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Este livro ressalta a importância das interações entre Estado e sociedade civil, tanto para identificar problemas quanto para colaborar com um processo de formulação e execução de Políticas Públicas mais corretivo e assertivo. Nesse contexto, o leitor é convidado a refletir sobre como a responsabilidade com transparência e prestação de contas faz com que a avaliação das políticas ganhe cada vez mais importância. A obra destaca que cabe aos gestores e avaliadores a identificação correta dos problemas, o desenho estratégico de soluções e, então, a definição das mais rigorosas metodologias que garantam credibilidade e segurança aos processos. Também se orienta para a busca por melhores práticas e instrumentos de coleta de dados, de modo a ter as mensurações adequadas que contribuam para a correção e padronização das políticas, além da compreensão dos resultados. Código Logístico 59184 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6585-1 9 7 8 8 5 3 8 7 6 5 8 5 1 Gestão e avaliação de políticas públicas Djalma de Sá IESDE BRASIL 2020 Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: anttoniart/ PictureAccent/toodtuphoto/Magsi/AsiaTravel/Varavin88/Rawpixel.com/Shutterstock Ildo Frazao/iStockPhoto CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ S111g Sá, Djalma de Gestão e avaliação de políticas públicas / Djalma de Sá. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2020. 102 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6585-1 1. Brasil - Política social - Avaliação. I. Título. 19-61930 CDD: 361.610981 CDU: 351(81) Djalma de Sá Doutorando e mestre em Gestão Urbana pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Graduado em Ciências Econômicas pela mesma instituição. Professor em cursos de graduação e pós-graduação. Pesquisador de Economia Urbana e Regional, Planejamento Urbano e Desenvolvimento Regional. Empresário, palestrante e consultor. Agora é possível acessar nossas videoaulas por meio dos QR codes inseridos no livro. Note que existe, ao lado do início de cada seção de capítulo, um QR code (código de barras) para acessar a videoaula. Para acessá-la automaticamente, basta direcionar a câmera fotográfica de seu smartphone, tablet ou notebook para o QR code. Em algumas versões de smartphone, é necessário ter instalado um aplicativo para ler QR code, disponível gratuitamente na App Store e na Google Play. Videoaula em QR code! SUMÁRIO 1 Gestão Pública e o papel do Estado 9 1.1 Introdução à Gestão Pública 10 1.2 Evolução dos modelos de Gestão Pública no Brasil 14 1.3 Planejamento governamental e Políticas Públicas 17 1.4 Capacidades do Estado para aplicação das Políticas Públicas 24 2 Ciclo de vida das Políticas Públicas 31 2.1 Formulação da agenda pública 32 2.2 Formulação das Políticas Públicas 35 2.3 Implementação das Políticas Públicas 37 2.4 Mecanismos de controle social das Políticas Públicas 40 3 Gestão das Políticas Públicas 46 3.1 Governabilidade, governança, accountability e transparência 46 3.2 Arranjos institucionais e gestão das Políticas Públicas 51 3.3 Inovação na Gestão Pública 54 3.4 Desafios para a Gestão Pública no Brasil 57 4 Análise de Políticas Públicas 64 4.1 Modelos de análise de Políticas Públicas 64 4.2 Natureza e dinâmica das Políticas Públicas 69 4.3 Instrumentos de Políticas Públicas 74 4.4 Indicadores de Políticas Públicas 79 5 Avaliação de Políticas Públicas 86 5.1 Breve histórico da avaliação de Políticas Públicas 86 5.2 Avaliação de Políticas Públicas: conceitos e abordagens 90 5.3 Tipologias de avaliação e técnicas de análise 93 5.4 Projeto de avaliação (desenho, gestão e disseminação) 97 Os regimes democráticos se destacam pelo exercício da soberania em seus territórios, seja pela organização do ordenamento jurídico norteador – fortemente marcado pelo advento das Constituições Federais –, seja pela responsabilidade de atender às demandas públicas por meio da adoção de Políticas Públicas. Esse cenário ganha ainda mais destaque com o modelo do Estado de bem-estar social, com um conjunto de serviços e benefícios oferecidos de modo universal à sociedade. Nesse contexto, a sociedade civil organizada, com desejos e necessidades em suas demandas, também tem uma importante participação para estabelecer uma ponte de interação com o Estado, que apresenta as condições necessárias para formulação e implementação das políticas. Assim, as interações são importantes tanto para identificar problemas quanto para colaborar com um processo de formulação e execução mais correto e assertivo. Neste livro, é possível notar que essa relação tende a contribuir para a melhoria e a efetividade das Políticas Públicas em um cenário onde a Administração Pública tem a necessidade de apresentar melhores resultados e eficiência na alocação dos recursos, principalmente após o advento do modelo da Gestão Pública gerencial. Nesse contexto, no qual o usuário é entendido como cliente, convida-se o leitor a refletir sobre como a responsabilidade com a transparência e a prestação de contas faz com que a avaliação das políticas ganhe cada vez mais importância. Por fim, a obra destaca que cabe aos gestores e avaliadores a identificação correta dos problemas, o desenho estratégico de soluções e, então, a definição das mais rigorosas metodologias que garantam credibilidade e segurança aos processos. Também se orienta para a busca por melhores práticas e instrumentos de coleta de dados, de modo a ter mensurações adequadas que contribuam para a correção e padronização das políticas, além da compreensão dos resultados. Bons estudos! APRESENTAÇÃO Gestão Pública e o papel do Estado 9 A dinâmica de funcionamento dos Estados exige instrumentos que promovam a convivência entre o Estado, a iniciativa privada e a sociedade, harmonizando a proteção dos direitos sociais garantidos pelas Constituições como forma de execução da soberania do seu povo em seu território. Dessa forma, o Estado tem o papel de preservar a coesão social, de modo que garanta a propriedade privada e os direitos coletivos. Com o advento do Estado de bem-estar social, as Políticas Públicas buscam satisfazer as demandas da sociedade, favorecendo a igualdade. Nesse contexto, o Estado se apresenta responsável pela manutenção da estrutura social no território e pela garantia de atendimento do interesse coletivo. Para corresponder às demandas da sociedade, ele se utiliza das Políticas Públicas definindo e escolhendo os problemas a serem enfrentados, bem como as formas de enfrentamento. Nos Estados democráticos de direito, a negociação política é feita pela interação dos diversos atores envolvidos nas Políticas Públicas. Dessa maneira, as Políticas Públicas são instrumentos do Estado para evitar os conflitos e as desigualdades sociais. Elas são estabelecidas pela articulação dos interesses dos vários setores e atores da sociedade, participantes de sua formulação e implementação. Por outro lado, cabe destacar que existe uma pressão dos ambientes externos para direcionar os recursos do orçamento. Os agentes do Estado, portanto, precisam estar atentos ao cenário econômico, político e social, além do efeito de crises que afetam o Estado. Assim, o Estado desenvolve capacidades para atingir os objetivos planejados e articular, nesse sentido, os setores e agentes envolvidos. Gestão Pública e o papel do Estado 1 10 Gestão e avaliação de políticas públicas 1.1 Introdução à Gestão Pública Videoaula A Administração Pública trata do planejamento, organização, direção e controle dos serviçospúblicos, seguindo as regras do Direito e o inte- resse comum. De acordo com Meirelles (1985), a Administração Pública realiza o aparelhamento do Estado, organizando a prestação de serviços públicos para satisfazer as necessidades coletivas da sociedade. A Administração Pública teve seu processo de organização a partir dos séculos XVIII e XIX, em um cenário onde o poder estava centrali- zado no modelo autoritário do Estado absolutista. Nesse contexto, a Administração Pública não estava vinculada à ideia de princípios e ba- ses constitucionais, devendo ser responsável pela gestão e defesa do território (DENHARDT, 2011). Esse cenário passa a mudar após a adesão ao conceito de Estado democrático de direito, da aderência às Constituições como exercício de soberania legal do Estado e no trato das atividades administrativas dos agentes públicos, norteados pelo Direito Administrativo. Dworkin (2001) destaca que o Estado de Direito parte da ideia de que tanto o governo quanto a sociedade devem ter suas atuações norteadas por regras públicas, que contemplem também as formas de mudanças dessas regras. Para Dworkin, nesse sentido, há a seguinte definição de Estado de Direito: O Estado de Direito dessa concepção é o ideal de governo por meio de uma concepção pública precisa dos direitos individuais. Não distingue, como faz a concepção centrada no texto legal, entre o Estado de Direito e a justiça substantiva; pelo contrário, exige, como parte do ideal do Direito, que o texto legal retrate os direitos morais e o aplique. (DWORKIN, 2001, p. 7) Para estabelecer o Estado de Direito, é importante a divisão dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), pois, no início da aplicação desse conceito, os Estados eram absolutistas e delegavam ao rei ampla autoridade sobre a sociedade. Com o avanço da ideia de um Estado menos absolutista e mais democrático, teóricos começaram a discutir uma nova divisão. Entre esses pensadores, destacam-se: Gestão Pública e o papel do Estado 11 Com o avanço das discussões sobre os poderes do Estado, adotou- -se o modelo de Montesquieu como ideal para os modelos democráti- cos. O cenário do Estado democrático de direito, da adoção de Constituições e adequação das regras públicas teve início com a sepa- ração dos poderes do Estado, com funções e atribuições que devem ser harmônicas e independentes entre si. Desse modo, foram organizados em poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que contemplam papéis distintos, conforme demonstrado na Figura 4. Filósofo inglês que viveu entre 1632 e 1704. Com base no modelo inglês, discutiu a divisão dos poderes do Estado. Para Locke, o Poder Legislativo define as ações públicas, bem como protege a sociedade do arbítrio dos governantes, sendo, por isso, separado do Poder Executivo. GG GG GG GG G GG GGG GG GG GG GGG GGG GG G Figura 2 John Locke Filósofo grego que viveu entre 384 e 322 a.C. Sua obra A política apresenta as primeiras discussões sobre a divisão da estrutura de poder do Estado. Embora Aristóteles não explicasse o modelo de repartição dos poderes, tratava da Assembleia dos cidadãos, os magistrados e os juízes. M GG GG GM GG M GG GG GGG GGG GG G Figura 1 Aristóteles Filósofo e escritor francês que viveu entre 1689 e 1755. Em sua obra Espírito das leis (1748), defendeu a repartição dos poderes do Estado em três, distintos, harmônicos e independentes entre si. Dessa forma, os poderes seriam organizados em Executivo, Legislativo e Judiciário. EE GG GG G E GG GG GGG GG GG GG GGG GGG GG G Figura 3 Montesquieu O artigo 2º da Constituição da República Federativa do Brasil assim dispõe: “São Poderes da União, independentes e harmô- nicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário” (BRASIL, 1988). Destaque os papéis de cada um desses Poderes. Atividade 1 12 Gestão e avaliação de políticas públicas Figura 4 Poderes do Estado democrático de direito Poder Executivo Administra o governo. Poder Legislativo Elabora as leis. Poder Judiciário Aplica as leis. Fonte: Elaborada pelo autor. A Figura 4 esclarece de modo sucinto os papéis exercidos pelos três poderes, a saber: • Poder Legislativo: criar as leis que regulam a sociedade e fiscali- zar as ações do Poder Executivo. • Poder Executivo: colocar em prática as leis criadas pelo Poder Legislativo e utilizar as Políticas Públicas e ações governamentais para administrar o interesse coletivo e o bem público. • Poder Judiciário: realizar os julgamentos dos conflitos e aplicar as leis elaboradas pelo Poder Legislativo. No entanto, para que os poderes sejam estabelecidos, o Estado pre- cisa de alguns elementos fundamentais, como: • Governo: ato da administração do sistema político para exercício da soberania. É a forma de organização para exercer o poder e levar a sociedade ao cumprimento das normas para harmonia social. • Povo: conjunto de habitantes fixados em um determinado território. • Território: dimensão territorial sob controle de um governo estabelecido. • Soberania: poder absoluto e indivisível de organização e condu- ção das ações do Estado, segundo a vontade livre de seu povo, e de fazer cumprir as suas decisões, inclusive pela força, se necessário. Para exercer a soberania, o governo deve organizar sua forma de go- vernança a fim de estabelecer a atuação e a intervenção do Estado, além do nível de participação e interação com a sociedade. As formas de go- verno podem ser puras ou impuras, conforme demonstrado na Figura 5. Gestão Pública e o papel do Estado 13 Figura 5 Formas puras e impuras de governo Monarquia Aristocracia Democracia Formas puras de governo Tirania Oligarquia Demagogia Formas impuras de governo Fonte: Elaborada pelo autor. Entre as formas puras de governo, na monarquia ocorre o governo de uma só pessoa ou família, que herda o poder e representa a von- tade jurídica do Estado; na aristocracia o governo é de poucas pessoas com privilégios de uma classe social nobre; e na democracia há o go- verno de muitas que, eleitas, representam a sociedade. Em relação às formas impuras, destaca-se a tirania, que também implica o governo de uma só pessoa ou família, porém com arbitrariedade, observando o interesse do monarca. Na oligarquia, o governo envolve poucos e visa ao interesse do grupo dominante, enquanto na demagogia é realizado por muitos, visando aos interesses de uma maioria em detrimento dos demais. Além do estabelecimento da forma de governo, destaca-se a impor- tância de definição de seus sistemas: o presidencialismo e o parlamen- tarismo. Esses conceitos são apresentados no quadro a seguir. Quadro 1 Sistemas de governo Presidencialismo Parlamentarismo Sistema de governo em que o mandatá- rio eleito acumula o papel de Chefe de Estado e Chefe de Governo, com inde- pendência em relação ao Poder Legis- lativo, no entanto necessita da maioria legislativa para governar. Sistema que apresenta uma distinção clara entre o papel de Chefe de Estado e Chefe de Governo. O primeiro ocupa uma maior posição de representação, sem participar das decisões políticas. O segundo, por sua vez, tem seu nome aprovado pelo Legislativo e recebe o tí- tulo de primeiro-ministro, chanceler ou presidente do Conselho. Fonte: Elaborado pelo autor. No vídeo Saiba em menos de 10 minutos a diferença entre parlamentarismo e presiden- cialismo, publicado pelo canal Política no Papel, é possível saber mais sobre esses sistemas de governo. Disponível em: https://www.you- tube.com/watch?v=ywHlIYO3UO4. Acesso em: 6 dez. 2019. Vídeo 14 Gestão e avaliação de políticas públicas Entende-se, assim, que a Gestão Pública é consequência da organi- zação da soberania do Estado, definindo a forma e o sistema de gover- no com respeito à divisão e à especificidade dos poderes instituídos. O Estado, então, organiza seu aparelhamento para a realização dos servi- ços públicos e atendimento dos interessesda sociedade. 1.2 Evolução dos modelos de Gestão Pública no Brasil Videoaula Na evolução da Gestão Pública, três modelos teóricos se destacam: patrimonialista, burocrático e gerencial. Na história dos Estados sem- pre houve a predominância de um dos modelos, no entanto os demais se mantêm mesmo nesse contexto, definindo assim a coexistência en- tre eles. A seguir, são apresentadas as características que os compõem. 1.2.1 Modelo patrimonialista Em termos históricos, o modelo patrimonialista é considerado o pri- meiro de Gestão Pública. A maior característica desse modelo é a cen- tralização do poder no mandatário detentor do cargo público. Devido a isso, o Estado passa a ser compreendido como patrimônio pessoal do mandatário – razão do título patrimonialista. Assim, o mandatário passa a não ter limites de atuação, inclusive em relação às disposições legais. Esse modelo é reconhecido nos Estados absolutistas, que atendem aos desejos e interesses dos governantes, incentivando a corrupção e o nepotismo. No caso brasileiro, o modelo patrimonialista é observado desde a época colonial, perdurando até o século XX, na República Velha. Na Fi- gura 6, é possível ver suas características. Bens públicos se confundem com os bens privados. Administração Pública atende aos interesses do governante. Incentivo ao nepotismo e à corrupção. Modelo patrimonialista Fonte: Elaborada pelo autor. Introdução à gestão pública SANTOS, C. S. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Considerado um clássico da Gestão Pública, esse é um livro de referência na área. Reúne características, princípios e processos da Gestão Pública, além dos demais conceitos para a atuação no setor público. Livros Figura 6 Características do modelo patrimonialista de Gestão Pública Gestão Pública e o papel do Estado 15 Com o avanço do conceito de Estado democrático de direito, o mo- delo patrimonialista passa a ser questionado, principalmente pelas suas consequências danosas e por não coadunar com a ideia de um modelo de Estado constitucional ou com a adoção do conceito de República. 1.2.2 Modelo burocrático O modelo burocrático aplicado à Gestão Pública é fruto dos estudos de Max Weber 1 Sociólogo e economista alemão, autor de grandes obras como A ética protestante e o espírito do capitalismo e Economia e sociedade. No campo da administração, desenvolveu o modelo burocrático de gestão, com foco nos processos e na meritocracia. 1 (1864-1920), que foram desenhados no século XX para a iniciativa privada e, em um segundo momento, aplicados à Admi- nistração Pública. A burocracia weberiana surge com o Estado liberal, buscando instaurar um modelo de administração impessoal, merito- crático, profissional e racional. O modelo burocrático surge também como uma resposta aos abu- sos e excessos do patrimonialismo. Para isso, seu foco principal são os processos que passam a ser corretamente definidos e rigidamente controlados. Assim, esse modelo permitiria, por meio dos procedimen- tos formalizados, combater o nepotismo e a corrupção na Administra- ção Pública. Busca-se, por meio dele, submeter as ações do Estado às normas e leis estabelecidas, tornando mais rígida a atuação do governo e menos discricionárias as decisões do Estado. Figura 7 Características do modelo burocrático de Gestão Pública Impessoalidade, profissionalismo, meritocracia e racionalidade. Rígido controle dos processos administrativos. Submissão à lei e pouca condição para a discricionariedade. Modelo burocrático Fonte: Elaborada pelo autor. Mesmo com esse novo desenho sendo adotado, o modelo burocrá- tico também sofre algumas críticas: em primeiro lugar, cria barreiras desnecessárias e disfunções na Administração Pública; em segundo, leva os processos à ineficácia e ineficiência. Esse fato se deve à preo- cupação exagerada com a adequação aos procedimentos e às normas, sem considerar necessariamente a qualidade dos serviços prestados. discricionárias: livre de restri- ções ou condições, ilimitada. Glossário coadunar: incorporar, conformar, reunir para formar um todo. Glossário 16 Gestão e avaliação de políticas públicas 1.2.3 Modelo gerencial e a Nova Gestão Pública Com o avanço do modelo burocrático, percebeu-se que ele não era eficaz para oferecer os serviços públicos de modo que atendessem às demandas da sociedade. Outro ponto importante foi que ele, embora reduzisse, não conseguiu eliminar as práticas patrimonialistas na estru- tura do Estado. Dessa forma, buscou-se um novo modelo mais eficaz e eficiente para a implantação das Políticas Públicas do governo. A busca desse novo modelo veio da observação das práticas gerenciais das organizações privadas, que apresentavam altos níveis de produtivida- de e de satisfação dos funcionários. Com base nisso, perguntou-se: por que o Estado não poderia adotar práticas gerenciais utilizadas na iniciativa privada para tornar o serviço público mais eficiente e eficaz? Na segunda metade do século XX surge, nos Estados Unidos da América, o modelo gerencial de Administração Pública como resposta à crise do modelo burocrático. Buscava-se a eficiência e qualidade no serviço público por meio da redução e otimização dos custos adminis- trativos e operacionais. Outra mudança importante refere-se ao foco principal, que não eram mais os processos, mas os resultados entre- gues ao cliente, o cidadão. Importante ressaltar que o novo modelo gerencial manteve as boas práticas adotadas no modelo burocrático, porém eliminando os pontos negativos. Como o modelo gerencial visa aos resultados dos serviços públicos, passa-se a adotar a avaliação de desempenho dos agentes para medir a satisfação dos cidadãos com os serviços prestados. Para tornar o pro- cesso mais ágil, são definidos menos níveis hierárquicos, fortalecendo a administração indireta e adotando um papel de regulação econômi- ca. Assim, o modelo gerencial passa pela adoção de três estágios distin- tos, apontados na Figura 8. Gerencialismo puro. Consumeirism. Public service orientation. Estágios do modelo gerencial Fonte: Elaborada pelo autor. Figura 8 Estágios do modelo geren- cial de Gestão Pública Gestão Pública e o papel do Estado 17 A seguir, são apresentados os detalhes de cada estágio presente na Figura 8. • Gerencialismo puro: busca adotar novas práticas para reduzir o custo, como forma de aumentar a eficiência. Nesse estágio, o usuário é o financiador do sistema público. • Consumeirism 2 Modelo de gestão com ênfase na flexibilidade, adoção de qualidade total nos serviços públicos e satisfação de seus consumidores segundo uma lógica de racionalidade privada (SANTOS, 2014). 2 : passa a adotar políticas de qualidade na pres- tação dos serviços públicos, estabelecendo o cidadão como foco. • Public service orientation 3 Modelo com base nas potencia- lidades do Estado, introduzindo os conceitos de accountability e equidade na prestação de serviço público. 3 : adota princípios de cidadania, accountability, transparência e equidade. Nesse estágio também há maior participação popular nas decisões do governo. http://www.anpad.org.br/admin/pdf/APB649.pdf O conceito de accountability é tão relevante para compreender o senso de responsabilidade na Administração Pública que se recomenda a leitura do ar- tigo Accountability e suas múltiplas abordagens: um balanço teórico, do autor Roberto Salles Xavier, apresentado durante o XXXV Encontro da ANPAD (Asso- ciação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração), realizado no Rio de Janeiro (RJ), de 4 a 7 de setembro de 2011. Artigo A análise dos modelos de Administração Pública permite o avanço dos processos de gestão, controle, eficácia e eficiência do Estado. Po- de-se perceber que os modelos procuram coibir as práticas nepotistas e de corrupção, melhorando os processos administrativos e ampliando a qualidade dos serviços ofertados, aumentando a transparência e a participação popular nas decisõesdo governo. A Gestão Pública no Brasil teve como base três modelos de Administração Pública – patrimonialista, burocrá- tico e gerencial – que estão relacionados com seus períodos históricos e a modernização do Estado. Diante desse contexto, descreva as características desses modelos. Atividade 2 1.3 Planejamento governamental e Políticas Públicas Videoaula A ação do governo é norteada por princípios constitucionais, entre os quais se destaca a eficiência, que se refere à utilização racional dos recursos, buscando atingir os objetivos com o mínimo possível deles. Assim, se por um lado o governo precisa atender às demandas da so- ciedade, precisa também buscar alocar o orçamento público de modo a obter os melhores resultados. 18 Gestão e avaliação de políticas públicas Nesse contexto, surge a importância do planejamento governa- mental, relacionando os recursos do Estado disponíveis para atender às demandas da sociedade. A seguir, aspectos do planejamento gover- namental são apresentados mais detalhadamente. 1.3.1 Planejamento governamental Compreende-se como planejamento governamental a definição de mecanismos para atingir resultados e objetivos projetados, transfor- mando a realidade para alterar o futuro. Esse processo acontece por uma escolha racional das ações, sendo uma atividade que orienta as decisões do governo. Na esfera federal, compõe-se de três leis orça- mentárias distintas: Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamen- tárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA). De acordo com Gontijo (2019), economista e consultor de Orça- mentos e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, o PPA tem vigência de quatro anos, sendo a principal ferramenta de plano do mandatário, estabelecendo as diretrizes, os objetivos e as metas de médio prazo da Administração Pública. A LDO, por sua vez, trata das prioridades das Políticas Públicas para o exercício subsequente. Por fim, a LOA é o instrumento que viabiliza a execução do plano de trabalho do governo, por meio da estimativa de receitas e da fixação das despesas. O planejamento governamental é feito com base em uma análise do cenário econômico, político-legal, sociocultural, tecnológico, demo- gráfico e ambiental estabelecendo o contexto para planejamento de aplicação das políticas. Dessa forma, esse planejamento precisa ser flexível para se adaptar às mudanças nos cenários estudados e, assim, pode ser alterado conforme a necessidade do ambiente. O planeja- mento governamental precisa ser apresentado e discutido com a so- ciedade civil organizada, possibilitando tanto o conhecimento do plano quanto a condição de participação social por meio do acolhimento de sugestões e da melhoria dos projetos. Depois de aprovado pelo Poder Legislativo, o planejamento gover- namental deve estar disponível para conhecimento, acompanhamento e fiscalização da sociedade. O trabalho de fiscalização, no entanto, é exercido pelo Poder Legislativo com auxílio dos Tribunais de Contas, Gestão Pública e o papel do Estado 19 apreciando, verificando e auditando as contas para garantir a transpa- rência e a legalidade. A ideia de planejamento pode ser considerada uma extensão do modelo de pensamento marxista, por se tratar de uma forma organi- zada de intervenção do Estado na estrutura econômica e social em que está inserida. Na América Latina, o estabelecimento do planejamento governa- mental teve impulso com o sucesso dos países envolvidos na Guerra Fria. Esse impulso também ocorreu pela atuação de órgãos inter- nacionais, a partir da década de 1940, como a Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que contemplaram todas as visões ideo- lógicas no período. No Brasil, “a criação do Conselho Federal de Comércio Exterior em 1934 pelo Governo Vargas pode ser considerada como um marco na história do planejamento governamental brasileiro” (DE TONI, 2014, p. 7). As primeiras experiências de planejamento governamental em grande escala no âmbito federal iniciaram nos anos 1950, tendo como marco o Plano de Metas do governo do então presidente Juscelino Kubitschek. Esse Plano de Metas foi um modelo de planejamento que buscava acelerar o crescimento econômico do país por meio do desen- volvimento da indústria de bens duráveis, ampliando a oferta para a classe média e, consequentemente, o consumo. No período militar (1964-1985), essa experiência se aprofundou com planejamentos autoritários e concentradores. Sua formulação era fortemente centralizada no governo, sem a participação da socie- dade civil organizada, que caracterizaria um planejamento participa- tivo e democrático. Nos anos 1970, com a implantação de um Sistema de Planejamento Federal, foram editados os Planos Nacionais de Desenvolvimento. O Sistema de Planejamento Federal foi idealizado como parte de um pro- cesso de modernização da administração federal para elaborar, coor- denar, acompanhar e modernizar os programas de governo. Nesse contexto, foram estabelecidos os Planos Nacionais de Desenvolvimen- to, que eram os planos econômicos para ampliar as bases do desen- volvimento local, pautados em investimentos na infraestrutura como maneira de fomentar o desenvolvimento econômico. Nos Estados socialistas, tendo como marco o modelo soviético, o planejamento destacou-se como um instrumento de organização da economia e da sociedade. Para o capitalismo, por sua vez, é algo importante para delimitar a atuação do Estado, limitando assim seu nível de intervenção. Também é importante para evitar as falhas de mercado, atuando na regula- ção e alocação de recursos. Curiosidade 20 Gestão e avaliação de políticas públicas Nos anos 1980, devido à crise econômica marcada pelo advento da hiperinflação e do endividamento do país, a ideia de planejamento governamental foi abandonada pelo Estado, tanto pela dificuldade de financiamento quanto pela ausência de modelos e sistemas articulados com o novo cenário global. Com a redemocratização e o advento da Nova República 4 Período da história do Brasil imediatamente posterior ao regime militar, marcado pelo processo de redemocratização, abertura e retorno dos direitos individuais e de liberdades fundamentais. 4 buscou- -se, sem sucesso, retomar a ideia do planejamento governamental devido às crises econômicas e dificuldades orçamentárias. Com a esta- bilização da economia após o período militar, a partir dos anos 1990, o Estado brasileiro volta a desenvolver sua atuação com base no estabe- lecimento do planejamento governamental. Conforme De Toni (2014), a evolução do planejamento governamen- tal pode ser dividida em cinco grandes períodos. O primeiro aconteceu no início do governo Vargas até os anos 1950, chamado de nacional- -desenvolvimentista. O segundo período, denominado desenvolvimen- tista-dependente, começou no pós-guerra e foi até 1964. Chamado de desenvolvimentista-autoritário, o terceiro período ocorreu de 1970 a 1980, com o fim do regime militar. O quarto começou com o processo de redemocratização até os anos 1990, com as reformas liberais, de- nominado democrático-liberal. Por fim, o último período ocorreu no século XXI com as políticas de inclusão e participação social, conhecido como desenvolvimento-societal. As características dos modelos de pla- nejamento governamental podem ser observadas no Quadro 2. Quadro 2 Diferentes períodos do planejamento governamental brasileiro Período Características Anos Nacional-desenvolvimentista • Planejamento estatal. • Nacionalismo econômico. • Planejamento econômico-normativo. De 1930 a 1946. Desenvolvimentista-dependente •Desenvolvimento associado ao capital externo – industrialização acelerada. •Modernização do Estado e da burocracia estatal. De 1946 a 1964. Desenvolvimentista-autoritário •Planejamento autoritário, economicista e normativo. • Lógica do comando e controle. • Planos de Desenvolvimento. De 1964 a 1985. (Continua) GestãoPública e o papel do Estado 21 Período Características Anos Democrático-liberal •Recomposição formal das organizações de planejamento. •Constituição Federal de 1988, início dos ci- clos dos PPAs. • Gerencialismo e domínio da lógica orçamen- tária-fiscal. De 1985 a 2003. Desenvolvimentista-societal • Retomada do planejamento com ênfase se- torial. • Mudanças pontuais nos Planos Plurianuais: mais participação e territorialização da agenda. • Planos Plurianuais de Estados e municípios. De 2003 a 2016. Fonte: Adaptado de De Toni, 2014. Pode-se concluir que o planejamento governamental ocorre com o processo de evolução do Estado e dos modelos de Gestão Pública. No Brasil, o planejamento governamental apresentou uma característica de investimento econômico, sendo marcado por demandas sociais a partir da Constituição Federal de 1988. O modelo de investimento econômico e de ampliação da infraes- trutura não se encerrou com o fim do regime militar, mas, com a re- forma administrativa do Estado nos anos 1990 e adoção dos princípios da nova Gestão Pública, passou a ter seu debate ampliado com a par- ticipação social e com uma lógica financeira atrelada a regras orça- mentárias mais rígidas. Assim, o planejamento não trata somente dos investimentos a serem realizados, mas passa a definir como realizar a melhor alocação dos recursos de modo mais equilibrado e eficiente. 1.3.2 Políticas Públicas As Políticas Públicas têm sua origem na década de 1930, nos Estados Unidos da América, como forma de o governo superar os impactos da crise econômica. O debate é ampliado na década de 1950, definindo- -as como uma área de conhecimento específica, cujo foco de estudos é exclusivamente a atuação, e não o papel do Estado. Em um segundo momento esse estudo passou a ser feito por europeus que, diferente- mente dos norte-americanos, partiram da análise do papel do Estado e do governo, para depois compreender as ações e políticas implementa- das. No entanto, independentemente do modelo adotado, começou-se a desenvolver um modelo teórico para compreender e analisar as Políticas Públicas (BRASIL; CAPELLA, 2016). 22 Gestão e avaliação de políticas públicas Para Parsons (2007, p. 51), “a noção segundo a qual o mundo estava cheio de enigmas e problemas que poderiam ser resolvidos por meio da aplicação de razão e do conhecimento humano está na base do desen- volvimento do enfoque de Políticas Públicas”. Nesse momento, passa-se a compreender a importância da definição política dos problemas a se- rem atendidos por essas políticas, conforme aponta Stone (2002, p. 231): Os problemas são definidos na política para atingir metas – mo- bilizar o apoio para um lado em um conflito. Definir um proble- ma é fazer uma declaração sobre o que está em jogo e quem é afetado e, portanto, definir interesses e a constituição de alian- ças. Não existe uma definição de problema apolítica. No caso brasileiro, no início do século XX, o Estado tinha como ca- racterística o conservadorismo, a centralização e o autoritarismo. O objetivo era buscar o desenvolvimento econômico com foco na indus- trialização, estabelecendo um “Estado fazedor” 5 . Com o advento da ideia do Estado do bem-estar social, passou-se a adotar um comporta- mento de regulação das dinâmicas econômicas e sociais. Em relação ao conceito de Políticas Públicas, Souza (2006) destaca que são um ramo da ciência política que explica o porquê de o Estado tomar determinadas decisões. Dessa forma, as Políticas Públicas se- riam um campo de estudo do governo sob o olhar dos grandes deba- tes públicos, produzindo efeitos específicos. As ações do Estado podem ser feitas diretamente ou por delegação, influenciando o cotidiano dos cidadãos. Goldin (2003, p. 163, tradução livre) colabora com essa refle- xão em sua definição de Política Pública: Uma Política Pública reflete a vontade de diferentes setores da sociedade em avançar para uma determinada direção e repre- senta uma articulação coerente de medidas para transformar uma situação. Sua eficácia se mede por sua sustentabilidade e sua coerência interna, que faz com que nos distintos setores en- volvidos tenha repercussão positiva. Uma Política Pública permi- te garantir que os problemas não serão crônicos e idênticos aos que sempre existiram. Para compreender a importância das Políticas Públicas, conforme é possível observar na Figura 9, Souza (2006) destaca três fatores funda- mentais: i) imposição de medidas restritivas de gastos, principalmente em países em desenvolvimento; ii) novos papéis assumidos pelos governos (atendimento de novas demandas sociais); e iii) o papel do Estado em fo- mentar o desenvolvimento econômico e as políticas de inclusão social. Estado que intervém diretamen- te na economia fazendo a Política Pública, ao contrário dos Estados reguladores, que incentivam e controlam a ação de atores privados. 5 Gestão Pública e o papel do Estado 23 As Políticas Públicas refletem, assim, nas inter-relações entre gover- no, política, economia e sociedade. Busca-se, então, analisar as ações do Estado e sugerir modificações no curso das ações públicas. Nesse contexto, as Políticas Públicas representam a materialização no mundo real do programa eleitoral do gestor. Essas políticas, segun- do Justen e Frota (2017), constituem-se dos estágios de “definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, execução e avaliação”. Em relação às formas de Políticas Públicas, por sua vez, Lowi (1964; 1972 apud SOUZA, 2006) define quatro delas, conforme se pode ver na Figura 9. Figura 9 Formas de Políticas Públicas Políticas distributivas Decisões que geram mais impactos individuais do que universais, que denotem privilégios para determinadas localidades ou grupos sociais. Políticas regulatórias Envolvem burocracia, políticos e grupos de interesse, sendo mais identificáveis pela sociedade. Políticas redistributivas Estabelecem perdas para determinados grupos sociais e ganhos para outros, constituindo as políticas sociais universais, o sistema tributário, o sistema previdenciário, entre outros. Políticas constitutivas Tratam do estabelecimento de normas para formulação e implementação das Políticas Públicas. Fonte: Elaborada pelo autor com base em Lowi, 1964; 1972 citado por SOUZA, 2006. Salisbury (1968) demonstra um olhar especial para as políticas cons- titutivas, pois orienta as decisões que prescrevem as regras, muitas ve- zes de maneira autoritária ou pela pressão dos grupos de interesse. Dessa forma, o autor incrementa um novo tipo de política denominado autorregulatório, em que o sistema decisório é descentralizado frente a As Políticas Públicas são resultantes das interações entre o Estado e os demais atores da sociedade, podendo ser consideradas a materialização das decisões dos governos no atendimento às demandas da sociedade. Diante desse cenário, aponte as formas de Políticas Públicas que podem ser usadas pelo Estado. Atividade 3 24 Gestão e avaliação de políticas públicas um conjunto de demandas, enfatizando a importância dos atores nas tipologias das políticas. Salisbury e Heinz (1970) citam dois tipos de po- líticas: as alocativas, ligadas ao tipo distributivo e redistributivo, e as estruturais, mais vinculadas ao tipo regulatório. No caso brasileiro, pode-se observar que o Poder Legislativo atua com políticas distributivas-paternalistas, articulando-se também pela pressão de grupos de interesse (SANTOS, 1987). Para Abranches (1994), no Brasil, as políticas distributivas seriam isentas de conflito, enquanto Santos (1987) define a política social como redistributiva, principalmen- te desde a Constituição Federal de 1988. Em relação à formulação das Políticas Públicas, Lobato (2006, p. 290) apresenta três vertentes teóricas para explicá-las. A primeira é a vertente pluralista, que “tem como base teórica a noção de que a for- mulação de políticas é dada segundo o jogo de forças empreendidopor diferentes grupos de interesses que, atuando junto ao governo, procuram maximizar benefícios e reduzir custos”. A segunda vertente é o neocorporativismo, que constitui arranjos políticos de grupos insti- tucionalizados responsáveis pela idealização da política em uma visão sistêmica. A vertente marxista, por sua vez, busca superar a visão do Estado capitalista da classe dominante, estabelecendo as Políticas Pú- blicas em prol de uma nova relação entre o Estado e a sociedade. As Políticas Públicas são definidas como ações estratégicas nor- teadas pelo Estado, alicerçadas por regras e procedimentos para regular as relações entre o público e o privado, garantindo a par- ticipação dos agentes públicos, privados e da sociedade envolvida (TEIXEIRA, 2002). 1.4 Capacidades do Estado para aplicação das Políticas Públicas Videoaula As capacidades estatais têm sido bastante estudadas por sociólogos e cientistas políticos e têm apresentado diversos conceitos, de acordo com os modelos de análise adotados e as tradições teóricas de cada ciência (CINGOLANI, 2013). No entanto, podem ser apresentadas pelo menos duas gerações de análise das capacidades estatais. Por um lado, o conceito refere-se ao fato de manter a ordem em determinados territórios, exigindo um con- Gestão Pública e o papel do Estado 25 junto de ações para proteger a soberania, administrando a estrutura coercitiva, arrecadando tributos e administrando um sistema judicial (JESSOP, 2001). Essa primeira vertente teve como foco a análise histó- rica de formação do Estado. Um segundo nível estuda as capacidades do Estado após o estágio inicial de sua formação, analisando se existem ou não condições para o atingimento dos objetivos de provisão de bens e serviços públicos por meio da implementação das Políticas Públicas (MATTHEWS, 2012). Dessa forma, as capacidades estatais estão estreitamente relaciona- das com o modelo de governança adotado, uma vez que a efetividade das Políticas Públicas passa pela interação entre o Estado, a iniciativa privada e a sociedade. Essa visão vai além da estrutura burocrática, institucional e política existente, trabalhando com a cooperação e a co- laboração entre os atores envolvidos (HUERTA, 2008). Designou-se, então, o termo big governance como a relação entre o modelo de governança adotado e as capacidades estatais, buscando compreender a estrutura institucional do Estado, a desconcentração dos arranjos e o estabelecimento da participação de múltiplos autores (LEVI-FAUR, 2012). Pode-se entender que, nesse cenário, a formulação de Políticas Públicas exige maior complexidade de arranjos e estrutu- ras decisórias que representem a relação do Estado com a sociedade e o mercado (SCHNEIDER, 2005). A literatura especializada apresenta três perspectivas teóricas para demonstrar a relação entre as capacidades estatais e as mudanças no Estado. Na primeira perspectiva, as mudanças reduzem a capacidade estatal, ocorrendo o esvaziamento e a perda do controle do Estado. Nessa relação, considera-se que as estruturas verticais são fragmen- tadas e as responsabilidades são transferidas para a sociedade civil, governos subnacionais e iniciativa privada (ZEHAVI, 2012). A segunda perspectiva defende que as mudanças do Estado não necessariamente diminuem as capacidades estatais. Autores dessa vi- são afirmam que o Estado não perde a centralidade, somente desloca as capacidades, passando a assumir a condição de Estado regulador, desenhando arranjos, formulando Políticas Públicas e controlando re- cursos (MATTHEWS, 2012). Por fim, a terceira perspectiva defende que a ampliação das capa- cidades estatais ocorre devido a mudanças associadas à noção de go- Saneamento básico Direção de Jorge Furtado. Brasil: Sonny Pictures, 2007. 1 DVD (102 min.). Comédia. O filme aborda uma comunida- de do interior do Rio Grande do Sul que se une para reivindicar à prefeitura a construção de uma fossa. Quando as pessoas desco- brem que a prefeitura não tem recursos para fazer a fossa, mas tem dinheiro para a produção de um vídeo, decidem fazer um filme educativo sobre o assunto para incentivar a obra. Filme 26 Gestão e avaliação de políticas públicas vernança. Para esses teóricos, as interações entre o Estado e os demais atores não substituem a capacidade estatal, mas a complementam. So- bre isso, Offe (2009, p. 12) afirma: a noção de governança pode estar associada ao aumento da capacidade de intervenção do Estado, ao proporcionar a mobi- lização de atores não estatais na formulação e implementação de Políticas Públicas, contribuindo, assim, para maior eficiência e efetividade [...]. É possível pensar na existência de “forças auxi- liares” [e não substitutivas] na sociedade civil que, por meio dos procedimentos adequados e de suas competências específicas, podem ser recrutadas para a cooperação na realização de tare- fas de interesse público [...] podendo gerar um Estado ao mesmo tempo mais leve e mais capaz. Além dessas perspectivas, há correntes mais modernas com ar- ranjos institucionais com maior sofisticação, transferindo papéis para atores estatais subnacionais e não estatais, construindo novas capa- cidades, ampliando o espaço de atuação, tornando as políticas mais flexíveis, facilitando o processo de monitoramento e permitindo novos aprendizados e reflexões (MATTHEWS, 2012). Essas novas interações, por meio de arranjos institucionais, permi- tem ampliar os esforços e recursos empregados, bem como fomentam o processo de inovação. Assim, esses arranjos mobilizam conhecimen- tos e informações sobre os problemas enfrentados, envolvendo um maior número de atores no acompanhamento, monitoramento e ava- liação das iniciativas (SORENSEN, 2012). O novo ambiente institucional apresenta três dimensões, segundo Pires e Gomide (2016): 1 A dimensão político-representativa aborda o problema da governabilidade e da produção de Políticas Públicas nacionais “em um sistema federativo, presidencialista e multipartidário” (PIRES; GOMIDE, 2016). 2 A dimensão dos controles horizontais refere-se aos processos de transparência, accountability e controles internos, envolvendo a Controladoria Geral da União, a fiscalização e os controles externos, tendo como exemplo o Tribunal de Contas da União. 3 A dimensão participativa, por fim, envolve a participação social nas decisões políticas, incluindo os conselhos de gestão, as audiências e as conferências públicas. Gestão Pública e o papel do Estado 27 Outro conceito bastante presente é o de capacidade para Políticas Públicas (Policy Capacity), que implica a reunião dos recursos necessários para a racionalidade das escolhas visando ao interesse público. Nesse sen- tido, trabalham-se também os conceitos de capacidade administrativa (Administrative Capacity), que trata da gestão eficaz de recursos humanos e físicos necessários para a entrega dos serviços públicos, e de capacidade de Estado (State Capacity), relativa à mobilização do apoio econômico e social dos resultados do Estado. Nesse contexto, a capacidade política é gerada no nível intersetorial, em um modelo de governança constituído de arranjos institucionais, procedimentos de transparência e accountability e mecanismos de coordenação do novo modelo (PAINTER; PIERRE, 2005). Desse modo, compreende-se que, para exercícios de formulação e execução das Políticas Públicas, é fundamental o desenvolvimento de capacidades estatais, articulando o papel do Estado com a iniciativa privada e a sociedade, ampliando a cooperação e a colaboração para atingir os objetivos definidos. CONSIDERAÇÕES FINAIS A Constituição Federal (BRASIL, 1988) estabeleceu um modelo fede- rativo com competências divididas entre a União, os estados e os mu- nicípios, principalmente em relação à atuação estatal e à formulação e aplicação das Políticas Públicas. Assim, as Políticas Públicas têm sido um instrumento eficiente para o alcance dos objetivos da Gestão Pública. Com o advento do conceitode Estado de bem-estar social, este passou a ter maior participação nas questões que promovem a qualidade de vida para a sociedade. Para o atendimento das demandas sociais é importante a definição de um modelo de governança que promova a participação popular na construção das Políticas Públicas, passando a ser um fator de legitimidade do governo em questão. Com isso, as Políticas Públicas contribuem para a redução dos conflitos e estabelecem uma interação entre os Poderes Executivo e Legislativo com os demais setores da sociedade. O cenário das Políticas Públicas sofreu alterações nos anos 1990 a par- tir da reforma administrativa do Estado, da adoção do modelo gerencial de Administração Pública e da limitação orçamentária dos governos (prin- cipalmente estados e municípios). Dessa forma, o Estado passou a fomen- tar a participação social, a transparência e a necessidade de desenvolver novas capacidades estatais para atender à demanda social e contribuir para o alcance de seus objetivos. 28 Gestão e avaliação de políticas públicas REFERÊNCIAS ABRANCHES, S. H. Política social e combate à pobreza: a teoria da prática. In: ABRANCHES, S. H.; SANTOS, W. G.; COIMBRA, M. A. Política social e combate à pobreza. 3. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. BRASIL. Constituição Federal (1988). Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao. htm. Acesso em: 27 nov. 2019. BRASIL, F. G.; CAPELLA, A. C. N. 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No modelo burocrático, o Estado tem como foco o rígido controle dos processos e a adequação das leis e normas. O modelo gerencial tem como ponto principal os resultados das Políticas Públicas e o cidadão passa a ser visto como cliente. 30 Gestão e avaliação de políticas públicas 3. São formas de Políticas Públicas, de acordo com Lowi (1964; 1972 apud SOUZA, 2005): • Políticas distributivas: decisões que geram mais impactos indivi- duais do que universais, que denotem privilégios para determina- das localidades ou grupos sociais. • Políticas regulatórias: são mais identificáveis pela sociedade, visto que envolvem burocracia, políticos e grupos de interesse. • Políticas redistributivas: determinam perdas para determinadosgrupos sociais e ganhos para outros, constituindo as políticas so- ciais universais, o sistema tributário, o sistema previdenciário, entre outros. • Políticas constitutivas: tratam do estabelecimento de normas para formulação e implementação das Políticas Públicas. Ciclo de vida das Políticas Públicas 31 O ciclo de vida das Políticas Públicas possui qualidades que são destacadas na literatura especializada. Conhecê-lo é importante para compreender as discussões sobre os temas trabalhados e os estágios que compõem esse ciclo, estudando suas características específicas. Destaca-se nesse contexto a formulação da agenda pública, compreendida como um conjunto de problemas e demandas importantes a serem atendidos, voltada para atores com ela envolvidos. Forma-se assim, com a interação desses atores, um plano de governo ou um planejamento orçamentário. Também se destaca o papel da sociedade civil organizada para estabelecer um diálogo com o Estado, buscando interagir com o interesse público. Mesmo com uma cultura de centralização decisória, o advento da Constituição Federal de 1988 define as formas de controle social como mecanismo democrático e de exercício da soberania. Assim, cabe compreender a formulação e a implementação da agenda para estabelecer um cenário de interação entre os diversos atores sociais, organizados e com pleno exercício de soberania, construindo Políticas Públicas diretamente relacionadas com as demandas sociais norteadoras das decisões do Estado. Ciclo de vida das Políticas Públicas 2 32 Gestão e avaliação de políticas públicas 2.1 Formulação da agenda pública Videoaula A agenda pública é fruto da ciência política no estudo das Políticas Públicas, como os temas que o governo e a sociedade focam sua aten- ção em momentos determinados, conforme a demanda e o interesse público dos atores envolvidos. A agenda pública pode ser entendida como uma coleção de demandas, envolvendo as causas e soluções que precisam de ações da sociedade e da Gestão Pública (BIRKLAND, 2007). Compreende-se, dessa forma, que a formulação da agenda é uma construção de diversos atores, e não somente do Estado. Nesse contex- to, a interação entre eles faz com que os problemas ganhem ou percam destaque, gerando maior interação entre sociedade, ideias, instituições e governos. Cabe mencionar que, se a agenda é uma questão social, existe uma disputa entre os diversos grupos com formas distintas de interpre- tar os problemas e apresentar as soluções, com uma complexidade de interações que culminam na agenda pública (FUKS, 2000). A formulação da agenda pública é uma etapa que ocorre antes do processo de decisão, envolvendo as temáticas que comporão as ações do Estado definidas como prioritárias. As ações que não compõem a agenda governamental são chamadas de ações não prioritárias, mesmo que sejam demandas e necessidades de grupos específicos. Quando um tema definido pelos elaboradores da agenda como “não prioritário” evolui e passa a ser entendido como “prioritário” pela sociedade, gera um problema político. O processo de formulação da agenda envolve basicamente dois ti- pos de atores: visíveis e invisíveis. Os atores visíveis são os que têm poder de influenciar a formação da agenda devido à visibilidade e pro- ximidade com o público – entre estes destacam-se políticos e imprensa, por exemplo. Por outro lado, os atores invisíveis têm menor poder para influenciar a formação da agenda, embora tenham maior capaci- dade de apresentar alternativas aos atores visíveis – destacam-se nesse caso os servidores públicos e os pesquisadores, por exemplo. Para compreender a integração dos problemas à agenda do gover- no, utiliza-se o modelo de múltiplos fluxos, de John Kingdon (2003). Ele trata da concentração de três grandes fluxos relacionados ao pro- cesso de tomada de decisões: em primeiro lugar o fluxo de problemas (problem stream), em segundo o fluxo de soluções (policy stream) e por fim o fluxo político (political stream), conforme definido na Figura 1. Ciclo de vida das Políticas Públicas 33 OPORTUNIDADE DE MUDANÇA (Windows) Convergência dos fluxos (coupling) pelos empreendedores (policy entrepreneurs) Figura 1 Resumo do modelo de múltiplos fluxos PROBLEM STREAM (Fluxo de problemas) Indicadores Crises Eventos localizadores Feedback de ações POLICY STREAM (Fluxo de soluções) Viabilidade técnica Aceitação pela comunidade Custos toleráveis POLITICAL STREAM (Fluxo político) “Humor nacional” Forças políticas organizadas Mudanças no governo AGENDA – SETTING Acesso de uma questão à agenda Fonte: Capella, 2007, p. 98. O fluxo de problemas trata das questões que farão parte da agen- da, captadas com base em três mecanismos distintos: i) indicado- res, compostos de dados que ajudam a compreender e interpretar a realidade, contribuindo para determinar se a questão será objeto da atenção do governo; ii) eventos, isto é, fatos ocorridos na sociedade que despertam atenção para alguma emergência a ser atendida; e iii) feedback das ações do governo, que envolvem avaliação, pela socieda- de civil organizada, dos programas e das Políticas Públicas implemen- tados pelo poder público. O fluxo de soluções trata das possibilidades de resolução discuti- das na rede de atores. Kingdon (2003, p. 32) destaca que “as pessoas não necessariamente resolvem problemas. [...] Em vez disso, elas ge- ralmente criam soluções e, então, procuram problemas para os quais possam apresentar suas soluções”. O fluxo político possui processos e normas livres das questões demandadas e das resoluções apresentadas, uma vez que são fun- damentados na política de negociação. Conforme dispõe a Figura 1, 34 Gestão e avaliação de políticas públicas a negociação é pautada em três pilares: i) clima ou “humor” nacional, que são questões emergentes ou em discussão pela sociedade para a priorização de temas da agenda; ii) formação de conflitos ou consen- sos pelos grupos de pressão ou forças políticas organizadas; e iii) mu- danças nos governos, permitindo a disseminação de novas práticas e a emergência de novas ideias para a Gestão Pública. A confluência desses três fluxos corrobora a abertura de uma jane- la de oportunidades para os atores manifestarem suas proposições, o que contribui para a formação da agenda. Pode-se constatar esse processo na representação a seguir. Fluxo de problemas Fluxo de soluções Janela de oportunidades Formação da agenda Fluxo político Figura 2 Fluxos decisórios e a formação da agenda Fonte: Adaptada de Oliveira, 2011. Um segundo modelo de compreensão de formulação da agenda foi desenvolvido por True, Baumgartner e Jones, em 2007, denominado Teoria do Equilíbrio Pontuado. Essa teoria busca explicar por que al- gumas temáticas são destinadas às agendas de decisão enquanto ou- tras ficam restritas aos atores invisíveis. A ideia central da teoria é que os processos de Políticas Públicas são caracterizados por períodos de “equilíbrio” e “pontuados” por outros de mudanças. Segundo os auto- res, os períodos de mudanças ocorrem quando uma questão, discutida no âmbito dos atores invisíveis, evolui para ser discutida pelos atores visíveis, retroalimentando o processo da agenda pública. A mudança ou status quo da política nessa teoria depende do modo de formulação da questão. Nesse caso, um determinado tema que- bra a situação de “equilíbrio” ao estabelecer um novo entendimento sobre a temática. Por esse motivo, nesse modelo, a apresentação da política recorre às informações e aos apelos, sendo isso fundamental para acessar o ambiente de formulação da agenda de decisões (TRUE; JONES; BAUMGARTNER, 2007). Atividade 1 A formulação da agenda pública compreende um conjunto de discussões políticas, apresen- tando questões que mobilizam o sistema político. Para ampliar a cidadania, a Constituição Federal de 1988 determina a participação e o controle social na formulação da agenda. No contexto da participação social, quais sãoos obstáculos para a formação de agenda? Ciclo de vida das Políticas Públicas 35 A comunicação dos atores referente à nova temática, portanto, atrai novos atores e novas ideias para a agenda decisória, com base na cons- trução de uma imagem com a sociedade. Inicialmente, é gerado um pe- ríodo “pontuado” por mudanças, desequilibrando o sistema para, em um segundo momento, criar um “ponto de equilíbrio”. 2.2 Formulação das Políticas Públicas Videoaula Uma Política Pública é formulada a partir de escolhas e decisões com impacto em grupos, organizações e indivíduos, que participam de debates e negociações para construí-la. O gestor público sempre deve focar a preocupação com o impacto no público-alvo da Política Pública, considerando os recursos legais, materiais, orçamentários e as pessoas disponíveis para implementá-la. De acordo com Cavalcanti (2007, p. 231), “a formulação se inicia quando os atores políticos, Estado, instituições etc., ‘conjuntamente’ [...] definem qual assunto fará parte da agenda política e sofrerá inter- ferência por parte do setor público, tornando necessária a formulação de alternativas de política”. Dessa forma, pode-se entender que a pri- meira etapa para a formulação da Política Pública é a análise e decisão de inserção dos temas na agenda pública. É nesse momento que as demandas são consideradas prioritárias ou deixadas de lado. A escolha dos temas para composição da agenda é feita tendo em vista sua importância para o interesse público. Sobre isso, Frey (2000, p. 227) afirma que “Somente a convicção de que um problema social precisa ser dominado política e administrativamente o transforma em um problema de policy”. Igualmente nesse sentido, Cavalcanti (2007, p. 181) explica: A construção da agenda ou mais propriamente a inclusão ou não de um determinado assunto na agenda de governo revela o fato de que em função da assimetria existente na distribuição do poder, nem todas as questões se transformam em assuntos que serão objeto da ação governamental. Em outras palavras, nem todos os assuntos são introduzidos na agenda e elaborados a fim de darem lugar a uma política a ser implementada. Desse modo, o ciclo da Política Pública tem início com a identifica- ção e o apontamento dos problemas, definindo as possibilidades e os mecanismos de resolução das demandas apresentadas. A formulação das alternativas é o momento de organizá-las, determinando “como”, 36 Gestão e avaliação de políticas públicas “quando” e “por que” aplicar a Política Pública em questão. É o momen- to de definição dos problemas e das soluções apresentadas pelo poder público (CAVALCANTI, 2007). A formulação das Políticas Públicas é um período marcado por uma série de decisões, motivado por fatores e diversos atores participan- tes. As decisões tomadas nessa etapa influenciam as demais fases do ciclo das Políticas Públicas. Esse processo decisório não é definido de maneira organizada e racional, sendo mais complexo e apresentando resultados indeterminados. O processo de decisão deriva de estudos dos modelos teóricos apresentados no Quadro 1. Quadro 1 Modelos teóricos de análise do processo de decisão Modelo racional Os decisores utilizam critérios racionais, tomando as melhores decisões com base em todas as informações disponíveis. Modelo da racionalidade limitada Os decisores não conseguem tomar a melhor decisão ou a mais racional, por não terem acesso a todas as in- formações disponíveis. Modelo incremental A decisão não é tomada com base nas informações, mas é fruto das pressões sociais e do grau de coalizações dos atores. Modelo de escolha pública Os atores tomam decisões tendo em vista seus próprios interesses e de acordo com seus objetivos pessoais. Modelo de análise de redes A decisão é tomada pela interação dos atores (redes) que contribuíram para formular as Políticas Públicas. Nessa relação, os atores realizam interações e trocas conforme seus próprios interesses. Fonte: Adaptado de Cavalcanti, 2007. Os modelos teóricos ajudam a compreender como as decisões são tomadas na formulação das Políticas Públicas, que é quando os desejos e as demandas dão origem às expectativas. Estas, segundo WU et al. (2014), são hipóteses dos atores sobre os impactos das ações e sobre os seus interesses. Em alguns casos, os atores decisores erram na aná- lise do cenário, propondo Políticas Públicas que não são adequadas à realidade. Mesmo quando o cenário é analisado cuidadosamente, as soluções podem não agradar a sociedade. Ciclo de vida das Políticas Públicas 37 Dessa forma, é natural acreditar que as expectativas podem agra- dar ou desagradar os atores envolvidos, de acordo com as vantagens ou desvantagens observadas na formulação da política. Ocorre, assim, uma mobilização dos atores, defendendo seus interesses e agindo con- forme suas preferências. Rua (2009) define preferências como as alter- nativas de solução para um problema que mais trazem vantagens ao ator (ou conjunto de atores), que dependem do custo aplicado e do benefício recebido. O custo, nesse caso, refere-se a prestígio, poder ou vantagens políticas. Devido a esse contexto de expectativas e preferências, a formula- ção das Políticas Públicas apresenta dois tipos de desafios: técnicos e institucionais. Desafios técnicos Barreiras técnicas podem ser um desafio para a formulação das Políticas Públicas, principalmente, devido à compreensão das causas do problema abordado e dos objetivos buscados. Desafios institucionais São características puramente governamentais, como o ordenamento legal do país, a estrutura federativa, os grupos sociais de pressão, o posicionamento político e a burocracia. Compreendidos e vencidos esses desafios, a formulação de uma Política Pública ocorre a partir de três etapas distintas: i) reunir infor- mações das características dos problemas analisados; ii) desenvolver alternativas de soluções para esses problemas; e iii) planejar objetivos, metas e ações para executar as alternativas propostas (WU et al., 2014). Entende-se, dessa forma, que o sucesso da formulação das Políticas Públicas depende diretamente do modelo teórico de análise de decisão adotado, compreendendo as necessidades e expectativas da sociedade. Por outro lado, é preciso compreender os desafios técni- cos e institucionais que podem limitar ou expandir a atuação do Estado na formulação das Políticas Públicas. O livro Análise de Políticas Públicas: temas, agenda, processos e produtos reú- ne diversos artigos em três partes voltadas para a área da saúde, mas que podem ser estendidas para toda Política Pública. A primeira parte trata das políticas de enfrentamen- to à violência infantoju- venil e às mulheres; a se- gunda trata das políticas de saúde e saúde mental; por fim, a última debate sobre a questão do álcool e outras drogas. GARCIA, M. L. T.; LEAL, F. X. (org.). São Paulo: Annablume, 2012. Livro 2.3 Implementação das Políticas Públicas Videoaula A implementação das Políticas Públicas é a fase subsequente à formulação. Nela, as decisões tomadas se tornam ações práticas que podem ser mensuradas em um momento futuro. A respeito disso, Ca- valcanti (2007, p. 218) destaca que: 38 Gestão e avaliação de políticas públicas Nem todas as políticas definidas são realmente implementadas. E, mesmo as que são implementadas, podem alcançar resultados di- ferentes daqueles que foram originalmente idealizados. Isso ocor- re porque muitas coisas falham entre o momento da formulação e aquele em que são produzidos os resultados. [...] O processo de implementação é um momento especialmente problemático. Mo- mento esse em que se pretende transformar as intenções expres- sas em planos ou programas em ações, e onde se materializam as decisões. Também é um momento que emergem as negociações que não foram levadas a termo entre os atores políticos ou que foram propositadamente deixadas em suspenso. O que denota o caráter dinâmico e complexo doprocesso de implementação. Há três modelos teóricos que buscam explicar a fase de implemen- tação das políticas: a visão clássica da implementação, a visão da im- plementação como processo e a teoria moderna, também denominada visão da implementação como jogo. Na visão clássica, o ciclo da política não é considerado um proces- so. Essa teoria segue o modelo top-down 1 , apresentando as etapas de formulação e implementação de modo segmentado, conforme de- monstrado na Figura 3. Figura 3 Implementação da política na visão clássica Formulação de políticas Implementação de políticas Resultados Fonte: Adaptada de Silva; Melo, 2000, p. 13. A política é construída em duas etapas na visão clássica: a formula- ção é realizada pelos funcionários públicos de alto escalão e, depois, a implementação é realizada pelos funcionários de baixo escalão. Essa teoria defende a ideia de que a Gestão Pública funciona de maneira perfeita, fazendo com que a fase de implementação seja uma reprodu- ção fiel das políticas formuladas anteriormente. A segunda visão, por sua vez, considera a implementação das Políticas Públicas como um processo. Essa teoria é mais completa por relevar as capacidades institucionais do Estado, assim como as ques- tões políticas e as pressões dos grupos e das coalizões. A seguir, a Figura 4 representa a implementação da política com base nessa teoria. O livro Implementação de Políticas Públicas: teoria e prática aborda essa te- mática com base em refle- xões teóricas e estudos de caso de políticas setoriais distintas. Essas reflexões mostram a importância da formulação das políticas em um cenário democrá- tico, plural e global. FARIA, C. A. (org.). Belo Horizonte: PUC Minas, 2012. Livro O modelo “de cima para baixo” (top-down) parte do pressuposto de que a respon- sabilidade pela implementação da política repousa quase que exclusivamente na atuação dos burocratas de “alto nível” que “comandam” aqueles situados nos níveis “mais baixos” (CAVALCANTI, 2007, p. 222). 1 Ciclo de vida das Políticas Públicas 39 Figura 4 A política na visão da implementação como processo Retroalimentação Monitoramento Formulação de políticas Implementação de políticas Fonte: Adaptada de Silva; Melo, 2000, p. 13. Nesse modelo, os problemas na implementação das políticas são monitorados e analisados de modo que retroalimentam o processo, sendo novamente implementados de uma maneira mais eficaz. Diferentemente das visões anteriores, a teoria moderna apre- senta um modelo que entende a implementação como um jogo. Esse modelo considera o ambiente político de negociações e tro- cas, demonstrando que a Gestão Pública não é um sistema per- feito. Além disso, a teoria moderna apresenta características mais realistas, tais como: limites de recursos orçamentários, informação escassa e capacidade limitada dos atores. O modelo destaca tam- bém a impossibilidade do controle das eventualidades, devido à dificuldade de prever as alterações de cenário que podem afetar o ambiente político. A implementação das políticas, no modelo da teoria moderna, não ocorre necessariamente como elas foram formuladas, dadas as eventualidades políticas e orçamentárias – esse processo retroali- menta o modelo e leva os tomadores de decisões a redesenharem objetivos e metas, reiniciando o ciclo de vida das Políticas Públicas. Os defensores desse modelo, entre os quais se destacam Lipsky (1980), Hjern e Porter (1981) e Hjern e Hull (1982), definem esse pro- cesso de retroalimentação como uma forma de aprendizado que contribui para a evolução e dinâmica das Políticas Públicas. Independentemente do modelo adotado, entretanto, Howlett, Ramesh e Perl (2013) destacam que a implementação das Políticas Públicas ocorre em cinco etapas distintas, destacadas a seguir na Figura 5. Atividade 2 O processo de implemen- tação de Políticas Públicas compreende instrumentos para alcançar os objetivos da política e os propósitos desenhados pelo Estado. Dentre as possibilidades de políticas destaca-se o modelo top-down. Do que se trata esse modelo? 40 Gestão e avaliação de políticas públicas Apresentar alternativas para solucionar o problema Projetar os resultados esperados Definir as estratégias de implementação Subdividir o problema Definir o problema e suas causas Figura 5 Etapas da implementação das Políticas Públicas Fonte: Elaborada pelo autor com base em Howlett; Ramesh; Perl (2013). A primeira etapa envolve a definição do problema e suas causas. Nela, ocorre a identificação clara dos problemas, tornando as deman- das cada vez mais transparentes. Em seguida, é feita a subdivisão dos problemas, que permite melhorar a percepção e reconhecer a complexidade do cenário identificado. Apresentam-se alternativas de implementação e soluções, que sejam possíveis e viáveis. A pro- jeção dos resultados esperados envolve a estimativa de resultados e da efetividade da política, mensurando os impactos. Por fim, de- finem-se as estratégias de implementação, escolhendo os meios técnicos e os especialistas, garantindo a correta execução da política. 2.4 Mecanismos de controle social das Políticas Públicas Videoaula Os movimentos sociais têm um importante papel no processo de redemocratização do país desde os anos 1970, buscando intervir nas Políticas Públicas e estabelecendo mecanismos de controle so- cial. Compreende-se como controle social a forma de compartilhar o poder de decisão entre o Estado e a sociedade civil organizada no estabelecimento de Políticas Públicas. Ocorre, assim, uma interação entre o Estado e a sociedade definindo prioridades na elaboração dos planos municipais. Ciclo de vida das Políticas Públicas 41 O controle social pode ser realizado tanto quando a política é imple- mentada como quando a política é fiscalizada, por meio do acompanha- mento e da avaliação das condições de gestão das Políticas Públicas. O controle social também tem um forte papel fiscalizador das ações e da execução do orçamento. A Constituição Federal de 1988 garantiu a participação e o controle social na formulação das Políticas Públicas em regulamentações espe- cíficas, tais como a Lei Orgânica da Saúde (LOS – Lei n. 8.080/1990), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei n. 8.069/1990), a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei n. 8.742/1993) e o Estatuto das Cidades (Lei n. 10.257/2001). Essas leis preveem a consulta e a deli- beração estabelecidas pelos Conselhos de Políticas Públicas. Nesse contexto, o controle social é entendido como um conjunto de maneiras de influenciar o comportamento dos grupos em busca da or- dem e participação social (MANNHEIM, 1971). Assim, o controle social é a evolução da relação Estado–sociedade, na qual a sociedade apresen- ta um novo papel de fiscalização e controle sobre o Estado. Na teoria política, o significado de controle social é ambíguo, podendo ser concebido em sentidos diferentes a partir de con- cepções de Estado e de sociedade civil distintas. Tanto é em- pregado para designar o controle do Estado sobre a sociedade quanto para designar o controle da sociedade (ou de setores organizados na sociedade) sobre as ações do Estado. (CORREIA, 2008, p. 67) O Brasil apresentou historicamente uma forma autoritária de go- vernar por meio de decretos secretos, atos institucionais, repressão e consequente redução da participação social, especialmente durante o regime militar. Esse modelo autoritário de governo faz parte da história e cultura do país, o que ajuda a entender a resistência à Constituição Federal de 1988, que propõe a participação e o controle social das Polí- ticas Públicas (CHAUI, 2001). O modelo de controle social tem como base as teorias de Rousseau 2 , que atribuem à sociedade o poder de controlar todas as atividades do Poder Executivo, seguindo uma perspectiva democrática. Dessa forma, o povo passa a exercer a soberania, em uma ideia do Estado controla- do pela sociedade. Busca-se
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