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Direito Penal (Parte Especial) Professor Rodrigo Larizzatti _1 CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL 1. CONTRA A LIBERDADE SEXUAL E VULNERÁVEIS No art. 213 do Código Penal está tipificado o delito de ESTUPRO. CPB – Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. § 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2o Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos Estupro é crime material e de dano, que exige a concreta violação do bem jurídico – liberdade sexual e o respectivo resultado lesivo – prática efetiva de conjunção carnal ou outro ato libidinoso, para que reste consumado, completo. Sem a lesão ao bem jurídico não resta configurado o crime na sua forma plena, podendo ser admitida tão-somente a forma tentada quando iniciados os atos executórios. É crime complexo, onde se emprega violência ou grave ameaça para a violação sexual, atingindo assim dois bens jurídicos distintos; e plurissubsistente, porque admite a forma tentada, uma vez que é composto por uma série de atos que, em conjunto, formam a conduta incriminada. No estupro, é possível haver a fragmentação da conduta, dando origem à tentativa. No estupro, como crime complexo que é, a primeira ação (violência ou grave ameaça) constitui começo de execução, porque está dentro do próprio tipo. Assim, para ocorrência da tentativa basta que tenha o agente ameaçado gravemente a vítima com o fim inequívoco de constrangê-la à conjunção carnal (TJSP – RT 665/268). A conjunção carnal é a cópula vagínica, a introdução do pênis na vagina da mulher. Neste sentido O crime de estupro consuma-se com a introdução do membro viril nos órgãos sexuais da mulher, tanto fazendo que se trate de superficial introdução do membro na cavidade vulvar como a completa introdução na vagina (TJSP – RT 577/353). Por sua vez, ato libidinoso é todo ato que busca a satisfação do desejo ou do apetite sexual, a satisfação da libido. Os mais comuns, reconhecidos pela jurisprudência, são a conjunção carnal – já tratada, o coito anal, a prática de sexo oral, a masturbação e o beijo lascivo. Entretanto, é um conceito muito vago e abrangente, que viola o princípio da taxatividade penal, segundo o qual ao prever os tipos penais o legislador deve evitar o emprego de termos e expressões dúbias, inconclusivas e abrangentes, que por isso não permitem uma aplicação taxativa da sanção penal. Assim, se faz importante o respeito a um outro princípio, de ordem constitucional, denominado proporcionalidade. Como ensina a obra de Julio F Mirabete Exige-se uma proporção entre o desvalor da ação praticada pelo agente e a sanção a ser a ele infligida (...) um equilíbrio entre a prevenção geral e a prevenção especial para o comportamento do agente que vai ser submetido à sanção penal (MIRABETE. Manual de direito penal. Volume 1. São Paulo: Atlas, 12ª edição, 1997, p. 57). O princípio da proporcionalidade, segundo Cleber Masson Constitui-se em proibição ao excesso, pois é vedada a cominação e aplicação de penas em dose exagerada e desnecessária (MASSON. Direito Penal. Parte Geral. Volume 1. Rio de Janeiro: Ed Método, 12ª edição, 2018, p. 57) Desta forma, o ato libidinoso que caracteriza o crime de estupro deve possuir a mesma carga de reprovabilidade de um ato de conjunção carnal propriamente dito, que tem conceito preciso e taxativo, respeitando-se a proporcionalidade. Pacífico entendimento jurisprudencial, para a tipificação do estupro basta que haja o dissenso da vítima com relação à prática do ato sexual, não lhe sendo exigida a oposição de resistência hercúlea à ameaça empregada pelo sujeito ativo para que o delito se caracterize. A resistência à agressão sexual varia de mulher para mulher, dependendo de seu temperamento, de sua força física e até mesmo do temor decorrente das circunstâncias, sendo impossível medir-lhe o dissenso apenas pela intensidade da oposição oferecida no plano corpóreo (TJRS – RJTJERGS 180/142). Tampouco importa a reputação e a vida pregressa da vítima para a caracterização do crime sexual No crime de estupro não se perquire sobre a conduta ou honestidade pregressa da ofendida, podendo dele ser sujeito passivo até mesmo a mais desbragada prostituta (TJRS – RT 613/371). Crime comum porque pode ser cometido por qualquer pessoa, não demandando do sujeito ativo qualquer Direito Penal (Parte Especial) _2 qualidade especial. Qualquer pessoa pode praticar, ou ser vítima, de um estupro. Tradicionalmente é delito comissivo, pois a conduta realizadora do tipo penal – constranger a conjunção carnal ou ato libidinoso diverso, se exprime em uma ação, um fazer, uma atividade positiva por parte do sujeito ativo, que viola preceito proibitivo. Entretanto, pode surgir na forma comissiva por omissão – omissão imprópria quando há a transgressão de um dever jurídico especial de agir para impedir a ocorrência do resultado lesivo, aos garantes/garantidores e estes nada fazem, se omitem, violando preceito impositivo e assim dando origem a uma relação jurídico-normativa entre a conduta omissiva e o resultado perda patrimonial. Desta forma, p. ex. caso uma mãe saiba que sua filha é violentada pelo padrasto e nada fizer, podendo agir para impedir o resultado, responderá por participação por omissão, no crime de estupro. Crime praticado na presença da mãe da vítima. (...) ainda que não haja prova suficiente da efetiva participação da mãe da menor nos fatos delituosos cometidos contra a mesma na sua presença, é de se considerar sua inércia ou passividade como omissão penalmente relevante, porque violou seu dever de proteção para com a filha, concorrendo para a prática dos crimes, pelo que se impõe a condenação da mesma como incursa nas penas cominadas aos crimes praticados pelo réu, na medida de sua culpabilidade (TJMG – RT 725/629). Nos §§1º e 2º do dispositivo estudado temos formas qualificadas de estupro, quando resulta lesão corporal de natureza grave, morte ou se a vítima é maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos de idade. No art. 215 está previsto o crime de VIOLAÇÃO SEXUAL MEDIANTE FRAUDE. CPB – Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. Se distingue do estupro porque nesta espécie criminosa o sujeito ativo não emprega violência ou grave ameaça para a prática do ato sexual. Ele usa fraude, tapeação, engodo que atinge a livre manifestação da vontade da vítima, que concorda com a prática do ato sexual porque levada a erro, atuando com vício de consentimento. Parte da doutrina penal o chama de estelionato sexual. O art. 215-A, inserido no CPB pela Lei nº 13.718, em setembro de 2018, passou a prever nova figura penal, denominada IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. CPB – Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. Antes da edição da mencionada norma, os atos libidinosos que eram praticados, especialmente, contra mulheres em shows, festas, cinema, bares e transportes públicos configuravam apenas a contravenção penal de Importunação Violenta ao Pudor, nos termos do revogado art. 61 da LCP – Lei de Contravenções Penais, com previsão de pena de multa. Com a inovação legislativa, tal conduta passou a ser considerada um crime apenado com reclusão, ainda que desprovida de qualquer tipo deviolência, física ou moral, sendo sua ação penal de natureza pública incondicionada. O art. 216-A descreve a figura penal do ASSÉDIO SEXUAL. CPB – Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. Parágrafo único. (VETADO) § 2o A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos. Assédio sexual é crime formal que não exige a concreta violação do bem jurídico – liberdade sexual e o consequente resultado lesivo – percepção real da vantagem ou do favorecimento sexual, para que reste consumado, completo. Para tanto, basta que o sujeito ativo realize o constrangimento com o intuito de obter tal benefício. É conhecido também como crime de consumação antecipada, uma vez que tal consumação coincide com o momento da prática da conduta e não com a ocorrência do resultado, dispensável É delito próprio, que não pode ser cometido por qualquer pessoa, exigindo que o sujeito ativo tenha hierarquia ou ascendência sobre a vítima, em razão de emprego, cargo ou função. Novo tipo penal inserido pelo legislador ordinário através da Lei nº 13.772/18, o art. 216-B descreve o crime de REGISTRO NÃO AUTORIZADO DA INTIMIDADE SEXUAL. CPB – Art. 216-B. Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo. O art. 217-A descreve a figura penal do ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CPB – Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. § 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações Direito Penal (Parte Especial) _3 descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. § 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. § 4o Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. O estupro de vulnerável é uma forma mais grave do crime sexual, que não demanda a violência ou a grave ameaça para se configurar, bastando a simples prática de conjunção carnal ou outro ato libidinoso com a vítima menor de 14 (catorze) anos de idade, ou nas condições previstas no §1º para que reste consumado, completo. Nos termos da súmula 593 do Superior Tribunal de Justiça - STJ STJ – Súmula 593: O crime de estupro de vulnerável configura-se com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente. Sobre o eventual consentimento da vítima na prática do ato sexual Nos crimes sexuais (...) o fato de a vítima ser menor de 14 anos, inexistindo alegação de erro quanto a sua idade, é o suficiente para a caracterização do delito eis que, em tal hipótese, a violência é presumida, independentemente de seu consentimento para a prática do ato diverso da conjunção carnal, pois não há conceber que menores de 14 anos a quem não se permite validade de atos jurídicos, tenham consciência plena para validar com o seu consentimento a prática sexual (STF – RT 792/556). Sob a normativa anterior à Lei n. 12.015/2009, que introduziu o art. 217-A no CPB, era absoluta a presunção de violência no estupro e no atentado violento ao pudor (referida na antiga redação do art. 224, “a”, do CPB) quando a vítima não fosse maior de 14 anos de idade, ainda que esta anuísse voluntariamente ao ato sexual. Em qualquer hipótese (anterior ou posterior à Lei n. 12.015/2009), o consentimento da vítima menor impúbere não tem relevância para infirmar a prática do crime de estupro. A questão, antes tratada como presunção legal, passou a integrar o próprio tipo penal (estupro contra vulnerável) (AgRg nos EREsp 1.577.738/ MS, DJe 02/10/2017). No art. 218 temos a figura penal da CORRUPÇÃO DE MENORES. CPB – Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. Para a consumação do crime de corrupção de menores não é necessário que o beneficiado tenha a sua lascívia efetivamente satisfeita. Entretanto para a consumação é exigido que o menor de 14 anos pratique o ato a que fora induzida pelo sujeito ativo, motivo pelo qual é considerado um crime material. O núcleo do tipo está em induzir – convencer, criar a idéia da vítima praticar algum ato visando satisfazer a lascívia de terceira pessoa, que se posta de forma passiva, contemplativa, sem qualquer contato físico. Importante ressaltar que o comportamento daquele que tem a lascívia satisfeita, por ato meramente contemplativo, não caracteriza qualquer ilícito penal, sendo assim atípica. Entretanto, caso ele venha a praticar qualquer ato sexual concreto, físico, com a vítima, restará configurado o estupro de vulnerável. SATISFAÇÃO DE LASCÍVIA MEDIANTE PRESENÇA DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE CPB – Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Uma importante particularidade deste delito é que a vítima não se envolva fisicamente no ato sexual, apenas o assistindo, presenciando, pois caso contrário haverá o estupro de vulnerável. No art. 218-B está previsto o crime de FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE OU DE VULNERÁVEL. CPB – Art. 218-B. Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos. § 1o Se o crime é praticado com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. § 2o Incorre nas mesmas penas: I - quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo; II - o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifiquem as práticas referidas no caput deste artigo. § 3o Na hipótese do inciso II do § 2o, constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento. O favorecimento da prostituição, previsto no dispositivo penal, exige que o aliciamento da vítima se dê a um número indeterminado de pessoas. Se esse número for determinado, o delito caracterizado será a corrupção de menores, do art. 218. Direito Penal (Parte Especial) _4 No art. 218-C, também inserido no CP pela Lei nº 13.718/18, temos o crime de DIVULGAÇÃO DE CENA DE ESTUPRO OU DE CENA DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, DE CENA DE SEXO OU DE PORNOGRAFIA CPB – Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave. Aumento de pena § 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação. Exclusão de ilicitude § 2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos Quanto à AÇÃO PENAL para os crimes contra a liberdade sexual e vulneráveis, assim prevê o art. 225 do CPB CPB – Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada Por sua vez, o art. 226 prevê hipóteses de aumento de pena quando. Art. 226. A pena é aumentada: I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas: II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela; III - (Revogado) IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado: Estupro coletivo a) mediante concurso de 2 (dois) ou mais agentes; Estupro corretivo b) para controlar o comportamento social ou sexual da vítima. 2. DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE PROSTITUIÇÃO O Lenocínio é a ação de explorar, estimular ou favorecer o comércio carnal ilícito, ou induzir ou constranger alguém à sua prática. A prostituição em si não é delituosa para a legislação penal brasileira, mas caso terceiro venha a tirar proveito da prostituição alheia, restará caracterizado o delito. No art. 227 do Código Penal está tipificado o delito de MEDIAÇÃO PARA A LASCÍVIA. CPB – Art. 227 Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem: Pena - reclusão, de um a três anos. § 1o Se a vítima é maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, ou se o agente é seu ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de educação, de tratamento ou de guarda: Pena - reclusão, de dois a cinco anos. § 2º - Se o crime é cometido com emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Pena - reclusão, de dois a oito anos, além da pena correspondente à violência. § 3º - Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa. Sobre o ilícito e seu sujeito passivo, entende a jurisprudência. (...) A meretriz não pode ser havida como vítima do delito previsto no art. 227 do Código Penal, pois não é induzida, mas se presta, voluntariamente, à lascívia de outrem (TJPR – RT 487/347). No art. 228 temos o delito de FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO. CPB – Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1o Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos. § 2º - Se o crime, é cometido com emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, além da pena correspondente à violência. § 3º - Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa. Sobre o ilícito e suas peculiaridades, se manifesta a jurisprudência Para a configuração do delito do art. 228 do Código Penal Direito Penal (Parte Especial) _5 não contam as qualidades morais do sujeito passivo. Corrompida que seja a pessoa, é suscetível de mesmo assim ser induzia ou atraída à prostituição (TJSP – RT 433/380-1). Facilitar a prostituição é prestar qualquer auxílio ao seu exercício, como promover a instalação de prostitutas, angariar-lhe clientes e até mesmo tolerar, coniventemente, contra o próprio dever jurídico que alguém exerça a profissão (TJSP – RT 483/306). Nesse sentido, quem mantém casa de prostituição está favorecendo o exercício deste mister, em última análise. Mas, o crime de favorecimento definido no art. 228 do Código Penal apresenta formas e contornos típicos diferentes. Configurada a manutenção da casa de prostituição, não se justifica a condenação pelos dois delitos, desde que o favorecimento consistiu exclusivamente na mantença do prostíbulo (TJSP – RT 388/98 e RT 455339). O art. 229 tipifica o crime de CASA DE PROSTITUIÇÃO. CPB – Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa Acerca do delito, a jurisprudência assim se manifesta Sujeito ativo da ação delituosa é o que tem a disponibilidade do estabelecimento ou local e pode dar- lhe a destinação que quiser, quiçá diversa daquele para que licenciado (TJSP – RJTJESP 8/446). A prostituta que recebe clientes em sua residência não pratica o crime do art. 229 do Código Penal, pois não mantém, embora exerça o meretrício, casa de prostituição (TJSP – JTJ 182/299). Todavia, o fato de alugar alguém o seu apartamento exclusivamente para o exercício da prostituição, cobrando diária dos seus frequentadores, configura o delito de casa de prostituição e não o de favorecimento desta (TJSP – RT 401/113). Ainda sobre casa de prostituição, é indispensável à configuração do delito previsto no art. 229 do CP a prova da habitualidade, a qual decorre do verbo ‘manter’, nele empregado (TJSP – RT 585/291). O art. 230 traz a figura penal do RUFIANISMO. CPB – Art. 230 Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1o Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 2o Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência. Crime habitual, o rufianismo exige a reiteração de atos que, particularmente considerados, não têm relevância no campo penal. Essa repetição faz surgir apenas um crime, que, traduz geralmente um modo ou estilo de vida. A prática isolada do fato típico não traz à tona o delito, sendo imprescindível sua reiteração. É o conjunto de vários atos que configura o crime habitual. Rufianismo. Pressupõe habitual e direta participação nos ganhos ou habitual sustento, total ou parcial, do agente, pela prostituta (TJRS – RJTJERGS 191/179). No art. 232-A está descrito delito de PROMOÇÃO DE MIGRAÇÃO ILEGAL. CPB – Art. 232-A. Promover, por qualquer meio, com o fim de obter vantagem econômica, a entrada ilegal de estrangeiro em território nacional ou de brasileiro em país estrangeiro: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1º Na mesma pena incorre quem promover, por qualquer meio, com o fim de obter vantagem econômica, a saída de estrangeiro do território nacional para ingressar ilegalmente em país estrangeiro. § 2º A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço) se: I - o crime é cometido com violência; ou II - a vítima é submetida a condição desumana ou degradante. § 3º A pena prevista para o crime será aplicada sem prejuízo das correspondentesàs infrações conexas. 3. DO ULTRAJE AO PUDOR No art. 233 do Código Penal está tipificado o delito de ATO OBSCENO. CPB – Art. 233 Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. O delito de ato obsceno, dada sua particularidade, demanda uma interpretação progressiva pelo aplicador do Direito, sob pena de não atender aos anseios sociais na busca da responsabilização penal. Esta forma de interpretar é utilizada para abranger as transformações sociais, científicas, jurídicas etc., ocorridas desde a expedição da lei penal. O Código Penal Brasileiro data do ano de 1940, tendo sofrido uma reforma parcial no ano de 1984. De lá para cá sucederam diversas mudanças sociais e culturais não acompanhadas pela letra fria da lei, fazendo com que algumas expressões, dantes consideradas de uma respectiva maneira, precisassem ser atualizadas para que a norma fosse aplicada corretamente. A caracterização do crime de ato obsceno depende Direito Penal (Parte Especial) _6 de uma análise social e cultural, considerando que viola o pudor público, uma concepção volátil na sociedade moderna. Na época de sua tipificação, em 1940, a lei exigia determinada conduta que hoje pode não mais ser violadora social. Dessa forma, mostra-se extremamente necessária uma interpretação mais acalentada nos dias atuais para que seja possível a execução da norma jurídica. Sobre o crime, dispõe a jurisprudência Em princípio, o meretrício e o trottoir não são puníveis, se não há importunação, nem ultraje público ao pudor (STF – RTJ 68/58). Nesse sentido, comete o crime de ato obsceno o ‘travesti’ que, na prática do trottoir, para atrair clientes, expõe partes íntimas de seu corpo, ofendendo a moralidade média da coletividade (TACRSP – RT 637/280). Praticado o ato obsceno dentro da propriedade do réu não se pode caracterizar o crime previsto no art. 233 do CP, posto que aquele não se caracteriza como lugar exposto ao público (TJGO – RT 728/609). Assim, não presente a publicidade do ato obsceno, inexiste justa causa para a ação penal pelo delito do art. 233 do CP. O fato de o acusado e sua namorada se permitirem, no interior do automóvel estacionado em local ermo e escuro, liberdades mais ousadas é questão puramente de moral, que escapa ao Direito repressivo (TACRSP – RT 553/356 e RT 602/344). Todavia, comete o crime de ato obsceno o agente que, despido totalmente, exibe os órgãos genitais a vizinhos, do interior do quintal de sua residência, máxime se esta casa é desprovida de muros em suas divisas, já que a qualquer hora é possível que as pessoas vejam o que se passa em seu interior (TACRSP – RJDTACRIM 4/54). O art. 234 do Código Penal descreve o delito de ESCRITO OBSCENO. CPB – Art. 234 Fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem: I - vende, distribui ou expõe à venda ou ao público qualquer dos objetos referidos neste artigo; II - realiza, em lugar público ou acessível ao público, representação teatral, ou exibição cinematográfica de caráter obsceno, ou qualquer outro espetáculo, que tenha o mesmo caráter; III - realiza, em lugar público ou acessível ao público, ou pelo rádio, audição ou recitação de caráter obsceno. 4. DISPOSIÇÕES GERAIS Nos arts. 234-A e 234-B temos CPB – Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada: I – (VETADO); II – (VETADO); III - de metade a 2/3 (dois terços), se do crime resulta gravidez; IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, ou se a vítima é idosa ou pessoa com deficiência. CPB – Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de justiça. 5. CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA Importante aspecto a ser considerado comumente para todos os crimes contra a Fé Pública – falsidades, é a imitatio veri ou imitação da verdade. Nos delitos em questão, a falsidade deve imitar a verdade de forma que com ela possa ser confundida, descaracterizando o ilícito penal contra a fé pública caso ocorra uma falsificação grosseira. Para tanto é essencial que se proceda ao exame pericial de corpo de delito, sobre o falso, buscando apurar se possue ou não a imitativo veri. Entretanto, essa inidoneidade verificada para os crimes de falso pode ser meio hábil, eficaz para enganar e ludibriar alguém, configurando ato executório de Estelionato – art. 171. A par de caracterizada a inidoneidade do suposto documento para ilaquear a fé pública, dada a grosseria da falsificação de carteira de identidade, a circunstância de tratar-se de reprodução não autenticada, não contemplada no ordenamento jurídico, como documento, denota a impossibilidade de ser objeto de crime de falsidade documental (STF – RT 588/436). Não se tem como caracterizado o crime de falsificação sem a ‘imitatio veri’. À falta de imitação caligráfica, a falsificação grosseira, facilmente verificável na comparação e confronto com a assinatura da vítima, afasta a possibilidade de reconhecer o falso (...) (TJSP – RT 663/293, RT 584/315 e RT 454/349). A falsificação grosseira, facilmente perceptível, não configura o delito do art. 297 do Código Penal. Porém, se o expediente utilizado pelo agente serviu para a obtenção de vantagem indevida, em prejuízo de outrem, patenteia-se o estelionato (TJSP – RT 509/356). Falsificado o documento com a intenção de imitar o verdadeiro, e se a falsificação, ainda que não perfeita, for capaz de enganar o homem médio, não se pode tê-la como grosseira (TJSP – RT 727/458). No art. 289 do Código Penal está tipificado o delito de MOEDA FALSA. CPB – Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel-moeda de curso legal no país ou no estrangeiro: Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa. § 1º - Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa. § 2º - Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, Direito Penal (Parte Especial) _7 moeda falsa ou alterada, a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de seis meses a dois anos, e multa. § 3º - É punido com reclusão, de três a quinze anos, e multa, o funcionário público ou diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou emissão: I - de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei; II - de papel-moeda em quantidade superior à autorizada. § 4º - Nas mesmas penas incorre quem desvia e faz circular moeda, cuja circulação não estava ainda autorizada. Crime contra a fé pública da União, moeda falsa é de competência da Justiça Federal à exceção quando configura meio executório para estelionato, pelo qual é absorvido, passando a ser processado e julgado pela Justiça Estadual. Não se apresentando grosseira a falsificação de cédula de moeda estrangeira posta em circulação, pois só verificada mediante utilização de aparelhagem e meios adequados pelos peritos oficiais, tem-se por aperfeiçoado o delito do art. 289 do CP e competente para o processo e julgamento o juiz federal (STJ – RT 667/344). Nesse sentido, determina a Súmula n. 73 – STJ: A utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado configura em tese o crime de estelionato, de competência da Justiça Estadual. Por isso, “o exame de corpo de delito é essencial ao processo pelo crime de moeda falsa (...)” (TRF – RF 139/390). Doutrinariamente, a considerar a forma básica do caput do art. 289 e seu § 1º, o crime de moeda falsa é delito comum, doloso, comissivo, instantâneo – nas formas falsificar,fabricar, alterar, importar, exportar, adquirir, vender, trocar, ceder, introduzir e permanente – quanto à conduta guardar, unissubjetivo, plurissubsistente. Sua consumação ocorre quando o sujeito ativo realiza a falsificação, através das condutas fabricar ou alterar, ainda que de uma única cédula ou moeda metálica, não sendo necessário que a mesma seja colocada em circulação. O número de moedas ou cédulas falsificadas não é relevante para a configuração do crime, bastando que uma esteja pronta, eis que não há insignificância no crime de moeda falsa, que possui a Fé Pública como bem jurídico protegido. No delito de falsificação existe uma infração única, qualquer que seja o número de cédulas falsificadas (TRF – RF 216/293). Caso o mesmo agente falsifique e posteriormente introduza em circulação a moeda, não haverá dois ilícitos, caracterizando-se o exaurimento do crime, post factum impunível. Desta forma, o § 1º do dispositivo é aplicado autonomamente quando terceira pessoa pratica as condutas ali descritas, não sendo ela o próprio contrafeitor. A introdução de moeda falsa na circulação só constitui crime autônomo, quando realizada por quem não foi o autor da falsificação. Se é o próprio falsificador quem faz uso da moeda falsa, o crime é um só, devendo o seu autor responder somente pela falsificação (TJSP – RT 176/474). No §2º do dispositivo estudado temos o comportamento daquele que adquire/recebe a moeda falsa agindo de boa- fé, mas para evitar prejuízo próprio a restitui à circulação após saber a falsidade, violando a fé pública. Temos o caso de quem primeiro foi vítima de um criminoso – o falsário, recebendo a moeda falsa por erro e, ao conhecer a falsidade lesa o Estado, restituindo-a à circulação. É infração de menor potencial ofensivo. CPB – Art. 289 (...) § 2º - Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de seis meses a dois anos, e multa. No art. 291 do Código Penal resta tipificado o crime de PETRECHOS PARA FALSIFICAÇÃO DE MOEDA. CPB – Art. 291 Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. Importante ressaltar que a tipificação deste ilícito depende da inequívoca comprovação da destinação dada aos maquinismos e utensílios – os petrechos. É indispensável à perfeição do delito previsto no art. 291 do CP a inequivocidade do destino do maquinismo, aparelho ou instrumento destinado à falsificação. Visando o petrecho não especificamente a contrafação da moeda, mas sim a prática de fraudes, como, por exemplo, o ‘conto da guitarra’, somente se poderá cogitar de eventual estelionato (TACRSP – JTACRIM 19/294). Os petrechos caracterizam meio preparatório para a prática da falsificação de moeda, que em ocorrendo absorverá o ilícito insculpido no art. 291. Assim, caso o sujeito pratique alguma conduta descrita no dispositivo com a finalidade de falsificar a moeda, e assim o fizer nos moldes do art. 289, em tese só lhe poderá ser imputada a prática da falsificação. Nos art. 297 e 298 do Código Penal estão tipificados os delitos de FALSIDADE MATERIAL, versando sobre documento público e documento particular, respectivamente. CPB – Art. 297 Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. CPB – Art. 298 Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro: Direito Penal (Parte Especial) _8 Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. Primeiramente há que se considerar a classificação dos documentos, em públicos e particulares, para a tipificação dos delitos de falsificação, eis que o caso concreto poderá subsumir-se ao art. 297 ou ao art. 298, com diferença nas penalidades impostas. Conforme os ensinamentos de Sylvio do Amaral: A natureza do documento público advém da sua origem oficial, do fato de ter sido expedido no exercício de função pública, e não da categoria do seu autor. Seja esta qual for, o documento será de caráter particular sempre que não se enquadre dentre o que o funcionário tem por função emitir, de acordo com a lei ou o regulamento que define suas atribuições oficiais (AMARAL, Sylvio. Falsidade documental. Campinas: Ed. Millenium, 2000, 4ª edição, p. 11). Conforme a jurisprudência Documento público é aquele expedido pelo Estado. Vale dizer, é o documento escrito por funcionário público (na acepção amplíssima do art. 327 do Código Penal), no exercício de função definida em lei ou regulamento. O certificado de propriedade de veículo é considerado documento formal e substancialmente público (TJSP – RT 480/285). Também definidos na lei se encontram os denominados documentos públicos por equiparação, sendo aqueles previstos no § 2º do art. 297. CPB – Art. 297 (...) § 2º Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular. Seguindo a doutrina de Sylvio do Amaral São certos documentos particulares que possuem excepcional relevância na vida dos indivíduos e da coletividade, justificando-se, por isso, maior rigor da lei na repressão de sua falsificação (AMARAL. Ob. cit., p. 23). No parágrafo único do art. 298 temos a falsificação de cartão de crédito ou débito, que é equiparado a documento particular. CPB – Art. 298 (...) Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, equipara-se a documento particular o cartão de crédito ou débito. Sobre as peculiaridades dos crimes de falsidade documental, se manifesta a jurisprudência Sendo a alteração de documento público verdadeiro uma das duas condutas típicas do crime de falsificação de documento público, a substituição de fotografia em documento de identidade dessa natureza caracteriza alteração dele, que não se cinge apenas ao seu teor escrito, mas que alcança essa modalidade de modificação que, indiscutivelmente, componente a materialidade e a individualização desse documento verdadeiro, até porque a fotografia constitui parte juridicamente relevante dele (STF – HC 75.690-5 DJU de 3.4.98, p. 4). Para a caracterização do delito de falsificação do documento público basta a sua adulteração, pouco importando o prejuízo real ou potencial, pois o bem lesado é a fé pública. Assim, para que se tipifique não é necessária a existência de prejuízo efetivo, bastando o simples perigo de dano (TJSP – RT 558/311). Se a imputação concerne ao falso material, com os documentos tidos como falsificados estando encartados nos autos, impõe-se o exame de corpo de delito, nos termos do art. 158 do CPP (STJ – RSTJ 32/277). O tipo do art. 297 do Código Penal exige apenas a ‘editio falsi’, sendo prescindível a posterior utilização do falso, que consiste em mero exaurimento (STJ – JSTJ 62/500). No art. 299 temos descrito o crime de FALSIDADE IDEOLÓGICA. CPB – Art. 299 Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular. O artigo trata da falsidade ideológica e não material, que são distintas. A falsidade material afeta a autenticidade do documento na sua forma exterior e por isso também pode afetá-la no conteúdo, no teor. A falsidade ideológica afeta apenas este conteúdo, e não a forma, que é verdadeira. Inclusive, para a caracterização da falsidade ideológica é necessário quea alteração ocorra em documento verdadeiro, seja público ou particular, que tem o seu conteúdo adulterado, mas não a sua forma. Assim, a constatação da falsidade por exame pericial é difícil e incomum, devendo ser ela comprovada por outros documentos, provas e testemunhas, afastando a exigência da perícia. A falsidade ideológica concerne ao conteúdo e não à forma. Quando esta é alterada, forjada ou criada, a falsidade a se identificar é a material (TJSP – RT 580/322). O falso ideológico diz respeito ao conteúdo do documento, a seu teor intelectual, e não à materialidade. Materialmente verdadeiro, o escrito é mentiroso no conteúdo, fato que pode ser demonstrado por testemunhas e outros documentos, mas não por perícia grafotécnica (TJSP – JTJ 170/336). Direito Penal (Parte Especial) _9 É dispensável a perícia no documento quando se trata de falsidade ideológica. Neste caso, o próprio documento substitui o corpo de delito, materialmente perfeito, porém, de conteúdo falso, circunstância apurável pelo juiz no curso do processo e não pelos peritos (TJRS – RJTJERGS 114/159). Aspecto de grande importância nos crimes de falsidade documental, seja ela material, seja ideológica é que se o agente falsifica documento com o objetivo de enganar alguém, com obtenção de vantagem econômica, estará configurado o crime de Estelionato, que absorve o delito de falsidade, nos termos da Súmula nº 17 do STJ, STJ – Súmula nº 17: Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. A falsidade ideológica exige um dolo específico para se caracterizar, no caso o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, como descrito no dispositivo estudado, por mais que não tenha gerado efetivo prejuízo, sendo assim um delito formal. Para que ocorra o delito de falsidade ideológica é necessário que a alteração seja relativa a fato juridicamente relevante, entendendo-se como tal a declaração que, isolada ou em conjunto com outros fatos, tenha significado direto ou indireto para constituir, fundamentar ou modificar direito, ou relação jurídica pública ou privada (TJSP – RT 546/344). O crime de falsidade ideológica, por ser crime formal, aperfeiçoa-se com a simples potencialidade do dano objetivado pelo agente, não se exigindo para sua configuração, a ocorrência do prejuízo (STJ – RSTJ 90/398). Se a falsidade material grosseira, incapaz de enganar, não constitui crime, dada a ausência de potencialidade de dano, da mesma forma é impunível a falsidade ideológica que afirma fato ou circunstância incompatível com a realidade de todos conhecida (TJSP – RT 477/656). No art. 304 temos o crime de USO DE DOCUMENTO FALSO. CPB – Art. 304 Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302: Pena - a cominada à falsificação ou à alteração. A conduta insculpida no tipo penal é fazer uso, que significa utilizar-se de, lançar mão ou usar, de forma que o ilícito se caracteriza quando o sujeito ativo emprega o documento falso para o fim a que ele serviria, se verdadeiro fosse, sem que haja a intenção de obter indevida vantagem econômica, caso em que estará caracterizado o crime de Estelionato. O simples porte de um documento falso não configura o delito do art. 304. Falso uso de documento é empregá-lo para o fim a que serviria, se não fosse falso (TJSP – JTJ 176/329). Fazer uso de documento falso é fazê-lo ou tentar fazê- lo passar como autêntico ou verídico. A ação que não ultrapasse da esfera dos atos preparatórios é atípica (TJSP – RT 420/87). Se o uso de documento falso foi endereçado à obtenção de indevida vantagem econômica, o falso constitui-se em crime-meio, que fica absorvido pelo crime-fim, no caso o estelionato (TJSP – RT 724/618). O réu que, ao ser submetido à revista policial, portava documentos de terceiro, entre os quais uma cédula de identidade em que fora inserida a sua fotografia, não pratica o crime disposto no art. 304 do CP, pois o simples porte do documento falso não consiste em verdadeiro uso do mesmo (TJSP – RT 794/578). Cópia reprografada só pode ser objeto do crime se estiver autenticada. A utilização de cópia autenticada de diploma falso para obter nomeação de cargo público é o suficiente para caracterizar o crime de falsidade documental, não havendo falar em atipicidade da conduta, uma vez que somente a cópia sem autenticação seria inidônea para integrar o conceito de documento a que se refere o art. 304 do CP (TJSP – RT 753/582). Uso de documento falso é delito de formal que se consuma com o efetivo uso do documento falso, não sendo necessária a obtenção de qualquer proveito ou a produção de dano a outrem. A tentativa é inadmissível, uma vez que o delito já se encontra perfeito com o primeiro ato de uso. O simples tentar usar já é uso, estando consumado o crime. (...) a tentativa é inadmissível, pois o simples tentar usar já é uso, estando consumado o crime (TJSP – RT 735/564). Por ser considerado crime autônomo, o uso de documento falso gera divergência quando cometido pelo próprio contrafeitor, pois o sujeito que falsifica e usa o documento estaria incidindo em dois tipos penais distintos, incorrendo em dois crimes, em concurso material. Todavia, o melhor entendimento é no sentido de que tal hipótese não configuraria concurso de crimes, mas sim crime único, em progressão. Quem falsifica objetiva, claramente, fazer uso do documento. Se, realmente, o faz o próprio falsificador, deve ser punido pelo crime-fim (art. 304) e não pelo delito-meio (art. 297) (TJSP – RT 504/328). O entendimento sufragado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é de que se o mesmo sujeito falsifica e, em seguida, usa o documento falsificado, responde apenas pela falsificação. (STJ – HC nº 70.703/2006 – GO) Novamente nos reportando aos ensinamentos de Sylvio do Amaral: Direito Penal (Parte Especial) _10 Quando o agente falsifica e, em seguida, usa o ‘falsum’, ele realiza tipicamente um crime progressivo, uma série de fatos delituosos tendentes a um objetivo fundamental, norteador de todo o procedimento e absorvente do sentido geral das ações procedentes – o emprego do documento falso (...) O delito-meio (falsificação) é essencialmente indispensável à consecução do delito- fim (uso do falsum), de tal modo que este é logicamente impossível sem a preexistência daquele. Não só a falsificação é absorvida pela contextura material do crime de uso (do qual é um elemento constitutivo), como não tem relevo acentuado no espírito do agente que se propõe realizar – o uso do documento falso (AMARAL. Ob cit., p. 171). Nos arts. 307 e 308 estão descritas as figuras penais da FALSA IDENTIDADE. CPB – Art. 307 Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. CPB – Art. 308 Usar, como próprio, passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia ou ceder a outrem, para que dele se utilize, documento dessa natureza, próprio ou de terceiro: Pena - detenção, de quatro meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. As formas de falso previstas no art. 307 e 308 não se incluem entre as práticas que caracterizam a falsidade documental, pois o ora comportamento criminoso difere da contrafação, adulteração ou inserção de dados falsos em documento verdadeiro, constituindo uma mentira sobre as qualificações pessoais do sujeito ativo, ou de terceiro, na mais ampla concepção de identidade. A norma incriminadora, ao se referir à falsa identidade, o faz de modo amplo e generalizado, de sorte que abrange os mais variados caracteres da pessoa, tais como nome, idade, estado civil, profissão, sexo, títulos, condecorações,qualidades publicamente reconhecidas, filiação, genealogia, estado pessoal etc. (TACRSP – RJDTACRIM 2/95). Importante frisar que como corolário do princípio constitucional da ampla defesa, insculpido no art. 5º, inciso LV da Constituição da República, o autor de um fato criminoso não é obrigado a fazer prova contra si mesmo, podendo fazer afirmação falsa, negar o calar a verdade sobre os fatos a si imputados, sem que isso caracterize qualquer ilícito penal. Todavia, conforme o melhor entendimento jurisprudencial, esse “direito de mentir” diz respeito tão somente aos fatos apurados e atribuídos, não alcançando seus dados de qualificação e identidade. CF – Art. 5º (...) LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; O Direito Constitucional deferido ao réu de permanecer calado e de não colaborar, não inclui o de falsear a própria identidade (...) (TJDF – RJEDFT 10/201). Nesse sentido, pratica o crime de falsa identidade (CP, art. 307) o agente que se identifica à autoridade policial com nome fictício ou de outra pessoa, ainda que o tenha feito como recurso de autodefesa, objetivando esconder seu passado criminoso, a fim de, como vantagem para si, obter benefícios penais ou processuais penais que do contrário não seriam concedidos ante a existência de antecedentes criminais. O direito constitucional de o indiciado calar ou falsear a verdade como autodefesa não o autoriza a cometer outro crime, qualquer que seja, mormente o de falsa identidade (TJSC – JCAT 99/517). No art. 311 temos a descrição do crime de ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. CPB – Art. 311 Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento: Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa. § 1º Se o agente comete o crime no exercício da função pública ou em razão dela, a pena é aumentada de um terço. § 2º Incorre nas mesmas penas o funcionário público que contribui para o licenciamento ou registro do veículo remarcado ou adulterado, fornecendo indevidamente material ou informação oficial. Os sinais identificadores de veículo estão definidos conforme o Código de Trânsito Brasileiro, em seus artigos 114 e 115 CTB – Art. 114. O veículo será identificado obrigatoriamente por caracteres gravados no chassi ou no monobloco, reproduzidos em outras partes, conforme dispuser o CONTRAN. CTB – Art. 115. O veículo será identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, sendo esta lacrada em sua estrutura, obedecidas às especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN. Conforme a jurisprudência Tipifica, em tese, a sua prática a adulteração de placa numerada dianteira ou traseira do veículo, não apenas a numeração do chassi ou monobloco (STF – HC 79.780-SP DJU de 18-8-2000, p. 82). Nesse mesmo sentido, o veículo é identificado externamente por meio das placas dianteira e traseira, cujos caracteres o acompanharão até a baixa do registro. Tipifica, portanto, a conduta prevista no art. 311 do Código Penal, a adulteração ou remarcação destes sinais identificadores, bem como daqueles gravados no chassi ou no monobloco (STJ – RSTJ 133/517 e RT 772/541). Direito Penal (Parte Especial) _11 No art. 311-A está previsto o crime de FRAUDES EM CERTAMES DE INTERESSE PÚBLICO. CPB – Art. 311-A. Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: I - concurso público; II - avaliação ou exame públicos; III - processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou IV - exame ou processo seletivo previstos em lei: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1o Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput. § 2o Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. § 3o Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário público.
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