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Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Esteato-hepatite é uma doença parenquimatosa associada ao depósito de triglicerídeos (esteatose). Começa com a quimiotaxia de células inflamatórias devido aos TG nos hepatócitos, por isso é mais parenquimatosa e menos portal como na hepatite viral. Elas podem ser classificadas em dois grandes grupos: esteato-hepatites alcóolica (ASH) e esteato- hepatites não-alcóolicas (NASH). 1. ESTEATO-HEPATITE ALCÓOLICA (ASH) O consumo excessivo de álcool (etanol) é a principal causa de doença hepática na maioria dos países ocidentais. De modo geral, a ingestão a curto prazo de até 90g de etanol (equivale a 200ml de uma bebida com 40% de etanol ou 6 cervejas) geraria uma lesão reversível. Quando ultrapassa essa ingestão surgem lesões irreversíveis. Estima-se que o abuso crônico de mais de 160g de álcool em 10 anos aumenta muito o risco de desenvolver doença hepática crônica. Contudo, apenas 10 a 15% dos alcoolistas desenvolvem cirrose, isso depende de outros fatores, como sexo, predisposição genética. As mulheres parecem ser mais suscetíveis à lesão hepática que os homens, embora a maioria dos pacientes seja do sexo masculino. Sobrecarga de ferro e infecções por HCV e HBV interagem com álcool, levando ao aumento da gravidade da doença hepática. Efeitos do álcool: a exposição ao álcool causa esteatose, disfunção das membranas mitocondriais e celulares, hipóxia e estresse oxidativo. Em concentrações milimolares, o álcool afeta diretamente as funções microtubular e mitocondrial e a fluidez da membrana. Existem três formas distintas, embora com alguma sobreposição, de lesão hepática alcoólica: (1) a esteatose hepatocelular ou alteração gordurosa, (2) a hepatite alcoólica (ou esteato-hepatite), e a (3) esteatofibrose (padrões de cicatrizes típicas para todas as doenças hepáticas gordurosas, incluindo álcool), que se soma à cirrose nos estágios tardios da doença. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp O risco de desenvolver cirrose é maior e depende da duração do alcoolismo, da frequência de consumo, da dosagem (H ingesta > 40g/dia; M ingesta > 20g/dia). Todas as alterações na doença hepática alcoólica começam na zona 3 do ácino e se estendem para fora, na direção dos tratos portais, com o aumento da gravidade da lesão. • METABOLISMO DO ETANOL O primeiro passo ocorre pelas isoenzimas gástricas, no estomago. Principalmente pela desidrogenase alcóolica (ADH). Após absorção pela mucosa gastrointestinal, é transportado para o fígado onde é oxidado. 2-10% da quantidade absorvida é eliminada como tal pelos rins e pulmões. O acetaldeído (ou Aldeído Acético) é o principal produto tóxico do metabolismo do etanol, é extremamente lesivo aos hepatócitos. Há 3 vias possíveis do metabolismo do álcool: - Metabolismo Oxidativo: via mais frequente, citosólica. Ocorre na mucosa gástrica pela desidrogenase alcóolica. - Sistema Microssomal Etanol-Oxidante (P450): Ocorre no RE dos hepatócitos, pela enzima CYP2E1. Os alcóolatras esgotam a via 1 e utilizam muito essa via, isso torna o indivíduo muito mais resistente ao consumo de álcool e suscetíveis ao desenvolvimento de lesões. Essa via também está relacionada com metabolização de medicamentos, como o Paracetamol. Por isso o uso concomitante de álcool e algumas medicações pode ser muito perigoso, pode causar insuficiência hepática fulminante. - Metabolismo não oxidativo: sistema da catalase, ocorre nos peroxissomos. O aldeído acético formado pelo metabolismo é tóxico e é convertido na mitocôndria pelas enzimas aldeído desidrogenase. O aumento excessivo de acetaldeído formado acaba destruindo as cristas mitocondriais e isso é a principal lesão por álcool. Isso aumenta a concentração de PGO, devido a lesão da mitocôndria dos hepatócitos. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Hialinos de Mallory: proteínas do citoesqueleto condensadas, enoveladas. Balonização: disfunção da bomba ATPase. No alcoolismo crônico há mitocondriopatia dos hepatócitos perivenulares (da zona 3). Importantíssima lesão alcóolica. Esses hepatócitos são menos oxigenados e por isso mais suscetíveis a essas lesões, por isso são os primeiros a sofrerem. A indução do citocromo P-450 no fígado pelo álcool aumenta o catabolismo do álcool no retículo endoplasmático e intensifica a conversão de outros medicamentos (p. ex., acetaminofeno) em metabólitos tóxicos. O álcool causa a liberação de endotoxinas bacterianas do intestino para a circulação portal, induzindo respostas inflamatórias no fígado, devido à ativação de NF-κB e a liberação de TNF, IL-6 e TGF-α. Além disso, o álcool estimula a liberação de endotelinas das células endoteliais sinusoidais, causando vasoconstrição e a contração de células estreladas miofibroblásticas ativadas, levando à diminuição da perfusão sinusoidal hepática. Interação do álcool com medicamentos: além de oxidar o etanol, a CYP2E1 inativa medicamentos, como analgésicos (Paracetamol), barbitúricos, etc. Quando ingeridos em conjunto, a enzima vai ficar super saturada e não vai metabolizar bem nem o etanol e nem os medicamentos, potencializando os efeitos deles. Aumenta a resistência de alcoólatras a alguns medicamentos em abstinência. Metabolismo de Ácidos Graxos: os ác. Graxos livres são absorvidos pelo intestino quando vem da dieta ou no sangue por lipólise do tecido adiposo. Encaminham-se para os hepatócitos, onde serão metabolizados. Ao entrar nos hepatócitos eles podem seguir algumas vias: oxidados a corpos cetônicos, formação de fosfolípides, ésteres de colesterol etc. Contudo, nem todo o ácido segue por essa via, uma parte é desviado para a enzima Glicerofosfato-alfa e são transformados em triglicerídeos (TG). Uma vez formados, eles podem ser ligados a apoproteínas e secretados no sangue como lipoproteínas. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Então, se há equilíbrio os triglicerídeos não se acumulam nos hepatócitos. Contudo, se tem etapas que alteram esse equilíbrio, como deficiências enzimáticas, aumento de ac graxos, diminuição de apoproteínas faz com que os TG fiquem armazenados no interior dos hepatócitos. De modo geral, a relação entre alcoolismo e esteatose engloba vários mecanismos. Estão relacionados: A produção dos acetaldeído reduz função mitocondrial de oxidação dos ácidos graxos e de produção de proteínas, causando decréscimo na síntese proteica. Por outro lado, elas também levam a aumento do glicerol plasmático, com aumento da esterificação de ácidos graxos para triglicerídeos, que ficam estocados nos hepatócitos (esteatose). Isso ocorre por aumento da enzima que faz a esterificação. O etanol é oxidado a acetaldeído e acetil CoA com consumo de NAD (que é nosso principal aceptor de elétrons). Esse consumo de NAD interfere no ciclo de Krebs, inibindo. Isso gera menor produção de ATP. O álcool também estimula a lipólise, aumentando o aporte de ac graxos no fígado. Também desestimula alimentação adequada porque o álcool é fonte abundante de calorias, com isso os níveis de proteínas caem e, com o tempo, cai apoproteínas. O álcool tem um efeito tóxico direto: a produção de acetaldeído no reticulo lesam membranas onde são formadas VLDL, o que impede a união adequada dos lípides às proteínas e, com isso, menos complexos lipoproteicos se formam e acumula TG no hepatócito. O metabolismo do etanol também gera acetil CoA, que é desviada para a síntese de ac graxos. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp ASPECTOS MORFOLÓGICOS A alteração gordurosa é completamente reversível se houver abstinência subsequente da ingestão de álcool. O fígado com esteatose tem aspecto gorduroso, aumentado de volume e peso (pode atingir 3 a 6kg). As bordas ficam arredondadas e fica com coloração amarelada. A esteatose pode ter aspecto macro ou microgoticular. A macrogoticularé uma complicação precoce e quase constante, é a primeira a aparecer e a primeira a ir embora. Os pacientes geralmente são assintomáticos. Ela desaparece após 2-6 meses de abstinência. São gotículas bem grandes que empurram o núcleo e organelas para a periferia dos hepatócitos. Fica branco porque quando processamos o material elas saem. Tem colorações específicas que conservam as gotículas. Já a esteatose microgoticular tem gotículas bem pequenas que não empurram os núcleos. Os pacientes podem ser assintomáticos. Elas regridem rapidamente após abstinência e estão frequentemente associadas a formação de megamitocôndrias (bolinhas róseas). São aglomerados de mitocôndrias por lesão do acetaldeído. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Quando tem esteato-hepatite (ou Hepatite Alcóolica), ocorre coisas além de esteatose, a lesão é mais grave. A esteatose é mais acentuada nos hepatócitos menos oxigenados, ou seja, da zona 3. Há balonização (degeneração hidrópica extrema) com ou sem corpos hialinos de Mallory. Há também infiltrado inflamatório lobular misto (com neutrófilos). Os corpos hialinos de Mallory não são especificas de doença hepática alcoolica, pois também estão presentes na NASH, na doença de Wilson e em doenças crônicas do trato biliar. Representa uma grande lesão as proteínas celulares. Então, esteatohepatite tem: Tumefação e necrose de hepatócitos + corpos hialinos de Mallory + reação neutrofílica. Podem ocorrer: - Satelitose: halo ou coroa de neutrófilos ao redor de hepatócito com corpúsculo de Mallory (leucotáxico). Persiste até 4 meses após abstinência alcoolica. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp - Lipogranulomas: células inflamatórias ao redor de hepatócito com grande vacúolo de gordura. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Esteatohepatite é um passo a mais de lesão. Além da esteatose tem degeneração balonizante, hialina de Mallory, infiltrado inflamatório. Não precisa ter todas essas características, mas se tiver algo mais que esteatose, já falamos de esteatohepatite. Lembrar que se concentra na zona centrolobular, ao redor da VHT, diferente das hepatites tradicionais. Processo mais parenquimatoso do que no espaço de disse. Esteatofibrose alcoólica: a hepatite alcoólica é frequentemente acompanhada por uma ativação evidente de células estreladas dos sinusoides e fibroblastos portais, originando fibrose. A fibrose começa com a esclerose das veias centrais. A cicatriz perissinusoidal então se acumula no espaço de Disse da região centrolobular, espalhando-se para fora e cercando grupos pequenos ou individuais de hepatócitos em um padrão de cerca de tela de arame. Com o desenvolvimento de nódulos, a cirrose se estabelece. Aspectos clínicos: a esteatose hepática pode causar hepatomegalia, com leve elevação dos níveis séricos de bilirrubina e fosfatase alcalina. Disfunção hepática severa é pouco comum. A retirada do álcool e o fornecimento de uma dieta adequada constituem um tratamento suficiente. Em contraste, a hepatite alcoólica tende a aparecer de modo agudo, geralmente após um episódio de ingestão intensa de álcool. Os sintomas e as manifestações laboratoriais podem variar de mínimos até aqueles semelhantes à insuficiência hepática aguda. Entre esses dois extremos estão os sintomas inespecíficos de mal-estar, anorexia, perda de peso, desconforto abdominal superior, hepatomegalia dolorosa e os achados laboratoriais de hiperbilirrubinemia, elevação de aminotransferases séricas e fosfatase alcalina e, muitas vezes, uma leucocitose neutrofílica. Com nutrição adequada e a interrupção total do consumo de álcool, a hepatite alcoólica pode ser resolvida lentamente. Contudo, em alguns pacientes, a hepatite persiste, apesar da abstinência, e progride para cirrose. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp 2. ESTEATO-HEPATITE NÃO ALCÓOLICA (NASH) Na hepatopatia alcóolica, cerca de 70% dos pacientes desenvolve esteatose. Cerca de 30% desenvolve esteato-hepatite, com esteatose microgoticular, degeneração balonizante, corpúsculos de Mallory, morte celular (necrose, apoptose) e infiltrado inflamatório principalmente de neutrófilos. A reparação do dano é por fibrose e cirrose. Isso ocorre numa menor porcentagem. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Na hepatopatia não alcóolica (NASH), não tem preferência por sexo ou idade. É difícil separar por alterações histológicas da hepatopatia alcóolica. Os fatores de risco são síndromes metabólicas, como obesidade, adiposidade central, DM tipo 2, hiperlipidemia, resistência periférica à insulina. Contudo, isso pode estar associado ao consumo de álcool e dificultar a diferenciação da esteatohepatite alcoolica e não alcoolica. Em geral, a esteatose hepática, assim como a obesidade, resulta de um excesso de alimentação rica em calorias, diminuição de exercícios e mecanismos genéticos/epigenéticos. Aqueles com esteatose simples geralmente são assintomáticos. A apresentação clínica é frequentemente relacionada com outros sinais e sintomas da síndrome metabólica, especialmente a resistência à insulina ou diabetes melito. No exame físico encontramos hepatomegalia. Outros fatores de risco para desenvolvimento da NASH são: toxinas, cirurgias (gastroplastia, bíleodigestivas), drogas (IFN, AINH, tamoxifeno, CE, E). Acredita-se que os hialinos de Mallory são mais numerosos na ASH, enquanto que a esteatose tende a ser mais intensa na NASH. Contudo, é muito difícil diferenciar. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp 3. EVOLUÇÃO DESFAVORÁVEL DA ESTEATOHEPATITE – cirrose Quando o uso do álcool continua sem interrupção em longo prazo, a subdivisão contínua de nódulos estabelecidos por novas teias de cicatrizes perissinusoidais leva a uma clássica cirrose micronodular ou cirrose de Laennec, descrita pela primeira vez para a doença hepática alcoólica em estágio final. A fibrose é o estágio intermediário no desenvolvimento da cirrose. No caso da fibrose associada a esteatohepatite, os primeiros hepatócitos que sofrem estão na zona 3. É lá que começa a fibrose. Assim: há necrose confluente perivenular causando esclerose hialina central associada à fibrose Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp perissinusoidal (pericelular). Com o passar do tempo, essa esteatohepatite se espalha por todas as zonas e a fibrose chega também ao espaço portal. Esse tipo de fibrose ao redor dos hepatócitos também é chamada de fibrose “em tela de galinheiro”. É bem delicada. No estágio mais avançado, a fibrose evolui para cirrose. Pode causar hipertensão portal e aumentar o risco de CHC. A fibrogênese é pelo mecanismo clássico da estimulação das células estreladas (de Ito) a se transformarem em miofibroblastos e depositar colágeno tipo 3. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp → ESTEATOHEPATITE ALCÓOLICA Este caso mostra efeitos do consumo prolongado de álcool no fígado. Há esteatose difusa, fibrose e infiltrado inflamatório nos espaços portais. Notam-se também delicados septos fibrosos separando lóbulos e indicando progressão para cirrose. Há proeminentes corpúsculos hialinos de Mallory no citoplasma de muitos hepatócitos, característicos, mas não patognomônicos, da hepatite alcoólica. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Abaixo, exemplos de alteração hialina de Mallory, material grumoso avermelhado no citoplasma de hepatócitos, geralmente visualisável em hepatócitos balonizados, e/ou em meio aos vacúolos lipídicos. Resulta da condensação de filamentos do citoesqueleto por ação tóxica do álcool. A alteração hialina de Mallory geralmente se acompanha de necrose de hepatócitos, que atrai neutrófilos. Contudo, nesta lâmina, tanto a necrose hepatocítica quanto os neutrófilos são raros. Branda de Oliveirade Lima, Turma LVI - MedUnicamp A esteatohepatite é uma das manifestações do alcoolismo crônico e, geralmente, ocorre após um episódio de ingesta excessiva de álcool. O termo hepatite alcoólica é empregado em parte por motivos clínicos, pois o quadro lembra uma hepatite viral, com icterícia, mas também porque costuma haver reação inflamatória no parênquima hepático. O mecanismo seria a toxicidade aguda do etanol, que lesa diretamente as células hepáticas, provocando a alteração balonizante e a alteração hialina de Mallory. A morte de hepatócitos induz reação inflamatória focal com neutrófilos. Surtos repetidos de hepatite alcoólica terminam por evoluir à cirrose em cerca de um terço dos casos.
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