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ISAÍAS VOLTAR Introdução Capítulo 16 Capítulo 33 Capítulo 50 Plano do livro Capítulo 17 Capítulo 34 Capítulo 51 Capítulo 1 Capítulo 18 Capítulo 35 Capítulo 52 Capítulo 2 Capítulo 19 Capítulo 36 Capítulo 53 Capítulo 3 Capítulo 20 Capítulo 37 Capítulo 54 Capítulo 4 Capítulo 21 Capítulo 38 Capítulo 55 Capítulo 5 Capítulo 22 Capítulo 39 Capítulo 56 Capítulo 6 Capítulo 23 Capítulo 40 Capítulo 57 Capítulo 7 Capítulo 24 Capítulo 41 Capítulo 58 Capítulo 8 Capítulo 25 Capítulo 42 Capítulo 59 Capítulo 9 Capítulo 26 Capítulo 43 Capítulo 60 Capítulo 10 Capítulo 27 Capítulo 44 Capítulo 61 Capítulo 11 Capítulo 28 Capítulo 45 Capítulo 62 Capítulo 12 Capítulo 29 Capítulo 46 Capítulo 63 Capítulo 13 Capítulo 30 Capítulo 47 Capítulo 64 Capítulo 14 Capítulo 31 Capítulo 48 Capítulo 65 Capítulo 15 Capítulo 32 Capítulo 49 Capítulo 66 INTRODUÇÃO I. ISAÍAS, O HOMEM Entre a "santa companhia dos profetas", Isaías destaca-se como uma figura majestosa. Pela elevação e originalidade do seu pensamento, bem como pela qualidade superlativa do seu estilo, é único no Velho Testamento. Nenhum outro profeta há tão digno como ele de ser chamado "o profeta evangélico". O seu nome significa "Jeová Salva" ou "Jeová é Salvação" e, em dias de crise e catástrofe sem precedentes na história do seu povo, exortava constantemente à fé nAquele que é o único que nos pode livrar. Em horas em que a esperança parecia morta, era uma inspiração e um repto para a coragem desfalecida dos homens Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 2 de Judá: O seu ministério foi longo, desde a sua chamada à missão profética no reinado de Uzias, rei de Judá, através dos reinados de Jotão, Acaz e Ezequias, com um possível interlúdio de serviço no tempo de Manassés. Durante todos estes anos revelou-se um estadista que lia o significado geral dos acontecimentos nos grandes problemas políticos da época e também um profeta verdadeiramente designado e escolhido pelo Senhor para proclamar o propósito divino com convicção inabalável e coração ardente. O nome de seu pai era Amós (Is 1.1; 2.1), segundo uma tradição judaica irmão do rei Amazias; nesse caso, Isaías seria primo do rei Uzias. Evidentemente que é impossível alguém pronunciar-se com certeza a respeito deste problema, mas há indicações nítidas de que Isaías desfrutava, de fato, de entrada imediata e regular na casa real, além de ter acesso às pessoas mais influentes do seu tempo. Apesar disso, continuou a ser um simples e indômito porta-voz de Jeová, motivo que - ainda segundo reza a tradição - levou à sua execução no reinado do ímpio Manassés. Era casado e chama a sua mulher "a profetisa" (Is 8.3); teve dois filhos, Sear-jasube (Is 7.3) e Maher-shalal-hash-baz (Is 8.3), cujos nomes constituíam prenúncio dos acontecimentos que se avizinhavam e reforçavam a mensagem do profeta. Fora disto, pouco mais se sabe da sua vida além do que o livro que tem o seu nome nos revela. Não é possível determinar com exatidão a duração do seu ministério; sabemos, porém, que, durante pelo menos 40 anos, continuou ativo, desde o último ano de Uzias, em 740 a.C., ao décimo quarto ano de Ezequias em 701 a.C., e que, durante todo este tempo, a sua mensagem e o repto que lançava aos seus contemporâneos foram inalteráveis e persistentes, fiéis a um propósito sempre claro e bem definido - estabelecer a adoração do Senhor em justiça e verdade entre a raça escolhida. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 3 II. INFLUÊNCIAS FORMATIVAS A influência mais destacada e mais perdurável na vida de Isaías foi, sem dúvida, a sua chamada pessoal e direta ao ministério profético dentro do recinto do templo depois da morte de Uzias. Este acontecimento é registrado com uma beleza e um brilho tais que indicam claramente a forte influência que essa visão exerceu sobre ele através de todo o seu ministério. Provavelmente nada há em toda a literatura dos povos do Oriente que exceda a grandeza e dignidade deste trecho imortal, em Is 6. Ao entrar no recinto do templo, depara-se, de súbito, ao jovem Isaías esta visão solene e aterrorizadora - o Senhor nas alturas, o séquito celeste, os místicos serafins, o "shequiná" da santidade, a voz anunciando ao profeta, prostrado perante a majestade assim revelada, a missão de que era incumbido. No meio duma cena política conturbada e incerta, ele contempla, com todo o poder de uma revelação direta, o Senhor Deus entronizado nas alturas, e doravante pousa sobre ele o selo da Sua ordem. Não havia que fugir daí. Embora isso significasse que o profeta iria levar aos povos do seu tempo uma mensagem que não receberiam, não havia que fugir à glória da revelação assim outorgada. Foi deste modo que Isaías saiu do templo com uma nova visão e uma nova noção dos altos e santos perigos da missão que lhe fora confiada e da incumbência que ficava a seu cargo. Antes desta experiência notável e decisiva, houvera o fruto do ministério de Amós e Oséias, o qual se devia encontrar ainda bem fresco na memória e experiência do jovem Isaías. Em épocas de crise nacional, houvera sempre em Israel, como em Judá, a mensagem do Senhor, numa ou noutra conjuntura, através da voz dos profetas, e nas palavras de Isaías descortinam-se vestígios dos elementos característicos das suas mensagens. Para alguém que resolvera firmemente no seu coração percorrer o caminho do Senhor, essas vozes deviam constituir uma inspiração incalculável, e as palavras calorosas e comoventes do profeta evangélico, ao apontar para o Redentor de todo Israel fazem lembrar os Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 4 termos em que esses servos mais antigos de Jeová haviam proclamado a mensagem divina. Além desses fatores, Isaías deve ter sido profundamente agitado pelos poderosos movimentos históricos do seu tempo. Durante o reinado do bom rei Uzias, Judá esteve em paz durante muitos anos e pouco conheceu das dificuldades que o reino do norte teve de enfrentar. Externamente havia paz e piedade, mas por debaixo, e no próprio âmago da vida da nação, havia desassossego e um afastamento pronunciado da realidade da adoração instituída no Concerto. (Ver Apêndice 1 de Reis, "A Religião de Israel no Período da Monarquia"). Fora da pátria, o horizonte apresentava já prenúncios sombrios de invasão e crise e, apesar de todos os eleitos, Isaías deve ter visto claramente, na fase mais formativa da sua vida, que, se não houvesse um movimento de regresso ao Senhor, a catástrofe era inevitável. Em certo sentido, todos nós somos produto do nosso ambiente; chegamos à hora de provação, ou para a enfrentar em toda a sua magnitude e determinar o seu curso, ou então para sermos moldados pela sua força titânica. No caso de Isaías, temos um dos exemplos mais frisantes de uma hora grave que encontrou um homem à sua altura, e de uma voz que se ergueu no próprio momento em que mais necessário era proclamar a mensagem de Deus. Isaías pôde trazer à tarefa que foi chamado a desempenhar um dom extraordinário, uma felicidade de expressão e uma penetração que, sob a mão de Deus, se deveriam transformar no veículo das verdades mais íntimas e profundas da revelação. Assim, equipado de forma única para o ministério a que era chamado, e preparado na escola da experiência para a prova que se avizinhava, no ano em que o rei Uzias morreu e em que o trono, havia tanto ocupado com tal distinção, vagou uma vez mais, o profeta estava pronto para a alta missão do Senhor transcendente nas alturas, enão desobedeceu à visão celestial. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 5 III. CRONOLOGIA Ver também Apêndice III de Reis, "Os Grandes Impérios no Período da Monarquia". 745 Tiglate-Pileser III ascende ao trono da Assíria. 740 Morte de Uzias. Jotão sucede-lhe no trono. Visão de Isaías, sendo o profeta incumbido de exercer o ministério do Santo de Israel. 736 Morte de Jotão. Acaz sucede-lhe no trono. O Reino do Norte alia-se à Síria para atacar Judá. 734-732 Tiglate-Pileser ataca e invade Israel e a Síria. Visita de Acaz a Damasco. 727 Ascensão de Salmaneser ao trono da Assíria substituindo Tiglate-Pileser. 725 Ezequias sobe ao trono, sucedendo a Acaz. 722 Ascensão de Sargom II ao trono da Assíria em lugar de Salmaneser. Tomada de Samaria. Cativeiro de Israel. 711 Sargom invade a Síria. Asdode é capturada. 709 Tomada da Babilônia. 705 Sargom assassinado; sucede-lhe Senaqueribe. 701 Senaqueribe invade Judá. IV. OS REIS DA JUDÉIA DURANTE A VIDA DE ISAÍAS Isaías nasceu no reinado do bom rei Uzias, e foi no último ano da vida desse monarca que recebeu a chamada ao ministério profético. Por consenso geral, o caráter de Uzias era exemplar, mostrando em tudo um espírito de verdadeira piedade e desejo de honrar as coisas de Deus, embora, nos seus últimos anos, o rei fosse atacado de lepra devido a um ato de orgulho (ver 2Cr 26.16-21). Durante o seu reinado, toda a nação atravessou uma fase de prosperidade e desenvolvimento material e foi com dor que o seu povo o viu desaparecer da cena numa altura em que a sua presença parecia mais necessária. Promoveu-se a adoração de Jeová, Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 6 mas o rei não foi suficientemente forte para conseguir que se destruíssem os altos, onde se celebravam práticas idólatras. O seu reinado classifica- se necessariamente entre um dos mais distintos do reino do Sul. Depois dele, subiu ao trono Jotão, seu filho, que já fora regente durante o isolamento de Uzias. Trilhou as mesmas veredas que seu pai, e sob o seu cetro o povo continuou a adorar o Senhor Jeová de acordo com os mandamentos, embora se permitisse que continuassem os "aserim" e locais onde se praticava a idolatria. Um observador superficial julgaria ver provas de devoção verdadeira e profunda, mas, na realidade, não era assim. Por toda a parte alastravam rápida e espontaneamente o luxo e a sensualidade, não sendo de surpreender que, em tal ambiente, o espírito da verdadeira piedade entrasse em rápido declínio (ver Apêndice I de Reis, "A Religião de Israel no Tempo da Monarquia"). Seguiu-se-lhe Acaz, cujo reinado foi, de princípio a fim, uma autêntica crônica de catástrofes e de destruição (ver 2Rs 16). Impetuosamente, Acaz empenhou-se em derrubar a forma estabelecida de adoração, quebrou os mandamentos em quase todos os seus pormenores, impediu a adoração no templo e acabou por fechar as portas da Casa de Deus. Deliberadamente, conspirou para obliterar a memória do culto do Senhor de todo o Israel, do Redentor, do Deus Santo. Todos os seus atos foram como que um aguilhão para o caráter devoto e franco do profeta Isaías que, em público, censurou o rei pelos seus atos extravagantes em matéria de religião, reprovando os seus pecados e apontando-o ao povo como inimigo do verdadeiro caminho. Isto de nada serviu; os seus avisos e conselhos foram desprezados pela nação, à frente da qual se encontrava o rei. Depois, veio Ezequias. Ao contrário de seu pai, Ezequias procurou de muitas formas restaurar a adoração no santuário; fez todos os esforços para abolir a idolatria e para libertar o povo que governava do poder do domínio estrangeiro. No seu reinado, começou-se a fazer justiça a Isaías, que passou a ser considerado com grande favor, sendo-lhe dadas todas as Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 7 oportunidades de aplicar as suas penetrantes e divinamente inspiradas faculdades de discernimento à análise dos fatos da situação sua contemporânea. Mas as sementes da loucura passada da nação começavam agora a dar fruto, e era já tarde demais para pôr em prática reformas eficazes e salutares. Estava próximo o derrubamento de Judá, acontecimento havia muito profetizado par Isaías e que nada poderia deter. Ver-se-á claramente, pois, que não foi fácil a tarefa do profeta durante o seu longo e ativo ministério. A missão que lhe foi confiada no dia da sua chamada ficou amplamente realizada, pois a mensagem que transmitiu foi, de fato, uma mensagem de condenação, e a profecia então feita, de que anunciaria a Palavra do Senhor mas que esta, embora ouvida seria incompreendida, teve cumprimento cabal. A glória da vida de Isaías é que não se esquivou ao problema quando recebeu a chamada. Através de todos aqueles anos sombrios, enquanto a nação caminhava sem parar e com rapidez crescente para o abismo e para a catástrofe, ele continuou a proclamar a mensagem do Senhor, mantendo-se firme como uma rocha da verdade no meio das marés e redemoinhos da infidelidade e irreligião do mundo. V. AUTORIA: O PROBLEMA ESPECIAL DOS CAPÍTULOS 40--66 a) Definição do Problema Esta parte importante do livro de Isaías há muitos anos que apresenta espinhosos problemas de ordem crítica, e nenhum estudo do livro no seu conjunto seria completo sem referência a este assunto. Há quase um século que se afirma, se põe em dúvida e se nega que tenha sido Isaías o autor dos capítulos 40 a 66. Esta seção do livro tem sido designada por nomes diversos, como "o Isaías Babilônico", "o Deutero- Isaías" e "O Grande Anônimo", que são já lugares-comuns na literatura. Muitos admitirão prontamente, com o Prof. A. B. Davidson, que tal problema "diz exclusivamente respeito aos fatos e à crítica, não Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 8 constituindo matéria de fé ou prática". Admitir-se-á talvez, também, que de ambos os lados o critério tem sido influenciado pela atitude do estudioso perante a profecia preditiva. Nesta breve introdução, a nossa finalidade será reproduzir tão objetivamente quanto possível os principais argumentos aduzidos em apoio das duas teses, visto nada se ganhar com votar ao desprezo a argumentação apresentada por aqueles que discordam de nós. No Dictionary of the Bible, de Hastings, G. A. Smith escreve o seguinte: "Os capítulos 40 a 66 não têm título nem reivindicam Isaías como autor. Os capítulos 40 a 48 referem-se claramente à ruína de Jerusalém e ao exílio como fatos transatos. O autor dirige-se a Israel como se tivesse já passado o tempo da sua servidão em Babilônia, e proclama a libertação do povo eleito como imediata. Chama a Ciro o salvador de Israel, referindo-se-lhe como tivesse já encetado a sua carreira e sido abençoado com o êxito por Jeová. Porquanto, como parte da argumentação a favor da divindade única do Deus de Israel, Ciro, "vivo, irresistível e já bafejado pelo triunfo, é apontado como prova insofismável de que se haviam começado a realizar as velhas profecias respeitantes à libertação de Israel. Em suma, Ciro é apresentado, não como predição, mas como prova do cumprimento de uma predição. Se não tivesse já aparecido em cena, e em vésperas de atacar Babilônia com todo o prestígio dos seus triunfos constantes, grande parte dos capítulos 40 a 48 seria ininteligível". Há, assim, uma data bem nítida a atribuir a esses capítulos; devem eles ter sido escritos entre 555 a.C., data do advento de Ciro e 538 a.C., data da queda de Babilônia". Esta citação apresenta da forma mais lúcida o problema que tem de enfrentar todo aquele que estuda o livro de Isaías. Além disso, é de extrema importância assinalar os diferentes pontos de vista das duas principais divisões do livro. Nos capítulos 1 a 39, por exemplo, é evidente que o profeta se dirige à sua própria geração, levando a uma situação sua contemporânea a mensagemviva do seu Deus; mas os capítulos 40 a 66 dirigem-se a uma geração surgida século e meio mais Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 9 tarde, os cativos de Babilônia. Não há dúvida de que o Espírito de Deus se poderia muito bem ter servido de Isaías para falar a uma geração vindoura e de que a predição constitui um elemento incontroverso na profecia. Todavia, aqueles que consideram estes capítulos como tendo sido escritos por um autor pertencente a uma data mais avançada afirmam que isso é forçar o critério e contrariar em grande parte o procedimento normal dos profetas de Israel, através dos quais a mensagem divina se fazia ouvir poderosamente em relação com situações vivas. Se os capítulos 40 a 48 se referem de forma tão evidente à ruína de Jerusalém e ao exílio como fatos já passados, não se deverá aceitar como provável, dizem eles, que a mensagem dirigida nesses versículos aos filhos de Israel proviesse de alguém que vivia no seu seio? b) Argumentos a favor da unidade do livro Dentro do âmbito deste trabalho, que não é de natureza especificamente crítica, não há possibilidade de proceder ao estudo pormenorizado deste problema. Todavia, talvez seja proveitoso resumir os aspectos principais de ambos os lados da questão. A favor da unidade de Isaías é unânime toda a evidência invocável de fontes externas. A evidência externa é toda a favor da unidade do livro; só nos últimos cem anos é que o problema surgiu. Até então, a comunidade judaica e a Igreja Cristã consideravam, sem hesitar, todo o livro como procedente da pena de Isaías, filho de Amós. A Septuaginta não contém a menor referência a uma autoria dupla. Essa antiga convicção foi expressa de forma incomparável pelo filho de Siraque, que, referindo-se à história dos dias de Ezequias, diz que Isaías, o profeta, "viu por um espírito excelente o que se passaria no final; e confortou aqueles que choravam em Sião. Mostrou as coisas que aconteceriam até ao fim dos tempos, e as coisas escondidas antes de surgirem" (Ec 48.24-25). A par disto há que mencionar os muitos trechos do Novo Testamento onde se faz referência a Isaías e se citam as suas palavras. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 10 "Isaías o profeta", eis como se lhe chama independentemente da parte do livro citada. Quanto às referências, distribuem-se de forma quase igual entre as duas partes do livro, sendo as da parte final ligeiramente mais numerosas. Isto, em si, confirma a evidência externa e a tradição dos Pais da Igreja. É sempre difícil avaliar a argumentação de base lingüística, e muito se tem discutido várias considerações suscitadas por palavras e frases comuns a ambas as partes do livro, bem como as que são peculiares a uma ou a outra dessas partes. É impossível analisarmos aqui este aspecto do problema, embora cumpra fazer alguns breves comentários sobre o significado da alusão a Jeová como "o Santo de Israel". Esta expressão ocorre em ambas as partes de Isaías mas é difícil encontrá-la alhures no cânon bíblico. Trata-se de uma das designações mais notáveis de Deus comuns a ambas as seções, e de um assunto de importância primacial. Não se deve confiar demasiado na evidência baseada em sutis e complexas distinções estilísticas e lingüísticas entre as duas partes. Dizer, por exemplo, que a palavra equivalente a "justiça" ocorre cerca de dezessete vezes na segunda parte e apenas quatro ou cinco na primeira; que as palavras correspondentes a "trabalho" ou "recompensa" se encontram cinco vezes na segunda parte e não ocorrem na primeira; que a palavra que significa "também", ou algo de semelhante, aparece repetida nada menos de vinte e duas vezes na primeira e não ocorre na segunda; dizer tudo isso e muito mais pouco prova, visto ser fácil compilar um catálogo de palavras e expressões características de cada uma das partes do livro. A própria distinção entre essas duas partes no tocante ao respectivo tipo de mensagem dá origem a distinções de ordem lingüística. Enquanto que a primeira parte se caracteriza por tremenda energia e vigor, os capítulos 40 a 66 estão impregnados de emoção e de solene beleza, desdobrando-se nas asas de uma harmonia profunda e eterna. Como em toda a grande poesia, há trechos em que se nos deparam repetições e duplicações de frases; mas, para o estudioso objetivo, a própria grandeza da mensagem da redenção e da esperança Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 11 messiânica, distinta da história direta ou de um rol de castigos que se avizinhavam para as nações circunjacentes, parecerá ser suficiente para explicar as diferenças de estilo e linguagem. Pelo que respeita ao estilo literário, até o Dr. Driver, que escolhe dezoito palavras ou frases nos capítulos 40 a 66, tem de largar mão de doze delas por haver trechos paralelos na primeira parte. Na realidade, a crítica sóbria tem afirmado que se exagerou imenso esta questão da diversidade de estilo. Verifica-se haver mais de trezentas palavras e expressões comuns às partes supostamente "anterior" e "posterior" de "Isaías" e que não têm qualquer lugar nas profecias mais recentes de Daniel, Ageu, Zacarias e Malaquias. Outro elemento a ter presente neste estado e que parece favorecer a unidade do livro é que a cor local da segunda seção, como na primeira, é principal e notavelmente a da Judéia. A este respeito, vale a pena reproduzir a seguinte citação do Bible Handbook (página 502) de Angus e Greene (tradução portuguesa: "História, Doutrina e Interpretação da Bíblia"). "Na paisagística do profeta entram rochedos, montanhas e florestas; os seus horizontes estendem-se até às ilhas do mar; os rebanhos são os de Quedar; os carneiros são os de Nebaiote; as árvores são cedros e acácias, pinheiros e buxos, os carvalhos de Basã e as alturas arborizadas do Carmelo. Sobretudo o terrível trecho que descreve a prolongada idolatria de Judá (56.9-57.21) enquadra essa cena "nos vales das torrentes, sob as fendas dos rochedos, entre os calhaus do ribeiro". "Como no solo plano, aluvial, da Babilônia não há torrentes mas apenas canais", escreve o Deão Payne Smith, "também ali não há leitos de torrentes; no entanto, estes constituem um traço comum na paisagem da Palestina e de todos os países montanhosos". Não podemos passar levianamente por cima de evidência como esta, e a opinião do autor destas linhas é que a cor local presente é tão notavelmente palestiniana que pesa mais na balança do que quaisquer alusões aparentes a fatos e incidentes típicos da vida babilônica nos últimos capítulos. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 12 Além disso, diga-se o que se disser acerca do resto dos últimos capítulos, os que contêm essa seção medonha em que se descreve a idolatria carnal de Israel afastam-se de forma tão completa de tudo o que sabemos acerca da Babilônia e do exílio judaico ali que devem ser identificados com outro local e época. É inegável que existiam muitos elementos na história pretérita de Israel e suas relações com as nações limítrofes que poderiam ser utilizados na elaboração destes trechos terríveis. Há também que enfrentar este outro problema: como foi que um profeta tão distinto como o escritor de Isaías 40 a 66 desapareceu por completo no ouvido? Os cuidadosos registros da Igreja Hebraica nada dizem acerca de o livro de Isaías ter ainda outro autor. Em várias coletâneas, conforme se salientou, Esdras e Neemias figuravam juntos, mas os judeus jamais os confundiam, mantendo a sua identidade separada. Sem dúvida que seria um dos fenômenos literários mais espantosos de todos os tempos se o autor de um livro tão majestoso e tão sublime ficasse por nomear, e se a raça em cuja língua escreveu e cujos escribas eram tão exatos na sua compilação de registros o identificassem impensadamente com um dos seus maiores profetas. Recentemente, os argumentos a favor da unidade do livro foram reforçados pela descoberta dos manuscritos do Mar Morto, nos quais não há qualquer solução de continuidadeno manuscrito de Isaías entre o final do capítulo 39 e o princípio do capítulo 40, começando, até, o capítulo 40 na última linha da página. É claro que não se podem extrair daqui quaisquer conclusões definitivas, mas trata-se de um fato que deve ser considerado importante como elemento de uma argumentação cumulativa. Para terminar, não sabemos ao certo em que circunstâncias decorreram os últimos dias da vida de Isaías. Ameaçado de morte às mãos do ímpio Manassés (2Rs 21.16), é muito possível que se visse forçado a retirar-se da cena pública para o abrigo de qualquer refúgio obscuro – uma situação algo semelhante àquela em que João escreveu o Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 13 livro do Apocalipse na ilha de Patmos. Também João mergulhava o olhar no futuro e registrava o que via. Por que não poderia o profeta Isaías, filho de Amós, frente ao declínio da religião autêntica na sua própria cidade de Jerusalém, "o lar dos eleitos de Deus", ser levado pelo Espírito do Senhor a ver e afirmar a esperança imperecível dos verdadeiros filhos de Sião e a proclamar às gerações vindouras a salvação incomparável oferecida pelo seu Deus? c) Argumentos contra a unidade do livro Deve-se, porém, admitir que a opinião dos críticos é preponderantemente contrária à unidade do livro. De fato, o Professor W. L. Wardle, escrevendo no "Comentário" do Dr. Peake, vai ao ponto de dizer acerca destes últimos capítulos de Isaías: "Nenhuma conclusão crítica é mais certa do que a de pertencerem a uma época posterior". A evidência a favor desta opinião pode-se sintetizar como se segue. De todos, o maior problema reside na mudança de situação, tempo e lugar verificada no capítulo 40. Tudo leva a crer que as profecias que ali se iniciam parecem dirigir-se aos filhos cativos de Israel em Babilônia e numa fase do cativeiro em que a libertação parecia iminente. Se estas palavras procedem da pena de Isaías, é óbvio que ele já não é um pregador da justiça para a sua própria geração, mas um vidente arrebatado a um plano de visão de onde contempla os acontecimentos que terão lugar século e meio mais tarde. As suas mensagens proféticas tornam-se, assim, um autêntico legado para as gerações vindouras, e não proclamações inspiradas de um homem arrastado na maré dos acontecimentos contemporâneos, juntamente com os seus irmãos. É óbvio que nada há de impossível nisto, embora seja algo diferente da prática costumeira dos profetas. Enquanto que muitos admitirão prontamente que a predição é parte essencial e integrante da profecia, no entanto parece-lhes que enfrentar assim uma situação que só surgiria volvido século e meio é tão excepcional que se torna altamente improvável na ausência de provas concludentes em contrário. Numa nota Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 14 suplementar ao seu trabalho sobre Isaías, o Professor Cheyne cita as palavras proferidas pelo deão Bradley perante a Universidade de Oxford, em 1875, onde esboça esta opinião preditiva em termos bem vívidos: "O Isaías", diz ele, "do tempo crítico e conturbado de Acaz e de Ezequias é, ao que se supõe, transplantado nos seus últimos dias pelo Espírito de Deus para uma época e região diferentes das suas... Em visão prolongada e solitária, é conduzido a um país cujo solo nunca pisou, e a uma geração que jamais contemplou. Desvaneceram-se e desapareceram cenas e rostos familiares rodeado dos quais vivera e trabalhara. Reduzem-se ao silêncio todos os sons e vozes do presente, e já não o impelem os interesses e paixões a que se consagra com toda a intensidade da sua raça e caráter. O presente fenecera no horizonte da visão da sua alma... As vozes que lhe soam aos ouvidos são de homens ainda por nascer, e vive uma segunda vida entre acontecimentos e pessoas, pecado e sofrimento, receios e esperanças, fotografados por vezes com a mais rigorosa exatidão no seu espírito sensível e compassivo; Isaías transforma-se no denunciador dos pecados característicos de uma geração distante, e no porta voz da fé, esperança e anseios veementes de uma nação exilada, descendente dos homens vivos na altura em que escrevia rodeado da paz profunda de uma prosperidade renovada". Quando estudamos os trechos que se referem ao estado contemporâneo da nação, é normal presumir que as palavras que lemos são de alguém que vivia naquela altura. Mas esta posição inverte-se por completo se aceitarmos a unidade de Isaías. Se os capítulos 40 a 48 tivessem chegado anonimamente até nós, nada mais natural do que serem atribuídos à época do cativeiro. No capítulo 41, o escritor, em pinceladas firmes, aborda uma situação histórica que é em breve delineada com extrema clareza. Ciro, o libertador, é apresentado como um vulto de projeção mundial, e em 44.24-45.25 depara-se-nos toda uma série de profecias que se relacionam com a sua obra e missão. Argumenta-se que, se se trata de escritos preditivos do Isaías de Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 15 Jerusalém, temos aqui uma proclamação absolutamente excepcional sem paralelo em toda a restante literatura profética. Neste contexto, frisa-se também que em parte alguma estes capítulos reivindicam a autoria de Isaías, encontrando-se, até, separados do resto do livro nitidamente seu por uma narrativa histórica de certa extensão. Na sua recente análise de todo este assunto, o Professor C. R. North estuda em pormenor o Servo Sofredor do "Deutero-Isaías". Enquadram-se bem aqui duas citações: "Enquanto se julgou que o Livro de Isaías era, na sua inteireza, obra de um profeta do oitavo século, nada mais natural do que presumir que as partes que têm o exílio como pano de fundo fossem profecia no sentido preditivo da palavra. Por conseguinte, parecia óbvia a interpretação messiânica do Servo. Mas, mal se começou a falar num Isaías de Babilônia, os investigadores cristãos passaram a adotar o ponto de vista que havia muito prevalecia entre os judeus, a saber, que o Servo era a nação de Israel". (Do capítulo intitulado: "Interpretações Cristãs: de Doederlein a Duhm"). A página 207, escreve ele: "A objeção fundamental à interpretação tradicional messiânica é a de esta se encontrar ligada a uma doutrina demasiado mecânica da inspiração, o que parece arredá-la como indigna de consideração séria. O profeta é um mero amanuense, e aquilo que escreve nada tem que ver com as condições do seu tempo. Além disso, se isso implica que ele viu antecipadamente Alguém que só nasceria cinco ou seis séculos depois, surge o difícil problema filosófico da possibilidade ou impossibilidade de uma autêntica previsão da história". Trata-se de afirmações de amplitude tal que exigem estudo muito mais profundo e pormenorizado do que o possível na presente obra. No entanto, exprimem de forma sucinta e enfática o ponto de vista da escola crítica a respeito do problema vertente. Pode-se perguntar com justiça, porém, se se deverá considerar adequada uma doutrina da inspiração que não inclui a possibilidade da visão profética até aos últimos recantos da história. Além disso, não foi a esperança messiânica uma das mais Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 16 poderosas influências que moldaram, preservaram e purificaram o espírito de Israel? Poderia existir tal esperança sem previsão profética? Salienta-se freqüentemente que, além de Ciro ser apresentado como um fato da história patente perante os seus olhos, esse fato é citado como prova da realização de profecias de longa data. É ele que torna difícil aceitar o argumento de que, aqui, o profeta se serve do chamado "perfeito profético" - ou seja, que, no calor do seu discurso, e na certeza da realização futura de certas coisas, empregava uma linguagem que implicava terem-se já cumprido os acontecimentos a que faz referência. George Adam Smith formula este argumento como se segue: "Não é só que a profecia, com o que poderia ser mero ardor visionário, apresenta o Persa como erguendo-se já acima do horizonte, na maré alta da vitóriamas que, no decurso de sóbria argumentação a favor da divindade única de Deus de Israel - argumentação essa que se desenrola dos capítulos 41 a 48 – Ciro, vivo e irresistível, e já bafejado pelo triunfo, com Babilônia prostrada a seus pés, é apontado como prova insofismável de que se haviam começado a realizar as velhas profecias respeitantes à libertação de Israel. Em suma, Ciro é apresentado, não como predição, mas como prova do cumprimento de uma predição. Se não tivesse já aparecido em cena, e em vésperas de atacar Babilônia com todo o prestígio dos seus tempos constantes, grande parte de Isaías 41 a 48 seria completamente ininteligível". Deixando agora o estudo da citação histórica, pode-se notar que a própria evidência constituída pela falta aparente de cor local típica de Babilônia é apresentada como um forte argumento a favor de uma data coincidente com o exílio. Os exilados de todos os tempos e de todas as raças têm o costume de viver rodeados do espírito do lar por que anseiam. O próprio desgosto que lhes pesa no coração torna-lhes impossível transformarem-se em verdadeiros cidadãos de uma cidade estrangeira, e instintivamente surgem pensamentos relacionados com uma cena diferente. O mesmo aconteceria com os judeus, banidos como foram de Sião, cidade do seu Senhor. Além disso, teriam presente grande Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 17 parte da sua literatura, cuja beleza e grandiosidade impregnaria a sua alma. Isto, e não as planícies estéreis, planas, do país do seu cativeiro, seria a fonte da sua inspiração quando falavam. Tudo isto é bem evidente. Mas há quem afirme também que se exagerou muito a ausência de cor local nas profecias de Isaías. Aqui temos, por exemplo, uma afirmação nesse sentido: "...vislumbres constantes de luz e sombra babilônica que se projetam em nosso caminho – os templos, as casas onde se faziam ídolos, as procissões de imagens, os adivinhos e astrólogos, os deuses e altares especialmente mantidos pelo espírito mercantil característico da terra; a navegação daquele empório internacional, as multidões dos seus mercadores; o relampejar de muitas águas e, até, o brilho intolerável que é uma maldição tão freqüente dos céus da Mesopotâmia (49.10)... Os animais que o profeta menciona têm, na sua maioria, sido reconhecidos como familiares em Babilônia; e, posto que o mesmo se não possa dizer das árvores e plantas que ele nomeia, observou-se que os trechos em que ocorrem são justamente aqueles em que os seus pensamentos se encontram fixados na restauração da Palestina" (G. A. Smith. The Book of Isaiah, II, págs. 13 e segs.). Finalmente, assevera-se que o contraste entre Jeremias e o livro de Isaías pelo que respeita à forma de predição do cativeiro é inteiramente único se, de fato, os capítulos 40 a 66 forem anteriores ao exílio. Jeremias falava do exílio e da certeza da libertação, mas sempre no futuro. Predisse aberta e nitidamente ambos estes acontecimentos, mas com uma reserva e reticência de pormenores que, segundo se diz, são inteiramente inexplicáveis se estes últimos capítulos de Isaías tivessem sido já escritos, e por um profeta tão destacado. O apelo do profeta dirige-se a um povo que sofre há muito sob a mão do Senhor; e é a homens e mulheres cuja consciência fora avivada e tornada sensível à sua culpa pelo poder punitivo das provações e do desgosto que é dada a esperança da libertação, sendo Ciro, o libertador, proclamado como instrumento do seu Deus. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 18 d) Sumário da evidência A favor de uma autoria dividida, vimos que o livro não contém qualquer evidência diretamente explícita que prove ter sido inteiramente escrito pelo próprio profeta; que os capítulos 40 a 66 em parte alguma reivindicam a autoria de Isaías, e que apresentam o exílio, não só como um acontecimento transato, mas também como próximo do seu fim, com Ciro prestes a provocar a queda da Babilônia. Além disso, a restante evidência existente - linguagem e estilo, teologia e ponto de vista da mensagem do profeta - de forma alguma entra em conflito com a teoria de uma data ulterior. Há um outro problema para o qual alguns estudiosos chamaram a atenção - o de uma teoria demasiado mecânica da inspiração, que põe o profeta a escrever acerca de coisas sem relação com o seu tempo e a falar do Servo sofredor de Deus como Alguém muito distante da cena contemporânea. Por outro lado, notamos que a evidência externa favorece inteiramente a unidade do livro; que o argumento da linguagem milita tanto a favor dessa unidade como do seu oposto, se não mais; que a cor local é predominantemente a da Judéia; que há certos passos nos capítulos 40 a 66 que, até do ponto de vista crítico, devem ser anteriores ao exílio; e que é difícil explicar o desaparecimento de autor tão notável do palco da história e do campo da literatura. No primeiro parágrafo desta seção, tivemos ensejo de nos referir ao ponto de vista do Dr. A. B. Davidson. Eis como ele formula a sua conclusão final: "Tais problemas deveriam ser mantidos o mais afastados possível de toda a interferência com os artigos de religião. Como poderá afetar a condição religiosa de cada um o fato de se crer ou não que seja Isaías o único autor das profecias que lhe são atribuídas, ou de se lhe acrescentarem outros autores? Seja-me permitido dizer que acho que devíamos repudiar e sentirmo-nos ofendidos com as tentativas que se fazem para transformar este problema num artigo de fé religiosa, e procurar formulá-lo de modo que se não transforme em tal". Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 19 Embora seja assim, permanece o fato que "a aceitação quase unânime, durante vinte e cinco séculos, da autoria de Isaías para todo o livro conhecido pelo seu nome só pode ser explicada pelo fato de tal opinião estar plenamente de acordo com o conceito da profecia apresentado na Bíblia em geral" (O. T. Allis, "The Unity of Isaiah", página 122). Se se aceitar a predição como elemento fundamental da mensagem do profeta; se ao dirigir-se aos seus contemporâneos, ele aponta para Aquele que deveria nascer; e se, para ilustrar os poderosos movimentos providenciais da história, Deus o faz ver antecipadamente o que vai suceder para que ele possa pregar com maior efeito ao seu povo, e também para que a crônica de épocas subseqüentes possa autenticar a mensagem profética então é inevitável concluir que o livro de Isaías é indivisível. PLANO DO LIVRO O livro de Isaías divide-se naturalmente em duas partes distintas: capítulos 1 a 39, e capítulos 40 a 66, que devem ser tratadas e consideradas separadamente. Ver a Seção V da Introdução. CAPÍTULOS 1-39 I. PROFECIAS REFERENTES A JUDÁ E JERUSALÉM - 1.1-12.6 II. PROFECIAS DIRIGIDAS CONTRA NAÇÕES ESTRANGEIRAS E HOSTIS - 13.1-23.18 III. O APOCALIPSE DE ISAÍAS: OS CASTIGOS DE JEOVÁ SOBRE O PECADO DO MUNDO - 24.1-27.13 IV. PROFECIAS RESPEITANTES ÀS RELAÇÕES DE JUDÁ E JERUSALÉM COM O EGITO E A ASSÍRIA - 28.1-33.24 Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 20 V. PROFECIAS QUE PROCLAMAM A QUEDA DE EDOM E A REDENÇÃO DE ISRAEL - 34.1-35.10 VI. APÊNDICE HISTÓRICO: A VIDA E ATIVIDADE DE ISAÍAS DURANTE O REINO DE EZEQUIAS - 36.1-39.8 CAPÍTULOS 40-60 VII LIBERTAÇÃO DO DOMÍNIO DA BABILÔNIA - 40.1-48.22 VIII REDENÇÃO PELO SOFRIMENTO E SACRIFÍCIO - 49.1- 57.21 IX O TRIUNFO DO REINO E O DOMÍNIO UNIVERSAL DE JEOVÁ - 58.1-66.24 COMENTÁRIO CAPÍTULOS 1-39 I. PROFECIAS REFERENTES A JUDÁ E JERUSALÉM - 1.1-12.6 Isaías 1 a) Os argumentos do Senhor (1.1-31) 1. TÍTULO E INTRODUÇÃO (1.1). É evidente que este versículo se relaciona apenas com os primeiros doze capítulos e não com todo o livro, visto mencionarem-se Judá e Jerusalém como os temas a ser tratados. Já se perguntou qual o momento no tempo a que se faz referência neste capítulo. A partir do verso 7, vemos que o país fora assolado pelos horrores de uma terrível invasão, e todos os indíciosparecem indicar que se trata da invasão de Judá por Senaqueribe em 701 a.C. A ser assim, Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 21 este capítulo foi escolhido e escrito à guisa de introdução por Isaías numa fase já tardia da sua vida. A cena que enfrenta ao contemplar o mundo do seu tempo é suficientemente representativa para que o profeta a considere típica da atitude de Israel para com a palavra e a vontade de Jeová. Como diz George Adam Smith: "Trata-se de um enunciado claro e completo dos conflitos entre Jeová e o Seu povo durante todo o tempo que Isaías foi profeta do Senhor. É a mais representativa de todas as profecias de Isaías, um sumário talvez melhor do que qualquer outro capítulo do Velho Testamento da substância da doutrina profética, e uma ilustração muito vívida do espírito e método proféticos" (Isaías). 2. INTRODUÇÃO (1.2-9). Esta introdução de Isaías assume a forma de um grande julgamento - a grande acusação, como Ewald lhe chama, formulada contra o povo escolhido. Deus é ao mesmo tempo queixoso e juiz. Céu e terra são chamados a apoiar a queixa (2), sendo o profeta a principal testemunha. A acusação feita contra o povo escolhido é de rebelião absoluta nascida do seu coração ímpio e antinatural. Aí se radicavam todos os males que assolavam o país. Embora a mensagem do Senhor Deus tivesse sido transmitida pela boca dos profetas Amós e Oséias, não lhe haviam dado ouvidos, e a perversidade daquele povo conduzira a muitas infrações patentes da lei moral. O resultado de tal estado de coisas é que Aquele que os havia criado e mantido continuava desconhecido e a desgraça que se abatera sobre o país constitui testemunho eloqüente da realidade deste afastamento da fé. Fala o Senhor (2). É significativo que, no próprio começo deste livro, Isaías acentua o fato de ele conter a mensagem autêntica do Senhor Deus (ver Sl 1.4; Dt 32.1). Note-se a ênfase desta afirmação de rebeldia: "Criei filhos e exalcei-os, mas eles prevaricaram contra Mim". O boi... o jumento (2). Os próprios animais do campo são capazes de demonstrar uma dependência e uma dedicação mais natural e mais perfeita do que o povo escolhido do Senhor. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 22 O Santo de Israel (4); esta expressão aplicada ao Senhor não ocorre antes do tempo de Isaías. É provável que seja criação sua. A visão que lhe veio dentro do Templo foi de um Senhor sentado num alto e sublime trono (6.1), de um Senhor superlativamente santo (6.3); e foi, sem dúvida, movido por essa inspiração no próprio início do seu ministério que Isaías continuou a referir-se a Deus como o Santo de Israel. Não é possível determinar todo o significado desta expressão para Isaías, mas provinha de alguém que vira o Senhor e que, em todo o seu ministério subseqüente, se consagra a dar ao seu povo igual consciência da majestade e poder dAquele a quem ele contemplara dentro do santuário. Temos aqui como que um relicário da glória e beleza da santidade, tudo compreendido na personalidade de Deus, o autor do Concerto. Se mais vos rebelaríeis? (5). A vossa terra está assolada... (7). Durante a vida de Isaías, ocorreram pelo menos três invasões do solo sagrado de Judá, uma delas pelas forças combinadas de Israel e da Síria cerca de 734 a.C., e as outras pelas forças dos assírios - a primeira sob o comando de Sargom em 712 a.C., e a outra sob o comando de Senaqueribe em 701 a.C. (Ver apêndice 3 do livro de Reis, "Os Grandes Impérios no Período da Monarquia"). O ataque sírio vem mencionado no capítulo 7, e os outros nos capítulos 22 e 26. Numa subversão de estranhos (7). Uma variante sugerida por Ewald produz um efeito muito mais forte: "... numa subversão como a de Sodoma". Filha de Sião (8). Trata-se de uma personificação, aludindo a referência à Cidade Santa. Esta expressão não é infreqüente nos escritos mais especificamente poéticos do Velho Testamento. Ver 2Rs 19.21; Sl 45.12. Cheyne salienta que em Lm 2.8 esta expressão parece designar a cidade sem quaisquer habitantes; enquanto que em Mq 4.10 parece aplicar-se aos habitantes sem a cidade. O quadro evocado é o de Jerusalém desolada, contemplando as ruínas que ficaram depois de a violenta maré da batalha e da invasão se ter perdido à distância. No verso Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 23 8 as várias idéias da cabana, da choupana, ambas abrigos toscos erguidos nos campos durante a colheita e da cidade sitiada são todas quadros de solidão. Já como Sodoma seríamos, isto é, teríamos sido totalmente destruídos. Assim, logo no princípio do seu livro, Isaías introduz uma expressão significativa, o remanescente (9). A promessa divina desde eras passadas diz respeito à continuidade da raça escolhida e Àquele que sairia do meio do povo de Israel. A ênfase recai sobre a soberania do propósito divino. É o Senhor que deixa um remanescente. É pela Sua graça que a nação não é totalmente derrubada numa catástrofe semelhante à que engoliu Sodoma e Gomorra. Ver nota sobre 7.3. 3. FORMALISMO NA ADORAÇÃO E A EXIGÊNCIA DIVINA (1.10-17). Nesta parte das suas profecias, Isaías descreve as muitas maneiras como os filhos de Israel, aqui ousadamente designados como o povo de Gomorra (10), procuravam o favor de Deus sem de qualquer forma satisfazer os altos e santos requisitos dos mandamentos. Oblações, luas novas, sábados, incenso, o sangue de bezerros e a gordura de carneiros, a assembléia convocada e o encontro solene (11-14). Estavam patentes aqui todos os adornos externos da vida religiosa, mas faltava o essencial da fé, e o povo observava um aparato vão sem o espírito que constitui o cumprimento de toda a lei. Contrastando com esta terrível negação da fé, o profeta expõe a lei eterna e os requisitos do Santo de Israel (16-17). O fundamental era a retidão e o cumprimento da ordem de atender necessidades como as dos órfãos e das viúvas. Temos aqui uma das mais nobres passagens de Isaías, freqüentemente comparada com as severas e inequívocas profecias de Amós (ver Am 5.15, etc.). Pisar os Meus átrios (12). Esta tradução não reproduz todo o conteúdo do original, a que anda aliada uma idéia de afronta. O sentido é pisar a pés os átrios do Senhor. Surgir perante o trono do Senhor Deus com toda a aparência de constituir um insulto para o céu e uma afronta para toda a glória da revelação do divino poder e santidade. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 24 Solenidades (14). Eram estas as festividades engastadas no próprio coração da lei e mandamentos de Deus. Quando delas andava ausente o estado de espírito que as transformava na expressão de um amor e de uma dedicação que procuravam tão-somente a Deus, até os sábados, a festa do Pentecostes, a festa da Páscoa, das trombetas e dos tabernáculos, o dia da propiciação - tudo se Lhe tornava odioso, uma ofensa contra o Seu glorioso mandamento. Sangue (15), em hebraico, "sangues", isto é, manchas de sangue. Lavai-vos, purificai-vos (16). Não bastava a purificação cerimonial; esta tinha de ser acompanhada de uma reforma positiva. Praticai o que é reto (17). Este versículo coloca-nos perante alguns dos males sociais que Isaías tanto se esforçava por condenar. Ver o verso 23 mais abaixo. 4. CONDIÇÕES DE BÊNÇÃO (1.18-20). Com estas palavras, apresenta-se ao povo o ponto crucial da questão. Note-se a maneira como Isaías acentua o poder da razão. "Deus discute com o homem - eis o primeiro artigo de religião para Isaías. O profeta salienta mais o aspecto intelectual do sentido moral do que o outro, sendo característica de toda a sua carreira a freqüência com que neste capítulo emprega as palavras saber, considerar, raciocinar" (G. A. Smith, Isaiah, pág. 10). Vinde então e arguí-Me (18). Cheyne traduz esta frase da seguinte forma: "Vinde agora, encerremos o nosso raciocínio". Por outras palavras, só há uma resposta final à rebelião do homem - o perdão livre de Deus. A oferta de perdão aqui feita não constituia continuação de um raciocínio de conjunto, mas o final de um debate e a conciliação de uma dissensão: Escarlate... carmesim (18), termos praticamente sinônimos que designam o vermelho vivo obtido da cochonilha (um inseto) e que contrastam fortemente com a cor da neve e da lã natural, não-tingida. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 25 5. CASTIGO E REDENÇÃO (1.21-31). Esta passagem suplementar no final do primeiro capítulo exprime de forma concentrada a certeza do castigo divino para todos quantos desobedecem e se revoltam (21-24,28-31), e a certeza da redenção do Senhor, que será bem real e não tardará (25-27). Virão certamente tribulações, mas serão definitivamente arredadas, e o Senhor Deus remirá Sião e o remanescente do povo. Os teus príncipes são rebeldes... (23). A forma como as classes dirigentes se haviam entregado à corrupção e à opressão é sempre descrita em termos ousados por Isaías. A doença partia da cabeça e alastrava por toda a estrutura política. Ver o verso 17 acima. Purificai inteiramente (25), literalmente, com um álcali, tendo o profeta ido buscar a metáfora aos processos de fundição. Ver verso 22. Ao fazer ligas de prata, costumava-se usar estanho ou chumbo. Os carvalhos e os jardins (29) estavam associados com a idolatria e ritos pagãos. b) Descrição da glória da era messiânica (2.1-4.6) Os capítulos 2 a 4 constituem em si um livrinho de ditos proféticos e inspirados. Há aqui seis breves oráculos, todos eles muitos provavelmente atribuíveis à primeira fase do ministério do profeta. Isaías 2 1. UMA PROFECIA MESSIÂNICA (2.1-4). Este trecho vem repetido em Mq 4.1-4 (ver notas). O quadro que nos é apresentado é o da era messiânica, na qual a cidade santa será demandada por todas as nações para aprenderem o verdadeiro caminho, e na qual o reino da paz universal será introduzida pela obediência do povo à mensagem revelada do Senhor (2-3). Então será estabelecida a justiça, e a lei divina rodeará toda a terra (4). Visão... (1). Uma vez mais o profeta acentua que a sua mensagem diz respeito a Judá e a Jerusalém. Como era aqui que o Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 26 remanescente escolhido deveria estar, nada mais próprio do que o autor se referir constantemente a estes lugares. O monte da casa do Senhor (2), ou seja, o Monte Moriá, onde o templo se erguia. Prediz-se aqui enfaticamente que a verdadeira adoração do Deus vivo acabará por prevalecer, nos últimos dias, sobre todas as outras formas de adoração ou devoção religiosa, as quais, pela sua própria natureza e pelo fato de serem alheios à revelação autêntica, se revelam falsas e insatisfatórias. Muitos povos (3), isto é, nações. De Sião (3); esta profecia cumpriu-se à letra. Foi na cidade santa que o nosso Senhor sofreu a rejeição, e foi do cenáculo nessa mesma cidade que a Palavra se disseminou por todas as nações; ver Jo 4.22; Lc 24.47,49. Sobre as gentes (4). O sentido correto é: "entre as nações". As causas de tudo o que contribui para conflitos serão julgadas pelo Senhor Deus e pelo Seu Messias, e a Palavra pronunciada, não o poder armado do homem, será o critério de arbitragem. Comparar o verso 4 com Jl 3.9- 10. Em vista da importância dada à cidade santa e ao Monte de Sião nesta passagem, tem-se freqüentemente sugerido que se trata talvez de uma intercalação muito tardia no texto, e que, portanto, se lhe deveria atribuir uma data posterior ao exílio. Tal argumentação equivale a forçar os pressupostos doutrinais e críticos ao máximo. O profeta, que recebeu a mensagem do Senhor Deus dentro de recinto do templo e que dali saiu com a Palavra de Deus vivo na sua boca, não podia deixar de ter consciência bem funda do significado da cidade santa nos propósitos de Deus; ao raiar no seu espírito a visão da glória futura no reinado do Príncipe da Paz, parecer-lhe-ia que só num local ela se poderia realizar de forma condigna, a saber, na cidade Santa. 2. O DIA DO SENHOR: CASTIGO E PROVAÇÃO (2.5-22). A esta visão de bênção futura segue-se uma acusação renovada da raça escolhida (5-9). Vem depois uma descrição da forma do castigo que Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 27 necessariamente cairá sobre ela visto ela teimar em se afastar do Senhor Deus (10-22). Este dia do Senhor acumulará forças como uma violenta tempestade e virá inexoravelmente do norte para a orla marítima, avassalando e esmagando no seu curso tudo o que é alto e elevado, dos cedros do Líbano (13) aos navios de Társis (16). Assim será abatido o orgulho do homem e castigado o seu pecado. Ó casa de Jacó... (5); versículo de transição do quadro do domínio universal do Senhor para a descrição dos pecados de Judá. Mas (6). Os versículos que se seguem apresentam as razões que o profeta invoca para o regresso ao Senhor Deus. Só se andarem na luz do Senhor (5) é que a profecia precedente se poderá realizar. Citam-se aqui quatro grandes motivos do desagrado divino: ligação com povos estrangeiros (6), imitação servil das práticas pagãs de tais povos (6), dependência das meras reservas financeiras e bélicas (7), e adoração dos ídolos (8). Se associam (6) com os filhos dos estranhos e dos pagãos, ou melhor: apertam-lhes a mão, fazendo um pacto com eles. Comparar o verso 10 com os vv. 19 e 21. Navios de Társis (16), os maiores navios conhecidos ao tempo, os que efetuavam a longa travessia para Társis. Társis era talvez Tartessus, na Espanha, embora haja quem seja de opinião que ficava na Itália e que os seus habitantes eram tirrenos ou etruscos. Ver 23.1n. Todas as pinturas desejáveis (16). Têm-se sugerido traduções diferentes para este passo, mas o sentido é bem evidente: o de serem derrubados todos os objetos de desejo. E todos os ídolos totalmente desaparecerão (18). É este o grandioso e dramático ponto culminante que o profeta aguarda. Na consumação dos atos poderosos de Jeová, o derrubamento de todas as divindades estranhas e falsas será absoluto e total; nada permanecerá de pé quando Ele surgir (ver Ml 3.2). Então os homens se meterão nas concavidades das rochas (19); ler os vv. 10 e 21. Vemos um povo que foge das suas casas perante o invasor e que procura abrigar-se nas montanhas (ver Ap 6.15-16). A Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 28 destruição é tão completa que aqueles que outrora se dedicavam devotamente às práticas idólatras dos pagãos as repudiarão com nojo e ódio, lançando-as às pragas dos campos e das casas (20). Deixai-vos, pois, do homem (22), isto é, de confiar apenas no homem. Só no Senhor Jeová há poder, suficiência e força perdurável. Isaías 3 3. OPRESSÃO E ANARQUIA (3.1-12). Tendo denunciado as práticas pagãs e o sentimento de autoconfiança do povo, o profeta aborda no capítulo 3 os males sociais e o luxo na vida particular. Nos vv. 1-12, prediz uma fase terrível de anarquia para o país, pois o Senhor removerá os dirigentes e todos aqueles que poderiam orientar o povo (1-3). A ausência destes será tão absoluta que os homens lançarão os olhos pelo país em busca de alguém que os governe e oriente, mas tudo em vão (4). É este o terrível galardão para o espírito da desobediência e do pecado, para a acepção de pessoas, geral no país, e para a falta de vergonha, como sucedera em Sodoma (5-9). A única esperança reside na justiça. A bênção será para os justos; ai dos maus; cada um colherá inevitavelmente aquilo que semeou (10-11). A opressão e a cobiça reveladas pelos nobres deverão desaparecer, ou então nunca haverá esperanças de melhores dias. Na corte, as coisas estão tão más que os próprios dirigentes são dominados pelo elemento feminino e agem como crianças (12). A anarquia é absoluta em todo o país. O bordão e o cajado (1). Usam-se aqui dois gêneros do mesmo substantivo, como em Ec 2.8; Na 2.12, de acordo com a construção idiomática hebraica usada na representação de todas as espécies de objetos. Neste caso, faz-se referência a todas as formas deapoio, como alimento, e seguidamente às outras coisas aqui mencionadas - governo, lei, ordem, paz. O sábio entre os artífices, e o eloqüente (3), ou, segundo uma tradução inglesa, "o mago habilidoso e o perito em encantamentos", uma referência à superstição que imperava. Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 29 Tu tens roupa (6). O sentido é que, ou a pobreza era tanta que descobrir alguém possuidor de vestuário adequado para um fim especial era um acontecimento digno de nota, ou que "roupa" (ou manto) se refere aqui ao trajo indicativo de um cargo; neste caso, ao aproximar-se assim do seu vizinho, o homem fala com alguém que outrora ocupara uma posição de mando no país. Para imitarem os olhos da Sua glória (8); ver 65.3. 4. O CASTIGO DO SENHOR (3.13-15). Com estas palavras, o profeta apresenta o Senhor Deus no ato de Se erguer para castigar os dirigentes do povo, que tão mal administravam os negócios públicos. O brado dos oprimidos chegara aos ouvidos do Altíssimo, que desce para os libertar e os salvar. Príncipes e governantes são agora chamados a prestar contas; os guardadores da vinha haviam abusado da sua posição de privilégio, transformando os proventos particulares na essência e na finalidade da vida. O mesmo castigo que eles haviam dado aos pobres e oprimidos abater-se-á sobre eles em medida ainda maior. Fostes vós que consumistes esta vinha (14). O "vós" é enfático: vós, os anciãos e dominadores, vós mesmos. A vinha é um símbolo favorito nas Escrituras (ver. 5.1-7). 5. O CASTIGO DAS FILHAS DE SIÃO (3.16-4.1). Chegamos ao ponto culminante desta mensagem de castigo e condenação. As próprias mulheres de Jerusalém têm culpa deste terrível estado de coisas. Também elas, como os homens, serão derrubadas no dia do Senhor (16- 17); o vigor do quadro aqui apresentado é realçado pelo contraste com o luxo a que elas estavam habituadas (18-24). Assim como Amós denunciou as mulheres de Samaria pela sua desalmada opressão dos pobres e pela sua conduta subseqüente (Am 4.1-3), também aqui Isaías ataca a altivez e o desdém das mulheres da Cidade Santa (16). Temos aqui um quadro mundano muito familiar - a miséria mais abjeta roçando ombros com o luxo e a extravagância altiva. Pela sua participação em Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 30 tais pecados, estas mulheres serão incluídas no castigo que se avizinha, e sobre elas cairá uma terrível e nojenta praga (17). Não só serão vítimas de uma doença repugnante, mas sobre elas cairá a tremenda maldição do Oriente - não se casarem (4.1). Na lista (18-23) das peças de vestuário e de adorno usadas pelas mulheres de Jerusalém, incluem-se muitos objetos igualmente usados pela deusa pagã Istar. Isaías 4 6. VISÃO DE CONFORTO E PAZ (4.2-6). Esta parte do livro termina, como sucede tão freqüentemente no sumário e coroamento das grandes mensagens do profeta, com uma visão de conforto e paz. Vale a pena afirmar uma vez mais que nada há no texto que justifique atribuir- se-lhe uma data posterior à de Isaías. Temos aqui a promessa de uma consumação e de uma vida magníficas (2-3); temos aqui a resposta divina às queixas do homem. A terra cobrir-se-á ainda de fruto e de vegetação para o remanescente eleito do Senhor (2). A justiça e a verdade reinarão nas cidadelas do país; o povo será purificado, e a coluna de fogo e de nuvem será, uma vez mais, a glória da nação e a defesa segura desta (3-5). No centro de tudo estará o tabernáculo do Senhor, onde o coração que O busca encontrará repouso, conforto e descanso eterno (9). O renovo do Senhor (2); ver Jr 23.5; 33.15; Zc 3.8; 6.12. É evidente nestas passagens que o autor se refere a Alguém que governará e regerá em justiça, Alguém da família de Davi, um servo de Deus. Não pode ser senão o Messias, que fará raiar para todo o país um dia de alta e graciosa bênção. Como diz G. A. Smith, "do pessimismo mais negro surgirão nova esperança e fé, assim como dos versículos mais sombrios de Isaías irrompe subitamente esta passagem, qual fonte irreprimível que jorra aos pés do inverno". Inscrito entre os vivos (3), isto é, incluído no rol do remanescente de Deus. Sobre toda a glória haverá proteção (5), ou, como noutra Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 31 versão, "sobre toda a glória se estenderá um dossel", isto é, de divino amor e proteção. Isaías 5 1) Os castigos de Deus sobre o pecado (5.1-30) Este capítulo começa sob a forma de um lamento cujo tema é uma história sobre a vinha do Senhor (1-7). Num trecho de extraordinário vigor e sublimidade, o profeta dirige-se aos ouvintes que o cercam e leva-os habilmente a concordar com o julgamento que ele vai pronunciar sobre a nação. A mudança súbita de ritmo no verso 7, e o emprego da assonância nesse mesmo versículo, acentuam a mensagem severa e incisiva do ministro de Jeová. Segue-se um lamento sêxtuplo: a sentença do amor eterno sobre os proprietários rurais cobiçosos (8-10), sobre os ébrios (11-17), sobre os descrentes (18-19), sobre os inimigos da ordem moral (20), sobre os homens confiantes em si e experientes do mundo (21), e sobre os juízes dissolutos e injustos (22-24). Segue-se a declaração severa e inequívoca de que o próprio Senhor chamará as terríveis e infatigáveis hostes dos assírios para destruir a terra de Judá (25-30). 1. A PARÁBOLA DA VINHA (vv. 1-7). Neste versículo, o profeta torna a acentuar a mensagem dos capítulos precedentes. Judá apostatou, o que constitui simultaneamente um desgosto para Deus e a causa do derrubamento e condenação daquele povo. Fez-se tudo o que se podia ter feito para que a vinha desse bom fruto, mas em vão (2,4). Nada resta senão arrancar pela raiz as defesas dela e destruir tudo o que lhe pertencera no passado (5-6). Segue-se inevitavelmente, e com tremendo vigor, a aplicação do verso 7. Ao meu amado (1); ao meu Amigo, isto é, Jeová. O objetivo desta introdução é captar a atenção dos circunstantes para a mensagem que se vai seguir. Um outeiro fértil (1); o lado mais soalheiro das encostas rochosas era sempre preferido para a vinicultura. Note-se a ênfase sobre Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 32 a intenção de permanência no trabalho e plano do Amado - fertilidade mediante a remoção das pedras; produção e desenvolvimento mediante a feitura do lagar, que seria escavado na rocha; defesa mediante a construção de paredes, sebes e torres. Através das Escrituras Sagradas é evidente esta maravilhosa intenção de Deus relativamente a Israel. "Ah, se tivesses dado ouvidos aos Meus mandamentos, então seria a tua paz como o rio, e a tua justiça como as ondas do mar" (48.18). Às nuvens darei ordem (6). Das palavras finais deste versículo é evidente que o profeta alude ao Senhor Deus. O guardador da vinha é o Senhor de toda a terra. Opressão... clamor (7). Temos aqui a definição do que fora mencionado parabolicamente sob a forma de "uvas bravas" (2,4). O clamor é o apelo de auxílio lançado pelos oprimidos. 2. DENÚNCIA DOS MALFEITORES E DECLARAÇÃO DOS CASTIGOS FUTUROS (vv. 8-24). Pronunciam-se aqui seis "ais" sobre determinados males. No primeiro (vv. 8-10), os proprietários rurais gananciosos são denunciados pela forma como procuram continuamente ampliar os limites das suas possessões, pisando a pés os pobres e os que não têm terras; na sua ganância, expulsavam os antigos donos das suas terras, criando para si latifúndios. Em breve virá a recompensa inevitável. A terra ficará desolada e as colheitas serão escassas e insatisfatórias. Geiras (10); esta palavra significa literalmente "jugos"; um "jugo" era o que uma junta de bois, isto é, dois bois, consegue lavrar num único dia. Um bato (10), uma medida líquida equivalente a um efa de medida para secos, pouco mais de trinta litros. Trata-se, pois, de uma quantidade ridiculamente pequena para uma área tão vasta de terra lavrada. Hômer (10), cerca de 315 litros - portanto, uma produção que mal chega a um décimo de porçãosemeada. O segundo "ai" (vv. 11-17) consiste numa severa denúncia de todos os que se entregam à dissipação. Tal conduta leva gradualmente a Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 33 nação à ruína e abre as portas da escravidão aos cativos (13-14). Esquecer Deus no planejamento da vida é facilitar a destruição certa e levar o povo à condenação inevitável reservada para os maus. Até que o vinho os esquenta (11). Isaías refere-se várias vezes ao alcoolismo, o que sugere a sua prevalência. Ver v. 22, e comparar com 19.14; 24.20; 28.1,7. Será levado cativo (13), para o exílio. Sepultura (14), isto é, o Seol ou Hades. Ver Jó 11.8; 14.13. No terceiro "ai" (vv. 18-19), o profeta dirige-se àqueles que se apegam ao pecado e que, com a sua conduta, incitam Deus a revelar-Se em castigo. As suas próprias ações fazem lembrar cordas que arrastam os resultados do pecado. Atente-se nas palavras de G. A. Smith: notável esta imagem de pecadores que zombam da aproximação de uma calamidade quando, de fato, a puxam sobre si, como se o fizessem com cordas". Cordas de carros (18), isto é, uma corda grossa que sugere a enormidade do pecado. O quarto "ai" (verso 20) dirige-se contra aqueles que, pelas suas palavras e comportamento, procuram derrubar a ordem moral estabelecida. As últimas duas frases são, na realidade, uma ilustração da primeira. O quinto "ai" (verso 21) dirige-se contra os que procuram ordenar a sua vida à luz do seu próprio entendimento. A confiança em si mesmo é um crime de corações insensatos que se esquecem de Deus nos seus planos. O espírito de dependência é a única coisa que pode manter o coração justo aos olhos de Deus. O sexto "ai" (vv. 22-24) parece visar os juízes corruptos, ironicamente descritos como "poderosos para beber vinho, e homens forçosos para misturar bebida forte". O que aqui salta à vista é, porém, a sua rejeição da lei e o seu desprezo pela mensagem de Deus, mais do que propriamente a sua propensão para a embriaguez (ver vv. 11 e 12 supra). Tais homens serão como palha que arde numa fogueira, e como uma Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 34 planta podre que não tem possibilidade de florescer. A negação da justiça aos justos constitui um tema que se repete (ver 1.17,23n.). 3. A IRA DE DEUS (vv. 25-30). É este o golpe final do castigo divino. Tinha havido anteriormente indicações do âmbito e poder do castigo que se avizinhava, enviado por uma deidade vingadora; agora, soa aos nossos ouvidos uma mensagem final, enfática, cheia de colorido. Nestes versículos magníficos, vemos um inimigo irresistível que se abate sobre a nação e a domina, vindo dos extremos da terra. As forças invasoras não são aqui mencionadas por nome, mas o profeta refere-se naturalmente ao poder acumulado dos exércitos assírios que, embora poderosos, iriam ser mais tarde eclipsados por um poder ainda maior - o de Babilônia. Cairão eles sobre as cidades indefesas de Judá - homens que não sentem o cansaço e que marcham em filas cerradas (27), com os seus cavalos e carros preparados para uma batalha decisiva (28), e soltando gritos de guerra que inspiram terror em todos os corações (29- 30). Assim se realiza decisivamente o terrível castigo do Senhor Deus, sendo consumido e esquecido o povo que olvidara os Seus mandamentos. Nações (26). Em vez de "nações" leia-se "nação". Ver Am 6.14. Assobiarão (26), isto é, chamarão ao ataque a nação invasora. As unhas dos seus cavalos dir-se-iam de pederneira (28). Os cavalos dos antigos não eram ferrados, e sugere se aqui que o invasor não seria detido pelo fato de os seus cavalos eventualmente ficarem coxos. Arrebatarão a presa (29) uma referência ao costume assírio de despovoar as cidades conquistadas. Como o bramido do mar (30). Nota-se aqui uma alteração, tanto na metáfora como no ambiente. Surge perante nós o quadro do mar encolerizado, sobre o qual se abatem trevas palpáveis. O sol está oculto, e a luz do céu é ensombrada e estranha. Toda a cena está impregnada de Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 35 um sentimento de cataclismo e caos. Assim termina a senda do coração pecador e da nação pecadora. Isaías 6 d) A chamada de Isaías (6.1-13) Isaías tem conhecimento da morte do rei Uzias, e logo, cônscio, ao que parece, do desgosto nacional ante as dificuldades e perigos que a nação tinha agora que enfrentar, penetra nos átrios do templo para se aproximar de Deus. É então que raia perante os seus olhos a visão relatada neste capítulo. Pouco antes, oprimiam-no o abandono a que o país se encontrava votado e o trono vazio, mas agora vê o Senhor Deus nas alturas, com todo o poder do universo às Suas ordens (1). No pensamento e ânimo do profeta agigantava-se neste momento a consciência da santidade do Deus de toda a terra (2-4) e, cônscio do seu próprio pecado e indignidade, o profeta exclama que esta perdido (5). Segue-se a mensagem de misericórdia salvadora. Até junto dele voou um dos serafins, tocando-lhe nos lábios com uma brasa acesa tirada do altar (6), e eis que no seu coração ecoam palavras avassaladoras de amor soberano (7). Só depois deste perdão absoluto é que lhe é dada a incumbência de trabalhar para o Senhor Deus, e o profeta ouve a voz do Senhor que pergunta quem está disposto a cumprir a Sua ordem (8). A mensagem é, na realidade, de condenação para a raça escolhida, e ninguém a poderia transmitir de ânimo leve (9-13); mas mesmo ali, dentro do recinto da casa de Deus, o jovem Isaías aceita o repto e sai, levando sobre si o peso da ordenação divina. Vi ao Senhor (1). No meio de toda a inquietação e agitação, o profeta constata que Deus guarda os Seus. O Senhor (1) ver Jo 12.41, onde a idéia inerente a esta passagem sugere a versão dos Targuns: "Vi a glória do Senhor". Aqui, a manifestação da divindade revela-se claramente na pessoa de Cristo, Filho de Deus. A revelação divina é sempre outorgada ao homem mediante a pessoa do Filho unigênito do Pai. "Ninguém jamais viu a Deus". Como sucedeu tão freqüentemente Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 36 nos tempos dos patriarcas e santos do Velho Testamento, temos aqui a atividade eterna do Deus de toda a terra transmitida ao homem através do Filho eterno. Trono (1). Acentua-se a certeza da soberania do Senhor Deus. Só há um dominador que rege o rolar incessante da história. Os serafins (2). Esta palavra é traduzida de várias maneiras; há quem prefira "serpente ardente", ou "áspide ardente voadora" (ver 14.29; 30.6), enquanto que outros tradutores optam por "seres exaltados ou nobres". No caso presente, tratava-se evidentemente de figuras aladas de forma humana, pois lemos que tinham mãos, pés e voz. O seu ministério incessante era louvar o Senhor e revelar a glória divina. Clamavam uns para os outros (3), em antífona: "Em cânticos respondiam, cantando, uns aos outros". Santo, Santo, Santo (3); a repetição exprime grande ênfase. Comparar com Jr 7.4; 22.29; Ez 21.27. Revela-se aqui o conteúdo intensamente espiritual da visão. Doravante, para Isaías, todos os antigos conceitos que aprendera brilharão com uma chama nova e ainda mais férvida. No meio de um povo cada vez mais atolado na busca de coisas alheias a Deus e que, portanto, de forma alguma se coadunavam com um sentido elevado e santo da Sua glória, Isaías vê agora que o Deus de Israel é, antes de mais, santo. De futuro, Deus será para ele "o Santo de Israel". Fumo (4); provavelmente, símbolo da cólera divina. Ai de mim (5). O efeito desta visão no profeta é imediato e avassalador. Unido com a nação no seu afastamento de Deus, e preso nos seus próprios desejos e hábitos pecaminosos, Isaías só se pode considerar perdido. Um homem de lábios impuros (5). Ver Jó 40.4-5. A visão de Deus na Sua santidade produz a consciência da nossa indignidade e impureza aos Seus olhos. Foi, sem dúvida, por Isaías saber que a sua vida seria consagrada à proclamação da mensagem do Senhor Deus que ele sentiaaqui a pecaminosidade e indignidade dos seus lábios para serviço tão excelso. A sua sensação de necessidade é imediatamente satisfeita pela ação de um dos serafins (6). Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 37 Purificado (7), expiado. Com respeito à ação purificadora do fogo, ver Nm 31.22-23; Ml 3.2; Mt 3.11. A mensagem que cumpria transmitir era de castigo solene. O povo iria ouvir e ver, mas não compreenderia o que a mensagem implicava. Cada vez estaria mais cego; o seu coração endureceria, em vez de ficar mais sensível; a nação seria destruída como um carvalho e como uma azinheira (13), "mas, se ainda a décima parte dela ficar, tornará a ser pastada". A idéia exprime uma devastação completa, mas mesmo assim ainda há promessas para o futuro. Os próprios troncos cortados florescerão e crescerão, e o remanescente (semente santa) do povo será reunido para servir o Redentor Todo Poderoso de Israel e voltar ao Seu domínio. A expressão "santa semente" falta na versão dos Setenta, mas ocorre no rolo de Isaías encontrado com os chamados Manuscritos do Mar Morto. Isaías 7 e) A mensagem do Senhor a Acaz (7.1-25) Este capítulo pertence à fase da guerra entre Judá e a coligação siro-efraimita. Perante a ameaça de ataque iminente, o rei de Judá, Acaz, fica aterrorizado e presa de grande perturbação (1-2). O profeta transmite-lhe a mensagem do Senhor, que, se ele tiver confiança, haverá livramento (3-9). Para restaurar a fé do rei hesitante, Isaías dá-lhe ensejo de pedir um sinal de Jeová (10-11), mas ele recusa (12), e é-lhe então dado um sinal pelo próprio profeta, o sinal de Emanuel (13-16). Segue-se a descrição da forma terrível como Judá será assolado numa data futura (17-25). 1. A MENSAGEM DO PROFETA AO REI ALARMADO (7.1-9). Esta mensagem é de confiança em Deus. Rezim... e Peca (1). Ver também 2Rs 16.5-6; 2Cr 28.5-8. Síria (1). A Síria da Bíblia é "Aram" em hebraico. Damasco era a principal Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 38 cidade dos estados arameus, desempenhando o papel decisivo nos seus destinos. Fez aliança (2); literalmente, a "Síria repousa em Efraim". Como Efraim era a principal tribo de Israel, o seu nome passou a designar todo o estado. Era da base avançada do território de Israel que o rei da Síria projetava levar a cabo a invasão. Sear-Jasube (3), literalmente, "voltará um remanescente". Isto não se refere à catástrofe que envolverá os exércitos de Judá. Uma das doutrinas mais importantes de Isaías é a do Remanescente. De todo o povo que se afastou do Senhor, ficará um resto que regressará à luz e se regozijará na salvação do Senhor Deus. Ao dar este nome ao seu filho, Isaías afirma a realidade tanto do castigo como da misericórdia. A raça dos fiéis não será inteiramente arrancada da terra. Apenas um resto, mas, mesmo assim, uma verdadeira geração de fiéis que sobreviverá à sombra da mão bondosa de Deus e transformará em realidade a vontade divina. Não temas... estes dois pedaços de tições fumegantes (4). Pretende-se acentuar que estes tições, outrora potencialmente perigosos, são agora quase impotentes, pouco mais do que meros troncos fumegantes. Assim, Isaías exprime o seu desprezo por eles. O filho de Tabeal (6). Nada se sabe a respeito deste homem. É significativo o fato de o profeta conhecer tão perfeitamente o plano da campanha que até sabe quem é a pessoa que se projeta sentar no trono. O nome é aramaico e, portanto, refere-se provavelmente a qualquer fantoche do rei da Síria. A cabeça da Síria será Damasco... (8). O sentido deste versículo e do seguinte é: "Contemplai o poder aparente de Aram e de Israel, mas não o temais. As suas cabeças são apenas Rezim e o filho pretensioso de Remalias, mas Jerusalém é a cabeça de Judá, e a cabeça de Jerusalém é Jeová". Dentro de sessenta e cinco anos (8). Alguns comentadores consideram estas palavras uma intercalação feita por um escriba em data posterior; afirmam eles que os profetas normalmente não dão uma data Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 39 tão precisa às suas predições. No entanto, leia-se Jr 25.12-13. Este espaço de tempo é certamente o que mediou a profecia e a destruição final do poder de Israel. Sob os golpes repetidos das invasões de Tiglate- Pileser e, mais tarde, com a introdução de colonos estrangeiros por Esar- Hadom, o poder do reino do norte foi completamente aniquilado. Se o não crerdes, certamente não ficareis firmes (9). Há um notável trocadilho no original que é quase impossível reproduzir numa tradução. Eis algumas tentativas de fazer ressaltar o efeito original: "Sem fé não há fixidez"; "Sem confiança forte não há forte de confiança"; "Sem confiança não há permanência". Estas palavras dirigem-se a Acaz e àqueles dos seus seguidores que dão indícios de não estarem convencidos pela mensagem do profeta. 2. A RECUSA DO REI E O SINAL (7.10-16). Para confirmar no coração e consciência do rei a verdade das suas palavras, Isaías diz-lhe que busque um sinal de Jeová (11). Receoso de que isto o pudesse obrigar a alterar de qualquer maneira a política externa que adotara, o rei recusa-se a fazê-lo (12), o que não impede que seja dado um sinal (14), o do nascimento de uma criança com o grande nome de Emanuel (14). É essa a certeza da esperança de que o Deus eterno não abandonara o Seu povo, antes em toda a sua vida o vigia, guarda e domina para glória Sua. Sinal (11). Não necessariamente milagroso. Um sinal é um penhor palpável, uma prova da verdade que o profeta proclamava em nome de Jeová. Nem tentarei... (12); temos aqui puro subterfúgio e hipocrisia. O rei recebera ordem expressa de pedir este sinal, e não o fazer era recusar o auxílio do céu. Eis que uma virgem conceberá... (14-16). É este um dos mais grandiosos trechos de Isaías, em torno do qual, nestes últimos tempos, se têm desencadeado tempestades de controvérsia e polêmica. Não podemos fazer aqui mais do que sublinhar alguns pormenores; para examinar mais a fundo esta questão, estudem-se obras de maior fôlego Isaías (Novo Comentário da Bíblia) 40 concebidas em maior detalhe. O problema é se esta passagem constitui uma referência específica e enfática à vinda do Messias e à maneira como se verificará o Seu nascimento, ou se temos aqui apenas uma referência estritamente limitada ao fato da presença de Jeová Todo Poderoso. Ao considerar este assunto, não se esqueça que é muito freqüente as profecias do Velho Testamento terem um sentido duplo, apontando para uma realização imediata e para outra mais tardia. Nos versos 15 e 16, o que se descortina é, evidentemente, um livramento num futuro breve. O nascimento daquela criança com o nome sagrado de Emanuel ("Deus conosco") é um penhor da certeza da libertação. Mas, para além dele, há a promessa firme, a realizar mais tarde, da salvação por Jeová do Seu povo de Israel. Só mediante a vinda do Filho de Deus e a realidade da encarnação é que se abriu o caminho para a realização deste livramento ulterior e mais absoluto. O autor destas linhas é de opinião que não há possibilidade de tirar a esta passagem o seu sentido messiânico. Mesmo que se conceda que a palavra traduzida por "virgem" (em hebraico almah) não tem necessariamente esse sentido exclusivo e que o profeta pensa, antes de mais, num acontecimento imediato, permanece o fato de que a redenção dos filhos de Israel e de toda a raça humana é realizada por Alguém com o nome de Emanuel, e acerca do Qual lemos, através do ensino explícito desse mesmo Alguém, que os profetas dEle escreveram e falaram (ver Lc 24.27). Com respeito ao reino futuro a que Isaías se refere (ver 7.16-18; 8.8), Delitzsch faz o seguinte comentário: "Se, nestes capítulos 7-9 Isaías encara a Assíria absolutamente como o Império Mundial, isto se revela verdadeiro na medida em que os impérios, do babilônio ao romano, constituem, na realidade, apenas o desenrolar de um processo que teve início na Assíria. E se aqui, no
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