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6ºAula Interpretação e compreensão de textos: aspectos teóricos Objetivos de aprendizagem Ao término desta aula, vocês serão capazes de: • Compreender a diferença entre interpretação e compreensão; Olá pessoal, tudo bem? Chegamos em nossa sexta aula intitulada Interpretação e compreensão de textos: aspectos teóricos. Aqui, discutiremos algumas técnicas, bem como conceitos fundamentais para a interpretação e compreensão de textos. O objetivo é muni-los de algumas abordagens teóricas que facilitem a prática e tornem os processos mencionados eficazes. Vamos lá? Bons estudos! 32 1 – Interpretar e compreender: qual a diferença 2 – Sentido literal e sentido figurado Seções de estudo 1 - Interpretar e compreender: qual a diferença Para iniciarmos nossas discussões, é necessário que reflitamos sobre os conceitos-chaves de nosso curso: Interpretação e Compreensão. Muitas vezes, o senso comum toma as duas palavras como sinônimas, o que é incorreto. É preciso que entendamos que possuem definições distintas. Vamos ao dicionário? Podemos perceber, a partir das definições do conceito, que os dois termos têm sentidos diferentes. A interpretação, por exemplo, diz respeito à versão, à explicação, a julgamento. Já a compreensão diz respeito à significação, à delimitação da palavra, opondo-se à extensão. Entendemos, então, que a compreensão delimita-se em relação à palavra, enquanto que a intepretação estende-se em seu significado, obviamente, respeitando determinados limites, estabelecidos social, temporal e historicamente. Vejamos a imagem abaixo: Na imagem, podemos notar que a interpretação engloba a compreensão, mas que é delimitada pelo contexto social, temporal e histórico. Para interpretarmos um texto, então, precisamos, antes compreendê-los, no entanto, tal interpretação precisa estar delimitado quanto ao contexto social, temporal e histórico. Vejamos a discussão de Vilson Leffa (s.d.) para explanar tais conceitos: COMPREEENSÃO INTERPRETAÇÃO 1 – Sentido em que se toma o que se ouve ou o que se lê, e que se julga ser o verdadeiro. 2 – Explicação. 3 – Desempenho (do papel pelo ator). 4 – Comentário, versão. <http://dicionariodoaurelio.com/ interpretacao>. 1 – Faculdade de compreender. 2 – Signifi cação da palavra (em oposição a extensão): a compre- ensão está na razão inversa da extensão. 3 – Sinédoque. <http://dicionariodoaurelio.com/ com - preensao>. COMPREENSÃO A base conceitual da interpretação de texto é a compreensão. A etimologia, ainda que não seja um recurso confi ável para estabelecer o signifi cado das palavras, pode ser útil aqui, para mostrar a diferença entre compreender e interpretar. “Compreender” vem de duas palavras latinas: “cum”, que signifi ca “junto” e “prehendere” que signifi ca “pegar”. Compreender é, portanto, “pegar junto”. Essa ideia de juntar é óbvia em uma das principais acepções do verbo compreender: ser composto de dois ou mais elementos, ou seja, abarcar, envolver, abranger, incluir. Vejamos alguns exemplos para ilustrar essa acepção: “O ensino da língua compreende o estudo da fala e da escrita. A gramática tradicional compreende o estudo da fonologia, da morfologia, da sintaxe e da semântica. A leitura compreende o contato do leitor com vários textos”. A outra acepção de compreender é entender, perceber, alcançar com a inteligência. Essa é a acepção que está mais próxima do tema abordado aqui. A ideia de “pegar junto” também cabe nessa acepção: o leitor não pega o texto sozinho; quando ele começa a ler, tudo vem junto. O leitor, numa das pontas, é o leitor e suas circunstâncias, mas o texto, na outra ponta, é também o texto e suas circunstâncias. Ou seja, existem ao redor do leitor e ao redor do texto, contextos que os envolvem, formando camadas de signifi cação que viabilizam a compreensão. Nem o leitor nem o texto estão isolados dos contextos que os envolvem. O leitor sozinho é uma impossibilidade teórica. O texto sozinho não tem sentido; é apenas um amontoado de rabiscos no papel ou uma grande sequência de minúsculos pixels na tela do monitor. Leitor e texto só existem quando se encontram no momento da leitura. Antes ou depois desse momento, são apenas potencialidades. Conforme Rosenblatt, “Cada leitura é uma transação que ocorre entre o leitor e o texto em um determinado momento e lugar. (...) O sentido não está pronto nem dentro do texto nem dentro do leitor, mas surge durante a transação”. (ROSENBLATT, 2004, p. 1369) Começando com o leitor, vejamos brevemente alguns dos elementos característicos de seu contexto, elementos que ele precisa mobilizar para que a compreensão aconteça. Partindo da literatura da área (ex.: KLEIMAN, 1999), o que se percebe é que esses elementos formam determinados conhecimentos, incluindo, entre outros, o cultural, o linguístico, o textual e o conhecimento de mundo (KOCH & TRAVAGLIA, 1990). Em outras palavras, o leitor não pode chegar sozinho ao texto; traz com ele o seu mundo, sua experiência de vida, as competências que já acumulou. A leitura é uma espécie de doação recíproca: o sentido não é simplesmente dado ao leitor; é trocado por algo que ele deve trazer. Se o leitor chegar ao texto de mãos vazias, nada leva. Neste trabalho, propõe-se que a compreensão envolve quatro competências: (1) tradução do código, (2) montagem do quebra cabeça, (3) evocação do saber construído e (4) planejamento das estratégias [...] INTERPRETAÇÃO Etimologicamente a palavra “interpretar” vem do latim “interpes”, que se referia à pessoa que examinava as entranhas de um animal para prever o futuro. Do ponto de vista da leitura, há um pressuposto interessante aqui: o signifi cado daquilo que é lido não está na cabeça do interpres, do adivinho, mas contido no objeto. O interpres não pode atribuir um signifi cado, não pode tirar algo de dentro de si para depositar no objeto; pode apenas extrair o signifi cado que já está dentro do animal. Uma atribuição de sentido seria não só uma impostura, mas seria também negar ao interpres a capacidade de leitura; ele não inventa e nem cria, 33 2 - Sentido literal e sentido fi gurado ele apenas reproduz o que supostamente preexiste na sua frente. Em suma, para o interpres, o signifi cado emerge do pró- prio objeto em direção ao leitor. Essa ideia de extração de signifi cado permanece até hoje, quando se trata de ler o futuro nos objetos. Dizemos, por exemplo, que “as cartas não mentem jamais”; ou seja, a verdade está nas cartas e não em quem as lê. Isso serve também para os búzios ou a bola de cristal. Variam os objetos e os nomes que se dão a esses leitores do futuro (cartomante, pitonisa, quiromante, jogador de búzios, etc.), mas a leitura que todos fazem é sempre a mesma. Nenhum adivinho, nenhum intérprete pode atribuir um signifi cado ao objeto que ele usa para sua leitura, seja a mão, uma concha, uma carta ou uma bola de cristal. “Quem interpreta normalmente atua como se estivesse a desvendar os sentidos contidos no texto. A crença de que o sentido é imanente ao objeto faz parte do exercício de quase toda atividade de interpretação”. (COSTA, 2008, p. 11) Quem interpreta faz uma leitura de mão única, recebendo passivamente as informações, sem voz para interagir ou dialogar com o texto. É alimentado diretamente pelo que lê, à semelhança de um paciente entubado no hospital, que se sustenta pela sonda, sem oportunidade de apreciar ou mesmo deglutir o alimento. Fonte: <http://www.leff a.pro.br/textos/trabalhos/interpretar_ compreender.pdf>. Acesso em 31 de ago. 2015. Para ilustrar as discussões feitas até agora, vamos ler uma tira de Mafalda? Na tirinha, temos um diálogo entre Miguelito e Mafalda que pode nos auxiliar no entendimento da diferença entre compreensão e interpretação. Miguelito leva ao pé da letra a expressão “Ficar sentado esperando alguma coisa da vida”. Não entende que, muitas vezes, tal expressão é usada de modo metafórico. Miguelito faz o usoda compreensão no entendimento da referida expressão. Já Mafalda a leva para o plano da interpretação quando percebe o uso metafórico da expressão, ao associá-la com a situação do mundo. Figura 5: Mafalda. Disponível em: <http://tirasdemafalda.tumblr.com/>. Acesso em 12 ago 2015. Figura 8: Ironia. Fonte: <https://literarizando.wordpress.com/2011/04/11/fi guras- de-linguagem-ironia-e- eufemismo/>. Acesso em 12 ago 2015. Figura 6: Mafalda. Disponível em: <http://tirasdemafalda.tumblr.com/>. Acesso em 12 ago 2015. Figura 7: Sentido literal. Fonte: <http://saladeauladivertida.blogspot. com.br/2011/08/sentido-fi gurado-ou- denotativo.html>. Acesso em 12 ago 2015. Na segunda tirinha Mafalda e Suzanita estão estudando palavras formadas a partir da letra F. Aqui, para entendermos, precisamos, necessariamente, associar com a interpretação, visto que Mafalda provoca uma reação em Suzanita ao mencionar o nome Fidel. Para fazermos a interpretação, precisamos saber o contexto político em que se insere os escritos de Quino, autor de Mafalda. Mafalda é uma personagem criada pelo argentino Quino. Com uma veia política bastante forte, Mafalda é uma menina crítica e reflexiva, por meio da qual Quino, seu criador, tantas vezes manifesta opiniões políticas veementes a respeito dos anos 60 do século XX, no qual se situa historicamente. Diante do exposto, vamos verificar outros conceitos fundamentais para ampliar nossos conhecimentos acerca das temáticas abordadas. Dois conceitos fundamentais para a interpretação e compreensão de texto são o sentido literal e figurado. • O sentido literal (ou denotativo) é o significado exato das palavras e dos enunciados. • O sentido figurado (ou conotativo) é o significado adquirido em situações particulares da língua, originando novos significados. Ironia: A ironia é muito utilizada em diferentes gêneros textuais. É fundamental associarmos ao contexto para podermos compreender. Veja o exemplo: Humor O humor também é outro conceito necessário à interpretação de textos. Se não interpretamos o humor presente não conseguimos entendê- lo adequadamente. 34 Figura 10: <https://peloburacodaagulha.wordpress.com/category/tirinhas/>. Acesso em 31 de ago. 2015. É possível percebermos que a tirinha de Hagar expõe uma situação que abre possibilidade para duas interpretações. Ao escolher a opção menos provável, Hagar provoca o humor por meio de sua fala. Não podemos dizer, então, que a interpretação feita por Hagar esteja completamente errada, mas a inadequação ao contexto provoca o estranhamento no leitor. Polissemia Também fundamental para a interpretação de textos é o conceito de polissemia. Diversas palavras em nosso idioma possuem diferentes significados. Ao dispor de possibilidades de sentido diferentes para uma mesma palavra ou expressão, muitas vezes, ocorrem ruídos na interpretação. Vejamos o exemplo da palavra linha: Figura 9: Humor. Fonte: <http://baudoluizinho.blogspot.com.br/2012/04/essa- carne-como-nao.html>. Acesso em 12 ago 2015. Ideia central e ideias periféricas De acordo com Adriano Alves (2014), é fundamental não confundirmos a ideia central com as ideias periféricas. Constantemente, ao lermos, tomamos uma parte ou um pensamento refletido no texto como sendo a ideia principal. Para evitarmos tal erro, é necessário treinarmos o nosso olhar para identificarmos tais ideias nos textos. Vamos ver um exemplo citado pelo autor? Não há vagas Ferreira Gullar O preço do feijão Não cabem no poema. O preço Do arroz Não cabe no poema. Não cabem no poema o gás A luz o telefone A sonegação Do leite Da carne Do açúcar Do pão O funcionário público Não cabe no poema Com seu salário de fome Sua vida fechada Em arquivos. Como não cabe no poema o operário que esmerila seu dia de aço e carvão nas ofi cinas escuras - porque o poema, senhores, Está fechado ‘não há vagas Só cabe no poema O homem sem estômago A mulher de nuvens A fruta sem preço O poema, senhores, Não fede Nem cheira (GULLAR, F. Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004, p. 162) O poema de Ferreira Gullar traça importantes críticas. Vamos acompanhar a análise empreendida por Alves (2014). Qual é a temática principal do texto acima? Esse famoso poema de Ferreira Gullar já esteve presente em vários exames seletivos; ao interpretá-lo, os candidatos, em sua maioria, têm dificuldade em descobrir a ideia principal. Como o poema fala de “preço do feijão”, “ preço do arroz”, “funcionário público” etc., o leitor é tentado a imaginar que o texto trabalhe a temática social como principal. Não! Essa temática é a secundária! Os versos de Ferreira Gullar têm como foco principal a própria poesia; no texto, critica-se a poesia (ou a arte em geral) que não apresente preocupação social. Ainda, logo no começo, a expressão “O preço do feijão não cabe no poema” remete ao título “Não há vagas”; ou seja, no poema, não há vagas para os problemas sociais. Assim, o texto critica os poemas que só falam de pessoas e coisas idealizadas: “o homem sem estômago”, “a mulher de nuvens”, “a fruta sem preço”; essa crítica é acentuada no desfecho, quando há uma referência à arte socialmente inútil: “O poema, senhores, não fede nem cheira”. Nesse caso, a dificuldade interpretativa acontece por causa de uma contaminação ideológica. É que, no dia a dia, os problemas sociais são tão comentados e repetidos que vemos crítica social até quando ela não existe. Você liga a tevê e lá está um jornalista questionando a honestidade de algum político; na escola, professores mostram problemas na administração pública brasileira e por aí vai... O caso não se restringe ao ato de criticar. O problema, como já foi dito acima, é que nosso raciocínio é contaminado por preconceitos; preconceitos no sentido mesmo da palavra, conceitos prévios [...]. A partir da interpretação de textos, temos outro conceito fundamental, o de inferência, a partir do qual podemos concluir algo a partir da leitura. Vejam sempre enunciados como, conclui-se; infere-se; depreende-se, entre outros. Para solidificar o conhecimento sobre interpretação, vamos verificar o exemplo abaixo. 35 Figura 11: <https://cronicasdaalma.wordpress. com/tag/ambiguidade/>. Acesso em: 31 de ago. 2015. Ambiguidade A ambiguidade é um conceito que diz respeito a orações construídas de forma a levar a mais de uma compreensão em relação ao enunciado. Diferentemente da polissemia, a ambiguidade acontece devido a problemas na construção do enunciado ou da oração. É preciso, portanto, que na escrita ou na fala, estejamos atentos ao modo como organizamos as informações que queremos transmitir. Vamos verificar um exemplo? A polissemia da linha A ‘Linha’ gerou discórdia entre a agulha e o tecido, E ambos perderam a ‘Linha’ com ofensas descabidas Numa discussão gravada na ‘Linha’ telefônica permitida Culminando na ‘Linha’ dura da polícia o acontecido. Enquanto isso, ‘Linha’ do tempo, fabricantes de lotação Para talvez conseguirem a licença à ‘Linha’ do novo projeto Que a Prefeitura inaugurou em sua ‘Linha’ de produção. Mas a ‘Linha’ da vida lhes manda um sério recado: Quem anda em ‘Linha’ reta será o real vencedor, E também se abrirá concessão a primeira ‘Linha’ do metrô. E assim se verifi ca que há ‘Linha’ por todo lado, Além de ‘Linha’ do Equador, ‘Linha’ das Alma, ‘Linha’ da pobreza... É ‘Linha’ que não acaba mais nessa ‘Linha’ do Horizonte sua maior Grandeza! Fonte: <http://www.recantodasletras.com.br/textos/>. Acesso em 31 de ago. 2015. Observem que cada tipo de texto tem uma função primária, porque nada impede que diferentes funções se misturem ao longo da mensagem. É possível que um certo ponto de vista do autor venha imiscuído em uma parte de um texto narrativo sem descaracterizá-lo. O importante é verificar qual das funções está em primeiro plano. Retomando a aula A nossa sétima aula teve como objetivo caminhar entre os conceitos de compreensão e interpretação; mostrandoque ambos são diferentes e que a distinção é necessária, pois o uso equivocado compreende diretamente o resultado em atividades comuns ao dia a dia. 1 – Interpretar e compreender: qual a diferença A nossa primeira seção caminhou entre conceitos de dicionários e teóricos com o objetivo de apresentar a diferença entre compreensão e interpretação. Em destaque, quero frisar mais uma vez a vocês que a compreensão limita-se ao texto e a interpretação vai além. Não deixem de prestarem atenção no comando do enunciado, pois ele indicará quais dos conceitos a ser usado em cada situação. Ah, é importante assistirem nossa vídeo aula, pois lá encontraremos exercícios de fixação. 2 – Sentido literal e sentido figurado Aqui, vimos que o sentido literal (ou denotativo) é o significado exato das palavras e dos enunciados. Enquanto o sentido figurado (ou conotativo) é o significado adquirido em situações particulares da língua, originando novos significados. TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino da gramática. Vale a pena Vale a pena ler Minhas anotações
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