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NA ESTRADA DO ALTOASF ABEDA 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO AABED A sn o Na estrada do asfalto Ao comemorar 50 anos de atividades, a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfaltos (Abeda) decidiu resgatar um pouco da memória do setor, cuja trajetória foi marcada pelo pioneirismo e a superação de desafi os. Afi nal, aqueles que fundaram a Abeda, assim como os que foram se associando à entidade no decorrer de cinco décadas, tiveram uma participação importante em momentos marcantes de nosso Brasil: da construção de Brasília, no Planalto Central, à implantação de uma malha de rodovias que corta o país, a partir da década de 1950; da construção da binacional Itaipu à implantação e expansão de aeroportos nas capitais e principais cidades brasileiras. O asfalto está sempre presente. Este livro fala um pouco dessa história, conforme atesta JOSÉ ALBERTO PIÑÓN GONZALEZ, Presidente da Abeda: “A partir de uma abordagem clara e objetiva, é possível conhecer a história do asfalto desde seus primórdios — à época, também apelidado de ‘ouro negro’ — até sua importância nos dias atuais. Aqui, o asfalto ganha vida! Ele é revelado como o grande protagonista da alavancagem do industrialismo e urbanismo brasileiros.” NA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DO ABEDA 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO ABEDA 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO ABEDA 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO ABEDA 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO ALALALALALALASFALASFASF TOTOTOTOTOTOALTOALTOALALTOALALALALALALTOALALALALALALTOALALALALTOALALTOALALTOALALALALTOALALASFASFASFASFASFASF AAAAAAABEDABEDABEDABEDABEDABED NA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DONA ESTRADA DO ABEDA: 50 ANOS NA ESTRADA DO ASFALTO Beatriz Cardoso Adênio de Carvalho Costa 1a Edição 2016 Rio de Janeiro FICHA CATALOGRÁFICA Cardoso, Beatriz C268 ABEDA: 50 anos na estrada do asfalto / Beatriz Cardoso,Adênio de Carvalho Costa. Rio de Janeiro: Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfalto, 2016. 267p.; il. color. ; 25 cm. ISBN 978-85-69658-01-6 1. Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfalto — História 2. Indústria do Asfalto — História I. Costa, Adênio de Carvalho II. Título. CDD 060:625.85 2 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto José de Alencar Nunes de Almeida Eder Vianna Curadoria Eunice Teixeira de Freitas Coordenação executiva ABEDA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DISTRIBUIDORAS DE ASFALTOS Roberto Dalmaso Valmir Pith Coordenação e produção Beatriz Cardoso Edição e coordenação editorial Adênio de Carvalho Costa Assistente de edição e pesquisa Bruno Braga Guilherme Araújo Nathália Tourinho Colaboradores Jonas Kussama Projeto gráfico e diagramação Sonia Cardoso Revisão Trama Criações Avenida Beira Mar, 406/1201 Centro — Rio de Janeiro (RJ) CEP 20021-900 (+55 21) 2215-3690 www.tramacriacoes.com.br trama@tramacriacoes.com.br TRAMA CRIAÇÕES Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto | 3 CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO CONSELHO FISCAL José Alberto Piñón Gonzalez Presidente do Conselho de Administração Brasquímica Produtos Asfálticos Ltda. José Miguel Cervantes de Menezes Nogueira Vice-Presidente do Conselho de Administração Stratura Asfaltos S/A Flavio Gomes Vianna Conselheiro de Administração Betunel Indústria e Comércio S/A Rodolfo Massari Conselheiro de Administração NTA — Novas Técnicas de Asfaltos Ltda. Ronaldo Aspesi Conselheiro de Administração Disbral — Distribuidora Brasileira de Asfalto Ltda. Carlos Guilherme Ceschin Gomes do Rego Conselheiro Fiscal Compasa do Brasil Distribuidora de Derivados de Petróleo Ltda. Clóvis Fernando Greca Conselheiro Fiscal Greca Distribuidora de Asfaltos S/A Leonardo Machado de Azevedo Vilela Conselheiro Fiscal Emam — Emulsões e Transportes Ltda. Luiz Gustavo Rocha Oliveira Rocholi Superintendente Executivo Eunice Muniz Teixeira de Freitas Secretária-Geral Monique de Souza Correia Assistente Administrativa 4 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Quem Somos A Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfaltos (Abeda) foi fundada em 1966 pelos pioneiros de um mercado ainda nascente, com o objetivo de contribuir para a organização e consolidação do setor no Brasil, bem como para disseminar o conhecimento técnico de pavimentação asfáltica. Como representante de suas associadas — as empresas de distribuição de asfaltos, fabricantes de emulsões asfálticas e asfaltos modificados — a Abeda tem como principal meta desenvolver ações que valorizem o segmento e conscientize o setor sobre a importância do distribuidor de asfalto, enquanto agente dinamizador da própria atividade e do desenvolvimento nacional. Nossa Missão Representar suas associadas, de forma ética, promovendo a excelência tec- nológica, mediante o desenvolvimento de políticas voltadas para o aprimoramento de toda a cadeia produtiva do asfalto. Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto | 5 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO: Um resgate revelador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 PREFÁCIO: Os anos de ouro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 PRÓLOGO: Uso milenar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Os primórdios da indústria do asfalto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 DÉCADA DE 1950: A revolução industrial brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 DÉCADA DE 1960: Na estrada das mudanças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82 6 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto DÉCADA DE 1970: Expansão do rodoviarismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110 DÉCADA DE 1980: Uma indústria de mão dupla . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .154 DÉCADA DE 1990: Grandes transformações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .182 ANOS 2000: A indústria do asfalto entra no século XXI . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .207 APÊNDICES: Associados Abeda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .248 Diretores da Abeda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .253 Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto | 7 8 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto O asfalto é o mais nobre e democrático de todos os derivados de petróleo; quando consumido, passa a produzir conforto e riqueza. Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto | 9 10 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Um resgate revelador Organizar o passado em função do presente seria a grande função social da história, na opinião do francês Lucien Febvre, um dos pais da corrente historiográfica econômica e social, que surgiu na primeira metade do século passado. Por sinal, o mesmo período sobre o qual nos debruçamos para iniciar o resgate da saga daindús- tria do asfalto no Brasil, para reuni-la em um livro — a missão que nos foi dada pela Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Asfaltos (Abeda) e abraçada por uma equipe de jornalistas. Contar uma grande história é o intuito de todo jornalista, que tem como principal desafio conquistar e prender a atenção, conquistar a mente e, se possível, o coração do leitor. Ao realizarmos as primeiras entrevistas com pessoas que, literalmente, ‘construíram’ a indústria brasileira do asfalto, nos vimos na condição de ouvintes sedentos por mais e mais ‘aventuras’. Parafraseando Drummond de Andrade, “não sabíamos que essa história era mais bonita que a de Robinson Crusoé”, pois aqueles que pavimentaram esse caminho também são personagens de uma saga que levará muito tempo para acabar. Afinal, há muita estrada pela frente para as novas gerações. Só nos resta agradecer a oportunidade dada pela Abeda e por todos os que colaboraram com a construção deste livro. Para nós, foi um prazer contar este ‘capítulo’, que marca os 50 anos da Abeda. Vida longa a essa valorosa indústria! Beatriz Cardoso APRESENTAÇÃO Apresentação | 11 12 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Os anos de ouro De uma brilhante ideia, nascida há um ano, com o simples desejo de contar a história da Abeda) — Associação Brasileira de Empresas Distribuidoras de Asfaltos, o livro tomou uma proporção muito além do que se propunha. A partir de uma abordagem clara e objetiva, é possível conhecer a história do asfalto desde seus primórdios — à época também apelidado de “ouro negro” — até sua importância nos dias atuais. Aqui, o asfalto ganha vida. Ele é revelado como o grande protagonista da história de alavancagem do industrialismo e urbanismo brasileiros. Sem perder de vista o embasamento científico, que beira cerca de 80% de todo o seu conteúdo, a obra dá voz a dezenas de personalidades que contribuíram (e ainda o fazem) por décadas para o surgimento e aperfeiçoamento do rodoviarismo do país. Foram mais de 70 horas de entrevistas decifrando a história sob a perspectiva de empreendedores que foram verdadeiros desbravadores do mercado. Obedecendo à ordem cronológica dos fatos, você verá, ao longo da leitura, que o século XX foi palco dos mais importantes acontecimentos da indústria do asfalto, período em que houve grandes avanços no escoamento da produção, no desenvolvimento urbano, na implantação da indústria automobilística, no transporte de cargas e pessoas, e no surgimento e povoamento de pequenas e grandes cidades. No cenário político, por exemplo, há merecidos destaques para alguns admi- nistradores que impulsionaram a indústria do asfalto. No período de 1917 a 1924, Washington Luís, então prefeito e depois governador paulista, ficou nacionalmente conhecido como o “estradeiro”. Já as décadas de 1950 e 60 foram marcadas pelo fenômeno da “revolução industrial brasileira”, com o surgimento da Petrobras, a consolidação da indústria automobilística (incentivada pelo Governo JK), a cons- trução de rodovias emblemáticas (para ligar Brasília ao resto do país), dentre outros fatos. E foi neste contexto que surgiram o Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR), o Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP) e as primeiras empresas distribuidoras de asfalto, momento em que, oportunamente, nascia a Abeda. Com papel estratégico na organização e consolidação da indústria deste nobre e democrático derivado do petróleo, a Abeda representa os interesses dos distri- buidores perante os órgãos reguladores, consumidores e produtores. A entidade PREFÁCIO Prefácio | 13 incentiva o avanço da tecnologia e disseminação do conhecimento por meio da promoção de palestras e congressos e publica livros e guias técnicos de orientação, com os quais contribui para a formação de mão de obra especializada, em parceria com universidades federais e estaduais. Neste livro você terá a oportunidade de conhecer a longa trajetória da Abeda, seus desafios e conquistas. Desde seu surgimento, com a lista dos integrantes que deram vida à primeira Diretoria, passando por suas mudanças de sede (São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Rio de Janeiro) até os dias atuais. Os anos 1970 são aqui divididos em dois momentos da economia brasileira: fim dos tempos de bonança (com grande inflação), por um lado, e implantação do Plano de Desenvolvimento e Integração Nacional, de outro. Para se ter uma ideia, é nesse período que nascem importantes eixos rodoviários no país, como a Transamazônica e a Cuiabá-Santarém, frutos de um trabalho desafiador que exigiu de seus construtores muita ousadia, persistência, bravura e empreendedorismo, marcas inconfundíveis dos distribuidores de asfalto no Brasil. A década também foi marcada pelo surgi- mento da Petrobras Distribuidora, do Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa) e do Instituto Brasileiro de Impermeabilização (IBI); pela construção da ponte Rio-Niterói e da BR-101 (Espírito Santo-Bahia). Também nos anos 1970 iniciaram operações as refinarias paulistas de Paulínia (Replan) e Henrique Lage (Revap), e ainda a Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, assim como do início da construção da Usina Hidrelétrica Binacional de Itaipu (Brasil-Paraguai). Com os graves efeitos deixados pela crise mundial do petróleo (1973-1979), a década de 1980 já nasceu fadada ao “insucesso”, inclusive denominada por muitos historiadores e economistas como “a década perdida”. No entanto, em meio ao fracasso dos planos econômicos do Governo Sarney, o Brasil sediou o I Congresso Latino- Americano de Asfalto, no Rio de Janeiro; eclodiram novas indústrias distribuidoras de asfaltos; entraram em operação os aeroportos de Guarulhos/SP e de Confins/ MG. Neste período, graças à atuação da Abeda, após muita luta com os governos anteriores, a categoria conquistou a chamada “abertura de mercado”, com o fim da exigência dos títulos regionais aos distribuidores — a partir de então, as empresas do ramo passaram a poder comercializar seus produtos fora de suas regiões de origem. Semelhante à década anterior, os anos 1990 promoveram grandes desafios e mudanças na economia do país. Dentre outros acontecimentos, a década foi marcada pelo curto e desastroso Governo Collor (1990-1992), sucedido do impeachment, e 14 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto pela privatização de grandes empresas e rodovias federais. Foi neste período que o Brasil passou a fabricar o primeiro asfalto borracha e experimentou a tecnologia de reciclagem, com o reaproveitamento de insumos asfálticos. Novas perspectivas de crescimento e de desenvolvimento econômico. Assim nasceu o século XXI no Brasil, com a criação do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), e do Ministério das Cidades, um novo olhar sobre a indústria rodoviária nacional. Antenada no cenário econômico favorável, a Abeda contribuiu de modo substancial para a formação e especialização de mão de obra. Assim foi com o Projeto Rua Estrada, treinando e reciclando técnicos de prefeituras e secretarias de obras, também com o Programa Proasfalto, desenvolvido dentro das Universidades. Na sequência, promove a publicação do livro Pavimentação asfáltica: Formação básica para engenheiros, e do Guia técnico de utilização de ligantes asfálticos em serviços de pavimentação, ambos escritos por mestres e doutores, expoentes da engenharia civil brasileira. Paralelamente, houve ainda a criação do Instituto Pavimentar, com a missão de incentivar pesquisas aplicadas e difundir tecnologia. Repetindo os feitos dos anos 1990, a política de concessões de estradas federais à iniciativa privada se sustentou, formalizando outros contratos, como o Rodoanel Mário Covas, em São Paulo, e o Complexo Industrial de Suape, em Pernambuco, a renovação da exploração da Ponte Rio-Niterói, bem como a construção da Estrada do Coco-Linha Verde, na Bahia. De acordo com dados da Confederação Nacional de Transporte (CNT), em pesquisa divulgada em 2015, o Brasil tem 1.720.607km de estradas implantadas (entre federais, estaduais e municipais), porém apenas 213.229 km (12,4%) são pa- vimentados. Esses números revelam um futuro promissor para a nova geração da indústria asfáltica brasileira, que já tem ao seu lado uma associação de classe forte, operante, competente e, acima de tudo, experiente — a Abeda. Afinal, são 50 anos de história. E que venham os novos desafios. Boa leitura! José Alberto Piñón Gonzalez Presidente da Abeda Prefácio | 15 16 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Introdução Q uando, no final de 2014, no Encontro Anual da Abeda em Foz do Iguaçu, o Presidente Carlos Guilherme Rego anunciou a elaboração de um livro comemorativo do cinquentenário da associação, em 2016, eu quase interrompi sua fala para cumprimentá-lo pela ótima ideia. E sua decisão, na sequência, de escolher o Eder Vianna e a mim como curadores da obra deixou-me muito feliz e honrado. Em agosto de 2015, na primeira reunião com os jornalistas responsáveis pelo projeto, Beatriz Cardoso e Adênio de Carvalho — ela coordenadora da equipe — e a Eunice Teixeira de Freitas — coordenadora de todas as atividades necessárias à sua execução —, ficou acordado e estabelecido o plano geral da obra. Nós falaríamos do asfalto, traçando uma linha do tempo desde a Antiguidade, muito antes das Olimpíadas da Grécia, até as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Numa espécie de zoom, focado em determinados intervalos desta linha do tempo, iríamos relatar fatos marcantes dos primórdios da pavimentação de vias, da indústria do petróleo no mundo e no Brasil e, quando no Brasil, de nossas primeiras vias e estradas, de nossos pioneiros na pavimentação rodoviária e na indústria do asfalto nacional. Em outro zoom, abrangendo um intervalo menor e, portanto, mais nítido, falaríamos da Abeda, a casa que nos reúne, magistralmente definida pelo meu com- panheiro de asfalto e Curadoria Eder Vianna, nosso decano e frasista de primeira: Introdução | 17 “A Abeda é onde os CPFs se confraternizam, enquanto os CNPJs se digladiam.” E falaríamos, e muito, das distribuidoras de asfaltos associadas e, principalmente, do relevante papel que sempre desempenharam no desenvolvimento e permanente atualização da pavimentação asfáltica do país, até certo ponto ainda ignorado, se- guramente por desconhecimento do que fazemos. Neste particular, chegaram a nos confundir com trocadores de nota! E houve até quem considerasse desnecessária a presença do distribuidor na cadeia produtiva do asfalto, já que o governo é quem produz e o governo é quem consome. E também era nossa preocupação o jovem universitário que estude ou pre- tenda estudar engenharia e não sabe das oportunidades de carreira que o setor de asfaltos pode lhe oferecer em uma distribuidora, em uma construtora de rodovias, e mesmo na universidade ou centro de pesquisas. Em resumo, o livro deveria se concentrar no trabalho dos dirigentes e engenheiros das distribuidoras em prol da pavimentação asfáltica, reduzindo ao mínimo os aspectos comerciais da atividade, na tentativa de mostrar, até mesmo a um leigo, o que fazemos. A propósito, permito-me narrar um diálogo, quase um monólogo, que mantive, há anos, com um amigo, advogado, culto e antenado com o que acontece no país: — Sei que você trabalha com asfalto. Mas não sei bem o que vocês fazem. — Vou começar com algo que lhe é familiar, a energia elétrica — eu lhe disse em tom meio professoral. — Ela é produzida longe daqui, em Itaipu, por exemplo, e precisa ser transportada para uma grande estação distribuidora, normalmente na periferia das grandes cidades. Não é um transporte fácil, em altíssima voltagem, coisa para especialista. Dela, com a voltagem reduzida, mas ainda alta, segue para subestações dos grandes consumidores e de vários bairros da cidade. A partir da mais próxima, ela é distribuída para as ruas vizinhas e, já transformada para 18 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto as usuais voltagens de 220 e 110 volts, é entregue em sua casa. Isso, de maneira simplificada, é o que faz uma distribuidora de energia elétrica. O distribuidor de asfalto faz algo parecido, com duas diferenças — continuei: — Os asfaltos são produzidos nas refinarias e precisam ser transportados para os terminais das distribuidoras. Também não é um transporte fácil, a temperaturas elevadas, coisa para especialista. A partir dos terminais, são enviados para as usinas de asfalto dos clientes (empresas de pavimentação ou órgãos públicos), onde é misturado com uma seleção de pedras britadas. O chamado “asfalto” aplicado na sua rua é, na verdade, essa mistura. Ele apenas meneou a cabeça, de modo afirmativo, e veio a pergunta: — E as diferenças? — A primeira é quanto à escala. Enquanto a distribuidora de energia tem milhões de clientes, na maioria residenciais, nas distribuidoras de asfaltos, eles se contam apenas às centenas. O que torna possível um contato direto e permanente. Sabemos de suas necessidades e, juntos, testamos os novos produtos e técnicas. E segui na explanação: — A segunda é que parte do asfalto que chega ao terminal da distribuidora é transformada em outros produtos asfálticos, capazes de criar novas opções de pavimentação, em linha com o que existe de mais atual no mundo. Para isso, os distribuidores enviam seus engenheiros para cursos, congressos e feiras no exterior; mantêm contatos com fornecedores de insumos, equipamentos e tecnologia; trazem o que aprenderam ou compraram para o Brasil; e, o mais importante, adequam as novidades à realidade brasileira. — E tem mais — acrescentei — as distribuidoras preparam manuais, promovem palestras e cursos para os clientes, prestam completa assistência técnica, desde seus laboratórios até a obra, e através da Abeda, isoladamente ou associada a outros parceiros, promovem e participam de importantes eventos e contratam os melhores talentos da área acadêmica para que produzam literatura técnica e ministrem cursos de formação profissional. Introdução | 19 Encerrando a conversa, ele disse: — Parabéns. Pena que muitos não saibam o que vocês fazem. Então, é isso o que faz um distribuidor de asfaltos. Foi isso o que fiz durante quase toda minha vida profissional. José de Alencar Nunes de Almeida Engenheiro Químico e Distribuidor de Asfaltos 20 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto PRÓLOGO: Uso milenar Deus mandará a Noé: “Faze para ti uma arca da madeira de gofer; farás compartimentos na arca e a betumarás por dentro e por fora com betume.” (Gênesis, 6:14) “E disseram uns aos outros: Eia, façamos tijolos e queimemo- los bem. E foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume por cal.” (Gênesis, 11:3) A inda que o asfalto, com o nome, conceito, forma e aplicação que co-nhecemos hoje, seja algo do século passado, o uso desse material vem de milhares de anos e é citado, inclusive, no Velho Testamento. E sempre cumprindo papel especial na vida do ser humano, principalmente como ligante e impermeabi- lizante milenar. Ele começou a ser utilizado milhares de anos antes de Cristo, sob as mais diferentes denominações: betume, alcatrão, lama, resina, azeite, nafta, óleo de São Quirino, nafta da Pérsia, entre outras (Canuto, 2002). Denominações dadas a uma substância negra que aflorava do solo e que passaria a ter diferentes usos. Prólogo | 21 O uso do asfalto teria começado na pré-história,[1] na última fase do período Paleolítico (‘idade da pedra lascada’) ou, mais, no período Neolítico, quando nossos antepassados teriam utilizado essa substância para unir as pontas de sílex[2] (rocha dura, com um corte incisivo quando lascada) a varas de pau para fazer lanças e flechas. Pântanos da Mesopotâmia Existem registros de que há pelo menos 6.500 anos as populações que viviam nos pântanos da Mesopotâmia (‘terra entre rios’ em grego), na região sul do atual Iraque e em parte do sudoeste do Irã (antiga Pérsia), descobriram as propriedades de impermeabilização do betume, “que era agregadoàs misturas de tijolos e argamas- sas, para impermeabilizá-los e, assim, proteger suas casas das cheias” (SPE, 2013). O betume estava presente na construção de embarcações de juncos — elas eram revestidas com essa substância. “Não podendo, porém, mais escondê-lo, tomou uma arca de juncos, e a revestiu com barro e betume; e, pondo nela o menino, a pôs nos juncos à margem do rio.” (Êxodo 2:3) 1 A pré-história abrange o período que antecede a invenção da escrita até aproximadamente 3500 a.C. O período Paleolítico (παλαιός, palaiós=”antigo”, λίθος, lithos=”pedra”, “pedra antiga”) ou Idade da Pedra Lascada, refere- -se ao período da pré-história em que os antepassados do homem começaram a produzir os primeiros artefatos em pedra lascada, até cerca de 10000 a.C., quando houve a chamada Revolução Neolítica (que se estende até 4000 a.C.), período no qual o homem passou a cultivar a agricultura, tornando-se não mais dependente apenas da coleta e da caça e, consequentemente, pôde deixar de ser nômade para se estabelcer em um local. 2 Rocha sedimentar silicatada, constituída de quartzo criptocristalino, muito dura e com densidade elevada. Em geral compacta, de cor cinzenta, negra e outras, tem fratura conchoidal. Foi muito utilizada pelo homem du- rante os períodos Paleolítico, Mesolítico/Epipaliolítico e Neolítico para confecção de armas (por exemplo, em pontas de seta) e utensílios de corte, devido a sua grande dureza e a seu corte incisivo, com as arestas afiadas produzidas quando fraturada. Foi também muito utilizada para produzir faíscas em antigas armas de fogo (pe- derneiras). É ainda empregada na construção, sobretudo na Inglaterra. 22 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Um costume que deu origem ao método hoje conhecido mundo afora como calafetagem — impermeabilização, sobretudo de barcos de madeira, empregada até a invenção dos modernos cascos de metal e fibra de vidro. Na Antiguidade,[3] em muitas regiões do Oriente Médio, o betume (ou petró- leo) contido em jazidas subterrâneas aflorava à superfície, formando poças dessa substância negra e densa. A disseminação de seu uso se dará a partir dessas regiões. Enfim, há registros que remontam a 4000 a.C., de exsudações e afloramentos frequentes no Oriente Médio. Povos da Mesopotâmia, do Egito, da Pérsia e da Judeia utilizavam o betume para pavimentação de estradas, calafetação de grandes cons- truções, aquecimento e iluminação de casas, bem como lubrificantes e até laxativo. Apogeu da Babilônia As sociedades da antiga Babilônia usaram betume para impermeabilizar as estradas com superfícies lisas e mais resistentes à chuva. No período de esplendor da Babilônia, cerca de 1800 a.C., “floresceu no Oriente Médio uma vasta rede de 3 Ou Idade Antiga, período demarcado pela invenção da escrita (4000 a.C. a 3500 a.C.) até a queda do Império Romano do Ocidente (476 d.C.). Jardins Suspensos da Babilônia — Gravura do século 16 representando os Jardins Suspensos (foto: Wikimedia Commons) Prólogo | 23 trocas comerciais baseada nesse ‘ouro negro’, com o qual se edificaram cidades inteiras” (SPE, 2013). Utilizado na maior parte das grandes construções da antiga Babilônia, suas características impermeabilizantes eram associadas a qualidades adesivas, sendo visto como muito útil para juntar os tijolos secados ao forno (Gênesis 11:3). Também seu uso teria sido crucial nas obras dos chamados Jardins Suspensos, um conjunto espetacular de terraços ajardinados, com flores e árvores, na região atual da cidade de Hillah, no Iraque. Nessa obra, atribuída ao rei Nabucodonosor II, que governou entre 605 e 562 a.C., o betume provavelmente teria sido utilizado tanto na impermeabilização dos tanques, onde os jardins eram plantados, como, também, na selagem dos canais de irrigação para impedir eventuais perdas da água, que era bombeada do rio Eufrates. A TORRE DE BABEL Babilônia deriva do termo grego Babylon, forma grega do acádio Babilum, que sig- nifica “Porta de Deus”. Na Bíblia, a região é chamada Babel. Os Jardins Suspensos estariam próximos à torre citada no Antigo Testamento (Gênesis 11,1-9), construída pelos descendentes de Noé, para eternizar seus nomes. A torre era um zigurate, construção piramidal escalonada com plataformas recuadas e sucessivas, degraus externos e santuário no topo. A ideia era fazê-la tão alta que alcançasse o céu — tal soberba teria provocado a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu as línguas ali faladas e os espalhou por toda a Terra. Daí a expressão ‘torre de Babel’ para se referir à multiplicidade de idiomas. O mito bíblico teria sido inspirado na torre do templo de Marduk, cujo nome em hebraico é Babel ou Bavel. 24 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Egípcios: pirâmides e múmias Também os egípcios chegaram a utilizar betume na construção de suas pirâmi- des e para calafetar os canais de irrigação, barcos e casas. E até mesmo no processo de mumificação: as pessoas embebiam os cadáveres em uma solução com algumas substâncias químicas como o sal, cera de abelha, resina de cedro e breu. “A palavra ‘múmia’ poderia ser derivada do árabe mumya, em referência à montanha persa Mumya, onde o betume era encontrado em abundância. Até bem pouco tempo, acreditava-se que o betume nunca fora usado no processo de mumificação, e que o termo múmia se devia ao fato de que elas escureciam quando entravam em contato com o ar, nas escavações antropológicas. No entanto, análises químicas recentes demonstraram que o betume foi de fato utilizado nas múmias egípcias, mas somente durante o chamado ‘período ptolemaico’ (de 323 a 30 a.C.). O betume chegava ao Egito pelo Mar Morto, flutuando na água, uma vez que o óleo não se mistura devido à sua densidade.” (SPE, 2013) O comércio do betume na região era dominado pelos nabateus — antigo povo nômade estabelecido perto do Mar Morto. Eles o traziam até a margem, cortavam-no e então o levavam para o Egito. Na realidade, o Mar Morto é um lago, mais de 400 m abaixo do nível do mar, que recebe as águas de um único afluente, o rio Jordão. Na Bíblia há citações sobre “poços e mais poços de betume” (Gênesis 14:10) no Vale de Sidim, situado próximo de Sodoma e Gomorra, na região do Mar Morto. Como até hoje o betume (fragmentos ou placas) é, vez por outra, lançado pelas águas em suas margens, há quem acredite que esse vale está sob as águas do Mar Morto. Tanto é assim, que os gregos o chamavam de Lago Asphaltite (mar de asfaltite) em função da presença do betume, considerado um mineral estratégico... razão pela qual faziam reservas dessa substância para uso posterior. Asfaltite é a junção da palavra asfalto e o sufixo ite (formador de termos de mineralogia), que indicaria sua origem mineral. Prólogo | 25 Os romanos, que faziam uso bélico do betume, a princípio o batizaram de es- tercus diaboli ou estercore diaboli (esterco do diabo), por seu mau cheiro (decorrente da presença de sulfeto de hidrogênio, além de metano e etano). No século V a.C., Heródoto de Halicarnasso escreve Histórias, primeira obra relatando fatos históricos, apontada como a tentativa pioneira do homem em siste- matizar o conhecimento de suas ações ao longo do tempo. Datada de cerca de 440 a.C., a obra registra a existência de processos de obtenção do betume no Oriente Médio (Cotta, 1975, p. 174). É do latim (e francês) que vem a palavra ‘petróleo’ — óleo de pedra (petrus oleum). Há relatos de que até os Incas teriam utilizado o betume, por eles denominado “goma da terra” para asfaltar suas estradas e impermeabilizar vivendas. Francisco Pizarro, o explorador espanhol que derrubou o império Inca, citaria uma destilaria dessa goma da terra, que aflorava no chão (Canuto, 2002). Mas, bem antes, os hebraicos já denominavam esse material, negro ou castanho, em suas distintas formas, por meio de três palavras hebraicas. Duas descrevem a diferença de dureza: piche (zé·feth), sua forma líquida; betume (hhe·már), seu estado sólido. Aterceira palavra, alcatrão (kó·fer) descreve como esse produto é aplicado para recobrir madeiramentos. Lagos de asfalto É na Idade Moderna, mais de 1.500 anos depois de Cristo, que o uso do as- falto vai se disseminar com força, com a descoberta dos chamados ‘lagos de piche’. O primeiro deles, La Brea (breu ou piche, em espanhol), em Trinidad e Tobago, na América Central, ficou mundialmente conhecido pelo nome em inglês, Pitch Lake. Localizado na intersecção de duas falhas (ruptura das camadas rochosas), pela qual emerge o asfalto natural, esse lago foi ‘descoberto’ para o resto do mundo pelo explorador britânico Sir Walter Raleigh, que aportou nessa região da costa sudoeste de Trinidad em 1595. Raleigh deparou-se com uma planície de solo negro e utilizou esse material para vedar vazamentos e impermeabilizar os barcos com os quais iria fazer a viagem de regresso, destacando os atributos daquele ‘piche’, que não derretia sob o sol (SPE, 2013). 26 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto A reserva de La Brea tornou-se um recurso econômico importante, quando se constatou a qualidade do produto natural para pavimentar estradas. Há informa- ções de que engenheiros norte-americanos, em 1876, o usaram na pavimentação da Avenida Pensilvânia, em Washington, DC, que se manteve em excelente estado de conservação por 11 anos, consolidando a reputação do material utilizado. Ainda que não seja um lago, ganhou essa denominação por alcançar cerca de 80 m de profundidade em alguns pontos de seu 0,47 km2. Suas reservas seriam em torno de 40 milhões de barris. Depois seriam descobertos outros lagos de asfalto natural nas Américas. O maior de todos é o de Guanoco, também conhecido como lago Bermudez, na Venezuela, com 420 hectares (4,2 km2) e profundidade de 1,5 m a 2 m. Foi descrito pelo naturalista e explorador alemão Alejander von Humboldt em sua expedição à Venezuela, em 1806 (Humboldt, 1991). O Instituto Venezolano del Asfalto (Inveas) avalia suas reservas em 75 milhões de barris. De 1885 até 1934, era exportado basicamente para os Estados Unidos e Brasil, quando o asfalto derivado da refinação do petróleo substituiu o produto Lago de Asfalto Pich Lake, Trinidad — Venezuela Prólogo | 27 natural. A Venezuela tem uma das duas maiores reservas de petróleo do planeta, ao lado da Arábia Saudita. Também é famoso um lago de asfalto na Califórnia (EUA), denominado Rancho La Brea Tar Pits, na área do atual Park Hancock, coração de Los Angeles. Descoberto em 1883, nele foram encontrados fósseis em excelente estado de conservação de tigres-dentes-de-sabre, lobos gigantes e mamutes (SPE, 2013). DEFININDO TERMOS Os termos betume, asfalto, alcatrão e piche muitas vezes são usados erronea- mente de forma intercambiável. Contudo, betume é um termo genérico, designa uma classe de compostos pesados de hidrocarbonetos escuros encontrados no alcatrão, no piche e no petróleo. O alcatrão é uma substância escura, pegajosa, obtida da destilação seca do carvão mineral, para obtenção do coque siderúrgico. A destilação do alcatrão resulta em vários subprodutos. Idade Moderna A forma atual de asfaltar tem origem em uma técnica desenvolvida no início do século XIX, pelo engenheiro de estradas escocês John Loudon McAdam (1756- 1836). Ele criou um sistema denominado mais tarde como macadam (macadame), em homenagem a seu criador. Consistia no assentamento de três sucessivas camadas de pedras (brita, gradualmente menor a cada camada), em uma fundação com valas laterais, para escoamento da água da chuva. Cada camada era calcada com um rolo pesado (um cilindro), fazendo com que as pedras menores se acomodassem entre as maiores (que formavam uma base sólida) para melhor nivelamento do solo. 28 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Obra secular O macadame do engenheiro escocês lembra o sistema similar utilizado nas vias implantadas durante os 500 anos do Império Romano, uma das mais fortes potências econômicas, políticas e militares do seu tempo. Existem vestígios dessas vias até hoje em diversos países sobre os quais os romanos avançaram em busca de ampliar a expansão territorial desse império. Mais tarde, esse sistema foi aperfeiçoado. Primeiro, pelo engenheiro e inventor inglês Richard Edgeworth, que criou o water-bound macadam, utilizando água com pedra moída (stone dust), técnica descrita por ele em 1813 em um artigo (An Essay on the Construction of Roads and Carriages) que se tornou um manual prático popular. Quase um século depois, com o advento dos primeiros veículos a motor, ins- pirado no que viu ser feito para impermeabilizar os pisos de madeira de hospitais Calçamento na Grécia, resquícios da época do Império Romano Prólogo | 29 na Indonésia, o médico suíço Ernest Guglielminetti sugeriu ao príncipe de Mônaco o uso de uma mistura de alcatrão (tar), areia e pedregulho para impermeabilizar as ruas do principado, em 1894. Surgia o tar-bound macadam, que em 1902 foi aplicado pela primeira vez em ruas de Mônaco. Em 1901, o inglês Edgar Purnell Hooley patenteia o Tarmac (tarmacadam), no qual adicionava alcatrão ao pavimento feito pelo processo de macadame, utilizan- do um rolo compressor (Hooley, apud Sheail, 2004/2002). Até hoje há rodovias em macadame, inclusive no Brasil. A indústria do petróleo Na mesma época em que o macadame surgia, inicia-se a saga da exploração do petróleo pelas mãos do nova-iorquino Edwin Laurentine Drake. A serviço da Seneca Oil Company, em 1857, ele foi enviado a Titusville, Pensilvânia, para explorar petróleo nas exsudações encontradas. O dono da empresa atribui a ele uma patente militar, para impressionar a população local, tornando-o conhecido como Coronel Drake. Percebendo que a mineração de petróleo a partir das exsudações naturais era muito lenta, buscou alternativas, incluindo a perfuração, nos moldes do que era feito em minas de sal. Junto com o operador de sonda William Andrew Smith, conhecido por “Uncle Billy”, aplicou um sistema de perfuração com coluna de tubos de diâmetro pequeno para evitar a invasão da água, que a cética população de Titusville apelidou de a Loucura de Drake (Drake’s Folly) (SPE, 2013). Ele mesmo bancou o poço que, no dia 27 de agosto de 1859, quando a per- furatriz atingiu um reservatório, começou a produzir 10 barris por dia, que eram armazenados em barris de uísque e até em banheiras. Nascia a indústria petrolífera. Titusville foi uma das primeiras capitais do petróleo do mundo, ao lado de Baku, no atual Azerbaijão — o primeiro poço ali perfurado foi em 1846 —, mas nos manuscritos denominados As viagens, do mercador e explorador veneziano Marco Polo, no século XIII, já era mencionado. 30 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto “Na zona limítrofe da Geórgia existe uma grande fonte de que sai um licor que é semelhante ao óleo, em tal abundância que podem carregar-se cem navios de uma só vez; mas não é proveitoso para beber e sim para queimar, e serve para untar os camelos, protegendo-os de urticárias e furúnculos; os homens vêm de muito longe recolher este óleo, e em toda a comarca não se queima senão esta substância.” [4] Baku só ganharia produção em escala a partir de 1872, quando a Rússia imperial leiloou parcelas de terra rica em petróleo em volta de Baku para investidores priva- dos, entre os quais os personagens conhecidos como um dos irmãos Nobel (Ludwig irmão de Albert, o inventor da dinamite e do prêmio que tem o nome da família) e os Rothschild. Nasceu assim a Cidade Negra, perto de Baku, da qual dizem que se extraiu, no início do século XX, quase a metade das reservas petrolíferas conhecidas. A história do asfalto e do petróleo no mundo chegará ao Brasil no século XX, na trilha do rodoviarismo, como veremos nos próximos capítulos. O QUE É PETRÓLEO? O petróleo é o resultado de um longo processo natural baseado, em grande parte, na decomposição da matéria orgânica, que forma os hidrocarbonetos. Embora pareça uma substância simples, na realidade,é uma complexa mistura de com- postos químicos. As refinarias e as plantas petroquímicas separam os diferentes compostos, que depois usam para produzir uma grande variedade de produtos: os derivados de petróleo (SPE, 2013). 4 Disponível em: http://seguindopassoshistoria.blogspot.com.br/2012/05/as-viagens-de-marco-polo.html. Acesso em setembro de 2016. Há várias versões dessas aventuras, entre as quais As Viagens — Il Milione (2013), de Marco Polo, e As Viagens de Marco Polo (2015), de Leal Ferreira, Roberto, ambos da Editora Martin Claret. Prólogo | 31 Os primórdios da indústria do asfalto E nquanto Estados Unidos e Europa aplicavam e aprimoravam a técnica de construção de estradas, a partir do macadame, e começavam a utilizar o betume importado de outros países, dando ensejo à nascente indústria do petróleo na Pensilvânia (EUA) e na região de Baku, atual Azerbaijão, o Brasil imperial começa a dar os primeiros passos na integração de suas cidades por estradas. Primeiro manual de construção de estradas em língua portuguesa Foi o português José Diogo de Mascarenhas Neto, magistrado, funcionário público, político e maçom, quem escreveu o primeiro manual de construção de estradas em língua portuguesa. Superintendente-geral das Calçadas e Estradas (1791-1805), comandou a construção da primeira estrada entre Lisboa e o Porto, publicando um manual que apresentou aspectos inovadores para o seu tempo (Mascarenhas Neto, 1790). Mas foi a partir das primeiras rodovias, ainda no século XIX — e mais fortemente com a política do rodoviarismo, amplamente difundida no século XX — que o Brasil começa a trilhar a via que o levará à criação e consolidação da indústria do asfalto. Desde o Império, há necessidade de maior mobilidade. Mobilidade das pes- soas, dos produtos, dos que chegavam e dos que eram levados das ricas ‘terras do pau-brasil’, do açúcar e das riquezas minerais. 32 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Um olhar atento pelo ‘retrovisor do tempo’ mostra que já no Império as estradas chamadas de normais surgem das picadas nas matas feitas por índios, bandeirantes e outros aventureiros. Temos ainda as estradas coloniais, traçadas a partir da cidade imperial de Petrópolis, no Rio de Janeiro, rumo a Minas Gerais, de forma a favorecer ao escoamento da produção de café e do extrativismo mineral. Calçada do Lorena, capitania de São Paulo A necessidade de pavimentação e alinhamento dessas vias para interligação de um Brasil continental vai estabelecer as bases do futuro rodoviarismo. Uma das marcas desse processo é o que ficou conhecido como Calçada do Lorena: uma via calçada de pedras construída por determinação do governador da capitania de São Paulo, Bernardo José Maria de Lorena. A obra, iniciada em 1790 (Mendes, 1994), era necessária em função das pre- cárias condições do antigo Caminho do Padre José de Anchieta, o que inviabilizava Capa e ilustração do manual Methodo para construir as estradas em Portugal. Porto, Officina de António Alvares Ribeiro, 1790. 4.o de X-97 páginas com duas gravuras Os primórdios da indústria do asfalto | 33 o transporte do açúcar e demais gêneros do planalto de Piratininga, pela serra do Mar, ao porto de Santos, no litoral. Aberta em 1554, Caminho do Padre, com 60-70 km, saía de São Vicente e subia pela serra de Paranapiacaba, a oeste do rio Perequê, até encontrar o rio Grande, terminando no chamado Porto Geral (colina do Colégio de Piratininga, que deu origem à cidade de São Paulo). Por essa picada chegavam à vila os escravos indígenas, que depois transporta- riam nos ombros os produtos que chegavam pelo porto, em um percurso de três dias. Sobre as condições dessa via, em 1585, o padre Fernão Cardim, que acompanhou o jesuíta Cristóvão de Gouveia, de São Vicente a São Paulo, testemunhou: “O caminho é cheio de tijucos (atoleiro, pântano, charco), o pior que nunca vi e sempre íamos subindo e descendo serras altíssimas e passando rios e caudais de águas frigidíssimas.” (Cardim, 1925) A cargo do brigadeiro João da Costa Ferreira, engenheiro da Real Academia Militar de Lisboa, a Calçada do Lorena foi concluída em 1792, com 50 km, reduzindo em cerca de 20% o percurso entre Santos e São Paulo de Piratininga. Foi considerada uma das maiores obras da engenharia na colônia (Toledo, 1981), uma vez que transpor os mais de 700 m de desnível representados pela serra do Mar, numa região de mata densa e altos índices pluviométricos, foi um desafio que exigiu de seus construtores a adoção de técnicas ainda inéditas na Capitania de São Paulo. A pedra foi utilizada na pavimentação, na construção de muros de arrimo e de proteção junto aos despenhadeiros e nos canais pluviais da Calçada. Nas curvas do trecho de serra, caixas de dissipação desviavam para fora da via as águas conduzidas pelos canais pluviais. Menos íngreme, a Calçada do Lorena foi a primeira via a possibilitar o trânsito de tropas de muares (mulas), consumindo apenas dois dias na subida. Por ela também subiu a serra o Príncipe Regente D. Pedro, em 1822, rumo a São Paulo, onde, em 7 de setembro, proclamou a Independência do Brasil. 34 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Com o aumento do trânsito, essa via passou por melhorias, inclusive no seu traçado, durante as obras que foram concluídas em 1844. E ganhou então o nome de Estrada da Maioridade, em homenagem à maioridade antecipada do Imperador Dom Pedro II (1840-1889).[5] Mais tarde, recebeu a designação de Estrada do Vergueiro, após nova reforma, realizada entre 1862 e 1864, sob o comando do Comendador José Pereira de Campos Vergueiro. Os remanescentes da Calçada do Lorena encontram-se preservados e aber- tos à visitação turística no trecho que se estende do seu início, no planalto, até seu terceiro acesso à Rodovia Caminho do Mar, como é conhecida até hoje essa via. Desde então, São Paulo indicava sua vocação para ser a ‘locomotiva’ do país, somando nada menos que 240 mil habitantes no último censo do século XIX. [6] 5 Dom Pedro II (1825-1891) foi o segundo e último Imperador do Brasil. Tornou-se príncipe regente aos 5 anos de idade, quando seu pai, Dom Pedro I, abdicou do trono. José Bonifácio de Andrada e Silva foi nomeado seu tutor e depois foi substituído por Manuel Inácio de Andrade Souto Maior Pinto Coelho. Aos 15 anos (1840) foi declarado maior e coroado Imperador do Brasil. Foi destituído em 1889. Fonte: Portal e-biografia: https://www. ebiografia.com/dompedro_ii/ 6 Disponível em: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/1900.php Gravura do artista inglês Charles Landseer (início do século XIX) retrata tropeiro na Calçada do Lorena Os primórdios da indústria do asfalto | 35 “Antigas chácaras ao redor do núcleo histórico da cidade eram loteadas e a área urbana se expandia continuamente. Ferrovias faziam a ligação com o interior, onde se produzia o café, e com o porto de Santos, por onde ele era exportado. São Paulo se firmava como o mais dinâmico centro comercial e financeiro da Província. A ferrovia Santos-Jundiaí foi inaugurada em 1867, operada pela The São Paulo Railway Company Ltd., mas a grande estação de passageiros no bairro da Luz entrou em uso apenas em 1901.” (Toledo, 1981) Serra da Estrela e União e Indústria — cidade imperial Em 1835, por Lei Provincial 18, de Minas Gerais, são estabelecidas as carac- terísticas das estradas normais, “que serão abobadadas, macadamizadas, largas e descortinadas” (Oliveira, 1985), padrão que perduraria por muitas décadas e seria seguido por algumas das principais obras rodoviárias no país. É o caso da estrada da Serra da Estrela, interligando o norte da atual região metropolitana do Rio de Janeiro, na altura de Magé, à cidade de Petrópolis. Construída pelo Barão de Mauá, a partir de 1843, tinha as características exigidas pela lei da província. “Sua largura total era de 7,20 m e faixa empedrada de 5,00 m, excluídas as sarjetas, que eram de cantaria e possuíam seção trapezoidal”(Prego, 2001). Essa via é hoje conhecida como a Estrada Velha Serra da Estrela. Em Petrópolis seria inaugurada a primeira rodovia a usar o macadame como base/revestimento no Brasil: a Estrada União e Indústria, interligando a cidade imperial a Juiz de Fora. Ela é fruto da concessão do Decreto Imperial 1.031, de 7 de agosto de 1852, feita a Mariano Procópio Ferreira Lage, que estava à frente da organização da Companhia União Indústria, a qual tinha como principal finalidade a construção e exploração de estradas de rodagem (Prego, 2001). Sua construção foi iniciada em 12 de abril de 1856, em evento que contou com a presença de Pedro II. 36 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto “Mariano Procópio, que havia visitado a Europa e os Estados Unidos, contratou engenheiros franceses e técnicos alemães, para a execução de seu empreendimento, conseguindo construir uma estrada que, na época, se igualava às melhores do mundo.” (Prego, 2001) Considerada um marco na história do rodoviarismo brasileiro, a estrada de 144 km foi inaugurada no dia 23 de junho de 1861, também com a presença do ilustre personagem, o imperador, que percorreu toda a rodovia até a cidade mineira. Construída em cinco anos, com mão de obra de colonos alemães moradores de Petrópolis, a rodovia foi pavimentada pelo método criado por John Loudon McAdam, com revestimento de betume. “Para a época as condições técnicas da União e Indústria eram simplesmente espetaculares, pois basta dizer que, ainda hoje, integra vários trechos da ligação Petrópolis-Juiz de Fora”, destaca Silva Prego, transcrevendo um trecho da revista Rodovia (mar/abr, 1938, ano 1), que fala sobre essa via, chamada de “a rainha das estradas de rodagem brasileiras” e que hoje integra a BR-040. “Cerca de 90 anos depois, em pequenos subtrechos de alargamentos, para superlarguras de melhorias de curvas, Foto de Revert Henrique Klumb, reproduzida de Álbum da Estrada União e Indústria, oganizado por Pedro Vásquez, 1997 Os primórdios da indústria do asfalto | 37 foi possível ao DNER averiguar que o macadame, em boas condições, incluía brita passando em 5” de malha quadrada.” A indústria petrolífera avança mundo afora Em 1888, no Peru, exploradores ingleses anunciam os primeiros descobrimentos comerciais de petróleo na América Latina. Nos Estados Unidos, John D. Rockefeller, que em 1870 havia criado a Standard Oil Company, dominaria a florescente indústria petrolífera logo nas primeiras décadas. Em 1890 é fundada a companhia holandesa Royal Dutch Petroleum Company. Sete anos depois, no Reino Unido, aparece a Shell Transport and Trading Company, que se uniria à petrolífera holandesa em 1907 para formar a Royal Dutch Shell. Antes do findar do século, em 1896, o engenheiro alemão Rudolf Diesel patenteia o motor a combustão, que, com muitas modificações, ainda faz referência a seu nome. O início do século XIX (1901) seria marcado pelo maior boom da história do petróleo, quando um poço alcança a produção de 100 mil barris por dia (bpd) em Spindletop/EUA. Começa a corrida ao ‘ouro negro’ no Texas, evento que mudaria completamente essa indústria. No encerramento do século é criado, em São Paulo (1899), o Gabinete de Resistência dos Materiais, que produziria a primeira compilação de ensaios para avaliação da qualidade e resistência dos materiais na construção civil, denominado Manual de resistência dos materiais. Este Gabinete seria as raízes de uma das mais importantes instituições técnicas do país, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Automóveis na pista No Brasil, ainda trilhamos caminhos. No início do século XX, contabilizava-se, segundo Silva Prego, cerca de 500 km de estradas com macadame hidráulico ou variantes desta técnica. Eram rodovias com tráfego ainda reduzido, todos de veícu- los de tração animal, mas que se tornariam impróprias para as viaturas a motor, as 38 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto quais começavam a chegar ao país. Já nos Estados Unidos, começava a produção dos primeiros derivados: 10 mil toneladas de asfalto são produzidas em 1902, a partir do refino do petróleo extraído na Pensilvânia. O primeiro automóvel foi trazido ao Brasil pelo aviador Alberto Santos Dumont, em 1891, no navio de luxo Portugal, que atracou em Santos. Tratava-se de um Peugeot, com motor Daimler, movido a gasolina e dois cilindros em V e 3,5 cavalos de potência máxima. O veículo ficou a maior parte do tempo na garagem da casa da família, em São Paulo, devido à precariedade das ruas, que demandava obras de engenharia. Enquanto Dumont guardava o carro na garagem, outro pioneiro, no Rio de Janeiro, circulava em um veículo movido a vapor, de 8 cilindros em V e 4 cavalos de potência: o farmacêutico, jornalista e ativista político José do Patrocínio. Ele havia importado da França o automóvel criado por Leon Serpollet. O barulhento carro, que espantava os transeuntes nas ruas cariocas, mesmo à velocidade de 3 km por hora, acabou protagonizando o primeiro acidente auto- mobilístico do país. Patrocínio decidiu ensinar o poeta Olavo Bilac a dirigir o veículo, até que este, na estrada da Tijuca, perdeu o controle do carro, atingiu e derrubou uma árvore, caindo em um barranco. Ambos saíram ilesos, mas o automóvel foi dado como perdido.[7] 7 Disponível em: http://amigosvelozes.blogspot.com.br/2013/06/olavo-bilac-o-primeiro-navalha.html; http://www.transitobr.com.br/index2.php?id_conteudo=141; http://www.osintrocaveis.com.br/index. php?pagina=curiosidade-historia-automovel-brasil Santos Dumont em seu veículo Peugeot Os primórdios da indústria do asfalto | 39 Em 1893 é criado o Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, em substituição à Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, que atuou por mais de 30 anos (Gabler, 2012). Começam então a surgir leis regulamentando o uso de automóveis nas ruas. Em São Paulo, onde o prefeito Antônio Prado institui regulamentações e taxas para os veículos, o mau estado das vias é questionado por Santos Dumont, que pede isenção da taxa. No ‘bate boca’ com a prefeitura, Dumont acaba perdendo a licença e a placa P-1, que acabaria no carro de Francisco Matarazzo. O número de carros cresce. São Paulo, que em 1903 tinha quatro veículos licenciados, somaria 83 carros no ano seguinte, quando o prefeito cria o exame para motoristas. No Rio, a prefeitura inicia o licenciamento de carros em 1903, realizando, três anos depois, o primeiro exame de motoristas. No mesmo ano, em São Paulo, onde havia seis veículos licenciados, é imposto o limite de velocidade: 30 km por hora. Macadame nas ruas Inaugurada em 1891, projetada pelo engenheiro Joaquim Eugênio de Lima, a Avenida Paulista, com sua grandeza, já sinalizava sua vocação de futuro símbolo da cidade. Apedregulhada em 1894, foi beneficiada em 1903 com a colocação de maca- dame em seu leito, sendo a primeira via pública asfaltada e arborizada de São Paulo. “Possuía três vias separadas por fileiras de magnólias e plátanos e era ladeada por imensos lotes onde foram sendo erguidos os palacetes que a caracterizaram até por volta de 1970.” [8] No Rio de Janeiro, o paulista Francisco de Paula Rodrigues Alves, no dia 15 de novembro de 1902, ocasião de sua posse na presidência da Velha República, anuncia a execução de uma grande reforma urbana para “regenerar” a capital do 8 Ver em: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/1900.php. 40 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto país. [9] Motivada por uma série de fatores, a chamada ‘Grande Reforma Urbana de 1903’ foi dividida em duas intervenções urbanísticas distintas, ficando um conjunto de obras sob a responsabilidade do Governo Federal, e outro atribuído ao Governo Municipal carioca. O engenheiro Paulo de Frontin dá início à abertura da Avenida Central (hoje Av. Rio Branco) no ano de 1904, quando também se iniciam as obras do Porto do Rio de Janeiro. Essa reforma do Distrito Federalimplicaria o calçamento asfáltico de grande escala na cidade do Rio de Janeiro, utilizando o asfalto natural de La Brea (CAN),[10] de Trinidad e Tobago. Uma das obras criaria um dos principais cartões-postais do país: as avenidas que margeiam a enseada de Botafogo. “A abertura de uma avenida que beirasse a orla da Baía de Guanabara sempre esteve nos planos do prefeito Francisco Pereira Passos. Já em princípios de 1903... Entretanto, como o orçamento da prefeitura estava em contados 40$000 contos de réis, e que deveriam dar 9 Discurso de posse de Rodrigues Alves realizado em 15 de novembro de 1902. In: Anais da Assembleia Legislati- va do Estado do Rio de Janeiro. 10 O cimento asfáltico natural recebe o símbolo de CAN. Ver: http://iseibfacige.com.br/biblioteca/wp-content/ uploads/2013/05/Materiais-Betuminosos.pdf. Avenida Cerntral, no Rio de Janeiro, 1910 (foto de Marc Ferrez) Os primórdios da indústria do asfalto | 41 para obras em quarenta e cinco outros logradouros da cidade, fora a abertura de novas vias, mandou o prefeito executar a avenida Beira Mar por partes, que ficaram prontas em épocas distintas. Seria um avanço de 33 metros sobre a orla original da cidade, começando a nova artéria na Rua de Santa Luzia, ao lado da serraria do prefeito, e terminando na Praia de Botafogo, junto ao Morro do Pasmado. Num pequeno trecho ela não margearia o mar, exatamente em volta do Morro da Viúva, fazendo-se a ligação da Praia do Flamengo com Botafogo por uma via interna, a qual, na falta de um nome melhor, ganhou o de ‘Avenida de Ligação’. Desde 1917 a mesma se chama Oswaldo Cruz, em homenagem ao famoso médico sanitarista que residia na Praia de Botafogo. Como em 1903 o bairro de Botafogo era um dos mais importantes da cidade, haja vista o enorme número de personalidades que ali residiam, a orla do bairro teve um destaque especial, sendo ali abertas três pistas: duas com piso de asfalto, para automóveis; e uma de areia, para cavalos, bem como a construção de jardins floridos, dois teatros de marionetes, um pavilhão de regatas e um pavilhão restaurante, este último, junto com um de teatrinhos, colado no Morro do Pasmado, e funcionando como um fechamento visual da avenida... Avenida Beira-mar, no Centro do Rio de Janeiro, vista do antigo Palácio Monroe, antes da construção da praça Paris, 1906 (foto de Augusto Malta) 42 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Os aterros foram realizados com entulho das demolições efetuadas por toda a área central da cidade, bem como alguma terra do Morro do Senado. Entretanto, a primeira parte da avenida a ficar pronta foi a orla de Botafogo, seguida pela Lapa e por último Flamengo e Avenida de Ligação. No mesmo dia em que o Presidente Rodrigues Alves inaugurava a Avenida Central, a 15 de novembro de 1905, era inaugurada a orla de Botafogo, já com a muralha em pedra, os jardins e pavilhão de regatas prontos. Somente a 15 de novembro de 1906 foi inaugurada a avenida do Centro a Botafogo, com uma ‘carreata’. E nesta época foi inaugurada a Av. Beira Mar pavimentada com asfalto importado da Ilha Trinidad. No ano de 1907, o Prefeito Souza Aguiar inaugurou o Pavilhão Mourisco, junto ao Morro do Pasmado, exatamente, onde hoje está uma passarela de ferro junto ao moderno Centro Empresarial Mourisco.”[11] 11 O Centenário da Avenida Beira Mar em Botafogo, de autoria do Prof. Milton Teixeira, em: http://amabotafogo. org.br/historia/centenario. Avenida Beira-mar, em Botafogo, 1906 (foto de Augusto Malta) Os primórdios da indústria do asfalto | 43 O combustível do rodoviarismo No ano em que é inaugurada uma das principais obras da primeira década do século XX, ocorre a primeira tentativa de viagem Rio-Petrópolis de automóvel, por iniciativa de José Maria da Silva Paranhos Júnior, jornalista, historiador e diplomata brasileiro, mais conhecido como Barão do Rio Branco. Ministro das Relações Exteriores de 1902 a janeiro de 1912 (mantido no cargo por quatro presidentes), ele aventou a possibilidade de se construir uma estrada do Rio de Janeiro até Petrópolis exclusivamente para automóveis, projeto que só se tornaria realidade em 1922, dez anos após sua morte. Em 25 de outubro de 1906, Santos Dumont sobrevoa Paris com o 14-Bis, tornando-se o primeiro homem a tripular um veículo mais pesado que o ar. No dia 27 de setembro de 1907, inaugura-se o Automóvel Clube do Brasil (ACB), com sede no Rio de Janeiro, instituição idealizada pelo aviador. Em São Paulo, no ano de 1908, é criado o curso de engenheiro-arquiteto da Escola de Engenharia Mackenzie College. Na França, por iniciativa do governo da- quele país, realiza-se o Premier Congrès International de la Route (I Congresso Mundial de Estradas), que se constituiria um novo marco no rodoviarismo. Desde 1908, realiza-se a cada quatro anos, pela L’Association International Permanente des Congrès de la Route (AIPCR), em diferentes países, inclusive no Brasil. Esse evento é um dos principais foros de debates daqueles que se dedicam à construção, consolidação e atualização da indústria mundial de asfalto. No mesmo ano, Henry Ford e o engenheiro Harold Wills lançam nos Estados Unidos o carro Ford modelo T, sem imaginar que além de popularizar definitivamen- te o automóvel — foram produzidos mais de 17 milhões apenas deste modelo — e criar as bases da indústria automotiva, estabeleceriam um novo paradigma para a construção de rodovias. Enquanto isso, a indústria petrolífera cartelizada é reestruturada nos Estados Unidos, onde, por ordem da Suprema Corte daquele país, em 1911, a Standard Oil Trust, de John D. Rockefeller, é dividida em várias empresas — e estas continuam poderosas até hoje. As operações de ultramar ficam a cargo da Standard Oil New Jersey (Exxon). 44 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Outras novas companhias, como a Standard Oil New York (Mobil), a Standard Oil California (Chevron), a Standard Oil Indiana (Amoco) e a Standard Oil Ohio (agora parte da BP America), investem no mercado norte-americano. Em 1911, pela primeira vez na história, as vendas de gasolina para automóveis ultrapassam as de querosene naquele país. A Venezuela extrai seu primeiro petróleo em 1912, sob exploração dos in- gleses. No Brasil, os carros ditam necessidades. O “paulista de Macaé”, Washington Luís Pereira de Souza, um dos fundadores do Automóvel Clube de São Paulo, no início da década de 1910, então secretário estadual de São Paulo, percorre as es- tradas paulistas, traçando os primeiros projetos para a melhoria de suas rodovias e implantação de um plano rodoviário estadual, considerando a frota de automóveis em expansão. Obras financiadas pelas exportações de café, insumo responsável pela riqueza galopante do estado. Começava uma ‘mudança’ na visão do governo, que até então vinha investindo no modal ferroviário. Com a difusão do uso de automóveis, reforça-se a demanda de uma via propícia a veículos entre a planície e o planalto paulista (onde está a capital). Washington Luís, então deputado estadual, teria pressionado o presidente (governador) recém-eleito do estado de São Paulo, Rodrigues Alves (que encerrara o mandato de presidente da República), para pavimentar a Estrada do Vergueiro, a qual é macadamizada em 1913, abrindo-se para o tráfego de automóveis. Na Câmara dos Deputados, Alves destaca a importância de construir estradas, obra que se tornaria lema central de seus governos: Sede do Automóvel Club, no Rio de Janeiro (acervo Automóvel Club) Os primórdios da indústria do asfalto | 45 “As estradas aproximam os centros produtores dos centros consumidores, valorizam as terras que atravessam, tornam baratos os produtos que exploram e trazem a facilidade de comunicação para correios e escolas!” (Fonseca, 1920) Nessa mesma década, nos Estados Unidos, William Merriam Burton desen- volve um dos primeiros processos de craqueamento térmico (1912), operando a 700-750° F (370-400°C) e a uma pressãoabsoluta de 90 psi (620 kPa). O método fica conhecido como o processo Burton. Nove anos depois, em 1921, C.P. Dubbs, funcionário da Universal Oil Products Company, estabelece novo processo operando em 750-860° F (400-460°C), que seria utilizado por muitas refinarias até o início dos anos 1940, quando o craqueamento catalítico entrou em uso.[12] Em São Paulo, avançam as pesquisas das propriedades de cimentos de fabri- cação nacional e da dosagem e confecção de concreto, com a criação, em 1926, do Laboratório de Ensaios de Materiais (LEM) pelo engenheiro Ary Frederico Torres. O LEM abriria caminho para a fundação de uma primeira fábrica moderna de cimento Portland do Brasil, além de contribuir para grandes obras de engenharia, como o Edifício Martinelli, primeiro arranha-céu do Brasil. Também deu suporte tecnológi- co às grandes empresas ferroviárias do Estado de São Paulo e do país — São Paulo Railway, Paulista, Mogiana, Sorocabana e, no Rio, a famosa Estrada de Ferro Central do Brasil. Governar é construir estradas A crescente demanda por ruas pavimentadas e também por combustíveis para os veículos atrai as primeiras petrolíferas para o Brasil: a Shell Mexican Petroleum (for- mada em 1919 pela companhia inglesa, quando assumiu o controle da Mexican Eagle Petroleum Company) e a norte-americana Standard Oil Company California (Chevron). 12 U.S. Supreme Court Cases & Opinions, v. 322, Universal Oil Products Co. V. Globe Oil & Refining Co., 322 U. S. 471 (1944). 46 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto A disseminação do uso de veículos a motor e a necessidade de se repensar as vias para uso dos automóveis já haviam levado o governo, em 1916, a promover o I Congresso Nacional de Estradas de Rodagem no Rio de Janeiro. Na sessão de aber- tura, segundo Silva Prego, o ministro da Viação e Obras Públicas Augusto Tavares de Lira teria afirmado: “...sem estradas de rodagem, os automóveis se reduziriam a simples objetos improdutivos e as estradas de ferro, artérias sem veias...” Em 1917, o país tinha em torno de cinco mil automóveis em circulação, 90% dos quais, na capital federal e em São Paulo. Dois anos depois, em 1919, a Ford Motor Company se instala no Brasil, sendo o primeiro projeto o famoso modelo T, aqui carinhosamente apelidado de “Ford Bigode”. No ano seguinte começariam a ser montados também os primeiros caminhões Ford. Em 1919 é fundado o Asphalt Institute, nos Estados Unidos, instituição pio- neira no segmento. É nesse ano que se realiza o segundo congresso de estradas de rodagem, em São Paulo, sempre incentivado por Washington Luís. Ele seria eleito presidente/governador do estado de São Paulo em 1920, com o lema “Governar é construir estradas” (Egas, 1924). Na realidade, ele parafraseia o ex-presidente Afonso Pena (1906-1909), que afirmava que ‘governar é povoar’. “O Estradeiro”, como Washington Luís foi apelidado, preconizava: “Governar é povoar; mas, não se povoa sem se abrir estradas, e de todas as espécies; governar é, pois, fazer estradas!” Em seu mandato, que durou até 1924, ele colocou em prática a política de de- senvolvimento rodoviário debatida nos congressos, dando início a um período intenso de obras rodoviárias no estado paulista. Durante seu mandato acontece a Semana de Arte Moderna e a pavimentação da rodovia Caminho do Mar (ambos, em 1922). No ano de 1926 é criada a Diretoria de Estradas de Rodagem de São Paulo (DER). Nessa época, no Nordeste, a Inspetoria de Obras contra a Seca construiria cerca de 2.500 km de estradas carroçáveis, para garantir maior mobilidade aos seus Os primórdios da indústria do asfalto | 47 inspetores. De acordo com Silva Prego, “até 1924, os únicos estados que possuíam algumas estradas de rodagem, dignas desse nome, eram São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais e, de certo modo, Rio de Janeiro”. Em 1925, outra montadora ingressa no país: a norte-americana General Motors, com capacidade inicial para montar 25 carros por dia, contabilizou no final do ano quase 5.600 veículos vendidos, o que a obrigou a aumentar a capacidade de produção diária para 40 veículos.[13] Somente em 1930 a GM mudaria para São Caetano do Sul, no chamado ABC onde permanece até hoje. Em 1926, eleito presidente da República, o ‘estradeiro’ daria continuidade à política de expansão das rodovias. “No período de 1925-1926 é executada, no trecho da Serra, a pavimentação em concreto de cimento da Rodovia Santos-São Paulo, an- tigo Caminho do Mar” (Prego, 2001). Ela se tornaria a primeira via da América Latina destinada a veículos de motor a explosão a receber esse tipo de pavimentação. A Caminho do Mar, conhecida hoje como Estrada Velha de Santos, constitui-se em um patrimônio histórico, turístico e ambiental, por cortar a Serra do Mar. 13 Ver em: http://www.osintrocaveis.com.br/index.php?pagina=curiosidade-historia-automovel-brasil. Ford é a primeira indústria automotiva a se instalar no Brasil (Banco de Imagens Ford — www.ford.com.br) 48 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Bases para um plano rodoviário No mesmo ano, é inaugurada a Estrada do Automóvel Clube do Brasil (atual RJ-085), interligação entre Rio e Petrópolis, cortando a Baixada Fluminense e incorporando a antiga estrada Serra da Estrela, com 6,00 m de leito, sarjetas de 0,75 m e revestimento de areia e barro. É construída com recursos levantados pelos associados do Automóvel Clube do Brasil (ACB). Na realidade, esse órgão idealizado por Santos Dumont tem forte atuação durante as primeiras décadas do século XX em prol do rodoviarismo, promovendo eventos como os congressos nacionais e internacionais de estradas de rodagem. Em um desses eventos, realizado em 1926, é aprovado o Primeiro Plano Geral para a Base da Rede Rodoviária do Brasil, no qual já constava a Rio-Bahia. Em 1927, por meio do decreto n. 5.141, de 5 de janeiro de 1927, cria-se o Fundo Especial para Construção e Conservação de Estradas de Rodagens Federais, para financiar o desenvolvimento rodoviário do Brasil. No ano seguinte, surgiria a Polícia Rodoviária Federal. Entre 1927 e 1928, Washington Luís também concluiria a rodovia Rio-São Paulo (Prego, 2001), iniciada durante seu mandato como governador do estado de Monumento rodoviário na antiga Rio-São Paulo — 1939 Os primórdios da indústria do asfalto | 49 São Paulo. Inaugurada em 5 de maio de 1928, a obra considerada na época de difícil realização, foi a primeira rodovia a ligar as duas capitais. Considerada “um marco inicial da nova política rodoviária” (Prego, 2001), ela reduziu para apenas 14 horas uma viagem que o aventureiro francês Conde Lesdain, em 1908, havia levado 33 dias, percorrendo mais de 700 km. Seria a única ligação entre as duas cidades por mais de 20 anos, até a inaugu- ração, em 1950, da rodovia Presidente Dutra. Em 25 de agosto de 1928, Washington Luís inaugura a rodovia Rio-Petrópolis, apontada como a primeira rodovia asfaltada do país, considerada por muitos anos como uma das melhores rodovias da América do Sul.[14] Em 1929, o estado de São Paulo cria o IPA (Instituto Paulista de Arquitetos) e no mesmo ano, nos Estados Unidos, é utilizada pela primeira vez a mistura de agregados com asfalto. A Venezuela, em 1929, torna-se o segundo maior produtor de petróleo do mundo, depois dos EUA. E os franceses buscam recuperar o tempo perdido, criando, em 1924, a Compagnie Française des Pétroles (CFP), constituída sob a égide do governo francês para assumir seus interesses no Iraque. A era do presidente estradeiro termina em outubro de 1930, quando, após apoiar Júlio Prestes para sucedê-lo, acaba sendo deposto pelos ministros militares que entregam a presidência a Getúlio Vargas no dia 3 de novembro de 1930. Uma nova etapa No início da década de 1930, há uma desaceleração no rodoviarismo, com a extinção da Comissão de Estradas de Rodagem Federais, criada por Washington Luís em 1927. É repassada à Inspetoria de Obras Contra a Seca a tarefa de elaborar o planejamento das estradasfederais, quando são estabelecidos sete troncos rodo- viários e 50 linhas subsidiárias, sujeitas a seca no Nordeste (Prego, 2001). 14 Ver: http://blogdopetcivil.com/2010/11/23/nova-rodovia-rio-petropolis-e-video-incrivel-sobre-o- projeto/ 50 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto A essa malha seria mais tarde interligada a Rio-Bahia, que hoje integra a BR 116, uma das principais rodovias brasileiras da atualidade — e a maior rodovia totalmente pavimentada no território nacional; é longitudinal, com início na cidade de Fortaleza (CE) e término na cidade de Jaguarão (RS), fronteira com o Uruguai. Os anos 1930 trazem boas surpresas. No Rio, em 1931, após nove anos de obras, é inaugurada aquela que se tornaria uma das novas maravilhas do mundo: a estátua do Cristo Redentor, concebida pelo engenheiro brasileiro Heitor da Silva Correio Paulistano — maio de 1930 — aniversário de dois anos da rodovia que interligou as duas principais capitais do país Os primórdios da indústria do asfalto | 51 Costa e construída em parceria com o escultor Paul Landowski e o engenheiro Albert Caquot, ambos franceses. Dois anos depois, funda-se no Rio de Janeiro o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea). São criados, ainda, pelo governo, o Serviço Geológico e Mineralógico Brasileiro (SGMB), em 1933, e o Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), em 1934. Em São Paulo, o Laboratório de Ensaios de Materiais (LEM) é transformado por Ary Torres, em 1934, no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), que teria uma participação estratégica no projeto e na construção das primeiras autoestradas brasileiras, como a Via Anchieta, a Anhanguera e outras. Nessa mesma década surge o Laboratório Estadual de Pesos e Medidas (primórdios do atual Ipem), responsável pela metrologia no estado de São Paulo. No final de 1936, realiza-se o VI Congresso Nacional de Estradas de Rodagem, promovido pelo Automóvel Clube do Brasil, no qual se adota o DER de São Paulo como o foro ideal para se concentrar estudos e informações relevantes “cuidando da uniformização das especificações fundamentais e da terminologia rodoviária” (Prego, 2001). No mesmo evento, recomendam-se aos governos, nas três esferas, “estudos e experiências de pavimentação e exploração de rochas asfálticas brasi- leiras, seguindo [...] ensaios e pesquisas feitos pelo IPT”. “É enfatizado o emprego de asfalto dissolvido, a partir do asfalto de penetração 100, em partes iguais com gas oil, em substituição ao road oil, nos tratamentos superficiais e no macadame por penetração, feitos com asfalto do mesmo tipo empregado na construção do respectivo pavimento, mas dissolvido com 30% de gas oil, em substituição à pintura de asfalto puro.” (Prego, 2001) Ainda em 1936, Monteiro Lobato lança O escândalo do petróleo, acusando o governo Vargas de “não perfurar e não deixar que se perfure”. O livro esgotou vá- rias edições em menos de um mês (Lobato, 1936). Censurado em 1937 por Getúlio Vargas, Lobato continua no tema de forma disfarçada, em O poço do Visconde, obra infantil na qual afirma “ninguém acreditava na existência do petróleo nesta enorme 52 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto área de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, toda ela circundada pelos poços de petróleo das repúblicas vizinhas”. Monteiro Lobato preconizava o potencial brasileiro para a exploração petro- lífera, já percebida por outros empreendedores. “O engenheiro Manuel Inácio Bastos, em 1930, começa a investigar a lama preta, oleosa, com que os moradores da região de Lobato, na Bahia, iluminavam suas casas, em substituição ao querosene. Após enviar amostras para o Rio de Janeiro e sem obter respostas Bastos procura o presidente da Bolsa de Mercadorias baiana, Oscar Cordeiro, e com ele formou uma sociedade para explorar as ‘jazidas’. Em 1939 são encontrados os primeiros vestígios de que o líquido preto era petróleo. Começa, então, uma enorme disputa acirrada entre setores ligados ao presidente Getúlio Vargas contra as empresas estrangeiras de perfuração de jazidas e geólogos afirmam que é impossível que naquela região fosse encontrado petróleo.” (Fausto, 1975) O DNER O ano de 1937 seria marcado por dois fatos importantes, que consagrariam a formação de uma indústria brasileira de asfaltos. Em julho, Vargas promulga a Lei n. 467, criando o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), subor- dinado ao Ministério de Viação e Obras Públicas. “Nasce o DNER equiparado a qualquer repartição federal, sem garantia de recursos e autonomia administrativa, impossibilitado, portanto, de impulsionar a expansão das rodovias brasileiras, mas, em 1938, ocorre a primeira aquisição de equipamento mecânico.” (Prego, 2001) Os primórdios da indústria do asfalto | 53 A despeito disso, nos anos que se seguiram o DNER conquista seu espaço e notoriedade pelas obras que realiza. Faz a pavimentação em concreto da estrada Itaipava-Teresópolis e o revestimento betuminoso nas estradas Areais-Caxambu, União e Indústria. Iniciaria a construção da Estrada de Rodagem Rio-Bahia em 1936 (BR-4) e a Rio-Porto Alegre (BR-2). “O empreendimento seria surpreendido por uma medida do governo argentino que proibiu a reexportação de petróleo, inviabilizando o esquema de recebimento de matéria-prima da empresa. Foi a partir daí que um grupo de empresários uruguaios começou a se articular para montar uma refinaria de petróleo no sul do país. Brasileiros, argentinos e uruguaios encontraram uma estreita faixa de terra entre o oceano e a Lagoa dos Patos e definiram que este seria o local ideal para instalar uma refinaria. O terreno deveria preencher uma série de requisitos: ter uma área entre 10 e 12 hectares, fácil ligação com o porto da cidade, com a linha de viação férrea, com a rede de água potável, com a rede elétrica e ter possibilidade de acesso rodoviário ao Centro da cidade. Refinaria da Ipiranga S/A — Companhia Brasileira de Petróleo, inaugurada em 1937 54 | Abeda: 50 Anos na Estrada do Asfalto Começava ali a árdua tarefa do aterro. Mesmo num tempo em que não existiam guindastes ou solda elétrica, o projeto foi executado com extrema rapidez. E no dia 07 de setembro de 1937 era inaugurada a Ipiranga S/A — Companhia Brasileira de Petróleo (atual Refinaria de Petróleo Rio-grandense S/A).” [15] Em 1938, Getúlio Vargas cria o Conselho Nacional de Petróleo (CNP), pelo Decreto-lei n. 395, de 29 de abril de 1938. No mesmo ano, inicia-se uma campanha de perfuração de poços na Bahia, o que resultaria na primeira descoberta de petróleo na região de Lobato, em Salvador, no início de 1939: “O ministro da Agricultura, Fernando Costa, anunciou em 21 de janeiro de 1939 a descoberta de uma jazida de petróleo em Lobato, bairro da capital baiana. Segundo o telegrama enviado pelo engenheiro Custódio Braga Filho, encarregado da sondagem, quando a perfuração do poço atingiu 208 metros, gotas de óleo começaram a aparecer pouco a pouco, até formar uma poça considerável na superfície. Foram recolhidos 70 litros de petróleo bruto. A descoberta foi um marco histórico. Até então manchas de óleo só chegavam até a boca dos poços perfurados na cidade de Bofete, São Paulo. Naquela época, em que o Brasil dava os primeiros passos para extração petrolífera, engenheiros e geólogos concordavam que em Lobato estava o início de um vasto lençol, o qual se prolongaria até Itaparica. A sondagem na Bahia fora iniciada um ano antes, com a sonda Calix IR BRF-1. Em 1941, um dos poços perfurados deu origem ao campo de Candeias, no Recôncavo baiano, o primeiro a produzir petróleo no Brasil. 15 Ver: http://www.refinariariograndense.com.br/refinaria/Pages/refinaria/historia/historia.aspx. Os primórdios da indústria do asfalto | 55 O general Horta Barbosa, presidente do Conselho Nacional do Petróleo, explicou que a região faz parte da Província Petrolífera do Nordeste, que abrange, além da Bahia, os estados de Pernambuco,
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