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Inatomi_CellyCook_D

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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
 
 
 
 
CELLY COOK INATOMI 
 
 
A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NAS POLÍTICAS DE ERRADICAÇÃO 
DO TRABALHO ESCRAVO RURAL NO BRASIL CONTEMPORÂNEO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAMPINAS 
2016 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
 
A Comissão Julgadora do trabalho de Defesa de Tese de Doutorado “A 
atuação do Poder Judiciário nas políticas de erradicação do trabalho escravo 
rural no Brasil contemporâneo”, composta pelos professores doutores a seguir 
descritos, em sessão pública realizada em 8 de março de 2016, considerou a 
candidata Celly Cook Inatomi aprovada. 
 
Prof. Dr. Oswaldo E. do Amaral 
 
Prof. Dr. Frederico Normanha Ribeiro de Almeida 
 
Prof. Dr. Valeriano Mendes Ferreira Costa 
 
Profa. Dra. Débora Alves Maciel 
 
Prof. Dr. Eduardo G. Noronha 
 
 
 
A Ata da Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora consta 
no processo de vida acadêmica da aluna. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho ao Chris e à Piaf, 
com muito carinho 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Agradecimentos 
 Começo expondo meus sinceros agradecimentos ao Andrei, que há mais de 10 
anos aceitou a tarefa de me orientar, desde a monografia ao doutorado, sempre com 
muita sabedoria, paciência e amizade. Agradeço por seu apoio, pelas oportunidades 
de participação em seus projetos, e pela confiança em mim depositada nas vezes em 
que fui sua monitora no Programa de Estágio Docente na Unicamp. 
Agradeço também aos professores membros da banca de qualificação, Prof. 
Dr. Eduardo Noronha e Profa. Dra. Walquíria Domingues Leão Rêgo, pelas críticas, 
observações e sugestões que contribuíram para a finalização deste trabalho e para o 
seu aperfeiçoamento. 
Sou grata à CAPES pela bolsa de doutorado concedida, sem a qual eu não 
poderia ter me dedicado exclusivamente para a realização desta pesquisa. 
Agradeço também aos funcionários do IFCH, especialmente à Priscila Gartier, 
da Secretaria da Pós-Graduação de Ciência Política, e ao Sandro Carmo, da 
biblioteca, pela forma tão solícita, gentil e competente com a qual sempre trabalharam. 
Sou grata aos alunos dos PEDs em que fui monitora na Unicamp, pela 
experiência enriquecedora de dar aula e pelo respeito com que me receberam. Sou 
grata especialmente aos queridos Murilo Polato e Ana Clara Rocha, pela docilidade e 
incentivo com que sempre me trataram. 
 Agradeço imensamente ao Thiago Trindade, a seu pai Edi Aparecido Trindade, 
e ao Coordenador do Curso de Direito da Faculdade de Jaguariúna Prof. Fabrízio 
Rosa, pela oportunidade concedida de trabalhar como professora. Agradeço aos meus 
alunos pelas experiências e pelo crescimento que tenho vivenciado enquanto docente. 
 Agradeço às minhas queridas amigas da pós-graduação da Unicamp, Marcia 
Baratto e Ariana Bazzano, que foram apoio constante em diversos momentos. 
Agradeço pelo ombro amigo tantas vezes cedido, pelos conselhos, pela sabedoria e 
conhecimento e pelas tantas risadas e comilanças que já compartilhamos juntas. Sem 
vocês, tudo teria sido muito mais difícil, solitário e sem graça. 
Agradeço também à minha querida amiga Karen Sakalauska, que com seu 
entusiasmo e fé inabalável, mostrou-se sempre disposta a ajudar e a dar o seu melhor. 
Agradeço pelas vezes que me recebeu tão bem em sua casa, pelas tantas mensagens 
só para saber se estava tudo bem, pelas conversas e discussões filosóficas (nem 
sempre harmoniosas), mas que me ensinam constantemente o real valor do respeito 
 
 
 
 
às diferenças de pensamento. Você me faz querer ser uma pessoa melhor, uma 
professora melhor e uma amiga melhor. Obrigada também por ter trazido a linda 
Clarinha ao mundo, que veio para alegrar a vida de todos. 
Agradeço também aos meus queridos amigos de graduação, Marcio Scherma, 
Sara Lima, Thelma Belo, Ciça Ferrarezzi e Renato Pereira, que mesmo distantes, 
continuam presentes em minha vida até os dias de hoje, seja em pensamento ou em 
uma mensagem de saudade. São todos amigos iluminados, que levo como referência 
de seres humanos extraordinários. 
Sou grata também à minha querida amiga de sempre e de todas as horas 
Juliana Bertazzo, que com sua generosidade abundante esteve sempre a postos para 
conversar, ajudar e alegrar. Agradeço por sua amizade sempre e invariavelmente 
sincera, calorosa e presente. Amizade preciosa e difícil de encontrar, um tesouro que 
quero levar por toda a vida. 
Agradeço à família Inatomi (pai, mãe, Satye, tia Margo, tia Anézia, tio Roberto, 
tia Amélia, Cristina, Hugo, Danilo e Daniel), à família Pierotti dos Santos (José Camilo, 
Eva Catalina, Thomas e Cristiane), à família Cook (Vó Meire, tia Neca, tia Tuca e tia 
Cheila), e a inúmeros amigos, pelo carinho, pelos presentes recebidos, pela ajuda, e 
por terem me proporcionado, ao fim da redação desta tese, uma semana de férias (tão 
gostosa!), da qual nunca vou me esquecer. 
Agradeço aos queridos José Camilo e Eva Catalina pelas ajudas que deram 
sempre que necessário ao longo de todos esses anos, e pelo tratamento tão carinhoso 
que dão a minha querida Piaf. 
Quanto à minha família, meu pai Mario, minha mãe Miriam, e minha irmã 
Satye, não há palavras que possam expressar a minha gratidão por tudo que já 
fizeram e ainda fazem por mim. Vocês são o início e o fim de tudo, minha base e meus 
princípios, e objeto constante das minhas orações. 
Por fim, agradeço ao meu querido Chris e a minha linda cachorrinha Piaf. A ela 
agradeço pela alegria e companheirismo sempre presentes, e por aparecer em minha 
vida como um verdadeiro presente de Deus. Ao Chris agradeço por seu coração 
sempre generoso e aberto, por sua paciência, pelo café na madrugada, por sentar 
comigo e me ajudar a pensar e organizar as ideais, por me acalmar, e por me levar 
para ver flores. Eu amo vocês. 
 
 
 
 
Agradeço, sobretudo, a Deus e a nossa senhora, pela saúde, pelo teto, pelo 
alimento e pela força concedida. 
 
 
 
 
Resumo 
O objetivo da tese é o de analisar a atuação do Poder Judiciário nas 
políticas de erradicação do trabalho escravo rural no Brasil contemporâneo, de 
forma a verificar seus entendimentos acerca do trabalho escravo, suas formas 
de argumentação e seus posicionamentos frente à necessidade das políticas 
de erradicação do trabalho escravo rural. Para tanto, a tese empreendeu uma 
análise em profundidade e em fluxo de três casos que trataram do tema do 
trabalho escravo rural no Brasil, sempre sob o olhar conjunto de três 
dimensões de análise: individual ou do jogo político, institucional e estrutural. A 
tese possibilitou verificar que o Poder Judiciário atuou de forma mitigada no 
quadro das políticas de erradicação do trabalho escravo rural, apresentando 
mais limitações do que possibilidades de apoio a essas políticas. Cada caso 
analisado mostrou que há uma coexistência entre fatores de ordem individual, 
institucional e estrutural que permitiram fortalecer a tese sobre a atuação 
mitigada do Poder Judiciário, embora cada caso tenha revelado um fator como 
mais expressivo que os demais. 
 
Palavras-chave: Poder Judiciário – trabalho escravo rural – direitos de 
cidadania – estudos de caso 
 
 
 
 
Abstract 
This thesis provides an analysis of the actions taken by the Judiciary in 
the framework of rural slave labor eradication policies in contemporary Brazil. 
The key aim of the research work was to determine the understanding held by 
the Judiciary of what constitutes slave labor, as well as to identify the 
arguments made by members of the judiciary and stances taken by them in the 
framework of rural slave labor eradication policies. For that purpose, the 
research work presented in this thesis produced an in-depth flow analysis of 
three casestudies that dealt with rural slave labor in Brazil, under three 
simultaneous analytical dimensions: individual (or political game), institutional 
and structural. The research work generated a central thesis that the Judiciary 
had limited action in the framework of rural slave labor eradication policies, 
invariably presenting more limitations than indications of support to such 
policies. Each case studied revealed the coexistence of individual, institutional 
and structural factors corroborating the thesis about the limited action of the 
Judiciary, even though a different key factor stands out in each of the three 
cases. 
Keywords: Judiciary – rural slave labor – citizenship rights – case studies 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
 
Introdução ................................................................................................................... 15 
Apresentação do tema e relevância da pesquisa .................................................... 15 
Objetivos ................................................................................................................. 18 
Tese e argumentos ................................................................................................. 19 
Metodologia de pesquisa ........................................................................................ 23 
Estrutura da tese ..................................................................................................... 24 
PARTE I...................................................................................................................... 26 
Capítulo 1 – Dimensões para uma análise política do Poder Judiciário ...................... 28 
1.1 – Introdução ...................................................................................................... 28 
1.2 – A dimensão individual: os interesses políticos dos atores .............................. 31 
1.3 – A dimensão estrutural: a função e a contradição do direito ............................ 45 
1.4 – A dimensão institucional: as regras do jogo político ....................................... 51 
1.5 – As análises do Poder Judiciário no Brasil e o despertar da 
multidimensionalidade............................................................................................. 55 
1.6 – Conclusões: “Let a hundred flowers bloom” ................................................... 60 
Capítulo 2 – Um panorama das políticas governamentais de erradicação do trabalho 
escravo rural ............................................................................................................... 62 
2.1 – Introdução ...................................................................................................... 62 
2.2 – Primeiras denúncias e sua visão sistêmica (1970-1984) ................................ 63 
2.3 – Políticas embrionárias e o jogo político (1985-1995) ...................................... 77 
2.4 – Reconhecimento público e as limitações institucionais (1995-2002) .............. 91 
2.5 – Políticas integradas, “consensos” e as contradições do direito (2003-2012) 105 
2.6 – Conclusões .................................................................................................. 124 
PARTE II ................................................................................................................... 127 
Preliminares para os estudos de caso ...................................................................... 128 
Critérios para a escolha dos casos ....................................................................... 128 
Os casos escolhidos ............................................................................................. 135 
Critérios para a análise dos casos na Justiça ....................................................... 144 
Capítulo 3 – O Caso do “gato”: aquele que “cai sempre em pé” (1996-2015) ........... 146 
3.1 – Introdução .................................................................................................... 146 
3.2 – A fuga, a denúncia e as fiscalizações (1996-2004) ...................................... 146 
3.3 – O Caso no Judiciário (2004-2015) ................................................................ 155 
3.4 - Conclusões ................................................................................................... 173 
 
 
 
 
Capítulo 4 – O Caso do Senador João Ribeiro: um “homem do campo” (2004-2014)176 
4.1 – Introdução .................................................................................................... 176 
4.2 – A denúncia e a fiscalização .......................................................................... 176 
4.3 – O caso entra no Judiciário ............................................................................ 182 
4.3.1 – O Caso do Senador João Ribeiro na Justiça do Trabalho ..................... 184 
4.3.2 – O Caso do Senador João Ribeiro no Supremo Tribunal Federal ........... 197 
4.4 – Conclusões .................................................................................................. 207 
Capítulo 5 – O Caso Pagrisa: “modelo internacional” (2007-2015) ........................... 212 
5.1 – Introdução .................................................................................................... 212 
5.2 – A denúncia e a fiscalização .......................................................................... 212 
5.3 – Senadores se rebelam e o caso entra no Judiciário ..................................... 229 
5.4 – O caso no Judiciário ..................................................................................... 265 
5.4.1 – O Caso Pagrisa na Justiça do Trabalho ................................................ 266 
5.4.2 – O Caso Pagrisa na Justiça Federal ....................................................... 280 
5.5 – Conclusões .................................................................................................. 304 
Conclusões ............................................................................................................... 311 
Tese e resultados ................................................................................................. 311 
Diálogos teóricos e metodológicos ........................................................................ 314 
Desdobramentos ................................................................................................... 319 
Referências Bibliográficas ........................................................................................ 321 
Apêndices ................................................................................................................. 345 
Apêndice 1 – Relatórios produzidos sobre trabalho escravo após 2003 ............... 345 
Apêndice 2 – Espectro dos casos nas políticas de erradicação do trabalho escravo346 
Apêndice 3 – Espectro temporal do Caso do “gato” .............................................. 347 
Apêndice 4 – Lista de notícias sobre o Caso do Senador João Ribeiro ................ 355 
Apêndice 5 – Espectro temporal do Caso Pagrisa ................................................ 356 
Apêndice 6 – Lista de notícias sobre o Caso Pagrisa no Senado ......................... 368 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de Tabelas 
Tabela 1 - Medidas Formais para o Trabalho Rural e para o Trabalho Escravo (1940-
1969) .......................................................................................................................... 66 
Tabela 2 - Medidas Formais para o Trabalho Rural e para o Trabalho Escravo (1985-
1994) .......................................................................................................................... 79 
Tabela 3 - Medidas Formais para o Trabalho Rural e para o Trabalho Escravo (1995-
2002) .......................................................................................................................... 93 
Tabela4 - Medidas Formais para o Trabalho Rural e para o Trabalho Escravo (2003-
2012) ........................................................................................................................ 107 
Tabela 5 - Operações de Fiscalização e Inclusões na "Lista Suja" do Trabalho Escravo 
(1995-2012) .............................................................................................................. 111 
Tabela 6 - Atividades rurais com trabalho escravo que foram parar no TST ............. 130 
Tabela 7 - Atividades rurais com trabalho escravo que foram parar no STJ ............. 131 
Tabela 8 - Autores das ações sobre trabalho escravo no TST .................................. 131 
Tabela 9 - Autores das ações sobre trabalho escravo julgadas pelo STJ ................. 132 
Tabela 10 - Tempo de duração dos processos no TST em função dos autores das 
ações ........................................................................................................................ 133 
Tabela 11 - Tempo de duração dos processos do STJ em função dos autores das 
ações ........................................................................................................................ 133 
Tabela 12 - Respostas do TST em função dos autores das ações ........................... 134 
Tabela 13 - Respostas do STJ em função dos autores das ações ............................ 134 
Tabela 14 - Espectro do cenário do trabalho escravo nos casos escolhidos ............. 135 
Tabela 15- Trabalhadores resgatos por estado federativo (1995-2014) .................... 136 
Tabela 16 - Operações de Fiscalização realizadas no Caso do "gato"...................... 148 
Tabela 17 - Quadro de Inquéritos Policiais abertos para o Caso do "gato" ............... 154 
Tabela 18 - Quadro Geral de Processos na Justiça para o Caso do "gato" .............. 156 
Tabela 19 - Características Gerais dos Processos Judiciais no Caso do "gato" ........ 157 
Tabela 20 - Redesignação de Audiências, Motivos e Autores - Caso do "gato" ........ 160 
Tabela 21 - Natureza dos motivos de redesignação de audiências - Caso do "gato" 161 
Tabela 22 - Natureza dos argumentos dos juízes - Caso do "gato" .......................... 172 
Tabela 23 - Quadro Geral de Processos na Justiça para o Caso do Senado João 
Ribeiro ...................................................................................................................... 184 
Tabela 24 - Características Gerais dos Processos na Justiça Trabalhista no Caso do 
Senador João Ribeiro ............................................................................................... 184 
Tabela 25 - Natureza dos argumentos dos juízes trabalhistas - Caso do Senador João 
Ribeiro ...................................................................................................................... 185 
Tabela 26 - Características Gerais dos Processos no STF no Caso do Senador João 
Ribeiro ...................................................................................................................... 197 
 
 
 
 
Tabela 27 - Natureza dos argumentos dos ministros do STF - Caso do Senador João 
Ribeiro ...................................................................................................................... 198 
Tabela 28 - Quadro Geral de Processos na Justiça para o Caso Pagrisa ................. 266 
Tabela 29 - Características Gerais dos Processos na Justiça Trabalhista no Caso 
Pagrisa ..................................................................................................................... 267 
Tabela 30 - Redesignações de audiências na Justiça Trabalhista de 1º Grau - Caso 
Pagrisa ..................................................................................................................... 268 
Tabela 31 - Motivos das Redesignações de audiências na Justiça Trabalhista de 1 º 
grau - Caso Pagrisa .................................................................................................. 269 
Tabela 32 - Redesignação de audiências na Justiça Trabalhista - Caso Pagrisa ...... 272 
Tabela 33 - Natureza dos argumentos dos juízes trabalhistas - Caso Pagrisa .......... 273 
Tabela 34 - Redesignação de Audiências, Motivos e Autores - Caso Pagrisa .......... 275 
Tabela 35 - Características Gerais dos Processos na Justiça Federal para o Caso 
Pagrisa ..................................................................................................................... 281 
Tabela 36 - Natureza dos argumentos dos juízes da Justiça Federal - Caso Pagrisa282 
 
 
Lista de Figuras 
 
Figura 1 - Atividades rurais em que foi encontrado trabalho escravo ........................ 129 
Figura 2 - Mapa dos trabalhadores escravos resgatados .......................................... 138 
Figura 3 - Mapa do índice de probabilidade de escravidão e resgates em 2007 ....... 139 
Figura 4 - Fluxos dos trabalhados escravos .............................................................. 140 
Figura 6 - Trabalho escravo e a cana-de-açúcar ....................................................... 142 
Figura 7 - Trabalho escravo e pecuária..................................................................... 143 
 
 
15 
 
 
 
Introdução 
 
Apresentação do tema e relevância da pesquisa 
Como nos mostra a socióloga Maria de Nazareth Baudel Wanderley 
(2011), o tema do trabalho escravo rural no Brasil contemporâneo não é novo 
na literatura brasileira das ciências sociais, pois está entre os diversos temas 
abordados pelos estudos rurais que vieram se desenvolvendo desde os anos 
1960 até os dias de hoje. Podemos encontrar, assim, diversos trabalhos, 
especialmente no campo da Sociologia, que buscaram entender as causas 
desse fenômeno, e que acabaram por fornecer contribuições muito importantes 
para o entendimento de processos macroestruturais da sociedade brasileira, 
tais como o avanço do capitalismo no meio rural e seu consequente processo 
de modernização conservadora. São trabalhos, portanto, que nos ajudam a 
entender a conformação da cidadania no meio rural brasileiro. 
Juntamente a esses avanços acadêmicos em direção a um 
entendimento mais macroestrutural, o tema também vem sendo abordado em 
outras direções. Desde meados dos anos 1980, diversos órgãos públicos e 
organizações da sociedade civil vêm produzindo uma série de relatórios de 
caráter mais técnico e denunciativo. Os relatórios mais descritivos e técnicos, 
em grande medida produzidos por órgãos públicos, possuem uma ênfase mais 
institucionalizada. Eles abordam questões de infra-estrutura e de organização 
das instituições para lidar com o problema, e também comentam as políticas de 
erradicação implementadas pelo governo federal. Já os relatórios de caráter 
mais denunciativo, produzidos por organizações da sociedade civil, possuem 
uma visão mais voltada para o processo político e para o sistema econômico. 
Ou seja, voltam seu olhar para a relação entre as expectativas sociais por 
cidadania e justiça e as ações tomadas pelas autoridades políticas e as 
diretrizes econômicas. O ponto em comum entre esses dois tipos de relatórios, 
no entanto, é que ambos batem na tecla da falta de um consenso acerca do 
que é e como se identifica o trabalho escravo rural hoje. Argumenta-se que a 
16 
 
 
 
falta desse consenso prejudica a atuação das instituições e, 
consequentemente, possibilita que a questão seja definida e manipulada de 
acordo com os valores e interesses particulares dos atores envolvidos. 
Como aponta José de Souza Martins (1999), a confusão sobre a 
definição do trabalho escravo rural vem, de fato, permitindo sua manipulação 
de acordo com interesses particulares e, com isso, constituindo um problema 
para a atuação das instituições. Mas o autor ressalva que enfatizar somente 
essa questão é deixar de olhar para algo mais importante, que é a ação e a 
capacidade das instituições políticas de lidar com aexploração do trabalho no 
campo em seu sentido mais genuíno e amplo. Segundo o autor, essa 
discussão sobre o trabalho escravo rural, pautada em sua definição, fragmenta 
o sentido de cidadania, pois acaba estabelecendo gradações acerca do que é 
uma exploração aceitável (uma questão “apenas” trabalhista) e o que é uma 
exploração inaceitável (que atinge o ser humano em sua dignidade). Assim, a 
busca indiscriminada por uma definição única pode ser tão problemática quanto 
a sua própria inexistência, pois as instituições podem deixar de fora novas 
situações de exploração do trabalho rural que não se encaixam em definições 
previamente estabelecidas e que precisam igualmente de uma constante 
atenção e atuação das autoridades públicas. 
A questão central, portanto, não está na definição, mas no entendimento 
que as instituições sustentam acerca das relações e das condições de trabalho 
no campo. Como argumenta o autor, as relações de trabalho e de produção no 
campo estão em constante modificação e, com elas, também caminham 
diferentes formas de exploração do trabalhador, no que a atuação institucional 
deveria ter a postura crítica de tentar acompanhar essas mudanças, de modo a 
evitar que a exploração ocorra em qualquer nível. No entanto, Martins (1999) 
aponta que quase nada tem sido feito em termos de pesquisas mais 
sistemáticas que possibilite acompanhar e analisar a atuação das instituições 
políticas, inclusive a atuação das instituições do Judiciário. 
É certo que os relatórios dos órgãos públicos têm fornecido informações 
sobre as instituições, descrevendo seus desempenhos e dificuldades. No 
entanto, como já vimos, são relatórios que estão mais preocupados em mostrar 
17 
 
 
 
dados acerca da infra-estrutura e dos resultados das políticas governamentais, 
não adentrando de forma mais crítica na lógica de funcionamento e de atuação 
das instituições. São relatórios que atribuem os problemas institucionais 
existentes à falta de recursos ou à falta de leis objetivas e claras que definam o 
que é o trabalho escravo rural. Os relatórios das organizações da sociedade 
civil, por sua vez, quando falam das instituições, acabam personalizando-as na 
figura de atores particulares, de modo a mostrar a correlação de forças e de 
interesses no jogo político, tratando a questão da erradicação do trabalho 
escravo majoritariamente como uma questão de vontade política. Com isso, 
acabam desconsiderando a ideia de que as vontades particulares dos sujeitos 
podem não se traduzir necessariamente na atuação das instituições. Ou seja, 
acabam negligenciando o caráter organizativo e coercitivo das instituições 
sobre a vontade particular dos indivíduos. 
Assim, tanto os relatórios dos órgãos públicos quanto das organizações 
da sociedade civil se apresentam de forma claramente parciais e engajadas, 
constituindo materiais empíricos a serem analisados e não pesquisas 
sistemáticas sobre a atuação das instituições políticas no problema do trabalho 
escravo rural. É nesse ponto que a tese, no campo da ciência política, pode 
apresentar algumas contribuições. 
Claramente que não se trata de analisar a atuação do Judiciário sobre 
todo tipo de exploração do trabalho no campo no passado e no presente, até 
mesmo porque o intuito é um focar sobre a instituição do Judiciário e não sobre 
a exploração do trabalho em si. Não é intuito, portanto, tentarmos ver como o 
Judiciário acompanha as transformações da exploração do trabalho no campo, 
até mesmo porque isso demandaria uma pesquisa empírica muito mais 
abrangente temporalmente. No entanto, pensamos que focar sobre a 
controvertida questão do trabalho escravo rural contemporâneo não nos 
impossibilita de ver a atuação do Judiciário perante a exploração do trabalho 
rural como um todo e mais historicamente. Por se tratar de uma questão 
controversa no universo político-jurídico, sendo alvo de muitas discórdias e 
desentendimentos entre os atores e as instituições políticas, é uma questão 
que acaba sendo definida através de comparações e diferenciações com 
18 
 
 
 
outras situações de exploração mais reconhecidas e sedimentadas, como as 
questões trabalhistas e o nosso antigo sistema escravista. Assim, o estudo 
sobre a atuação do Judiciário sobre o trabalho escravo rural no Brasil 
contemporâneo pode facilmente fornecer pistas sobre sua atuação (ou ao 
menos sobre seu pensamento) em outras questões de exploração do trabalho 
no campo. Mais importante, trata-se de um tema que nos permite expandir os 
estudos empíricos sobre o Judiciário brasileiro e sobre o seu papel na defesa e 
garantia dos direitos de cidadania. 
 
Objetivos 
O objetivo central da tese é o de realizar uma análise de caráter 
exploratório através do estudo de três casos de trabalho escravo rural de 
expressividade teórica e que foram parar nas instâncias do Poder Judiciário. 
Escolhemos três casos de trabalho escravo cujas atividades rurais em questão 
são significativamente representativas no quadro do trabalho escravo rural no 
Brasil, e nos quais os acusados possuem perfis distintos ou capacidades 
litigatórias variáveis. Os casos compreendem, assim, acusações de trabalho de 
escravo no setor sucroalcooleiro e no setor pecuário; e tem por acusados um 
“gato” (o Caso do “gato”), um senador da República (o Caso do Senador João 
Ribeiro) e uma grande empresa do setor sucroalcooleiro (o Caso Pagrisa)1. 
 O intuito é o de realizar uma incursão em profundidade e em fluxo nos 
casos selecionados, de forma a delimitar e analisar as formas pelas quais o 
Poder Judiciário vem pautando suas decisões e atuando no cenário das 
políticas de erradicação do trabalho escravo rural no Brasil contemporâneo, 
especialmente entre 1995 e 2012, quando as políticas se tornam mais 
institucionalizadas. 
Queremos saber que avanços, retrocessos ou interferências ele tem 
empreendido nesse cenário; como vem entendendo esse problema crítico da 
 
1
 Os critérios de seleção dos casos encontram-se detalhados nas “Preliminares para os 
estudos de caso”, expostas na Parte II da tese. 
 
19 
 
 
 
exploração do trabalho no campo; e que instrumentos e ações institucionais 
vem apresentando para lidar com esse problema. Queremos identificar e 
analisar, também, as respostas que ele tem dado às expectativas de outros 
atores e instituições; a que ou a quem sua atuação tem propiciado ganhos 
diretos ou indiretos; e de que formas vem respondendo e se alinhando às 
políticas governamentais implementadas. Queremos, ainda, explorar e 
compreender os argumentos e critérios que ele tem se valido para justificar sua 
atuação. Em resumo, queremos saber como que o Judiciário vem se 
apresentando e se portando neste quadro, e se nele podemos enxergar 
possibilidades de entendimentos mais críticos sobre a exploração do trabalho 
no campo, que considerem seu aspecto sistêmico e que permitam romper com 
a reprodução de padrões desiguais de cidadania. 
 
Tese e argumentos 
A hipótese de pesquisa trabalhada pela tese resultou da realização de 
duas explorações empíricas preliminares (que serão expostas ao longo da 
análise), e que auxiliaram, inclusive, na opção pelo método dos estudos de 
caso e também na própria delimitação dos casos analisados. Na primeira 
exploração empírica realizada (exposta no Capítulo 2 da tese), foi feita a leitura 
e análise de um conjunto de documentos legislativos, políticas, relatórios e 
pesquisas elaborados por diversos atores políticos e sociais acerca do tema do 
trabalho escravo rural e acerca das políticas governamentais implementadas. E 
na segunda exploração empírica (exposta nas Preliminares para os estudos de 
caso na Parte II da tese), foi realizado o levantamento e análise de alguns 
processos judiciais envolvendo o tema do trabalho escravo rural em função de 
variáveis gerais de análise. 
Esses dois momentospreliminares de exploração empírica nos 
possibilitaram perceber não apenas a complexidade de fatores que envolvem a 
questão do trabalho escravo rural, como também a diversidade de dimensões 
analíticas que são necessárias para obtermos uma compreensão mais 
completa da atuação do Poder Judiciário. Ambos os momentos nos deram 
ilustrações empíricas primárias da tese de que o Poder Judiciário vem atuando 
20 
 
 
 
de forma mitigada sobre o tema, apresentando mais limitações do que 
possibilidades de apoio às políticas de erradicação do trabalho escravo rural. 
Tais ilustrações primárias foram problematizadas e fortificadas pelos estudos 
de caso empreendidos, que nos mostraram de forma ainda mais clara a 
atuação mitigada do Poder Judiciário e a importância de se considerar 
diferentes dimensões de análise para se compreender as possíveis razões 
dessa atuação. 
No que tange às possibilidades de apoio às políticas de erradicação por 
parte do Poder Judiciário, os estudos dos casos nos mostraram que embora 
tenha sido possível encontrar sentenças e entendimentos judiciais que 
considerassem os aspectos mais sistêmicos acerca da exploração no campo, 
tais entendimentos acabaram se dando de forma isolada e provisória, na 
medida em que foram ou questionados ou anulados através de recursos 
julgados por instâncias judiciais superiores. Tais situações, no entanto, 
apresentaram um ponto positivo importante, no sentido de que as sentenças e 
entendimentos mais amplos acabaram servindo como instrumentos de 
mobilização por parte de outros atores políticos, especialmente pela mídia 
ativista no campo. 
No que tange às limitações, por sua vez, os estudos dos casos nos 
mostraram que elas se apresentaram das mais variadas formas. Pudemos 
encontrá-las nos retrocessos que o Judiciário empreendeu no entendimento da 
exploração do trabalho no campo, minimizando e ponderando as situações de 
exploração encontradas. Pudemos vê-las nas interferências que ele realizou ao 
questionar a legitimidade de ações e medidas punitivas tomadas por outros 
atores e instituições políticas. Também estiveram presentes na falta de 
responsividade do Judiciário às expectativas por justiça de outros atores 
políticos e sociais, deixando-lhes o sentimento de impunidade em função da 
morosidade e do prolongamento dos processos até a prescrição dos crimes. 
Ligadas a isso, também pudemos observar a existência de decisões e 
argumentações diferenciadas que o Judiciário deu aos casos em função de 
seus réus e de sua relevância no cenário político-econômico, apontando a 
permeabilidade da Justiça às pressões de ordem externas. Além disso, as 
21 
 
 
 
limitações também puderam ser observadas nos diversos argumentos que o 
Judiciário mobilizou para justificar sua atuação. Tais argumentos se mostraram 
de forma explícita (como nos casos citados de amenização da exploração 
encontrada e de questionamento de medidas de outras instituições) e também 
de forma implícita à sua lógica de funcionamento institucional (como nas 
tergiversações processuais e na postergação dos casos até serem amenizados 
ou anulados). 
Assim, na medida em que fomos ganhando mais contato com os 
materiais empíricos e, simultaneamente, com os diversos estudos e 
abordagens de análise sobre o Poder Judiciário (apresentadas no Capítulo 1 
da tese), também fomos percebendo a importância de vê-lo a partir de lentes 
ou dimensões mais variadas de análise. Fomos percebendo que uma hipótese 
e uma explicação dicotômica, que simplesmente mostrasse a atuação do 
Judiciario como sendo o resultado de um fator ou outro, poderia não dar conta 
de diversos elementos trazidos por nossos materiais empíricos. Ou seja, fomos 
percebendo que explicar a atuação do Judiciário somente em função do 
conservadorismo dos juízes, ou somente em função de problemas internos 
institucionais, ou somente em função da estrutura social e econômica histórica 
brasileira, poderia negligenciar fatores importantes. 
Como apontamos, trata-se da existência tanto de limitações quanto de 
possibilidades de sustentação, sobre as quais supomos uma predominância 
das limitações e não uma simples exclusão das possibilidades de sustentação 
das políticas de erradicação por parte do Judiciário. Julgamos relevante, assim, 
construirmos nossa argumentação através da ênfase conjunta em três 
dimensões de análise: uma voltada para o processo político ou para a ação dos 
atores envolvidos, uma segunda de ordem estrutural, e uma terceira dimensão 
institucional. Ou seja, pensamos e nos questionamos sobre a contribuição ou 
peso explicativo de cada dimensão, de forma a empreendermos um estudo 
aprofundado da atuação do Poder Judiciário sobre o problema do trabalho 
escravo rural. 
Para nós, ver o Judiciário a partir da lente do processo político ou 
individual é enxergá-lo a partir da ação dos juízes e de suas relações com 
22 
 
 
 
outros atores envolvidos. É identificar e caracterizar esses atores, seus 
entendimentos, objetivos, demandas, expectativas, estratégias, decisões, 
poderes e relações. É olhar mais de perto as coalizões de forças, de ideias e 
de programas de ação. É se voltar para as aproximações e distanciamentos 
entre os atores, e para a sua inserção no cenário conflitante das políticas de 
erradicação do trabalho escravo rural. É ver que as polarizações resultantes de 
um olhar mais estrutural podem ser esmiuçadas e detalhadas em suas 
nuances e efeitos. É olhar o resultado final dos processos macro-estruturais a 
partir de uma lupa, para vermos as possibilidades abertas no seio das relações 
entre os atores, para entendermos como elas são pensadas e alcançadas, e de 
que forma podem impactar no posicionamento de outros sujeitos e no próprio 
cenário de políticas voltadas para o combate ao trabalho escravo rural. 
Ver o Judiciário a partir de uma lente estrutural, por sua vez, nos 
possibilita resgatar, com auxílio da bibliografia, a ideia de função do Judiciário 
nas mudanças estruturais das relações sociais e do desenvolvimento da 
cidadania no campo no Brasil. É entender seu papel hoje em função de sua 
inserção em importantes marcos históricos da ordem política, econômica e 
social brasileira no passado. É recordar, por exemplo, o papel atribuído ao 
Judiciário para lidar com as consequências diretas da política 
desenvolvimentista do regime militar, do processo de redemocratização no final 
dos anos 1980, e das reformas neoliberais implementadas a partir dos anos 
1990. É lembrar, portanto, do seu papel no avanço da empresa capitalista no 
campo, na acentuação da concentração da propriedade da terra e na expulsão 
de camponeses de suas terras e sua consequente submissão a condições 
indignas e degradantes de trabalho. É recordar também a sua função de 
repressão institucional sistemática das mobilizações renovadas por reforma 
agrária, e a sua função de criminalização dos movimentos sociais rurais. 
Assim, ver o Judiciário a partir de uma lente mais estrutural é vê-lo a partir de 
sua funcionalidade para a defesa e manutenção desses marcos históricos 
fundamentais, ajudando na conformação de uma cidadania de caráter peculiar 
no meio rural. 
23 
 
 
 
Por fim, olhar para o Judiciário a partir de uma dimensão institucional é 
entendê-lo como uma instituição política que possui independência e 
autonomia perante os sujeitos e os processos macroestruturais. Ou seja, é vê-
lo enquanto dotado de regras, organização e lógica próprias de funcionamento 
e de atuação. É entendê-lo na complexidade de suas relações intra-
institucionais que regem a ação de seu corpo de funcionários. Trata-se de uma 
dimensão que nos permite, por exemplo, trabalhar as inovações das 
instituições judiciais, especialmente no que diz respeito à sua independência, 
prerrogativas e aos instrumentos de promoção de cidadania adquiridos após 
1988 e, mais fortemente, após a reforma judicialde 2004. Isso, por sua vez, 
nos possibilita estudar as relações conflituosas que se abriram com os outros 
poderes do Estado do ponto de vista da formulação e da implementação de 
políticas públicas. O que essa dimensão nos traz de essencial, portanto, é um 
maior conhecimento da “máquina” judicial brasileira e de seus efeitos sobre o 
processo político. 
Podemos observar, assim, que são três dimensões de análise que nos 
chamam atenção para elementos igualmente importantes para explicar as 
possibilidades e as limitações (bem como suas relações) da atuação do 
Judiciário brasileiro na questão do trabalho escravo rural no Brasil 
contemporâneo. 
 
Metodologia de pesquisa 
A tese se pautou centralmente pela metodologia dos estudos de casos e 
da análise de fluxo dos processos judiciais selecionados2, mantendo um 
diálogo com os achados empíricos preliminares e com as diversas abordagens 
analíticas sobre o Poder Judiciário. Entendemos que os estudos de casos nos 
permitem analisar o problema com maior profundidade, no que podemos 
levantar e trabalhar com variáveis que abordem as três dimensões de análise 
citadas. A análise de fluxo, por sua vez, nos permite acompanhar os processos 
 
2
 Os critérios de seleção, assim como os critérios de análise dos casos, encontram-se 
detalhados nas “Preliminares para os estudos de caso”, expostas na Parte II da tese. 
24 
 
 
 
em toda a sua trajetória, percursos, atalhos, interferências e pausas. Assim, 
acompanhamos cada caso desde a denúncia até o julgamento e 
sentenciamento, passando por diferentes esferas e graus do Judiciário. 
Trata-se, sobretudo, de um estudo de caráter exploratório, que não 
busca dar explicações fechadas ou unilaterais sobre a atuação do Poder 
Judiciário, mas sim levantar elementos que, em conjunto, permitem entender 
essa atuação em fluxo e em profundidade. A partir do estudo exploratório não 
se toma uma variável única que seja capaz de explicar todo e qualquer caso de 
trabalho escravo rural, muito embora seja possível estabelecer alguns critérios 
gerais e comuns de análise, que tomam forma particular em função do fluxo 
singular a cada caso. 
 
Estrutura da tese 
A tese foi divida em duas partes. Na Parte I (formada pelos Capítulos 1 e 
2), colacionamos um conjunto de questões e respostas, tanto no plano teórico 
e metodológico quanto no plano empírico, que ajudam a compreender a 
atuação política do Poder Judiciário na questão do trabalho escravo rural. 
Assim, no Capítulo 1 apresentamos um mapeamento de várias abordagens 
teóricas sobre o Poder Judiciário, em que tentamos identificar quais dimensões 
analíticas cada abordagem enfatiza e que relações ela estabelece com as 
demais dimensões. Procuramos, ainda, verificar as metodologias de pesquisa 
mobilizadas e suas possibilidades analíticas. No Capítulo 2, traçamos um 
panorama das políticas de erradicação do trabalho escravo rural no Brasil, de 
forma a descrever as caracterizações e os entendimentos institucionais acerca 
do problema e de que forma essas políticas e entendimentos foram avaliados 
por diferentes atores políticos e sociais. 
Na Parte II, por sua vez, voltamo-nos inteiramente para os estudos de 
caso, que se dispõem ao longo dos Capítulos 3, 4 e 5. No Capítulo 3, 
analisamos o Caso do “gato”, em que o Judiciário tratou de um caso sem 
repercussão política, e no qual sobressaiu a importância de fatores de ordem 
institucional para a compreensão da atuação do Poder Judiciário. No Capítulo 
25 
 
 
 
4, por sua vez, analisamos o Caso do Senador João Ribeiro, em que já se nota 
uma repercussão política bem maior, não apenas em função da posição 
pública do senador, mas também em função da manifestação de 
posicionamentos individuais dos juízes sustentando concepções conservadoras 
e naturalizadoras das condições degradantes de trabalho no campo. No 
Capítulo 5, por fim, analisamos o Caso Pagrisa, que é o caso mais de 
descrição mais longa, mais complexo e de maior repercussão política entre os 
três casos estudados, e no qual se mostrou de forma mais evidente a 
importância de fatores de ordem estrutural sobre o andamento do caso na 
Justiça, dada a visível permeabilidade dos juízes às influências de ordem 
socioeconômica exercidas pela empresa. 
Nas conclusões, por fim, fazemos um resgate dos resultados 
apresentados nos estudos dos casos em função da tese defendida, assim 
como também procuramos “fechar” diálogos teóricos e metodológicos abertos 
no Capítulo 1 da tese em função dos resultados obtidos com os estudos de 
caso. E procuramos, ainda, traçar algumas possibilidades de desdobramentos 
da tese para a realização de pesquisas futuras. 
 
 
26 
 
 
 
PARTE I 
 
27 
 
 
 
 
Esta primeira parte da tese está voltada para a discussão de questões e 
respostas que podem ser levantadas em uma análise política da atuação do 
Poder Judiciário. Essa discussão é feita aqui em dois momentos. 
Primeiramente, no Capítulo 1, o debate é realizado no plano teórico e 
metodológico, de forma a estudar as questões, respostas e metodologias 
desenvolvidas por diferentes abordagens analíticas para o estudo político do 
Poder Judiciário. Num segundo momento, no Capítulo 2, a discussão já é feita 
através dos primeiros movimentos exploratórios e empíricos da tese, em que 
traçamos um panorama das políticas de erradicação – de forma a apresentar 
os problemas em voga e as soluções institucionais dadas pelas políticas 
governamentais – e procuramos analisar as avaliações de diferentes atores 
políticos e sociais sobre as políticas implementadas – de forma a verificar as 
questões e avaliações que foram feitas inclusive sobre a atuação do Poder 
Judiciário. Assim, tanto o primeiro quanto o segundo capítulo nos ajudam a 
colacionar questões e possíveis respostas sobre a atuação política do Poder 
Judiciário no quadro das políticas de erradicação do trabalho escravo rural, 
apontando, especialmente, para a necessidade de considerarmos uma 
multiplicidade de fatores ou dimensões analíticas para a compreensão mais 
completa do problema. 
 
 
28 
 
 
 
Capítulo 1 – Dimensões para uma análise política do 
Poder Judiciário
3
 
 
“It’s the vague people who are the pioneers” 
(Richard Rorty) 
1.1 – Introdução 
O objetivo deste capítulo é o de apresentar o esquema teórico-
metodológico que nos auxilia neste trabalho e que resulta de um esforço em 
discutir a importância de diferentes dimensões analíticas para se pensar o 
Poder Judiciário brasileiro. Para tanto, destinamos boa parte deste capítulo 
para discutir o debate norte-americano em Ciência Política sobre o Poder 
Judiciário. A essencialidade deste debate reside na sua própria formação e 
desenvolvimento, que nos mostra um embate constante entre diferentes 
abordagens analíticas com diferentes explicações sobre a atuação do Poder 
Judiciário. A exploração desse debate nos ajuda não apenas a entender suas 
possibilidades e limites como também a entender as possibilidades e limites do 
debate brasileiro, que, em sua maioria, incorporou alguns pressupostos do 
debate norte-americano de forma acrítica, especialmente através das teses da 
judicialização da política. 
Apresentamos o debate norte-americano de forma a tornar menos 
nítidas as linhas teórico-metodológicas que separam as diferentes abordagens 
analíticas presentes nesse debate. Expomos uma visão mais abrangente das 
abordagens, saindo do que lhes é padrão e nuclear para caminhar em direção 
às suas margens e, assim, ver os contatos que estabelecem com outras 
abordagens. O intuito, portanto, é o de verificar os pontos de semelhança, de 
continuidade ou mesmo de complementaridade entre as diversas perspectivas, 
mostrando que o debate pode ser apresentado menos como um jogo de 
oposições e mais como um diálogo fluido de trocas teóricas e metodológicas.3
 Este capítulo é o resultado resumido de um trabalho mais extenso sobre o debate norte-
americano em ciência política sobre o Poder Judiciário, trabalho no qual os autores e obras 
citadas ao longo do capítulo se encontram resenhados e analisados com maior profundidade e 
correlação. 
29 
 
 
 
Defendemos a tese de que conhecer esse debate para além do que lhe 
é padrão nos ajuda a perceber que a adoção de uma abordagem analítica 
particular para estudar o Poder Judiciário não deve necessariamente nos 
prender a uma linha única de pensamento, pressupostos e métodos de 
trabalho. Isso acontece justamente porque as abordagens conversam muito 
mais entre si do que geralmente se reconhece, extrapolando os esquemas 
teórico-metodológicos por demais rígidos e fechados. A reconstrução do 
debate em termos mais abrangentes possibilita verificar a existência de uma 
margem de ação para o pesquisador transitar de forma mais livre e exploratória 
entre as diversas abordagens analíticas sobre o Poder Judiciário, buscando 
realizar tentativas de síntese e não o aprofundamento de análises unilaterais. 
A identidade que cada abordagem sustenta no campo dos estudos 
judiciais norte-americanos geralmente é construída e defendida em oposição 
às abordagens já existentes, até mesmo para que ela se coloque como 
diferente e inovadora. Esse processo de diferenciação se dá através da defesa 
ou da ênfase de uma dimensão de análise específica: algumas abordagens 
defendem que para entendermos a atuação política do Judiciário é preciso que 
nos voltemos para as ações dos juízes, para os seus valores e preferências 
políticas particulares, levando-nos, assim, para dimensões individuais de 
análise; outras abordagens, por sua vez, defendem que a atuação do Judiciário 
só pode ser inteiramente compreendida se conseguirmos descobrir a sua 
função dentro de uma determinada sociedade, fazendo-nos pensar em 
dimensões analíticas mais estruturais; e outras, ainda, defendem que uma 
análise sobre o Poder Judiciário tem que levar em conta suas regras e formas 
de funcionamento, no que é preciso reconhecer a importância da dimensão 
institucional. 
O que podemos perceber, no entanto, é que, embora as abordagens 
sempre apresentem uma ênfase sobre uma dimensão de análise em particular, 
e embora elas sejam reconhecidas, agrupadas e compreendidas por isso, elas 
se entrelaçam de maneiras diversas, extrapolando não somente os limites 
internos de suas próprias abordagens como também dos conjuntos de 
abordagens no qual se inserem, a dizer, individualistas, estruturalistas e 
30 
 
 
 
institucionalistas. Podemos encontrar, por exemplo, abordagens individualistas, 
mas que apresentam características teórico-metodológicas que se desviam do 
padrão de uma análise individualista, trazendo argumentos de caráter 
institucional ou estrutural e, com isso, desenvolvendo análises mais 
multidimensionais. O que se pode perceber é que até mesmo as abordagens 
mais “puras” ou mais unidimensionais possuem trabalhos ou estudiosos que 
fogem à regra e empurram os limites de suas próprias abordagens, testando ao 
extremo sua capacidade analítica. 
Para realizar o que estamos propondo, este capítulo se divide da 
seguinte forma. Na primeira parte, discutimos um conjunto de abordagens 
norte-americanas que enfatizam a dimensão individual para analisar o Poder 
Judiciário. Falamos sobre as abordagens mais tipicamente ou puramente 
“individualistas”, como o Modelo Atitudinal e o Modelo Estratégico; e sobre as 
abordagens mais abrangentes, como o Realismo Jurídico, a Jurisprudência 
Política e a Mobilização do Direito. Além disso, mostramos que até mesmo 
dentro das abordagens mais puramente individualistas, como no Modelo 
Atitudinal e no Modelo Estratégico, é possível encontrar exemplos que não 
somente se aproximam das abordagens individualistas mais abrangentes, 
como também extrapolam os limites do próprio conjunto de abordagens 
individualistas, caminhando em direção a considerações de caráter mais 
institucional e/ou estrutural. 
Na segunda parte do capítulo, discutimos os trabalhos norte-americanos 
de cunho estruturalista vindos do movimento dos Critical Legal Studies, 
novamente pensando em termos de trabalhos mais puros e mais abrangentes. 
Dentre os mais puros, vemos o posicionamento radical das teses da 
“indeterminação” do direito. Dentre as mais abrangentes, vemos o 
posicionamento de trabalhos que se aproximam tanto das abordagens 
individualistas quanto dos trabalhos estruturais de origem marxista. 
Na terceira parte, discutimos a abordagem do Institucionalismo Histórico, 
de forma a mostrar as ligações e semelhanças com os conjuntos de 
abordagens vistas anteriormente. Ao compararmos o Institucionalismo Histórico 
com as demais abordagens, relembramos, com base nas análises anteriores, 
31 
 
 
 
que ele não foi o único e nem o primeiro a tentar fazer uma síntese analítica 
entre as três dimensões de análise. 
Na quarta e última parte, por fim, buscamos fazer alguns apontamentos 
sobre o debate brasileiro de acordo com o que foi discutido nos itens 
anteriores, de forma a entender as possibilidades e os limites das abordagens 
mais recorrentes sobre o Poder Judiciário brasileiro, bem como as questões 
trazidas por novos trabalhos. 
Nas conclusões, por fim, recuperamos algumas considerações centrais 
feitas ao longo do capítulo, para mostrar que o desenvolvimento das diferentes 
abordagens analíticas se deu não apenas através de um jogo de oposições, 
mas também através de uma fluidez significativa de questões, pressupostos e 
metodologias, que acabam ofuscando a nitidez das linhas que separam as 
abordagens em quadros rígidos e fechados de análise e abrindo um campo 
grande de perguntas de pesquisa. 
 
1.2 – A dimensão individual: os interesses políticos dos atores 
Na Ciência Política norte-americana, as abordagens de cunho 
individualista são geralmente identificadas como behavioristas ou como 
abordagens que têm por unidade de análise os indivíduos ou grupos de 
indivíduos, cujas ações, comportamentos, interesses e valores particulares são 
os elementos que explicam o jogo político. Em outras palavras, são 
abordagens que procuram explicar a política através do comportamento ou da 
ação dos indivíduos, ação esta voltada para a realização de objetivos 
particulares. Para essas abordagens, as instituições, assim como as regras 
mais estruturais de uma sociedade, seriam basicamente reflexos sedimentados 
dessas preferências individuais em ação e em interação; e funcionariam 
auxiliando os indivíduos com informações ou previsões sobre como melhor agir 
para alcançar seus objetivos. 
Essa identificação das abordagens individualistas como behavioristas 
também é comum entre os estudos políticos norte-americanos sobre o Poder 
Judiciário, e isso se deve, em grande medida, à quebra teórica e metodológica 
32 
 
 
 
que o behaviorismo trouxe para o campo dos estudos judiciais (Pritchett, 1968; 
Smith, 1988; March e Olsen, 1989; Whittington, 2000; Maveety, 2003b; Segal, 
2003), dividindo-o em “estudos judiciais no Direito” (Public Law) e “estudos 
judiciais na Ciência Política” (estudos do Judicial Process). 
O behaviorismo representou um marco importante da “emancipação” da 
Ciência Política frente ao Direito. Se antes os cientistas políticos se 
encontravam de alguma forma dependentes do Direito e das categorias 
jurídicas e institucionais para analisar o Judiciário, aparecendo como meros 
“comentadores” de leis e de decisões judiciais, eles passam, agora, a constituir 
um campo próprio de estudos, construindo uma teoria e metodologia própria. A 
ideia central que se funda, portanto, com a emergência do “behaviorismo 
judicial”, particularmente através do Modelo Atitudinal e do Modelo Estratégico, 
é a ideia de análise “política” do Judiciário, análise esta que requer uma 
mudança radical de foco, métodose materiais empíricos de pesquisa 
(Schubert, 1963). 
A atuação do Judiciário e as decisões judiciais não podem mais ser 
explicadas com base nas regras e normas jurídicas, ou com base na ideia do 
legalismo jurídico de que os juízes são meros “aplicadores” das leis, neutros e 
apolíticos. Agora, a atuação do Judiciário e as decisões judiciais somente se 
explicam em função dos valores e das preferências políticas particulares dos 
juízes. O juiz passa a ser visto como um verdadeiro ator político, que tem na 
decisão judicial a sua possibilidade de ação política; ele não decide conforme 
as regras, mas conforme seus interesses políticos particulares (Schubert, 1963; 
Segal e Spaeth, 1993; Segal, 2003). As regras jurídicas só tem importância 
para a análise caso exerçam alguma influência sobre o comportamento dos 
juízes, que podem instrumentalizar tais regras de forma estratégica para atingir 
seus objetivos (Schubert, 1964, 1974b; Segal e Spaeth, 1993, 1996a, 1996b; 
Rohde, 1972a, 1972b; Rohde e Spaeth, 1976; Murphy, 1964; Epstein e Knight, 
1998). 
O que ocorre, assim, é uma mudança completa de foco, que sai da visão 
extremamente formal e institucional do Direito para uma visão individualista e 
comportamentalista da decisão judicial. Juntamente com a mudança de foco, 
33 
 
 
 
também se dá uma mudança no método e no material empírico de pesquisa. O 
cientista político não deve mais se voltar para uma análise descritiva do 
conteúdo das leis, códigos e constituições, limitando-se a comentar as 
diferentes interpretações que foram dadas pelos juízes em contextos políticos 
distintos. Agora, ele deve observar os votos que os juízes deram e suas 
frequências em uma massa de decisões, quantificando as vezes em que deram 
votos liberais e votos conservadores4. O importante é localizar o juiz no jogo 
político, verificar de que “lado” ele está, e mostrar, através de métodos 
quantitativos cada vez mais sofisticados5, que a atuação política do Judiciário 
deve ser entendida unicamente a partir do comportamento político dos juízes. 
Isso seria fazer uma análise “política” e “científica” do Judiciário, análise esta 
que configuraria o mainstream dos estudos judicias na Ciência Política norte-
americana. 
Nesse processo de construção de uma análise “política” do Judiciário ou 
de fortalecimento dos estudos judiciais em Ciência Política frente aos estudos 
judiciais no Direito, o Modelo Atitudinal e o Modelo Estratégico tiveram cada 
qual papéis importantes e, sob nosso ponto de vista, complementares. Se o 
Modelo Atitudinal foi o responsável por firmar a ideia do “juiz político”, que 
decide conforme seus valores e preferências políticas particulares, o Modelo 
Estratégico procurou resgatar para a análise behaviorista a importância de se 
olhar novamente para as normas e para as regras institucionais, de forma a 
enfatizar que os juízes podem atuar de forma estratégica frente a elas para 
alcançar seus objetivos particulares. Em seus desenvolvimentos mais recentes, 
inclusive, os trabalhos estratégicos (agora reconhecidos como do “Neo-
 
4
 Esses estudos produziram um grande conjunto de bases de dados estatísticas para 
demonstrar o caráter político da atuação dos juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos. 
Para exemplos, consultar Spaeth (1999a, 1999b) e Segal e Spaeth (2000). 
5
 Um das técnicas mais comumente utilizadas é a scalogram analysis, através da qual o 
estudioso pode dispor as atitudes individuais dos juízes (os votos) em uma escala unilear, 
acumulativa e contínua de valores, de forma a verificar a consistência dessas atitudes ao longo 
de diversas decisões. Trata-se de uma escala gradativa de valores, do extremo mais 
progressista ao extremo mais conservador, que permite verificar que um juiz vota sempre a 
favor daqueles valores que vão até o limite crítico de valores que os separam de outros. Essa 
técnica é importante na medida em que permite explicar as diferenças encontradas nos votos 
dos juízes de decisão para decisão, mostrando uma lógica maior por trás de votos que se 
diferenciam, mas que acabam caindo dentro um grupo único de valores. 
34 
 
 
 
Institucionalismo da Escolha Racional”) analisam o envolvimento de elites 
governamentais na formulação e na alteração das regras constitucionais e de 
funcionamento das instituições judiciais, mostrado o caráter político do próprio 
direito e as suas relações com o comportamento estratégico dos juízes e de 
outros atores políticos (Ginsburg, 2003; Helmke, 2004, Hirschl, 2004; Finkel, 
2008). 
A ideia de estratégia, contudo, não é exclusividade ou pioneira do 
Modelo Estratégico ou do Neo-Institucionalismo da Escolha Racional, muito 
embora o contrário seja propagado pela literatura6. Emprestada de teóricos da 
escolha racional ou de teorias econômicas da política (Downs, 1957; Riker, 
1962; Elster, 1986), a ideia de estratégia já se encontrava presente entre os 
primeiros trabalhos do Modelo Atitudinal, influenciando de forma significativa 
não apenas o desenvolvimento dos próprios trabalhos atitudinalistas7, como 
também o nascimento dos trabalhos estratégicos, alguns inclusive em parceria 
com os atitudinalistas8. A diferença entre uma abordagem e outra parece se 
dar muito mais no plano da “gradação” do que da “inovação”: enquanto entre 
os atitudinalistas a ideia de estratégia aparece de forma rarefeita e esparsa, 
para explicar casos em que a preferência política particular do juiz não se 
encontrava tão explícita na decisão judicial, entre os estratégicos, a ideia ganha 
estatuto de “conceito”, permitindo explicar tais “contra-casos” de forma mais 
sistemática. 
 
6
 Como mostram Epstein e Knight (2000), é em função da questão estratégica e da 
consideração de questões institucionais para a análise comportamental dos juízes que o 
Modelo Estratégico é geralmente entendido e se porta como um movimento revolucionário 
diante do Modelo Atitudinal. 
7
 Glendon Schubert (1964, 1974a, 1974b), considerado o pai fundador do Modelo Atitudinal, 
preocupava-se, assim como os estratégicos, com questões de caráter institucional, de forma a 
mostrar o comportamento estratégico dos juízes diante dessas questões. Para incorporar tais 
elementos à análise comportamental, Schubert procurou aperfeiçoar gradativamente os 
métodos quantitativos de pesquisa, de modo a considerar as regras e outros elementos de 
forma sistemática, quantificável e não mais de forma descritiva. 
8
 A semelhança entre o Modelo Atitudinal e o Modelo Estratégico são reconhecidas pelos 
próprios estudiosos estratégicos (Epstein e Knight, 2000), reconhecimento este que também 
pode ser visto nas parcerias de pesquisa e em publicações conjuntas desde o início do 
desenvolvimento dos trabalhos estratégicos (ver, por exemplo, Pritchett, Murphy e Epstein 
(2002 [1961]). 
35 
 
 
 
Tanto para os atitudinalistas quanto para os estratégicos, portanto, a 
ideia de estratégia se encontra presente, e, em ambas as ocasiões, para 
manter a análise com foco na dimensão individual ou na questão 
comportamental. O uso da ideia de estratégia lhes possibilitou considerar 
elementos institucionais, mas sem abandonar a dimensão individual de análise, 
que era o diferencial de seus trabalhos frente às pesquisas no Direito. Assim, 
não se trata de olhar para as regras e para as instituições de forma 
independente, mas sempre tendo como referência primeira o comportamento 
dos juízes. Por isso dizemos, portanto, que tanto o Modelo Atitudinal quanto o 
Modelo Estratégico ajudaram a estabelecer e a fortalecer a ideia padrão de 
análise “política” do Judiciário, diferenciando os estudos judiciais na Ciência 
Política dos estudos judicias no Direito. Seu olhar voltado para o 
comportamento individual, assim como sua metodologia quantitativa 
sofisticada, conformaram na CiênciaPolítica norte-americana um padrão 
“científico” a ser seguido e implementado. 
Contudo, podemos encontrar entre os próprios modelos behavioristas, 
trabalhos atitudinalistas e estratégicos que fogem a esse padrão e apresentam 
outras formas de se fazer uma análise política do Judiciário, alargando os 
limites de suas abordagens e dialogando com outras dimensões analíticas. 
Existem trabalhos atitudinalistas e estratégicos que dizem que, para 
entendermos a atuação política do Judiciário, não basta olharmos para os 
juízes, para os seus valores e comportamentos. É preciso também olhar para 
os aspectos institucionais e estruturais como elementos independentes das 
vontades e das estratégias individuais, e que cercam e limitam de fato a 
atuação do juiz. 
Entre esses trabalhos, encontramos estudos que defendem que a 
atuação política do Judiciário deve ser compreendida também a partir da 
função do juiz e do Judiciário dentro de um sistema ou “espírito” democrático 
(Pritchett, 19489; Howard, 1968). É preciso não apenas mostrar quais são os 
 
9
 Para alguns, o caráter multidimensional de Pritchett é visto como ambíguo e como um 
resquício da crise inicial (teórica e metodológica) que a Ciência Política enfrentou para se 
desvencilhar do Direito (Schubert, 1963; Maveety, 2003; Segal, 2003). Embora Pritchett seja 
36 
 
 
 
valores políticos que guiam o comportamento decisório dos juízes, mas 
também investigar como que se formam tais valores (Pritchett, 1948, 1968; 
Danelski, 1960). O juiz e o Judiciário, dentro de um sistema democrático, 
teriam funções políticas específicas, normativamente estabelecidas, no que as 
regras jurídicas poderiam sim formar e guiar seu comportamento. Assim, um 
juiz que decide intervir no Executivo ou no Legislativo em defesa dos direitos e 
das liberdades individuais pode resultar não diretamente de seus valores 
políticos particulares, mas antes da sua própria função dentro de um sistema 
constitucional democrático, cujas regras lhe dão independência e poder político 
para esse tipo de intervenção. 
Também encontramos trabalhos behavioristas que questionam a ligação 
direta que se faz entre os valores particulares dos juízes e as decisões 
judiciais, mostrando que a direção e a intensidade desse link mudam ao longo 
do tempo, especialmente em função de constrangimentos institucionais (Ulmer, 
1969, 1979b). São estudos que se voltam, por exemplo, para a análise das 
regras de funcionamento das cortes, de outros momentos do processo 
decisório (Ulmer, 1972, 1979a; Ulmer, Hintze e Kirklosky, 1972), das regras 
judiciais de acesso aos tribunais (Ulmer, 1978), e da pressão exercida por 
grupos e lideranças dentro da Corte sobre o comportamento dos juízes 
(Danelski, 1960; Ulmer, 1963). Tudo para mostrar que esse comportamento 
varia conforme questões outras que não somente os valores políticos 
particulares dos juízes10. 
Outros estudos behavioristas questionam um problema central dos 
atitudinalistas e estratégicos padrões, que é a separação que eles fazem entre 
“direito” e “política”. Passa-se a questionar se “decidir conforme as regras” é de 
fato diferente de “decidir conforme valores e interesses políticos”, observando-
 
reconhecido como o precursor do Modelo Atitudinal (Maveety, 2003), seu trabalho não é visto 
como o que de fato “quebrou” com o Legalismo Jurídico e seus pressupostos institucionais. 
10
 Ulmer reconhece a importância das abordagens tradicionais (institucionais) e se coloca mais 
numa posição de complementaridade do que de oposição a elas. Bradley (2003) cita, inclusive, 
uma passagem de um livro de Ulmer em que ele confirma essa ideia: “A abordagem 
behaviorista não substitui outras perspectivas, mas complementa o conhecimento que tem sido 
e continua a ser a marca de modelos analíticos mais tradicionais” (Ulmer, 1961: I apud Bradley, 
2003: 109). 
37 
 
 
 
se que as próprias regras ou que o próprio direito é um elemento político em si 
e não apenas uma roupagem que é estrategicamente utilizada ou 
instrumentalizada pelos juízes para alcançarem seus objetivos particulares. 
Alguns estudos mostram “a política no direito” ao enfatizarem a 
importância dos valores culturais e políticos de uma sociedade na formação 
não somente do comportamento dos juízes, como também das próprias regras 
de funcionamento das instituições judiciais. Encontramos, assim, preocupações 
com a questão da socialização judicial e com as experiências profissionais e 
políticas dos juízes, que estruturam e institucionalizam padrões de 
comportamento (Cook, 1971). Também encontramos análises sobre as 
relações entre os tribunais com a opinião pública e as expectativas culturais e 
sociais sobre o papel do juiz e do Judiciário (Cook, 1977, 1979). Vemos, ainda, 
trabalhos em que se demonstra a importância dos valores políticos, culturais e 
sociais de uma sociedade na formulação das regras de seleção dos juízes da 
Suprema Corte dos Estados Unidos11, mostrando que os valores manifestos 
nas decisões dos juízes podem ser culturalmente e institucionalmente 
selecionados (Cook, 1977, 1981, 1982, 1984). 
Vemos, assim, que são trabalhos que procuram mostrar que, embora 
haja uma relação entre valores políticos pessoais dos juízes e suas decisões, 
há muitas outras questões institucionais e estruturais anteriores e contínuas ao 
processo decisório que influem na efetivação dos valores pessoais dos juízes. 
Assim, existiria uma muldimensionalidade latente na atuação política do 
Judiciário, que deve ser estudada a partir de um entrelaçamento de questões 
individuais, institucionais e estruturais, de modo semelhante ao que apontam 
os estudos do Neo-institucionalismo histórico12. 
 
11
 Cook mostra o processo de aceitação da primeira mulher como juíza da Suprema Corte dos 
Estados Unidos. Segundo seus estudos, isso só foi possível quando a cultura política do país 
se alterou e passou a considerar plausível a presença de uma mulher na Suprema Corte. 
12
 Como apontou Epstein e Matther (2003: 186), o interesse de Beverly Blair Cook em 
diferentes dimensões da atuação política do Judiciário “moveu intelectualmente as barreiras do 
atitudinalismo, incorporando em uma explicação do ato de julgar as normas jurídicas e o 
contexto social, que são os mesmos fatores enfatizados pela abordagem alternativa do 
institucionalismo histórico ao estudo do comportamento judicial”. 
38 
 
 
 
Do ponto de vista metodológico, esses trabalhos behavioristas não-
padrões ajudam a quebrar com a ideia que se fundou com o Modelo Atitudinal 
de que uma análise “política” e “científica” do Judiciário requer obrigatoriamente 
um foco unidimensional sobre o juiz, juntamente com a aplicação de uma 
metodologia quantitativa sofisticada. Ainda que o uso desta metodologia não 
tenha sido descartada, e em alguns casos tenha sido estimulada e 
aperfeiçoada, o reconhecimento de outras dimensões analíticas e a utilização 
de metodologias qualitativas parece ser um traço comum entre esses 
estudos13. Eles vêm conquistando espaço e importância crescentes no 
mainstream dos estudos judiciais na Ciência Política norte-americana, dada a 
capacidade de mostrar os limites das análises políticas padrões e a 
possibilidade de inaugurar novas hipóteses, agendas de pesquisa, e até 
mesmo novas abordagens analíticas. 
Assim, se entre as abordagens individualistas puramente behavioristas 
nós podemos encontrar tantos trabalhos que fogem ao padrão, vejamos o que 
acontece entre as abordagens individualistas que não são behavioristas, ou 
que podemos chamar de “mais abrangentes”, como o Realismo Jurídico, a 
Jurisprudência Política e a Mobilizaçãodo direito. Através delas podemos 
encontrar trabalhos que tratam a relação entre política e direito não apenas 
pela chave da instrumentalidade (pressupondo a centralidade do juiz e a 
separação entre direito e política), mas também pelo seu caráter histórico e 
constitutivo, considerando cada vez mais a importância das dimensões 
institucionais e estruturais de análise para se entender a atuação politica dos 
juízes e do Judiciário como um todo. É a partir de seus trabalhos que podemos 
ver semelhanças e diálogos cada vez mais claros tanto com o Marxismo e com 
 
13
 Destaca-se, por exemplo, a capacidade dos métodos qualitativos como os estudos de caso 
de realizar uma espécie de “anatomia” do processo judicial, permitindo ver a existência de 
manipulações e constrangimentos de grupos de interesses sobre o juízes (Pritchett, 1968; 
Pritchett, Murphy e Epstein, 2002). Aponta-se também a importância das análises descritivas 
de Howard sobre os fluxos de litigação, agendas de julgamento, bem como das biografias e 
entrevistas de juízes como meios de se analisar a questão estratégica (Maveety e Maltese, 
2003). E, no extremo da desvinculação da pesquisa a uma metodologia pré-estabelecida, 
aponta-se, como fez Beverly Blair Cook, a importância de deixar o problema e o objeto de 
pesquisa ditar a metodologia necessária e não o contrário (Epstein e Matther, 2003). 
 
39 
 
 
 
os Critical Legal Studies, quanto com o Neo-institucionalismo Histórico e com o 
próprio Legalismo Jurídico. Ou seja, é a partir dessas abordagens 
individualistas mais abrangentes que podemos ver que as tentativas de 
“despolarização” ou de “des-unidimensionalização” (que vimos entre alguns 
atitudinalistas e estratégicos não-padrões) ganham ainda mais força. 
Não se pode negar que todas as três abordagens possuem trabalhos 
que insistem na unidimensionalidade e na chave da instrumentalidade (na 
importância das ações individuais dos juízes) para entender e explicar a 
atuação política do Judiciário. Contudo, todas as três abordagens são 
caracterizadas por uma marcante diversidade interna, que é onde se abrem e 
se mostram os avanços em direção a pesquisas multidimensionais e a um 
diálogo com abordagens de cunhos diferenciados. 
No Realismo Jurídico, foi onde a unidimensionalidade e a ideia de 
instrumentalidade se deu de forma mais ampla, ao passo que foi com o 
advento das análises realistas que se introduziu pela primeira vez (antes 
mesmo do surgimento do behaviorismo judicial em Ciência Política, com o 
Modelo Atitudinal) a dimensão individual no campo dos estudos judiciais, 
tomando o juiz como um ator político, que julga conforme seus interesses 
próprios e não conforme as regras e as leis (Holmes, 1897; Llewellyn, 1930). 
Contudo, alguns trabalhos realistas importantes não incorporam 
acriticamente a ideia de que as atitudes individuais dos juízes explicam por si 
as decisões judiciais e a atuação do Poder Judiciário. Argumenta-se que, por 
trás das atitudes e valores individuais, há a presença consciente ou 
inconsciente de uma ideologia dominante. Os interesses e os comportamentos 
individuais dos juízes refletem interesses e comportamentos dos grupos nos 
quais eles estão inseridos. Esses grupos, por sua vez, estão mergulhados em 
seus próprios interesses materiais e econômicos, que, por fim, influenciam no 
tempo e no espaço a formulação das leis e o funcionamento das instituições 
governamentais como um todo (Bentley, 2008 [1908]; Beard, 2006 [1938]). 
Dessa forma, questões de caráter estrutural se fazem igualmente necessárias 
para desvendar e entender a “realidade” que está por trás das decisões 
40 
 
 
 
judiciais14. Mantem-se uma certa relação de instrumentalidade e de importância 
das ações do indivíduo ou de um grupo de indivíduos, mas enfatiza-se 
questões estruturais, materiais e econômicas, e também ideológicas, como 
sendo os elementos que estão por trás das ações e das próprias regras 
jurídicas, formando-as e constituindo-as, no que “decidir conforme as regras” 
não se diferencia de “decidir conforme valores”. 
Na Jurisprudência Política, a ideia de instrumentalidade também 
aparece, na medida em que se colocam os interesses individuais ou das elites 
como as forças motoras que constroem, mantêm e transformam as regras e as 
instituições judiciais ao seu favor. O elemento da escolha ou da decisão dos 
indivíduos continua a ser um elemento central para o estudo político judicial 
(Shapiro, 1963)15. Contudo, não se pode esquecer que os estudos da 
Jurisprudência Política não surgiram em completa concordância com o 
behaviorismo judicial (Danelski, 1983; Stumpf, 1983), mas como uma 
alternativa entre o institucionalismo do Legalismo Jurídico e o individualismo do 
behaviorismo judicial16. 
Para os estudos da Jurisprudência Política, caberia uma dupla 
preocupação: em função do legado deixado pelo behaviorismo judicial, não se 
poderia mais seguir acreditando que os juízes eram meros “aplicadores” das 
 
14
 Fisher, Horwitz e Reed (1993), ao empreenderem o que chamam de uma “visão generosa” 
sobre o Realismo Jurídico, analisam a diversidade analítica presente na abordagem, 
mostrando seus diversos desdobramentos e suas diferentes formas de definir e entender o que 
é a “realidade” por trás das decisões judiciais. 
15
 Segundo Martin Shapiro (1963: 295), que cunhou o nome da abordagem (Political 
Jurisprudence), “a nova jurisprudência compartilha com todo o pensamento jurídico americano 
moderno [realistas e behavioristas] a premissa de que os juízes fazem mais do que 
simplesmente descobrir a lei. Sem essa premissa, não poderia existir nenhuma jurisprudência 
política, pois uma das preocupações centrais da política é o poder, e o poder implica na 
escolha. Se o juiz não tem nenhuma escolha entre alternativas, se ele simplesmente aplica as 
regras fornecidas pelas compilações jurídicas e chega a uma conclusão comandado por uma 
lógica jurídica inexorável, ele não seria de mais interesse político do que uma máquina da IBM 
que poderia substituí-lo em breve”. 
16
 Como descreve Stumpf (1983), a Jurisprudência Política sustenta uma visão de indivíduo 
distinta do behaviorismo judicial. Este último defende uma visão mais psicológica dos juízes, 
estudando-os como seres humanos, e relacionando seus comportamentos a um corpo teórico 
mais geral sobre o comportamento humano em momentos de escolha ou de decisão. A 
Jurisprudência Política, por sua vez, sustenta uma visão mais sociológica de indivíduo, 
pensando-o mais enquanto integrante de determinados grupos inseridos em instituições 
políticas, que, por sua vez, estão inseridas num determinado sistema governamental. 
41 
 
 
 
regras jurídicas; contudo, as análises políticas também não poderiam mais 
seguir fazendo economia de conceitos jurídicos (Shapiro, 1963). Seria preciso 
pensar nos elementos que ocupam o espaço existente entre esses dois pólos 
de explicação, de forma a entender e a ver a política não somente no 
comportamento dos juízes, mas na própria história de criação, manutenção e 
transformação das regras e das instituições jurídicas, vendo-as também como 
agências políticas governamentais (Shapiro, 1986). 
Em função dessa dupla preocupação, a Jurisprudência Política pode ser 
vista e entendida a partir de diferentes perspectivas, denotando a 
multidimensionalidade presente em seus estudos. Alguns a vêem como uma 
abordagem behaviorista por manter a centralidade e a importância das 
escolhas individuais (Smith, 1988); outros a vêem como uma abordagem 
funcionalista, dada a ênfase que seus estudos dão ao caráter funcional das 
regras e instituições judiciais para determinados grupos políticos (McCann, 
2010); e outros, por fim, a vêem como uma clara abordagem institucionalista e 
precursora do Institucionalismo Histórico, dada

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