Buscar

Comunicação e expressão perante pares de idades diferentes

Prévia do material em texto

ISSN 2176-1396 
 
CONVIVÊNCIA ESCOLAR ENTRE PARES DE IDADES DIFERENTES 
 
Viviane Cristina Medeiros
1
 - UTP 
Vanessa Kokott
2
 - UTP 
 
Grupo de Trabalho – Violências nas escolas 
Agência Financiadora: não contou com financiamento 
 
Resumo 
 
Este artigo apresenta um estudo teórico sobre a questão da convivência na escola, no contexto 
dos anos iniciais do Ensino Fundamental, entre alunos de idades diferentes. O objetivo é 
analisar quais são as implicações observadas na convivência entre alunos, quando estes 
interagem com pares de idades diferentes. Para a construção deste trabalho utilizou-se uma 
investigação bibliográfica, resultando na elaboração de uma síntese do conhecimento sobre o 
objeto de pesquisa. Com base na elaboração teórica realizada neste artigo pretendemos 
apresentar algumas contribuições para o estudo da convivência escolar. Primeiramente, a fim 
de fundamentar a discussão, é abordado o conceito de convivência, de acordo com Delors 
(1996), no qual “aprender a conviver” é definido como um dos quatro pilares para a Educação 
do Século XXI. Também consideramos o conceito de convivência escolar proposto por Fierro 
(2012, 2013) e Mena (2003). Em seguida, exploramos a importância dos agrupamentos entre 
alunos de diferentes idades na escola, na perspectiva de Katz (1995), Kinsey (2001) e Gaustad 
(1997). Ao final, apresentamos alguns resultados que influenciam a convivência escolar entre 
pares de idades diferentes, quando estes compartilham experiências e decisões coletivamente 
em escolas pautadas em uma “educação democrática”, conceito apresentado por Singer 
(2010). Dentre os resultados destacam-se algumas implicações, entre elas, a construção de 
uma convivência com características inclusiva, democrática e pacífica. Os estudos nos 
revelaram que é preciso que os professores e equipe gestora superem práticas tradicionais, que 
segregam e excluem os alunos de acordo com critérios etários, e possam dar espaço para 
interações embasadas em valores humanos na escola. É preciso ensinar a convivência nas 
mais diversas interações cotidianas, sendo esta aprendizagem, portanto, um grande desafio 
contemporâneo para a escola. 
 
Palavras-chave: Educação. Convivência na Escola. Diferentes idades. 
 
1 Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná - UFPR. Especialista em Metodologias 
Inovadoras na Ação Docente pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC-PR. Mestranda em 
Educação no Programa de Pós-Graduação da Universidade Tuiuti do Paraná. Pedagoga na Secretaria do Estado 
do Paraná. E-mail: vimedeiros29@hotmail.com. 
2
 Graduada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Especialista em Psicopedagogia pela 
Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC-PR. Mestranda em Educação no Programa de Pós-Graduação 
da Universidade Tuiuti do Paraná. Pedagoga na Secretaria do Estado do Paraná. E-
mail:vanekokott@yahoo.com.br. 
mailto:vimedeiros29@hotmail.com
21252 
 
Introdução 
Atualmente o cenário mundial é marcado por transformações sociais, cientificas e 
tecnológicas, e a escola, nesse contexto, apresenta algumas contradições. Entre as quais 
podemos destacar a seguinte situação: de um lado, assume um discurso progressista, e por 
outro lado, apresenta práticas pautadas em concepções tradicionais. Dessa maneira, apresenta 
contradições no modo de construção da convivência escolar, ou seja, as práticas reforçam 
relações de poder desiguais e hierárquicas. Essa contradição pode prejudicar o processo de 
ensino e aprendizagem, pois as relações entre professores e alunos, assim como entre pares, 
são tensas. Nesse sentido, geram problemas de convivência, entre eles, podemos destacar 
diferentes formas de indisciplina. 
Nesta perspectiva, a convivência construída nas interações cotidianas no interior da 
escolar reforçam algumas segregações, como por exemplo, o critério de divisão e 
classificação etária de alunos no tempo e espaço escolar. A preocupação é centralizada no 
controle dos educandos, por isso são organizados agrupamentos homogêneos, e 
consequentemente, há pouco espaço para a aprendizagem de convivência na diversidade. É 
preciso superar esse quadro, de modo a buscar diferentes formas de agrupamentos etários, 
pois a sociedade é marcada pela heterogeneidade, e esta complexidade de relações humanas 
também está presente na escola. Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo analisar quais 
são as implicações observadas na convivência entre alunos, quando estes interagem com pares 
de idades diferentes. 
A metodologia usada na elaboração deste artigo foi uma investigação bibliográfica. 
Primeiramente foi realizado um levantamento de produções teóricas, em seguida, a seleção 
dos autores e suas obras, e, após uma leitura crítica foi elaborada uma síntese do 
conhecimento sobre o objeto de pesquisa. 
Neste trabalho, inicialmente será abordado o conceito de convivência. Em seguida, 
exploramos a importância da organização de agrupamentos de diferentes idades na escola. Ao 
final, apresentamos alguns resultados que influenciam a convivência escolar entre pares de 
idades diferentes, quando estes compartilham experiências e decisões coletivamente em 
escolas democráticas, pautadas em princípios de liberdade e gestão participativa. Desta 
maneira, as implicações destas práticas possibilitam a construção de uma convivência com 
características inclusiva, democrática e pacífica. Os estudos nos revelaram que é preciso 
21253 
 
superar práticas tradicionais, e este é um grande desafio para a escola, ensinar a conviver na e 
para a diversidade. 
Explorando o conceito de convivência 
De acordo com o relatório elaborado para a UNESCO, da Comissão Internacional 
sobre a educação para o século XXI, é apresentado os quatro pilares fundamentais para 
educação. Entre eles, destacamos o aprender a conviver com os outros. Essa aprendizagem 
acontece no campo dos valores e atitudes (Delors, 2010). 
A escola enquanto instituição social desempenha um papel fundamental para o 
processo formativo tanto de crianças, jovens e adultos. Dessa maneira, é preciso ensinar 
modos de convivência pautados em valores humanos. É neste espaço educativo que podemos 
analisar a questão da convivência entre alunos de diferentes idades. Nessa perspectiva, 
buscamos a compreensão do conceito de convivência segundo Fierro (2012, 2013) e Mena 
(2003). 
De acordo com Fierro e Tapia (2013, p. 73) é preciso compreender o conceito de uma 
maneira mais ampla, pois conviver implica na necessidade da condição humana em viver 
junto, em grupo, onde o homem se faz no contato com o outro. Nesta relação com o outro, na 
vida em sociedade, o indivíduo, para viver junto, precisa buscar um equilíbrio entre as suas 
vontades e a necessidade que atenda o grupo ao qual está inserido. 
O desenvolvimento da capacidade da convivência entre as pessoas gera a interação 
entre elas, e busca conciliação entre distintos interesses. Os seres humanos, ao 
conviver juntos, tem a necessidade de encontrar um equilíbrio entre a satisfação das 
próprias necessidades e as do outro, que os leva a gerar uma série de dimensões 
pessoais, que permitem avançar na convivência, ou “conduta moral”. (MENA e 
RAMÍREZ, 2003, p. 45) 
Esta busca do equilíbrio deve-se ao fato das pessoas compartilharem algo em comum, 
que possibilita as interações sociais, mais do que “viver juntos” é preciso “estar juntos” , ou 
seja, a convivência é uma experiência de interação humana. 
Mena e Ramírez (2003, p. 45-46) sugerem que há três dimensões pessoais envolvidas 
no desenvolvimento da convivência: a capacidade de compreender o outro, a empatia e o 
juízo moral. A primeira dimensão sugere a necessidade de compreender, ao conviver com o 
outro, o que este pensa e sente de maneira diferente, de acordo com sua trajetória de vida e, 
portanto, deve ser respeitado na sua singularidade.A dimensão da empatia envolve uma 
21254 
 
“ressonância afetiva” (p. 46), pela qual a pessoa sente uma conexão afetiva com o outro. 
Segundo as autoras, a capacidade de empatia está na base da solidariedade, da compaixão e do 
perdão (p. 46). Quanto à dimensão do “juízo moral” – expressão usada por Piaget (1994) -, 
esta se refere à capacidade de discernir aquilo que é correto em determinada situação (p. 46). 
Desta maneira, a convivência é algo construído nas relações humanas, no contato com 
o outro, em um ambiente que promova a interação com os diferentes. A convivência envolve 
aprendizagem e isso torna necessária uma reflexão sobre quais valores se deseja inserir nessa 
experiência, e que sociedade esperamos como resultado desse processo. As considerações 
anteriores possibilitam entender a convivência, portanto, como uma experiência de interação 
humana, que envolve aprendizagem, compreensão do outro, empatia e consciência moral. 
De acordo com a abordagem da convivência escolar em pesquisas, Fierro e Tapia 
(2013, p. 74) apontam uma diversidade de disciplinas e enfoques sobre o tema, entre elas: a 
Educação para a Paz e os Direitos Humanos, Educação e Democracia, Educação Inclusiva, 
Educação de Gênero, Educação e Valores, Educação Cívica e Ética, entre outros. As revisões 
sobre trabalhos apontam dois enfoques gerais: normativo- prescritivo e analítico. 
Quanto ao primeiro enfoque, o normativo-prescritivo, aborda a convivência na 
perspectiva da prevenção da violência ou da qualidade da educação, visando práticas que 
possam intervir na construção da convivência escolar (FIERRO; TAPIA, 2013, p. 75). O 
estudo sobre a convivência de “caráter remedial” ou de “prevenção” podem apresentar 
estratégias e ações restritas ou amplas. A relação entre convivência e qualidade da educação, 
considera a influência no processo ensino-aprendizagem e a necessidade da construção de um 
clima favorável onde os alunos possam aprender. Podem ser abordadas em três dimensões: 
inclusiva, democrática e paz (FIERRO; TAPIA, 2013, p. 79). 
A convivência inclusiva parte do pressuposto que a sociedade é heterogênea, portanto, 
a diversidade deve ser valorizada na escola. Sendo os processos fundamentais para a inclusão, 
o sentimento de pertencimento, reconhecer e valorizar a própria identidade e perceber a 
importância da singularidade dos sujeitos (FIERRO, 2012, p. 11). A convivência democrática 
destaca a importância da construção coletiva das normas e regulamentos da vida em comum, 
assim como resolver os conflitos por meio do diálogo. Quanto à convivência pacífica, em 
função das anteriores, estabelecer relações interpessoais baseadas no respeito e cuidado com o 
outro e os espaços compartilhados (FIERRO; TAPIA, 2013, p. 81). 
21255 
 
Em relação ao enfoque analítico, a convivência é abordada como fenômeno relacional 
ou como experiência subjetiva. A primeira está presente na diversidade das relações 
compartilhadas em determinado tempo e espaço, construídas no cotidiano. Quanto à 
experiência subjetiva, referem-se às experiências dos sujeitos que vivenciam o espaço escolar, 
abordado no conceito de “clima escolar” (FIERRO; TAPIA, 2013, p. 81). 
É preciso compreender a convivência de uma maneira ampla, ultrapassando o contexto 
do processo ensino aprendizagem, mas como forma de se descobrir com o outro, 
compartilhando valores e atitudes comuns. De acordo com Fierro et al (2013, p. 107) o 
conceito da convivência, partindo da perspectiva analítica, está distante de uma definição 
única e de uma interferência linear, pois sempre será um “conglomerado” de convivências. 
Portanto, não pode ser reduzido a um único conceito, mas “um fenômeno que podemos 
acessar de uma maneira indicativa, parcial e temporária” (p. 107). 
Desta maneira, é preciso aprender a conviver, e a escola, enquanto instituição social 
responsável pela formação de crianças, jovens e adultos, para a vida em coletividade, assume 
um papel importante. Portanto, tempos e espaços escolares devem repensados e planejados 
para a aprendizagem da convivência edificada em valores humanos. 
Agrupamentos entre alunos de idades diferentes no contexto dos anos iniciais do Ensino 
Fundamental 
Muitas escolas organizam os alunos em agrupamentos que seguem certos critérios, 
entre eles, o etário. A criança quando inicia a escolarização nos anos inicias do Ensino 
Fundamental, aos seis anos de idade, é classificada, muitas vezes, de acordo com o critério 
etário. Em seguida, segue o percurso escolar em determinada classe, onde passa a conviver 
cotidianamente com o mesmo grupo ao longo do ano letivo. A maioria da organização do 
tempo e espaço escolar permite a convivência somente com pares da mesma idade, restando 
poucos momentos para a interação entre os alunos mais velhos e mais novos. Entre estes 
períodos, destacam-se o recreio e momentos festivos e culturais da escola. 
De acordo com estudos de Katz (1995, p. 1), as interações entre crianças de diferentes 
idades na sociedade atual são limitadas. A autora aponta algumas razões, entre elas: a 
diminuição do tamanho das famílias e o aumento da permanecia da carga horária diária em 
que as crianças passam na escola, na qual, o tempo e espaço escolar são organizados de 
21256 
 
acordo com a divisão de grupos etários, desta maneira, as crianças passam mais tempo 
segregadas por idades. 
Em relação aos agrupamentos de diferentes idades na escola, Katz (1995, p. 1), aponta 
os benefícios da mistura de idades, tanto para as crianças mais velhas quanto para as mais 
novas, e também para os professores, sendo estes sociais e intelectuais. 
Quanto aos benefícios sociais, para as crianças mais velhas, Katz (1995, p. 2-3) 
apresenta algumas possibilidades destas interações, entre elas: atitudes de liderança, pois se 
sentem menos ameaçados, ensinam o outro, melhoram o comportamento quando encorajados 
a ajudar os menores, os imaturos sentem-se menos rejeitados e os tímidos mais confiantes. 
Em relação aos benefícios para os mais novos (p. 3-4), aprendem a importância do cuidado e 
do carinho como habilidades para a vida, e que todos temos limitações, inclusive os adultos, 
assim, sempre precisarmos do outro ao longo da vida. 
Katz (1995, p. 5-6) aponta entre os benefícios intelectuais para os mais velhos, podem 
ser citados, os momentos no qual podem explicar algo para os mais jovens, tendo a 
possibilidade de desenvolver a autoestima. Quantos aos benefícios intelectuais para os mais 
novos (p. 5-6), podemos abordar a participação em jogos e atividades mais complexas, onde o 
desenvolvimento é mais estimulado. 
Kinsey (2001) faz um levantamento dos estudos acadêmicos sobre os agrupamentos 
“multi-idades”, evidenciando que ainda há muito a avançar nas pesquisas em relação ao tema, 
apontando entre as dificuldades, a própria definição do conceito. 
Colocar crianças com pelo menos um ano de idade de diferença, em grupos na 
mesma sala de aula, assim como intencionalmente, aperfeiçoar o que pode ser 
aprendido quando crianças de diferentes – tal como a mesma - idades e habilidades 
têm oportunidades frequentes de interagir. (KINSEY, 2001 apud KATZ, 
EVANGELOU E HARTMANN, 1990, p. 1). 
Na literatura acadêmica, de acordo com Gaustad (1997, p. 2), podemos encontrar 
diferentes termos para se referir aos agrupamentos entre pares de diferentes idades na escola, 
entre eles “agrupamentos familiares”, “misturas”, “multi-idades”. 
Educação Multi-idades envolve a colocação de crianças de diferentes idades, 
habilidades e maturidade emocional na mesma sala de aula. Os alunos são 
frequentemente reagrupados para a aprendizagem de diferentes atividades em vez de 
serem constantemente segregados por idade cronológica, e que muitas vezes 
permanecem com o mesmo professor ou equipe de professores há mais de um ano. 
(GAUSTAD, 1997, p. 2). 
21257 
 
Os estudos realizados na área sócio-emocional apresentam benefícios nosagrupamentos “multi-idades”, apontando que estudantes demonstram atitudes mais positivas 
em relação à escola, desenvolvem habilidades de liderança, autoestima e comportamento 
menos agressivo em comparação aos pares da mesma idade (KINSEY, 2001, p. 1). 
As considerações acima, de acordos com as investigações sobre agrupamentos de 
diferentes idades, demonstram nestas interações benefícios sociais e intelectuais, os quais 
refletem nas habilidades para a vida em comum. Desta maneira, uma possibilidade de 
aprender a conviver com pares de diferentes idades no contexto escolar. 
Convivência entre pares de idades diferentes em escolas pautadas em uma educação 
democrática 
A instituição escolar, ao assumir um discurso de acordo com uma concepção 
progressista de educação, precisa organizar o seu tempo e espaço, no qual alunos possam 
conviver em agrupamentos entre pares de diferentes idades, aprendendo a conviver na 
diversidade. Uma escola que promova encontros para conhecer o outro, momentos para 
compartilhar experiências e decisões coletivamente, propicia um ambiente seguro o qual 
promove a liberdade de expressão e o respeito ao outro. 
Podemos constatar, no contexto atual, algumas possibilidades de fazer uma educação 
inovadora, que rompa com paradigmas tradicionais, que segregam e classificam os alunos, há 
escolas que resistem a estes modelos, sendo denominada “educação democrática” (SINGER, 
2010, p. 15). Estas instituições escolares apresentam duas características comuns: 
[...] gestão participativa, com processos decisórios que incluem estudantes, 
educadores e funcionários, e organização pedagógica como centro de estudos, em 
que os estudantes definem suas trajetórias de aprendizagem, sem currículos 
compulsórios. (SINGER, 2010, p. 15). 
De acordo com levantamento, estas escolas estão presentes ao redor do mundo, as 
quais, várias delas, articuladas em redes, entre elas: Institute for Democratic Education (IDE) 
criada em 1987; International Democratic Education Network (IDEN) criada em 2000, a 
escola mais famosa que pertence a esta rede é Summerhill; Sudbury Education Resource 
Network. Em Portugal, a Escola da Ponte inicia o processo de democratização em 1976, mas 
não participa de nenhum movimento internacional de escola democrática. No Brasil, a 
21258 
 
primeira escola democrática criada foi a Lumiar, em 2003, na cidade de São Paulo (SINGER, 
2010, p. 43-47). 
A contextualização aponta para uma ambiguidade permanente: trata-se de um 
fenômeno ao mesmo tempo internacional e isolado. As mais diversas realidades 
socioculturais suscitam a formação de escolas similares, que se caracterizam pela 
proposta de uma prática diferente, em resistência a um sistema em que as avaliações, 
a competição e o autoritarismo dão a tônica. (SINGER, 2010, p. 55). 
Algumas dessas escolas romperam com a organização seriada, e promovem interações 
entre os alunos de idades diferentes. Nesse sentido, é possível aprender em um ambiente 
colaborativo, de aprendizagem solidária e cooperativa, em detrimento a um sistema de 
exclusão e competição. De acordo com Singer (2010, p. 133-134), a escola Sudbury, nos 
Estados Unidos, que matricula alunos a partir dos quatro anos de idade até os 18 anos sem 
preocupação com a escolarização prévia. Nessa escola não há agrupamentos determinados, o 
aluno é livre para decidir a organização de seu tempo. 
Em 2004, os psicólogos Jay Feldmann e Peter Gray fizeram uma pesquisa de 
observação sobre o convívio de crianças pequenas e adolescentes em Sudbury e seus 
resultados contribuem para a melhor compreensão da escola. A principal conclusão 
deste estudo é que os diferentes níveis de compreensão das atividades propostas 
tendem, de fato, a variar por faixa etária, mas de modo bem mais amplo e 
heterogêneo do que supões a seriação escolar. (SINGER, 2010, p. 134). 
Os estudos de Feldmann e Gray apontam que em atividades acadêmicas o 
aproveitamento acontece de maneiras diferentes e a reflexão coletiva é enriquecida pela 
multiplicidade do grupo multietário (SINGER, 2010, p. 134-135). 
Em uma escola democrática como Sudbury a maior habilidade de um não dá lugar a 
manifestações competitivas, mas sim solidárias. Analogamente, a dificuldade maior 
de alguém não o impede de participar das atividades, dado que todos podem sempre 
contribuir recebendo o auxilio adequado. (SINGER, 2010, p. 135). 
Desta maneira, alunos de diferentes idades aprendem juntos em um ambiente 
acolhedor, mais velhos e mais novos trocam experiências e conhecimentos em uma relação 
horizontal. As práticas são inclusivas, não há medo de “errar” ou “não saber”, enfim, de ser 
avaliado e classificado. Há liberdade para se expressar, apresentar dúvidas e inseguranças, 
enfim, aprender mutuamente. 
As formas de compreensão das escolas denominadas “democráticas” buscam romper 
com estruturas tradicionais da escola, as decisões são discutidas e decididas coletivamente em 
assembleias, de acordo com princípios de uma gestão participativa. Podemos usar como 
21259 
 
exemplo Sudbury, na qual existe a assembleia, composta por todos os estudantes e equipe, a 
qual tem como função legislar as regras comunitárias e administrativas, a participação é 
voluntária. Há também um órgão legislador de conflitos, que organiza um comitê, o qual é 
composto seguindo um rodízio mensal. A função deste comitê é receber queixas, investigar e 
sentenciar, quanto às situações mais complicadas são encaminhadas para a assembleia 
(SINGER, 2010, p. 134). 
Outra escola que não trabalha com divisão etária, é a Escola Democrática de Hadera, 
localizada em Israel, atendendo estudantes de 4 a 19 anos. Esta instituição deu origem ao IDE 
(Instituto para Educação Democrática). No final do ano letivo, toda a comunidade escolar faz 
um levantamento dos conteúdos para serem ofertados no ano seguinte, organizados em 
cursos, os quais os alunos escolhem livremente, de acordo com seus interesses. Não há 
obrigatoriedade a cumprir um currículo pré-estabelecido, o que importa são os reais interesses 
dos alunos, o que amplia o aprendizado para diferentes assuntos e a autoestima (SINGER, 
2010, p. 147). 
Dentre as escolas democráticas, uma das mais conhecidas por educadores ao redor do 
mundo, é a Escola da Ponte, localizada em Portugal. Inicialmente era uma escola tradicional, 
enfrentava problemas de convivência: entre eles a indisciplina e a violência. Neste contexto, 
houve um projeto para superar estas dificuldades, idealizado pelo educador José Augusto, 
chamado Projeto Fazendo a Ponte, buscando transformações nas práticas escolares (WREGE, 
2012, p. 77). 
Na Ponte não existem salas de aula nem separação por séries ou idades. Os alunos 
reúnem-se em grupos para estudar assuntos de interesse comum, agrupando-se por 
vontade própria e ajudando-se mutuamente. Os grupos formados recebem nomes 
que refletem a faixa etária e as ideologias de seus integrantes. Tal ruptura com a 
organização em classes ou séries constitui o traço mais marcante desta experiência 
escolar. Os espaços são polivalentes e tanto alunos quanto professores gozam de 
autonomia para realizarem seus trabalhos. Os desejos dos alunos são respeitados e o 
percurso educacional deve ser trilhado da maneira mais agradável possível. Os 
educadores trabalham com todos os educandos, não havendo um lugar fixo para 
estudar, brincar e aprender. Os grupos reúnem-se com o professor tutor, traçando os 
planos de estudos para a quinzena, definindo o tema a ser pesquisado e a 
metodologia que deverá ser empregada, assim como as possíveis fontes de 
informações que poderão ser utilizadas. (WREGE, 2012, p.79). 
No Brasil, podemos citar dentre as escolas que adotam uma “educação democrática”, a 
Escola Municipal de Ensino Fundamental Amorin Lima, em São Paulo, influenciada pela 
proposta da Escola da Ponte. “Situada em um bairro de alta heterogeneidade cultural e social 
21260 
 
e próxima a poloscientífico-culturais, a instituição recebe uma clientela também heterogênea 
e múltipla” (WREGE, 2012, p. 81). 
Destaca-se que, na Amorim Lima, de maneira semelhante à Ponte, os educandos 
trilham seus próprios caminhos com o auxílio de um professor tutor. Para tanto, a 
escola “quebrou as paredes” e transformou o espaço que era destinado às salas de 
aula em um local único, disponibilizando aos alunos os materiais e ferramentas, tais 
como livros e computadores, que privilegiam o trabalho de pesquisa. (WREGE, 
2012, p. 83). 
Enfim, muitas escolas espalhadas pelo mundo buscam uma nova concepção de 
educação frente às necessidades contemporâneas. Nesse sentido, ensinam modos de 
convivência que valorize o ser humano, em detrimento de atitudes competitivas e de exclusão. 
Dessa maneira, a organização do tempo e espaço escolar, pautado em princípios de uma 
educação democrática, o qual alunos de diferentes idades possam compartilhar experiências e 
decisões, influencia a qualidade da convivência escolar. Sendo assim, estas interações 
possibilitam determinadas vivências embasadas em valores de respeito, cooperação e 
solidariedade, e, portanto, a construção de uma convivência inclusiva, democrática e pacífica. 
Considerações Finais 
A partir da discussão apresentada, entende-se a importância da escola organizar 
agrupamentos entre pares de idades diferentes, em momentos em que os alunos tenham 
possibilidade de compartilhar experiências. Dessa maneira, estas interações podem influenciar 
a construção de uma convivência diferenciada, baseada em valores humanos. Sendo assim, 
apresenta-se como possibilidade de superar modelos tradicionais excludentes e de segregação, 
que reproduzem a discriminação e o preconceito, geram a intolerância e o desrespeito às 
diferenças. 
A escola, fundamentada em uma concepção progressista de educação, deve planejar e 
construir coletivamente um projeto de convivência, pautado em valores humanos. Entretanto, 
a aprendizagem da convivência não ocorre somente em discursos, mas em situações práticas 
cotidianas no ambiente escolar. O sujeito aprende com o outro, e nesta troca, (re) constrói a 
sua identidade. Nesse processo, dinâmico e complexo, o indivíduo busca o equilíbrio de suas 
satisfações pessoais e sociais. Nesse sentido, em ações mediadas pela moral, fundamentada 
em valores aprendidos nas interações sociais. 
21261 
 
Desta maneira, possibilitar a convivência escolar entre pares de idades diferentes, 
quando estes compartilham experiências e decisões coletivamente em escolas pautadas por 
princípios de liberdade e gestão participativa , produzem implicações que influenciam a 
construção de uma convivência inclusiva, democrática e pacífica. 
Este ambiente construído coletivamente valoriza processos que fundamentam uma 
convivência inclusiva, pois estudantes sentem-se acolhidos e respeitados em sua 
singularidade. As dificuldades não são impedimentos para realização de atividades, pois as 
relações são embasadas em valores de cooperação e solidariedade. A construção coletiva de 
normas que regulam a vida em comum na escola e a resolução de conflitos mediados pelo 
diálogo possibilita o desenvolvimento da autonomia nos alunos, e, portanto, a construção da 
convivência democrática. Nessa perspectiva, um modo de convivência que possibilita 
interações baseadas no respeito e cuidado com o outro, na confiança, no uso do diálogo na 
resolução dos conflitos, portanto, um ambiente escolar seguro que influencia na construção de 
uma convivência pacífica. 
Desta maneira, a convivência entre pares de idades diferentes, fundamentada em uma 
educação democrática, fortalece as interações na escola. É preciso aprender a viver junto, não 
apenas dividindo um tempo e espaço segregado e estabelecer interações verticalizadas, mas 
compartilhando valores comuns, de respeito e cuidado pelo outro, solidariedade e cooperação. 
A construção de modos de convivência inclusiva, democrática e pacífica nas interações 
cotidianas da escola, estreita vínculos e influenciam na (re) construção da identidade da escola 
e dos sujeitos. 
REFERÊNCIAS 
DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da 
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Brasília: UNESCO, 2010. 
FIERRO EVANS, Maria Cecília et al. Conversando sobre la convivencia en la escuela: una 
guia para el auto-diagnóstico de la convivencia escolar desde las perspectivas docentes. 
Revista Iberoamericana de Evaluación Educativa, Madrid, v. 6, n. 2, p. 103-124, 2013. 
FIERRO EVANS, Maria Cecilia. Convivencia inclusiva y democrática. Una perspectiva para 
gestionar la seguridade escolar. Sinéctica, Jalisco, n. 40, p. 1-18, enero/junio 2012. 
FIERRO EVANS, Maria Cecilia; TAPIA, Guillermo. Convivencia escolar: un tema 
emergente de investigación educativa en México. In: FÚRLAN, Alfredo; SCHWARTZ, Terry 
21262 
 
Carol Spitzer (Org.). Convivencia, disciplina y violencia en las escuelas 2002-2011. 
México: ANUIES, 2013, p. 73-131. 
 
GAUSTAD, Joan. Building support for multiage education. ERIC Digest. Champaign, n. 
114, p. 1-6, jun. 1997. 
KATZ, Lilian. The benefits of the mix. ERIC Digest. Champaign, p. 1-6, abr. 1995. 
KATZ, Lilian; EVANGELOU, Demetra. e HARTMAN, Jeanette. Allison. The case for 
mixed-age grouping in early childhood education. National Association for the Education 
of Young Children. Washington D.C., ED326302, p. 75, 1990. 
KINSEY, SUSAN. Multiage grouping and academic achievement. ERIC Digest. Champaign, 
p.1-6, jan. 2001. 
MENA, Maria Isidora; RAMÍREZ, Maria Teresa. Contra la violencia, la formación de la 
convivencia. Revista Docencia . Santiago, n. 19, p. 43-50, maio 2003. 
PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. SP: Summus, 1994. 
SINGER, Helena. República de crianças: sobre experiências escolares de resistência. 2. ed. 
Campinas: Mercado das Letras, 2010. 
WREGE, Mariana Guimarães. Escolas Democráticas: um olhar construtivista. 418 f. 
Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de 
Campinas, Campinas, 2012.

Continue navegando