações ainda tem um resquício do darwinismo, como as intervenções diretas e arbitrárias dos EUA em diferentes países. Também movimentos nazifascistas que justificam a violência física, política e ideológica contra estrangeiros e etnias.
Outro grupo dependente da relação com as ciências biológicas ficou conhecido como “organicistas”, pois procuravam pensar a sociedade como um organismo vivo. Eles procuravam características universais da espécie humana, deixando de lado suas particularidades. Procuravam criar uma identidade entre leis biológicas e leis sociais, hereditariedade e história. Os principais expoentes foram: Albert Schäffle, Herbert Spencer, Alfred Spinas, Charles Montesquieu e Aléxis de Tocqueville.
A Sociologia, no entanto, só atingiu o grau de sistematização disciplinar sob influência do positivismo. Este foi o primeiro a definir o objeto, a estabelecer conceitos e uma metodologia de investigação, além de, apontar a especificidade do estudo científico da sociedade. O principal representante e sistematizador foi Auguste Comte (1798-1857).  O positivismo* reconheceu a existência de princípios reguladores do mundo físico e do mundo social.
O nome “positivismo” tem sua origem no adjetivo “positivo”, que significa certo, seguro, definitivo. Como escola filosófica, derivou do “cientificismo”, isto é, da crença no poder dominante e absoluto da razão humana em conhecer a realidade e traduzi-la sob a forma de leis para reger o homem, a natureza e o universo. Pretendia-se substituir as explicações teológicas, filosóficas e de senso comum, que até então explicavam a realidade.
Antes de ser “sociologia”, foi definida por Comte como “física social”. O método inicial era considerar a sociedade como um organismo coeso e harmônico. Daí ficou conhecido também como “organicismo”. Procurava resolver os conflitos sociais por meio da exaltação à coesão, à harmonia natural entre os indivíduos, ao bem-estar do todo social. Foi o pensamento que glorificou a sociedade europeia do século XIX, em franca expansão.
Ao longo da disciplina você conhecerá outras correntes sociológicas, passando pelas clássicas até as sociologias contemporâneas. 
Aula 2 - Sociologia clássica: Émile Durkheim
Objetivo: compreender o conceito de fato social e sua importância na sociologia durkheimniana.
Olá, tudo bem?
Ao longo das próximas três aulas, daremos uma olhada panorâmica nos chamados clássicos da sociologia: Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber. Nesta aula, nos concentraremos no primeiro dos grandes clássicos, o francês Émile Durkheim. Destacaremos aquele que, seguramente, é um dos seus principais conceitos e que, de alguma forma, constitui-se no principal objeto da pesquisa sociológica:os fatos sociais.
O objeto da sociologia durkheimiana são os fatos sociais. Estes têm três características fundamentais:
Coerção: exercem força sobre os indivíduos, levando-os a conformar-se às regras da sociedade em que vivem, independentemente  de sua vontade e escolha. O grau de coerção de um fato social* pode ser identificado pelas sanções sociais que ele provoca. As sanções podem ser legais e espontâneas.
São exteriores aos indivíduos (independem de sua consciência particular): existem e atuam sobre os indivíduos independentemente de sua vontade ou adesão consciente.
Generalidade: é social todo fato que é geral. Isto é, que se repete em todos os indivíduos ou, pelo menos, na maioria deles.
Émile Durkheim 
(1858-1917)
Nasceu em Epinal na Alsácia, descendente de uma família de rabinos. Iniciou seus estudos filosóficos na Escola Normal Superior de Paris, indo depois para a Alemanha. Lecionou Sociologia em Bordéus, primeira catedra dessa ciência criada na França. Transferiu-se em 1902 para a Sorbonne, para onde levou inúmeros cientistas, entre eles seu sobrinho Mareei Mauss, reunindo-os num grupo que ficou conhecido como escola sociológica francesa. Suas principais obras foram: Da divisão do trabalho social, As regras do método sociológico, O suicídio, Formas elementares da vida religiosa, Educação e Sociologia, Sociologia e filosofia e Lições de Sociologia (obra póstuma). Paris.#001
A seguir apresentaremos algumas citações da obra As Formas elementares de vida religiosa (Paulinas, 1980) que ajudarão na apresentação do pensamento durkheimiano.
Sobre o que é uma sociedade:
“A própria maneira pela qual se formam umas e outras completa a diferença. As representações coletivas são o produto de uma imensa cooperação que se estende não apenas no espaço, mas no tempo; para produzi-las, uma multidão de espíritos diversos se associaram, misturaram, combinaram suas ideias e seus sentimentos; longa série de gerações acumularam aí a sua experiência e o seu saber. Uma intelectualidade muito particular, infinitamente muita mais rica e mais complexa que a do indivíduo aí está como que concentrada.”#002
“[...] O homem é duplo. Há nele dois seres: um ser individual que tem sua base no organismo e cujo círculo de ação encontra-se, por isso mesmo, estreitamente limitado, e um ser social que representa em nós a mais alta realidade, na ordem intelectual e moral, que possamos conhecer pela observação, ou seja, a sociedade."#003
“Não se pode deduzir a sociedade do indivíduo, o todo da parte, o complexo do simples. A sociedade é uma realidade sui generis; tem suas características próprias que não são encontradas, ou que não são encontradas sob a mesmo forma, no resto do universo. As representações que a exprimem têm, portanto, um conteúdo completamente diferente das representações puramente individuais, e podemos estar seguros, de antemão, que as primeiras acrescentam alguma coisa às segundas.”#004
Durkheim teve e continua tendo grande influência na Sociologia. Foi a partir da tradição durkheimiana que surgiram as formulações funcionalistas, como as ideias de “função” e “totalidade” (interconexão entre o todo e as partes, as partes e o todo), que depois deram origem às abordagens sistêmicas. Até certo ponto toda sociologia que dá mais ênfase ao organismo social (à sociedade) do que à ação social* dos indivíduos tem algum nível de relação com a tradição durkheimiana.
Na próxima aula estudaremos outro autor, um nome que ainda hoje gera polêmicas por conta das suas opções políticas. No entanto, sua contribuição teórica é muito rica e instrumental. Estamos falando de Karl Marx.
Aula 3 - Sociologia clássica: Karl Marx
Objetivo: conhecer de forma panorâmica as principais contribuições e conceitos da obra de Karl Marx. 
Olá, tudo bem? 
Em continuidade ao estabelecimento de uma visão panorâmica dos chamados clássicos da sociologia, nesta aula nos ocuparemos com o alemão Karl Marx. Mas, quem foi Marx?
O QUADRO, À ESQUERDA, OFERECE UMA VISÃO BIOGRÁFICA SINTÉTICA DA VIDA DE MARX.
Curiosamente, no passado muitos acreditavam que Marx não tinha qualquer relevância para a sociologia e isso se devia, em grande medida, ao fato de que, em geral, ele era tido por um economista, um filósofo, até um revolucionário, mas não um sociólogo, em sentido rigoroso. É claro que à época de Marx não havia uma ciência da sociedade, apenas o nome “sociologia”, cunhado por Augusto Comte por volta de 1830. Já que sua formação tinha se dado em outras áreas, é claro que dificilmente ele seria enquadrado dentro de uma área que ainda não estava consolidada enquanto ciência.
Capitalismo e força de trabalho
Para Marx, o capitalismo surge das desigualdades sociais, a partir das quais uma enorme quantidade de riquezas se concentra nas mãos de uns poucos indivíduos que possuem as possibilidades de acumular bens e obter cada vez mais lucros.#005 
Em linhas gerais, para Marx, o capitalismo é responsável pelo assalariamento (relação de compra e venda de trabalho) que, em sua opinião, trata-se de uma relação social fundamental. Para ele, essa relação não é natural, teve que ser inventada. Tal relação se dá entre a indústria — que é aquela que detém os meios de produção — e alguém que oferta sua capacidade de trabalho. Esta, então, é vendida para aquela. Por exemplo: digamos que alguém, um metalúrgico, procure uma indústria automobilística em busca de emprego. Esse trabalhador, obviamente, não pode produzir um carro em casa, pois não dispõe dos meios de produção: não dispõe da matéria-prima (digamos o aço com o qual se fará o carro, as peças, os parafusos, etc.); também não dispõe das ferramentas, como os tornos, as parafusadeiras, as máquinas de corte e usinagem, etc. Nesse caso, a indústria, então, disponibiliza a matéria-prima e as ferramentas necessárias e o trabalhador disponibiliza sua força de trabalho. Apesar de ser uma relação de troca, a crítica de Marx é a de que os capitalistas colonizaram os meios de produção e, portanto, controlam toda a força de trabalho.
A questão de Marx, então, se coloca da seguinte forma: como se explica essa dinâmica extraordinária de uma sociedade que se transforma de uma forma revolucionária em função de mudanças econômicas que são geradas por uma classe específica e dominante, que é a classe dos capitalistas, ou seja, a classe burguesa?
Já que no capitalismo o trabalhador vende sua força de trabalho para o empresário capitalista que a compra, pode-se dizer que o trabalho é livre, afinal, trata-se de uma sociedade baseada na propriedade privada e nos meios de produção. Nesse sentido, essa sociedade é fundamentalmente organizada em função da produção de mercadorias. Isso também resulta em um trabalho que se transforma em mercadoria nessa relação de trocas. Para Marx, então, o “trabalho” -- visto numa perspectiva capitalista -- é  uma categoria construída historicamente a partir da qual é o trabalho livre e a venda da força de trabalho que move a estrutura social.
Numa sociedade capitalista, pois, o trabalho se transfigura em mercadoria e, para que ele se apresente sob essa forma, é necessário que ele seja empregado em coisas que possam satisfazer necessidades de qualquer natureza. Obviamente, essa força de trabalho que é consumida, gera prazer a alguns e acúmulo de lucro a outros.
Deve-se ressaltar que Marx não fala tanto de produção, de trabalho, mas no modo de produção e na maneira como se organiza isso. Ou seja, Marx quer saber que tipo de relações sociais está em pauta quando consideramos determinada maneira de se produzir algo que usa recursos, tecnologias, matérias-primas, capitalistas e trabalhadores. E é por seu interesse no “subsolo”, que Marx se coloca como um pensador da suspeita (Paul Ricouer), afinal, não se interessa apenas naquelas relações que se fazem notórias por estarem à nossa volta, mas, sobretudo, nas relações que se escondem no modo como se apresentam as coisas na sociedade em que vivemos; para ele, ao percebermos as relações escondidas, entendemos melhor aquelas que estão à nossa volta. Apesar de não sersociólogo em sentido estrito, Marx é o mais sociológico dos grandes clássicos. 
Capitalismo X Socialismo
Percebe-se que para Marx o capitalismo é uma criação histórica da burguesia. Ao colocar na fábrica os trabalhadores que não dispõem dos meios de produção, o capitalismo é obrigado a trazê-los para perto e organizar esse conjunto disperso de trabalhadores em função da produção. Resultado: muito além de meros produtos materiais, de mercadorias, o capitalismo, na verdade, produz uma nova configuração social, produz, portanto, uma nova classe, e é a luta de classes o que constitui, para Marx, o motor da história. Ele sugere, assim, que se o capitalismo produz uma nova classe que, rebelando-se contra a ordem vigente, é capaz de se orientar e organizar seus próprios interesses à revelia de qualquer compromisso com a manutenção dessa ordem capitalista, isso significa também a possibilidade de tal classe fazer valer sua capacidade e seus interesses. Inevitavelmente isso faria surgir um novo tipo de sociedade, o socialismo, no qual apostava Marx. O socialismo, então, seria a plena realização da ideia de sociedade que, no dizer de Marx, significaria a associação livre de pessoas livres, não sujeitas a qualquer tipo de dominação externa. Ou seja, o socialismo seria a materialização do modelo ideal de sociedade para Marx.
Deve-se fazer uma distinção entre o pensamento de Marx e as correntes de pensamento, chamadas marxistas, que nasceram no século XX. Nesse sentido é que alguns estudiosos optam pela distinção entre pensamento marxiano (o pensamento de Marx) e pensamento marxista (o pensamento advogado pelos seguidores e intérpretes de Marx). Inspiradas nos pensamentos de Marx é que todas as correntes marxistas prometem lutar por uma sociedade na qual pessoas não sejam exploradas por pessoas. Não se pode deixar de notar, entretanto, as dificuldades na materialização histórica das ideias marxistas. Em 1917, por exemplo, a Revolução Russa, inspirada no marxismo, procurou colocar essas ideias em prática. Em 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial, juntaram-se à União Soviética países do Leste Europeu, e esse grupo de países passou a se chamar “Cortina de Ferro”. Dentre os países que fizeram parte desse bloco, encontrava-se metade da Alemanha de Marx. A queda do Muro de Berlim, em 1989, simbolizou o fim da União Soviética, 72 anos depois de sua criação, e, consequentemente, o aborto dessa materialização do projeto socialista. Ou seja, a primeira tentativa histórica de materializar as ideias de Marx não funcionou.
Marx e a educação
Karl Marx não realizou nenhuma reflexão sistemática a respeito da educação. Entretanto, o tema se constitui pano-de-fundo de toda sua obra, “visto que a crítica à estrutura do capitalismo e a proposição de uma nova ordem social implicam a transformação tanto da sociedade quanto da subjetividade dos sujeitos que nela atuam”.#006 Tanto Marx quanto os seus seguidores e intérpretes desenvolveram uma visão crítica sobre os limites da educação na sociedade contemporânea, vista, é claro, para além dos limites do contexto escolar.  Para eles, deveria ser colada sob suspeita toda educação que fosse inclinada para a reprodução das condições já dadas de vida social.
Já que mesmo a educação não está imune às relações e determinações sociais, econômicas, políticas e ideológicas que estão presentes no modo de produção capitalista, na perspectiva de Marx e seus seguidores ela deveria ser suficientemente comprometida em criar indivíduos capazes de ir além, de transcender essa ordem capitalista. A organização escolar, nesse sentido, se estrutura para dar manutenção às condições de reprodução dessa estrutura e, consequentemente, fortalecê-la. Nessa perspectiva, qualquer treinamento com vistas à qualificação da força de trabalho, comum no dia-a-dia da carreira de um trabalhador, passa, inevitavelmente, por uma educação ideológica. Numa sociedade na qual o trabalho foi fragmentado — como fragmentados foram também os trabalhadores — e o sistema* escolar se estrutura para consolidar isso, necessita-se superar a divisão do trabalho e a propriedade privada e a colonização dos meios de produção.
A
O que Marx pensaria do mundo de hoje? O que ele diria do cumprimento de algumas de suas previsões? Algumas incluem:
1) as relações sociais se mercantilizaram;
2) o ser humano não só produz, mas também se tornou mercadoria;
3) a mais-valia se realiza de uma forma brutal;
4) aconteceu a fusão do capital financeiro com o capital industrial;
5) Consequentemente, ampliou-se as relações de dominação.
Por outro lado, o que ele diria sobre as experiências socialistas que falharam? Haveria algum vácuo a se preencher entre a crítica teórica e sua efetiva materialização na história?
Aula 4 - Sociologia clássica: Max Weber
Objetivo: Compreender os conceitos de ação social, tipos ideais e tipos de dominação na sociologia de Max Weber.
Max Weber
(1864-1920)
Foi na cidade de Erfurt que nasceu Max Weber, numa família de burgueses liberais. Desenvolveu estudos de direito, filosofia, história e sociologia, constantemente interrompidos por uma doença que o acompanhou por toda a vida. Iniciou a carreira de professor em Berlim e, em 1895, foi catedrático em Heidelberg. Manteve contato permanente com intelectuais de sua época, como Simmel, Sombart, Tönnies e Georg Lukács. Na política, defendeu ardorosamente seus pontos de vista liberais e parlamentaristas e participou da comissão redatora da Constituição da República de Weimar. Sua maior influência nos ramos especializados da Sociologia foi no estudo das religiões, estabelecendo relações entre formações políticas e crenças religiosas. Suas principais obras foram: Artigos reunidos de Sociologia da Religião, Artigos reunidos de teoria da ciência, Economia e sociedade (obra póstuma) e A Ética protestante e o espírito do capitalismo. Morreu em Munique.#007
Olá, como vai?
Já vimos dois dos três grandes clássicos da Sociologia: o francês Émile Durkheim e o alemão Karl Marx. Nesta aula nos dedicaremos a dar uma olhada, também panorâmica, em alguns dos principais conceitos proposto pelo alemão Max Weber. É possível dizer que, em certo sentido, a sociologia de Weber se aproxima mais da de Marx, enquanto se contrapõe mais a de Durkheim. Entre outros motivos, essa relação de proximidade e distanciamento entre os autores se justifica na medida em que tanto Marx quanto Weber procuram se distanciar muito mais do positivismo em relação ao qual a Sociologia de Durkheim ainda se mantém dependente.
Nesta aula, nos concentraremos nos conceitos de ação social* , tipos ideais* e tipos de dominação*.
Aula 5 - A perspectiva dos clássicos sobre religião
Objetivo: Conhecer de maneira panorâmica a perspectiva de Durkeim, Weber e Marx sobre o papel da religião na sociedade.
Olá, tudo bem?
Nesta aula queremos responder, de forma sintética, é claro, a seguinte pergunta: como os chamados clássicos da Sociologia — refiro-me a Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx — compreenderam o papel da religião na sociedade? lá?
Émile Durkheim
Na obra “As formas elementares da vida religiosa”, Émile Durkheim considera a religião como um elemento fundante da vida social. Nessa obra seu objetivo é “estudar a religião mais primitiva e simples atualmente conhecida, fazer a análise dela, tentar sua explicação”. Durkheim considera que a ciência não substitui a religião, já que parece haver algo eterno na Religião. Então, longe de substituí-la, sua função é estuda-la. E é por isso que ao longo da obra ele visa buscar a origem da vida social e, para isso, pesquisa profundamente o Totemismo* de povos primitivos na Austrália. Sua intenção é a busca pelo universo ideológico que deriva do fenômeno religioso e é em função desse interesse que ele articula as representações de tempo, espaço e morte a partir do estudo de instituições que, para ele, possuem uma consciência coletiva. A conclusão de Durkheim é que as representações religiosas, que se fazem por meio de seus ritos, são eminentemente coletivas. Ou seja, a religião deve servista como algo primordialmente social, produto da coletividade.
Max Weber
A relação de Weber com a religião pode ser vista, por exemplo, em uma de suas principais motivações no estudo da Sociologia: entender as relações entre economia e religião. Weber reconhece que o capitalismo é uma força significativa no contexto da realidade social moderna, embora evite concluir que a origem das dinâmicas sociais tenha apenas uma matriz. Nesse sentido, Weber difere de Marx. Essa relação entre o econômico e o religioso é trabalhada principalmente em sua obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”. Ao contrário do que costumeiramente se diz, nessa obra Weber não afirma necessariamente que a religião é o fator causal que determina o desenvolvimento econômico. O que lá é afirmado é que há um relacionamento de afinidade eletiva entre certas formas religiosas e o estilo de vida capitalista. Embora ele não defina o que seja afinidade eletiva, de seus escritos pode-se deduzir que ele se refere a um tipo de relacionamento de atração mútua que conduz a certa simbiose cultural. Ou seja, tanto a consciência econômica é condicionada por um conteúdo específico da fé religiosa, quanto o estilo de vida capitalista condiciona a religião. A realidade social moderna é, então, determinada tanto pelo capitalismo quanto pelo fator religioso. É nesse sentido que Weber afirma que o protestantismo calvinista estabelecia determinados objetivos existenciais e pregava um tipo de moral ascética, bem como a mensagem de que o sucesso na profissão é um sinal da predileção divina, elementos tais que favoreciam a acumulação de capital. Como tal moral impedia que se gozasse das riquezas adquiridas, o fiel era induzido a reinvestir as riquezas adquiridas. Segundo Roberto Cipriani, “Max Weber se detém especialmente sobre as éticas do calvinismo, do pietismo, do metodismo e das seitas batistas, salientando o papel da eleição por meio da graça, das regras de vida, mas principalmente da predestinação”.#008
Karl Marx, Friedrich Engels e os marxistas
Marx não se debruça muito em torno do tema da religião, embora seja possível extrair de seus escritos algumas de suas opiniões. Também deve-se notar que boa parte da comum oposição percebida entre as igrejas e o marxismo e a repressão da religião em países socialistas tem mais a ver com uma tradição vulgarizada do marxismo que nos foi legada, do que propriamente com as afirmações de Marx e Engels. Não se pode negar, entretanto, que essa tradição histórica começou a mudar já a partir da Segunda Guerra Mundial, no movimento de resistência ao nazismo e ao fascismo em torno do qual congregaram-se militantes comunistas juntamente com militantes cristãos. Do lado cristão, tal movimento incluiu, por exemplo, a militância dos padres operários na França e o engajamento político de um setor significativo da igreja, especialmente na América Latina, em defesa dos pobres e oprimidos. Tais fatos certamente implicam numa mudança que desde então tem ocorrido na teoria e prática marxistas sobre a religião.
Inicialmente, influenciado por outro autor alemão, o filósofo Ludwig Feuerbach, Marx aceita o fato de que “é o homem que faz a religião”. Mas, avança em sua crítica perguntando pela razão dessa projeção. Sua conclusão é a de que o ser humano não pode ser compreendido fora do mudo, ao contrário, ele forma a sociedade, o Estado, e são estes que produzem a religião, produzem, portanto, uma consciência invertida do mundo. Em sua obra, “Contribuição à crítica da filosofia do direito de Hegel” (1843), Marx afirma: “A miséria religiosa constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e o protesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração, assim como o espírito de estados de coisas embrutecidos. Ela é o ópio do ”.#009 Portanto, é a miséria do mundo e a alienação humana que produzem a necessidade de religião. Entretanto, para Marx, a religião é tanto a expressão do mundo real quanto um protesto contra esse mundo; a angústia religiosa é tanto a lamentável legitimação das condições existentes quanto um protesto contra elas.
Pense: em que medida a religião praticada em nossas igrejas se exprimem como ópio? Ou seja, em que medida elas apenas espelham as desigualdades sociais ou, por outro lado, são um legítimo protesto contra o mundo em favor da transformação social?
Em escritos posteriores Marx amplia sua percepção de religião como alienação para uma compreensão de religião como ideologia. Entretanto, como ele acredita que as ideias não existem autonomamente, mas, se explicam a partir do modo como as pessoas produzem os bens materiais, suas bases de fundo permanecem as mesmas: a religião torna-se o reflexo ilusório das relações de dominação de classe; torna-se o reflexo das relações de exploração. As ideias religiosas, nesse sentido, “exprimem, justificam e escondem a realidade da dominação. A religião é ideologia, falsa consciência”.#010 
Tanto Friedrich Engels quanto vários autores marxistas que se seguiram, tais como, Kautsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci e outros, abrem mão de uma análise da religião considerada de modo geral, para abordá-la a partir do modo como se manifesta concretamente na história. Nesse novo interesse pela religião, muitos se põem a investigar o cristianismo primitivo e logo acham semelhanças entre os primeiros cristãos e os socialistas. Para a maioria desses autores, não interessa mais a essência da religião, se ela é falsa ou verdadeira, mas se historicamente exerce seu papel libertador, se age contra ou a favor da transformação social.
Aula 6 - Sociologia da Religião
Objetivo: Compreender a religião como fenômeno social e distinguir a abordagem sociológica da religião de outras abordagens.
Olá, tudo bem?
Vamos nos concentrar em oferecer uma visão bastante sintética e introdutória do campo da Sociologia da Religião. Queremos responder à pergunta: quando falamos de Sociologia da Religião, do que realmente estamos falando? Então, mãos à obra!
Sociologia da Religião: do que estamos falando? 
A Sociologia da Religião obviamente não é a única área do saber humano que se propõe discutir o tema da religião. Além dela, outras disciplinas se debruçam sobre a religião, tais como a Filosofia da Religião, a Fenomenologia da Religião, as Ciências da Religião e a própria Teologia, dentre outras. A Teologia, por exemplo, em sua tarefa de pensar a religião, utiliza-se de algumas perspectivas para fazê-lo, que se diferenciam do trato sociológico. A fé é um pressuposto fundamental nessa forma de pensar a religião e, independentemente se consideramos o Cristianismo ou outra religião, quando nos referimos à fé como componente presente nessa análise, estamos indicando que esse conhecimento "teológico" se constrói, em grande medida, desde dentro, e não de fora. Ou seja, tal análise considera o próprio movimento interno e histórico, o modo como as comunidades de fé "construíram" suas liturgias, doutrinas, etc. O olhar é, em grande medida, a partir de dentro, a partir da maneira como os fiéis ao longo da história daquela determinada religião interpretaram sua relação com a divindade.
A Sociologia, por outro lado, considera a religião como um fenômeno social. Ou seja, preocupa-se em determinar a influência da religião na sociedade (na vida dos indivíduos e da comunidade) e a influência da sociedade na construção e manutenção das religiões. Nesse sentido, por um lado, deve-se manter à vista o fato e que a religião sempre foi de vital importância na configuração das sociedades, não sendo possível, portanto, uma compreensão de sociedade que desconsidere o papel fundamental das religiões e do sentimento religioso no tecido social. Por outro lado, também não se pode desconsiderar o fato de que toda religião (e todo indivíduo em sua experiência religiosa) é significativamente afetada pelo entorno social, o que significa que não existe uma religião “pura”, que sobreviva independentemente da configuração social. Então, como construção social, obviamente, areligião não pode ser vista sob o prisma da fé, como na Teologia. A religião na perspectiva da Sociologia é vista como empreendimento humano, afinal, enquanto fenômeno empírico, é assim que ela se manifesta. Numa perspectiva sociológica, portanto, omite-se aquele interesse em saber se a religião, de fato, é algo mais do que humana, já que seu corte é científico.  é  fora.
Aula 7 - Religião e Modernização
Objetivo: Obter uma primeira aproximação sobre as relações entre religião e modernidade e compreender o conceito de modernização.
Olá, tudo bem?
Nesta aula, queremos nos aproximar mais da religião e sua relação com a Modernidade. Na esteira dessa discussão, é de suma importância, por exemplo, discutirmos o conceito de modernização. lá?
Religião e sociedades modernas
Por que tomar como base de nosso estudo sociológico sobre a religião o tema das sociedades modernas? Por duas razões principais: (a) a Sociologia, enquanto disciplina científica, nasce e se desenvolve primariamente como sociologia da Modernidade, como esforço intelectual para compreender e descrever as transformações ocorridas na Europa ao longo dos séculos XVII-XX; e (b) o conceito de religião, enquanto objeto da pesquisa acadêmica, é constituído na própria pesquisa sobre a Modernidade – os primeiros grandes sociólogos descreveram a Modernidade, em grande medida, em contraste com a religião – que, para eles, representava e encarnava o modo de pensar e os valores do mundo pré-moderno. Em vários escritos sociológicos clássicos, religião e modernidade são descritos como duas formas antagônicas de organizar a vida social – a religião descrita como uma forma arcaica*, tradicional e dogmática*, a modernidade descrita como uma forma nova, científica, progressista.
Escritos sociológicos da segunda metade do século XX oferecem, porém, um caminho alternativo para entender as relações entre religião e modernidade. Embora continuem constatando as diferenças entre essas duas formas de entender a realidade e organizar a vida social, há muito menos otimismo em relação ao sucesso do modo moderno de viver e menos preconceito em relação ao modo religioso de viver. Há claros sinais de que as mais recentes descrições sociológicas da religião não apresentam mais a religião e a modernidade como modos antagônicos, mas, sim, como diferentes descrições da realidade e da vida social – ambas com valores e limites, ambas historicamente situadas, ambas em constante mutação. Nosso estudo seguirá esta tendência mais recente da pesquisa sociológica.
Modernização
Para entendermos o modo de vida social descrito como Modernidade, precisamos analisar os processos sociais e históricos que, na Europa, resultaram no fim do modo feudal de organização sócio-política e no início do modo moderno, baseado nos direitos individuais de cidadania e na subordinação do Estado à Constituição e às leis. Esses processos podem ser descritos pelo termo modernização: “O conceito de modernização refere-se a um conjunto de processos cumulativos e de reforço mútuo: (1) à formação de capital e mobilização de recursos; (2) ao desenvolvimento das forças produtivas e ao aumento da produtividade do trabalho; (3) ao estabelecimento do poder político centralizado e à formação de identidades nacionais; (4) à expansão dos direitos de participação política, das formas urbanas de vida e da formação escolar formal e, (5) à secularização de valores e normas”.#011
Aula 8 - A Modernidade e suas características
Objetivo: Compreender os principais sócio-históricos que resultaram nas sociedades modernas.
Na aula anterior, vimos alguns aspectos relativos ao processo de modernização. A partir do momento em que compreendemos adequadamente esse processo, fica mais fácil perceber em que sentido se pode tomar aqui a expressão modernidade. Nesta aula, portanto, queremos entender melhor o que significa modernidade e, para isso, estudaremos alguns efeitos dos cinco processos sócio-históricos que deram luz às sociedades modernas. Entender a modernidade é de vital importância para entendermos a relação entre sociologia e religião.
Os cinco processos sócio-históricos, estudados na aula anterior, resultaram nas seguintes características das sociedades modernas, ou Modernidade:
1. A atividade econômica é caracterizada pela forma capitalista de organização, com predomínio da industrialização e massificação da produção e circulação de bens, reguladas pelo funcionamento do mercado, que gera estruturas alienantes e despersonalizantes de organização da atividade psíquica;
2. O modo capitalista de organização da economia demanda a profissionalização do trabalho, de modo que novas habilidades são necessárias para trabalhar na indústria e no comércio. Cria-se uma divisão de classes entre empresários e trabalhadores, na qual os primeiros detêm o Capital e influenciam decisivamente o poder político, e os segundos são obrigados a vender sua força de trabalho aos empresários. Como a relação capital-trabalho é predominantemente injusta, surgiram os movimentos de trabalhadores e os Sindicatos, que visam equilibrar os dois polos da relação econômica (capital-trabalho);
3. A vida sócio-política é caracterizada pelos Estados-nação democráticos, cuja legitimidade e funcionamento é baseada: (a) nas Leis, (b) na criação de estruturas burocráticas e impessoais de prestação de serviços, e (c) na forma representativa do governo (eleição), subdividido em três poderes (executivo, legislativo e judiciário). O Estado mantém relações tensas com o Mercado e com a chamada Sociedade Civil (a população em geral e os votantes em particular), pois cada um desses três elementos da sociedade se ocupa, em maior ou menor grau, dos modos de administrar, controlar e organizar a vida dentro das fronteiras nacionais. O Estado, semelhantemente, passa a definir a língua nacional e busca estabelecer uma identidade nacional hegemônica, que subordina as identidades parciais (religiosas, regionais, de gênero, de classe, etc.);
4. Em relação ao mundo feudal, crescem os direitos individuais de participação política e de liberdade individual, criando-se, assim, a forma moderna de cidadania – cada cidadão é portador de iguais direitos e deveres perante a Lei. Simultaneamente, a população dos Estados tende a migrar do campo para as cidades, modificando os modos tradicionais de relacionamento familiar, formação educacional, escolha de profissão – que se tornam cada vez mais individualizados e dependentes da identidade hegemônica promovida pelo Estado. Surge, então, a educação formal “universal”, para cidadãos infância, modo a e as novas habilidades para a econômica à população;
5. A moralidade e a vida religiosa são caracterizadas por um crescente pluralismo e desvalorização das tradições, acelerados pela escrita/leitura e pelos meios de comunicação de massa. A religião, em especial, deixa de ter o papel principal na organização da vida e na explicação do mundo (papel que possuía na Idade Média feudal), que passa a ser dividido com o Estado, com o Mercado e com a Ciência – mais recentemente, com a Mídia. Os valores tradicionais, sejam morais, sejam religiosos, são reformulados a partir da noção fundamental da ética moderna: a busca incessante do progresso econômico.
A Modernidade, portanto, é o nome que se dá ao conjunto de valores, conceitos, e representações do processo de modernização; é um estilo de vida que inicia na Europa e se torna mais ou menos mundial em sua influência. Ela se constitui a partir da pretensão de rejeitar a tradição, submetendo tudo ao exame crítico da razão e à experimentação, embora a tradição tenha persistido em muitas esferas da vida. A Modernidade possui uma tendência para dinamismo e mudança incessantes, questionando as suas próprias conquistas e buscando continuamente inovações científicas e econômicas. Marx e Engels, no Manifesto Comunista, conseguiram descrever a característica fundamental da Modernidade de modo brilhante em uma única frase: “tudo o que é sólido desmancha no ar”. Nesta frase “tudo o que é sólido” se refere às crençase tradições do mundo europeu pré-moderno, que acreditava na solidez, na durabilidade das estruturas sociais, políticas e culturais. Acreditava-se nessa durabilidade por que se pensava que essas estruturas eram criação de Deus. “Desmancha no ar” por que as sociedades modernas não mais acreditam no papel de Deus como criador e organizador da vida em sociedade. Toda a vida social, então, passa a ser vista como fruto da ação humana e as ações humanas só duram por um determinado período de tempo – logo, “desmancham no ar”.
Para terminar, é importante não nos esquecermos de que a expressão modernidade é polissêmica, ou seja, possui variados sentidos. Nesse caso, é fundamental que se preste atenção ao contexto em que o autor utiliza a expressão.
Aula 9 - Religião, Modernidade e Secularização
Objetivo: Entender a concepção de religião e o conceito de secularização dentro desse contexto.
Olá, tudo bem?
Na aula passada tivemos uma ideia inicial do que significa modernidade e isso se tornou possível, sobretudo, quando estudamos os cinco processos sócio-históricos que geraram as sociedades modernas. Nesta aula, queremos ver mais de perto a relação entre religião e modernidade. Queremos entender as mudanças ocorridas na concepção moderna de religião em relação ao ambiente pré-moderno. Para isso, um dos principais conceitos que precisamos visitar, neste momento, é o conceito de secularização. Então, mãos à obra!
A Sociologia a Religião
Religião, consequentemente, é o nome que a sociologia dava às crenças e práticas vinculadas à Igreja Católica Romana, única instituição religiosa legítima no continente europeu pré-moderno, e às crenças e práticas por ela condenadas como heresia, superstição ou feitiçaria. Nos tempos modernos, a religião é considerada como o principal inimigo da modernização e, consequentemente, da modernidade; de modo que ambas – religião e modernidade – coexistem de forma conflitiva e mutuamente destrutiva. Assim, os primeiros estudos sociológicos sobre a religião possuem marcas claras dessa atitude de antagonismo, de rejeição da religião, a qual existe ainda hoje em dia.
Essa atitude polêmica em parte se justifica, na medida em que, no período pré-moderno, o modo de vida hegemônico era configurado de acordo com a “cosmovisão” da Cristandade, cujas principais características eram:
(a) Fusão entre Igreja e Estado (Império), de modo que a monarquia era legitimada pela doutrina eclesiástica;
(b) Controle da produção intelectual (universitária) pela Igreja; 
(c) A ética sexual e familiar da Igreja era imposta às pessoas;
(d) Proibições “doutrinárias” afetavam as práticas econômicas e políticas, e não só as “religiosas”; e
(e) Visão geocêntrica (a Terra é o centro do Universo) e metafísica (há uma unidade espiritual de todas as coisas, que se explica pela revelação de Deus) do Universo – esta visão religiosa dificultava o avanço do pensamento científico nascente, que era mecanicista (o Universo não tem sentido, ele é apenas uma grande “máquina” cuja ordem e sentido são descobertos pela reflexão matemática e científica) e heliocêntrico (a Terra gira ao redor do Sol, logo ela não pode ser o centro do Universo).
Desta maneira, a noção predominante de religião nos primórdios da sociologia era negativa. A religião estava ligada ao pré-moderno e, mais ainda, ao anti-moderno, sendo caracterizada como:
(a) tradicional e estática (contra o progresso e o avanço), incapaz de mudanças significativas;
(b) conservadora politicamente, contrária à liberdade e à democracia;
(c) cheia de crenças e práticas metafísicas e irracionais, impossíveis de serem justificadas pelo argumento e pela ciência; e
(d) defende uma ética centrada no dever e na obediência à autoridade eclesiástica, contrária ao livre-arbítrio e à pluralidade de valores. 
Religião e Modernidade: secularização
A sociologia nascente nos tempos modernos previa o desaparecimento gradual da religião, como fruto de três fatores: o avanço científico, o progresso do conhecimento e a expansão dos regimes democráticos. O próprio Protestantismo – forma moderna de Cristianismo – foi concebido pelo sociólogo Max Weber como uma força anti-religiosa, aliada da modernização e, ele também, fadado ao desaparecimento. A única esperança de sobrevivência da religião seria a sua transformação radical em uma religião secular, irreligiosa, totalmente racional e moderna (e.g. a “religião racional” de Kant, ou a “religião positiva” de Comte). Por isso, nosso estudo sociológico da religião passará, agora, a apreciar a categoria sociológica da secularização.
A palavra secularização tem o significado básico de tornar secular (pertencente ao século, e não à eternidade) e se referia, no início do uso dessa palavra, à transferência de propriedades da Igreja para o Estado. Tornou-se, na sociologia, um termo técnico usado com os seguintes sentidos:
(a) Declínio da religião mediante o qual símbolos, doutrinas e instituições religiosas perdem seu prestígio e relevância, culminando em uma sociedade sem religião;
(b) Maior conformidade das pessoas a “este mundo”, mediante a qual a atenção se volta do sobrenatural para as exigências e problemas desta vida;
(c) Transposição de crenças e instituições religiosas para formas não-religiosas, moldando uma espécie de religião antropocêntrica; e
(d) O desacoplamento entre sociedade e religião, mediante o qual a religião se volta para sua própria esfera separada e torna-se uma questão da vida privada, interior, da pessoa.
Dos quatro sentidos acima descritos, o do desaparecimento da religião não tem mais validade sociológica. Ao se examinar a prática religiosa das sociedades modernas, percebemos que ocorreram, de fato, as transformações indicadas pelos quatro sentidos acima – mas ocorreram de modos diferentes em lugares e épocas diferentes. Por exemplo; na Europa o declínio da frequência às igrejas cristãs é muito maior do que nos Estados Unidos ou no Brasil.
Retirando desses quatro sentidos os elementos de predição do futuro da religião, podemos constatar que o processo de secularização possui três elementos nucleares que efetivamente se manifestam nas sociedades modernas:
(1) Diferenciação: o processo mediante o qual a religião e as instituições religiosas se diferenciam de outras esferas socioculturais;
(2) Racionalização: o processo mediante o qual, uma vez separadas da religião, outras instituições sociais operam com base em princípios racionais próprios; e
(3) Mundanização: o processo mediante o qual as pessoas se tornam menos preocupadas com questões transcendentais Retirando desses quatro sentidos os elementos de predição do futuro da religião, podemos  constatar que o processo de secularização possui três elementos nucleares que efetivamente se manifestam nas sociedades modernas e mais voltadas às questões intramundanas. Não devemos entender o termo “mundanização”, aqui, em sentido moral. Ele simplesmente expressa que as pessoas religiosas nas sociedades modernas são menos interessadas no céu, nos seres celestiais e na vida após a morte do que as pessoas religiosas das sociedades pré-modernas.
 
Desses três elementos nucleares podem ser extraídos seis elementos derivados:
(1) Autonomização: o processo mediante o qual as instituições sociais se tornam independentes da influência da religião – passam a funcionar de acordo com suas próprias regras e normas;
(2) Privatização: a religião torna-se cada vez mais uma questão privada, desvinculada das questões públicas (Mercado, Estado, etc.) – a não ser quando instituições, grupos ou outras subjetividades coletivas* consideram importante que aspectos da religião interfiram na vida pública;
(3) Generalização: a religião assume um papel social mais difuso, generalizado, ao mesmo tempo em que perde o seu monopólio moral-valorativo (por exemplo: a Igreja Católica continua defendendo apenas a prática natural de anti-concepção, entretanto, muitos católicos, fiéis à Igreja em outras questões, decidem sobre as formas de anti-concepção que utilizarão);  
(4) Pluralização: tornando-se matéria de escolhapessoal, as formas religiosas se multiplicam e relativizam seu próprio valor público e presença institucional – as Igrejas Cristãs têm de concorrer com novos movimentos religiosos, com religiões de outros continentes que se instalam no mundo ocidental, com novas formas de Igrejas Cristãs e com novas formas de espiritualidade e religiosidade institucionalizadas ou não;
(5) Cientização: os conceitos religiosos perdem a força explicativa da realidade natural, sendo substituídos - parcial ou totalmente - por conceitos científicos ou assemelhados (por exemplo: crentes na Criação e na Soberania de Deus, quando necessário, usam recursos científico-tecnológicos para resolver problemas pessoais, mesmo em casos em que se afirma que Deus tem a última palavra, como na concepção de filhos, mediante a utilização dos modos tecnológicos de fertilização); e
(6) Mercadorização: as crenças e práticas religiosas são ressignificadas como bens ou produtos a serem consumidos individualisticamente ou em grupo. No Brasil, por exemplo, um dos tipos de igrejas cristãs que mais cresce nos últimos vinte anos são as igrejas que pregam a “prosperidade” financeira como uma bênção de Deus (como exemplo da “mundanização” nessas igrejas podemos notar o desaparecimento da pregação sobre o “fim dos tempos” – para que esperar a volta de Jesus Cristo se já se pode ter o ”céu na terra”?
O conceito de secularização é muito importante para a compreensão das transformações religiosas ocorridas nos últimos trezentos anos nos continentes do hemisfério ocidental. Como todo conceito sociológico, porém, ele não deve ser entendido como a única explicação possível dos fenômenos sociais, nem mesmo como uma explicação abrangente – que explica a religião em sua totalidade. O processo de secularização das religiões no Ocidente não é uniforme, nem no tempo nem no espaço. Diferentes religiões, diferentes igrejas, em diferentes épocas e lugares, são afetadas de formas diversas pelo processo de secularização. Um bom exercício intelectual pode ser feito por você: analise a sua própria igreja e prática religiosa pessoal à luz dos elementos do conceito de secularização.
Aula 10 - Religião e Pós-Modernidade
Objetivo: Conhecer, de forma panorâmica, algumas características da chamada Pós-Modernidade e sua relação com a religião. 
Olá, tudo bem?
Espero que sua jornada pelos caminhos da Sociologia até aqui esteja sendo prazerosa. Aprendemos muito mais quando temos alguma relação significativa com aquilo sobre o qual estamos estudando. Mas, mesmo que tal relação não se construa, ainda assim é possível obter muitos benefícios dos conteúdos com os quais entramos em contato. De uma forma ou de outra, espero que essa experiência seja boa para você. 
Nas últimas aulas, vimos algumas características da Modernidade e as mudanças na compreensão de religião que a transição do período pré-moderno para o moderno acarretou. A Modernidade estabeleceu um novo lugar para a religião ao colocar o ser humano no centro. Entretanto, a Modernidade não entregou aquilo que prometeu, razão pela qual abre-se espaço para uma nova forma de compreender o mundo, especialmente as sociedades. É sobre essa nova cosmovisão e sua relação com a religião que trataremos nesta aula.
Modernidade e Pós-Modernidade
Vamos começar o nosso estudo sobre esse fenômeno chamado Pós-Modernidade dando uma olhada nos fatores que favoreceram o seu surgimento. Para isso, assista ao vídeo "Esgotamento da Modernidade e Advento da Pós-Modernidade":
A Pós-Modernidade
Após o final da II Guerra Mundial, cresce o reconhecimento de que algumas das promessas da Modernidade não puderam ser cumpridas:
* a barbárie (as duas Guerras Mundiais) no do mundo civilizado;
* o desenvolvimento científico produz, igualmente, melhorias na vida e a ameaça da destruição ecológica;
* a miséria, a , a desnecessária continuam existindo;
* a fé na capacidade da ciência resolver todos os problemas e fornecer definitivamente o sentido da vida se esvaiu;
* apesar da secularização, o Cristianismo e outras religiões continuam a fazer parte da vida cotidiana e do espaço público;
* a aposta nos projetos coletivos de mudança social dá cada vez mais lugar a visões individualistas da mesma.
Nosso tempo passa a ser chamado de Pós-Modernidade por alguns autores. Hoje em dia, porém, outros nomes também são usados para tentar descrever os processos de mudança social que produziram nosso mundo atual, os processos de pós-modernização:
Fim da história – o pós-modernismo radical, que desistiu de toda e qualquer explicação racional da história e da vida social e afirmou que não é possível nenhuma melhoria na vida humana social;
Hiper-modernidade – a afirmação de que vivemos a plenitude da modernidade: individualismo e consumismo plenos, o mundo vive a lógica da moda;
Modernidade inacabada – o reconhecimento de que o projeto moderno não se concretizou, mas é válido e pode ser aperfeiçoado, é algo pelo que se vale a pena lutar.
Não importa tanto o nome que usamos. Importa, sim, reconhecer que o modo “moderno” de organização da vida social e de explicação da realidade como um todo não mais tem a força que tivera até os anos 1950. Vivemos, assim, em uma época de transição da estruturação da vida em sociedade que afeta a vida humana como um todo, inclusive a prática da religião. Em tempos de transição, várias incertezas tomam conta da sociedade, da política, da cultura, das ciências, da economia e da religião também. Cabe à sociologia tentar explicar as mudanças ocorridas e dar algum sentido ao novo tempo em que vivemos.
Há muitas formas de se entender a relação entre Modernidade e Pós-Modernidade. Eu gostaria de sugerir uma maneira que pode facilitar para aqueles que se sentem confusos diante dos variados sentidos disponíveis. Para isso, assista ao vídeo "Pós-Modernidade como ruptura e continuidade":
Aula 11 - Respostas Modernas ao Processo de Secularização
Objetivo: Descrever as principais formas "modernas" de resposta religiosa aos processos de secularização.
Olá, tudo bem?
Vimos nas aulas anteriores como o processo de secularização afetou as religiões no Ocidente. Entretanto, não estudamos como as religiões reagiram ao processo de secularização. Este será nosso tema: como as religiões, especialmente o Cristianismo, reagiram ao processo de secularização. Para facilitar a compreensão,   três . Nesta primeira, o foco recai sobre as respostas modernas; nas próximas aulas nos ocuparemos com as respostas pós-modernas. lá?
É a resposta que afirma que a religião está acima da Modernidade e não pode ser afetada por ela (a cultura aponta para o Transcendente, mas ele não está dentro dela). O transcendentalismo se manifesta de modo diferente em tradições religiosas distintas. Por exemplo: a Igreja Católica Apostólica Romana buscou (e ainda tem buscado, embora em menor grau e intensidade) restaurar a relação com o poder que mantinha no mundo pré-moderno, impedindo a secularização – em ouras palavras, se esforça para reestruturar o modelo de “Cristandade” (Igreja e Estado agindo em sintonia para estruturar e organizar a vida social). Algumas igrejas protestantes, através da doutrina e da pregação, tentaram (e ainda tentam) subordinar a ciência à “ortodoxia”, supervalorizaram a experiência subjetiva de fé que, por um lado “privatiza” as práticas religiosas, mas, por outro, tenta restaurar o lugar de primazia da religião sobre a racionalidade econômica e política.
Outra reação foi a tentativa de adaptar a religião à Modernidade, entendendo a modernização como algo positivo, um processo histórico dirigido por Deus. Por exemplo:
(a) a tentativa de criar formas de religião completamente “racionais” (Kant, Comte, etc.); 
(b) o desenvolvimento da crítica racional nos métodos de teologia e de exegese*, subordinando os conteúdos da fé aos achados científicos, levando à formação da chamada teologia liberal no séc. XIX e início do XX.
Apologética
Uma forma de explicar a relação entre religião e modernidade a partir da ideia do paradoxo (duas ordens opostas de vida, a serem seguidassimultaneamente), afirmando:
(a) a aceitação parcial dos conceitos e valores da modernidade, mas rejeitando o seu secularismo – e.g. Pascal (ICAR), Kierkegaard (Luteranismo), Heschel (Judaísmo);
(b) a aceitação dos valores humanísticos, mas rejeição da cosmovisão iluminista: conservadorismo protestante e anti-modernismo na ICAR, conservadorismo islâmico, ortodoxia judaica.
A religião é descrita como uma força crítica perante a Modernidade (o Transcendente experimentado no presente como força de transformação pessoal e social). Por exemplo:
(a) movimentos missionários marginais na ICAR e em denominações protestantes nos sécs. XVI-XIX (e.g. morávios, católicos no extremo oriente);
(b) o ecumenismo (CMI) e o evangelicalismo (WEF), que pregam, por um lado, a unidade “espiritual” das igrejas cristãs e, por outro lado, o papel crítico das igrejas na vida social, em defesa da justiça e da paz.
Aula 12 - Respostas Pós-Modernas ao processo de secularização
Objetivo: Descrever as principais formas "pós-modernas" de resposta religiosa aos processos de secularização. 
Olá, como vai?
Na última aula estudamos sobre algumas respostas modernas ao processo de secularização. Ou seja, como a religião se posicionou, em geral, ao fenômeno da secularização. Nesta aula, nossa atenção se voltará às respostas pós-modernas a esse mesmo fenômeno. Ou seja, de que formas a religião respondeu a esse processo? Focaremos, especificamente, em quatro "respostas": fundamentalismo, religiosidade consumista, naturalismo científico e a pós-secularização. Então, vamos lá!
Reforçando a rejeição da Modernidade no transcendentalismo, crescem os fundamentalismos religiosos: (a) islâmico: verdade exclusiva do Corão, aceitação de práticas violentas contra a modernidade; moralismo patriarcal exacerbado; (b) cristão: verdade exclusiva da doutrina do grupo fundamentalista; aceitação parcial de soluções violentas; moralismo patriarcal exacerbado.
O fascínio do fundamentalismo provém de sua promessa de emancipar os convertidos das agonias da escolha. Aí a pessoa encontra, finalmente, a autoridade indubitavelmente suprema, uma autoridade para acabar com todas as outras autoridades. [...] O fundamentalismo é um remédio radical contra esse veneno da sociedade de consumo conduzida pelo mercado e pós-moderna – a liberdade contaminada pelo risco [...] (um remédio que cura a infecção amputando o órgão infeccionado – abolindo a liberdade como tal, na medida em que não há nenhuma liberdade livre de riscos). O fundamentalismo promete desenvolver todos os infinitos poderes do grupo que [...] compensaria a incurável insuficiência de seus membros individuais, e justificaria, dessa maneira, a indiscutível subordinação das escolhas individuais a normas proclamadas em nome do grupo”.#012
Na esteira da ideia do fracasso da ciência na resolução dos problemas humanos, renasce uma busca religiosa consumista com as seguintes características principais:
* consumo de experiências e bens religiosos;
* hipervalorização do ;
* individualização da prática religiosa, desconfiada das instituições;
* compromisso com o bem-estar pessoal, não com um projeto altruísta – formando uma espécie de religiosidade da “auto-ajuda”:
São as incertezas concentradas na identidade individual, [...] a incerteza centrada na identidade não precisa nem das benesses do paraíso, nem da vara do inferno para causar insônia [...] Os homens e mulheres pós-modernos realmente precisam do alquimista que possa, ou sustente que possa, transformar a incerteza de base em preciosa auto-segurança, e a autoridade da aprovação é a pedra filosofal que os alquimistas se gabam de possuir. A pós-modernidade é a era dos especialistas em ‘identificar problemas’, dos restauradores da personalidade, dos guias de casamento, dos autores de livros de ‘auto-afirmação’: é a era do ‘surto de aconselhamento’. Os homens e mulheres pós-modernos [...] são selecionadores. E a arte de selecionar é principalmente em torno de evitar um perigo: o de perder uma oportunidade [...] Para evitar esse perigo, os homens e mulheres pós-modernos precisam de aconselhamento.  A incerteza de estilo pós-moderno não gera a procura da religião: ela concebe, em vez disso, a procura sempre crescente de especialistas na identidade. Homens e mulheres assombrados pela incerteza de estilo pós-moderno não carecem de pregadores para lhes dizer da fraqueza do homem e da insuficiência dos recursos humanos. Eles precisam da reafirmação de que podem fazê-lo – e de um resumo a respeito de como fazê-lo.#013
 
Científico
Desenvolve-se e se amplia a cosmovisão cientificista do mundo, na forma do naturalismo, que consiste em reduzir todos os fenômenos mentais ou espirituais a meros efeitos de fenômenos naturais. O naturalismo considera a religião como (a) resquício de fases inferiores do processo evolutivo do ser humano; (b) resposta inadequada aos desafios do ambiente que envolve o ser humano; e (c) obstáculo ao aperfeiçoamento evolutivo.
Alguns cientistas assumiram para si a missão de desmascarar a religião e levar a humanidade a viver sem qualquer tipo de religião ou religiosidade. Um dos principais líderes desse movimento, chamado de The new cultural wars (A Nova Guerra Cultural), é o biólogo Richard Dawkins, autor de vários livros panfletários contra a religião, supostamente embasados em argumentação exclusivamente científica. Um desses livros é Deus, um delírio, que assim foi resenhado por um cientista brasileiro:
O livro de Dawkins surge nesse contexto como uma espécie de grito de guerra, de chamado à mobilização geral. Basta, diz ele, de respeitar um conjunto de crenças que não é apenas improvável, como profundamente tolo e nocivo ao bem-estar humano. "a . Os ateus esconderam-se tempo demais nas catacumbas. Perseguidos, estigmatizados, envergonhados, cabe-lhes assumir a iniciativa do debate intelectual. Não é suficiente para Dawkins que se declarem "agnósticos" - e, na discussão desse termo, localiza-se talvez o ponto mais incisivo e original de sua argumentação. Um agnóstico, explica o autor, considera impossível responder se Deus existe ou não. Seja porque não surgiram até hoje provas convincentes de sua existência, seja porque essas provas seriam a rigor impossíveis de obter. A posição agnóstica não , , para Dawkins. O cientista agnóstico se contenta em deixar a questão sobre a existência de Deus no campo das coisas que não lhe dizem respeito. “Deus, um delírio” apresenta um argumento destinado a lançar a existência de Deus no campo das improbabilidades quase absolutas.#014 
Pós-Secularização
Reconhecendo a insuficiência das visões cientificistas para explicar a realidade da ação humana em sociedade, alguns sociólogos desenvolveram a noção de que já estamos vivendo em sociedades pós-seculares. Nessa visão, a secularização não é entendida como um processo linear e universalizante, mas como um dos vários processos históricos de aprendizagem cultural e sociológica. Entende que “a 'modernização da consciência pública' abrange de modo assíncrono tanto as mentalidades religiosas como as mundanas e as modifica de modo reflexivo. Ambas as partes (pessoas religiosas e não-religiosas), se concebem a secularização da sociedade como um processo de aprendizagem complementar, podem realizar suas contribuições aos temas controversos na esfera pública e levarem-se mutuamente a sério, também por motivos cognitivos.”#015
A compreensão pós-secular da sociedade vê as religiões como um fenômeno integrante da vida pessoal e social, evitando o juízo de valor sobre os conteúdos doutrinários das mesmas, evitando também a noção de que a religião possui uma superioridade na explicação da vida e seus mistérios. Reconhece a contribuição que as crenças e práticas religiosas podem oferecer tanto ao conhecimento da realidade, quanto à ação política na democracia. Espera que as pessoas religiosas reconheçam que as suas crenças religiosas não são a única explicação válida da vida, mas uma delas. Demanda que, no debate público, as crenças religiosas sejam traduzidas em linguagemsecular, e vice-versa, com vistas à possibilidade de se produzirem consensos politicamente viáveis na busca de solução para os principais problemas da vida social contemporânea.
O estudo sociológico das religiões está, à luz das discussões sobre a modernidade e a pós-modernidade, em aberto e em disputa. Por um lado, há as tendências seculares e as pós-seculares de compreensão do fenômeno religioso; por outro, há as tendências religiosas de compreensão do fenômeno religioso. Minha opção é pela tendência pós-secular; cabe a cada um de vocês escolher criticamente a sua própria resposta.
Aula 13 - Sociologias contemporâneas: Ação Comunicativa (Jürgen Habermas)
Objetivo: Apresentar a perspectiva habermasiana sobre as principais dimensões da ação humana e seu papel na vida social.
As principais teorias sociológicas da segunda metade do século XX foram construídas a partir de dois princípios teóricos fundamentais: (1) a virada linguística na filosofia, que afetou todas as ciências humanas – colocando no centro das preocupações metodológicas e da pesquisa empírica a comunicação humana através da linguagem; e (2) uma renovada compreensão do sujeito, da pessoa humana, não mais como um indivíduo isolado, mas como um sujeito intersubjetivo, cuja identidade e ação são moldadas pela interação com os outros através da linguagem. Esses dois princípios nos fazem analisar a sociedade como fruto da interação comunicativa entre as pessoas que vivem no mesmo tempo e espaço.
Empírica: Que está relacionado ao empirismo. Que se fundamenta na observação e na experiência, seguindo métodos ou não.
Nesta aula, estudaremos as dimensões da ação humana enquanto elementos fundantes da vida em sociedade, seguindo a teoria de Habermas.
Dimensões da ação humana em sociedade
A ação humana possui várias dimensões, das quais sete são as essenciais, na medida em que são, de certo modo, estruturantes da vida coletiva enquanto tal. Há várias tipologias e descrições da ação. A que apresentamos aqui se baseia principalmente na teoria da ação comunicativa de J. Habermas, mas procura ir além das suas propostas, tanto em busca de um aperfeiçoamento do conceito de ação por ele proposto, quanto em função dos interesses da elaboração teológica. Habermas, na Teoria da Ação Comunicativa, descreveu cinco dessas dimensões – embora as nomeie como conceitos de ação e os enumere como quatro, unindo a dimensão estratégica na ação teleológica – e aproveitaremos aqui, em parte, suas descrições, embora não aceitemos a terminologia de “conceitos”, nem pensemos na dimensão estratégica como uma subdivisão da dimensão teleológica, mas como uma dimensão sistêmica da ação, em contraste com a ação comunicativa, uma dimensão mundo-da-vida da ação.
A primeira dimensão da ação é a que denominamos intencional, ou, em linguagem mais tradicional, teleológica (com vistas a uma finalidade – vem do grego: telos = finalidade). Habermas a “Toda a ação é Uma ação pode ser definida como a concretização de uma intenção de um agente que escolhe e decide livremente. A ação apresenta uma estrutura teleológica na medida em que todas as ações-intenções têm por finalidade alcançar a realização de um objetivo preestabelecido”.#016 Exemplos desta dimensão são inúmeros e simples: tomar uma refeição é uma ação realizada com a intencionalidade básica de saciar a fome; cursar uma faculdade é uma ação realizada coma  intencionalidade básica de conseguir um diploma que qualifica para o exercício de uma profissão...
A segunda dimensão da ação é aquela que Habermas chama de: ação regulada por normas (normativa), e “se refere ... aos membros de um grupo social que orientam sua ação por meio de valores comuns. O ator particular observa uma norma (ou a viola) tão prontamente quanto em uma situação dada estejam presentes as condições às quais a norma se aplica. As um um grupo social. Todos os membros de um grupo sob uma determinada norma têm o direito de esperar uns dos outros que, em determinadas situações, se executem ou se omitam, respectivamente, as ações obrigatórias, ou as proibidas”.#017 Por exemplo: espera-se que um professor chegue pontualmente à sua aula, tenha a mesma preparada de antemão, relacione-se respeitosamente com os estudantes ...
A terceira dimensão da ação a ser aqui apresentada pode ser chamada de identitária. É aquela dimensão da ação mediante a qual o ator constitui a sua identidade, e acontece em dois âmbitos distintos: o individual e o coletivo. Como uma boa descrição da ação identitária coletiva, podemos seguir a terminologia habermasiana da ação dramática:
O conceito de ação dramática não faz referência, primariamente, nem a um ator solitário nem ao membro de um grupo social, mas a participantes de uma interação que constituem, uns para os outros, um público perante o qual se colocam em cena. O ator suscita em seu público uma determinada imagem, uma determinada impressão de si mesmo, ao revelar, mais ou menos de propósito, sua própria subjetividade. Todo agente pode controlar o acesso dos demais à esfera de seus próprios sentimentos, pensamentos, atitudes, desejos, etc., à qual ele tem um acesso privilegiado. Na ação dramática, os implicados aproveitam esta circunstância e governam sua interação regulando o acesso recíproco à própria subjetividade, a qual é sempre exclusiva de cada um. O conceito, aqui central, de auto-encenação, significa, portanto, não um comportamento expressivo espontâneo, mas uma estilização da expressão das próprias vivências, feita em função dos espectadores.#018 
Pense: Não se deve considerar a ação dramática como uma falsificação da identidade da pessoa que age. A fraude pode acontecer, mas o termo encenação usado na definição não possui significado valorativo.
Já a ação identitária individual, ou subjetiva, refere-se às interações do sujeito para consigo mesmo, mediante as quais constitui, não só a sua própria identidade, mas também a identidade do alter (outro), sempre no contexto de suas inter-relações sociais. “A experiência da pessoa é, assim e eminentemente, uma experiência integradora e sintética e tem lugar quando nos experimentamos, na unidade do mesmo ato, como inalienável interioridade (o Eu sou constituindo-se e exprimindo-se para-si nas categorias de estrutura) e como imperativo de abrir-se para a exterioridade do outro (o Eu sou constituindo-se e exprimindo-se para-outro nas categorias de relação). Nessa experiência, ao mesmo tempo a mais elevada e a mais profunda do nosso exercício de viver e, portanto, do nosso próprio existir – experiência do nosso existir pessoal – tem lugar em nós a síntese final da interioridade e da exterioridade como dialética constitutiva do nosso ser-no-mundo e da finitude do nosso ser espiritual”.#019 Como exemplos de ação identitária individual, temos a meditação, a fala consigo mesmo, o planejamento pessoal de vida, etc.
Aproveito a noção de habitus, desenvolvida pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu, para introduzir a quarta dimensão da ação: “O habitus é esse princípio gerador e unificador que retraduz as características intrínsecas e relacionais de uma posição em um estilo de vida unívoco, isto é, em um conjunto unívoco de escolhas ... Os habitus são princípios geradores de práticas distintas e distintivas ... mas são também esquemas classificatórios ... mas o essencial é que, ao serem percebidos por meio dessas categorias sociais de percepção, desses princípios de visão e de divisão, as diferenças nas práticas, nos bens possuídos, nas opiniões expressas tornam-se diferenças simbólicas e constituem uma verdadeira linguagem”.#020
A dimensão habitual (costumeira, ou tradicional), destaca os aspectos de conformidade social da ação, de uma forma similar à dimensão da ação regulada por normas. A diferença fundamental entre estas duas dimensões da ação é que a dimensão habitual é definida por Bourdieu como inconsciente, ou seja, como uma imposição de modos de ação não percebidos como impostos, enquanto a dimensão normativa se refere ao seguimento explícito, consciente, das normas de convivênciade um determinado grupo social. Um exemplo da dimensão habitual pode ser o da ação de vestir-se. As roupas que agentes sociais utilizam seguem as regras de seu contexto social mais significativo (normalmente não se usam numa igreja as mesmas roupas que se usam em uma praia), ou das situações sociais vividas (em um julgamento não se devem usar roupas caseiras). Bordiue afirma: “A teoria da ação que proponho (com a noção de habitus) implica em dizer que a maior parte das ações humanas tem por base algo diferente da intenção, isto é, disposições adquiridas que fazem com que a ação possa e deva ser interpretada como orientada em direção a tal ou qual fim, sem que se possa, entretanto, dizer que ela tenha por princípio a busca consciente desse objetivo”.#021 É comum pensarmos que usamos as roupas que queremos usar quando, na prática, usamos as roupas que nos permitem ficar mais bem situados em nosso grupo social.
As próximas dimensões da ação a serem discutidas têm, em comum na teoria habermasiana, a característica de funcionarem como meios de coordenação da ação coletiva em sociedade. A distinção entre essas dimensões somente faz pleno sentido no âmbito da visão bidimensional da sociedade de Habermas, mediante a qual se distinguem os aspectos interacionais dos aspectos sistêmicos da vida social. A última dimensão da ação não consta da teoria habermasiana. Incluo-a aqui como expressão de uma releitura teológica da teoria da ação comunicativa. Entendo a dimensão transcendental da ação como uma das dimensões da ação com função de coordenação da interação social, reconhecendo a necessidade de maiores estudos com vistas à sua integração mais segura em uma teoria sociológica de grande alcance como a habermasiana.
As dimensões ação
A quinta dimensão da ação é aquela forma de coordenação da ação coletiva fundada no interesse próprio e no exercício do poder sistêmico, e é denominada por Habermas de ação estratégica: “a ação teleológica se amplia e se converte em ação estratégica quando, no cálculo que o agente faz acerca de seu êxito, intervém a expectativa de decisões de pelo menos um outro agente que atua com vistas à realização de seus próprios propósitos. Este modelo de ação é amiúde interpretado em termos utilitaristas; então se supõe que o ator eleja e calcule meios e fins do ponto de vista da maximização da utilidade ou de expectativas de utilidade.”#022 Diferentemente da dimensão teleológica, a estratégica não é integrante de toda e qualquer ação humana, mas apenas daquelas ações que envolvem a participação de pelo menos mais um agente na realização dos propósitos de outro. Neste sentido, a dimensão estratégica da ação se opõe à comunicativa, uma vez que ambas são formas antagônicas de coordenação da ação coletiva.
Característica fundamental da dimensão estratégica da ação é a sua ancoragem na dimensão sistêmica da sociedade: “a transferência da coordenação da ação, da linguagem para os meios diretivos, significa um desacoplamento entre a interação e os contextos do mundo da vida*. Meios, tais como dinheiro e poder, vinculam-se a laços empíricos; eles codificam uma atitude racional-teleológica perante quantias calculáveis de valor e tornam possível exercer influência generalizada, estratégica, sobre as decisões de outros participantes, à medida que se desviam dos processos de comunicação orientada-para-o-consenso”.[1]
A forma de dirigir um culto pode exemplificar a dimensão estratégica da ação. O dirigente do culto, tomando proveito da boa-fé das pessoas participantes, pode direcionar seu comportamento ritual e suas emoções para a realização de objetivos e interesses pessoais (ou institucionais), manipulando a interpretação que a audiência faz de suas próprias necessidades e/ou interesses. Não é tão difícil, por exemplo, conseguir com que pessoas doem dinheiro à igreja, persuadidas de que essa doação irá resultar em ganho pessoal. 
A sexta dimensão da ação é a dimensão comunicativa (ou consensual): “ação comunicativa se refere à interação de, pelo menos, dois sujeitos capazes de linguagem e de ação que (seja com meios verbais ou não-verbais) estabelecem uma relação interpessoal. Os atores buscam chegar a um consenso sobre uma situação de ação para poder, assim, coordenar, sem reservas, de comum acordo, seus planos de ação e, com isso, suas ações. O conceito aqui central, o de interpretação, se refere primordialmente à negociação de definições da situação suscetíveis de consenso”.#023 Em outras palavras, a ação é comunicativa quando, para tomar uma decisão conjunta, as pessoas ou grupos sociais debatem sobre a situação, chegam a um consenso sobre a sua compreensão e tomam decisões baseadas nesse consenso, visando o benefício do maior número possível de pessoas afetadas por tais decisões.
No pensamento de Habermas, a dimensão comunicativa da ação recebe um lugar privilegiado, na medida em que: (a) é a dimensão da ação que tem o maior potencial para as transformações sociais em direção à justiça; (b) é aquela dimensão da ação que expressa mais adequadamente a racionalidade emancipatória[2] – comunicativa – que transcende o simples cálculo de interesses, e inclui as dimensões normativa e expressiva da razão. Desse modo, na interpretação da situação de ação são levados em conta dados provenientes não só do “mundo” objetivo (o planeta), mas também dos mundos social (as sociedades humanas) e subjetivo (as identidades pessoais); e (c) é a dimensão da ação que mais diretamente corresponde aos imperativos do mundo-da-vida. Coordenar comunicativamente a ação em sociedade significa agir, consensualmente, visando à plena emancipação humana. 
A ação comunicativa, nas sociedades complexas, não se dá apenas na interação pessoal imediata, mas também na interação pessoal mediada por instituições e movimentos sociais, e se configuraria como a forma mais adequada de coordenação democrática da ação coletiva. Um exemplo de coordenação comunicativa da ação coletiva são as assembleias de associações civis e/ou religiosas, nas quais um determinado tema é debatido por todos os membros da assembleia que o desejarem, e decisões são tomadas mediante a decisão baseada na argumentação oferecida pelos participantes.
A sétima dimensão da ação pode ser denominada de transcendental ou sagrada. Normalmente ausente das discussões sociológicas sobre a ação, em função de uma tendência anti-religiosa claramente presente nas teorias modernas da ação, esta dimensão é também constitutiva da ação humana em sociedade. Enquanto descrição da ação humana, que se pretende cientificamente adequada, a descrição da dimensão transcendental da ação não poderá ser feita a partir da ótica de uma confissão religiosa específica, mas a partir de uma noção laica de sagrado, e, especialmente, a partir de uma atitude crítica em relação à noção de secularização construída na modernidade. Vejamos como um acadêmico apresenta a presença da “religião” como um resto, um resquício de tempos não modernos:
Como impulso utópico e como consciência dos limites, a religião tem um lugar assegurado na sociedade do conhecimento. 'Com a passagem da nostalgia religiosa para a práxis social consciente', escreveu Horkheimer em 1935, 'sobrevive sempre uma ilusão, que pode ser refutada, mas não exorcizada... A humanidade perde a religião ao longo do seu caminho, mas ela não desaparece sem deixar vestígios. Em parte, os impulsos e desejos que a crença religiosa preservou se desprendem da forma que os tolhia e ingressam, como forças produtivas, na prática social'. #024
Henrique C.  de Lima Vaz, sacerdote católico e filósofo, procura analisar e definir o que ele denomina de ato espiritual que seria o ato humano por excelência, e do qual derivam as ações propriamente humanas.#025 [Seguindo a terminologia por mim adotada, seria melhor falar em ato transcendental ou sagrado]). O ato sagrado estrutura a ação humana a partir do binômio Inteligência e Amor, que orientam a ação humana para e sob os critérios da verdade e do bem, “em outras palavras: a abertura transcendental ao horizonte

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