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Aula 8 e 9 Novo II - Redação Instrumental

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CCJ0130 – REDAÇÃO INSTRUMENTAL 
AULA 6 : Narrativa dos Fatos e Construção de Versões
Profa Leila Medeiros
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Redação Instrumental 
Narrativa Jurídica
O Capítulo 2 procura fazer uma abordagem teórica da narrativa jurídica, afirmando
que o fato é um só, mas cada narrador ou representante legal da parte
mostrará a sua versão sobre ele de acordo com o seu intento defensivo ou acusatório,
isto é, cada um deles irá narrar o fato, dando-lhe uma versão, do modo
que lhe interessar.
OBJETIVOS
• Compreender como os recursos linguísticos auxiliam na apresentação dos fatos e constroem diferentes versões.
• Compreender a função da descrição no ato de narrar.
• Identificar a função do uso de modalizadores na narrativa jurídica.
• Selecionar fatos/versões e vocábulos que imprimam ao texto a função persuasiva.
• Compreender a importância da narrativa dos fatos, das provas, das versões lógicas e verossímeis sobre os fatos para a argumentação.
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2.1 Construção: Fatos e Versões
Analisa-se aqui a noção de fato, segundo a abordagem do pragmatismo filosófico, porque, nessa perspectiva, é visto como uma narração (construção humana), que reflete os interesses das partes (advogado), afastando-se da teoria da concepção da objetividade na interpretação do fato e da teoria da “verdade” como correspondência, e a prova é examinada como descrição, voltada à persuasão.
Pragmatismo filosófico - o pragmatismo é a atitude predominantemente pragmática (que busca a eficácia e a utilidade).
O fato (suporte fático concreto) será trabalhado, portanto, como versões trazidas pelas partes, incompatível com a tese de que existe uma única versão “verdadeira” passível de ser descoberta. 
Tenta-se explicar, de modo simples e lógico, como ocorre a passagem do fato, do mundo fático para o mundo jurídico.
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2.1 Construção: Fatos e Versões
Entende-se, assim, que os fatos ingressam na órbita jurídica não em estado bruto, mas sob a forma de uma narrativa jurídica e que um mesmo encadeamento narrativo pode ser narrado e interpretado de várias maneiras.
ATENÇÃO
O aluno - futuro advogado- deve atentar para o fato de que a narrativa tem sim uma função argumentativa e alguns dos fatos que são selecionados para compô-la vêm para o reforço das ideias que serão expostas na argumentação propriamente dita, que será no próximo elemento, por exemplo, da Petição Inicial, denominado “Do Direito”. Logo, desde o início da narrativa jurídica, o advogado, ao narrar os fatos, já está procurando persuadir o seu auditório (juiz, tribunal de júri).
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2.2 Descrição a Serviço da Narrativa: Circunstâncias do Fato
Não há como narrar, sem um mínimo de descrição. 
Esse é também o entendimento de Genette (1971, p.265): “A descrição poderia ser concebida independentemente da narração, mas de fato nunca é encontrada em estado livre; a narração, por sua vez, não pode existir sem descrição”. 
Em outras palavras, há sempre uma relação complementar entre as duas formas de expressão; sendo que, principalmente, do lado da narração, a complementação se faz necessária.
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2.2 Descrição a Serviço da Narrativa: Circunstâncias do Fato
Em Direito a descrição da circunstância em que o fato ocorreu é muito relevante, pois por meio dela será desenhada a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime, dentre outros procedimentos, segundo configura, por exemplo, no artigo 41 do Código de Processo Penal: 
A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. 
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2.2 Descrição a Serviço da Narrativa: Circunstâncias do Fato
Dessa maneira, em todas as situações fáticas, na área penal ou não penal, a
narrativa jurídica vai-se construindo em uma sucessão temporal, e, consequentemente, o juiz, ao buscar compreender o que se passou com as partes do processo para decidir no presente, participa de uma trama que se liga por um fio condutor que não pode ser apenas descrito, mas também narrado, razão por que narrativa jurídica é a maneira mais adequada para se compreender o Direito.
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A Autora teve um relacionamento esporádico com o Réu, do qual nasceu Pedro.
Durante cinco anos, somente a Autora e a avó materna cuidaram da criança, nunca tendo o menor recebido visita ou auxílio financeiro do Réu, mesmo tendo ele reconhecido a paternidade.
Entretanto, em 10 de setembro de 2015, a Autora, a pedido do Réu, pai da criança, levou o menor para a cidade de Belo Horizonte/MG para que conhecesse os avós paternos, sobretudo o avô, que se encontra acometido de neoplasia maligna.
Quando chegou à casa do Réu, a Autora foi agredida fisicamente por ele e outros familiares, sendo expulsa do local sob ameaça de morte e obrigada a deixar seu filho Pedro com eles contra sua vontade e o Réu fez questão, ainda, de reter todos os documentos da criança (certidão de nascimento e carteira de vacinação).
Em seguida, ainda sob coação física, a Autora foi forçada a ingressar em um ônibus e retornar ao Rio de Janeiro. Assim, com sua vida em risco, a Autora, desesperada, deixou o menor e viajou às pressas para a Cidade do Rio de Janeiro/RJ, onde reside
com sua mãe, a fim de buscar auxílio.
Desde essa data (10/9/2015) o menor se encontra em outro Estado, na posse do Réu e de seus familiares, e a Autora, que sempre cuidou de seu filho Pedro, não sabe o que fazer, pois o Conselho Tutelar da Cidade do Rio de Janeiro já foi notificado, mas, até o momento não conseguiu fazer contato com o Réu.
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2.2 Descrição a Serviço da Narrativa: Circunstâncias do Fato
Como se nota na narrativa jurídica em estudo, o advogado narra os fatos com as formas verbais no passado e na terceira pessoa do singular, apropriando-se da fala da autora, por meio da paráfrase, em uma estratégia de apagamento da voz da autora, em busca da pretensão de que a verdade possua uma só versão.
A esse fenômeno chamamos discurso monofônico.
Observa-se que as circunstâncias que cercam os fatos precisam ser descritas porque elas são submetidas também à apreciação no contexto do caso concreto, produzindo melhor entendimento acerca dos fatos narrados, além isso contribuem para tipificação da conduta praticada e na avaliação da possibilidade das atenuantes e/ou agravantes para o crime praticado.
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2.3 Modalização da Linguagem: Seleção Vocabular
É importante que a parte processual constitua um advogado que apresente em seus textos competência linguística, pois, no momento de narrar os fatos, o advogado tem que exercer a função de um fabulista, e ser, realmente, um grande contador de grandes histórias, uma vez que narrar uma história é também fazê-la, mas não porque tudo se possa resumir a uma construção meramente discursiva. 
A perspectiva é outra: a narrativa é um movimento ativo, ligado a um processo social de negociações e poder (uma vez que não se pode esperar que qualquer coisa que se diga seja aceita como “verdade”) pelo qual se determina a compreensão acerca dos fatos passados.
Para isso, a seleção vocabular é um recurso retórico muito importante, pois a escolha dos termos a serem usados na narrativa jurídica, por exemplo, tem grande poder persuasivo, razão por que a utilização de substantivos, advérbios e adjetivos pertencentes a um determinado campo semântico nesse tipo de texto.
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2.3 Modalização da Linguagem: Seleção Vocabular
Para melhor compreensão da modalização da linguagem, leia os fragmentos jornalísticos, extraídos do livro de Rodríguez (2002, p.177), prestando bastante atenção à seleção vocabular apresentada e à análise feita pelas autoras:
Polícia agride manifestantes no centro da cidade Camelôs que foram expulsos de seu local de trabalho nas ruas do centro da cidadefizeram ontem manifestação na região central. A tropa de choque foi chamada para reprimir a manifestação, agredindo vários camelôs, que saíram feridos.
Camelôs invadem o centro da cidade e tumultuam a vida do paulistano Revoltados porque a Prefeitura resolveu retirá-los das ruas do centro da cidade, camelôs fizeram ontem manifestação agressiva, destruindo vitrines de lojas e tumultuando o centro da cidade, inclusive ferindo transeuntes. A polícia foi obrigada a apaziguar o tumulto, dispersando os manifestantes.
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2.3 Modalização da Linguagem: Seleção Vocabular
Nota-se que ambos os textos narram o mesmo acontecimento, a saber: a manifestação dos camelôs e a repressão dos policiais. Entretanto, cada autor apresenta seu ponto de vista implícito mediante a utilização de dois procedimentos: a seleção vocabular e a seleção de fatos a serem narrados. 
Constata-se que não há diferença entre os fatos narrados, e que apenas o modo de ver ou o ponto de vista varia, escolhendo, cada um dos narradores, narrar aquilo que lhe parece mais relevante: nos fatos mais importantes – manifestação de camelôs em virtude de uma conduta da prefeitura e o chamado da polícia para pôr fim ao tumulto -, os textos coincidem.
Depreende-se dos fragmentos que sempre há estratégias discursivas, implícitas ou explícitas, e modalizadoras em relação ao modo de narrar os fatos e essas marcas discursivas jamais serão neutras, imparciais, mas sim sempre parciais acerca do fato narrado, por não existir discurso algum em nosso mundo real sem intencionalidade.
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CURIOSIDADE
Uma vez, um sultão poderoso sonhou que havia perdido todos os dentes. Intrigado, mandou chamar um sábio que o ajudasse a interpretar o sonho. O sábio fez um ar sombrio e exclamou:
"Uma desgraça, Majestade. Os dentes perdidos significam que Vossa Alteza irá assistir a morte de todos os seus parentes". 
Extremamente contrariado, o Sultão mandou aplicar cem chibatadas no sábio agourento. Em seguida, mandou chamar outro sábio. Este, ao ouvir o sonho, falou com voz excitada: "Vejo uma grande felicidade, Majestade. Vossa Alteza irá viver mais do que todos os seus parentes". Exultante com a revelação, o Sultão mandou pagar ao sábio cem moedas de ouro. Um cortesão que assistira a ambas as cenas vira-se para o segundo sábio e lhe diz: "Não consigo entender. Sua resposta foi exatamente igual à do primeiro sábio. O outro foi castigado e você foi premiado". Ao que o segundo sábio respondeu:
"a diferença não está no que eu falei, mas em como falei". 
Na vida á assim, não basta ter razão: é preciso saber levá-la. É possível embrulhar os nossos pontos de vista em papel áspero e com espinhos, revelando indiferença aos sentimentos alheios. Mas, sem qualquer sacrifício do seu conteúdo, é possível, também, embalá-los em papel suave, que revele consideração pelo outro.
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