Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
AULA 2 LITERATURA INFANTIL Profª Deisily de Quadros 02 CONVERSA INICIAL Olá! Bem-vindo à nossa segunda aula da disciplina Literatura Infantil. Nosso assunto será os gêneros literários. Para tanto, vamos percorrer a tipologia e os gêneros textuais para, então, adentrar nos gêneros da literatura: a narrativa, a poesia e o texto dramático. É muito importante o letramento literário nesses três conjunto de textos e, para tanto, é necessário que o professor conheça a estrutura de cada um deles. Pronto? Vamos lá, então! CONTEXTUALIZANDO “Era uma vez...”. Quando nos deparamos com essa expressão, já no início do texto, conseguimos fazer algumas antecipações sobre o que vamos ler. O que você pensa ao abrir um livro e ler essa expressão? Isso! Contos de fadas. E ainda antecipamos o que virá no texto: rei, rainha, príncipe, princesa, bem e mal e, claro, o “felizes para sempre”. Isso acontece porque conhecemos a estrutura própria do conto de fadas, que é um gênero literário. Cada tipo e gênero textual possui a sua estrutura e ensinar nosso aluno a ler literatura, é também ensiná-lo a perceber as características de cada gênero. Você sabe, por exemplo, a diferença entre fábula e mito? Vamos descobrir? TEMA 1 – TIPOLOGIA E GÊNEROS TEXTUAIS O que é tipo e o que é gênero textual? Você saberia a diferença? Pois bem, o conceito de gênero e tipo textual pode ser aplicado a qualquer texto, seja ele literário ou não, oral ou escrito. Quando falamos de sujeitos letrados, de leitores competentes, referimo-nos ao sujeito capaz de compreender os mais variados tipos e gêneros de textos que circulam na sociedade: receita, outdoor, SMS, conta de luz, conto de fadas, poema, música. Assim, o trabalho que a escola desenvolve com a leitura precisa abarcar todos os tipos e gêneros orais e escritos, literários e não literários que circulam culturalmente. Mas, afinal, o que é tipo textual? O tipo é uma superestrutura, é um conjunto de traços que caracterizam a estrutura de um texto, um esquema ao qual o discurso se adapta. Segundo a professora Marta Morais da Costa, “os tipos textuais surgiram para atender a necessidades sociais específicas para cada tipo. Também não há 03 uma tipologia pura, isto é, os textos apresentam, muitas vezes, contaminação entre eles” (Costa, 2009, p. 95). Dessa forma, ainda que haja uma divisão entre os tipos textuais, muitas vezes os textos são híbridos. Ademais, essa divisão não é um consenso entre os linguistas. Podemos encontrar uma variedade de categorias quanto à tipologia textual. Aqui, apresentaremos a de Isabel Solé, que apresenta a seguinte classificação: narrativo, descritivo, expositivo e instrutivo- dedutivo. Acrescentaremos uma quinta categoria, que muitas vezes aparece nos livros didáticos: argumentativo. Quadro 1 – Tipos e características textuais TIPO CARACTERÍSTICAS Narrativo Apresenta sequência temporal, ou seja, os acontecimentos se desenrolam em uma determinada ordem. Muitos apresentam a seguinte estrutura: estado inicial, problema, ação, resolução do problema e estado final. Descritivo Predominam as sequências de localização. Seu objetivo é descrever um objeto, um local, um personagem, um fenômeno mediante características e comparações. Expositivo Apresenta sequências explicativas. O propósito desses textos é explicar determinados fenômenos, apresentando análises e sínteses das representações conceituais. Instrutivo- indutivo São sequências imperativas. A pretensão é induzir o leitor com instruções, palavras de ordem. Argumentativo São sequências contrastivas. Há uma tese que precisa ser defendida com argumentos, com a finalidade de convencer o leitor. Nossa realidade social e cultural apresenta uma circulação generosa desses tipos textuais. Assim, apresentar ao aluno apenas um dos tipos não é viável, empobrece o processo de letramento. Segundo a professora Marta Morais da Costa, “[...] o estudo dos tipos textuais contribui para a diversificação e a complexificação necessárias à formação de um leitor crítico, competente e proficiente” (Costa, 2009, p. 95). Exposta a tipologia textual, vamos aos gêneros? Enquanto os tipos não são mais do que 5, os gêneros são muitos, incontáveis. São muitos os gêneros materializados, circulando na sociedade, que encontramos em nosso cotidiano. 04 Pense: desde que você acorda, até o fim do dia, com quais gêneros textuais tem contato? Agenda telefônica, bloco de notas, placas de trânsito, outdoors, jornal, lista de compras, SMS, identificação do ônibus, crachá, enfim... O que define um gênero textual são características sociocomunicativas definidas por conteúdos, funções, estilo e composição. Não são estáticos, se transformam com o tempo, de acordo com as necessidades sociais. Você saberia mencionar um gênero que não é mais utilizado? E outro que surgiu recentemente? Cada tipo textual pode ser comparado a um guarda-chuva, que abriga uma infinidade de gêneros textuais. Veja alguns exemplos: Quadro 2 – Tipos e gêneros textuais TIPO GÊNERO Narrativo Romance, conto, lenda. Descritivo Dicionário, guia turístico, inventário. Expositivo Enciclopédia, entrevistas, verbetes. Instrutivo-indutivo Manuais de instrução, receita, propaganda. Argumentativo Texto de opinião, editorial, resenha. Assim, é de extrema importância que na escola circulem os tipos e gêneros que estão presentes na sociedade. É importante também apresentar os textos nos seus suportes para que o aluno perceba que os textos existem e têm vida fora do livro didático. Dessa forma, estaremos formando leitores competentes, capazes de atuar criticamente na leitura da diversidade textual com a qual nos deparamos no dia a dia. TEMA 2 – GÊNEROS DA LITERATURA Na literatura, também temos a divisão de gêneros textuais, que devem ser levados em conta no momento de trabalhar com a literatura infantil em sala de aula, pois o modo como estão caracterizados requer um trabalho diferenciado do professor. Segundo Machado, em Glossário Ceale, “os estudos de gêneros literários buscam identificar estabilidades que podem ser reconhecidas, podendo favorecer a compreensão dos textos lidos e ouvidos que a literatura oferece”. Assim, temos características específicas que marcam cada um dos gêneros literários e um leitor competente sabe identificá-las e transitar por elas durante a leitura. 05 Os gêneros literários, de acordo com Bakhtin (1992), não são estáticos: transformam-se no tempo. Isso porque os textos da literatura dialogam com o espaço, com o tempo, com a cultura, com as gerações, com a oralidade e com a escrita. Dessa forma, os gêneros se reinventam e também se tornam híbridos, ou seja, há textos que se apresentam enquanto uma mistura de diferentes gêneros. Cabe ainda ressaltar o diálogo entre texto escrito e imagem que caracteriza os gêneros da literatura infantil, ou seja, da literatura endereçada para as crianças. As cores, as formas, os traços, enfim, os componentes das imagens também precisam ser lidos e produzem efeitos ao leitor, sempre no entrelaçamento com o texto verbal. Temos dois grandes grupos que abarcam os gêneros literários: narrativa (texto em prosa) e poesia (texto em verso). Observe os dois exemplos: Texto 1 – A cigarra e a formiga Num belo dia de inverno as formigas estavam tendo o maior trabalho para secar suas reservas de comida. Depois de uma chuvarada, os grãos tinham ficado molhados. De repente aparece uma cigarra: - Por favor, formiguinhas, me deem um pouco de comida! As formigas pararam de trabalhar, coisa que era contra seus princípios, e perguntaram: - Mas por quê? O que você fez durante o verão? Por acaso não se lembrou de guardar comida para o inverno? Falou a cigarra: - Para falar a verdade, não tivetempo, passei o verão todo cantando! Falaram as formigas: - Bom... Se você passou o verão todo cantando, que tal passar o inverno dançando? E voltaram para o trabalho dando risadas. Moral da história: Os preguiçosos colhem o que merecem. Texto disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=wh9jbqaaqbaj>. p. 74-75. Acesso em: 3 dez. 2017. Texto 2 Cadê o toucinho que estava aqui? O gato comeu. Cadê o gato? Foi pro mato. Cadê o mato? O fogo queimou. Cadê o fogo? A água apagou. Cadê a água? O boi bebeu. Cadê o boi? Foi carregar trigo. Cadê o trigo? A galinha espalhou. Cadê a galinha? Foi botar ovo. 06 Cadê o ovo? O frade bebeu. Cadê o frade? Está no convento. Você percebe a diferença entre esses dois textos? No primeiro exemplo temos uma das fábulas de Esopo: “A cigarra e a formiga”. É uma narrativa. Por quê? Veja: temos a presença de um narrador, personagens que atuam num tempo e num espaço, e uma estrutura por meio da qual se desenvolvem os acontecimentos da história ficcional: situação inicial, desenvolvimento, problema, solução do problema e situação final. Já no segundo exemplo temos um poema folclórico, ou seja, um texto poético. Antes de lê-lo, visualizando apenas o seu formato, o leitor que conhece as características da poesia já reconhece que se trata de um poema: nesse caso, apresenta versos, estrofes e rima. TEMA 3 – NARRATIVA As narrativas existem desde o início da humanidade, pois o ser humano sempre contou histórias, seja narrando situações ocorridas no dia a dia, como na caça, ou inventando situações para tentar explicar fenômenos que desconhecia. Com o surgimento da escrita, as narrativas que antes eram orais ou registradas por desenhos passam a ser escritas. As histórias povoam nosso imaginário desde a mais tenra idade. Quer ver? Pense no seu repertório de narrativas. Quantas conhece? Já pensou em fazer uma lista? O trabalho na escola com a literatura infantil precisa contemplar os diferentes gêneros da narrativa, pois cada um deles apresenta características próprias. Além da classificação em gêneros, ou seja, da estrutura – que mais uma vez não é unânime entre os teóricos – a professora Marta Morais da Costa traz outras classificações apresentadas por Vera Teixeira Aguiar, como personagens, temáticas e efeitos. Vale a leitura do livro base da disciplina. Quanto à estrutura, cada gênero literário exige diferentes modos de ler do leitor. Podemos classificar os textos narrativos em mito, lenda, fábula, apólogo, conto, novela e crônica. Vamos ler o seguinte texto? Como nasceram as estrelas Numa aldeia indígena, algumas mulheres tinham colhido milho para fazer pão. Mas as crianças roubaram as sementes de suas mães e as levaram para a vovó. A vovó fez para elas alguns pãezinhos deliciosos. Com medo de que as mães descobrissem o furto, elas cortaram a língua da vovó e fugiram para a floresta. 07 Lá, pediram a um colibri que amarrasse um cipó no céu para que pudessem subir, escapando, assim, de suas mães, que as procuravam. Como castigo, as crianças tiveram que ficar olhando para a Terra todas as noites, cuidando de suas mães, que sofriam de saudade. E esses olhos sempre abertos tornaram-se estrelas. A qual gênero da narrativa pertence essa história? Você saberia dizer? “A origem das estrelas é um mito. Isso porque é uma “narrativa atemporal que procura explicar a gênese, a origem de seres e coisas, de forma não racional, lógica e histórica (...)” (Costa, 2009, p. 73). Ou seja, é uma história que não tem autoria, não sabemos quando foi escrita e que procura explicar o surgimento de algo: das estrelas, de certas tribos indígenas, do guaraná, das Cataratas do Iguaçu. A busca humana de explicações de tudo o que acontece a nossa volta fortaleceu os mitos, que sempre existiram, pois o homem primitivo já questionava a origem do que existia no mundo e apresentava situações sobrenaturais para explicar a realidade. Vamos ao próximo texto? Boitatá Diz a lenda que há muito tempo atrás, uma noite se prorrogou muito parecendo que nunca mais haveria luz do dia. Era uma noite muito escura, sem estrelas, sem vento, e sem barulho algum dos bichos da floresta, era um grande silêncio. Os homens viveram dentro de casa e estavam passando fome e frio. Não havia como cortar lenha para os braseiros que mantinham as pessoas aquecidas, nem como caçar naquela escuridão. Era uma noite sem fim. Os dias foram passando e a chuva começou, choveu muito, esta chuva inundou tudo e muitos animais acabaram morrendo. Uma grande cobra que vivia em repouso num imenso tronco despertou faminta e começou a comer os olhos de animais mortos que brilhavam boiando nas águas. Alguns dizem que eles brilhavam devido a luz do último dia em que os animais viram o sol. De tanto olhos brilhantes que a cobra comeu, ela ficou toda brilhante como fogo e transparente. A cobra se transformou num monstro brilhante, o Boitatá. Dizem que o Boitatá assusta as pessoas quando elas entram na mata à noite. Mas muitos acreditam que o Boitatá protege as matas contra incêndios. E essa narrativa? Pertence a qual gênero? É uma lenda. As lendas, como os mitos, não têm autoria. Possuem uma base histórica, podendo ser criação coletiva do povo, e apresentam versões diferentes, pois eram inicialmente orais. “(...) A lenda, em seu princípio, não é senão a história das primeiras lutas do homem, de sua ignorância e de sua ânsia por desvendar o mistério que o rodeia e o aprisiona” (Sosa, 1978, p. 109). Ou seja, essas histórias eram criadas com o relato do povo para explicar, pelo viés do sobrenatural, da idealização e do exagero, situações e acontecimentos vividos ou experimentados. Mais um texto para fruição e reflexão. A raposa e o leão 08 Um dia, o leão fingiu-se de doente. Como ele era o rei, muitos bichos foram visitá-lo. Cada um que chegava à entrada da caverna era chamado pelo leão para vê-lo de perto. Mas, na verdade, o leão comia cada um deles. Quando a raposa chegou, o leão convidou-a para entrar. Então, ela respondeu: - Não vou entrar porque não quero incomodá-lo. Sua caverna deve estar muito cheia, pois um monte de bichos entrou aí e até agora nenhum saiu. “A raposa e o leão” apresenta quais características? A fábula é protagonizada por animais que apresentam comportamentos humanos, é um texto curto e há uma moral implícita ou explícita no início ou no fim do texto. A lição moral condiciona a interpretação desse gênero textual caracterizado pela “presença do animal, colocado em situação humana e caracterizando símbolos, dentro de um contexto universal” (Coelho, 1991, p. 148). Essa fábula, por exemplo, traz a simbologia da esperteza da raposa e da força do leão, e a moral de que a esperteza vence a força. As fábulas surgiram no Oriente e foram sendo reinventadas com o tempo. Chegaram ao Ocidente pelas mãos do grego Esopo e, atualmente, convivendo com as fábulas tradicionais, temos as fábulas modernas, muitas delas criadas para a escola. Outro gênero da narrativa é o apólogo. A estrutura que apresenta é muito semelhante à da fábula: texto curto, personagens com comportamento humano e uma moral implícita ou explícita no início ou no fim do texto. Mas, então, qual é a diferença entre uma fábula e um apólogo, você deve estar se perguntando. São os personagens. Enquanto na fábula os personagens são animais, no apólogo os personagens são objetos inanimados que ganham comportamento humano. Um apólogo muito conhecido e que você pode pesquisar na internet é “A linha e a agulha”, de Machado de Assis. Vamos falar agora do conto. Os contos têm a sua origem nos mitos e trazem, por meio da ficção, acontecimentos humanos e sociais que atravessam gerações, pois correspondem a valores e características permanentes do ser humano. São narrativas curtas,com uma ação única, poucos personagens, tempo e espaço reduzidos e poucos acontecimentos. Por ser uma narrativa curta, assim como a fábula, a lenda e o mito, é muito trabalhado na escola. Nelly Novaes Coelho divide os contos em três categorias: contos de encantamento, contos maravilhosos e contos de fadas. Os personagens, nos contos de encantamento, necessitam de auxílio de objetos sobrenaturais, como amuletos e varinhas de condão para resolver os problemas que aparecem no enredo extraordinário. Os contos maravilhosos 09 apresentam uma visão mágica da realidade. E os contos de fadas têm na fada o personagem provido de poderes mágicos para auxiliar a pessoa que ficará sob sua proteção. Somados à essa classificação, há ainda os contos do cotidiano, que trazem conflitos e personagens do nosso dia a dia, contos de aventura, contos com enigmas, dentre outros. São exemplos de conto: “Aladim e a lâmpada maravilhosa”, “João e o pé de feijão”, “Cinderela”, “Chapeuzinho Vermelho”, dentre outros. A novela é outro gênero da narrativa. Denominada por alguns teóricos de romance, apresenta muitos personagens, várias ações simultâneas, se desenvolve num tempo maior e em vários cenários e, muitas vezes, apresenta mais de um problema. Portanto, a extensão do texto é mais longa que o conto. Um exemplo é “Harry Potter”. E a crônica? Como o conto, é uma narrativa curta. Trata de assuntos do nosso cotidiano, trazendo para o leitor, por meio do trabalho com a palavra, o lírico, a poesia, a sensibilidade e a emoção. Trata normalmente do tempo presente, por isso, é um texto datado, que envelhece. Estão presentes em livro, mas também são veiculadas em jornais. Domingos Pellegrini, Carlos Drummond de Andrade são cronistas muito presentes na sala de aula. Quer experimentar a leitura de crônicas? Que tal procurar na internet pela cronista do jornal Zero Hora, Martha Medeiros? Ela tem também crônicas publicadas em livros como “Doidas e Santas”, de 2008, por exemplo. Experimente! Vai ser uma experiência interessante, pode ter certeza! Vamos encerrar com um quadro, apresentando as principais características e um exemplo de cada um dos gêneros da narrativa? Quadro 3 – Exemplos dos gêneros da narrativa GÊNERO CARACTERÍSTICA EXEMPLO Mito História que não tem autoria, não sabemos quando foi escrita e que procura explicar o surgimento de algo As Cataratas do Iguaçu Lenda Histórias criadas com o relato do povo para explicar, pelo viés do sobrenatural, da idealização e do Curupira 010 exagero, situações e acontecimentos vividos ou experimentados. Fábula História que é protagonizada por animais que apresentam comportamentos humanos, é um texto curto e há uma moral implícita ou explícita no início ou no fim do texto. O leão e o ratinho Apólogo Texto curto, personagens são objetos inanimados com comportamento humano e há uma moral implícita ou explícita no início ou no fim do texto. A caneta e o papel Conto Narrativas curtas, com uma ação única, poucos personagens, tempo e espaço reduzidos e poucos acontecimentos. Pinóquio, de Collodi Novela Apresenta muitos personagens, várias ações simultâneas, se desenvolve num tempo maior e em vários cenários e, muitas vezes, apresenta mais de um problema. A bolsa amarela, de Lygia Bojunga Crônica Narrativa curta, trata de assuntos do nosso cotidiano, normalmente do tempo presente. Fala, amendoeira, de Drummond TEMA 4 – POESIA Muitos poetas e uma grande variedade de formas de poemas compõem a poesia brasileira. Assim, há um vasto acervo que pode ser levado para a sala de aula. No entanto, há a crença de que a poesia é difícil e dispersa a criança. Na verdade, o ritmo e a metáfora, tão presentes nos poemas, são naturais na infância, como afirma Cunha: [...] é muito comum compararmos a criança e o poeta. Realmente, o mundo infantil é cheio de imagens, como o campo da poesia. A fantasia 011 e a sensibilidade caracterizam ambos. [...] É fácil entender, portanto, por que entre as formas de arte a criança prefira primeiro a música, depois a poesia” (Cunha, 1983, p.93). Assim, o que acontece, muitas vezes, é a má escolha do poema: com uma linguagem que vai além do nível de leitura em que a criança se encontra, ou o contrário, pouco desafiador. É preciso tomar ainda o cuidado com os poemas didáticos, que não são produzidos por poetas, mas pelo próprio autor do livro e traz todo um ranço de lição de moral, ficando a linguagem poética em segundo plano. E o que é poesia? “Poesia é transfiguração da realidade objetiva ou subjetiva em expressão de beleza e de contemplação emocional. É o encontro e a harmonização do eu existencial com o eu poético, realizando a revelação do ser, da essência” (Carvalho, 1982, p. 223). Dessa forma, a poesia é linguagem poética e simbólica, que apresenta ritmo e sonoridade num estreito diálogo com a temática (semântica). Pode ainda apresentar rimas, versos, estrofes – ou não. Resultado da sensibilidade, a poesia deve ser sentida em toda a sua emoção e beleza, em toda a sua riqueza estética. Para tanto, é muito importante que não tenha cunho pedagógico. A primeira distinção apresentada no livro base da disciplina pela professora Marta Morais da Costa é entre a poesia autoral e a poesia folclórica. A poesia autoral são textos com o autor identificado. Por exemplo: os poemas do livro “Ou isto, ou aquilo”. Sabemos que a autora é a Cecília Meireles. Já a poesia folclórica é formada por aqueles poemas que atravessam gerações e já fazem parte do repertório popular: não sabemos quem é o autor. São trava-línguas, parlendas, cantigas, quadrinhas, enfim, poemas que caracterizam a nossa cultura e podem ensinar o aluno a gostar de poesia. Como exemplo, “Roda Cotia” e “Ciranda cirandinha”. Podemos também pensar em quatro grandes grupos de poemas: narrativo, descritivo, expositivo e misto. Vejamos o primeiro exemplo: Macaco foi à feira Macaco foi à feira Não tinha o que comprar Comprou uma cadeira Pra comadre se sentar A comadre se sentou A cadeira esborrachou Tadinha da comadre Foi parar no corredor 012 Esse é um exemplo de poesia folclórica, pois não tem autoria. É uma parlenda. É também um poema narrativo, pois narra uma história e os personagens participam de uma ação linear (a história contada apresenta a sequência começo, meio e fim). É, portanto, um poema – está estruturado em versos e faz o uso de recursos poéticos como a metáfora – que conta uma história. Mais um exemplo: Era uma bruxa À meia-noite Em um castelo mal-assombrado Com uma faca na mão Passando manteiga no pão Essa parlenda é um exemplo de poema descritivo. Nesse texto, predomina a caracterização sobre a ação. Pode haver a descrição de pessoas, lugares, objetos, paisagens, sentimentos. A bruxa é descrita de maneira inusitada: no mundo poético se abrem muitas possibilidades de criação e exercício do imaginário. Agora, um exemplo de poema expositivo: “A Pátria Ama, com fé e -orgulho a terra que nasceste! Criança, não verás país nenhum como este! Olha que céu! Que mar! Que rios! Que floresta! A Natureza, aqui, perpetuamente em festa, É um seio de mãe a transbordar carinhos. (...)” O trecho inicial do poema de Olavo Bilac (1904), expõe ideias e explicações sobre a necessidade de amar a Pátria, ou seja, o Brasil. O um poema com ideal ufanista. Os poemas expositivos apresentam características, como explicações, explanações, dissertação sobre o mundo, pessoas, ideias. E o quarto tipo: o poema misto: Hoje é domingo Hoje é domingo Pede cachimbo O cachimbo é de barro Bate no jarro O jarro é ouro Bate no touro O touro é valente Machuca a gente A gente é fraco Cai no buraco O buraco é fundo Acabou-se o mundo 013 Nessa parlenda, que é um poema folclórico de domíniopúblico, há narração e descrição. Narração, porque há uma sucessão de ações. Descrição porque há a caracterização do cachimbo, do jarro, do touro, da gente, do buraco com o uso de adjetivos. Assim, temos o poema misto. Saiba mais O grupo palavra cantada tem essa parlenda gravada. Vale a pena conferir na internet. Vamos encerrar os gêneros da poesia com um mapa conceitual? Figura 1 – Mapa conceitual Pode ser Dividem-se em 4 grupos Fica também uma dica: o trabalho com a poesia visual em sala de aula. A combinação entre imagem, recursos gráficos e palavra no papel cativa de imediato o público infantil. A poesia visual passou a se configurar no cenário brasileiro na década de 1970, sendo fruto do fim do ciclo histórico dos versos instaurado pelos concretistas. É de grande valia a pesquisa e leitura de autores como Sérgio Capparelli, José Paulo Paes, Fernando Paixão e Paulo Leminski. POESIA AUTORAL FOLCLÓRICA NARRATIVA DESCRITIVA EXPOSITIVA MISTA 014 TEMA 5 – O TEXTO DRAMÁTICO O teatro para crianças no Brasil surgiu apenas no Século XIX. Era tratado como “teatrinho”, pois era considerado uma arte menor e tinha uma dimensão pedagógica muito forte e muitas vezes patriótica, como é o caso das peças escritas por Olavo Bilac, Coelho Neto e Figueiredo Pimentel. Somente após a década de 1940 é que o teatro infantil sai das mãos de educadores e surgem peças não mais vinculadas ao pedagógico, como “O casaco encantado” (1948), de Lúcia Benedetti, e “O boi e o burro no caminho de Belém” (1950), de Maria Clara Machado. O teatro, para se concretizar no palco, é antes literatura, ou seja, texto dramático. Em outras palavras, a arte cênica tem como alicerce básico o texto. O texto dramático, assim como a narrativa e a poesia, tem também as suas especificidades. Por ser criado para concretizar-se no palco, carrega em sua estrutura algumas marcas próprias, como o intenso diálogo entre os personagens e as rubricas. Observe o exemplo: SEBASTIÃO Deve ser aqui! Veja o mapa, Julião! JULIÃO Veja você, Sebastião. (Troca o mapa pela vela do Sebastião.) SEBASTIÃO É melhor o João ver; João é o encarregado do mapa. (Troca a garrafa com João e bebe um traguinho. Fazem várias vezes este jogo de trocar.) JOÃO (Com o mapa) Uma casa perdida na areia branca perto do mar verde...Deve estar por perto...Pega na luneta, Julião. Esse é um trecho extraído do início do texto dramático “Pluft, o fantasminha”. O texto escrito por Maria Clara Machado, em 1955, apresenta elementos da dramaticidade; consegue identificar? Por que não é uma narrativa? Por que não é um poema? O texto dramático, como é criado para ser encenado no palco, traz signos teatrais em sua estrutura: o nome do personagem cada vez que aparece a sua fala, um intenso diálogo entre os personagens, que determina a ação, e as rubricas (ou didascálias), que, no exemplo dado, estão entre parênteses, mas podem vir destacadas no texto com o itálico ou ainda negrito. E para que servem as rubricas? As rubricas dão indicações importantes na história, auxiliando os personagens a realizarem as suas ações, a organização do cenário, a dinâmica no palco. Podem indicar os gestos, o ambiente, a época, interpretação, movimento. 015 O texto dramático pode ainda estar dividido em atos, divisão clássica feita pelo sentido da peça, em quadros, determinados pela troca de ambientes, e em cenas, marcadas cada vez em que um personagem entra ou sai do palco. Dessa forma, a leitura do texto dramático exige um leitor que identifique, que perceba esses signos teatrais e que seja capaz de transformar as palavras impressas e organizadas nas páginas do livro, em imagens vivas. Cabe aqui uma ressalva muito importante ao professor: é preciso compreender a estrutura do texto dramático para promover a leitura com os alunos. E, caso opte por encenar um texto dramático em sala, materializando-o por meio da encenação, lembre-se de que o teatro, assim como a literatura, é arte. Assim, fuja do teatro de cunho apenas pedagógico e procure por textos dramáticos que trazem riqueza estrutural e temática, como a obra de Maria Clara Machado. “Pluft, o fantasminha”, “O cavalinho azul”, “A bruxinha que era boa”, “A menina e o vento”. FINALIZANDO Discutimos, nesta aula, três grandes grupos de textos que abarcam os gêneros textuais da literatura: narrativas, poesia e texto dramático. Cabe ao professor apropriar-se desses textos para que torne possível o acesso aos mais variados gêneros literários na sala de aula. O letramento deve ocorrer neste sentido: o aluno precisa reconhecer em cada texto a sua estrutura própria. Assim, transitará pelos mais variados textos da literatura infantil, fruindo e compreendendo- os em suas especificidades, deixando-se encantar pela arte da palavra, pelo imaginário, pela fantasia e pela beleza das palavras no papel. 016 REFERÊNCIAS CARVALHO, B. V. de. A literatura infantil: visão histórica e crítica. São Paulo: Edart, 1982. COELHO, N. N. Panorama histórico da literatura infantil/juvenil. São Paulo: Ática, 1991. COSTA, M. M. da. Literatura infantil. Curitiba: IESDE, 2009. CUNHA, M. A. A. Poesia da escola. São Paulo: Discubra, 1976. ESOPO. A Cigarra E A Formiga. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=Wh9JBQAAQBAJ>. p. 74-75. Acesso em: 2 dez. 2017. MACHADO, M. C. Pluft, o fantasminha. São Paulo: Ática, 2002. p. 9-10. MACHADO, M. Z. V. Gêneros literários para crianças. In: Termos de alfabetização, leitura e escrita para educadores. Glossário Ceale. Disponível em: <http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/verbetes/generos- literarios-para-criancas>. Acesso em: 2 dez. 2017. SOSA, J. A literatura infantil: ensaio sobre a ética, a estética e a Psicopedagogia da literatura infantil. São Paulo: Cultrix/USP, 1978.
Compartilhar