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Murray Microbiologia Médica MICOLOGIA - 7ª Ed

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6 5
Classificação, Estrutura e
Reprodução dos Fungos
Este capítulo apresenta uma visão geral da classificação, estrutura e reprodução dos fungos. Serão discutidos
os aspectos básicos de sua organização celular, sua morfologia, assim como a classificação clínica das micoses
humanas. Propomos uma  taxonomia  simplificada dos  fungos para destacar as principais  classes dos  fungos
patógenos  em  humanos:  Mucormicetos,  Basidiomicetos,  Pneumocistidiomicetos,  Hemiascomicetos  e
Euascomicetos.
A Importância dos fungos
Os fungos representam um diverso grupo de organismos ubíquos que tem como principal objetivo degradar a
matéria orgânica. Todos os fungos podem existir como heterotróficos ou saprófitas (organismos que se nutrem
de materiais mortos  ou  em decomposição),  simbiontes  (organismos  que  vivem  em  conjunto  com  benefício
mútuo), comensais (quando vivem em estreita relação em que apenas um organismo é beneficiado e o outro
não é prejudicado) ou como parasitas (organismos que vivem à custa de outro e esta relação é prejudicial ao
hospedeiro).
Os  fungos emergiram nas últimas décadas como a principal causa de doenças em humanos  (Tabela  65‑1),
especialmente entre indivíduos imunossuprimidos ou hospitalizados com doenças de base graves. Entre estes
pacientes,  os  fungos  atuam  como  patógenos  oportunistas,  causando  infecções  de  altas  morbidade  e
mortalidade. A incidência total de micoses invasivas continua aumentando com o tempo (Tabela 65‑2) e a lista
de fungos patógenos oportunistas aumenta da mesma maneira a cada ano. Em resumo, não existem fungos não
patogênicos.  Este  aumento  das  infecções  fúngicas  pode  ser  atribuído  ao  crescente  aumento  do  número  de
pacientes  imunossuprimidos,  incluindo  transplantados,  portadores  da  síndrome  da  imunodeficiência
adquirida  (AIDS),  pacientes  com  câncer  sob  uso  de  quimioterapia  e  aqueles  com  doença  de  base  grave
submetidos a procedimentos invasivos.
Tabela 65­1
Incidência e Relações Caso­fatalidade de Determinadas Infecções Fúngicas Invasivas
Patógeno
N°ˉ de Casos por Milhão por Ano
Relação Caso‑fatalidade (%) por Primeiro Episódio
Incidência
Candida spp. 72,8 33,9
Cryptococcus spp. 65,5 12,7
Coccidioides immitis 15,3 11,1
Aspergillus spp. 12,4 23,3
Histoplasma capsulatum 7,1 21,4
Agentes de mucormicose 1,7 30,0
Agentes de hialo‑hifomicose 1,2 14,3
Agentes de feo‑hifomicose 1,0 0
Sporothrix schenckii < 1 20,0
Malassezia furfur < 1 0
Total 178,3 22,4
Modificada de Rees JR, et al: The epidemiological features of invasives mycotic infections in the San Francisco Bay Area, 1992­1993:
results of population­based laboratory active surveillance. Clin Infect Dis 27:1138­1147, 1998.
Tabela 65­2
Incidências Cumulativas de Determinadas Micoses Invasivas
Micose
Incidência por Milhão por Ano
CPHAa CDCb NHDSc NHDSd
1980‑82 1992‑93 1996 2003
Candidíase 2,6 72,8 228,2 290,0
Histoplasmose 13,9 7,1 13,6 ND
Aspergilose 8,4 12,4 34,3 22,0
Criptococose 4,0 65,5 29,6 ND
ND, Dados não disponíveis.
aCPHA, Comission on Hospital and Professional Activities (Reingold et al., 1986).
bCDC, Centers for Disease Control and Prevention (Rees et al., 1998).
cNHDS, National Hospital Discharge Survey (Wilson et al., 2002).
dNHDS, National Hospital Discharge Survey (Pfaller e Diekema, 2007).
Taxonomia, estrutura e reprodução dos fungos
Os  fungos  são  classificados  em  seu  próprio  reino,  o  reino  Fungi.  Eles  são  organismos  eucariotas  que  se
distinguem dos demais por  terem uma parede celular rígida composta de quitina, glicana e uma membrana
plasmática em que o ergosterol (esterol) é o principal componente que substitui o colesterol (Fig. 65‑1).
FIGURA 65­1  Diagrama de uma célula fúngica.
A taxonomia clássica dos fungos se baseia fundamentalmente na morfologia e na formação dos esporos. No
entanto,  cada  vez  mais  as  características  estruturais,  bioquímicas  e  moleculares  são  consideradas  na
classificação,  resultando  em mudanças  na  denominação  taxonômica  original.  Os  fungos  podem  ser  uni  ou
multicelulares. O agrupamento mais simples baseado em sua morfologia são leveduras e fungos filamentosos.
A levedura pode ser definida morfologicamente como uma célula que se reproduz por brotamento ou fissão
(Fig.  65‑2),  em  que  a  célula  progenitora  ou  “célula‑mãe”  se  modifica  e  dá  origem  a  uma  descendência  ou
“célula‑filha”.  As  células‑filhas  podem  alongar‑se  e  formar  estruturas  com  formato  de  salsicha  chamadas
pseudo‑hifas. As leveduras são geralmente unicelulares e produzem colônias redondas, pastosas ou mucoides
em  ágar. Os  fungos  filamentosos,  por  outro  lado,  são  organismos multicelulares  constituídos  de  estruturas
tubulares,  chamadas de hifas (Fig. 65‑2),  que  se  alongam na  extremidade  em um processo  conhecido  como
extensão apical. As hifas podem ser cenocíticas (asseptadas ou com poucos septos) ou septadas (divididas por
paredes  transversais)  (Fig. 65‑2). As hifas  se mantêm unidas para produzir uma  estrutura  semelhante  a um
tapete  chamada  de  micélio.  As  colônias  dos  fungos  filamentosos  são  frequentemente  descritas  como
filamentosas, aveludadas ou algodonosas. Quando se desenvolvem em ágar ou outras superfícies sólidas, os
fungos  filamentosos  produzem  estruturas  denominadas  hifas  vegetativas,  que  crescem  sobre  ou  entre  a
superfície do meio de cultura, e também hifas que se projetam acima da superfície do meio, chamadas de hifas
aéreas.  As  hifas  aéreas  podem  produzir  estruturas  especializadas  conhecidas  como  conídios  (estrutura  de
reprodução assexuada) (Fig. 65‑3). Os conídios podem ser produzidos por um processo blástico (brotamento)
ou processo tálico, em que fragmentos de hifas dão origem a células individuais ou artroconídios. Os conídios
são  facilmente  dispersos  pelo  ar  e  servem  para  disseminar  o  fungo.  O  tamanho,  a  forma  e  os  aspectos  do
desenvolvimento dos conídios são utilizados como meio de identificação para o gênero e espécie dos fungos.
Muitos fungos de importância clínica são denominados dimórficos, porque podem existir tanto sob a forma de
levedura como de fungo filamentoso.
FIGURA 65­2  Morfologia das células fúngicas. A, Células de leveduras que se reproduzem por
fissão nuclear e por formação de blastoconídios. O alongamento de células de leveduras em
brotamento para formar pseudo­hifas é mostrado, assim como também a formação de um tubo
germinativo. B, Tipos de hifas vistas em vários fungos filamentosos.
 
FIGURA 65­3  Exemplos de formação de esporos assexuados e estruturas associadas vistas em
um zigomiceto (A) e Aspergillus spp. (B).
A  maioria  dos  fungos  apresenta  respiração  aeróbia,  embora  alguns  sejam  anaeróbios  facultativos
(fermentadores)  e  outros  sejam  estritamente  anaeróbios.  Seu metabolismo  é  heterotrófico  e  os mesmos  são
bioquimicamente  versáteis  na  produção  primária  (p.  ex.,  ácido  cítrico,  etanol  e  glicerol)  e  metabólitos
secundários (p. ex., antibióticos [penicilina], amanitenos, aflatoxinas). Em relação às bactérias, os fungos são de
crescimento lento, com tempo de duplicação celular de horas em vez de minutos.
Um esquema taxonômico simplificado listando as cinco principais classes de fungos de importância clínica é
mostrado na Tabela 65‑3. Entre centenas de milhares de diferentes fungos, apenas cerca de 200 são conhecidos
como causas de doença em humanos, embora este número pareça estar aumentando.
Tabela 65­3
Fungos de Importância Clínica (Reino Fungi)
Designação
Taxonômica
Gêneros Representativos Doenças em Humanos
Classe: Zigomicetos
Ordem: Mucorales Rhizopus, Mucor, Absidia, Saksenaea Mucormicose: oportunista em pacientes com
diabetes, leucemia, queimaduras graves ou
desnutrição; infecções rinocerebrais
Ordem:
Entomophtorales
Basidiobolus, Conidiobolus Mucormicose: infecções subcutâneas e
gastrointestinais
Classe:
Basidiomicetos
Teleomorfos de Cryptococcus, Malassezia, e
espécies de TrichosporonCriptococose e numerosas micoses
Classe:
Arquiascomicetos
Pneumocystis jirovecii Pneumonia por Pneumocystis
Classe:
Hemiascomicetos
Teleomorfos de espécies de Candida;
Saccharomyces
Numerosas micoses
Classe: Euascomicetos
Ordem: Onygenales Arthroderma (teleomorfos de Trichophyton e
Microsporum); Ajellomyces (teleomorfos de
espécies de Blastomyces e Histoplasma)
Dermatofitoses; micoses sistêmicas
Ordem: Eurotiales Teleomorfos de espécies de Aspergillus Aspergilose
Ordem:
Hypocrealues
Teleomorfos de espécies de Fusarium Ceratite e outras micoses invasivas
Ordem: Microascales Pseudallescheria (teleomorfo de espécies de
Scedosporium)
Pneumonia, micetoma e micoses invasivas
Modificada de Brandt ME, Warnock DW: Taxonomy and classification of fungi. In Versalovic J, et al (eds): Manual of clinical
microbiology, ed 10,. Washington, DC, 2011, American Society for Microbiology Press.
Os  fungos  reproduzem‑se  pela  formação  de  esporos,  que  podem  ser  sexuados  (envolvendo  meiose,
precedida  por  fusão  do  protoplasma  e  fusão  dos  dois  núcleos  compatíveis)  ou  assexuados  (envolvendo
somente  mitose).  As  classes  Entomoftoromicotina,  Mucormicotina,  Pneumocistidiomicetos,  Basidiomicetos,
Sacaromicetos e Euascomicetos produzem diferentes tipos de esporos (sexuados e assexuados) (Tabela 65‑4). A
forma teleomorfa está relacionada à formação de esporos sexuados, e forma anamorfa, à formação de esporos
assexuados. O  fato  de  um mesmo  fungo  possuir  estado  anamorfo  e  teleomorfo  implica  uma  nomenclatura
diferente  para  um  mesmo  agente  (p.  ex.,  Ajellomyces  capsulatum  [teleomorfo]  e  Histoplasma  capsulatum
[anamorfo]) e é uma fonte de confusão para não micologistas.
Tabela 65­4
Características Biológicas, Morfológicas e Reprodutivas de Fungos Patogênicos
Classe dos
Organismos
Gêneros
Representativos
Morfologia Reprodução
Mucormicetos Rhizopus, Mucor,
Absidia,
Basidiobolus
Largas hifas cenocíticas de parede
delgada, de 6 – 25 μm, com lados
não paralelos; esporos contidos
no interior do esporângio;
estruturas semelhantes a raízes
chamadas de rizoides,
características de alguns gêneros
Assexuada: produção de
esporangiosporos dentro do
esporângio. Sexuada: produção de
zigosporos formados por fusão de
tipos compatíveis para
acasalamento
Basidiomicetos Leveduras
basidiomicetosas
anamórficas
(Cryptococcus,
Malassezia,
Trichosporon)
Leveduras em brotamento, hifas e
artroconídios. Hifas que
produzem basidiósporos (não
vistos na natureza ou em
pacientes). Hifas com conexões
reforçadas.
Assexuada: produção de conídios por
brotamento a partir de uma célula‑
mãe ou dentro de um fragmento
de hifa. Sexuada: fusão de núcleos
compatíveis seguida de meiose
para formar basidiósporos ou não
identificada
Pneumocistidiomicetos Pneumocystis
jirovecii
Formas tróficas e estruturas
semelhantes a cistos
Assexuada: fissão binária. Sexuada:
fusão de tipos compatíveis para
acasalamento para formar um
zigoto; compartimentalização de
esporos no interior do cisto.
Sacaromicetos Candida e
Saccharomyces
Leveduras em brotamento e hifas,
pseudo‑hifas
Assexuada: produção de conídios
através de brotamento a partir de
uma célula‑mãe. Sexuada: não
vista ou por conjugação entre duas
células isoladas ou através de
conjugação do tipo “mãe‑
brotamento”
Euascomicetos Dermatófitos,
Blastomyces,
Histoplasma,
Aspergillus,
Fusarium,
espécies de
Scedosporium
Leveduras em brotamento, hifas
septadas, conídios assexuados
desenvolvidos em estruturas
especializadas
Assexuada: produção de conídios por
meio de brotamento de uma
célula‑mãe. Sexuada: ascósporos
produzidos em uma estrutura
especializada chamada de asco, ou
não vista
Em  alguns  fungos,  a  fase  assexuada,  ou  anamorfa,  apresenta  uma  alta  capacidade  de  rápida  dispersão  e
adaptação a novos habitats em relação ao estágio sexual, ou teleomorfo, o qual desapareceu ou ainda não foi
descoberto.  Mesmo  na  ausência  da  fase  teleomorfa,  é  possível  atribuir  aos  Basidiomicetos,
Pneumocistidiomicetos  e  Sacaromicetos  seus  anamorfos  através  da  sequência  do  ácido  desoxirribonucleico
(DNA). No passado  estes  fungos  assexuados  foram  classificados  em um grupo  artificial,  os Fungi  Imperfecti
(divisão Deuteromicota).
Independentemente  da  capacidade  de  um  fungo  produzir  esporos  sexuais,  na  prática  clínica  é  comum
referir‑se aos fungos pela designação de sua forma assexuada, ou seja, seu estado anamorfo (assexuado). Em
amostras clínicas, o estado sexual (teleomórfico) ocorre apenas em situações especiais no laboratório.
Os  esporos  assexuados  consistem  basicamente  em  dois  tipos:  esporangiósporos  e  conídios.  Os
esporangiósporos são esporos assexuados produzidos no interior de uma estrutura chamada esporângio (Fig.
65‑3)  e  são  estruturas  pertencentes  aos  Mucorales,  tais  como  Rhizopus  e Mucor  spp.  Conídios  são  esporos
assexuados  que  se  desenvolvem  em  estruturas  especializadas,  como  visto  em  Aspergillus  spp.  (Fig.  65‑3),
Penicillium spp. e os dermatófitos.
Mucormicetos (anteriormente Zigomicetos)
Os Mucormicetos  (Zigomicetos)  são  constituídos de hifas  largas,  irregulares e  com poucos  septos. O subfilo
Mucoromicotina  foi  proposto  para  abrigar  os  Mucorales  e  os  Entomoftorales.  Estes  fungos  produzem
zigósporos sexuados após fusão de estruturas compatíveis. Os esporos assexuados dos Mucorales (Fig. 65‑3)
estão contidos dentro de um esporângio (esporangiósporos). Os esporângios estão localizados na extremidade
do  esporangióforo  em uma  estrutura  chamada  columela (Fig. 65‑3). A  presença  de  estruturas  em  forma  de
raiz, chamadas rizoides, é útil na identificação de espécies dentro do grupo Mucorales. Os Mucorales incluem
os  gêneros  Lichtemia  (Absidia, Mucor,  Rhizopus  e  Rhizomucor).  A  outra  ordem  dos  Mucorales  incluem  os
Entomoftorales,  que  são  menos  comuns,  e  os  Basidiobolus  e  Conidiobolus.  Estes  organismos  causam
mucormicose  subcutânea  tropical.  Os  esporos  assexuados  são  produzidos  individualmente  em  esporóforos
curtos e são ejetados quando maduros.
Basidiomicetos
A maioria dos basidiomicetos tem um forma filamentosa separada, mas alguns são tipicamente leveduras. A
reprodução  sexuada  leva  à  formação  de  basidiospóros  haploides  na  face  externa  de  uma  célula  geradora
denominada basídio. Os patógenos humanos mais proeminentes da classe dos basidiomicetos são as leveduras
com  estágio  anamorfo  pertencente  ao  gênero Cryptococcus, Malassezia  e Trichosporon.  O  gênero  Cryptococcus
contém mais de  30  espécies diferentes  com  teleomorfos  (estágios  sexuais),  que  foram atribuídos  ao  gêneros
Filobasidium e Filobasidiella.
Pneumocistidiomicetos
Pneumocistidiomicetos  é  uma  nova  classe  que  foi  recentemente  descrita  para  incluir  um  organismo,
Pneumocystis carinii, que era anteriormente considerado um protozoário. A reclassificação do Pneumocystis foi
baseada  em  evidências  moleculares  de  que  ele  estava  mais  intimamente  relacionado  ao  ascomiceto
Schizosaccharomyces  pombe.  Estudos  moleculares  posteriores  resultaram  na  denominação  de  Pneumocystis
jirovecii  em  cepas  derivadas  de  humanos.  O  organismo  existe  em  forma  vegetativa  que  se  reproduz
assexuadamente  por  fissão  binária.  A  fusão  de  tipos  compatíveis  para  acasalamento  resulta  em  um  cisto
esférico que na maturidade contém oito esporos.
Sacaromicetos
A  classe  dos  Sacaromicetos  contém  as  leveduras  de  Ascomicetos  (ordem  Saccharomycetales),  que  são
caracterizadas  por  leveduras  vegetativas  que  se  reproduzem  por  brotamento  ou  fissão  (Fig.  65‑2A). Muitos
membros da ordem Saccharomycetales têm um estágio anamórfico pertencentes ao gênero Candida (Tabela 65‑
3). Este gênero, que consiste em cerca de 200 espécies anamórficas, tem teleomorfos em mais de 10 diferentes
gêneros, incluindo Clavispora, Debaromyces, Issatchenkia, Kluyveromyces e Pichia.
Euascomicetos
A classe Euascomicotinaapresenta  reprodução assexuada que  leva à  formação de paredes finas, ou asco, as
quais  contêm  os  ascósporos  haploides.  Embora  a  maioria  dos  fungos  filamentosos  que  são  isolados  no
laboratório  clínico  pertença  à  classe  dos  Euascomicetos,  é  incomum  encontrar  estruturas  reprodutivas
sexuadas em culturas de rotina.
Esta classe possui 12 ordens que incluem espécies patogênicas para os humanos. Entre as mais importantes
estão a ordem Onygenales, que contempla os dermatófitos e alguns agentes patogênicos sistêmicos dimórficos
(incluindo Histoplasma capsulatum  e Blastomyces dermatitides);  a  ordem Eutoriales,  que  contém os  teleomorfos
dos gêneros  anamórfico Aspergillus  e Penicillium;  a  ordem  Sordariales,  que  contém  o  teleomorfos  do  gênero
anamórfico  Fusarium  e  a  ordem  Microascales  que  contém  os  teleomorfos  (Pseudallescheria)  do  gênero
anamórfico Scedosporium  (Tabela  65‑3). Além  disso,  os  teleomorfos  de  vários  fungos  de  importância  clínica
melanizados (dematiáceos) pertencem a ordens dessa classe.
Classificação das micoses humanas
Além da classificação taxonômica formal dos fungos, as infecções fúngicas podem ser classificadas de acordo
com  os  tecidos  infectados,  assim  como  pelas  características  específicas  dos  grupos  de  organismos.  Estas
classificações  incluem  as  micoses  superficiais,  cutâneas  e  subcutâneas,  as  micoses  endêmicas  e  as  micoses
oportunistas (Tabela 65‑5).
Tabela 65­5
Classificação Clínica das Micoses Humanas e Agentes Etiológicos Representativos
Micoses Superficiais Micoses Cutâneas e Subcutâneas Micoses Endêmicas Micoses Oportunistas
Pedra negra 
Piedraia horate 
Tinea nigra 
Hortae werneckii 
Pitiríase versicolor 
Malassezia furfur 
Pedra branca 
Trichosporon spp.
Dermatofitoses 
Microsporum spp.
Trichophyton spp.
Epidermophyton floccosum
Tinea unguium
Trichophyton spp.
E. floccosum
Onicomicose
Candida spp.
Aspergillus spp.
Trichosporon spp.
Geotrichum spp.
Ceratite micótica
Fusarium spp.
Aspergillus spp.
Candida spp.
Cromoblastomicose
Fonsecaea spp.
Phialophora spp.
Blastomicose
Blastomyces dermatitidis
Histoplasmose
Histoplasma capsulatum
Coccidioidomicose
Coccidioides immitis/posadasii
Peniciliose
Penicillium marneffei
Paracoccidioidomicose
Paracoccidioides brasiliensis
Aspergilose
Aspergillus fumigatus
A.flavus
A.niger
A.terreus
Candidíase
Candida albicans
C. glabrata
C. parapsilosis
C. tropicalis
Criptococose
Cryptococcus neoformans
Tricosporonose
Trichosporon spp.
Hialo‑hifomicose
Acremonium spp.
Fusarium spp.
Paecilomyces spp.
Scedosporium spp.
Mucormicose
Rhizopus spp.
Mucor spp.
Absidia spp.
Feo‑hifomicose
Alternaria spp.
Curvularia spp.
Bipolaris spp.
Wangiella spp.
Pneumocistose
Pneumocystis jirovecii
Micoses Superficiais
As micoses superficiais são aquelas infecções que estão limitadas às superfícies da pele e dos pelos. Elas não
são destrutivas e são apenas de importância cosmética. A infecção clínica denominada de pitiríase versicolor é
caracterizada pela descoloração ou despigmentação  e descamação da pele. Tinea  nigra  se  refere  a manchas
pigmentadas em castanho ou negro localizadas principalmente nas palmas das mãos. As entidades clínicas da
pedra negra e da pedra branca envolvem os pelos e são caracterizadas por nódulos compostos por hifas que
envolvem  as  hastes  dos  pelos.  Os  fungos  associados  a  estas  infecções  superficiais  incluem Malassezia  spp.,
Hortae weneckii, Piedraia hortae e Trichosporon spp.
Micoses Cutâneas
As micoses  cutâneas  são  infecções  da  camada  queratinizada  da  pele,  pelos  e  unhas.  Estas  infecções  podem
provocar  uma  resposta  do  hospedeiro  e  se  tornar  sintomáticas.  Os  sinais  e  sintomas  incluem  prurido,
descamação, pelos tonsurados, lesões arredondadas na pele e unhas espessadas e opacas. Os dermatófitos são
fungos  classificados  nos  gêneros  Trichophyton,  Epidermophyton  e  Microsporum.  As  infecções  da  pele  que
envolvem estes organismos são chamadas de dermatofitoses. Tinea unguium  se  refere a  infecções nas unhas
que envolvem estes agentes. As onicomicoses incluem infecções das unhas causadas pelos dermatófitos, assim
como também fungos não dermatófitos, tais como Candida spp. e Aspergillus spp.
Micoses Subcutâneas
As micoses subcutâneas envolvem as camadas mais profundas da pele,  incluindo a córnea, os músculos e o
tecido  conjuntivo,  e  são  causadas  por  um  largo  espectro  de  fungos  taxonomicamente  diversos.  Os  fungos
ganham  acesso  aos  tecidos  mais  profundos  normalmente  por  inoculação  traumática  e  permanecem
localizados,  causando  a  formação  de  abscessos  e  úlceras  que  não  cicatrizam.  O  sistema  imunológico  do
hospedeiro  reconhece  os  fungos,  resultando  em  destruição  tecidual  variável  e  frequentemente  em  uma
hiperplasia  epiteliomatosa.  As  infecções  podem  ser  causadas  por  fungos  filamentosos  hialinos,  tais  como
Acremonium  spp.  e  Fusarium  spp.,  e  por  fungos  pigmentados  ou  dematiáceos,  tais  como  Alternaria  spp.,
Cladosporium  spp., e Exophiala  spp.  (feo‑hifomicoses, cromoblastomicoses). As micoses subcutâneas  tendem a
permanecer localizadas e raramente se disseminam sistemicamente.
Micoses Endêmicas
As  micoses  endêmicas  são  infecções  fúngicas  causadas  por  patógenos  fúngicos  dimórficos  clássicos:
Histoplasma  capsulatum,  Blastomyces  dermatitidis,  Coccidioides  immitis,  Coccidioides  posadasii  e  Paracoccidioides
brasiliensis.  Estes  fungos  exibem dimorfismo  térmico  (existem  como  leveduras  ou  esférulas  a  37  °C,  e  como
fungos filamentosos  a  25  °C)  e  geralmente  estão  confinados  a  regiões  geográficas  onde  eles  ocupam nichos
ambientais  ou  ecológicos  específicos.  As  micoses  endêmicas  são  frequentemente  referidas  como  micoses
sistêmicas,  porque  estes  organismos  são  verdadeiros  patógenos  e  podem  causar  infecções  em  indivíduos
saudáveis. Recentemente, o fungo dimórfico Penicillium marneffei  foi adicionado à lista de agentes causadores
de micoses  endêmicas.  Todos  estes  agentes  produzem uma  infecção primária  no pulmão,  com  subsequente
disseminação para outros órgãos e tecidos.
Micoses Oportunistas
As  micoses  oportunistas  são  infecções  atribuídas  aos  fungos  que  são  normalmente  encontrados  como
comensais humanos ou no ambiente. Com exceção de Cryptococcus neoformans, estes organismos exibem uma
virulência  inerentemente  baixa  ou  limitada,  e  causam  infecções  em  indivíduos  que  estão  debilitados,
imunossuprimidos,  ou  são  portadores  de  aparelhos  protéticos  implantados  ou  cateteres  vasculares.
Praticamente, qualquer fungo pode atuar como um patógeno oportunista, e a lista destes se torna maior a cada
ano. Os patógenos fúngicos oportunistas mais comuns são as leveduras Candida spp. e Cryptococcus neoformans,
o  fungo  filamentoso Aspergillus  spp.  e Pneumocystis  jirovecii.  Devido  à  sua  inerente  virulência, Cryptococcus
neoformans é frequentemente considerado um patógeno “sistêmico”. Embora este fungo possa causar infecção
em  indivíduos  imunologicamente  normais,  ele  é  claramente  visto  com mais  frequência  como  um  patógeno
oportunista na população imunocomprometida.
Sumário
Com  o  número  cada  vez  maior  de  indivíduos  em  risco  de  infecções  fúngicas,  é  imperativo  que  médicos
“pensem em fungos” quando analisam uma infecção suspeita. A lista de patógenos fúngicos documentados é
extensa,  e  não  se  pode  mais  ignorar  ou  desconsiderar  os  fungos  como  “contaminantes”  ou  clinicamente
insignificantes  quando  isolados  a  partir  de  material  clínico.  É  também  considerado  que  o  prognóstico  e  a
resposta à terapia variem com o tipo de fungo que causa a infecção, assim como com o status imunológico do
indivíduo.  Deste  modo,  os  médicos  devem  se  tornar  familiarizados  com  os  vários  fungos,  seus  aspectos
epidemiológicos e patogênicos, e  também com as abordagens  ideais dediagnóstico e  terapia. Estas questões
serão discutidas em detalhe nos capítulos subsequentes de acordo com o esquema de classificação mostrado na
Tabela 65‑5.
Questões
1. Como os fungos diferem das bactérias (tamanho, núcleo, citosol, membrana plasmática, parede celular, fisiologia, tempo
de geração)?
2. Como a membrana plasmática dos fungos difere da de outras células eucarióticas (p. ex., células de mamíferos)?
3. Qual é a diferença entre uma levedura e um fungo filamentoso?
4. O que os termos anamorfo e teleomorfo significam e por que eles são importantes?
Bibliografia
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ed 10, Washington, DC: American Society for Microbiology Press, 2011.
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Reingold, A. L., et al. Systemic mycoses in the United States, 1980‑1982. J Med Vet Mycol. 1986; 24:433–436.
Wilson, L. S., et al. The direct cost and incidence of systemic fungal infections. Value Health. 2002; 5:26–34.
6 6
Patogênese das Doenças Fúngicas
Embora  as  bases  moleculares  e  genéticas  da  patogênese  bacteriana  e  viral  sejam  bem  conhecidas,  nosso
entendimento  sobre  a  patogênese  das  infecções  fúngicas  é  limitado.  Relativamente  poucos  fungos  são
suficientemente virulentos para serem considerados patógenos primários (Tabela 66‑1).  Patógenos  primários
são aqueles capazes de iniciar uma infecção em um hospedeiro normal, aparentemente imunocompetente. Eles
são  capazes  de  colonizar  o  hospedeiro,  encontrar  um  nicho  microambiental  adequado  com  substratos
nutricionais  suficientes,  evitar  ou  subverter  os mecanismos  de  defesa  do  hospedeiro,  e  então  se multiplicar
dentro  do  nicho  microambiental.  Entre  os  patógenos  fúngicos  primários  conhecidos  estão  quatro  fungos
ascomicetos,  os patógenos dimórficos  endêmicos Blastomyces  dermatitidis, Coccidioides  immitis  (e C.  posadasii),
Histoplasma capsulatum e Paracoccidioides brasiliensis. Cada um desses microrganismos possui  supostos  fatores
de virulência que lhes permitem romper ativamente as defesas do hospedeiro que normalmente restringem o
crescimento  invasivo  de  outros  microrganismos  (Tabela  66‑1).  Quando  um  grande  número  de  conídios  de
algum  desses  quatro  fungos  é  inalado  por  humanos,  mesmo  se  esses  indivíduos  forem  saudáveis  e
imunocompetentes, geralmente ocorrem infecção e colonização, invasão tecidual e disseminação sistêmica do
patógeno. Como ocorre com a maioria dos patógenos microbianos primários, esses fungos podem também agir
como patógenos oportunistas, uma vez que as formas mais graves de cada uma dessas micoses são vistas mais
frequentemente em indivíduos com comprometimento das defesas imunes inata ou adquirida.
Tabela 66­1
Características de Patógenos Fúngicos Primários e Oportunistas
  Habitat/Infecção Patogênese Fatores de Virulência
Presumidos
Formas Clínicas da
Micose
Patógenos Primários
Blastomyces
dermatitidis 
Fase
saprofítica 
• Micélio septado
e conídios
Fase parasitária
• Leveduras com
brotamento de
base larga
Habitat saprofítico
• Solo e restos
orgânicos
• Área endêmica
sudoeste dos
Estados Unidos e
Vale dos Rios Ohio‑
Mississipi
Modo de infecção
• Inalação de
conídios
Conídios inalados se convertem em
levedura; invasão localizada do
hospedeiro pela levedura
provoca reação inflamatória; a
levedura escapa ao
reconhecimento pelos
macrófagos e se dissemina
através da corrente sanguínea.
• Crescimento a 37 °C
• Dimorfismo térmico
• Modulação das
interações entre a
levedura e o sistema
imune do hospedeiro
• Geração de resposta
TH2Desprendimento
de WI‑1
• Blastomicose
pulmonar primária
• Blastomicose
pulmonar crônica
• Blastomicose
disseminada
• Cutânea
• Osso, trato
geniturinário e
cérebro
Coccidioides
immitis
(posadasii) 
Fase
saprofítica
• Hifas septadas e
artroconídios
Fase parasitária
• Esférulas com
endósporos
Habitat saprofítico
• Solo do deserto:
sudoeste dos EUA,
México e regiões
das Américas
Central e do Sul
Modo de infecção
• Inalação de
artroconídios
• Inoculação
percutânea (rara)
Artroconídios inalados alcançam os
alvéolos; convertem‑se em
esférulas, que geram
endósporos; os endósporos são
fagocitados, mas sobrevivem;
grandes (60 – 100) esférulas
escapam à fagocitose; ambiente
alcalino permite a sobrevivência
dentro do fagossomo.
• Crescimento a 37 °C
• Dimorfismo térmico
• Resistência dos
conídios à destruição
fagocítica
• Estímulo de uma
resposta TH2
ineficiente
• Produção de urease
• Produção de
proteinases
extracelulares
• Mimetismo
molecular
• Infecção pulmonar
inicial
• Coccidioidomicose
pulmonar crônica
• Coccidioidomicose
disseminada
• Meningite
• Osso e articulações
• Trato geniturinário
• Cutânea
• Oftálmica
Histoplasma
capsulatum 
Fase
saprofítica
• Hifas septadas,
microconídios e
macroconídios
tuberculados
Fase parasitária
• Pequenas
leveduras
intracelulares
com
brotamentos
Habitat saprofítico
• Solo enriquecido
com fezes de
aves/morcegos
• Metade oriental
dos Estados
Unidos, a maior
parte da América
Latina, partes da
Ásia, Europa,
Oriente Médio; a
variedade duboisii
ocorre na África
Modo de infecção
• Inalação de
conídios
Conídios inalados se convertem em
leveduras; leveduras são
ingeridas por macrófagos;
sobrevivem e proliferam dentro
do fagossomo; algumas formas
de levedura permanecem
hibernantes dentro dos
macrófagos, outras proliferam e
destroem os macrófagos,
liberando células‑filhas.
• Crescimento a 37 °C
• Dimorfismo térmico
• Sobrevivência nos
macrófagos
• Modulação do pH
do fagossomo
• Captação de ferro e
cálcio
• Alteração da
composição da
parede celular
• Pulmonar
clinicamente
assintomática e
“disseminada
críptica”
• Histoplasmose
pulmonar aguda
• Mediastinite e
pericardite
• Histoplasmose
pulmonar crônica
• Mucocutânea
• Disseminada
Paracoccidioides
brasiliensis 
Fase
saprofítica
• Hifas septadas,
conídios
Fase parasitária
• Leveduras com
múltiplos
brotamentos
Habitat saprofítico
• Solo e vegetação
• Américas Central e
do Sul
Modo de infecção
• Inalação de
conídios
Conídios inalados se convertem em
grandes leveduras com
brotamentos multipolares;
ingeridos, mas não eliminados
pelos macrófagos; podem
permanecer hibernantes por até
40 anos; disseminação para a
mucosa oral e nasofaríngea.
• Crescimento a 37 °C
• Dimorfismo térmico
• Sobrevivência
intracelular
• Influências
hormonais
• Alterações da
parede celular
• Resposta TH2
ineficiente contra
gp43
• Diversas
manifestações
clínicas
• Envolvimento
crônico de um
único órgão
• Envolvimento
crônico multifocal
(pulmões, boca,
nariz)
• Doença juvenil
progressiva:
linfonodos,
envolvimento
cutâneo e visceral
Patógenos Oportunistas
Espécies de
Candida 
Fases
Habitat saprofítico
• Mucosa
gastrointestinal,
mucosa vaginal,
Supercrescimento em mucosas com
subquente invasão; geralmente
barreira de mucosa debilitada,
• Crescimento a 37oC
• Transição
brotamento‑hifa
• Aderência
• Colonização
simples de
mucosas
• Candidíase
saprofíticas e
parasitárias
semelhantes:
leveduras com
brotamentos,
hifas, pseudo‑
hifas
pele, unhas
Modo de infecção
• Translocação
gastrointestinal
• Cateteres
intravasculares
disseminação hematogênica.
Transferência das mãos de
profissionais da saúde para o
cateter; colonização do cateter e
disseminação hematogênica.
• Hidrofobicidade da
superfície celular
• Mananas na parede
celular
• Proteases e
fosfolipases
• Mudanças
fenotípicas
mucocutânea
• Comprometimento
oral/vaginal
• Disseminação
hematogênica
• Candidose
hepatoesplênica
• Endoftalmite
Cryptococcus
neoformans 
Fases
saprófitas e
parasitárias
semelhantes:
leveduras
encapsuladas
com
brotamento
Habitatsaprofítico
• Solo enriquecido
com fezes de aves
(pombos)
Modo de infecção
• Inalação de
leveduras
• Inoculação
percutânea
Células leveduriformes inaladas são
ingeridas por macrófagos;
sobrevivência intracelular;
cápsula inibe a fagocitose;
cápsula e melanina protegem da
lesão oxidativa, disseminação
hematogênica e linfática para o
cérebro.
• Crescimento a 37oC
• Cápsula
polissacarídica
• Melanina
• MATalfa
• Pneumonia
criptocócica
primária
• Meningite
• Disseminação
hematogênica
• Criptococose
geniturinária
(prostática)
• Criptococose
primária cutânea
Espécies de
Aspergillus  
Fase
saprofítica
• Micélio septado,
conídios e
cabeças
conidiais
Fase parasitária
• Micélio septado,
conídios e
cabeças
conidiais
geralmente só
vistos em lesões
cavitárias
Habitat saprofítico
• Solo, plantas, água,
pimenta, ar
Modo de infecção
• Inalação de
conídios
• Transferência para
feridas através de
curativos/ataduras
contaminadas
Conídios inalados se ligam ao
fibrinogênio e à laminina no
alvéolo; conídios germinam e
hifas secretam proteases e
invadem o epitélio; invasão
vascular resulta em trombose e
infarto tecidual; disseminação
hematogênica. 
• Crescimento a 37oC
• Ligação a
fibrinogênio e
laminina
• Secreção de elastase
e proteases
• Catalase
• Gliotoxina (?)
• Aspergilose
broncopulmonar
alérgica
• Sinusite
• Aspergiloma
• Aspergilose
invasiva
• Pulmão
• Cérebro
• Pele
• Gastrointestinal
• Coração
De Cole GT: Fungal pathogenesis. In Anaissie EJ, McGinnis MR, Pfaller MA, editors: Clinical mycology. New York, 2003, Churchill
Livingstone.
Em geral,  indivíduos  saudáveis  e  imunocompetentes  apresentam alta  resistência  inata  à  infecção  fúngica,
apesar de serem constantemente expostos às  formas  infecciosas de diversos  fungos presentes como parte da
microbiota normal (endógenos) ou no ambiente (exógenos). Os patógenos fúngicos oportunistas, como Candida
spp.,  Cryptococcus  neoformans  e  Aspergillus  spp.,  somente  causam  infecção  quando  ocorrem  quebras  nas
barreiras  protetoras  da  pele  e  membranas  mucosas  ou  quando  falhas  no  sistema  imune  do  hospedeiro
permitem  a  penetração,  colonização  e  reprodução  no  hospedeiro  (Tabela  66‑1).  Entretanto,  mesmo  nas
infecções  oportunistas,  há  fatores  associados  ao  organismo,  e  não  ao  hospedeiro,  que  contribuem  para  a
capacidade do fungo de causar doença (Tabela 66‑1).
Patógenos fúngicos primários
Todos  os  patógenos  fúngicos  primários  são  agentes  de  infecções  respiratórias  e  nenhum  deles  é  parasita
obrigatório. Cada um tem uma fase saprofítica  caracterizada por hifas septadas  fragmentadas, normalmente
encontradas no solo ou em vegetais em decomposição e que se disseminam pelo ar. Da mesma maneira, a fase
parasitária de cada fungo está adaptada ao crescimento a 37 °C e à reprodução assexuada no nicho ambiental
alternativo da mucosa  respiratória  do hospedeiro  (Cap. 72,  Fig.  72‑1).  Essa  habilidade  de  existir  em  formas
morfogenéticas alternadas (dimorfismo) é uma das várias características especiais  (fatores de virulência) que
permitem esses fungos competirem com as condições ambientais hostis do hospedeiro (Tabela 66‑1).
Blastomyces dermatitidis
Como os demais patógenos fúngicos dimórficos endêmicos, B. dermatitidis frequentemente causa uma infecção
respiratória autolimitada (Cap. 72). Entretanto, a blastomicose se diferencia de outras micoses endêmicas pela
alta  incidência  de  doença  clínica  em  comparação  com  as  formas  moderadas  ou  assintomáticas  entre  os
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#f0010
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
indivíduos  infectados  em  epidemias.  O  potencial  patogênico  de  B.  dermatitidis  é  ressaltado  pela  gravidade
clínica da maioria dos casos esporádicos de blastomicose.
Os  fatores  importantes  para  a  sobrevida  in  vivo  de B.  dermatitidis,  como  quaisquer  patógenos  dimórficos
endêmicos, são a capacidade de o patógeno inalado alcançar os alvéolos, sofrer transformação para uma outra
fase (levedura ou esférula) capaz de se replicar a 37 °C, e colonizar a mucosa respiratória. Após a inalação de
conídios  ou  fragmentos de  hifas  de B.  dermatitidis,  os  elementos  da  fase  saprofítica  do  fungo  supostamente
entram em contato e aderem à camada epitelial dos alvéolos, sofrendo transformação para a fase parasitária de
levedura,  em  um  processo  chamado  de  dimorfismo  térmico.  Essa  conversão  de  conídio  (2  a  10  μm  de
diâmetro) para as formas maiores de levedura (8 a 30 μm de diâmetro) fornece uma importante vantagem à
sobrevida  ao  fungo.  Enquanto  os  conídios  são  pequenos  o  suficiente  para  serem  rapidamente  ingeridos  e
destruídos pelos neutrófilos humanos, as leveduras são capazes de resistir ao ataque fagocítico dos neutrófilos
e das células mononucleares durante os estágios iniciais da resposta inflamatória. Em vez de se adaptarem ao
microambiente  intracelular  dos  fagolisossomas,  como  H.  capsulatum,  as  leveduras  de  B.  dermatitidis
desprendem  seu  antígeno  imunodominante  da  superfície  da  célula  e,  subsequentemente,  modificam  a
composição de sua parede celular, permitindo que escapem ao reconhecimento pelos macrófagos. Assim, eles
são capazes de colonizar tecidos e se disseminar pela corrente sanguínea.
Modulação das Interações entre as Leveduras e o Sistema Imune do Hospedeiro
O  principal  componente  imunorreativo  presente  na  superfície  das  células  leveduriformes,  mas  não  nos
conídios de B. dermatitidis, é uma glicoproteína da parede celular de 120 kDa, WI‑1. Essa glicoproteína parece
ter participação fundamental na patogênese de B. dermatitidis, promovendo adesão da célula leveduriforme ao
macrófago e induzindo uma potente resposta dos sistemas imune humoral e celular. WI‑1 é expressa por todos
os isolados virulentos de B. dermatitidis já examinados.
Aparentemente, cepas mutantes não virulentas de B. dermatitidis que expressam altos níveis de WI‑1 em sua
superfície celular são reconhecidas por macrófagos, fagocitadas, e rapidamente eliminadas do hospedeiro. Em
contraste,  cepas  virulentas  desse  fungo  desprendem  grandes  quantidades  de  WI‑1  durante  o  crescimento,
sendo capazes de evitar o reconhecimento pelos macrófagos por este processo. A apresentação de WI‑1, quer
se mantenha  associada  à  superfície  celular,  quer  seja desprendida da  célula para  o  ambiente,  é  um aspecto
fundamental da patogenicidade deste fungo.
A composição de carboidratos da parede celular da levedura também parece desempenhar uma função na
apresentação e desprendimento de WI‑1 e, portanto, na patogenicidade. Um dos principais componentes da
parede  celular  da  levedura  é  a  1,3‑α‑glucana. Há  uma  relação  inversa  entre  a  quantidade  de  1,3‑α‑glucana
presente na parede  celular de B. dermatitidis  e  a  quantidade de WI‑1  detectável  na  superfície  celular. Cepas
virulentas de B. dermatitidis produzem leveduras que possuem paredes celulares espessadas contendo grande
quantidade de 1,3‑α‑glucana e, quando maduras, apresentam pouca WI‑1 detectável na sua superfície celular.
De maneira oposta, cepas não virulentas exibem paredes finas com ausência de 1,3‑α‑glucana, mas com WI‑1
abundante  em  sua  superfície. Especula‑se que  a  incorporação de  1,3‑α‑glucana na parede  celular mascare  a
glicoproteína  de  superfície  WI‑1,  desempenhando  um  papel  na  liberação  de  um  antígeno  modificado
(componente de 85 kDa) no microambiente do sítio de  infecção. Por mascarar o antígeno WI‑1, a  levedura é
capaz de escapar ao reconhecimento por macrófagos e disseminar‑se por via hematogênica. O desprendimento
do  componente  de  85  kDa  de  WI‑1  pode  facilitar  a  evasão  imune  por  ligação  ou  consumo  de  anticorpos
opsonizados  e  complemento  longeda  superfície  celular  da  levedura.  Da  mesma  maneira,  a  liberação  do
componente WI‑1 pode também saturar receptores de macrófago e diminuir a eficiência da ligação e fagocitose
das leveduras.
Apresentação de Antígenos de Superfície Modula a Via das Células T Auxiliares da
Resposta Imune
Há diferentes subpopulações de células T auxiliares CD4 (TH, do inglês, CD4 T helper) que secretam diversos
padrões de citocinas em resposta a um estímulo antigênico. Após o encontro inicial com um antígeno, células
TH podem se  tornar polarizadas,  secretando predominantemente  interleucina‑2  (IL‑2) e  interferon‑γ  (IFN‑γ)
(padrão TH1)  ou predominantemente  IL‑4,  IL‑5  e  IL‑10  (padrão TH2).  IFN‑γ  e  IL‑2 ativam respectivamente
macrófagos  e  células  citotóxicas  T  e  NK  (natural  killer),  para  a  eliminação  de  organismos  intracelulares,
enquanto as citocinas TH2 favorecem o crescimento e diferenciação de células B, a mudança de isótipos para
imunoglobulina E (IgE) e a diferenciação e ativação de eosinófilos, respostas que pedem produção e proteção
contra alguns patógenos, mas que também foram relacionadas a alergia e reações de hipersensibilidade.
A resposta  imune mediada por células T contra B. dermatitidis  é  essencial para  imunoproteção  contra  esse
patógeno. Camundongos imunizados com WI‑1 desenvolveram uma forte resposta TH2 contra os antígenos. É
notável  que,  em  um  modelo  de  infecção  de  blastomicose  em  camundongos,  os  animais  infectados  que
desenvolveram  características  de  uma  resposta  TH2  morreram  com  uma  infecção  crônica  e  progressiva,
enquanto  os  animais  infectados  que  desenvolveram  uma  resposta  TH1  restringiram  a  disseminação  do
patógeno e  foram capazes de  responder à  terapia antifúngica e  se  recuperar da doença. Portanto, uma  forte
resposta TH2 pode não ser útil na eliminação da infecção por B. dermatitidis, podendo até mesmo retardá‑la.
Por liberar grandes quantidades do fragmento de 85 kDa de WI‑1, as células leveduriformes de B. dermatitidis
podem enganar as duas vias da resposta imune por evasão da resposta celular e pelo estímulo de uma resposta
humoral dominante, porém ineficaz.
Coccidioides immitis
C. immitis e C. posadasii são patógenos primários capazes de causar uma ampla variedade de lesões (Cap. 72).
Esses  fungos  são  endêmicos  no  deserto  do  sudoeste  dos  Estados Unidos  e,  embora  demonstrem diferentes
morfologias em suas fases saprofíticas e parasitárias, distinguem‑se dos demais fungos dimórficos endêmicos
por características únicas da fase parasitária (Cap. 72, Fig. 72‑1). Entre os fatores de virulência presumidos que
podem contribuir para a patogenicidade desse organismo, encontram‑se a resistência dos conídios infecciosos
à destruição  fagocítica,  a  capacidade de  estimular uma  resposta TH2  ineficiente  (similar  a B. dermatitidis),  a
produção de urease e proteinases extracelulares e a capacidade de mimetismo molecular (Tabela 66‑1).
Resistência dos Conídios à Destruição Fagocítica
A fase  saprofítica de C. immitis  (e C. posadasii)  consiste  em  hifas  septadas  que,  quando maduras,  produzem
artroconídios em forma de barril, separados uns dos outros por células disjuntoras vazias (Cap. 65, Fig. 65‑2B;
Cap.  72,  Figs.  72‑1D  e  72‑7).  Os  artroconídios  são  muito  hidrofóbicos  e  facilmente  aerossolizados.  Esses
conídios são pequenos (3 a 5 μm × 2 a 4 μm) e, quando inalados, podem ser transportados profundamente para
o interior no trato respiratório, frequentemente até o nível alveolar. A parede externa do conídio é composta
primariamente  por  proteína  (50%),  incluindo  pequenos  polipeptídeos  ricos  em  cisteína  conhecidos  como
hidrofobinas,  devido  ao  seu distinto perfil  hidropático. O  restante da  composição da parede  inclui  lipídios
(25%), carboidratos (12%) e um pigmento não  identificado. Acredita‑se que essa camada externa hidrofóbica
tenha  propriedades  antifagocíticas,  uma  vez  que  sua  remoção  resultou  no  aumento  da  fagocitose  de
artroconídios de C. immitis por neutrófilos polimorfonucleares (PMN, do inglês, polymorphonuclear neutrophils)
humanos  em  comparação  à  fagocitose  de  artroconídios  intactos.  É  importante  notar  que  tanto  os  conídios
intactos quanto aqueles  com a parede celular  externa  removida não  foram eficientemente destruídos após a
ingestão  por  PMN. Aparentemente,  os  artroconídios  infecciosos  de C. immitis  apresentam  barreiras  ativas  e
passivas contra o ataque pelas defesas inatas do hospedeiro nos pulmões.
Estímulo de uma Resposta Imune TH2 Ineficiente por C. immitis
Sabe‑se  que  todos  os  indivíduos  com  infecções  por  Coccidioides  spp.  produzem  anticorpos  contra  uma
glicoproteína predominante  (SOWgp) de uma camada externa da parede das células parasitárias  (esférulas).
Ambas as vias da resposta  imune por células T auxiliares, TH1 e TH2, são estimuladas por SOWgp. Sabe‑se
que  a  ativação  da  via  TH1  está  associada  à  resolução  espontânea  da  infecção  por  Coccidioides  spp.  em
camundongos.  Além  disso,  foi  demonstrado  que  camundongos  suscetíveis  à  infecção  por  C.  immitis
demonstraram uma resposta TH2 à infecção, enquanto linhagens resistentes apresentaram uma maior resposta
TH1. Assim, semelhantemente ao que foi descrito para B. dermatitidis, as respostas TH2 contra SOWgp podem
não contribuir para a eliminação de C. immitis, podendo até mesmo ser desvantajosas no controle da infecção.
As formas mais graves de coccidioidomicose são acompanhadas por depressão da  imunidade celular e altos
níveis plasmáticos de anticorpos fixadores de complemento específicos para C. immitis,  compatível com uma
resposta  predominantemente  TH2.  Embora  não  se  saiba  muito  a  respeito  do  perfil  de  citocinas  humanas
durante infecções por Coccidioides spp., é razoável especular que antígenos imunodominantes de C. immitis que
provocam  um  forte  aumento  de  IL‑10  e  IL‑4  possam  direcionar  a  resposta  imune  para  uma  via  TH2.  Essa
imunomodulação pode contribuir para o aumento da gravidade da infecção fúngica.
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#f0010
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000656.xhtml#c0325
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000656.xhtml#f0015
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#f0010
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#f0040
Produção de Urease
O nicho ambiental para a forma saprofítica de C. immitis é o solo alcalino do deserto. Tanto a fase saprofítica
quanto  a  parasitária  deste  organismo  demonstraram  íons  amônia  e  amônio  quando  cultivadas  in  vitro,
resultando  na  alcalinização  do  meio  de  cultura.  Os  endosporos  de  C.  immitis  liberam  muito  mais  íons
amônio/amônia  do  que  as  esférulas  quando  cultivadas  em  condições  ácidas  (pH  5,0).  Endosporos  recém‑
liberados demonstraram ser cercados por um halo alcalino produzido pelos íons amônio/amônia.
Os  endosporos  de  C.  immitis  são  rapidamente  fagocitados  por  macrófagos  alveolares,  mas,  uma  vez
ingeridos, são capazes de sobreviver intracelularmente. Foi demonstrado que endosporos intracelulares viáveis
são cercados por um halo alcalino em sua superfície celular, sugerindo que a produção de íons amônio/amônia
pode contribuir para a sobrevivência do patógeno dentro do fagossomo do macrófago ativado.
A capacidade de C. immitis de gerar um microambiente alcalino e  responder à acidificação aumentando a
quantidadede íons amônio/amônia por suas células parasitárias é uma característica que pode contribuir para
a  patogênese  desse  fungo.  Embora  os  detalhes  da  geração  de  amônia  e  o  modo  como  a  alcalinidade  da
superfície celular afetam a função fagocítica não sejam bem compreendidos, foi proposto que a principal fonte
de amônia produzida por C. immitis advenha da atividade da urease. Esta é uma metaloenzima que se localiza
na fração citoplasmática de células microbianas e catalisa a hidrólise de ureia, formando amônia e carbamato.
Na sequência, o carbamato é hidrolisado, formando outra molécula de amônia. A maior quantidade de urease
detectada em C. immitis se encontra em esférulas na fase de formação de endósporos, o que se correlaciona com
o  estágio  de  desenvolvimento  no  qual  as  maiores  quantidades  de  íons  amônia/amônio  são  detectadas.
Consideradas  em  conjunto,  essas  informações  sugerem  que  a  atividade  da  urease  contribui  para  a
patogenicidade de C. immitis.
Proteinases Extracelulares
Os patógenos fúngicos produzem uma série de proteinases ácidas, neutras e alcalinas que são ativas ao longo
de  uma  extensa  faixa  de  pH,  exibindo  ampla  especificidade  de  substratos.  Sugeriu‑se  que  certas  enzimas
extracelulares secretadas por fungos desempenhem funções fundamentais no crescimento invasivo, o que pode
levar  à morte do hospedeiro  infectado. As proteinases  secretadas podem permitir  a penetração de barreiras
cutâneas  e  mucosas,  a  neutralização  parcial  de  defesas  ativas  do  hospedeiro,  a  transmigração  de  camadas
endoteliais  e  a  subsequente  disseminação  hematogênica,  levando  ao  estabelecimento  da  infecção  em  vários
sítios anatômicos.
C.  immitis,  como  um  patógeno  fúngico  primário,  é  capaz  de  romper  a  barreira  da  mucosa  respiratória,
penetrar na corrente sanguínea e/ou no sistema linfático e se disseminar para outros órgãos. Ambas as formas
do fungo, saprofítica (conídio) e parasitária, expressam diversas proteinases durante o crescimento celular. O
conídio produz uma proteinase extracelular de 36 kDa capaz de quebrar o colágeno, a elastina e a hemoglobina
humanos,  bem  como  IgG  e  IgA.  A  clivagem  de  imunoglobulinas  secretórias  por  patógenos  fúngicos
oportunistas  foi  correlacionada  à  capacidade  de  estes  organismos  colonizarem  a  mucosa  do  hospedeiro.
Acredita‑se  que  uma  proteinase  alcalina  de  66  kDa  capaz  de  digerir  proteínas  estruturais  encontradas  no
tecido pulmonar seja secretada durante todo o curso da doença causada por C. immitis. Todos os pacientes com
coccidioidomicose  produzem  anticorpos  dirigidos  contra  essa  enzima,  e  acredita‑se  que  essa  proteinase
alcalina desempenhe uma importante função na colonização e invasão de tecidos do hospedeiro por esférulas e
endósporos de C. immitis.
Mimetismo Molecular
A produção de moléculas por um microrganismo patogênico que são estrutural antigênica e funcionalmente
semelhantes  a moléculas  do  hospedeiro  é  denominada mimetismo molecular.  Em  alguns  casos,  a  infecção
pode resultar na geração de anticorpos que apresentam reação cruzada com tecidos do hospedeiro e produzem
uma  patologia  do  tipo  autoimune.  Foi  demonstrado  que  fungos  produzem  moléculas  semelhantes
funcionalmente,  mas  nem  sempre  estruturalmente,  a  moléculas  do  hospedeiro  (“mimetismo  funcional”).
Foram  identificadas moléculas  fúngicas  que  funcionam  de maneira  similar  às  integrinas,  aos  receptores  de
complemento e aos hormônios sexuais.
Uma  proteína  que  se  liga  ao  estrogênio  foi  isolada  de  frações  citosólicas  de  C.  immitis.  Sabe‑se  que  as
concentrações fisiológicas de progesterona e 17‑β‑estradiol estimulam a taxa de crescimento de C. immitis e a
liberação de endósporos. Estas informações coincidem com o reconhecimento de que a gravidez, especialmente
durante o terceiro trimestre, apresenta um grande fator de risco para coccidioidomicose disseminada.
Histoplasma capsulatum
Sabe‑se que a maioria das pessoas  infectadas por H. capsulatum  se  recupera sem complicações e sem terapia
antifúngica  específica  (Cap.  72).  Entretanto,  a  reativação  da  histoplasmose  pulmonar  e  extrapulmonar  em
pacientes  imunocomprometidos  que  originalmente  apresentaram  disseminação  progressiva  do  fungo  está
documentada ao  longo da  literatura.  Inalação de  conídios  a partir do ambiente,  juntamente  com a  falha em
eliminar  o  fungo  por  mecanismos  mucociliares,  gera  a  oportunidade  de  que  os  conídios  inalados  se
transformem em leveduras que são ingeridas por fagócitos mononucleares. H. capsulatum é encontrado quase
exclusivamente dentro das células do hospedeiro, onde pode se replicar ou permanecer inativo.
Histoplasma capsulatum Reside nos Macrófagos do Hospedeiro
A  conversão  de  conídios  inalados  de  H.  capsulatum  em  células  leveduriformes  é  fundamental  para  a
sobrevivência  do  patógeno  dentro  do  hospedeiro  e  ocorre  horas  após  a  infecção.  Embora  teoricamente  um
único  conídio  possa  ser  suficiente  para  estabelecer  uma  infecção,  geralmente  se  considera  que  um  inóculo
muito  grande  de  conídios  seja  necessário  para  estabelecer  doença  disseminada  em  uma  pessoa  saudável  e
imunocompetente. Os  fagócitos mobilizados para o  sítio de  infecção são efetivos na destruição dos conídios
ingeridos, o que não ocorre tão bem em relação às leveduras.
Sabe‑se que o organismo produz substâncias quimiotáxicas para os macrófagos alveolares, o que facilita a
internalização pelos fagócitos do hospedeiro; entretanto, os detalhes da forma pela qual o patógeno resiste aos
esforços  destrutivos  dos macrófagos  ainda  não  estão  claros.  Sugeriu‑se  que  certos  esfingolipídios  contendo
fosfoinositol  na  parede  celular  possam  interferir  na  resposta  oxidativa  do  macrófago  contra  o  patógeno
fúngico. O  fato  de  os macrófagos  serem  as  principais  células  do  hospedeiro  nas  quais H.  capsulatum  reside
durante a fase de levedura leva a acreditar que seja uma importante estratégia de sobrevivência e disseminação
do patógeno. Existem diversos fatores, considerados importantes para a capacidade de o fungo persistir dentro
do  fagolisossoma  do  macrófago,  que  contribuem  significativamente  para  a  patogenicidade  do  organismo:
modulação de pH, captação de ferro e cálcio e alteração da parede celular da levedura.
Modulação do pH do Fagolisossoma
As  células  leveduriformes  de H.  capsulatum  são  rapidamente  ingeridas  por  macrófagos  alveolares.  Após  a
ingestão, o pH do fagolisossoma contendo uma ou mais células de levedura se eleva (6,0 a 6,5) acima do valor
ideal para muitas das enzimas do lisossomo. Esta modulação de pH não só interfere na atividade enzimática,
mas também influencia no processamento de antígenos dentro da célula e contribui para a sobrevivência do
patógeno  in  vivo.  Embora  seja  tentador  relacionar  a  urease  de  H.  capsulatum  a  este  processo,  ela  não  é
considerada  um  fator  primordial,  uma  vez  que  o  pH  só  se  eleva  em  fagossomos  que  contêm  a  célula  de
levedura.  Se  a  urease  fúngica  estivesse  envolvida,  seria  esperado  que  íons  amônia/amônio  produzidos  se
difundissem para fora do fagossoma e elevassem também o pH no restante da célula do hospedeiro.
Captação de Ferro e Cálcio
O ferro é um importante cofator de diversas metaloenzimas diferentes e proteínas contendo o grupo heme. Os
microrganismos captam ferro do ambiente produzindo sideróforos, que provocam a quelação do ferro férrico e
formam complexos solúveis de ferro. H. capsulatum capta ferro através de um sideróforo hidroxâmico, embora
o papel deste sideróforo na sobrevivência do fungo dentro do macrófago seja desconhecido. A capacidade do
fungo de modular o pH no interior do fagolisossoma entre 6,0 e 6,5 é fundamental na captação de ferro pelas
leveduras. Um pH superior a 6,5 torna o ferro inacessível ao H. capsulatum.
Da mesma maneiraque  ocorre  com o  ferro,  as  leveduras  dentro  do  fagolisossoma devem  apresentar  um
eficiente mecanismo para a ligação e o transporte de Ca2+. As células leveduriformes, mas não as filamentosas,
liberam grandes quantidades de uma proteína ligadora de cálcio, CBP1 (do inglês, calcium‑binding protein), para
o microambiente  que  as  rodeia.  Foi  sugerido  que  a  CBP1  seja  importante  na  aquisição  de  cálcio  durante  o
parasitismo intracelular. A expressão de CBP1 específica da fase de levedura pode fornecer ao H. capsulatum
outro importante mecanismo adaptativo para sua sobrevivência dentro do fagolisossoma do macrófago.
Alteração da Composição da Parede Celular da Levedura
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000723.xhtml#c0360
De modo semelhante ao B. dermatitidis, a maior parte das cepas de H. capsulatum apresenta a 1,3‑α‑glucana em
sua parede celular. Demonstrou‑se que mutantes espontâneos de H. capsulatum que perderam o componente
1,3‑α‑glucana  infectam  e  persistem  no  interior  dos  macrófagos  aparentemente  sem  lesar  a  célula  do
hospedeiro. Em contraste, cepas selvagens de leveduras com 1,3‑α‑glucana podem infectar e sobreviver dentro
dos macrófagos, mas  também podem proliferar‑se dentro do  fagolisossoma e finalmente destruir o  fagócito,
liberando  leveduras  que  passam  a  infectar  novos  macrófagos.  Portanto,  aparentemente  microambientes
específicos  encontrados  dentro  de  células  do  hospedeiro  podem  influenciar  a  seleção  de  variantes  que
apresentam  o  potencial  para  a  persistência  de  longo  prazo  dentro  do  hospedeiro,  bem  como  daqueles  que
produzem um processo proliferativo mais rápido.
Paracoccidioides brasiliensis
A  infecção  por  P.  brasiliensis  começa  com  a  inalação  pulmonar  de  conídios,  seguida  pela  disseminação
hematogênica ou linfática do fungo para praticamente todas as partes do corpo (Cap. 72). Uma característica
peculiar da paracoccidioidomicose, em comparação com outras micoses sistêmicas, é o fato de que as infecções
pulmonares  primárias,  que  subsequentemente  se  disseminam,  manifestam‑se  muito  frequentemente  como
lesões de mucosa na boca, no nariz e, ocasionalmente, no trato gastrointestinal.
A parede da levedura de P. brasiliensis é rica em glucanas solúveis em meio alcalino, como a 1,3‑α‑glucana.
Como ocorre com muitos outros patógenos fúngicos dimórficos endêmicos, acredita‑se que a presença de 1,3‑
α‑glucana na camada mais externa da parede celular da levedura seja essencial para a sobrevivência do fungo
in vivo. Aparentemente, os macrófagos são elementos fundamentais para a resposta inata contra a infecção por
P. brasiliensis. Os macrófagos são capazes de conter a infecção por P. brasiliensis, mas geralmente não eliminam
as leveduras. Apesar de uma resolução clínica inicial da infecção, lesões residuais contendo leveduras viáveis
podem  se  reativar  até  40  anos  depois,  causando  recorrência  e  sequelas  graves.  As  características  de  P.
brasiliensis  consideradas  importantes  na  patogênese  da  infecção  incluem  a  resposta  a  fatores  hormonais,  a
expressão de 1,3‑α‑glucana e as respostas imunes contra um antígeno imunodominante, gp43.
Influências Hormonais na Infecção
Embora a reatividade do teste cutâneo para a paracoccidioidina seja comparável entre homens e mulheres que
residem  em  áreas  endêmicas  da  paracoccidioidomicose,  a  relação  entre  homens  e mulheres  para  a  doença
sintomática  é  de  78:1.  A  infecção  subclínica  parece  ocorrer  com  a  mesma  frequência  entre  os  dois  sexos;
entretanto, a progressão para a doença disseminada clinicamente evidente é muito mais frequente em homens.
Esta observação levou à hipótese de que fatores hormonais desempenhem um importante papel na patogênese
da paracoccidioidomicose.
Em  contraste  com  C.  immitis,  no  qual  o  estrogênio  estimula  o  crescimento  fúngico  e  a  formação  de
endósporos, a transição de conídios para a forma de levedura de P. brasiliensis é  inibida pelo estrogênio. Isto
resulta na rápida eliminação da infecção em mulheres, enquanto em homens ocorre a progressão da infecção.
Uma  explicação  alternativa  seria  a  de  que  os  hormônios  sexuais  masculinos  apresentam  um  efeito
imunoinibitório que facilita o estabelecimento da infecção. Esta ainda é uma área em investigação. De qualquer
maneira,  os  eventos  iniciais  da  interação  fungo‑hospedeiro  após  a  infecção  natural  parecem  ser modulados
pelos  hormônios,  sendo,  portanto,  significativamente  diferentes  em  homens  e  mulheres.  Essas  diferenças
poderiam  ser  responsáveis  pela  suscetibilidade  acentuadamente  superior  entre  homens  para  a
paracoccidioidomicose.
O Papel das Glucanas da Parede Celular na Patogênese de P. brasiliensis
A parede celular de P. brasiliensis contém quatro polissacarídeos principais: galactomanana, 1,3‑α‑glucana, 1,3‑
β‑glucana  e  quitina. O  componente  1,3‑α‑glucana  só  é  expresso  na  forma de  levedura do  organismo,  e  sua
expressão se correlaciona com sua virulência. Cepas mutantes de P. brasiliensis desprovidas dessa glucana não
são virulentas, sendo muito mais suscetíveis à digestão por neutrófilos.
A  fração  1,3‑β‑glucana  da  parede  celular  age  como  importante  imunomodulador  e,  quando  exposta  na
parede celular do fungo, provoca uma intensa resposta inflamatória. As β‑glucanas são descobertas quando os
níveis de 1,3‑α‑glucana se  reduzem, o que  levou à hipótese de que a proporção entre 1,3‑α‑glucana e 1,3‑β‑
glucana na parede celular de P. brasiliensis possa ser mais importante na patogênese do que cada componente
polissacarídico  isoladamente. É  importante perceber que a  relação entre a  razão de α‑/β glucanas na parede
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celular  de P.  brasiliensis  e  o  tipo  de  resposta  imune  é  semelhante  àquela  observada  tanto  na  histoplasmose
quanto na blastomicose. Em cada caso, um grande conteúdo de 1,3‑α‑glucana nas leveduras está relacionado a
uma virulência aumentada, e níveis ausentes ou diminuídos deste componente relacionam‑se a uma virulência
reduzida. A alteração na composição da parede celular de  leveduras dos  três patógenos dimórficos  também
está relacionada à sua capacidade de eles serem sequestrados dentro das células e dos tecidos e de persistirem
como elementos viáveis durante anos após a infecção.
Resposta ao Antígeno Imunodominante, gp43
A fase de  levedura de P. brasiliensis  secreta uma glicoproteína  imunodominante de 43 kDa  (gp43), que é  ao
mesmo tempo um importante antígeno sorodiagnóstico e um presumido fator de virulência. O antígeno gp43 é
um receptor de laminina‑1 e pode ser responsável pela adesão das células de leveduras à membrana basal do
hospedeiro. Este antígeno  também se  liga a macrófagos e provoca  tanto uma forte resposta humoral quanto
uma resposta de hipersensibilidade tipo tardia (HTT) em humanos.
A defesa imunológica contra a infecção por P. brasiliensis depende da imunidade celular e não da humoral.
Uma  resposta da HTT debilitada  se  correlaciona  com um aumento da gravidade da doença. Camundongos
imunizados  com  gp43  desenvolvem  respostas  imunes  tipos  TH1  e  TH2,  enquanto  gp43  e  um  segundo
antígeno,  gp70,  são  grandes  contribuintes  para  uma  resposta  humoral  em  humanos.  É  possível  que  a
reatividade imune de pacientes contra gp43 e gp70 seja dominada pela via TH2 com uma resposta inadequada
de células T. Caso a imunidade celular do paciente contra P. brasiliensis esteja de fato comprometida por essa
hiporresponsividade  de  células  T,  este  poderia  ser  um  mecanismo  (como  visto  na  histoplasmose  e
coccidioidomicose) subjacente à imunopatogênese da paracoccidioidomicose.
Patógenos Oportunistas
O  estado  do  hospedeiro  é  de  fundamental  importância  na  determinação  da  patogenicidade  de  patógenos
fúngicos  oportunistas,  comoCandida  spp.,  C.  neoformans  e  Aspergillus  spp.  Na  maioria  dos  casos,  esses
organismos podem existir como colonizadores benignos ou saprófitas ambientais, só causando infecções sérias
quando há uma diminuição das  defesas  do  hospedeiro.  Existem  fatores  associados  a  estes  organismos,  que
podem ser  considerados  “fatores de virulência”, por  contribuírem para o processo patológico,  e,  em alguns
casos, que podem explicar as diferenças entre as patogenicidades dos diversos organismos.
Espécies de Candida
Candida  spp.  são  os  mais  comuns  dos  patógenos  fúngicos  oportunistas  (Cap.  73).  Atualmente  está  bem
estabelecido o  fato de que Candida  spp. colonizam a mucosa gastrointestinal e atingem a corrente sanguínea
por translocação gastrointestinal ou através de cateteres vasculares contaminados,  interagem com defesas do
hospedeiro e deixam o compartimento intravascular invadindo tecidos profundos de órgãos‑alvo como fígado,
baço,  rins,  coração  e  cérebro. Acredita‑se  que  as  características  do microrganismo que  contribuem para  sua
patogenicidade incluam sua capacidade de aderir a tecidos, o dimorfismo entre as formas de levedura e hifa, a
hidrofobicidade de sua superfície celular, a secreção de proteinases e as mudanças fenotípicas (Tabela 66‑1).
A  capacidade  de  aderência  de  Candida  spp.  a  diversos  tecidos  e  superfícies  inanimadas  é  considerada
importante  nos  estágios  iniciais  da  infecção. A  capacidade  de  aderência  de  várias  espécies  de  Candida  está
diretamente  relacionada  ao  seu  grau  de  virulência  em  diversos  modelos  experimentais.  A  aderência  é
adquirida por uma combinação de mecanismos específicos (interação ligante‑receptor) e  inespecíficos (forças
eletrostáticas e de van der Waals).
Há muito  tempo se  considera que a  capacidade de  sofrer  transformação de  leveduras para hifa apresente
alguma  importância  na  patogenicidade.  A  maioria  das  espécies  de  Candida  é  capaz  de  realizar  essa
transformação,  que  demonstrou  ser  regulada  tanto  por  pH  quanto  por  temperatura.  A  transformação  de
levedura em hifa é uma resposta de Candida spp. a alterações no microambiente. As hifas de C. albicans exibem
tigmotropismo  (um sentido de  tato), que  lhes permite crescer ao  longo de depressões ou através de poros e
pode auxiliar na infiltração de superfícies epiteliais.
A composição da superfície celular de Candida spp. pode afetar tanto a hidrofobicidade da célula quanto a
resposta  imune  contra  ela.  O  tipo  e  o  grau  de  glicosilação  das manoproteínas  na  superfície  celular  podem
afetar a hidrofobicidade da célula e, portanto, a adesão a células epiteliais. Os tubos germinativos de C. albicans
são  hidrofóbicos,  enquanto  os  brotos  ou  blastoconídios  são  hidrofílicos.  As  diversas  glicoproteínas  de  C.
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000735.xhtml#c0365
albicans  também  suprimem  a  resposta  imune  contra  o  organismo  por  meio  de  mecanismos  pouco
compreendidos.
Conforme  discutido  em  relação  aos  patógenos  primários,  a  capacidade  de Candida  spp.  secretar  diversas
enzimas  pode  também  influenciar  a  patogenicidade  do  organismo.  Diversas  espécies  de  Candida  secretam
aspartil  proteinases  que  hidrolisam  as  proteínas  do  hospedeiro  envolvidas  em  defesas  contra  a  infecção,
permitindo  que  as  leveduras  rompam  barreiras  de  tecido  conjuntivo.  Da  mesma  maneira,  a  maioria  das
espécies de Candida que causam infecção em humanos produz fosfolipases. Estas enzimas lesam as células do
hospedeiro, sendo consideradas importantes na invasão tecidual.
A  capacidade  de Candida  spp.  transformarem‑se  rapidamente  de  um morfotipo  a  outro  foi  denominada
mudanças fenotípicas. Embora originalmente aplicada a alterações na morfologia macroscópica de colônias, já
se  sabe  que  os  diferentes  fenótipos  observados  em  meios  de  cultura  sólidos  representam  diferenças  na
formação  de  brotamentos  e  hifas,  expressão  de  glicoproteínas  de  parede  celular,  secreção  de  enzimas
proteolíticas,  suscetibilidade  à  lesão  oxidativa  por  neutrófilos  e  suscetibilidade  e  resistência  a  antifúngicos.
Mudanças fenotípicas contribuem para a virulência de Candida spp. por permitir que o organismo se adapte
rapidamente  à  alteração  em  seu microambiente,  facilitando  sua  capacidade de  sobreviver,  invadir  tecidos  e
escapar das defesas do hospedeiro.
Cryptococcus neoformans
C.  neoformans.  é  uma  levedura  encapsulada  com  distribuição  universal,  que  causa  infecção  em  humanos.
Embora  este  organismo  possa  infectar  hospedeiros  aparentemente  normais,  ele  causa  doença  com  mais
frequência e gravidade em hospedeiros imunocomprometidos. Ao se analisar a patogênese da criptococose, é
útil considerar tanto as defesas do hospedeiro quanto os fatores de virulência presumidos.
Existem três linhas de defesa principais contra a infecção por C. neoformans: macrófagos alveolares, células
fagocíticas inflamatórias e resposta de células T e B. O desenvolvimento da criptococose depende amplamente
da competência das defesas celulares do hospedeiro e do número e da virulência das leveduras inaladas.
A primeira linha de defesa são os macrófagos alveolares. Estas células são capazes de ingerir as células de
leveduras, mas apresentam uma capacidade limitada de destruí‑las. Os macrófagos que contêm as leveduras
ingeridas produzem várias citocinas para o  recrutamento de neutrófilos, monócitos,  células NK e células da
corrente sanguínea para os pulmões. Eles também agem como células apresentadoras de antígenos e induzem
à diferenciação e proliferação de linfócitos T e B que são específicos para C. neoformans. As células recrutadas
são eficientes na destruição de C. neoformans por mecanismos  intra  e  extracelulares  (tanto oxidativos quanto
não oxidativos).
A  resposta  de  anticorpos  contra  este  organismo  não  é  protetora,  mas  serve  para  opsonizar  as  células
leveduriformes,  aumentando  a  citotoxicidade mediada  por  células.  Dessa maneira,  o  sistema  complemento
aumenta a eficácia da resposta de anticorpos e fornece opsoninas e fatores quimiotáxicos para a fagocitose e o
recrutamento de células inflamatórias.
Uma  resposta  efetiva do hospedeiro  contra C. neoformans  consiste  em uma  interação  complexa  de  fatores
imunes celulares e humorais. Quando esses fatores são prejudicados, a infecção se dissemina, geralmente por
migração  de  macrófagos  contendo  células  de  levedura  viáveis,  a  partir  do  pulmão  para  os  linfáticos  e  da
corrente sanguínea até o cérebro.
Os  principais  fatores  inerentes  ao  C.  neoformans  que  permitem  que  a  levedura  invada  as  defesas  do
hospedeiro e estabeleça a infecção incluem a capacidade de crescer a 37 °C, produzir uma espessa cápsula de
polissacarídeos, sintetizar melanina e apresentar um fenótipo do tipo MATalfa (Tabela 66‑1).
A cápsula de C. neoformans protege a célula da fagocitose e de citocinas induzidas pelo processo fagocítico e
suprime  tanto  a  imunidade  celular  quanto  a  humoral.  A  cápsula  pode  bloquear  fisicamente  o  efeito
opsonizante do complemento e anticorpos anticriptococos, e a alteração negativa que ela confere produz uma
repulsão  eletrostática  entre  as  células  leveduriformes  e  as  células  do  hospedeiro.  Além  disso,  o  material
capsular  interfere na  apresentação de  antígenos  e  limita  a produção de óxido nítrico  (tóxico para  as  células
criptococócicas) pelas células do hospedeiro.
O fungo produz melanina por meio de uma enzima fenoloxidase ligada à membrana e a deposita na parede
celular. Acredita‑se que a melanina aprimore a integridade da parede celular e aumente a carga total negativa
da  célula,  protegendo‑a  ainda mais  contra  a  fagocitose.  Estima‑se  que  a melanização  seja  responsável  pelo
neurotropismo  de  C.  neoformans  e  possa  proteger  a  célulade  estresse  oxidativo,  temperaturas  extremas,
redução de ferro e peptídeos microbicidas.
O  fenótipo MATalfa está associado à presença do gene STE12alfa, que demonstrou ser um modulador da
expressão de vários outros genes cujas funções são importantes para a produção da cápsula e melanina.
Espécies de Aspergillus
A aspergilose é a mais comum infecção invasiva por fungos filamentosos em todo o mundo. Aspergillus spp.
são  saprófitos  ubíquos  na  natureza,  podendo  ser  encontrados  no  solo,  em  vasos  de  plantas,  vegetação  em
decomposição,  pimenta  e  áreas  de  construção.  Aspergillus  spp.  podem  causar  doença  em  humanos  pela
colonização  de  vias  aéreas  com  subsequentes  reações  alérgicas,  pela  colonização  de  cavidade  preexistente
(aspergiloma) ou por invasão tecidual.
A via primária de infecção na aspergilose é a inalação de conídios por aerossol (2,5 a 3 μm) que se depositam
nos  pulmões,  nasofaringe  ou  seios  paranasais.  Nos  pulmões,  os  macrófagos  alveolares  e  neutrófilos
desempenham papel fundamental na defesa do hospedeiro contra Aspergillus  spp. Os macrófagos  ingerem e
destroem os conídios, enquanto os neutrófilos aderem e destroem as hifas que crescem após a germinação dos
conídios.  As  hifas  que  não  são  destruídas  podem  invadir  o  tecido  pulmonar  e  a  vasculatura,  levando  a
trombose e necrose tecidual local, bem como à disseminação hematogênica para outros órgãos‑alvo (cérebro).
Aspergillus  spp.  secretam  muitos  produtos  metabólicos,  como  gliotoxinas  e  várias  enzimas,  incluindo
elastase,  fosfolipases,  diversas  proteases  e  catalase,  que podem  ter  uma  importante  função  na  virulência. A
gliotoxina inibe a fagocitose por macrófagos e a ativação e proliferação de células T; entretanto, não se sabe se
são produzidas quantidades clinicamente significativas de gliotoxinas na doença humana.
Conídios  de Aspergillus  fumigatus  se  ligam  ao  fibrinogênio  humano,  bem  como  à  laminina  na membrana
basal alveolar. Acredita‑se que este seja um importante primeiro passo que permite ao fungo se estabelecer em
tecidos do hospedeiro. A ligação ao fibrinogênio e laminina poderia facilitar a aderência de conídios, enquanto
a secreção de elastases e proteases ácidas poderia auxiliar na invasão de células do hospedeiro pelas hifas.
A  aspergilose  invasiva  está  altamente  associada  à  neutropenia  e  à  deficiência  na  função  neutrofílica.  Os
conídios de Aspergillus  resistem à destruição por neutrófilos, mas  os  conídios  em germinação  e  as  hifas  são
rapidamente destruídos. Na doença granulomatosa crônica, os neutrófilos são  incapazes de gerar a explosão
respiratória  para  destruir microrganismos  produtores  de  catalase. Aspergillus  spp.  produzem  catalase,  uma
enzima que quebra o peróxido de hidrogênio. A  forte  associação  entre  aspergilose  e doença granulomatosa
crônica  ressalta a  importância da  função neutrofílica na defesa do hospedeiro contra a aspergilose e  fornece
evidências indiretas para a catalase como um fator de virulência. É geralmente aceito que o risco aumentado de
aspergilose em indivíduos que recebem altas doses de corticosteroides seja devido à deficiência na função de
macrófagos  e,  talvez,  de  células  T.  Além  disso,  foi  demonstrado  que  os  corticosteroides  estimulam  o
crescimento  de Aspergillus  spp.  em meios  de  cultura. Não  se  sabe  se Aspergillus  spp.  apresentam proteínas
específicas de ligação a esteroides análogas àquelas encontradas em outros fungos.
Questões
1. O que distingue um patógeno primário de um patógeno oportunista?
2. Quais são os temas comuns vistos na patogênese dos patógenos fúngicos primários?
3. Qual é a mais importante linha de defesa contra os fungos dimórficos endêmicos?
4. Qual fator de virulência presumido é comum tanto aos patógenos fúngicos primários quanto aos
oportunistas discutidos neste capítulo?
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Nemecek, J. C., et al. Global control of dimorphism and virulence in fungi. Science. 2006; 312:583–588.
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O Papel dos Fungos na Doença
Um  resumo  dos  fungos  (leveduras  e  fungos  filamentosos)  mais  comumente  associados  com  a  doença
humana  é  apresentado  neste  capítulo.  As  doenças  micóticas  humanas  se  desenvolvem  como  processos
patogênicos  em  um  ou  mais  sistemas  de  órgãos.  Os  sistemas  afetados  podem  ser  tanto  as  camadas  mais
externas  da  pele  quanto  as  superficiais  ou  profundas  como  o  coração,  o  sistema  nervoso  central  ou  trato
gastrointestinal. Embora um único fungo possa estar mais comumente associado com a infecção de um único
sistema  orgânico  (p.  ex., Cryptococcus  neoformans  em  sistema  nervoso  central),  mais  frequentemente  vários
organismos  distintos  podem  produzir  uma  síndrome  diferente  de  acordo  com  o  agente  etiológico,  para
orientar  o diagnóstico  subsequente  e  os  esforços  terapêuticos,  é útil  desenvolver um diagnóstico diferencial
que inclua os mais prováveis patógenos fúngicos.
Como  o  desenvolvimento  de  uma  infecção  fúngica  depende  de  fatores  que,  com  frequência,  são  mais
importantes do que o potencial de virulência do organismo infectante, é preciso considerar numerosos fatores,
tais como o estado imune do hospedeiro, a oportunidade para a interação entre o fungo e o hospedeiro (p. ex.,
o  fungo é endógeno ou exógeno  ao  paciente?)  e  a  carga  infectante  (p.  ex.,  no  caso  de  um  fungo  dimórfico
endêmico)  para  a  determinação  da  possibilidade  de  uma  infecção  fúngica,  o  significado  dos  dados
microbiológicos  (p.  ex.,  resultados da  cultura)  e  a necessidade de  tratar  e  com qual  agente. Muitas vezes  as
infecções fúngicas ocorrem em pacientes gravemente debilitados, e não é possível resumir aqui as interações
complexas  que,  em  última  análise,  levam  ao  estabelecimento  da  infecção  e  da  doença  em  cada  indivíduo.
Como alternativa, este capítulo fornece uma lista bastante ampla dos vários fungos comumente associados a
infecções em locais específicos do corpo e/ou manifestações clínicas específicas (Tabela 67‑1). Estas informações
visam à utilização  conjunta  com aquelas do Capítulo 68, Tabela  68‑1,  como  um  auxílio  para  estabelecer  um
diagnóstico  diferencial  e  para  a  seleção  das  amostras  clínicas mais  prováveis  que  ajudarão  a  estabelecer  o
diagnóstico  etiológico  específico. Outros  fatores  que podem  ser  importantes  na determinação da  frequência
relativa com que  fungos específicos causam doença  (p.  ex.,  idade,  comorbidades,  imunidade do hospedeiro,
epidemiologia das micoses e fatores de risco) são abordados nos capítulos individuais neste texto ou nos textos
de doenças infecciosas mais abrangentes citados neste e em outros capítulos.
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000681.xhtml#c0340
https://www.evolution.com.br/contentresolver/epub/66487/OEBPS/xhtml/B9788535271065000681.xhtml#t0010
Tabela 67­1
Resumo dos Fungos Associados à Doença Humana
Sistema Afetado Patógenos
Infecções do Trato Aéreo Superior
Orofaringe Candida spp., Cryptococcus neoformans, Histoplasma capsulatum, Blastomyces dermatitidis, Paracoccidioides
brasiliensis, Penicillium marneffei, Geotrichum candidum
Sinusite Aspergillus spp., Mucormycetes, Fusarium spp., fungos

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