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Parasitologia UNIDADE 4 1 PARASITOLOGIA UNIDADE IV PALAVRAS DO PROfESSOR Olá como vão os estudos? Estamos chegando ao final da nossa disciplina de Parasitologia, está sendo um prazer colaborar com o seu aprendizado. Ao longo das nossas unidades, que já foram estudadas, seu comprometimento foi essencial e conto com sua participação em nossa IV unidade. Gostaria de lembrar a importância da leitura de seu livro-texto. Não deixe de acessar o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e responder às atividades e aos fóruns avaliativos. É uma excelente maneira de colocar em prática seu aprendizado. Surgindo dúvida pergunte ao seu tutor! PARA INIcIO DE cONVERSA Olá, prezado (a) aluno (a), inicialmente, você viu os conceitos relacionados aos principais protozoários de interesse médico e, na Unidade III, iniciamos o estudo das doenças causadas por helmintos (vermes). Você observou que os platyhelminthes são os representantes mais inferiores dos helmintos, os quais se caracterizam por apresentarem simetria bilateral, uma extremidade anterior com órgãos sensitivos e de fixação e uma extremidade posterior. Também não possuem sexo ou endoesqueleto, são achatados dorsoventralmente, sem celoma, com ou sem tubo digestivo, sem ânus, sem aparelho respiratório e sistema excretor. Seus representantes estão distribuídos em três classes (Turbellaria, Trematoda e Cestoda). Está preparado (a) ? Espero que sim! Vamos lá! A ESQUISTOSSOMOSE A partir de agora, estudaremos uma enfermidade negligenciada endêmica na região Nordeste, mais especificamente no estado de Pernambuco: A esquistossomose. O agente etiológico desta doença é o verme Schistosoma mansoni, pertencente à classe Trematoda (trematódeos). 2 A esquistossomose apresenta impacto em vários lugares do mundo, sendo mais comum em populações socialmente vulneráveis que vivem em locais com saneamento básico precário. As crianças que vivem nessas áreas de risco são os indivíduos mais afetados pela esquistossomose, principalmente pelo hábito de nadarem ou tomarem banho em águas contaminadas com o parasito. Entretanto, não esqueça que todas as pessoas expostas à agua contaminada por esse helminto podem contrair a esquistossomose (Figura 1). Você deve estar se perguntando como esse fato pode estar relacionado com a parasitose em questão. Bem, ao longo do texto você passará a entender como isso é possível. Vamos conhecer mais sobre essa enfermidade? Figura 1: Adultos e crianças em contato com água contaminada com o verme. (Fonte: Adaptado- http://www2.unifesp.br/dmed/gastro/pee/05.htm). A esquistossomose também está inserida na lista de doenças negligenciadas, assim como a doença de Chagas e as leishmanioses. VEjA O VíDEO Acesse o vídeo para compreender melhor esse contexto, com duração de 13 minutos. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a esquistossomose é a segunda doença parasitária mais devastadora do mundo. O Brasil é considerado um dos maiores focos endêmicos, onde cerca de seis a oito milhões de pessoas estão contaminadas e 30 milhões vivem em áreas de risco de contrair a infecção. O Ministério da Saúde registrou mais de 63 mil casos dessa enfermidade no Brasil no ano de 2011. O clima do país fornece as condições necessárias para a propagação da doença, existindo focos de elevada endemicidade em Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais. http://www2.unifesp.br/dmed/gastro/pee/05.htm https://www.youtube.com/watch?v=d-pEGQANTtA 3 Na África e na América do Sul, a espécie predominante é Schistosoma mansoni, responsável por uma doença intestinal. Além dessa espécie, existem outras que são agentes etiológicos da esquistossomose humana, incluindo Schistosoma haematobium (também na África), Schistosoma japonicum (Ásia), entre outros. O S.mansoni será o alvo da nossa aula, vez que é a espécie endêmica no Brasil. O helminto S.mansoni é um parasito de ciclo heteroxênico, possuindo um hospedeiro definitivo (o homem) e um hospedeiro intermediário (o caramujo). Por isso, a esquistossomose também é conhecida popularmente como doença do caramujo. Os moluscos do gênero Biomphalaria são os hospedeiros intermediário do S.mansoni. As espécies desses vetores encontradas no Brasil são: • Biomphalaria glabrata; • Biomphalaria tenagophila; • Biomphalaria straminea. Morfologia Parasitos do gênero Schistosoma apresentam fases evolutivas com um nítido dimorfismo sexual nos dois tipos de hospedeiros. A morfologia da espécie S. mansoni deve ser estudada abordando os vários estágios encontrados em seu ciclo biológico: verme adulto (macho e fêmea), ovo, miracídio, esporocisto e cercária. Iniciaremos com os vermes adultos e depois descreveremos as fases larvárias. Lembre-se que é fundamental conhecer cada forma morfológica para compreender o ciclo biológico de S. mansoni mais adiante. Macho O macho mede cerca de 1 cm de comprimento, apresenta uma coloração esbranquiçada e tegumento recoberto por minúsculas projeções, denominadas tubérculos. Em sua porção anterior apresenta as ventosas oral e ventral (acetábulo) e na porção posterior encontra-se o canal ginecóforo (dobras laterais de seu corpo para albergar a fêmea e fecundá-la). Além disso, esse parasito possui um esôfago bifurcado ao nível do acetábulo, ceco terminando na extremidade posterior e massas testiculares que se abrem no canal ginecóforo (Figura 2 e 3). fêmea A fêmea de S. mansoni mede 1,5 cm de comprimento, apresenta cor mais escura e tegumento liso. Sua porção anterior possui as ventosas oral e ventral, assim como o macho, e a metade posterior é preenchida pelas glândulas vitelogênicas (responsáveis pela maturação dos ovos) e ceco. Além disso, a fêmea apresenta vulva, útero e ovário. Observe nas figuras 2 e 3 que assim como os demais helmintos, a fêmea é maior do que o macho. 4 Figura 2: Representação esquemática de um casal adulto de Schistosoma mansoni. (Fonte: http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1942.htm). Figura 3: Macho e fêmea adultos de Schistosoma mansoni visualizados por microscopia óptica. (Fonte: http://www.microbiologybook.org/Portuguese/para-port-chapter6.htm). Os vermes adultos habitam o sistema porta hepático do homem, podendo ser encontrados em outras localizações, como pulmões, baço, pâncreas e bexiga. Além disso, podem sobreviver de três a cinco anos no organismo, chegando até 25 anos. Esses vermes possuem um tubo digestivo que se comunica com o exterior através da boca (não possui ânus) e não tem aparelho circulatório. A nutrição é realizada através do sangue do hospedeiro e os produtos não aproveitáveis na digestão são eliminados pela boca. Ovos O ovo de S. mansoni tem formato oval e mede cerca de 150 μm de comprimento por 60 μm de largura. Na parte mais larga apresenta um espículo voltado para trás. Esse ovo possui uma casca dupla resistente, onde sua casca interna envolve o embrião (miracídio- veremos essa forma evolutiva a seguir). O ovo maduro possui o miracídio formado, visível pela transparência da casca (Figura 4). http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1942.htm http://www.microbiologybook.org/Portuguese/para-port-chapter6.htm 5 A fêmea elimina um ovo por vez e cerca de 300 ovos por dia que são liberados com as fezes como ovos imaturos. Nas fezes formadas, esses ovos sobrevivem cerca de 5 dias e apenas um dia em fezes diarréicas. Quando as fezes são lançadas na água, ou quando os ovos são arrastados para água, sua eclosão ocorre rapidamente. Figura 4: Ovo de Schistosoma mansoni com espícula lateral presente na região mais dilatada. Material de sedimento fecal corado com lugol. (Fonte: http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos). Miracídio O miracídio são larvas de forma cilíndrica com dimensões médias de 180 μm de comprimento por 64 μm de largura. Apresenta células epidérmicas, onde se implantam os cílios, os quais permitem o movimento no meio aquático. Na extremidade anterior apresenta as glândulasde penetração, importantes no processo de penetração no molusco vetor e as terminações nervosas, com funções tácteis e sensoriais (Figura 5). Os miracídios nadam ativamente à procura dos caramujos e morrem em aproximadamente oito horas se não os encontrar. Apenas os miracídios que encontram os hospedeiros intermediários, as espécies suscetíveis de Biomphalaria, penetram pelas partes moles e irão se desenvolver. O tempo total de penetração é de 10 a 15 minutos. No molusco, o miracídio, perde os cílios e transforma-se em esporocistos . Veremos adiante! Figura 5: Miracídio de Schistosoma mansoni. (Fonte: http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1943.htm). Esporocistos e cercária Os esporocistos são estruturas em forma de saco com paredes cuticulares, que contém, em seu interior, células germinativas ou reprodutivas em multiplicação, denominadas de esporocisto primário que por http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1943.htm 6 poliembrionia origina esporocistos secundários. Em seguida, essa estrutura se rompe e libera esporocistos- filhos que amadurecem, dando origem a numerosas larvas – cercárias – por reprodução assexuada. Um único miracídio pode originar cerca de 100.000 cercárias. As cercárias têm comprimento total de 500 μm, sendo formada por um corpo cercariano e uma cauda que se bifurca na parte terminal (Figura 6). Apresentam duas ventosas: a oral, que possui as terminações das glândulas de penetração e a ventral, que serve para fixação da cercária na pele do hospedeiro no momento da penetração. As cercárias podem viver de 48 horas até 3 dias na água. Figura 6: Cercária de Schistosoma mansoni. (Fonte: http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1943.htm). ciclo Biológico e Transmissão O S. mansoni apresenta um complexo ciclo biológico, com interação adaptativa entre parasito, hospedeiros e o ambiente natural onde o ciclo ocorre. O ciclo é formado por duas fases parasitárias: uma no hospedeiro definitivo (vertebrado/homem) e outra no hospedeiro intermediário (invertebrado/caramujo). Além disso, existem duas passagens de larvas de vida livre no meio aquático que se alternam com as fases parasitárias. Observe atentamente a representação esquemática do ciclo biológico do S. mansoni na figura 7: http://interna.coceducacao.com.br/ebook/pages/1943.htm 7 Figura 7: Ciclo biológico da esquistossomose. (Fonte: Adaptado do CDC- http://www.cdc.gov/parasites/schistosomiasis/biology.html). No indivíduo infectado, os ovos de S. mansoni são liberados junto com as fezes, vivendo cerca de 24 horas em fezes diarreicas e cinco dias em fezes sólidas. Quando alcançam a água, os ovos eclodem e liberam o miracídio, estimulado por temperaturas mais altas, luz intensa e oxigenação da água. A capacidade de penetração do miracídio no caramujo dura aproximadamente oito horas após a eclosão, sendo influenciada pela temperatura do ambiente. A combinação dos intensos movimentos contráteis e rotatórios do miracídio, juntamente com a ação de enzimas proteolíticas liberadas pelas glândulas de penetração, permite a entrada da larva nos tecidos do molusco. O local de penetração pode ser representado por qualquer ponto das partes expostas do caramujo. Observe que o miracídio é a forma infectante do hospedeiro intermediário. O miracídio penetra pelo epitélio do caramujo e se estabelece em seu tecido subcutâneo. Após a perda das glândulas de adesão e penetração, a larva continua a perder suas estruturas no processo de penetração, transformando-se em esporocisto com as células germinativas. Nos tecidos do molusco, as células germinativas iniciam um processo de intensa multiplicação http://www.cdc.gov/parasites/schistosomiasis/biology.html 8 (poliembrionia), fazendo com que o esporocisto primário dobre de tamanho e sofra diferenciações, gerando vários esporocistos secundários. Por sua vez, os esporocistos secundários originam as cercárias, as quais emergem para o meio externo através da formação de vesículas no epitélio do caramujo. A emergência das cercárias é influenciada por estímulos do ambiente como luz e temperatura. A formação completa da cercária, até a sua saída para o meio aquático, pode ocorrer num período de 27 a 30 dias, em condições ideais de temperatura (cerca de 28ºC). Um único miracídio pode gerar de 100 a 300.000 cercárias, onde cada uma dessas larvas já tem o sexo definido. A sobrevivência das cercárias na água é cerca de dois dias, pois muitas delas morrendo após algumas horas de sua libertação do hospedeiro intermediário. Ao ficarem livres na água, nadam ativamente até serem atraídas por um hospedeiro definitivo, que nem sempre será o homem (podem penetrar em mamíferos, aves e outros). A maior atividade e capacidade infectiva das cercárias ocorre nas primeiras oito horas de vida. As cercárias nadam ativamente na água e ao alcançarem a pele do homem, fixam-se entre os folículos pilosos com auxílio de suas duas ventosas e são capazes de penetrar na pele e nas mucosas por ação lítica, do conteúdo das glândulas de penetração, e ação mecânica, através de movimentos vibratórios intensos. Inicialmente, ocorre a penetração do corpo cercariano e a perda da cauda, fazendo com que as cercárias alcancem a corrente sanguínea em 2 a 15 minutos. Esse processo leva à irritação da pele, conhecida popularmente como dermatite cercariana. Falaremos disso ao longo do texto. Prezado (a) aluno (a), observe que o ciclo biológico está totalmente relacionado com a forma de transmissão do parasito. As pessoas se infectam pelo contato com águas contaminadas durante suas atividades diárias, onde ocorre a penetração ativa das cercárias na pele e mucosa. As cercárias penetram, frequentemente, nos pés e nas pernas por serem áreas do corpo que mais ficam expostas às águas contaminadas. O horário em que são vistas em maior quantidade na água e com maior atividade é entre 10 e 16 horas, quando a luz solar e o calor são intensos. Adicionalmente, pode haver a penetração na mucosa, quando água infectada é ingerida. As cercárias ingeridas com água são destruídas quando chegam ao estômago e as que penetram na mucosa bucal desenvolvem-se normalmente. Entretanto, essa forma de contágio é muito menos significativa. Os locais onde se dá a transmissão mais frequente são os focos peridomiciliares: valas de irrigação, açudes e córregos, entre outros. Bem, a partir de agora, abordaremos a continuidade do ciclo que ocorre dentro do hospedeiro definitivo. Após a penetração das cercárias, as larvas resultantes, denominadas esquistossômulos, migram pelo tecido subcutâneo e, ao penetrarem nos vasos, são levadas passivamente da pele até os pulmões, passando pelo coração direito. Os esquistossômulos se dirigem para o sistema porta, podendo usar duas vias para realizar este percurso: uma via sanguínea e uma transtissular, isto é, uma migração através dos tecidos, após a perfuração do parênquima pulmonar. Uma vez no sistema porta hepático, os esquistossômulos se transformam em machos e fêmeas, 30 dias após a penetração. Em seguida, migram acasalados para a veia mesentérica inferior, onde será feita a postura dos ovos pela fêmea. A migração dos ovos para a luz intestinal processa-se num período mínimo de seis dias, tempo necessário para a maturação do ovo. Após vinte dias, se os ovos que não conseguirem 9 atingir a luz intestinal, ocorrerá a morte dos miracídios. Os ovos que chegam à luz intestinal são eliminados junto com o bolo fecal. Patogenia A partir de agora, observe atentamente as características relacionadas à patogenia da esquistossomose que está ligada a vários fatores, tais como a idade e o estado nutricional do indivíduo, a cepa do parasito, a carga parasitária adquirida e resposta imune. Entretanto, os dois últimos parecem ser os mais importantes. Sabe-se também que as alterações cutâneas e hepáticas são grandemente influenciadas pela resposta imune dopaciente frente aos antígenos dos esquistossômulos e dos ovos. As lesões observadas no organismo variam de acordo com a fase evolutiva do parasito. Os determinantes de maior importância no desenvolvimento das alterações patológicas são a liberação de antígenos dos vermes nas diferentes formas evolutivas; a formação de imunocomplexos a partir dos antígenos liberados; a reação inflamatória ao parasito, com formação de granuloma em vários tecidos e a fibrose (no intestino e no fígado, principalmente). Você pode estar se perguntando o que é um granuloma? Bem, a esquistossomose é uma doença decorrente da resposta inflamatória gerada em torno dos ovos vivos do parasito, os quais liberam seus antígenos solúveis. Esses antígenos sensibilizam nossas células de defesa, resultando em uma resposta imune celular e na formação do granuloma. Ao redor dos ovos de S. mansoni há um acúmulo de linfócitos, macrófagos, entre outras células, formando um halo linfocitário. Além disso, fibroblastos estão presentes na periferia desse halo, em arranjo concêntrico, formando uma cápsula que corresponde a estrutura do granuloma. Observe a figura 8 abaixo: Figura 8: Reação granulomatosa em torno do ovo de S. mansoni. (Fonte: Adapatado de http://journal.frontiersin.org/article/10.3389/fimmu.2013.00089/full). É frequente nos granulomas o encontro de cascas de ovo fagocitadas por grandes macrófagos e, mais raramente, são observados ovos intactos ou restos de vermes. S. mansoni também provoca uma reação de hipersensibilidade no organismo, atraindo eosinófilos. Os eosinófilos são as células inflamatórias mais relacionadas à defesa contra parasitos e é comum que em pacientes portadores de helmintíases intestinais exista eosinofilia (aumento do número dos eosinófilos no sangue). http://journal.frontiersin.org/article/10.3389/fimmu.2013.00089/full 10 Na fase aguda da infecção, a reação granulomatosa é exacerbada, e na fase crônica atinge dimensões menores. Tais lesões granulomatosas são as principais responsáveis pelas variações clínicas e complicações digestivas e circulatórias vistas na esquistossomose. Aspectos clínicos da esquistossomose Os sintomas da esquistossomose são causados pela reação do nosso sistema imune aos ovos produzidos pelos vermes adultos e podem ser classificados como agudo ou crônicos. Observe a seguir: Esquistossomose aguda Poucos dias após a infecção, podem aparecer sintomas cutâneas, correspondendo a dermatite cercariana, citada anteriormente no nosso texto. A dermatite corresponde à penetração das cercárias através da pele, apresentando-se como erupção papular, eritema, edema e prurido, podendo durar até 05 dias após a infecção (Figura 9). Figura 9: Dermatite cercariana causada pelas cercárias de S. mansoni: coceira e vermelhidão no local onde o verme penetra. (Fonte: http://www.mdsaude.com/2011/11/esquistossomose-sintomas.html) A esquistossomose aguda ocorre após três a sete semanas de exposição. Essa doença se caracteriza por febre, anorexia, dor abdominal e cefaleia. O paciente também pode apresentar diarreia, náuseas, vômitos e tosse seca. Durante o exame físico, pode-se detectar a hepatoesplenomegalia, ou seja, o aumento do fígado e do baço. Esquistossomose crônica A doença começa a se cronificar a partir dos seis meses após a infecção, podendo evoluir por muitos anos. Essa forma pode apresentar grandes variações clínicas, dependendo de serem as alterações predominantemente intestinais, hepatointestinais ou hepatoesplênicas e com níveis extremos de gravidade. As manifestações clínicas também variam de acordo com a intensidade da carga parasitária. A forma intestinal e hepatointestinal apresentam sintomatologia bastante semelhante, sendo diferenciadas basicamente pela ausência de crescimento do fígado na forma puramente intestinal. Por outro lado, a http://www.mdsaude.com/2011/11/esquistossomose-sintomas.html 11 forma hepatointestinal caracteriza-se pela presença de granulomas dispersos no parênquima hepático ou nos espaços porta, no intestino, duodeno e até no reto. As manifestações clínicas são intestinais, como disenteria, dor abdominal e tenesmo retal. A forma hepatoesplênica é a de maior importância clínica, devido a maior morbimortalidade. Nessa enfermidade, há presença de hepatoesplenomegalia (Figura 10), podendo apresentar-se na forma compensada (sem comprometimento da função hepática) ou descompensada (com falência hepatocelular). Além disso, nessa forma de esquistossomose surge um quadro de fibrose periportal, resultante da resposta granulomatosa. Observa-se também uma retração da cápsula hepática em numerosos pontos, o que provoca a formação de saliências no fígado. Com o avanço do quadro de fibrose, ocorre uma gradual perda da capacidade contrátil dos vasos portais intra-hepáticos causada pela destruição da parte elástica destes, levando a um aumento da pressão e queda da velocidade da circulação do sistema porta, surgindo a hipertensão portal. Na forma hepatoesplênica, as manifestações clínicas são decorrentes da hipertensão portal e as principais complicações são a ascite e a formação de varizes gastresofágicas, as quais geram, por seu rompimento, graves hemorragias digestivas, muitas vezes fatais. Essas manifestações também podem ser visualizadas na figura 10. Figura 10: Forma hepatoesplênica da esquistossomose e varizes esofagianas. (Fonte: adaptado- https://saudefloripa33pj.wordpress.com e http://www2.unifesp.br). Diagnóstico A esquistossomose é uma infecção de difícil diagnóstico clínico, sobretudo em áreas não endêmicas. Os exames laboratoriais e a avaliação por métodos complementares são essenciais para a detecção do comprometimento orgânico causado pelo S. mansoni. O diagnóstico laboratorial pode ser realizado através do exame parasitológico de fezes que permite a visualização e contagem dos ovos por grama de fezes, fornecendo um indicador da intensidade da infecção. Além disso, testes moleculares e testes sorológicos possuem sensibilidade ou especificidade suficiente, sendo úteis em áreas de baixa prevalência da doença, em pacientes com baixa parasitemia e/ ou imunodeprimidos. Entretanto, esses métodos não estão disponíveis na rotina clínica. https://saudefloripa33pj.wordpress.com http://www2.unifesp.br 12 Entre os métodos complementares, a ultrassonografia hepática é de auxílio no diagnóstico da fibrose. A biópsia retal ou hepática, apesar de não indicada para utilização na rotina, pode ser útil em casos suspeitos, na presença de exame parasitológico de fezes negativo. Tratamento e profilaxia A importância do tratamento da esquistossomose não está só no fato de curar a doença ou diminuir a carga parasitária dos pacientes, mas também de impedir sua evolução para formas graves. Existem duas drogas disponíveis: oxamniquina e praziquantel. Os dois medicamentos atuam diretamente contra o verme adulto, e se equivalem quanto à eficácia e segurança. Atualmente, o praziquantel é a droga de escolha, em função do menor custo no tratamento. Entretanto, não esqueça que essa droga é mais ativa apenas nos parasitos adultos e esse fato está relacionado com as baixas taxas de cura, já que os pacientes são propensos a abrigar parasitos juvenis e adultos ao mesmo tempo. A escolha da terapêutica depende da fase em que se encontra a infecção, variando desde anti- histamínicos locais e corticosteroides tópicos na fase aguda, ao uso de praziquantel e oxamniquina na fase crônica. Todo caso confirmado deve ser tratado, a não ser que haja contraindicação médica, como no caso de crianças menores de 2 anos, pacientes maiores de 70 anos, gestantes e mulheres em fase de amamentação, entre outros. Os efeitos colaterais causados pelo tratamento incluem tonturas, náuseas, vômitos, cefaleia e sonolência. Esses efeitos são comuns aos dois medicamentos, sendo a tontura mais frequente com oxamniquina e náuseas e vômitos com praziquantel. Além disso, é importante destacar que a quimioterapiatambém reduz a hepatoesplenomegalia previamente instalada. Uma vez desenvolvidos estágios tardios da fibrose periportal e das varizes esofágicas, a quimioterapia de escolha não será eficaz para reverter as complicações da doença e, nesses casos, o tratamento com propranolol e/ou procedimentos cirúrgicos são necessários. A principal forma de minimizar o impacto da esquistossomose é sua profilaxia e controle com medidas referentes a vários âmbitos da saúde pública. As ações de saneamento ambiental são as mais eficientes para modificar permanentemente as condições de transmissão da esquistossomose. Tais medidas evitam a eliminação inadequada dos dejetos e, dessa forma, impedem a propagação da endemia por meio de esgotos a céu aberto, córregos e rios poluídos. Além disso, a educação em saúde da população que vive em áreas endêmicas também é fundamental. 13 VISITE A PáGINA Caso você tenha interesse em aumentar seus conhecimentos sobre a esquistossomose, sugiro que você leia as publicações científicas abaixo. Você sempre deve se atualizar! Os textos estão no idioma português e disponíveis nos seguintes links: • Esquistossomose mansônica: Aspectos gerais, imunologia, patogênese e história natural. Disponível no link. • Esquistossomose mansônica: Diagnóstico, tratamento, epidemiologia, profilaxia e controle. Disponível no link. Boa leitura! AScARIS LUMBRIcOIDES A partir de agora, iremos abordar uma parasitose que apresenta importância mundial, a ascaridíase. Em seguida, estudaremos outra enfermidade negligenciada endêmica no estado de Pernambuco: a filariose. Essas parasitoses são causadas por vermes classificados como nematelmintos. Como vimos inicialmente na unidade II, os helmintos são divididos em dois filos: os platelmintos e os nematelmintos. Estes últimos são vermes cilíndricos e filamentares (nemato = “filamento”; helmintos = “verme”). O parasito Ascaris lumbricoides é um nematelminto, conhecido popularmente como “lombriga” ou apenas chamado de áscaris. Esse verme é considerado um geohelminto, uma vez que parte do seu ciclo evolutivo pode ocorrer no solo (fonte de infecção, podendo contar as larvas ou os ovos dos vermes). Em geral, os nematelmintos são geohelmintos. PALAVRAS DO PROfESSOR Agora, preste atenção ao longo do texto, pois iremos conhecer um pouco mais sobre esse parasito. A. lumbricoides é o agente etiológico da ascaridíase e infecta cerca de um milhão de pessoas no mundo, sendo mais comum nos países em desenvolvimento. A ascaridíase na maioria dos casos é uma infecção leve e benigna, mas que pode ocasionar graves complicações para o hospedeiro (especialmente em crianças), como interferência no seu estado nutricional e no desenvolvimento físico e mental. http://files.bvs.br/upload/S/1679-1010/2011/v9n4/a2190 http://files.bvs.br/upload/S/1679-1010/2012/v10n1/a2676 14 Morfologia O nematelminto A. lumbricoides apresenta diferentes formas evolutivas: os vermes adultos (macho e fêmea) e o ovo. A partir de agora, iremos conhecer cada um desses estágios evolutivos. O verme adulto de áscaris é considerado o maior nematódeo, medindo entre 25 a 35 cm (fêmea) e 15 a 30 cm (macho) de comprimento, e entre dois a cinco milímetros de diâmetro. É importante destacar que o tamanho dos exemplares de A. lumbricoides depende do número de parasitos albergados e do estado nutricional do hospedeiro. Assim, segundo o autor Neves (2011), as dimensões dadas para machos e fêmeas referem-se a helmintos recolhidos de crianças com baixas cargas parasitárias e bem nutridas. Esses vermes possuem um corpo longo, cilíndrico e afilado nas pontas, sendo facilmente reconhecidos. A extremidade posterior da fêmea é retilínea e do macho curvilínea. Além disso, são recobertos por uma cutícula de aspecto brilhante e com coloração rósea-amarelada/esbranquiçada. Observe a figura 11. Figura 11: Ascaris lumbricoides. Espécime fêmea e macho adultos de cor rósea-esbranquiçada conservados em formol. Observe que o macho é caracterizado pela extremidade curvada semelhante a um cabo de guarda-chuva (Fonte: http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos). Se você pudesse observar um áscaris internamente, seria possível observar que esse verme apresenta simetria bilateral e são triblásticos. Isto quer dizer que esse helminto possui os três folhetos germinativos (ectoderme, mesoderme e endoderme). Uma característica marcante dos nematelmintos é a presença do pseudoceloma, uma cavidade entre a mesoderme e a endoderme, preenchida pelo líquido celomático, responsável pelo equilíbrio hidrostático e movimentos, envolvendo os órgãos nele contidos (tubo digestivo e órgãos genitais). (Figura 12) Figura 12: Corte de Ascaris lumbricoides evidenciado os folhetos germinativos e o pseudoceloma. (Fonte: http://www.coladaweb.com/biologia/reinos/nematelmintos). http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos http://www.coladaweb.com/biologia/reinos/nematelmintos 15 PALAVRAS DO PROfESSOR Gostaria de realizar alguns comentários gerais a respeito do organismo dos nematelmintos (incluindo A. lumbricoides e filarídeos como Wuchereria bancrofti). Esses helmintos não possuem sistema circulatório ou vascular. No pseudoceloma existe a oxihemoglobina, contendo substâncias nutritivas e também resíduos metabólicos, sendo movimentada pelas contraturas do corpo do verme. O sistema nervoso é formado por um cérebro contendo gânglios nervosos interligados. Existem também papilas que funcionam como órgãos sensoriais. A excreção é feita através do aparelho excretor. A reprodução e o processo de atingir os hospedeiros é muito diverso nos nematoides. A. lumbricoides é um nematelminto dioico (sexos separados). O sistema genital masculino é diferenciado em testículo, canal deferente, vesícula seminal e canal ejaculador, abrindo-se na cloaca. O aparelho genital feminino é constituído de ovário, útero, vagina e vulva, que podem variar em forma, disposição e número. Entre o útero e a vagina pode-se distinguir uma estrutura denominada ovojector que regula a passagem dos ovos. Os espermatozoides fecundam os ovócitos em sua passagem pelo útero, onde se completa a formação do ovo, envolvidos por três membranas. Em alguns nematoides, como A. lumbricoides, o embrião se desenvolve dentro do ovo no meio exterior. Em filarídeos como a Wuchereria, o ovo tem desenvolvimento semelhante, porém a casca é mole, chamada de bainha como veremos mais adiante nesta unidade. Para fixar, observe abaixo as principais características fisiológicas de A. lumbricoides: • Sistema digestório completo com boca e ânus; • Não possuem sistema respiratório, realizando respiração cutânea; • Não possuem sistema circulatório; • As células intestinais absorvem e distribuem os nutrientes através do liquido do pseudoceloma; • Excreção através dos canais excretores e do poro excretor. Os ovos de áscaris possuem coloração esbranquiçada e adquirem cor castanha devido ao contato com as fezes (Figura 13). Possuem morfologia ovalada, são grandes e medem cerca de 50 µm de diâmetro. Uma das características marcantes desses ovos é a cápsula espessa com uma membrana externa mamilonada, formada por mucopolissacarídeos. Existem também uma membrana média de quitina e proteínas, e outra mais interna, delgada e impermeável à água constituída de 25% de proteínas e 75% de lipídios. Assim, percebemos que os ovos de áscaris são bastante resistentes às condições adversas do ambiente. Internamente, os ovos apresentam uma massa de células germinativas. Também é possível encontramos ovos inférteis nas fezes. Estes mais alongados, possuem membrana mamilonada mais delgada e o citoplasma granuloso. Algumas vezes, os ovos férteis (com estádios larvários em seu interior) podem apresentar-se sem a membrana mamilonada (Figura 14). 16 Figura 13: Ovo fértil apresentando três membranas – interna (lipídica), mediana (casca) e externa (albuminóide, morfologia mamilonada).Presença de massa germinativa ao centro. Material de sedimento fecal corado com lugol. (Fonte: http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos). Figura 14: Ovos de Ascaris lumbricoides fértil não embrionado, fértil embrionados e infértil. (Fonte: http://segundocientista.blogspot.com.br/2015/05/nematoides.html). GUARDE ESSA IDEIA Antes de estudarmos o ciclo biológico de A. lumbricoides, gostaria de destacar algumas características gerais de ovos e larvas dos nematelmintos. Durante o desenvolvimento pós-embrionário, o nematoide passa por cinco estádios larvários e na passagem de um estádio para o outro, ocorre uma troca de cutícula. O embrião que se forma no ovo é uma larva de primeiro estádio ou L1 e para completar o ciclo pode fazê-lo direta ou indiretamente, ou seja, através de um ciclo monoxênico ou heteroxenico. No estádio de larva infectante ou L3 (terceiro estádio), deve existir a infecção do hospedeiro definitivo de acordo com cada ciclo biológico. Em Wuchereria, as larvas L1 liberadas pelas fêmeas são conhecidas como microfilárias e podem ser encontradas no sangue circulante. Entre esses parasitos, para a continuidade do ciclo, é necessária a atuação de um hospedeiro invertebrado intermediário em um ciclo do tipo heteroxenico, como veremos no nosso próximo conteúdo. http://www.usjt.br/acervolaminas/index.php/parasitologia/96-helmintos http://segundocientista.blogspot.com.br/2015/05/nematoides.html 17 ciclo biológico e Transmissão Agora que você já observou as formas evolutivas de A. lumbricoides, vamos entender como seu ciclo biológico acontece. Precisamos ter em mente que os áscaris vivem no intestino e seus ovos são eliminados nas fezes de pessoas infectadas. Dessa forma, em locais sem saneamento básico adequado, onde as pessoas defecam fora de locais apropriados, existirá a deposição dos ovos diretamente no solo. Em seguida, esses ovos se tornam maduros e podem contaminar outros indivíduos. Vamos conhecer em detalhes o ciclo deste parasito? Primeiramente, é importante ressaltar que esse parasito apresenta um ciclo do tipo monoxênico, se desenvolvendo em apenas um hospedeiro. Esse ciclo também pode ser chamado de direto (Figura 3). A transmissão de A. lumbricoides pode ocorrer através da ingestão de alimentos ou água contaminados com ovos contendo a larva infectante (L3). Isso também pode acontecer quando as mãos contaminadas são colocadas. Adicionalmente, vetores mecânicos como poeira e insetos (moscas e baratas) também podem veicular os ovos infectantes. Observando a figura 15, acompanhe agora a descrição do ciclo: Os ovos de áscaris, contendo a larva L3, contaminam água e/ou alimentos e assim, o indivíduo ingere os ovos larvados. O ovo passa pelo estômago e libera a larva L3 no intestino delgado (etapas 1, 2 e 3 da figura 15). As larvas penetram na mucosa intestinal e são carreadas pelo sistema porta hepático até os pulmões (etapas 4 e 5 da figura 15). Observe na etapa 6 da figura 15 que neste momento, as larvas L3 sofrem transformação para L4 (mudam a cutícula e aumentam de tamanho), rompendo os capilares e caindo nos alvéolos pulmonares, onde sofrem nova muda (L5). A larva L5 agora irá migrar para faringe e pode ser expulsa através da expectoração ou então serem deglutidas (etapas 7 da figura 15). Após serem deglutidas, as larvas atingem novamente o duodeno, transformando-se em vermes adultos. As fêmeas, após a cópula, iniciam a ovoposição e os ovos são eliminados pelas fezes no ambiente (etapas 8 e 9 da figura 15). Lembre-se que esses ovos férteis evoluem até se tornarem larvados, com a larva L3 (etapas 10, 11 e 12 da figura 15). Fatores ambientais, como a oxigenação do solo, temperatura e umidade favorecem esse processo. 18 Figura 15: Ciclo biológico de Ascaris lumbricoides. (Fonte: adaptado do CDC- http://www.dpd.cdc.gov/DPDx/HTML/Image_Library.htm). Patogenia Em geral, as pessoas infectadas por áscaris possuem entre 4 e 10 vermes. As alterações causadas por A. lumbricoides estão diretamente relacionadas a quantidade de formas presentes no organismo (em geral dez vermes). A patogenia de áscaris deve ser entendida de acordo com o ciclo biológico desse helminto, ou seja, a patogenia das larvas e dos vermes adultos. As larvas, em infecções de baixa intensidade, normalmente não causam nenhuma alteração. Entretanto, em infecções maciças encontramos lesões hepáticas e pulmonares. As lesões hepáticas correspondem principalmente a focos hemorrágicos e de necrose fibrosados. Já as lesões pulmonares se caracterizam por edemaciação dos alvéolos, infiltrado eosinofílico, febre, bronquite, pneumonia e tosse produtiva (com produção de secreção). Estas manifestações geralmente ocorrem em crianças e estão associadas ao estado nutricional e imunológico. Os vermes adultos são responsáveis por uma série de ações no organismo do hospedeiro, como ação espoliadora, através do consumo de uma grande quantidade de vitaminas (A e C), proteínas, lipídios e carboidratos; ação tóxica, exercida pelos antígenos parasitários; ação ectópica que ocorre pela migração http://www.dpd.cdc.gov/DPDx/HTML/Image_Library.htm 19 dos vermes, atingindo locais indevidos ou sendo eliminados pela boca; e finalmente, ação mecânica, causando irritação da parede intestinal ou o enovelamento dos parasitos que podem obstruir as alças intestinais. Sintomas Já vimos que a infecção por A. lumbricoides ocorre quando a larva é liberada do ovo no intestino delgado, penetrando a mucosa e, por via venosa, finalmente alcança o fígado, pulmão e a árvore brônquica. Junto com as secreções respiratórias as larvas são deglutidas e atingem o intestino, onde chegam ao tamanho adulto. Apesar da presença do verme no organismo, a maioria das infecções por A. lumbricoides é assintomática. Em várias situações podem surgir manifestações clínicas, dependendo do órgão atingido. Em geral, os sintomas só aparecem quando a infecção é média (30 a 40 lombrigas) ou intensa (mais de 100). Observe a variedade de sintomas listados abaixo: • Irritabilidade; • Olheiras; • Ranger de dentes à noite; • Prurido no nariz; • Tosse e coriza; • Edema; • Urticária; • Manchas claras circulares na pele; • Desconforto intestinal; • Cólicas súbitas; • Diarreia; • Indigestão; • Apetite irregular; • Perda de peso; • Anemia; • Desnutrição; • Fraqueza. É importante destacar que quando há grande número de vermes (acima da média), pode haver o quadro de obstrução intestinal. Observe o abdome distendido, característico de crianças com infecção grave por A. lumbricoides. Essa criança está sujeita a ter uma obstrução das alças intestinais (Figura 16). Nesses casos, o tratamento poderá ser cirúrgico, visando retirar os vermes do intestino (Figura 17). 20 Figura 16: Abdome distendido, infecção grave por A. lumbricoides. (Fonte: http://www.medscape.com/viewarticle/451597_3). Figura 17: Retirada de A. lumbricoides, após terapia com anti-helmíntico em criança. (Fonte: http://www.medscape.com/viewarticle/451597_3). A larva pode contaminar as vias respiratórias, fazendo o indivíduo apresentar tosse, catarro com sangue ou crise de asma. Se uma larva obstruir o colédoco pode haver icterícia obstrutiva. Diagnóstico Como acabamos de observar, a ascaridíase humana é pouco sintomática e difícil de ser diagnosticada em exame clínico, sendo a gravidade da doença determinada pelo número de vermes que infectam a pessoa. Como o parasito não se multiplica dentro do hospedeiro, os ovos infectados são responsáveis pelo acúmulo de vermes adultos no intestino. O método diagnóstico padrão para ascaridíase é a identificação dos ovos em amostras de fezes utilizando o microscópio óptico. Além disso, possível fazer o diagnóstico através da coleta de vermes eliminados com o uso de laxantes ou naturalmente, assim como em exames vídeo-endoscópicos. As radiografias usando contrastes tambémpodem detectar o parasito graças às suas grandes dimensões. http://www.medscape.com/viewarticle/451597_3 http://www.medscape.com/viewarticle/451597_3 21 VEjA O VíDEO Acesse os links abaixo e veja os vídeos com casos de ascaridíase elucidados por exames de imagem. • Endoscopia do intestino delgado (duração de 1 minuto): • Ultrassonografia da vesícula biliar (duração de 10 segundos): Tratamento e profilaxia O tratamento da ascaridíase pode ser realizado através de medicamentos anti-helmínticos, como albendazol e mebendazol que são as drogas de escolha. Em geral, a infecção é tratada em três dias. As drogas são efetivas e apresentam poucos efeitos colaterais. O procedimento cirúrgico é indicado na ausência de resposta ao tratamento medicamentoso e em casos de infecções graves com obstrução intestinal, como mostramos na figura 4 e 5. Medidas simples devem ser adotadas para evitar infecções por A. lumbricoides: • Lavar cuidadosamente frutas e verduras; • Ingerir apenas água tratada ou fervida; • Usar instalações sanitárias adequadas; • Saneamento básico eficiente. WUcHERERIA BANcROfTI Finalizaremos nossa disciplina com o estudo do nematelminto Wuchereria bancrofti, parasito encontrado na África e nas Américas. Esse verme possui um ciclo heteroxênico, possuindo como vetor de transmissão, o mosquito Culex quinquefasciatus, na maioria das regiões endêmicas. Na sua fase adulta, esse parasito habita os vasos e gânglios linfáticos, sendo o agente etiológico da filariose linfática, uma doença parasitária exclusiva de seres humanos. Existem outros tipos de vermes filarídeos, entretanto, nosso estudo será focado na espécie W. bancrofti. Observe abaixo outras espécies: • Brugia malayi - agente etiológico de filariose linfática, encontrado no sul e sudeste da Ásia e Pacífico Oriental). • Brugia timori - agente etiológico de filariose linfática, encontrado no leste da Indonésia e ilha do Timor). • Onchocerca volvulus - agente etiológico da oncocercose ou cegueira dos rios. • Dirofilaria immitis - parasita cães; existem casos humanos. • Mansonella ozzardi - não patogênica e comum na Amazônia. https://www.youtube.com/watch?v=HOaZCkA8Zvk https://www.youtube.com/watch?v=OHVXaik6hgA 22 A filariose linfática, também conhecida como elefantíase em uma de suas manifestações na fase crônica, é considerada como uma doença tropical negligenciada, sendo uma das principais causas de incapacidade permanente em todo o mundo. Atualmente, existem mais de um bilhão de indivíduos expostos ao risco de infecção em quatro continentes, 120 milhões de pessoas infectadas e 40 milhões incapacitadas ou desfiguradas pela doença. Comunidades frequentemente rejeitam indivíduos desfigurados pela doença. O estado de Pernambuco é considerado como uma região endêmica de filariose. Entretanto, a filariose linfática já está em fase de eliminação enquanto problema de saúde pública e com atividades de controle da doença no Estado desde 2003, especificamente nos municípios do Recife, Olinda, Paulista e Jaboatão dos Guararapes. Os principais agentes da filariose linfática são as espécies W. bancrofti e B. malayi. Detalharemos a seguir os aspectos mais relevantes sobre o parasito W. bancrofti e a filariose linfática. Morfologia W. bancrofti apresenta diferentes formas evolutivas nos hospedeiros vertebrados (humanos) e invertebrados (mosquitos vetores). Observe que o verme adulto macho possui corpo delgado e branco- leitoso, medindo cerca de 4 cm de comprimento e 0,1 mm de diâmetro. Sua extremidade anterior é afilada e a posterior é enrolada ventralmente. Já as fêmeas são maiores do que os machos, medindo até 10 cm de comprimento e 0,3 mm de diâmetro (Figura 17). Além disso, possuem órgãos genitais duplos, com exceção da vagina, que é única e se exterioriza em urna vulva localizada próximo à extremidade anterior. Figura 17: Vermes adultos de Wuchereria bancrofti macho e fêmea. (Fonte: http://www.cdc.gov/dpdx/lymphaticFilariasis/gallery.html#adultswbancroft). Como foi dito anteriormente, os vermes adultos permanecem juntos nos vasos e gânglios linfáticos humanos e vivem, em média, de quatro a oito anos. Esses parasitos são mais encontrados nas regiões das pernas, braços, escroto e mamas. A microfilária é uma forma evolutiva também conhecida como larva ou embrião. A fêmea grávida faz a postura de microfilárias, que possuem uma membrana extremamente delicada e que funciona como uma bainha flexível, medindo de (250 a 300 mm). http://www.cdc.gov/dpdx/lymphaticFilariasis/gallery.html#adultswbancroft 23 A microfilária embainhada apresenta vários núcleos na região caudal (células germinativas) dispostos em filas simples. Essa forma se movimenta ativamente na corrente sanguínea do hospedeiro. A presença da bainha é importante, pois alguns filarídeos encontrados no sangue não possuem tal estrutura, sendo este um dos critérios morfológicos para o diagnóstico diferencial.Observe a figura 18. Figura 18: Microfilária de Wuchereria bancrofti. (Fonte: http://www.cdc.gov/dpdx/lymphaticFilariasis/gallery.html#microwbancrofti). As microfilárias, paridas no interior dos ductos e vasos linfáticos, são eliminadas pelas fêmeas grávidas e saem dos ductos linfáticos e ganham a circulação sanguínea do hospedeiro. Essas larvas acumulam-se no interior da rede vascular sanguínea dos pulmões. Ao anoitecer, as larvas aparecem na circulação sanguínea periférica e seu número aumenta até as primeiras horas da madrugada. As microfilárias apresentam uma periodicidade noturna (com pico às 24:00hs). Durante o dia se localizam nos capilares profundos principalmente do pulmão. O pico da microfilaremia (microfilárias no sangue) coincide com o período preferencial de hematofagismo do vetor invertebrado C. quinquefasciatus. Essa é uma característica importante no momento da realização do diagnóstico, como iremos observar mais adiante no nosso texto. As larvas de W. bancrofti são encontradas no inseto vetor. A larva de primeiro estádio (L1) mede em torno de 300 µm de comprimento e é originária da transformação da microfilária. Essa larva se diferencia em larva de segundo estádio (L2), duas a três vezes maior, e sofre nova muda originando a larva infectante (L3) que tem entre 1,5 e 2,0 µm de comprimento. ciclo biológico e Transmissão O ciclo de vida de W. bancrofti é do tipo heteroxênico e o hospedeiro intermediário é a fêmea hematófaga do mosquito C. quinquefasciatus. Esse inseto, ao picar pessoas parasitadas, ingerem microfilárias (Figura 19). No estômago do mosquito, após poucas horas, as microfilárias perdem a bainha, migram para o tórax do inseto e transformam-se em larvas L1. http://www.cdc.gov/dpdx/lymphaticFilariasis/gallery.html#microwbancrofti 24 Em cerca de seis dias, as larvas L1 se transforma em L2 que após 15 dias de crescimento, se transformam em larvas L3 infectante. A larva L3 migra pelo inseto até alcançar a probóscida (aparelho picador) do mosquito. Quando a fêmea do C. quinquefasciatus vai fazer um novo repasto sanguíneo, as larvas L3 são introduzidas dentro da pele do hospedeiro definitivo (homem). Observe na figura 19 que as larvas L3 migram para os vasos linfáticos e linfonodos, onde crescem e se tornam sexualmente maduras. Dessa forma, no interior dos ductos e vasos linfáticos, as fêmeas adultas produzem as microfilárias que se acumulam no interior da rede vascular sanguínea. Ao anoitecer as larvas aparecem na circulação sanguínea periférica e seu número aumenta progressivamente até as primeiras horas da madrugada. Quando o mosquito realiza um novo repasto sanguíneo em uma pessoa infectada, ingere as microfilárias. DIcA Não esqueça que as microfilárias possuem uma periodicidade noturna (com pico às 24:00hs) e que durante o dia se localizam nos capilares profundos principalmente do pulmão. O pico da microfilaremia (microfilárias no sangue) coincide com o período preferencial de hematofagismo do C. quinquefasciatus. Figura 19: Ciclobiológico de Wuchereria bancrofti. Fonte: (Adaptado do CDC http://www.dpd.cdc.gov/DPDx/HTML/Image_Library.htm). http://www.dpd.cdc.gov/DPDx/HTML/Image_Library.htm 25 Patogenia e sintomas PALAVRAS DO PROfESSOR Como você pode ver anteriormente, os vermes adultos de W. bancrofti se localizam nos linfonodos e vasos linfáticos, órgãos que mantém o equilíbrio de fluidos e combate as infecções do corpo. A patogenia da filariose é encontrada principalmente pela presença do verme adulto nesses locais, provocando uma reação imunoinflamatória. A ação mecânica exercida pelas filárias no sistema linfático causa obstrução dos vasos e extravasamento de linfa para o interstício, provocando linfa edema nos órgãos. Já a ação irritativa, é causada por produtos metabólicos excretados pelo parasito e oriundos da degeneração de vermes mortos. O período de incubação da filariose é de 9 a 12 meses. Essa doença é caracterizada por um amplo espectro clínico associado à presença dos vermes adultos ou das microfilárias. Metade dos indivíduos infectados em zonas endêmicas desenvolvem a forma assintomática da doença, embora apresentem microfilárias no sangue e sejam portadores sãos. As manifestações clínicas são relacionadas com inflamação aguda linfática e também patologia linfática crônica, dependendo do grau da infestação. Nas infecções assintomáticas, existe um pequeno número de parasitos e a própria resposta inflamatória combate as filárias. Observe abaixo os principais tipos de lesões encontrados na filariose linfática: • Adenite: Os linfonodos hipertrofiados (aumentados) tornam-se muito sensíveis ou mesmo dolorosos. • Linfangite: Inflamação e dilatação dos vasos linfáticos. • Lesões genitais: Funiculite filariana (linfangite do cordão espermático acompanhada de inflamação do tecido conjuntivo) e hidrocele (distensão e espessamento do testículo). • Linfedema: Acúmulo de linfa nos tecidos, devido à dificuldade circulatória. • Derrame linfático: Ocorre em cavidades serosas (pleura, peritônio ou testículo). Os primeiros sintomas são processos inflamatórios, desencadeados pela morte do parasito, localizados nos vasos linfáticos (linfangite), com febre, calafrio, dor de cabeça, náusea, sensibilidade dolorosa e vermelhidão ao longo do vaso linfático. O quadro de linfangite pode ocorrer em diferentes regiões do corpo: escroto, cordão espermático, mama, membros inferiores, etc. São frequentes os casos com ataques repetidos de linfangite, linfadenite (inflamação dos nódulos linfáticos) e lesões genitais. Na fase aguda, os principais sintomas são adenite e linfangite, acompanhadas de febre e mal-estar. A evolução da filariose é lenta. Na fase crônica, os sintomas são linfedema, hidrocele e elefantíase. Na elefantíase, há fibrose (endurecimento e espessamento) e hipertrofia das áreas com edemas linfáticos, provocando deformações. 26 Geralmente, ela se localiza em uma ou ambas as pernas, ou nos órgãos genitais externos (Figura 20). Existem ainda complicações relacionadas a essa enfermidade, como o derrame de líquidos nas vias urinárias (linfúria) ou mais raramente no intestino (linforreia) e as infecções secundárias. É importante esclarecer que a filariose não é causa direta da elefantíase. Diversos fatores, como falta de higiene, ocasionam a proliferação de bactérias e a infecção aguda nos locais das lesões. Entre as complicações da filariose, destaca-se a Eosinofilia Pulmonar Tropical (EPT). Essa síndrome é causada pela migração de microfilárias de W. bancrofti para o pulmão, originando uma doença intersticial pulmonar e uma exacerbada resposta imunológica com o aumento de eosinófilos. Já a hematúria (presença de sangue na urina) é pouco frequente na filariose, mas pode ocorrer devido à deposição de imunocomplexos na membrana basal glomerular. Figura 20: Pacientes com elefantíase. Fonte: http://www.coccidia.icb.usp.br/parasite_db/galeria_imgs/high/FI_24_high.jpg Diagnóstico e tratamento Agora que você já conhece a filariose, assim como seu agente etiológico, é importante entender como ocorre o diagnóstico dessa doença. O diagnóstico laboratorial/parasitológico pode ser realizado através da pesquisa de microfilárias no sangue periférico das 22 horas às 4 horas da manhã, período em que as microfilárias se encontram na região periférica. Deve-se realizar a coleta de uma gota de sangue e observar a presença de microfilárias para comprovar a etiologia da doença. Os métodos utilizados são o exame da gota espessa, esfregaço sanguíneo e exame à fresco. Além disso, existem testes imunológicos e ultrassonografia que pode demonstrar a presença de filarias nos canais linfáticos. http://www.coccidia.icb.usp.br/parasite_db/galeria_imgs/high/FI_24_high.jpg 27 Quando a presença do parasito é detectada, o tratamento específico deve ser adotado, visando debelar a infecção. O tratamento tem três objetivos: reduzir ou prevenir a morbidade; corrigir as alterações provenientes da infecção (edema, hidrocele, elefantíase) e impedir a transmissão. A droga de escolha é a Dietilcarbamazina (DEC) na forma de comprimidos de 50mg. Sua administração é por via oral e apresenta rápida absorção e baixa toxicidade. Esta droga tem efeito micro e macro filaricida, com redução rápida e profunda da densidade das microfilárias no sangue. Esse tratamento poderá ser repetido várias vezes, se necessário, até o desaparecimento da parasitemia. Outras drogas como a ivermectina, um antibiótico semissintético de largo espectro, tem sido utilizado para filariose em diferentes regiões endêmicas. Esse medicamento é muito eficaz na redução da microfilaremia, mas não atua sobre os vermes adultos, não curando completamente a infecção. Ultimamente a OMS tem recomendado o tratamento do hospedeiro com duas drogas simultaneamente (DEC + ivermectina ou albendazol). Além disso, a pré-terapia com tetraciclina ajuda limitar as patologias causadas por vermes mortos e diminuir a carga parasitária. A filariose linfática é uma patologia potencialmente erradicável, através do controle dos vetores e do tratamento dos pacientes, uma vez que não possui reservatórios animais. No estado de Pernambuco, as ações profiláticas do Programa Sanar foram desenvolvidas nas áreas com histórico de transmissão da doença que realizaram tratamento coletivo durante cinco anos ou mais. Também foram desenvolvidas ações de educação em saúde, treinamento de profissionais e exames em diferentes municípios além dos endêmicos para busca de possíveis novos focos da doença. Visite a página: Sugiro que você leia mais sobre essas medidas no link. VEjA O VíDEO Para conhecer mais sobre esta doença negligenciada e seus impactos para sociedade, veja o vídeo (visualização obrigatória) de aproximadamente 11 minutos. PALAVRAS DO PROfESSOR Prezado (a) aluno (a), chegamos ao fim da nossa disciplina, espero que você tenha compreendido os conteúdos abordados ao longo das unidades. Agora você poderá realizar os exercícios e o fórum da unidade IV, além de esclarecer as possíveis dúvidas com nossos tutores. Minha última sugestão é que você busque novos conhecimentos utilizando o recurso da Internet. Além da página do CDC, indicada na unidade I, você pode explorar as notícias de outras instituições, como DNDi, OMS e Ministério da Saúde: http://portal.saude.pe.gov.br/programa/secretaria-executiva-de-vigilancia-em-saude/programa-sanar-doencas-negligenciadas https://www.youtube.com/watch?v=eJpt-buOa40 28 VISITE AS PáGINAS http://www.dndial.org/ http://www.paho.org/bra/ http://portalsaude.saude.gov.br/ Bons estudos! http://www.dndial.org/ http://www.paho.org/bra/ http://portalsaude.saude.gov.br/
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