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SBDG – Caderno 81 1 Cadernos da 81 Trabalhos apresentados por ocasião da conclusão do 111º Grupo de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos, realizado na cidade de Erechim, RS, de 03 de novembro de 2004 a 28 de julho de 2006. Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Didata Solange S. de Oliveira, Especialista Porto Alegre 2006 So ci e d a d e Br a si l e i r a d e D i n â m i c a d o s Gr u p o s SBDG – Caderno 81 2 Travessa La Salle, 75 Bairro Menino Deus CEP 90130-120 Porto Alegre/RS Telefone: (51) 3028.9114 e 3061.9115 E-mail: sbdg@sbdg.org.br Site: www.sbdg.org.br CONSELHO DIRETOR Presidente Samara Mª M. Ferreira Costa e Silva Vice-Presidente Eliane de Melo Meira Rank Diretor Administrativo-Financeiro Geime Rozanski Vice-Diretor Administrativo-Financeiro Roberto Scola Diretora de Educação Carmem Maria Sant’Anna Vice-Diretor de Educação Marcel Paranhos Dias Os textos são de responsabilidade dos respectivos autores, não representando necessariamente o ponto de vista da SBDG. Editoração e gravação: Suliani – Editografia Ltda. Fone/fax (51) 3384.8579 e-mail: editor@suliani.com.br SBDG – Caderno 81 3 NÚCLEOS Núcleo RS GESTOR GERAL: Mara Maru dos Santos GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suzana Zimmer GESTOR DE EVENTOS: Doralício Siqueira Filho VICE-GESTOR DE EVENTOS: André Beneduzi Núcleo SC GESTOR GERAL: Emiliana Simas Cardoso da Silva GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Carmem Sinzato GESTOR DE EVENTOS: João Carlos Machado VICE-GESTOR DE EVENTOS: Maria Alexandra Cardoso da Silva Núcleo PR GESTOR GERAL: Helena Mª França Sundin GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Suely do Rocio Pucci GESTOR DE EVENTOS: Laucemir Pessine VICE-GESTOR DE EVENTOS: Ana Silvia A. Borgo Núcleo PA GESTOR GERAL Mauro Nogueira de Oliveira GESTOR ADM.FINANCEIRO: Rosa Mª Campos de Souza GESTOR DE EVENTOS: Rosa Helena Gonçalves Moreira VICE GESTOR DE EVENTOS: Mª Zenaide Marques Pereira Núcleo MS GESTOR GERAL: Maria Selma Perez GESTOR ADM.-FINANCEIRO: Luciana Rezende GESTOR DE EVENTOS: Miriam de Paula Junqueira Netto VICE-GESTOR DE EVENTOS: Márcia Fachini SBDG – Caderno 81 4 Apresentação Quanto o medo superava a coragem e a ação, foi nascendo o movimento e a atenção. Um medo de se estragar que virou Transformação. Tudo, no início, tão fora do grupo, acabou com alguma Conexão, Coragem permeando a ação. Nosso afeto e nossos parabéns pela caminhada do Grupo que se intitulou ora movimento ora metaformose. Solange e Lídia SBDG – Caderno 81 5 Sumário Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos Cibele Fátima Schifel Fabíola Griebler Gisela Manchini de Carvalho Solange Márcia Bandiera Transferência e contratransferência nos fenômenos grupais Iselda Pereira Naiura Paludo Rossi Patrícia de Fátima Mota Treinamento para lideranças no ambiente organizacional Giseli Cristine Zago Selmar Luis Passini Taís Regina Tibolla Teresinha Albina Bordin Vivenciando a coordenação Lana Cristiane Erig Misiara de Alcântara Simone Alice Röhrig Competências interpessoais em um grupo de formação Iraci Maria Bohrer Mara de Lima Campos Paulo Morais SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 1 Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos Erechim – RS Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos CIBELE FÁTIMA SCHIFEL FABÍOLA GRIEBLER GISELA MANCHINI DE CARVALHO SOLANGE MÁRCIA BANDIERA INTRODUÇÃO Somos hoje um grupo constituído por quatro amigas, que, no início da formação, apesar de não termos grande amizade, buscávamos idêntico objetivo: ampliar conheci- mentos. Já se passaram dezoito meses e ousamos arriscar afirmando que as amizades que eram superficiais ou que já tinham um vínculo estabelecido se tornaram ainda mais fortes e intensas. Para podermos desenvolver este trabalho coube-nos saber respeitar os limites e desejos de todas, porém tínhamos um objetivo em comum; elaborar o trabalho. Assim, nos deparamos com o estilo de cada uma, cujo anseio de todas constituía-se em buscar titulação como Coordenadoras em Dinâmica de Grupo. Acreditamos que o ser humano só existe porque se comunica e sendo assim ousa comunicar-se de várias e inusitadas maneiras. Muitas vezes, não é falando, ou seja, não lançando mão do suporte lingüístico, outras, é falando mas não dizendo nada, outras ve- zes é seu corpo quem se comunica, noutras, ainda, são formas, cores, sons, ruídos, gestos, trejeitos quem falam; enfim, são muitas as formas, as quais tentaremos demonstrar neste trabalho. Para que a comunicação tenha sentido devemos exercer um fluxo de mão dupla, sempre tendo em mente que se torne comum esta comunicação entre duas ou mais pes- soas, isto é: estabelecer dialogismo entre alguém que se comunica (ou pretende fazê-lo), com outro, um presumível interlocutor. Podemos afirmar que o ser humano só se inclui socialmente à medida que intera- ge com seus semelhantes estabelecendo algumas regras que facilitam esta comunicação, poderíamos denominar este movimento de um exercício de comunicação. A humanidade, conforme evolui, passa a ter necessidade de comunicação, Cassi- rer (1992, p. 21) afirma: “Os limites da minha linguagem, são os limites do meu mundo” e o processo comunicativo pode ser verbal ou não verbal o qual vai depender da exigên- cia do receptor em um maior ou menor grau de envolvimento das partes, significa dizer que necessita de intencionalidade e receptividade. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 2 O grupo que deseja afirmar sua identidade e seus valores acaba criando uma lin- guagem própria. E como aconteceu no nosso grupo do SBDG, turma “movimento”, quando se criou uma linguagem e expressões que são genuínas deste grupo. O grande grupo nos proporcionou evolução, já que se constitui como processo, nos fazendo compreender os diferentes níveis de obstáculos, em que usamos a verdade e a autenticidade, os feedbaks compreendidos e omitidos. A COMUNICAÇÃO A comunicação é uma das necessidades básicas do ser humano. Envolve a trans- missão de conteúdos emocionais e intelectuais, e deve ser uma via de mão dupla, pois algo deve ser tido como comum por duas ou mais pessoas. Segundo a definição de Zimerman (2000, p. 168) “A comunicação se processa a partir dos seguintes elementos: o emissor, a mensagem, o canal e o receptor. Cada um deles, em separado ou em conjunto, pode sofrer um desvirtuamento patológico”. O emissor e a fonte de sinais ou mensagens. A mensagem é o conteúdo daquilo que deve ser emitido. O receptor separa a fonte do destino que podem estar próximos ou distan- tes. O canal é quem recebe a mensagem enviada ao canal e a transforma em algo compreensível. A comunicação pode ser entendida como um processo social presente em todas as sociedades, permeando suas ações, reflexões, estruturas e dimensões. É a transferência de informação e significado de uma pessoa para outra, podendo ser considerada como o pon- to que liga as pessoas para que compartilhem sentimentos e conhecimentos. Vygotsky (1998, p. 157) defende que “Se os significados das palavras se alteram em sua natureza intrínseca, então a relação entre pensamento e palavra também se modifica”. Assim sen- do, as relações humanas, de qualquer natureza, sofrem modificações constantes. Ainda segundo Ziberman (2000) é importante sempre levar em conta que cada emissor tem seu próprio estilo de transmitir suas mensagens, o que de um certo modo, é muito influenciado pela sua personalidade, dessa forma aparecem os diversos estilos, o arrogante, o narcisista, o detalhista, odramático, o defensivo, o auto-depreciativo, enfim, cada um coloca o seu jeito singular de ser na mensagem. O indivíduo extremamente narcisista reverte ao seu favor tudo o que ouve, ainda que aparente estar em concordância com o mesmo, o arrogante, tenta provocar uma dis- torção do verdadeiro propósito de quem emitiu a mensagem, o detalhista procura contar tudo nos mínimos detalhes, detalhes estes que muitas vezes não teriam a menor impor- tância senão para o que ele quis entender, o dramático está sempre fazendo “uma tempes- tade em copo d’água”, o defensivo não espera nem o emissor concluir a mensagem e já se coloca na defensiva, o auto depreciativo nunca ouve o que o outro quer transmitir, apenas escuta e relaciona as próprias opiniões com às alheias e sempre acha que é inferior aos outros. Uma mesma mensagem pode ser entendida de diferentes formas, por um mesmo grupo de pessoas, pois elas podem estar em diferentes estados emocionais. Ainda faz-se importante ressaltar que alguns desentendimentos podem ocorrer devido ao significado semântico das palavras, pois uma mesma palavra pode adquirir significados diferentes de SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 3 uma pessoa para outra, os traços culturais, a visão de mundo, a vida pregressa, os conhe- cimentos internalizados inerentes a cada indivíduo, tornam-no diferenciado perante os episódios circunstanciais. O que torna a comunicação humana um fenômeno único, é o fato de que cada pes- soa é única em suas percepções, valores, motivações, interpretações, enfim, cada ser é responsável pelo que fala, ouve, sente, filtra e entende. Segundo Chiavenato (2000), todo ser humano possui uma percepção seletiva, que além de ser um mecanismo de defesa, bloqueia as informações não desejadas, e que o indivíduo considera irrelevantes. Dessa forma podemos dizer que aquilo que duas pessoas comunicam é determinado pelas percepções que possuem naquele determinado momento e pela cosmovisão que detêm. Para entendermos a comunicação é importante entendermos os sentimentos en- volvidos. Muitas vezes um determinado indivíduo se programa para agir de uma forma e acaba agindo de outra, totalmente diferente e inesperada, pois o sentimento que o moti- vou inicialmente, não é mais o mesmo no momento do seu agir já que a programação que havia feito, pode sofrer alterações de natureza vária, inclusive de estado emocional. As palavras nem sempre estão a serviço da comunicação, em alguns momentos, falar não é o mesmo que comunicar, pois às vezes as palavras divergem da aparência. Esta divergência pode ser vista como utilização de máscaras e estas dificultam a possibi- lidade de uma comunicação ser autêntica. A cognição ou conhecimento, representa aquilo que as pessoa sabem a respeito de si mesmas e do ambiente que as rodeia. Neste ambiente estão compreendidos os valores pessoais, as experiências psicológicas passadas e presentes e isto influencia profunda- mente na personalidade de cada indivíduo, pois suas ações são guiadas pelo seu conheci- mento, ou seja, pelo que ele pensa, acredita e sente. Segundo a visão de Manosso (2003), um bom observador consegue identificar o canal que uma pessoa está vivenciando ou se comunicando, através das palavras e dos gestos que usa. As pessoas costumam utilizar em suas falas, palavras que especificam processos de ver, ouvir, sentir, degustar e cheirar; é assim que se formam as comunica- ções visuais, auditivas e sinestésicas. As pessoas se comunicam ainda pela postura, respi- ração, suor, tensão muscular, relaxamento, isto é, a comunicação é entendida devido à forma de colocação das palavras, postura corporal, gestos e expressões faciais. Enfim, Fernandes (1991) assinala dois aspectos que são muito importantes no processo de comunicação grupal: o primeiro é o de que “tanto o emissor como o receptor fazem transformações o tempo todo. Desse modo, comunicação completa e verdadeira é impossível”. O seu segundo assinalamento aponta para a relevante questão daquilo que não é dito, sendo que “grande parte das confusões que ocorrem quando tentamos nos co- municar, são desviadas pela omissão. Em muitos casos, o trabalho principal do analista será tentar descobrir o que não foi dito”. Não há outra forma de evoluir, senão a de nos comunicarmos com outras pessoas, toda ação provoca uma reação, assim como os atos comunicativos, como veremos a se- guir na apresentação dos conteúdos da comunicação verbal e não verbal. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 4 Tipos de comunicação Comunicação verbal A comunicação verbal e escrita ocorre de forma direta entre o emissor e o recep- tor, mas é importante deixar bem claro que uma mensagem pode sofrer diferentes distor- ções por ser recebida por diferentes pessoas ao mesmo tempo, sendo que estas podem entender de formas distintas. Poderíamos dizer que o que está no imaginário destas pes- soas, seria acrescentado à mensagem. Em outras palavras, a comunicação verbal consiste na troca de informações reali- zada entre duas ou mais pessoas através das palavras ou da escrita, para estabelecer um contato com os demais, podendo, assim, expressar seus pensamentos e sentimentos. Existem muitas diferenças na habilidade de cada indivíduo no uso da linguagem falada, que estão relacionadas, principalmente, com o grau de inteligência, educação, treino e classe social. A seguir seguem alguns exemplos de comunicação verbal, extraídos do grupo Movimento da SBDG. – “O grupo anda no ritmo dos mais lentos”. – “Um charuto é só um charuto”. – “Este grupo vai me estragar”. – “O grupo coloca só a pontinha”. – “Aqui todos querem ser os fodões”. – ”Vou me furar com a faquinha”. – “Desejar o desejo do outro”. – “Cala a boca e chupa, isto quer dizer”. – “Tô me cagando todo”. – “Não vou descer do salto”. – “Só por Deus”. – “Aqui dentro eu sou diferente de lá fora”. – “Hoje eu gozei”. – “Vou ter que elaborar”. – “Vou levar para pensar”. – “Estou tendo um insight”. – “Não sei se volto no próximo encontro”. – “Não sei se ocupo o meu espaço”. – “Não tô entendendo”. – “Nós mostramos como realmente somos”. – “O lado saído do grupo”. – “Este foi o meu encontro”. – “Ir ao ponto”. – “Matar um leão por dia”. – “Vou largar um pum aqui”. – “Cada um vai crescer até aonde se permitir”. – “Sabor do chocolate e o amargo do limão”. – “Eu não consigo, ou eu não quero”. – “Destruir para construir”. – “As coisas que não são resolvidas voltam”. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 5 – “O grupo não percebe quando atinge o objetivo”. – “vou pegar o chicotinho”. – “Você está sabonetiando”. – “E o grupo se esconde atrás da técnica”. – “O grupo da o poder para quem quer”. – “Tira o microfone da...” – “A serviço de que”. – “este grupo quer se cuidado”. – “Que jogo é este”. – “Você conta tudo, tudinho para este grupo”. – “Até que ponto eu valorizo eu valorizo o que tenho”. – “Agora que ficou bom acaba”. – “Engolir Goela abaixo”. – “O que significa perder o poder para este grupo?”. – “Não mexe mais comigo”. – “O grupo se incomoda quando não se apropria”. – “Síndrome da Gabriela”. – “Minha verdade”. – “Me ajuda que eu te ajudo”. – “São sempre os mesmos”. – “Este grupo não é um grupo terapêutico”. – “A gente é assim, muito sério, muito rígido”. – “Este grupo não se permite”. – “O que tem por trás disso”. – “O que esta fora..., o que esta aqui dentro”. – “Do que este grupo tem medo”. – “Este grupo só olha para o próprio umbigo, e esquece do resto”. – “Que faceta deste grupo que esta depositada na...” – “Qual é a perda que este grupo chora”. – “Qual é o luto deste grupo”. – “Estou emburrecendo”. – “Fica na fantasia”. – “Este grupo vai me acolher”. – “Será que eu vou poder confiar neste grupo”. – “Que investimento cada um está fazendo?” – “Dar-se conta”. – “Este grupo não sepermite brincar”. – “Porque que o riso dos membros incomoda”. – “Vocês não estão fazendo os relatórios” – “Tu fizeste uma escolha”. – “Pegar alguém para Cristo”. – “Alguma vez você disse o que espera dele?” – “Talvez ele te dê tudo o que ele pode dar”. – “Eu fiz falta neste grupo”. – “Agora se abracem”. – “Eu não sei se agüento o rojão”. – “O grupo come para não falar”. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 6 Comunicação não-verbal Segundo Kurt Lewin (1965), a comunicação não-verbal é todo recurso que possi- bilite a comunicação além da fala. Neste contexto, podemos citar gestos, expressões fa- ciais, posturas, enfim toda forma que expresse sentimentos sem utilizar as palavras. Podemos considerar diversas formas de comunicação não-verbal. Contato corporal é todo contato que possibilite proximidade física, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, quando no início de todos os encontros o grupo se cumprimentava com abraços, beijos, carinhos, sendo que era claro o desinteresse de alguns por este tipo de contato, alguns saíam antes outros chegavam atrasados, e outros se comprometiam com tarefas como limpar a cuia, preparar o chimarrão, arrumar as cadei- ras, etc. Proximidade física é todo convite de proximidade mais íntima, como, por exem- plo, o grupo Movimento da SBDG sair para jantar, fazer um encontro em um local onde todos os membros do grupo pudessem ficar juntos e dormirem em um acampamento, como aconteceu com o grupo. Postura corporal é a forma de inclusão expressa através do corpo, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, quando alguns integrantes não se sentindo à vontade demonstram seu incômodo não ficando sentados na cadeira, não se sentindo à vontade para sentar no chão, afastar a cadeira para trás do círculo. Gestos é a forma de expressar incomodação interior como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, quando alguns colegas caminham forte expressando indignação, quando outros balançam a classe, batem a caneta, saem da sala para ir ao banheiro, ou ainda gestos de finalização para encerrar uma situação. Expressões faciais são a forma de expressar claramente, através dos músculos fa- ciais, os sentimentos do aqui-e-agora, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, as caras e bocas do grupo, desânimo, frustração, incomodação, o bufar de alguns colegas, expressões de surpresa, alegria e aceitação. Movimento e expressão dos olhos são a forma declarada de demonstrar os sen- timentos e buscar alianças nos sentimentos, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, muito presente entre os membros dos subgrupos quando os mesmos, através de olhares se comunicavam e os demais membros do grande grupo ficavam como “peixes fora d’água”. Aparência é a forma que o membro do grupo vê a si mesmo e como gostaria de ser visto pelos outros, como, por exemplo, o grupo Movimento da SBDG, em que alguns membros do grupo dizem que nunca vão descer do salto, outros sempre com cara feliz, outros sempre se fazem de vítimas, doentes, e outros querendo ser os “fodões”. Aspectos não-verbais da fala são a forma de desdizer alguma coisa falando algo e demonstrando outra coisa totalmente diferente através da postura do membro, como quando alguns integrantes do grupo Movimento da SBDG falavam que estavam felizes e a expressão era de infelicidade, era o “tudo bem” do grupo. É possível que a comunicação verbal não esteja sincronizada e sintonizada com a comunicação não-verbal no mesmo indivíduo, no mesmo momento. “Às vezes o não- verbal está em dissonância com o verbal, trai o eu íntimo que o verbal tenta camuflar” (Mailhiot, 1970, p. 71). Para Manosso (2003), esse é o Princípio da Conformidade Ex- pressiva, ou seja, a conformidade entre o que se expressa e o que se comunica, quando isso não acontece causa o estranhamento, a desconfiança e a reprovação. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 7 Todo comportamento pode ser comunicado. Há casos, porém, em que os indiví- duos querem evitar a comunicação e, dependendo do contexto, não podem se eximir. As- sim, segundo Watzlawick (1967), algumas reações são possíveis de acontecer em função do indivíduo não querer se comunicar, como: Rejeição da comunicação – é identificada pelo não desejo de não se comunicar. No grupo Movimento do SBDG esta situação se fez presente quando no encontro 17 foi dada a oportunidade a uma integrante do grupo mediante a provocação, para comunicar- se, e ela não se apropriou do espaço dizendo: “Não estou preparada para falar”. Aceitação de comunicação – caracteriza-se pela tendência das pessoas em res- ponder o mínimo necessário, evitando maiores informações sobre o fato. No Grupo Mo- vimento do SBDG, constatamos isso quando supomos que, se aprofundássemos estes temas, o que estava no imaginário do grupo iria de encontro às normas convencionadas e crenças do grupo. Acreditamos que o grupo não aprofundou por medo de ressignificar suas relações. A desqualificação da comunicação – caracteriza-se quando o indivíduo invalida sua própria comunicação ou a do outro. Abrange uma gama de fenômenos da comunica- ção: incoerências, mudanças bruscas de assunto, interpretações erradas. O grupo Movi- mento da SBDG, por várias vezes, não respeitou o silêncio ou o momento de seus inte- grantes, mudando de assunto ou falando de outro problema latente, descontextualizado, muito presente nos encontros do grupo esta atitude com relação a um integrante, que mesmo em sua ausência, então, o grupo acabava por desqualificar algumas falas. Silêncio Dentre as forma de comunicação não-verbal muito utilizada pelo homem é o si- lêncio. O silêncio é sempre uma das maneiras mais ricas de comunicação não verbal que o grupo utiliza para expor uma faceta diferente ou para encobrir em determinado momen- to, algo que não está conseguindo enfrentar. O silêncio é sempre uma das mais ricas fontes de comunicação não verbal que o grupo usa para expor uma faceta diferente ou para encobrir um determinado momento, algo que não está conseguindo enfrentar. [...] Estar à vontade dentro dele ajudará o grupo a aliviar- se de grande parte da tensão ansiosa (Castilho, 2002, p. 94). O silêncio é uma expressão não-verbal do grupo, que nos comunica, às vezes, muito mais do que as palavras. Para Castilho (2002), o silêncio é o “espinho na garganta de muitos facilitadores de grupo”. O silêncio marca freqüentemente o fim ou início de uma nova etapa do grupo. É como se as pessoas estivessem procurando recuperar energias para uma nova fase, e no- vamente se repete o ciclo do comportamento que, com outro enfoque e objetivo, quebra resistências. O silêncio é um fenômeno de grupo dos mais expressivos. O mesmo deve ser res- peitado e considerado para o grupo poder ser interpretado e estudado. Sendo assim, per- cebe-se que no começo dos grupos o mesmo é muito evitado e até incomoda, principal- mente os membros mais ansiosos e impacientes. O grupo passa a depender dos integran- tes que falam sem parar, fazem brincadeiras para evitar qualquer tipo de tensão. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 8 Mesmo com o empenho do grupo para abafá-lo, ele surge, obrigando os membros do grupo a outras reações, como balançar os pés, escrever ou rabiscar sem parar, coar café, tomar água ou chimarrão, trocar olhares. Afirma Castilho (2002) que são várias as modalidades de silêncio que se fazem presentes nos processos dos grupos. Os mais freqüentes são: Silêncio de medo – Caracteriza-se por muita tensão, manifesta-se pela mudança de postura física e psicológica, quando a angústia gerada pelo encontro leva para casa e gera dor, como quando alguns integrantes do grupo Movimento da SBDG retornam no dia seguinte após passar a noite com vômitos, dor de cabeça, enxaqueca, herpes e mal- estar. Silêncio da dor e perda – Este silêncio é vivido por perda real, danomuito sério, vivido no grupo movimento SBDG como, por exemplo, a briga entre irmãos fora do gru- po, a perda do diploma por um dos integrantes do grupo, a saída de dois integrantes do grupo, movimentos que deixaram o eco de suas falas presentes nos demais membros. Silêncio de expectativa – A fantasia sobre relatos que poderiam vir à tona, dei- xando o grupo na expectativa. No grupo Movimento SBDG apareceu este silêncio em vários momentos como, por exemplo, quando um membro do grupo falou sobre sua von- tade de se mudar para a Bahia e, depois, nos demais encontros se calou e não relatou mais nada. Silêncio de solidão – É um sentimento de vazio, de estar só. Integrantes do grupo freqüentemente citam a falta de intimidade com o parceiro e dificuldade de comunicação. Silêncio de desinteresse – Caracteriza-se pela resistência ou bloqueio emocional frente à situação. Presente nos encontros quando alguns integrantes saem da sala em meio a discussões, ou quando colegas faltam a encontros e voltam como se nada tivesse ocor- rido. Silêncio por dificuldade de comunicação – É a dificuldade de se expressar. Ocorre quando um integrante não ocupa o seu espaço. Silêncio de mágoa – É sentimento de mágoa, decepção, perda de confiança em alguém. Ocorreu quando um integrante do grupo movimento foi rejeitado por outro membro e depois teve que fazer a co-coordenação com o mesmo. Quando um membro do grupo rejeita o outro para não poder realizar o trabalho de coordenação, fica instaurada a mágoa. Silêncio de desconfiança – É o medo que o grupo tem de que exista a quebra do sigilo ao que for colocado no grupo. No grupo, ficou depositado por duas vezes em uma colega, quando fatos externos geraram a cobrança da possível quebra de confiança, mo- mentos em que fantasias de integrantes desestabilizam a união e confiança do grupo. Silêncio da reflexão – É momento de introspecção do grupo após experiência emocional intensa. Presente no grupo movimento quando o grupo torna-se reflexivo, após a emoção por relatos de integrantes. Silêncio de atenção – É disposição para escutar, se colocar no lugar do outro. Muito presente quando o integrante encontra-se motivado a falar e o grupo se dispõe a ouvir. Ocorreu no grupo quando uma integrante trouxe para o grupo a problemática do filho, que não conseguia ler, abalada pela perspectiva de ver sua história se repetir. Enfim, as pessoas vivenciam inúmeras situações de silêncio, e de forma incons- ciente ou não, esperam que ele resolva, decida ou faça tudo aquilo que elas não conse- guem ou não querem enfrentar; contudo, percebemos no grupo, movimento que os maio- res crescimentos, amadurecimentos e trocas, ocorreram quando a comunicação verbal foi plena, o silêncio interpretado e a comunicação não-verbal decodificada. SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS Inúmeras vezes no transcorrer do curso, ouvimos sobre a importância da comuni- cação nos grupos. Mas o que significa exatamente comunicar? Quais são as formas de comunicação? Há significado no silêncio? Houve efetiva comunicação no grupo que du- rante dezoito meses integrou esta turma do SBDG? Dessa forma, o tema escolhido por este subgrupo para o trabalho de conclusão do curso não poderia ser mais apropriado, uma vez que a questão da comunicação nos gru- pos é um dos cernes da própria dinâmica de grupos: a raiz da palavra comunicação é a palavra comum. Comunicar seria o ato de tornar comum, conhecido. Este ato de tornar comum a outras pessoas os sentimentos, as intenções, os conflitos poderia tranqüilamente descrever um dos objetivos da dinâmica de grupos. Durante a elaboração do trabalho, na medida em que a pesquisa teórica avançava, surgiram, no grupo, alguns questionamentos em relação ao tema, objeto deste estudo, e à sua relação com a prática vivenciada por todos nós, enquanto participantes do curso. Es- pontaneamente brotaram questões como: de que forma deu-se a comunicação da turma durante o período de duração do curso? Houve predominância de que tipo de comunica- ção? Todos conseguiram se comunicar? A reflexão sobre o tema levou à conclusão de que as falas dos integrantes não transmitiram somente nossas idéias; transmitiram também um conjunto de informações sobre nós mesmos. Certas palavras e gestos que empregávamos acabavam “denunciando” quem éramos, o que estávamos sentindo, os conflitos conscientes e inconscientes que estávamos vivenciando naquele momento. O uso da comunicação também informava sobre nossa timidez, sobre nossa capacidade de nos adaptarmos a situações novas, nossas inseguranças, limites, alternâncias, entre outras. Por outro lado, detectou-se que, quanto mais a convivência se estreitava, mais era possível estabelecer uma comunicação eficiente, sendo que as barreiras iniciais foram suprimidas pouco a pouco, oportunizando a integração e o crescimento do grupo, mesmo quando a comunicação revelava conflitos, problemas pessoais e diferenças entre os mem- bros. O desencontro entre o que se falava e o que se sentia gerou conflitos internos in- dividuais que acabaram se alastrando para o grande grupo – abafados no início, os confli- tos iam ganhando força e um dia, acabavam se exteriorizando, surpreendendo, às vezes, o próprio autor da explosão, uma vez que estes indícios corporais, na maioria das vezes, são sinais inconscientes até para quem os emite. A integração dos sentimentos, desejos e anseios pessoais, com a prática da vida diária, exige um profundo autoconhecimento ou, pelo menos, vontade sincera de se conhecer. Quanto mais distanciada está a pessoa do que ela realmente é, mais perceptíveis são os sinais de distanciamento entre o que se ex- pressa racionalmente e o que se expressa irracionalmente, através de todo um conjunto de gestos corporais e atos falhos. Nesta direção, Diana Cooper (1993, p. 127), no livro Ilumine sua vida, fornece uma explicação interessante em relação aos sinais produzidos por nosso corpo e que se constituem em efetiva comunicação: “O nosso corpo é um maravilhoso instrumento para demonstrar o que está acontecendo em nossa mente. Podemos até mentir para nós mes- mos, enganando sobre nossos sentimentos e emoções, mas nosso corpo jamais mente.” Se alguém diz que quer fazer algo, mas seus olhos vagueiam, seu corpo está di- zendo o contrário. Se afirmamos que gostamos de alguma coisa, mas cruzamos os braços, nosso corpo diz que não estamos à vontade. Se, em seguida, retrucamos que cruzamos os SBDG – Caderno 81 Comunicação verbal e não-verbal na dinâmica dos grupos 10 braços porque nos sentimos melhor dessa maneira, significa que estamos tão habituados a nos sentir ameaçados, que esta é de fato a única posição em que nos sentimos descontraí- dos. O grupo Movimento da SBDG – Erechim fez uso da comunicação não-verbal que sempre esteve presente através dos nossos gestos, choros, nas dores de cabeça, nas en- fermidades, nos abraços bem apertados ou na falta de cumprimentos, o excesso de cari- nho ou a falta dele, no bom humor, enfim, o tempo todo passamos nos comunicando, mesmo quando a intenção não era comunicar algo. Para tanto, a fim de enriquecer o tra- balho e aproximar a teoria da comunicação nos grupos na prática vivenciada por nós, selecionamos um conjunto de palavras, gestos e sinais que foram emitidos pela turma nos dezoito meses de duração do curso. Este trabalho nos proporcionou a compreensão de que a comunicação, sob qual- quer forma que ela se manifeste, é um poderoso instrumento de ação social, transforma- dora. Ela pode tanto facilitar quanto dificultar o nosso relacionamento com as pessoas e a sociedade em geral. Proporcionou, igualmente, a reflexão acerca da importância do auto- conhecimento, da análise crítica individual e do recebimento dos feedbacks: se a comuni- cação clara do que queremos e do que pretendemos, é essencial para o nosso crescimento nos âmbitos pessoal e profissional, antesde tudo precisamos nos comunicar com nós mesmos. Uma mensagem confusa revela um emissor igualmente “perdido”. Uma mensa- gem clara e objetiva, revela um emissor seguro e confiante. Como no verso “qualquer vento ajuda para quem sabe a direção que quer tocar o barco”, quanto mais nos conhece- mos melhor nos comunicamos e, conseqüentemente, mais perto estamos de atingir os nossos objetivos. REFERÊNCIAS BION, Wilfred R. Experiência dos grupos. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1970. CAPRA, Fritjof. As conexões ocultas: ciência para uma vida sustentável. São Paulo: Cultrix, 2002. CASSIRER, Ernest. Linguagem e mito. São Paulo: Perspectiva, 1992. CASTILHOS, Áurea. Dinâmica do trabalho de grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. CHIAVENATO, Idalberto. Recursos humanos. São Paulo: Atlas, 1994. COOPER, Diana. Ilumine sua vida. São Paulo: Roca, 1993. LEWIM Kurt. Teoria de campo em ciência social. São Paulo: Pioneira, 1965. MAILHIOT, Gerald B. Dinâmica e gênese dos grupos. São Paulo: Duas Cidades, 1970. MANOSSO, Radamés. Elementos de retórica. Disponível em: <www.url:http://radamesm.sites.uol.com.br/autor.htm>. MOSCOVICI, Fela. Desenvolvimento interpessoal: treinamento em grupo. 10. ed. Rio de Janeiro: LTC. VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Pensamento e linguagem. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1998. WATZLAWICK, Paul; BEAVIN, Janet H.; JACKSON, Don D. Pragmática da comunicação humana. São Paulo: Cultrix, 1967. ZIMERMAN, David Epelbaum. Fundamentos básicos dos grupos terapias. Porto Alegre: ArtMed, 2000. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 1 Curso de Formação Básica em Dinâmica dos Grupos Erechim – RS Coordenação: Lídia Tassini Mancia, Solange S. de Oliveira Transferência e contratransferência nos fenômenos grupais ISELDA PEREIRA NAIURA PALUDO ROSSI PATRÍCIA DE FÁTIMA MOTA EU NÃO SOU VOCÊ, VOCÊ NÃO É EU... ... MAS ME VEJO... ... ME SINTO EM VOCÊ... “Eu não sou você Você não é eu... Mas sei muito de mim vivendo com você. Eu não sou você Você não é eu Mas me encontrei comigo e me vi enquanto olhava para você Na sua insegurança Na sua desconfiança Na sua competição Na sua birra infantil Na sua omissão Na sua firmeza Na sua impaciência Na sua prepotência Na sua fragilidade Na sua mudez Na sua indiferença Na sua raiva Na sua... E você como se sentiu enquanto olhava para mim? Eu não sou você Você não é eu Mas você me reflete No que ainda sou No que quero vir a ser Eu não sou você Você não é eu Mas me vejo, me sinto em você quando... (Madalena Freire) SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 2 INTRODUÇÃO Ao estruturar o tema do trabalho de conclusão, partiu-se do questionamento: “o que despertou maior inquietude e/ou reflexão no decorrer da formação, de modo que te- nha um sentido especial para se investigar?”. Entre uma discussão e outra, acerca da tarefa a ser executada, resgatam-se vivên- cias experienciadas no decorrer da formação do grupo “Movimento”, elucidando senti- mentos que pairavam uma em relação às outras do subgrupo. Ou seja, se questionava: “afinal, que sensações despertam e despertamos quando se percebe e percebemos reações e sentimentos dos outros em relação a si e de si em relação aos outros?”. Assim, se identifica a importância de examinar o conceito de transferência e con- tratransferência, aliado aos mecanismos de defesa, focalizando suas peculiaridades no contexto grupal. Na situação de grupo coexistem múltiplas transferências que os mem- bros estabelecem entre si, potencializando uma gama de possibilidades de sentimentos, tornando-se fundamental que os componentes do grupo desenvolvam a capacidade para reconhecer os próprios sentimentos transferenciais que os outros lhe despertam, assim como os que ele desperta nos outros. A partir disso, possibilita-se a objetivação de alguns aspectos considerados importantes para a leitura grupal, que podem ser traduzidos no auxilio a cada indivíduo para identificar o que é seu do que é do outro; facilitar o anda- mento da livre tarefa e o atingimento dos objetivos do grupo; bem como, identificar as necessidades para crescimento de cada pessoa, de que ela deve aprender a reconhecer, por mais difícil que seja, aquilo que ela desperta nos outros. Dessa forma o trabalho possui como objetivo estudar os fenômenos de transferên- cia e contratransferência em grupos operativos de aprendizagem, evidenciando seu pro- cesso e implicações no autoconhecimento, forma de interação dos membros, consecução da tarefa e no alcance dos objetivos grupal. Visando, observar, a luz da teoria psicanalíti- ca, alguns momentos em que o grupo de formação “Movimento” vivenciou os fenômenos de transferência e contratransferência e seus reflexos no campo grupal. O leitor poderá acompanhar no decorrer das próximas páginas, que desvelaremos alguns momentos em que o fenômeno da transferência e da contratransferência ocorreu nos encontros, precedidos da contextualização teórica, que dá suporte ao nosso entendi- mento. Salientamos ao leitor que intencionalmente, no decorrer da nossa pesquisa, substi- tuímos alguns termos para melhor entendimento da nossa construção literária; sem, con- tudo, deturparmos o sentido do contexto de onde ele foi “recortado”.1 “Eu não sou você, você não é eu, mas vejo, me sinto em você quando...” Ah, quantas projeções, sobre as quais desejamos despertar reflexões que permitam os mem- bros de grupo lançar em seu mundo interior, na busca constante de seu autoconhecimento como premissa para o estabelecimento de relações interpessoais que permitam a constru- ção genuína do eu, você e nós. 1 Os termos substituídos são: terapeuta e facilitador por coordenador; paciente por grupo ou componente de grupo. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 3 QUEM SOMOS? UM BREVE OLHAR SOBRE O GRUPO MOVIMENTO O 111º grupo de formação em Dinâmica de Grupo da SBDG, 2º grupo de forma- ção da cidade de Erechim/RS, teve seu início marcado em 30 de setembro de 2004, com a participação de 19 membros, entre os quais dois do sexo masculino, e duas coordenado- ras, ambas de Porto Alegre-RS. A interessante composição da educação acadêmica dos membros oferece, assim como um “conjunto de notas musicais”, um tom complementar na construção da aprendi- zagem. Os “tons musicais” contemplam enfermeiros (2), contabilistas (4), psicólogos (3), advogados (3), administradores (3), pedagoga (1), assistentes sociais (2) e tecnologia da informação (1). Cada um com conhecimentos e experiências das diversas áreas: agências de empregos, empresas de material de construção, empresas de contabilidade, docência, hospitais, grupos terapêuticos, consultoria, área de recursos humanos e instituições edu- cacionais. O grupo é convidado a construir sua “cara” através da “confecção” de seu nome, melodia e grito de guerra. Nestes momentos, fica mais evidente a homogeneidade de al- gumas características e dicotomicamente a heterogeneidade de outras que dão o ritmo no funcionamento deste grupo. No decorrer da construção da melodia do grupo, surgem inúmeras surpresas, entre as quais os tons oriundos das ciências exatas, que inicialmente exclamavam “um charuto é só um charuto”, passam a olhar o que fica na sombra do gru- po... o que está nas entrelinhas... E o sentimento inicial, depositado no grupo, de que in- terpretações são restritas a psicólogos, passam a ser desmitificadas e apropriadas também por eles. Vários ensaios de acertos e elaborações foram construídos nos diversos encontros, todos em busca de um significado coletivo, de uma identidade grupal que pudesse lem- brar a “interligação” dos seus membros. No início, percebe-se foco maior em procedi- mentos formais,como horários de funcionamentos, locais (diversas vezes foi alterados – será o medo da afirmação deste grupo?), bem como conflitos originados pela seleção dos “síndicos” do grupo. Estes ajustes em alguns momentos demonstravam serem necessários para estruturação do grupo; no entanto, em outros, demonstravam que o grupo necessita- va se conhecer, saber o que era “aceito” por todos, como também obscurecia outros as- suntos que o grupo precisava discutir naquele momento. Aos poucos o grupo foi focando as discussões para os assuntos que emergiam nas técnicas vivenciadas, e assim começava ficar mais claro o que este grupo buscava. O grupo sofreu duas perdas. A primeira relacionada a um membro que participou do primeiro encontro e não retornou para o seguinte. O impacto desta saída se fez presen- te nos movimentos que o grupo construiu. O sentimento foi de um desacorde, como se a orquestra tivesse perdido um tom. O temor da separação, da perda, sondava constante- mente o grupo: “ninguém pode desistir; temos um compromisso conosco”; “se houver mais uma desistência eu não vou ter condições financeiras para suportar”. (Será que eram as condições financeiras que não podiam suportar?) Ao final do segundo módulo, o grupo sofre sua segunda desistência. E, pelo estágio de desenvolvimento em que se encontrava, sente os reflexos e impactos deste evento, podendo ser exemplificado através da manu- tenção (por vários encontros) da cadeira vazia no círculo, ou nos momentos de coordena- ção que falas ficavam veladas sobre o assunto. Contudo, esta segunda desistência permite ao grupo perceber seu funcionamento diante de perdas, dos temores e angústias que ron- dam, bem como o seu trabalho de elaboração do luto e de fantasias de abandono, entre SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 4 outros temas e sentimentos que nos fogem no momento em que revivemos e resgatamos transcrever esta história. Diversos sons e melodias surgem no caminhar deste grupo, oscilando em suaves, alegres, tristes, ruidosas, silenciosas, confabulosas, empáticas, agitadas, projetivas... E neste balançar, entrelaçado de emoções, o 111º grupo vai construindo a sua história e identidade grupal, contando ao término, após 19 encontros mensais, com 17 membros, ou melhor, 17 tons musicais da mais bela sinfonia oportunizada pela Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupo. O FENÔMENO DA TRANSFERÊNCIA Para melhor compreender o conceito de transferência, pode-se inicialmente rever a definição da palavra transferir. De acordo com o dicionário Novo Aurélio Século XXI, corresponde a “fazer passar (de um lugar para outro); mudar de um lugar para outro; des- locar”. Conseqüentemente, designa-se por transferência o “ato ou efeito de deslocar, transferir ou ceder a outrem a propriedade de algo”. Aproximando-se do conceito psica- nalítico, equivaleria a transferir sentimentos e desejos inconscientes vivenciados no pas- sado com pessoas importantes (por exemplo, pai, mãe, irmãos e outros personagens signi- ficativos, que fizeram parte das primeiras relações estabelecidas no ambiente familiar) a outras do presente. Embora para a comunidade psicanalítica o termo “transferência” deva ficar restri- to ao que se passa no campo analítico, daquilo que o paciente está revivendo e sentindo com o seu analista, é inegável que não há como desconhecer que essa expressão já ga- nhou grande extensão e uma analogia conceitual com aquilo que se passa na relação mé- dico-paciente, professor-aluno, patrão-empregado, etc. Como afirma Zimerman (2005), em qualquer campo grupal, seja terapêutico ou não, é inevitável que surjam manifesta- ções transferenciais. A percepção distorcida do campo relacional, resultante das expectativas do passa- do que são projetadas inadvertidamente no presente, de modo totalmente indiscriminado e inconsciente, é o que se convencionou denominar transferência. A pessoa impõe atitu- des, sentimentos e expectativas adotados no passado a uma pessoa do presente; mas esta percepção é completamente desprovida de sustentação na realidade, pois se enraíza em um solo predominantemente inconsciente e, como tal, é regida pelo processo primário de pensamento e embebida na vida de fantasia do sujeito (Gabbard, 1992). Ainda que vinculada aos eventos do passado, transferência é um fenômeno, por excelência, do aqui-e-agora. É nesta realidade precária e heterogênea do espaço da trans- ferência que vigora uma dimensão da temporalidade complexa e não-consistente marcada pela coincidência e não coincidências simultâneas entre o passado subjetivo do indivíduo. Neste espaço, tanto o passado irrompe no atual, como o presente pode incidir sobre o passado, desconcertando-o e ressignificando-o. O FENÔMENO DA TRANSFERÊNCIA NOS GRUPOS A transferência no grupo é multilateral, pois engloba não somente o relaciona- mento dos membros do grupo com o coordenador, mas também dos próprios membros SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 5 entre si (Zimerman, 1999). Logo nos estágios iniciais do grupo, pode-se observar que há alguns indivíduos que estabelecem uma transferência com o coordenador, enquanto ou- tros o farão com determinados participantes. Nota-se, assim, que progressivamente vai se estabelecendo uma rede de relações entre os membros do grupo e, paralelamente, confi- gura-se a transferência dos membros em relação ao coordenador e deles próprios entre si. Essa configuração multifacetada de vínculos leva ao desenvolvimento de um senso de intimidade dentro do grupo, que contribui para fomentar um clima de confiança e de maior liberdade em relação às inibições individuais. Contudo, em grupos operativos não-terapêuticos, de ensino aprendizagem, por exemplo, o coordenador nada fará para incrementar o surgimento das transferências e somente trabalhará com as mesmas se elas estiverem muito emergentes e num grau im- peditivo do livre curso da tarefa grupal. Segundo Zimerman (2005), a transferência pode se manifestar em quatro níveis, os quais serão elucidados através de um breve conceito e com exemplos extraídos dos encontros de formação em diferentes datas: a) Transferência Parental: de cada indivíduo em relação à figura central do coordenador de grupo. Caso: O membro R coloca para o grupo que tinha expectativa que suas interven- ções fossem validadas pela coordenadora P. Esclareceu que isto fazia com que tivesse uma grande exigência na elaboração de suas interpretações, inclusive gerando seu silên- cio, devido o medo de não atender as expectativas da coordenadora. Hipótese: O membro R transfere a sua própria auto-exigência de desempenho pa- ra figura do coordenador e a necessidade de ser percebida, aceita, por figuras de autorida- de. b) Transferência Grupal: do grupo como uma totalidade em relação à figura central, ou seja, o membro que está se manifestando. Caso: No antepenúltimo encontro do grupo Metamorfose o membro N relata no jornal a possibilidde de repetência de seu filho na escola. Diz que a professora apontou o seu filho como o mais fraco da turma e ainda não consegue ler. Durante o relato, o mem- bro N se emociona, relembrando que repetiu por duas vezes e diz sentir vergonha deste fato. Abaixa a cabeça e não consegue olhar o grupo. O grupo se mobiliza em torno do tema, e utiliza-se de teoria pedagógica, afirman- do que a professora não tem uma postura adequada frente à questão, pois se deve respei- tar o ritmo de cada aluno. O membro P intervém e diz: “Gente vamos ouvir o sentimento dela!” Hipótese: A totalidade do grupo (representado por N) identificou-se com a condi- ção de fragilidade e medo de não atender as expectativas de membros diversos, de ser o fraco do grupo. c) Transferência Fraternal: de cada indivíduo em relação a outro(s) determinado(s) indivíduo(s). Caso: O membro O diz ter se sentido traído pelo subgrupo de estudos teóricos, devido o membro C não ter falado sobrea sua escolha de outros pares para o trabalho de conclusão. Fala sentir-se traído pelas coisas não ditas, não faladas sobre o que vinha acontecendo e também traído pelo subgrupo não ter feito o trabalho de conclusão, mas ter sido desmembrado. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 6 O membro C pergunta para O: “E o que você fez para contribuir para o nosso gru- po se reunir? Você nem vinha participando dos encontros de estudo”. O membro O responde: “muitas vezes quando tentei falar, senti você irônica co- migo”. Hipótese 1: O membro O transfere para o membro C sua insatisfação com as coi- sas não ditas no grupo Metamorfose, e com a ironia do grupo em relação a ele em alguns momentos. Hipótese 2: Outra possibilidade seria o membro O transferir para o membro C a angustia latente do grupo diante do penúltimo encontro e do questionamento sobre com quem manter-se-á contato e com quem não manter-se-á contato? Como serão as esco- lhas? O grupo conseguirá manter contato ou estabelecer-se-á subgrupos? Sentiremos-nos traídos? d) Transferência de Pertença: de cada indivíduo em relação ao grupo como uma enti- dade abstrata. Caso 1: Um dos momentos de auge coletivo no grupo ocorre no encerramento do primeiro módulo, quando os membros divididos em subgrupos, realizam a técnica de construção do nome do grupo, denominado Metamorfose, do grito de guerra, “eu posso, eu quero, vamos nos experimentar”, da simbologia materializada num “aspiral de cor verde” e de um single que em seu refrão diz “Eu prefiro ser está metamorfose ambulante, a ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. Hipótese: Diante do desenvolvimento da técnica, os membros transferem ao gru- po as expectativas, ideais e necessidades que são individuais e que se manifestam no co- letivo. Caso 2: O membro R exclama: “Será que este grupo, ao descobrir minhas fragili- dades, vai me ajudar a superá-las ou vai reforçá-las, através de rótulos?” Hipótese: O membro R, no início da formação, transfere para o grupo, enquanto entidade abstrata, sua preocupação em demonstrar o seu “eu secreto” e a dúvida se encontrará no grupo amparo ou exclusão, configurando um pedido para aceitar os membros nas suas diferenças e na busca de cumplicidade. Para melhor elucidar os exemplos citados acima, ressalta-se que a configuração das diversas identificações parciais de cada indivíduo irá determinar, em grande parte, a formação de sua identidade, tanto a individual como a grupal. Para Winnicott (apud Zi- merman, 1999), as transferências acontecem muitas vezes com o auxílio de nossas expec- tativas depositadas nos outros e oriundas de relações introjetadas. Caso 2: O membro R se interroga: “Será que este grupo, ao descobrir minhas fra- gilidades, vai me ajudar a superá-las ou vai reforçá-las, através de rótulos?” Hipótese: O membro R, no início da formação, transfere para o grupo, enquanto entidade abstrata, sua preocupação em demonstrar o seu “eu secreto” e a dúvida se encontrará no grupo amparo ou exclusão, configurando um pedido para aceitar os membros nas suas diferenças e na busca de cumplicidade. Diante das modalidades citadas, cabe salientar que todas as transferências se pro- cessam simultaneamente, embora haja momentos em que alguma prevaleça com maior SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 7 nitidez, constituindo o que se costuma chamar “transferências cruzadas”. Ou seja, as di- versas situações que estão interligadas entre os membros do grupo. Atualmente, sabe-se que desde seu primeiro movimento, qualquer membro de um grupo está processando uma distorção em sua percepção do coordenador e dos demais componentes. Na verdade, antes mesmo de ingressar no grupo cada membro já traz con- sigo uma distorção perceptiva em suas expectativas iniciais de como serão os outros ou de como irão tratá-lo. Devido à semelhança dos conflitos, frustrações e desilusões vivi- dos, é possível que experiências emocionais intensas de natureza transferencial de um ou mais membros despertem determinados conflitos de transferência em outros participantes assim que são vivenciadas. Outro aspecto relevante do fenômeno transferencial é a chamada Transferência Negativa, citada por Freud (1912), que se refere às transferências nas quais predomina- vam os sentimentos de inveja, ciúme, rivalidade, voracidade, ambição desmedida... Caso 1: No momento do jornal o membro I comenta extensivamente a sua felici- dade pela conquista de seu espaço residencial, e em encontros posteriores ele traz suas conquistas profissionais e de bens materiais. Hipótese: O membro I quando traz os seus desejos demonstra uma busca pela aproximação de conquistas externas, pois como verbaliza “tem interesse de desejar o de- sejo do outro”. Trazendo sua fala encontros posteriores o membro E verbalizar uma con- quista da compra de seu carro. Caso 2: O membro E recebe vários elogios da coordenação devido o seu desem- penho no papel de coordenador do grupo, inclusive cita: “você surpreendeu o grupo!”. Na técnica desenvolvida por E, usou metaforicamente os instrumentos “garfo”, relacionando quando o grupo se espeta, a faca “quando o grupo se fere, se corta” e a colher “quando o grupo acolhe, cuida”. Após os feedbacks positivos direcionados a E, o membro J questio- na a ele: “Será que a coordenação não usou da ‘colher’ com você? O questionamento, realizado perante outros membro do grupo, soa como se a coordenação de E não tivesse sido tudo aquilo posto pela coordenação. Hipótese: O membro J transfere o desejo de reconhecimento da coordenação em relação ao seu desempenho no grupo, e exprime sentimento de ciúmes do membro E. A expressão Transferência Positiva designa todas as pulsões relativas a senti- mentos amistosos. No entanto, o mais importante é destacar que aquilo que muitas vezes parece ser uma transferência positiva pode estar sendo negativa, do ponto de vista de um processo analítico, porquanto pode estar representando não mais do que uma extrema e permanente idealização, o que representa um entrave para um verdadeiro crescimento (Zimerman, 1999). Caso 1: O membro H vivenciando uma situação delicada que envolve sua família, decide mudar de endereço residencial. Recebendo o apoio manifestado por todos os membros do grupo. Hipótese: O membro H oportuniza ao grupo um convite para trocar de “local, re- sidência”, ampliar seu espaço de ação, com maior liberdade e poder de escolha, verbali- zando e materializando uma ação que, inconscientemente, todo o grupo manifesta dese- jar.Por isso que o grupo legitima e acolhe. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 8 Além das modalidades citadas acima, também encontramos o conceito Para- Transferência, no qual a pessoa extravasa para fora da situação analítica (no caso do ambiente terapêutico) os seus sentimentos transferenciais que estão sonegados e que não aparecem diretamente no momento e acabam sendo levados para as pessoas do convívio diário. (Zimerman, 1999). Caso: Quando o membro N relata uma situação de frustração vivenciada com du- as pessoas externas, diante da postura egoísta de uma delas e aceitada pela outra. Em re- lação a esta última, o membro N tem maior intimidade de dizer que não aceitará o fato ocorrido, pois entende falta de consideração. Neste contexto N provoca no membro U forte emoção, já que se utilizou deste exemplo para deflagar em U uma postura indiferen- te frente aos fatos importantes que vem ocorrendo em sua vida, os quais estão sendo acei- tos de forma cruel com ela mesma. Soma-se ainda o termo Transferência Perversa, se referindo quando os mem- bros em geral, de alguma forma, tendem “perverter” as combinações que eles aceitaram em relação ao trabalho, ou seja, buscam mudar as regras do jogo (Zimerman, 1999). Caso: Quando os membros do grupo, como forma de transferir sentimentosdepo- sitados no grupo, chegam atrasados, ficam “saboneteando”, discutindo por várias vezes a mesma situação, disponibilizam tempo reduzido para os seminários e estudos. Outra si- tuação ocorre quando o grupo metamorfose, por várias vezes, não realizou um dos semi- nários, pois se estendeu em discussões. Neste momento, alguns alertavam “ainda temos o seminário para realizar”, mas não tinha eco no grupo. Outros membros se antecipavam e propunham: “vamos realizar o estudo dos dois temas num único seminário”, unindo os temas. Ou seja, trocavam-se as regras e no dia seguinte o grupo percebia a perda de con- teúdo, face o tempo escasso para apresentar, decorrente da mudança das regras. A transferência se expressa por meio de um ou vários porta-vozes. Estes dão indí- cios que permitem ao coordenador entender os papéis que estão sendo assumidos por um ou mais participantes e também conferidos a eles, pelo próprio grupo, e a partir dessa compreensão ajudar o grupo a confrontar-se com a realidade concreta. Ou seja, é papel do coordenador ajudar a explicitar o implícito. Como coloca Castilho (1997), poderá ocorrer que um indivíduo procura falar por outros membros do grupo, que são mais reservados ou calados, expressando os sentimentos, quando na verdade ele está apenas servindo de meio para o sujeito externar suas próprias concepções ou sentimentos. Essas atitudes po- derão, no futuro, vir a causar ressentimentos à pessoa “calada”, levando-a a uma atitude de protesto. TRANSFERÊNCIA E MECANISMOS DE DEFESA No campo grupal há transferência em tudo, mas nem tudo é transferência a ser trabalhada, pois, como afirma Freud (1895, p. 360), o termo “transferência” pode ser também avaliado no sentido de uma forma de resistência, isto é, como um obstáculo à análise, bem como, uma forma de um falso enlace, ou falsas conexões entre paciente e terapeuta (no ambiente terapêutico). Após alguns estudos o mesmo autor conceitua a transferência “como novas edições revistas” passando a considerá-la como uma inevitá- vel necessidade. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 9 Caso: Quando o Membro O resiste à possibilidade de escuta de um feedback so- bre as suas atitudes, buscando sempre uma justificativa sobre suas intervenções. O que dificulta a elaboração do insight emocional na situação vivenciada. Hipótese: O membro O, buscando resistir a tomada de consciência através da elu- cidação que outros membros externaram, toma uma atitude “emburrecedora – de não- entendimento” justificando sua ação. Zimerman (2005) define a expressão “mecanismo de defesa” como distintos tipos de operação mental que tem por finalidade reduzir as tensões psíquicas internas, ou seja, das angústias. Salienta também que qualquer defesa, por mais primitiva que seja, inicial- mente é útil para o desenvolvimento do psiquismo. Por esse motivo esta pesquisa busca elucidar e elaborar esses aspectos, buscando o insigth, focalizando somente os mecanis- mos de defesa que estão interligados no processo transferencial e contratransferencial. Ressalta-se que a transferência é um fenômeno pelo qual emerge por muitas vezes associado aos mecanismos de defesa, no entanto, é um aspecto singular, mas em relação ao qual se busca reconhecer e legitimar a sua importância no processo intra e interpessoal. a) Deslocamento: Essa defesa é um processo inconsciente pelo qual os sentimentos são vinculados a uma fonte e redirecionados a outra. A transferência constitui um exemplo evidente de deslocamento, visto que os sentimentos por uma pessoa do passado são trans- feridos para uma figura do presente. Caso: O membro F, quando cobrado pelo grupo devido sua postura reservada e si- lêncio freqüente, se emociona e justifica que seu comportamento está atrelado a educação que recebeu de sua mãe na infância: “não é bonito falar de você, sobre as tuas coisas com outras pessoas”. Hipótese: o silêncio foi mecanismo de defesa utilizado para não transgredir o mo- delo de educação recebido na infância, além de transferir para o grupo o entendimento de que não seria adequado se expor. b) Isolamento do afeto: esse mecanismo divorcia o afeto da ideação. Uma recordação traumática pode ser facilmente evocada, mas será destituída de qualquer sentimento in- tenso concomitante. O isolamento freqüentemente age de mãos dadas com a intelectuali- zação, que realiza uma função similar, de evitação do afeto. Caso: O membro U recebe um feedback sobre sua atuação no grupo, onde não se expõe, chega atrasado e já esteve ausente. Em seguida, “U” responde de forma intelectua- lizada. Questionado sobre sua forma de resposta, uma vez que passou a imagem de não ter acolhido o feedback como uma oportunidade de reflexão, fica sem graça e diz “eu não desço do salto”; e continua, lembrando que quando era secretária sempre usava salto, mesmo para limpar o chão do escritório. Hipótese: o membro U utilizava-se de postura intelectualizada no grupo para se proteger e evitar exposição emocional. O “não descer do salto” era como um escudo con- tra a sinalização do grupo de acolhida e afeto para que pudesse falar sobre seus sentimen- tos, já que era visível seu esforço para encobri-los. c) Identificação Projetiva: Este mecanismo de defesa é um processo inconsciente constituído de três etapas, pelo qual aspectos de si mesmo são renegados e atribuídos a outrem. As três etapas incluem: SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 10 1 – O membro do grupo projeta uma representação do self ou do objeto no grupo e em seus pares. Caso: O membro D entrega convite de casamento para membro J, que surpreso com o modelo do convite exclama: “seu convite quebrou a formalidade, e isto representa para mim que poderei ser eu mesma no seu casamento”. Hipótese: o membro J deposita simbolicamente no objeto convite um pedido de espontaneidade e quebra de formalidades no grupo, na “união” do Grupo Metamorfose. 2 – O coordenador inconscientemente identifica-se com o que é projetado e co- meça a sentir-se e comportar-se como a representação do self ou do objeto projetado, em resposta à pressão interpessoal exercida pelos membros do grupo. Caso: Quando os membros do grupo projetam no membro U a sua falta de afeto, e este membro quando realiza suas atividades de coordenação traz técnicas e reflexões mais “racionais”. Hipótese: a pressão exercida pelo grupo no sentido de que o membro U não aja com afeto, respaldos em declaração anterior do respectivo membro que afirma que evita em suas decisões a emoção e afeto, contribui para que o membro U, no momento de sua coordenação, realize o processamento da técnica de forma mais intelectualizada. 3 – O material projetado é “psicologicamente processado” e modificado pelo co- ordenador, que o devolve aos membros do grupo via reintrojeção. Ressalva-se que nem todo o material projetado deve ser foco de análise pelo coordenador, se tratando da espe- cificidade do grupo pesquisado, e sim, somente nos aspectos que tiverem dificultando o funcionamento da dinâmica do grupo. Caso: O grupo com freqüência deposita no coordenador P o papel de autorizar e decidir algumas regras: “Posso falar agora?”; “Podemos realizar o intervalo antes?” Dian- te desta situação, P devolve para o grupo em forma descontraída: “Vocês parece que per- guntam: mamãe posso ir? mamãe posso fazer?”. Hipótese: P permite que o grupo perceba seu grau de dependência e necessidade de aprovação, bem como, desperta para a importância da construção da autonomia do grupo, de seu jeito próprio de funcionar. Dentro deste contexto, Kernberg (1987b) verbaliza que a identificação ocorre dentro do projetor, não no alvo da projeção. Mantendo esse vínculo empático ou identifi- cação com o que foi projetado, o projetor tem a fantasia de controle sobre o material pro- jetado. Sandler (1987) observou: “Aquilo de que alguém deseja livrar-se em si mesmopode ser-lhe colocado à disposição pela identificação projetiva, e pelo controle do objeto pode adquirir a ilusão inconsciente de controlar o aspecto desejado e projetado do self”. Já Zimerman (1999) acentua que as cargas de identificações projetivas, pelas quais o in- divíduo que não consegue conter dentro de si próprio os seus aspectos maus e bons, os projeta dentro de outros, que então passam a ser sentidos como idênticos a ele. Caso 1: Quanto o membro A, relatando um evento erótico, diz para o membro R: “Por que esta cara?”. R lhe dá a devolutiva: “Esta expressão é tua. Eu estou gostando”. E não se deixa envolver pelo sentimento do outro. Hipótese: A projeta no outro o receio ou repreensão de seus próprios pensamentos e sentimentos. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 11 Negação: Refere-se a um processo pelo qual o sujeito, de alguma forma, inconsciente- mente, não quer tomar conhecimento de algum desejo, fantasia, pensamento ou sentimen- to, e assim faz como se esse não existisse. Caso: Membro I relata no jornal que durante um jantar que realizou para sua famí- lia corta o dedo e vai mostrar a todos o que houve. Diz no decorrer de sua fala: “Não sei como consegui cortar o dedo numa lata!” Não obtendo a atenção da família, enrola a mão na camiseta aglomerando sangue e mostra a todos novamente, gerando neste momento preocupação de modo que levam-na para o pronto socorro. Após relata que não obedeceu às orientações médicas sobre o tempo para retirada dos pontos, tendo ela mesma tirado os pontos e posteriormente contado aos familiares a proeza que fez. Após I relatar a situação, o membro C propõe ao membro I que reflita sobre a si- tuação, questionando se não agiu daquela forma para chamar a atenção de sua família. Diante desta colocação I contesta veemente, nega várias vezes, fica irritado e durante o encontro cala-se. Duas características principais da transferência são as inadequações ao relaciona- mento atual e o fato de ser uma repetição do passado (Geenson, 1967). A pessoa incons- cientemente reencena o relacionamento passado, ao invés de recordá-lo, e ao fazê-lo in- troduz no tratamento grande quantidade de informações sobre os relacionamentos passa- dos. Para ser mais preciso, todo relacionamento é uma mistura de relação real e fenômeno transferencial, visto que a transferência superpõe-se às características reais. Caso: Quando o membro A projeta no membro E sua fase de início de carreira e traz este relato ao grupo, ficando indignada quando E não age no grupo como o membro A gostaria que ela agisse. Hipótese: O membro A projeta no membro E algumas situações suas passadas e como forma de re-significá-las, fica indignada quando o membro E não realiza o que sua necessidade está manifestando. As manifestações de resistência estão presentes em toda parte e podem assumir muitas formas, incluindo atrasos nos encontros, relutância em estudar para a socialização dos seminários, esquecerem as datas dos encontros (quer seja do grupo ou do subgrupo), silêncio ou omissão de contribuição nos encontros, conversa paralela, teorização ou “em- bretamento” em assuntos não tão relevantes ao momento, falando sobre e não vivendo o aqui e agora. Toda resistência tem em comum uma tentativa de evitar sentimentos desa- gradáveis, seja raiva, culpa, amor, inveja, vergonha, tristeza, ansiedade, e assim por diante. Caso: Membro N protesta sobre a necessidade de estudar para os seminários, ten- do que reunir-se com o subgrupo, fazer resumos e preparar as apresentações. Exclama: “Que saco, o meu tempo de fazer trabalhos passou com a fase da faculdade”. Em encontro posterior, foi direcionado ao membro N elogio sobre sua capacidade, inteligência. O membro emociona-se e expõe: “às vezes me acho burrinha e a minha fa- mília sempre me tratou como se eu fosse fraca”. Ainda, compartilha com o grupo: “Vocês não sabem o quanto é importante para mim este feedback. Vou colar este cartaz (fazia parte da técnica) na minha geladeira, para todos da minha família verem”. A partir deste evento, o membro N conquistou um espaço significativo nos seminários, oferecendo con- tribuições importantes ao desenvolvimento do grupo. Hipótese: Num primeiro momento, foi resistente aos seminários, talvez como uma defesa diante da fantasia de não dar conta dos conteúdos teóricos. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 12 Psicanalistas pesquisadores norte-americanos, como Kantrowitz in Zimermann (1999), que uma relação analítica, vai muito além de uma simples relação transferencial repetidora de vivências passadas. E essas investigações, fizeram estes autores concluírem que os aspectos pessoais de cada psicanalista (coordenador) em relação com os de um determinado paciente (membro de grupo) constituem um match singular, o qual tem uma decisiva influência na evolução, exitosa ou não, da análise (funcionamento de grupo). Caso: Quando os membros J, R e B verbalizam, no momento de expor os seus sentimentos em relação à experiência da co-coordenação, que receavam coordenar na presença coordenadora P. Esta declaração ecoa no grupo, em especial no membro I que diz compartilhar do mesmo sentimento, pois tinham a sensação que não dariam conta e receavam as observações, desta coordenadora, não serem positivas. Zimermann (1999) cita o termo Transferência Idealizadora, ou seja, os aspectos transferências conduzidos do paciente (membros do grupo) para o analista (coordenado- res), que se não atende às expectativas dos membros estes se sentem desamparados. Caso: Quando o membro I chega ao primeiro encontro e tem como expectativa presenciar “o quadro cheio de informações, orientações e instruções” e quando se depara com um contexto diferenciado se questiona “Eu comprei até um caderno, não vamos usar?”. Caso: O grupo nos primeiros seminários aguarda a confirmação da coordenação ou até mesmo solicita “palestra” sobre temas específicos, conferindo (idealizando) a co- ordenação o saber da interpretação teórica. CONTRATRANSFERÊNCIA O fenômeno contratransferencial está intimamente ligado ao fenômeno da transfe- rência, de maneira que são indissociáveis e muitas vezes superpostos. Assim, podendo agir de forma benéfica ou inadequada, dependendo da utilização, bem como da consciên- cia da sua existência. Os pacientes têm transferência, os terapeutas têm contratransferência, em um tra- balho de grupo o mesmo acontece entre coordenador para com os membros, uma vez que cada qual inconscientemente, experimenta o outro como alguém do passado. Enquanto a transferência é discutida e analisada como parte do processo grupal, a contratransferência é controlada pela constante vigilância interna do coordenador, que nota a emergência de poderosos sentimentos positivos e negativos em relação aos mem- bros e reflete em silêncio acerca da possível origem de tais sentimentos no contexto de relacionamentos passados. Esse processo de controle consiste numa tentativa deliberada de recordar, que ajuda a evitar a repetição ou reencenação da antiga relação objetal (Zi- merman, 1999). A contratransferência se origina das cargas de identificações projetivas que os membros depositam no coordenador e que, por isso mesmo, podem se constituir para este como uma excelente bússola para a empatia e para a interpretação. A definição de Freud referia-se a transferência do analista ao paciente ou a resposta do analista a transferência do paciente. Implícita nessa conceituação está à emergência de conflitos não-resolvidos do inconsciente do analista, que no processo grupal se refere ao coordenador (Bechelli e Santos, 2006). SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 13 O prefixo “contra” ganhou um claro significado de contraparte, ou seja, aquilo que o coordenador sente é o que os membros o fizeram sentir, porquanto constitui os sen-timentos do mundo interior deste último. Contudo, é indispensável que se tenha claro à distinção entre o que é contratransferência propriamente dita, e o que é simplesmente a transferência própria da pessoa do coordenador (Kernberg, 1965). Para Bion (citado por Zimermann, 1999) a transferência não é estática e uniforme, antes, ela resulta e comporta-se como um processo de transformações, dependendo de como é vista a figura dos seus membros. Pois, partindo do pressuposto de Descarte o ana- lista (na condição terapêutica), é visto como uma pessoa real e não unicamente como um objeto, uma mera pantalha transferencial. Caso: O membro U faltou alguns encontros do grupo, inclusive no encontro que antecedeu a sua coordenação. Além disso, vinha sendo sinalizadas e questionadas pelo grupo suas contribuições teorizadas, sem entrar em nível de sentimentos. Na coordenação do membro U, teve que administrar durante a sua técnica atrasos de vários membros do grupo, e a intervenção dos membros restritos a falar “sobre a técnica” de forma teorizada. Hipótese: Os membros do grupo transferem para técnica a insatisfação em relação à participação e comprometimento de U, já que não conseguiam fazer de forma explicita. CONTRATRANSFERÊNCIA NOS GRUPOS Da mesma forma como ocorre com a transferência, também a contratransferência se processa no campo grupal, em quatro níveis: 1) Os sentimentos do coordenador em relação, separadamente, a cada um dos membros. Caso: No evento de revelação do amigo secreto o membro M, o qual representava a figura do coordenador, verbaliza que se identifica com o membro R por sua história de vida semelhante. Hipótese: Diante da manifestação de M poderia dificultar o funcionamento no ambiente grupal, devidos provocar sentimentos de ciúmes, de competição pela atenção da coordenação, de sensação de membro “favorito”, etc. 2) Os sentimentos em relação ao grupo como uma totalidade gestáltica. Caso: O coordenador P ao se deparar com o não-aprofundamento teórico na socia- lização dos seminários relata sua insatisfação e frustração: “Aí quando alguém questionar com quem vocês fizeram a formação na SBDG e vocês responderem que foi comigo, a pessoa vai pensar: Nossa, fez formação com P e não domina os conceitos? Não acredi- to!”. Hipótese: A coordenadora P contratransfere para o grupo sua idealização de com- petência. 3) Os sentimentos que determinados membros do grupo desenvolvem e agem em relação a cada um de seus pares. Caso: O membro Q era tido no início da formação como alguém mais reservado, com dificuldades de expor os seus sentimentos e ocupar o seu espaço. Várias vezes era lembrado: “Q ainda não falou!” ou no jornal sempre era uma das últimas pessoas a falar. No decorrer da formação, Q passou a ser percebido como um membro “especial”, que SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 14 transmitia energia, paz, tranqüilidade, e as suas intervenções passaram a ser entendidas como simples mais profundas e verdadeiras. Este sentimento reflete no momento da esco- lha de pares para co-coordenação, onde o membro Q foi escolhido por o membro J, V, inclusive ficou emocionada e surpresa com a manifestação do grupo. Hipótese: O momento de coordenar é tenso na maioria das vezes, e o grupo depo- sita no membro Q, através de sentimentos prévios, a possibilidade de coordenar de uma forma mais tranqüila e segura, ancorados na serenidade de Q. Foi dito por J: “Ela vai me passar à segurança e tranqüilidade que preciso no momento de coordenar”. 4) Os sentimentos de cada indivíduo em relação ao que o grupo, como uma totalidade abstrata, lhe desperta. São as contratransferências cruzadas, específicas do campo das grupoterapias. Caso: O grupo foi citado várias vezes, por alguns membros, como sendo sério, conservador. Este assunto foi pauta de vários encontros, enfatizando a discussão diante de técnicas onde alguns membros brincavam, davam risadas altas, e isto era compreendido como falta de responsabilidade por outros membros. A coordenação chegou a propor para o grupo, no primeiro módulo, que cada membro contasse um “mico” que tivesse passado. A tentativa, entende-se, era de descontrair e assim atingir a espontaneidade. Hipótese: O grupo despertava, para alguns membros, seriedade atrelada a atitudes sérias, cometidas, porém isto representava um mecanismo de controle, já que os membros estavam se conhecendo e descobrindo o quanto poderiam arriscar-se e expor-se na convi- vência grupal. A contratransferência resulta, essencialmente, das contra-identificações projetivas e ela tanto pode servir como um instrumento de empatia (contratransferência concordan- te), como, ao contrário. O COORDENADOR NO FENÔMENO TRANSFERENCIAL E CONTRATRANSFERENCIAL Vielmo (2006) destaca a colocação de Zimerman quando o mesmo diz que “Em qualquer campo grupal, quer seja terapêutico ou não, é inevitável que surjam manifesta- ções transferenciais”. O que difere é a forma como o coordenador compreende e maneja as manifestações transferenciais. Podendo auxiliar no esclarecimento do funcionamento do grupo ou podendo “embretar o mesmo”. Sendo fundamental que o coordenador tenha uma profunda consciência de suas necessidades, carências e limitações, para que não se transforme dentro do grupo em um “cliente”, precisando mais de ajuda do que, no fundo, podendo ajudar. Dentro deste contexto, Castilho (1997), verbaliza que o coordenador deve ter uma compreensão exata dos seus próprios sentimentos; o que se passa consigo, que repercus- são tem aquele momento do grupo para ele. Isso requer certo grau de maturidade e auto- conhecimento, pois implica entender e aceitar suas dimensões e limitações. Seu encora- jamento capaz de considerá-las para que não venha a interferir de modo pouco produtivo, para não dizer negativo, no desenvolvimento do grupo. SBDG – Caderno 81 Transferêcia e contratransferência nos fenômenos grupais 15 Caso: O membro O, no papel de coordenador, é questionado sobre sua postura enquanto membro, no entanto o mesmo ouve e busca uma continência em si e assim dá seqüência nas suas atividades sem “pegar” para si a fala dos membros. Hipótese: Quando membro O percebe o seu papel de coordenador, bem como tem conhecimento da transferência e desejo dos membros do grupo de mandar seus recados a ele no momento de sua coordenação, pois acaba sendo o depositário de vários sentimen- tos do grupo, não se “embreta” nas falas. Como também, este membro pode não ter per- cebido como sua esta atitude verbalizada pelo grupo. Faz-se necessário também estar atento para perceber todas as reações individuais para, num sentido gestáltico (de totalidade) dar-lhes unidade de compreensão. No grupo, pequenos detalhes comportamentais expressam muitas vezes sentimentos comuns e laten- tes dentro dele, e só o olho experimentado de um observador atento será capaz de perce- ber e decodificar. É, portanto seu papel interpretar de forma clara e explícita, quando achar necessário e conveniente, sua forma de ver e compreender o momento do grupo (Castilho, 1997). Caso 1: O membro L traz a luz, no momento da verbalização de sua observação, a situação vivenciada pelo membro U em sua relação conjugal; questionando o que o grupo tem desta fala. Hipótese: o grupo queria falar sobre si, sobre suas relações, mas devido à dificul- dade fica depositado no membro U esta demanda, que é elucidada no momento da socia- lização da colocação da observadora. Caso 2: Quando o membro J, na sua co-coordenação, insiste em concluir a técnica segundo o seu planejamento, ignorando o movimento do grupo. O grupo realiza a con- signa, no entanto sem se envolver de fato com a proposta. Hipótese: O membro J, diante da situação posta acima, verbaliza, no momento de compartilhar seus sentimentos decorrentes do exercício de co-coordenação, o seu desejo de possibilitar ao grupo olhar para si. Enfatizando uma característica
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