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Ficha E.doc 1 Planejamento Urbano I Ficha E A derradeira Utopia: O Movimento Moderno e a Cidade Num período da história da humanidade em que multiplos inventos científicos se desenvolvem e tantas alterações sucedem no campo social do Mundo Ocidental, surgem variados movimentos intelectuais e artísticos, de cariz mais ou menos radicais, com uma acção importante na arquitetura: os Futuristas, os Neo-plasticistas, os Construtivistas, os Modernistas, etc. Comungando uma atitude de ruptura com o passado, todos consistem de certo modo em aproximações utópicas ao tema da arquitectura e da cidade. De todos eles, aquele que mais profundamente vai marcar a fisionomia do mundo em que vivemos é aquele que convencionou chamar-se Movimento Moderno (por vezes designado por Estilo Internacional, nome de baptismo surgido por ocasião da exposição “Arquitectura Moderna” de 1932 organizada pelo crítico de arte Kevin- Russel Hitchcock e pelo arquitecto Philip Johnson). O Movimento Moderno – designação (como todas as “rotulagens” deste tipo) um pouco vaga e imprecisa - irá englobar diversas figuras seminais da arquitectura do século XX. De forma mais ou menos nítida, todos eles serão afectados por tendências funcionalistas: uma atitude de raiz “platonista” que propõe que se todos os objectos, vivos ou inanimados, obedecerem a princípios organizativos e formais que respeitem essencialmente a função para que estão vocacionados, então o mundo resultante será mais agradável e equilibrado – form follows function... Se na Europa a figura proeminente da tendência é Loos, nos Estados Unidos da América sobressai Louis Sullivan que, de forma menos intelectualizada que o austríaco, põe em prática um estilo eminentemente pragmático, aliás bastante característico no comportamento do “Novo Mundo”. Na geração seguinte de arquitectos, em ambos lados do Atlântico, destacam-se igualmente um par de nomes na criação artística do século XX: na América, o discípulo de Sullivan, Frank Lloyd Wright; na Europa, o suíço Ficha E.doc 2 (naturalizado francês) Charles-Edouard Jeanneret – conhecido como Le Corbusier. Tal como os dois iniciadores do “Funcionalismo” (Loos e Sullivan), também agora se nota uma atitude mais intuitiva do americano, e uma postura muito mais racional e intelectualizada (sobretudo nas criações iniciais e médias) do europeu. Em consequência disso, se Frank Lloyd Wright limita a sua obra sobre a cidade a uma claramente utópica “Broad-acre city” – um ensaio algo ambíguo que se manifesta desde logo no seu nome, sobre uma urbe ideal que é um híbrido entre cidade e campo – já Le Corbusier nos lega um corpo teórico fundamental na formulação da cidade moderna, fazendo dele a figura mais importante do pensamento urbanístico do século. As raízes da cidade corbusiana são no entanto fáceis de detectar, residindo nas propostas de Auguste Perret e de Tony Garnier, e mais longinquamente na “cidade-jardim” de Ebenezer Howard. Tal como nestes, também a reflexão sobre a cidade de Le Corbusier passa uma imagem claramente utopista, na medida em que configura todo um modelo inteiramente novo de relações físicas, económicas e sociais dentro da cidade. Ele insistia que a reorganização da cidade era a primeira tarefa da arquitectura moderna, o que ele ensaia na exposição de 1922 da “Cidade Moderna para Três Milhões de Habitantes”. A diferença entre todos é que se Howard, Garnier e Perret conseguem pôr algumas vezes em prática as suas teorias utópicas, com Corbusier (na sequência de uma preocupação mundial pós-depressionária crescente com o Planejamento Urbano, para a qual o Congresso Internacional de Arquitectura Moderna parece ser a única organização capaz de dar respostas), a utopia converte-se em realidade, e cidades em todo o mundo, até aos nossos dias, seguem com certa fidelidade as propostas do CIAM (fortemente influenciado pela figura de Le Corbusier). Assim, é com a teoria urbanística do movimento moderno que se desfaz a Luisa Realce Ficha E.doc 3 estrutura tradicional da cidade, em que os espaços habitacionais, industriais e os serviços usavam dos mesmos espaços. O centro da cidade ocidental, altamente cotado financeiramente, torna-se demasiado caro para a atividade residencial. Os modernos transportes públicos e o automóvel – dois elementos essenciais para o funcionamento da cidade modernista – permitem a deslocação diária do cidadão do bairro residencial onde dorme para o centro terciário, ou para a zona industrial. Le Corbusier identifica então as quatro funções urbanas da cidade: habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o espírito e circular. Dá-se continuidade ao “zonamento” da cidade, em que às distintas funções humanas correspondem distintos espaços da cidade. Já que habitar é considerada a função principal, o mínimo elemento habitável – a moradia – torna-se o elemento fundamental da nova cidade. Assumindo a moradia – e não o edifício – como ponto de partida para reorganizar a cidade, torna-se possível criticar e rejeitar os modelos de edifícios próprios da cidade burguesa: a residência construída na linha da rua e a pequena villa afastada desta linha. Esta preocupação com o “módulo habitacional” vai lançar as bases da moderna regulamentação urbanística, com uma actuação científica que determina áreas e funções mínimas da moradia, requisitos relativos à luz, som, arejamento e conforto térmico, recorrendo à Economia, Geografia, Sociologia, Estatística e Psicologia. Le Corbusier ensaia modelos teóricos na sua “Cidade Moderna para Três Milhões de Habitantes”, por ocasião do Salão de Outono (1922), no Plano Voisin (1925), nas “Villes Radieuses” (1930-36). A pré-fabricação é ferramenta indispensável à edificação da nova cidade: “Sucintamente: para que o estaleiro se industrialize, é necessário passar da construção anacrónica de um imóvel isolado, «à medida», com todos os seus Luisa Realce Luisa Realce Ficha E.doc 4 casos isolados, à construção de ruas inteiras, de quarteirões inteiros. Trata-se de estudar bem a célula, isto é, a residência de um homem, de lhe fixar o módulo, e de passar à execução em séries uniformes.”1 Daqui surge o sistema corbusiano “Domino”, em que a grande indústria deveria colaborar na produção do módulo comum, produzindo janelas, portas e painéis de parede de série. Na Maison Citrohan (um trocadilho com o Citröen da industria automóvel), o arquiteto produz “uma casa como um automóvel” – que seja vista como uma ferramenta ou uma máquina de habitar. No plano Voisin, Le Corbusier lança o desafio a várias empresas da grande indústria para o patrocínio de um projecto teórico de reformulação de uma parte da cidade de Paris – convite que é aceite pela Empresa Aeronáutica Voisin, que financia o estudo.2 Nos seus “Imóveis-Villa” (imeuble-villa), um sistema de moradias sobrepostas funciona dentro de um grande bloco habitacional: cada casa tem o seu jardim suspenso, e na cobertura do bloco há uma grande sala desportiva comum e uma pista de 300 m.; também na cobertura existe uma sala de festas à disposição dos residentes (um espaço que encontramos em muitos blocos de apartamentos actuais…). No pátio interior do “Imóvel” há cortes de ténis, e uma organização hoteleira trata dos serviços comuns do imóvel – pode o morador dispensar o recurso a uma empregada doméstica: encomenda as refeições no serviço de restauração, e a limpeza e lavandaria nos respectivos sectores. Por vezes recorre aos “Rédents”: grandes blocos ziguezagueantes com a largura de 21 m., alojando módulos-villas – uma das quais Le Corbusier edifica a título “prototípico” no Pavillon de L’Esprit Nouveau na Exposição Internacional de Artes Decorativas de 1925. Ficha E.doc 5 As propostas, como se vê, encerram evidentes propósitos de tipo ideológico: a casa“modular”, feita em série para o cidadão, revela as simpatias de Le Corbusier. 1 Le Corbusier. “L’Urbanisme”. Èditions Vincent Fréal et Cie. Paris, re-edição de 1966. 2 “Penso então bem friamente que se deve chegar à ideia de demolir o centro das grandes cidades e de reconstruí-las”. A função de circulação assume papel fulcral na cidade moderna. Na cidade “à rédents”, a superfície construída de apenas 15%, com 85% do solo plantado, numa densidade equivalente ao centro de Paris, servida por grandes ruas axiais de 50m. de largo, cortadas a cada 400m. (a circulação automóvel permitiria a supressão de 2/3 das ruas actuais). A rua é rectilínea: Corbusier chama à rua curva “o caminho dos asnos” e à rua direita “o caminho dos homens”. Na “Cidade de Três Milhões de Habitantes”, Le Corbusier apetrecha com uma rede de circulação hierarquizada a cidade utópica que propõe: “A rua corredor de dois passeios, sufocada entre altas casas, deve desaparecer. As cidades têm o direito de ser outra coisa que não os prédios todos em corredor.” “Onde param os milhares de viaturas na cidade moderna? Ao longo dos passeios, engarrafando a circulação; o homem de negócios nova-iorquino abandona a sua viatura no subúrbio! Deviam criar-se parques castos, abrigados, para estacionar as viaturas no horário de trabalho. As ruas actuais recusam-se a isso. A rua-corredor não pode mais subsistir e por mil razões. Há que criar um outro tipo de rua. A rua moderna deve ser uma obra-prima de génio civil, e não-mais um trabalho de calceteiros. A «rua em corredor» não deve continuar a tolerar-se porque ela envenena as Ficha E.doc 6 casas que a marginam e porque ela provoca a construção de pátios fechados.” Corbusier propõe então três tipos de ruas, a níveis desencontrados: a. Em sub-solo, para os veículos pesados. O piso das casas a este nível é formado pelos “pilotis” estruturais, que deixam entre si espaços livres muito grandes, onde os veículos pesados podem circular, descarregando ou carregando mercadorias – constituindo na realidade as “docas” do prédio. b. Ao nível do Rés-do-Chão, num sistema múltiplo e sensível das ruas normais que conduzem a circulação para os fins mais variados. c. No sentido Norte/Sul e Este/Oeste, os dois grandes eixos da cidade, os “autódromos de travessia para circulação rápida em sentido único” (uma antecipação das modernas auto-estradas) estabelecidos sobre vastas passadeiras de betão com 40 e 60 metros de largura ligadas a cada 800 ou 1200 metros através de rampas ao nível das ruas normais. Acedemos aos “autódromos de travessia” num ponto qualquer do seu curso e podemos efectuar a travessia da cidade e atingira o seu subúrbio em poucos minutos, com uma maior rapidez, sem ter que suportar qualquer cruzamento. “O número de cruzamentos é função directa do número de ruas; é uma consequência nefasta do número de ruas. O cruzamento de ruas é o inimigo da circulação. O número de ruas actual é determinado pela mais distante história. As ruas assim, intersectam-se a cada 50 m., cada 20 m., cada 10 m.! É então o engarrafamento ridículo!” O sistema de transportes públicos cruza-se no centro da cidade, coração do pulsar urbano: hoje as portas da cidade são as gares. “O afastamento de duas estações de “Metro” ou de autocarro fornece o módulo útil de distância entre ruas, módulo condicionado pela velocidade dos veículos e a resistência admissível do peão. Essa distância média de 400 m. dá portanto o afastamento normal das ruas, módulo das distâncias urbanas. A minha cidade é traçada sobre uma quadrícula regular de ruas espaçadas de 400 m. e cortada por vezes a 200 m. Ficha E.doc 7 O loteamento de 400 m. de lado determina então quarteirões de 16 ha. para uma população variante de acordo com o seu cariz - negócios ou residência - de 50.000 a 6.000 habitantes. O veículo sobre trilhos só tem razão de existir se atrelado em comboios, satisfazendo assim um grande débito: é então a rede de “Metro” ou o comboio suburbano. O eléctrico, esse, não tem mais o direito de cidadania no coração da cidade moderna. Alinhado com os principais eixos estruturantes da cidade, dois andares abaixo do autódromo de travessia, acha-se então o “Metro” de penetração, que assoma à superfície nos quatro pontos extremos dos subúrbios das cidades-jardim e que constitui o colector da rede metropolitana. Realizações Urbanísticas sob Influência do Movimento Moderno A reunião do CIAM de 1933 em Atenas, marca um ponto histórico na afirmação do Movimento Moderno. O Congresso, dominado pela figura de Le Corbusier, emite uma Carta (a famosa Carta de Atenas) de conclusões, em que se afirmam os pontos doutrinais sobre a cidade moderna: "71. A maioria das cidades estudadas apresentam hoje uma imagem caótica. Estas cidades não respondem, de modo algum, ao seu destino, que devia consistir em satisfazer as necessidades primordiais, biológicas e psicológicas, da sua população. 72. Esta situação revela, desde o começo da era das máquinas, a sobreposição incessante dos interesses privados. 73. A violência dos interesses privados provoca uma desastrosa ruptura de equilíbrio entre o impulso das forças económicas, por um lado, e a debilidade do controlo administrativo e a impotência da solidariedade social, por outro. 74. Ainda que as cidades se achem em estado de permanente transformação, o seu desenvolvimento dirige-se sem precisão nem controle e sem que se tenham em conta os princípios do urbanismo contemporâneo, elaborados nos meios técnicos qualificados. 75. A cidade deve garantir, nos planos espiritual e material, a liberdade individual e o benefício da acção colectiva. 76. A operação de dar dimensões a todas as coisas no dispositivo urbano só pode reger-se pela escala do homem. Ficha E.doc 8 77. As chaves do urbanismo contêm-se nas quatro funções seguintes: habitar, trabalhar, recrear (nas horas livres), circular. 78. Os planos determinarão a estrutura de cada um dos sectores afectados às quatro funções chave e assinalarão a sua localização respectiva no conjunto. 79. O ciclo de funções quotidianas, habitar, trabalhar e recrear (recuperação), será regulado pelo urbanismo dentro da mais estrita economia de tempo. A vivenda será considerada como o próprio centro das preocupações urbanísticas e como o ponto de união de todas as medidas. 80. As novas velocidades mecânicas transformaram o meio urbano, ao introduzir nele um perigo permanente, ao provocar o engarrafamento e a paralisia das comunicações e ao comprometer a higiene. 81. Há que rever o princípio da circulação urbana e suburbana. Há que efectuar umaclassificação das velocidades disponíveis. A reforma do zonamento que harmonize as funções chave da cidade criará entre estas vínculos naturais para cuja consolidação se preverá uma rede racional de grandes artérias. 82. O urbanismo é uma ciência de três dimensões, e não somente de duas. Com a intervenção do elemento altura dar-se-á solução à circulação moderna e ao afastamento mediante a exploração dos espaços livres assim criados. 83. A cidade deve ser estudada dentro do conjunto da sua região de influência. O simples plano municipal será substituído por um plano regional. O limite do aglomerado será função do raio da sua acção económica. 84. A cidade, definida no sucessivo como uma unidade funcional, deverá crescer harmoniosamente em cada uma das suas partes, dispondo dos espaços e das vinculações em que poderão inscrever-se, equilibradamente, as etapas do seu desenvolvimento. 85. É da mais imperiosa necessidade que cada cidade estabeleça o seu programa, promulgando leis que permitam a sua realização. 86. O programa deve elaborar-se a partir de análises rigorosas feitas por especialistas. Deve prever as etapas no espaço e no tempo. Deve unir numa fecunda concordânciaos recursos naturais do lugar, a topografia do conjunto, os dados económicos, as necessidades sociológicas e os valores espirituais. 87. Para o arquitecto, ocupado aqui em tarefas de urbanismo, o instrumento de medida será a escala humana. 88. O núcleo inicial do urbanismo é uma célula de habitação (uma vivenda) e sua inserção num grupo que forme uma unidade de habitação de tamanho eficaz. Ficha E.doc 9 89. A partir desta unidade-vivenda estabelecer-se-ão no espaço urbano as relações entre a habitação, os locais de trabalho e as instalações consagradas às horas livres. 90. Para resolver esta grande tarefa é indispensável utilizar os recursos da técnica moderna. Esta, com o concurso das especialidades, apoiará a arte de construir com todas as seguranças da ciência e enriquecê-la-á com as invenções e os recursos da época. 91. A marcha dos acontecimentos ver-se-á influenciada fundamentalmente pelos factores políticos, sociais e económicos. 92. E não será aqui que a arquitectura em última instância intervirá. 93. A escala dos trabalhos a empreender urgentemente para a ordenação das cidades e, por outro lado, o estado infinitamente fragmentado da propriedade do solo, são duas realidades antagónicas.A perigosa contradição observada aqui coloca uma das questões mais perigosas da nossa época: a urgência de regulamentar, através de um meio legal, a disposição de todo o solo útil para equilibrar as necessidades vitais do indivíduo em plena harmonia com as necessidades colectivas. 94. O interesse privado subordinar-se-á ao interesse colectivo." - § - A dinâmica do crescimento urbano no "Novo Mundo" não possui paralelo na Europa: as grandes cidades do "Velho Continente" possuem um tecido urbano consolidado de características seculares, que se torna impróprio para operações urbanísticas de tipo modernista; assim, neste continente, as concretizações desta escola no seio da cidade vão ser essencialmente: - De tipo "imaterial", na esfera do pensamento: a área do planeamento, onde a regulamentação urbanística forma de certo modo um legado do estudo da habitação que o movimento moderno promove; neste sentido o conceito de tipologia habitacional (incluindo seus espaços, funções e áreas mínimas), salubridade (ventilação, fenestração), espaços verdes, estacionamento, circulação, equipamento, tanto devem ao pioneirismo da escola modernista. - De tipo "material", incidindo nos espaços de expansão das urbes existentes. Os novos bairros, na cintura das cidades antigas, vão seguir os preceitos do movimento moderno, um pouco por toda a Europa; Já no Hemisfério Ocidental a civilização urbana limitava-se, quando os Ficha E.doc 10 europeus aí chegam em finais do século XV, à América Central e parte da América do Sul, com as civilizações pré-colombianas (maias, aztecas e incas), em cidades que os colonizadores espanhóis vão destruir totalmente (cidade do México), ou votar ao abandono (Machu Pichu). O Brasil e a América do Norte eram povoadas por indígenas essencialmente nómadas e aqui a civilização urbana não existia. A situação na Oceânia e Ilhas do Pacífico não diferia grandemente. Daqui resulta que os densos tecidos urbanos do centros urbanos europeus inexistiam nestas paragens o que, aliado ao espírito aventureiro e optimista dos colonizadores destas paragens, leva à implantação de princípios urbanísticos "modernos" (e não ainda "modernistas") essencialmente pragmáticos que lemos, por exemplo, nas planta de Manhattan, Washington, Nova Delhi ou Maputo (ex- Lourenço Marques) e na adopção de métodos construtivos e linguagem arquitectónica na mesma linha (conforme o já referido Sullivan e outros). Nas cidades do "Novo Mundo" os princípios do movimento moderno vão encontrar então terreno propício às concretizações em grande escala, e se os respectivos subúrbios seguem modelos de "cidade-jardim" que negam o quarteirão clássico da cidades europeia (veja-se Los Angeles, que se espraia numa "cidade-jardim" quase ininterrupta de centenas de quilómetros), já os bairros centrais - terciários ou de habitação - vão adoptar esquemas recticulados mas onde, em vez do "quarteirão" que poderia existir, se situa apenas uma torre, que podemos olhar em todo o redor, carecendo como tal da leitura hierarquizada do quarteirão urbano europeu (com fachada sobre a rua, fachada de traseiras e empenas cegas laterais): é o caso da Avenida Paulista (no Brasil), de Hong-Kong ou da Baixa Manhattan, mas que na Europa também podemos encontrar – as torres Velasca, de Rogers, ou Pirelli de Gio Ponti e Pier Luigi Nervi, na época da sua construção o mais alto edifício em concreto armado no mundo (ambas em Milão), ou até em Lisboa, numa escala menor – tendo no Hotel Sheraton na Avenida Fontes Pereira de Melo o mais vistoso exemplo. O aspecto fundamentalmente materialista e especulativo destas sociedades permite que os "arranha-céus" cresçam desenfreadamente, à medida Ficha E.doc 11 que a tecnologia o permite, o que provoca consequências nefastas, por exemplo ao nível da insolação dos bairros envolventes, boa parte dos quais passam a ver- se privados de luz durante várias horas do dia. Este cariz optimista e particularmente orientado para o futuro dos continentes de colonização mais recente, receptivos às novas tecnologias construtivas e novos modelos de cidade, encontram apogeu em Chandigarh, capital do novo estado indiano do Punjab, com projecto urbanístico de Le Corbusier (que também desenha os principais edifícios), e Brasília, que sob desenho de Lúcio Costa vai realizar-se também de acordo com os preceitos do Movimento Moderno raiz em torno da Praça dos Três Poderes e principais edifícios cívicos de Oscar Niemeyer. É afinal de certo modo uma legitimação do "International Style", que no prazo de três dezenas de anos passa de movimento de vanguarda a estilo "oficial".
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