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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES CÊNICAS GLEISON AMORIM DA SILVA O PROFESSOR-PERFORMER E A PERFORMANCE EDUCACIONAL: Uma política de resistência, escrituras e desvelamentos em Desmontagem Cênica NATAL/RN 2018 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART Silva, Gleison Amorim da. O professor-performer e a performance educacional : uma política de resistência, escrituras e desvelamentos em desmontagem cênica / Gleison Amorim da Silva. - 2018. 110 f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Natal, 2018. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Naira Neide Ciotti. 1. Performance. 2. Professor-performer. 3. Desmontagem cênica. 4. Artista Latino Americano e Coletivo de Teatro. 5. Experimento Artístico-Pedagógico Performativo. I. Ciotti, Naira Neide. II. Título. RN/UF/BS-DEART CDU 792 Elaborado por Gleison Amorim da Silva - CRB-X GLEISON AMORIM DA SILVA O PROFESSOR-PERFORMER E A PERFORMANCE EDUCACIONAL: Uma política de resistência, escrituras e desvelamentos em Desmontagem Cênica Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Artes Cênicas. Área de concentração: Artes Cênicas. Linha de Pesquisa Interfaces da Cena: Políticas, Performances, Cultura e Espaço. Orientação: Drª. Naira Neide Ciotti NATAL/RN 2018 Universidade Federal do Rio Grande do Norte PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES CÊNICAS ATA Nº 9 Aos seis dias do mês de agosto de 2018, às quatorze horas, reuniu-se a Banca Examinadora composta pelos professores doutores: Naira Neide Ciotti (Presidente (PPGArC/UFRN), Marcílio de Souza Vieira (Membro Interno - PPGArC/UFRN) e Fabio Guilherme Salvatti (Membro Externo à Instituição UFSC), via vídeo-conferência, para a apresentação de Defesa da Dissertação intitulada: Teatralidade Expandida: O professor-performer e a mirada pedagógica como política de montagem e desmontagem cênica., de autoria do discente Gleison Amorim da Silva. Após 20 minutos de apresentação, os professores arguiram seguindo a ordem do convidado externo para o interno e a Banca considerou que o discente respondeu e comentou adequadamente as questões levantadas. Após a arguição a banca retirou-se para deliberar e decidiu que existem alterações estruturais no trabalho que precisam ser realizadas antes da entrega do exemplar final. A banca concluiu que o trabalho atende às exigências de uma Dissertação de Mestrado. Por fim, a banca considerou o trabalho aprovado, sob a condição de que sejam feitas as devidas alterações levantadas pela banca. Não havendo nada mais a registrar, eu, Naira Neide Ciotti, Presidente da Sessão, lavrei a presente Ata que, depois de lida e aprovada, vai assinada por mim, por todos os membros presentes e pelo discente. Dr. FABIO GUILHERME SALVATTI, UFSC Examinador Externo à Instituição Dr. MARCILIO DE SOUZA VIEIRA, UFRN Examinador Interno Dr. NAIRA NEIDE CIOTTI, UFRN Presidente GLEISON AMORIM DA SILVA Mestrando Campus Universitário BR-101 - Lagoa Nova - Natal/RN - CEP 59078-900 Telefax: (84) 99193-6340 • Dedico esta investigação aos estudantes de teatro, artistas de modo geral e aos professores que atravessaram essa trajetória de formação. Aos mestres encontrados no caminho cuja orientação quanto aos processos de resistência, foram decisivos à compreensão de que através da arte encontramos os cenários propícios para nossas políticas. AGRADECIMENTOS Agradeço especialmente à professora-performer, Drª. Naira Ciotti, pela parceria nessa investigação e, sobretudo, na vida, muitas vezes lançando pistas, o que permitiu a compreender o desafio que é vivenciar o mundo acadêmico e artístico; bem como por sua generosidade ao me desafiar no campo da performance, principalmente a pedagógica; Ao programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas - PPGArC/UFRN, por acolher o projeto desta pesquisa e ao fomento (Demanda Social /CAPES) que viabilizou esta investigação tornar-se material. Enriquecido pelas importantes contribuições ao longo do cumprimento das disciplinas que atravessaram o “estado da arte” desta pesquisa: Metodologia da Pesquisa em Artes Cênicas; Seminário de Dissertação I; Poética e Teatro; Seminário de Dissertação II; Tópicos Especiais em Artes Cênicas; Curso de Iniciação à Docência; Epistemologia do Corpo na Arte, ministradas pelos Professores: Drª. Naira Ciotti/ Drª. Karenine Porpino; Dr. Sávio Araújo, Dr. Robson Haderchpek, Drª. Teodora Alves/ Drª. Patrícia Leal; Drª. Naira Ciotti, Drª. Cláudia Rosana Kranz, Drª. Lara Rodrigues, respectivamente. Ao grupo de Pesquisa Cirandar/CNPQ, ao qual estou vinculado por meio da linha de pesquisa: Interfaces da Cena: Políticas, Performances, Cultura e Espaço - por acolher tantos artistas, professores e pesquisadores num mesmo espaço. E ao Laboratório em Performance e Teatro Performativo, vulgo SALA 20, pelas trocas nos projetos/eventos: Reperformar o Afeto: Professores-performers. Enorme gratidão à Atuadora Tânia Farias, da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz e a Terreira da Tribo, por ter proporcionado um contato tão verdadeiro com o Teatro enquanto adolescente e inspirar a vivência como artista e investigador com sua Desmontagem Evocando os Mortos: Poéticas da Experiência (2014). Aos companheiros de turma: César Ferrario, Diocélio Barbosa, Francisco Júnior, Frank Duesberg, Gabriela Gorges, Hianna Camilla, Hilca Honorato, Iane Licurgo, Iego José, Leonardo Palma, Luciano Inácio, Lucivânia Barbosa, Mauricio Barbosa, Milena Lenore, Paul Mailliw, Rodrigo Cesar (Bico), Stephane Louise, Thardelly Pereira e Weller Alves. Aos alunos da disciplina TCC- Espetáculo (curso de Teatro/ DEART/UFRN), que muito contribuíram para a formação durante o estágio e docência no ensino superior assistido pela professora Drª. Naira, cujos conceitos, nesta pesquisa, puderam ser experimentados de maneira hibridizada para o campo expandido da cena. A eles agradeço a formação do coletivo criado durante a disciplina Cia de Menines de Performance Potyguar. Aos estudantes- performers: Abner Souza, Bruno Silva, Éric Medeiros, Guga Medeiros, Pam Dutra, Patrick Cezino; orientação de montagem: Naira Ciotti; escritura cênica: Camila Morais; música: Erhi Araújo; audiovisual: Rita Cavassana, Vicente Martos; fotografia e diagramação visual: André Chacon; iluminação: Laura Figueiredo. Por último, agradeço ao rico e precioso desafio de ser um cidadão ético, estético e político. Experimentar tais valores permitiu a aproximação de diferentes práticas artísticas em diferentes cenários da Latino América. E esse cruzamento de tantas pessoas e vozes em sua coletividade possibilita perceber o real sentido desta construção inacabada, enquanto uma experiência de formação em sua constante busca e insatisfação. Sigo, portanto, reflexionando um estudante ser/estando em Des/montagem! O teatro é uma construção culturalque nasce de valores determinados de acordo com a comunidade onde surge, respondendo a relações sociais específicas, como foram as que operaram em diferentes momentos da história. O teatro que chega da Espanha é o teatro do pai, que veio e se impôs ao teatro da mãe, da América pré-hispânica, gerado em contextos ritualísticos, celebrações, jogo, dança, mascaramento. Essas formas seguem vivas e cruzaram o tempo com uma mitologia que as sustenta e desde onde se constroem acontecimentos únicos, que evocam formas ancestrais da representação. As novas gerações não têm modelos e nossas fronteiras cênicas estão saudavelmente movidas. Há zonas cada vez mais indefinidas e nelas novos espectadores. Miguel Rubio Zapata, 2014. RESUMO Esta pesquisa propõe uma atitude performativa / colaborativa por parte dos leitores e revisa os processos artísticos de gênese que desenvolveram o interesse de atuar com um teatro performático. Nas pistas dos processos, o ponto de vista do espectador é redimensionado, principalmente pela "mestiçagem" de procedimentos com processos pedagógicos, ou performances pedagógicas. Indicando outras possibilidades e modos de agir, e ampliando diferentes revelações corporais nas práticas de grupos de artistas e coletivos na América Latina. A ideia de atuação, especialmente para a atividade pedagógica, é orientada à luz do livro "O professor- performer”, (CIOTTI, 2014), que delineia esses estudos sobre o procedimento artístico-pedagógico na “Desmontagem Cênica” (CABALLERO, 2009). Examinamos o conceito de Desmontagem no contexto da cena estendida (em performance), concluímos com a dimensão das práticas de fragmentação como ação pedagógica, sob um olhar mais pró - ativo, e percebemos que esta pesquisa possibilitou um percurso investigativo e metodológico a partir do momento em que passamos a vivenciá-las como uma experiência de trabalho artístico / pedagógico. Palavras-Chave: Performance, Professor-Performer, Desmontagem Cênica, Artista Latino- Americano e Coletivo de Teatro, Experimento Artístico-Pedagógico Performativo. ABSTRACT This research proposes a performative / collaborative attitude on the part of the readers and revises the artistic processes of genesis that developed the interest of acting with a performance theater. In the process clues, the spectator's point of view is scaled up, mainly by the "mestizaje" of procedures with pedagogical processes, or pedagogical performances. Indicating other possibilities and ways of acting, and amplifying different corporeal revelations in the practices of groups of artists and collectives in Latin America. The idea of acting, especially for pedagogical activity, is oriented in the light of the book "The teacher- interpreter" (CIOTTI, 2014), which outlines these studies on the artistic-pedagogical procedure in “Scenic Disassembly” (CABALLERO, 2009). concept of Disassembly in the context of the extended scene (in performance), we conclude with the dimension of fragmentation practices as pedagogical action, under a more proactive look, and we realize that this research made possible an investigative and methodological course from the moment in which we come to experience them as an experience of artistic / pedagogical work. Key words: Performance, Professor-Performer, Scenic Disassembly, Latin American Artist and Theater Collective, Artistic-Performative Pedagogical Experiment. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Escrituras cênicas, processo criativo 17 Figura 2: Travestimento, criação do corpo grotesco. 18 Figura 3: Escrituras cênicas, processo criativo 19 Figura 4: Escrituras cênicas, processo criativo 20 Figura 5: Segismundo ex Marqués (1993) 29 Figura 6: El Mierdazo (2002), em Buenos Aires/ Coletivo Etcetera 31 Figura 7: As mães da Praça de Maio 32 Figura 8: Testígo de las Ruínas / Mapa Teatro 33 Figura. 9: Teaser Genética Teatral 47 Figura. 10: O Rei Já Era Parará Tim Bum Bum (1979) 51 Figura. 11:. Teatro de rua: mito e criação no Brasil. 53 Figura. 12: Code QR – O Atuador para Terreira da Tribo 55 Figura 13: Desmontagem Evocando os Mortos (2014) 57 Figura 14: As personagens desveladas - Evocando os Mortos 59 Figura 15: Tania atuando Ofélia na peça Hamlet-Machine (1999). 60 Figura 16: Grupo Cultural Yuyachkani (1971), “estou pensando... Estou lembrando...” 62 Figura 17: Cenários do Documentário Persistência da Memória: Grupo Yuyachkani 66 Figuras 18: Performance Rosa Cuchillo (1995) 68 Figura 19: Performance Rosa Cuchillo (1995) 69 Figura. 20: Performance Rosa Cuchillo (1995) 71 Figura. 21: "ser um professor é minha maior obra de arte". 73-74 Figura. 22: Extrato de Processo Patafísico (2017) 76 Figura. 23- 27: Oficina em desmontagem durante o Estágio à Docência (2017) 78 Figura. 28: Code QR – Vestígio de criação Mãe Ubu (Performer Guga Medeiros) 80 Figura. 29: Code QR –Vestígios da montagem UMBUZADA | Um experimento Patafísico (2017) 81 Figura. 30-41: Narrativas das Oficinas Work in progress (2017) 82-85 Figura. 42-57: Descrição do Cenário | Teatro Performativo (2017) 86 Figuras 58 a 71: Interações, intervenções de ubu no espaço | Ações | resultados Obtidos (2017) 88-94 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO PRINCÍPIOS DA PESQUISA A/R/TOGRAFICA EM/SOBRE ARTE DA CENA............................................................................................................................12 1.1 A/r/t – Práticas de um professor-performer.............................................................15 1.2 A/r/t – Um espectador atraído pelos afetos disparados na ação..............................20 1.3 Desmontagem como dispositivo artístico/pedagógico de reflexão.........................22 2. I PARTE | Mirada A DESMONTAGEM CÊNICA COMO PROCEDIMENTO ARTÍSTICO/PEDAGÓGICA DE DESVELAMENTO CORPORAL......................................................................................25 2.1 A Gênese da Desmontagem....................................................................................29 2.2 Cenários Conceituais, Teatralidades e 2.3 Liminaridades......................................35 2.3 Desvelamentos Corporais.......................................................................................42 3. II PARTE | Memória A RESISTÊNCIA NA CONSTRUÇÃO DE ESCRITURAS E PERFORMANCES EM DUAS DESMONTAGENS DE TEATRO NA LATINO AMÉRICA.....................................46 3.1 Teatro Performativo da Terreira da Tribo Oi Nóis Aqui Traveiz: Uma Narrativa Simbólica na Desmontagem Evocando os Mortos | Poéticas da Experiência de Tania Farias (2014)........................................................................................................................................51 3.2 Políticas Utópicas e Memória do Grupo Cultural Yuyachkani: Estudo da Desmontagem Rosa Cuchillo de Ana Correia (1995)...............................................................62 4. III PARTE | Práticas OS DESVELAMENTOS CORPORAIS DA DESMONTAGEM NAS ESTRATÉGIAS DE UM A/R/T – O PROFESSOR-PERFORMER COMO AÇÃO PEDAGÓGICA DE UMA MONTAGEM CÊNICA...........................................................................................................73 4.1 A experimentação do corpo a/r/tografista..............................................................75 4.2 Vivência em Desmontagem com os Performers de Ubu.........................................78 4.3 Narrativas das oficinas Work in Progress...............................................................82 4.4 Leituras Genéticas e Desmontagem no processo de experimentação patafísica Ubu Rei (Umbuzada)........................................................................................................................864.5 Interações e Intervenções de Umbuzada no Espaço................................................88 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................95 6. REFERÊNCIAS .........................................................................................................103 13 1. Introdução | PRINCÍPIOS DA PESQUISA A/R/TOGRAFICA EM/SOBRE ARTE DA CENA ‘Viver a vida de um artista que também é um pesquisador e professor é viver uma vida consciente, uma vida que permite abertura para a complexidade que nos rodeia, uma vida que intencionalmente nos coloca em posição de perceber as coisas diferentemente’. Rita L. Irwin1 A perspectiva da A/r/tografia abordada por Rita Irwin no artigo A/r/tografia: uma mestiçagem metonímica (2008), em que prioriza práticas desenvolvidas por sujeitos artistas, pesquisadores e professores, está fundamentada no acrônimo a/r/t (artist – researcher – teacher / artista – pesquisador – professor)2. Corresponde às três funções que o investigador deverá assumir, complementando sua ação a partir da grafia, termo de origem grega para designar o significado de escrita. A/r/tografia é um conceito atribuído enquanto abordagem metodológica proposta por um grupo de pesquisadores da Faculdade de Educação da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá. Os quais, no enfrentamento diário de suas práticas, a priori, encontram espaços mais performativos para a elaboração de suas pesquisas. A atitude de pesquisa a/r/tografica privilegia diferentes tarefas como de ações artísticas imagéticas ou plásticas, promovendo entre elas um contato híbrido que, em seu corpo teórico, é chamado de mestiçagem. Nesta abordagem para a/r/tografia são vislumbrados diversos campos de atuação com a arte, trilhando caminhos a partir do quanto o a/r/t, transpõe em seus papéis e na vida um compromisso diário com sua comunidade. Não se trata de um método rígido, mas sim, de uma abertura para a hibridização de experiências que ajudaram à ressignificar, durante a dialógica do processo, o significado das experiências produzidas na busca coletiva por outros significados e possibilidades através do: repensando, revivendo e refazendo. (IRWIN, 2004, p. 91-92). A metodologia desta pesquisa foi desenvolvida a partir dos processos hibridizados que possibilitaram trabalhar com a ‘mestiçagem de procedimentos’ (AMALIO, 2009) artístico/poéticos, visto que na a/r/tografia não encontramos e não parece ser seu desejo, estabelecer um método de criação. A mestiçagem a que nos referimos é uma metáfora que 1 A Dr. Rita L. Irwin é uma artista, pesquisadora e professora profundamente comprometida com as artes e educação. Ela é professora de educação artística no departamento de currículo e pedagogia da University of British Columbia in Vancouver, British Columbia, Canada. Rita L. Irwin tem sido uma líder educacional para uma série de organizações nacionais e internacionais, inserida em estudos canadenses para os estudos curriculares da educação através da arte. 2 A partir deste momento da pesquisa passarei a utilizar o acrônimo a/r/t (artist-researcher-teacher), elaborado por Irwin (2008), como maneira de designar o artista/pesquisador/professor, ou como se lêssemos em uma só palavra integrada o artistapesquisadorprofessor. 14 ajudou a desenvolver algo desvelado através de outro, ou seja, atentar para os processos de performances que se esboçassem em um cenário educativo. Os a/r/ts buscaram por melhorias nas políticas educacionais através da Arte Embasada na Pesquisa Educacional Baseada em Arte (PEBA), como perspectiva que amplia nossa compreensão das relações humanas através dos meios artísticos (BARONE; EISNER, 2006, p.95). A PEBA, diferentemente da pesquisa tradicional, opta por uma melhoria de perspectivas a partir de práticas artísticas para estudar eventos educativos. Desta forma, práticas de educadores, artistas e não-artistas tornam-se espaço para investigação podendo variar também as formas de apresentação do projeto por este viés educacional. Pode ser através de percursos artísticos de maneira hibridizada; através das artes numa concepção expandida; no trabalho de agenciamento entre pesquisadores e espectadores; nas pesquisas educacionais que optam por outras formas de compartilhamento que não seja exato ou fechado em si. Criar academicamente é, também, uma prática corporal, que por sua vez, é transfigurada no diálogo, necessário entre os espaços culturais, os grupos e coletivos de nossa cidade. Desenvolvemos assim um percurso mediante a pesquisa-ação que nas últimas décadas desde o século XX, passou a ser amplamente utilizada na perspectiva das pesquisas educacionais no que se refere ao pensamento a/r/tográfico. Nossa tarefa, enquanto pesquisador dos objetivos de estudo e experimentação a partir de uma poética processual, nos levou a trabalhar com estratégias da pesquisa a/r/tografica. E perceber quando as relações contínuas de hibridização contaminaram-se num processo didático entre a realização da produção artística, produção de conhecimento e prática docente como corpus que compõem o a/r/t, assim como constroem o corpo que nela manifesta sua forma qualitativa. Do mesmo modo que se realiza na a/r/tografia, a pesquisa-ação se concentra em melhorar sua prática e compreendê-la para diante dela buscar por outros caminhos e/ou influenciar as experiências de outros. Durante os desafios encontrados no cotidiano da investigação em/sobre arte, fizemos o levantamento de questões que foram propulsoras na procura por estratégias de como superar as dicotomias que vislumbramos para a realização de processos, produtos e tarefas profissionais em que o envolvimento de sua construção se materialize de maneira performativa. Portanto, esta relação a caminho do processo a/r/tografico, impõe uma atitude de pesquisa relacionada com a vivência mais direta com o objeto de estudo, ou seja, prioriza as práticas artísticas de vivências e experimentação. 15 O desenvolvimento da pesquisa-ação torna-se, dessa forma, um organismo vivo. As práticas de artistas e educadores se hibridizam e tornam-se objetos de investigação em que intencionamos uma atitude de pesquisa aberta a outras formas. Diferentemente da perspectiva da ciência tradicional, nos voltamos aos processos diversos entre a educação e a produção artística na construção do pensamento de pesquisadores tendo em vista a experiência. Enquanto experiências estéticas integradas na ação do a/r/tografista, apontamos pelo menos três formas de pensamento (para o artista, para o professor e para o pesquisador), reconhecendo sua estreita necessidade de experimentação em diferentes contextos. Por sua vez, no espaço das fissuras hibridizadas reconhecemos também, em cada papel, a importância de suas estratégias e especificidades nas formas de quer-fazer, ou seja, o relacionamento constante com seu corpo e sua cultura. A partir do uso desta abordagem para o a/r/t, dissertações de mestrado e teses de doutoramento vêm sendo defendidas em diversas universidades do mundo, nas quais a elaboração visual se dá simultaneamente ao registro escrito. Dada sua ênfase às questões da visualidade, cabe aqui o seguinte questionamento: quais seriam as proposições possíveis da a/r/tografia para uma pesquisa (educacional) em artes da cena? Para tentar responder à questão supracitada, buscamos por estratégias cênicas para dar forma ao percurso de nossas trajetórias. Como exercício inicial reconhecemos que as universidades, os fóruns, as mostras vêm produzindo espaços para novas aparições e intervenções de jovens artistas, coletivos de criação e ‘professores-performers’ (CIOTTI, 2014) a se manifestarem no cenário de São Paulo, Ceará, Paraíba, Macapá e Pernambuco. Por isso,nos juntamos ao projeto Reperformar o Afeto: professores-performers (2016- 2018) 3, que visa criar uma rede de colaboração entre pesquisadores de diversas regiões do Brasil e também do exterior. Compartilhamos o significado de investir no trabalho de inovação pedagógica das artes cênicas notadamente a partir do conceito de professor- performer (CIOTTI, 2014), que, nesta pesquisa, tem conotação semelhante ao trabalho desenvolvido por um a/r/t. Enquanto professor-performer, muitas considerações provindas do 3 Este projeto é composto por: Núcleo de Estudos Colabor, Grupo de estudos ligado a emergências e artes colaborativas da USP; Prof. Dr. Antonio Wellington de Oliveira Jr., Professor Associado II - ICAUFC, Coordenador do PPGCOM-UFC, Líder do Laboratório de Investigação em Corpo, Comunicação e Arte - LICCA, e o Grupo de Pesquisa Salvaguarda e Comunicação Museológica na Amazônia Brasileira com a pesquisadora Cristiana Nogueira Menezes Gomes, da Universidade Federal do Amapá, em Macapá e o professor Artur Matuck, líder do Grupo de Pesquisa COLABOR Centro de Pesquisas em Linguagens Digitais, da Universidade de São Paulo. Integrantes: Naira Neide Ciotti - Coordenador / Artur Matuck - Integrante / Vicente Martos Moreira - Integrante / Antonio Welligton de Oliveira Jr. - Integrante / Frank Duesberg - Integrante / Rita Tatiana Cavassana - Integrante / Cristiana Nogueira - Integrante / Gleison Amorim - Integrante / Hikel Brawn - Integrante / Mauricio Barbosa - Integrante. 16 trabalho a/r/t ao tentar integrar teoria, práxis e poiesis, ou, teoria/pesquisa, ensino/aprendizado e arte/produção, são compartilhadas. O projeto supracitado objetivou o treinamento de docentes para os desafios da atual crise que atravessamos, colaborando diretamente com o estudo desta pesquisa ao analisar que as práticas de professores-performers podem ser estimuladas pela emergência artística, situações, condições ambientais e experiências acadêmicas. Das questões aqui tratadas, a experimentação nos levou para campos de conhecimentos estéticos diversos. Por meio do contato entre os colaboradores surgiram vários caminhos para experimentar esses percursos artísticos, corporais e pedagógicos. A proposição do professor-performer nos levou enquanto discente/pesquisador a experimentar o sentido de ser produtor em arte. Durante o desafio da criação de um evento cênico, por exemplo, constatamos que um processo de montagem possui diversas maneiras de produção. No trabalho com a perspectiva proposta para um Professor-Performer (CIOTTI, 2014), por exemplo, encontramos um sentido para o processo de compartilhamento de conhecimento em suas diferentes dimensões, recorrendo, além de uma abordagem artística, também a outros saberes relativos à Filosofia, às teorias comunicacionais, à política, entre outros. 1.1 A/r/t – Práticas de um professor-performer De fato, acredito que nosso papel como pedagogos, ensinando a teoria do teatro é de tentar analisar da melhor forma aquilo que vemos, isto é, assinalar os movimentos, as correntes, uma evolução, relacionar as práticas, contextualizá-las. E para isso é preciso saber manter-se aberto às diversas práticas, mas também às teorias, incluindo aquelas das outras disciplinas, a fim de importar saberes de um domínio para outro. É apenas assim que renovamos verdadeiramente o campo da prática. Em outras palavras, é preciso saber não permanecer fixados em nossas certezas e nossos conhecimentos (FÉRAL, 2009, p. 262). À luz do pensamento de Féral (2009, p. 262), as experiências pedagógicas, por assim dizê-las, propiciam possibilidades outras do fazer nas artes da cena em um contexto que foi se expandindo ao teatro hibridizado com a performance. A Professora-Performer Naira Ciotti4 4 Naira Ciotti é professor-performer, com bacharelado e licenciatura em História pela Universidade de São Paulo (1983). Mestrado concluído em 1999 com o título “O híbrido professor-performer: uma prática”, sob a orientação da Prof. Dr. Ana Cristina Pereira de Almeida. Desenvolveu pesquisa de doutorado sob orientação dos professores Renato Cohen e Christine Greiner sobre questões da performance arte, arte contemporânea na tecnocultura, a rede, a memória do corpo e os museus de arte, denominado “O museu como mídia: performance e espaço colaborativo”, em setembro de 2005, no Programa de Comunicação e Semiótica da PUC/SP. Atua desde 1994 como performer na cena artística. Entre seus trabalhos, o mais conhecido é a performance Imanência, curadoria de Renato Cohen, uma permanência de oito dias, realizada por oito performers, na Casa das Rosas, São Paulo, 1997. Realizou estágio pós-doutoral em 2014 na ECA USP e, no mesmo ano, seu primeiro livro: "O professor-performer", foi lançado. Docente pesquisadora no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas 17 (2014, p. 43), que desenvolve o conceito de professor-performer nos aspectos de criação e experimentação como processos hibridizados no contexto do ensino da performance, considera essa como uma pedagogia a ser experimentada por outros dispositivos. Na proposição criada para um professor-performer há um “alto índice de responsabilidade, mas isso não deve servir como empecilho para que o professor de arte enfrente as dificuldades de repertório e de criatividade de seus alunos” (IDEM, p. 43). O Professor-Performer, aqui, é aquele que reconhece na palavra performance a necessidade de “uma atitude pedagógica diferenciada. Não só corpo voz e lugar estão imbricados, como também, nessa forma de ver a performance, está implícita uma preocupação pedagógica" (IDEM, p. 62). O papel de um professor-performer aqui retoma potencializado como abordagem que vê o corpo enquanto parte indizível que sintetiza suas relações com os “conhecimentos e experiências da cultura” (CIOTTI, 2014, p. 28). O Laboratório de Estudos em Performance e Teatro Performativo na Sala 20 do Departamento de Artes (DEART) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN/RN), no intuito de estudar e experimentar a Performance de maneira colaborativa, e, por sua vez, performativa, quando se pretendesse dialogar com outros espaços da universidade além da sala de aula tradicional, passou a fazer uma pesquisa performática também caracterizada como espaço comum para experimentação de diferentes alunos de graduação e pós-graduação. Contou também com a participação de outros alunos e professores que se integraram, e passaram a contribuir, confirmando nossa intenção ao trazer luz às ações pedagógicas realizadas por este corpo coletivo no decorrer de um processo criativo. Percebe-se, assim, que os principais aspectos para uma ação colaborativa são diversos em si e muitas vezes se confundem com a prática dos coletivos artísticos aqui hibridizados em registros processuais. Propomos uma reflexão gerada a partir do olhar/espectador: o professor-performer, do quanto o teatro expandiu (em performance), especialmente atravessada por uma política: a mirada e principalmente pedagógica, que encontra saídas, nas questões recorrentes de um ‘corpo ausente’ (ARTAUD, 1995); violentado pela institucionalização dos estados repressivos e ditatoriais, e pelo tempo, na hibridação entre arte e política. Um espaço ético para as narrativas surgidas de outra ordem, o da teatralidade. Contrapondo-se à ideia de teatro moderno fundamentado através de gêneros, da interpretação psicológica naturalista, da PPGArC, coordena atualmente o Labperformance na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o evento Reperformar o afeto: professores-performers, edital CAPES PAEP 2017. 18 presença artística “a priori de um dramaturgo-autor,de um diretor-encenador, de um ator- intérprete, de contextos demarcados da cena” (COHEN, 2011, p. 95). . No mundo/espaço contemporâneo tecnologizado, oscilando entre a presença e a representação, o corpo é redimensionado e ampliado, retomando o pensamento paradigmático de Derrida e Artaud da ‘ausência de presença’. O aqui-agora-ritualístico constrói uma autoria e a fala é mediatizada em vídeos, solilóquios, vozes espectrais, corpos atemporais em que a performance, através do performer contemporâneo, é mediada para outros suportes espelhos. (2001, p. 110). “O corpo eleva-se à sua dimensão virtual, cria-se o “corpo estendido”, pós- humano, laboratorizado em próteses de suporte. As relações da physis são redimensionadas na esfera da tecnologia” (COHEN, 2001, p. 110). O contato com o livro Corpo e Performances, de Stephan Baumgartel (2011), levou- nos, durante o processo, a entender o fascínio ambivalente entre o corpo e o ator, travestidos (Figura 2) com a presença no palco de um corpo teatral e eroticamente ilusório, que embaralha categorias de gênero socialmente estabelecidas e a moral burguesa. Utilizamos o travestimento para significar a oportunidade suprema de subversão, porque no teatro, corpos e sentimentos se misturam: “mimetizar o poder é desmistificar o poder”. (KOTT, 1968 Apud SENELICK, 2000, Apud BAUMGARTEL, 2011, p. 126). A estratégia de subversão se baseia num uso tático do corpo do ator, do elenco travestido para mimetizar o gênero, à luz da Figura 1 Escrituras Cênicas, processo criativo. Fonte: Desenhos de Naira Ciotti . 19 citação de Kott (1986), como um impulso para zombar do discurso hegemônico de gênero através da exposição irônica de seu conteúdo reprimido (IDEM, p.127). Figura 2 travestimento, criação do corpo grotesco. Fonte: Desenhos de Naira Ciotti O caminho aqui percorrido está relacionado com o conceito de ‘traço’, visto a partir das leituras que realizamos em Derrida (1995). O traço estabelece o caminho que mais evidentemente é percorrido. O traço tem uma duração, é algo que permanece; aquilo que acompanha o processo por mais tempo, não estando somente na origem. A obra neste ponto não é fruto de uma grande ideia localizada em momentos iniciais do processo, mas está espalhada pelo percurso: “Há criação em diários, anotações e rascunhos. Busco a compreensão da tessitura desse movimento, enquanto mergulho na complexidade do processo” (SALLES, 2008 p.27); numa perspectiva em que o a/r/t cria um sistema que é agenciado na complexidade, de acordo com as novas relações que vão sendo partilhadas. O ‘agenciamento cênico’ (IDEM, 2008), propõe redes de criação em múltiplas 20 possibilidades, em que a memória é nosso principal material na produção de narrativas. Estas são experimentadas pelo a/r/t que se propõe a uma crítica genética de processo. São pontos em destaque o ‘registro’ e ‘crítica genética’ (SALLES, 2004, 1992), daquilo que predomina, enquanto traço do processo em análise. Figura 3 Escrituras Cênicas, processo criativo. Fonte: Desenhos de Naira Ciotti. Reconhecemos assim, uma “crítica genética” para leituras das desmontagens, conforme Salles (1992) aponta, de reinventar a própria presença de “outras obras que teriam sido possíveis”. Consideramos uma “genética teatral” ou uma “genética de encenação” (FÉRAL, 2009) mediante a reflexão pessoal do traço de desmontagem, diferentemente de um vestígio, no sentido de uma materialidade residual. A crítica genética trata “de uma investigação que indaga a obra de arte a partir de sua fabricação, a partir de sua gênese. Como é criada uma obra? Esta é sua grande questão” (SALLES, 1992, p.17). Pierre – Marc de Biasi (2000, p. 9), apresenta o conceito e embora exista o desejo de aproximação é necessário destacar que o mesmo apresenta relação maior com o conceito de 21 ‘traço’ (DERRIDA, 1995). A análise do núcleo genético da encenação se volta principalmente para a observação dos ensaios, primeiramente na observação do outro e não somente da memória ensimesmada de sua própria gênese (FÉRAL, 2013). O que está em evidência é analisar os processos de gênese que levem à performance como um processo pedagógico através do ensino e da produção em/sobre arte no contexto educacional. Por outro lado, para que possamos nos converter em mediadores de um processo estético-social, reconhecemos que a ação de ensinar “não constitui uma performance artística, mas certamente é uma performance, na medida em que o professor precisa definir certas relações com os alunos, para desempenhar o papel de professor” (SCHECHNER, 2010, p. 30-31 apud DAL BELLO, 2013, p. 2). Portanto, experiências pedagógicas buscam pôr em questão possibilidades outras do fazer nas artes da cena. “Ensinar – como qualquer outra ocupação – traz consigo certas convenções de comportamento, de vestuário, linguagem e por aí em diante” (SCHECHNER, 2010, p.31). Por isso, torna-se importante que o performer seja um “compositor”, capaz de produzir uma composição consciente desses materiais, passando pelas etapas de seleção e ordenação do que for produzido em aula e nos ensaios. 1.2 A/r/t – Um espectador atraído pelos afetos disparados na ação Atualmente, nas artes performáticas, o ator passou a ser um criador/performer, intérprete do modo de sua revolução. A representação do coro ganha corpo novamente e percorre o tempo, se misturando aos eventos cênicos. Aqui o cenário da imagem e da ação se multiplica e são evidenciados na recepção com o espectador com características próximas do que entendemos por teatro performativo em colaboração com a Performance. Essa, por sua Figura 4 Escrituras Cênicas, processo criativo. Fonte: Desenhos de Naira Ciotti. 22 vez, significa aqui, autopenetração que desvela e sacrifica a parte mais íntima, a mais dolorosa e não é recepcionada pelo mundo, sendo capaz de se manifestar ao menor impulso. O que buscamos na ideia de performance, ainda enquanto manifesto, é uma abertura para as formas de expressão artística que estreitam os laços entre arte e vida. Para Fayga Ostrower (2010), o ato de criação realizado pelo sujeito artista, não se trata apenas de um gesto simples e cotidiano, apenas por querer ou porque gosta, e sim, por uma questão necessária, por que enquanto ser humano, só podemos crescer coerentemente – ‘criando, dando forma’ (2010, p. 9-10). O corpo reflexivo nessa escritura vislumbra nos atos éticos, estéticos e políticos, uma maneira aberta de atuar cenicamente, que, ao mesmo tempo, reflexiona alguns princípios norteadores como elementos artísticos e pedagógicos; e também se caracteriza por desvelar um caminho de pesquisa teórico-prática em teatro performativo. A própria cena sendo experimentada vai dando aos atuadores noções de intenções, personagens, tempo da peça, marcações, etc. São os movimentos que possibilitam o fazer teatral e suas respectivas transformações tornarem-se jogo. Contribuem para nossa percepção enquanto encenador, ampliando também as relações estéticas do espetáculo como um todo e a união dos elementos como fundamentais para a compreensão da obra que está sendo criada. Quando falamos em encenar ficamos propensos ao experimento, arriscamos nossas ideias sem sacralizar, usamos o equívoco como o propulsor para elaborar, estabelecer novas resoluções. Esse ato de experimentar torna-se experiência quando entendemos que nossas práticas nos ensinam, na medida em que vivemos aprimorando, organizando, movendo, metamorfoseando-se. O ato de metamorfose faz do processo artístico um experimento performático transformado em encenação performativa: justaposição, colagens, vivências revelam o espetáculo em sua totalidade cênica. Desta forma, os elementos da encenação convergem para o trabalho e a fragmentação experimentando caminhos possíveispara a representação, fragmentada, múltipla e simultânea perpetuando, dessa forma, uma formalização pertinente ao Zeitgeist – “em palavras de Gerald Thomas, essa representação, que, ao mesmo tempo, vivifique o informe, o numinoso, o desconhecido” (COHEN, 2004. p.133). Esse processo de ressignificação da obra durante o fazer, cujo ato vai se modificando, experimentando, rompendo ambiguidades, estreitam cada vez mais a experiência com o próprio ato de viver, pois organizamos o caos. Questionamo-nos sobre como desempenhar o papel de criadores em diferentes contextos. Vivenciamos e experimentamos processos que permitiram noções para a criação do universo cênico em suas respectivas necessidades. 23 Discutimos o processo artístico enquanto fazer vivencial em contraponto com os aspectos políticos dos contextos estudados. Em linhas gerais, o projeto desta investigação à luz das práticas de um sujeito a/r/t – o professor- performer volta-se para um percurso processual, produzindo uma possibilidade de desvelamento em caráter teórico-prático, segundo a linha de pesquisa Interfaces da Cena: Políticas, Performances, Cultura e Espaço, do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPGArC), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, entre 2016/2018, onde se desenvolveu esta pesquisa de mestrado. 1.3 Desmontagem como dispositivo artístico/pedagógico de reflexão Quanto ao objetivo teórico deste trabalho propomos ao a/r/t – o professor-performer a realização de um estudo acerca do conceito de Desmontagem Cênica (CABALLERO, 2009), procurando investigar na proposta apresentada pela professora e pesquisadora Ileana Diéguez Caballero5 (2009), possibilidades de caminhos e eixos temáticos para que experimentássemos em laboratórios um caminho performativo mediante a metodologia a/r/tografica. O intuito é propor um exercício de desmontagem escrita e corporal, no qual o pesquisador escreve seu trajeto de criação segundo a desmontagem tecida por este sujeito, com base em suas experiências e nos rastros deixados, considerando os traços colaborativos. Apresenta-se em formato de reflexões hibridizadas com o estudo do teatro performativo ao se deparar com a performance, sobretudo pedagógica. Essa vertente nos leva a compreensão de que todo processo criativo carrega em si uma carga pedagógica muito forte como uma proposição compartilhada ao mesmo tempo artística/pedagógica. Emergiram alguns questionamentos, norteadores do percurso, e que, a priori, como pesquisador, não havia como responder. Embora a desmontagem fosse vista como uma possível relação com o corpo e o processo do artista, mas não percebia um caminho para concebê-la. Destacamos como principais questionamentos presentes na memória desta escrita: 5 Ileana Diéguez Caballero é professora e investigadora no Departamento de Humanidades da UAM- Cuajimalpa. Trabalha sobre problemáticas da arte, da memória, da violência e das teatralidades e performatividades expandidas e sociais. É curadora de exposições visuais como Navajas (2012), de Rosa María Robles pelo Centro de las Artes de Monterrey; Sudarios (2012), de Erika Diettes; La domus del ausente (2013), de Juan Manuel Echavarría e Mayra Martell pela Galería Metropolitana; Ensayo de la memoria (2012), de Mayra Martell pelo Museo Universitario del Chopo; Las formas de la ausência (2015) pela Casa da Cultura da UAEMéx, en Tlalpan. Curadora dos projetos Des/montar la re/presentación realizado na UAM-Cuajimalpa (2003); e Desmontajes: procesos de investigación y creación escénica (2009) realizado na CITRU-INBA. Tem realizado seminários e conferencias nas respectivas instituições acadêmicas: Universidade de São Paulo- USP, Universidad de Buenos Aires, Universidade Federal de Rio Grande do Sul - UFRGS, Universidad de Concepción en Chile, Universidade do Estado de Santa Catarina- UDESC, Universidade Federal de Uberlândia- UFU, entre outras como a Universidad Iberoamericana. 24 Desmontagem seria o mesmo que demonstração pedagógica de trabalho? Seria um evento expandido no contexto teatral a outra dimensão de compartilhamento? A desmontagem pode ser uma performance? Ou, como fazer uma desmontagem? E, finalmente, que estratégias artísticas nos fazem proposições de pensamento pedagógico para a desmontagem? Esta última prevaleceu como substrato propositivo do quanto intencionamos hibridizar ainda mais o conceito de desmontagem. A partir das experiências realizadas íamos entendendo o envolvimento cada vez mais estreito com a performance. Desse modo, foi possível que partíssemos do desejo particular pelo teatro hibridizado com a performance. Através das pistas deixadas pelo procedimento de desmontagem formou-se o espaço propositivo, construído abertamente durante a trajetória da pesquisa para performances educacionais, bem como os processos de recepção junto a espectadores e artistas refletidos em diferentes contextos. Essencialmente, a desmontagem é pensada com o espectador não mais como sujeito passivo que assiste a um espetáculo, mas como um construtor da cena da qual compartilha. São interessantes as teorias das práxis que ajudam a entender estes processos. Na América Latina temos: Miguel Rubio, Ileana Dieguez, Beatriz Rizk, Vivian Martínez Tavares, Magaly Muguercia, Alicia del Campo, Jorge Dubatti, Flavio Desgranges, Antônio Araújo, Augusto Boal, entre outros; e Josette Féral no México. Esses autores vêm desenvolvendo não somente práticas teóricas, mas se dedicam a experimentar e desenvolver suas teorias alicerçadas em suas experiências e por elas nos enviesamos. Ela (a desmontagem), ao atuar nesta concepção para o a/r/t – o professor-performer de outras formas cênicas oxigenou o processo do construto cênico, criando assim, procedimentos outros e novos desafios para quem estuda e reflete ao redor da cena. Contribuiu também, para a elaboração propositiva de estratégias artístico/poéticas, principalmente, ao incorporarem uma mirada reflexiva (político/artística) em suas montagens. Esse interesse pela mirada nos fez refletir, a partir de algumas perguntas percebidas nas leituras realizadas em Ileana Diéguez Caballero (2009, 2011, 2014), principal referência para esta investigação relacionado com a desmontagem e de sua possibilidade performativa em contextos não-institucionalizados. Quanto à desmontagem, enfatizamos os processos individuais dos artistas - como cada um cria seu processo e de como sua trajetória pode ressignificar, propor miradas, olhares para o fenômeno e as formações de outros sujeitos da experiência artística. Neste caso, nos referimos às práticas de montagem oriundas dos teatros da Latino América, tão importantes no diálogo com as questões centradas na memória. Tais aspectos 25 nos levaram a perceber o quanto os níveis de leitura dados pela teatralidade, ajudaram a pensar diferentes miradas e outros olhares sobre os atos de mediação e experimentação da arte. O entrecruzamento de códigos culturais, tais como o tema da mestiçagem, a antropofagía e xamanismo conectados a uma ampla gama de discursos filosóficos, psicoanalítico ou artístico (Nietzsche, Freud, Futurismo Russo, Cubismo Europeu, Cultura de vídeo, afro-Candomblé, mitos indígenas...) são outros aspectos que constituem as abordagens pós-coloniais para o Teatro ou a performance Latino- americano (a) (Cohen, Prieto). Deste modo, também no trabalho de Kurapel, de Nelson Rodrigues e de Antunes filho domina a interseção de códigos culturais como a teoria dos mitos de M. Eleiade ou as doutrinas psicanalíticas de Freud, os arquétipos de Jung ou as teorias de Roland Barthes recodificado textualmente por Nelson Rodrigues e encenado por Filho dentro do contexto cultural local (Mila). (TORO, 2004, p. 13). A mirada estabelecida pelo olhar do espectador transita entre as possíveis relações docorpo, da arte e da política, voltada às ações de artistas e pesquisadores que vislumbraram na desmontagem e sua possível relação com a Performance, uma mirada artística/pedagógica, ao mesmo tempo em que ajudou a desvelar uma memória de diferentes artistas do teatro e da performance Latino Americana. Nesse ponto, a mestiçagem, entre os procedimentos de professor-performer (CIOTTI, 2014) e desmontagem (CABALLERO, 2009), demonstrou ser um interessante meio de compartilhamento dos saberes encontrados nas memórias das desmontagens. Atribuímos assim, um intuito estratégico para o corpo desta pesquisa. Uma maneira propositiva na criação de escrituras e práticas cênicas, em que o caráter reflexivo se dá segundo o resgate por ações mais colaborativas e performativas de concretização com o fazer artístico. Isso atribui às experiências estudadas uma atitude mais complexa que se desvelam na mirada artístico/pedagógica vendo o corpo produzido pela performance como um campo a ser experimentado. 26 2. I PARTE | Mirada DA DESMONTAGEM CÊNICA COMO PROCEDIMENTO ARTISTICO/PEDAGOGICO DE DESVELAMENTO CORPORAL Debord (1999, p. 42), principal teorizador das condições espetaculares das sociedades modernas, considera o espetáculo como sendo um dos meios de produção mais utilizados da sociedade atual. Entretanto, [...] a representação da forma hierárquica do poder alcança o seu mais alto grau no espetáculo que ela organiza para a sociedade, mediando as relações e apresentando a aparência como substituição da vida. No entanto, nas manifestações espetaculares em que a sociedade atual organiza a si mesma já não é possível falar do espetáculo como uma "inversão de vida", como assinalava Debord, pois este se concretiza num movimento que inverte a condição espetacular produzida pelo poder. (CABALLERO, 2011 p. 93). Subvertendo as estruturas de poder, as criações teatrais da Latino América no início do século XX, passaram a ser um importante agenciador das escrituras corporais, improvisações e achados cênicos, principalmente na maneira de trazer para discussão e produção artística de atores, grupos e coletivos, uma outra arte de escritura corporal. No final dos anos setenta do séc. XX, por exemplo, a contribuição das formas apresentadas pelo Odin Teatret e de Eugenio Barba, especialmente depois do Encontro de Teatros de Grupo organizado por Cuatrotablas em Ayacucho (1978), originou na América Latina uma relação com as técnicas que destinaram aos atores outros meios de instrumentalização de suas práticas artísticas, num solo que propunha o desenvolvimento mais expandido da cena e de escrituras mais performáticas nas realizações dos atores com um papel preponderantemente reflexivo (IDEM, p. 93). No Brasil de 1987, as estruturas teatrais e as cênicas também abordaram a problemática acerca dos questionamentos realizados pela visita de Eugênio Barba, durante o encontro organizado pelo Instituto Nacional das Artes Cênicas (INACEN), o que mudaria e deslocaria o modus operandi do pensamento e do fazer artístico brasileiro. Nos dois casos, em diálogo com as demonstrações pedagógicas de trabalho realizadas pelos atores e pesquisadores do projeto da International School of Theatrical Anthropology (ISTA), do Odin Teatret, sob/sobre os preceitos da ‘Antropologia Teatral’ (BARBA, 2009). Segundo Narciso Telles (2013, p. 145), esse projeto proporcionou a aproximação com os princípios da Antropologia Teatral e possibilitou instaurar na Latino América uma série de procedimentos técnicos, caracterizados pela ênfase, no treinamento do ator e nas práticas interculturais, bem como na utilização das demonstrações de trabalho e das práticas 27 pedagógicas. “...a presença e a influência do pensamento-prática de Eugenio Barba na América Latina é algo inegável. Vários são os grupos e artistas nos diversos países do continente que trabalham a partir dos preceitos da Antropologia Teatral” (TELLES, 2013, p. 145). Deste modo, diferentes artistas da Latino América viram na Antropologia Teatral, apontada por Eugênio Barba e Nicola Savarese (1995), a afirmativa para diferenciar um teatro baseado não somente no texto ou na representação dramatúrgica da encenação, propondo um ‘novo teatro’, mas também apoiado nas “matrizes tradicionais do teatro em relação com a cultura” (BARBA; SAVARESE, 1995, p. 77). O procedimento de desmontar os processos cênicos pode ser utilizado no âmbito de uma peça, de memórias de vida ou em qualquer experiência que remonte no corpo a tônica para corporeidades diversas. Experiências como o compartilhamento de memórias corporais, contribuíram para a elaboração de estratégias poéticas e passaram a considerar uma dimensão política para a prática de atuação, de reflexão e de presença. Considerando que o percurso da história da desmontagem, perpassa desde a passagem dos preceitos da Antropologia Teatral, fundada por Eugenio Barba e nos compartilhamentos das demonstrações pedagógicas dos atores do Odin Teatret, até as realizações de eventos cujo conceito é remontado a partir de 1990. Ileana Diéguez Caballero (2009), em um de seus apontamentos mais importantes, considera que A proposta de desmontagem carrega consigo um histórico baseado nas demonstrações de trabalho, mas sugere com outros aspectos relevantes, como uma investigação, interessada em fazer visível o tecido criativo através de depoimentos, desconstruções e reconstruções dos próprios autores (CABALLERO, 2009, p. 18). A demonstração pedagógica estabelece uma aproximação ao mesmo tempo artística e pedagógica e, neste sentido, se aproxima dos procedimentos de desmontagem. Ambos estão interessados no contato com o espectador no que se refere aos desvelamentos de investigação nas práticas artísticas. É o ator que busca incessantemente um caminho de presentificar sua presença, na potência e nas formas mestiças que se fabrica durante um processo híbrido. Neste sentido, as demonstrações pedagógicas de trabalho criaram caminhos que além de explicar os processos criativos realizados durante uma trajetória, também possibilitam outros momentos de presença frente aos espectadores como, por exemplo, numa dimensão para desconstrução. 28 Entretanto, a desmontagem tampouco implica, somente, uma desconstrução no sentido Derridiano da palavra/conceito, ou seja, “desconstruir é também descoser" (DERRIDA 1976, p.19). A desmontagem não é uma operação negativa, devido ao fato de que a desconstrução gera um gesto que assume certa necessidade da problemática estruturalista. É preciso compreender a construção do conjunto mais do que simplesmente ‘destruir’ o que foi feito. É preciso compreender como este conjunto foi construído, “e, para isso, era preciso reconstruí- lo” (DERRIDA, 1997, p. 3-4). Neste sentido, a desmontagem e desconstrução forneceram um importante articulador de experimentos, sendo capaz de trabalhar com a desmontagem para garantir que os ideais desconstrucionistas nas leituras das desmontagens fossem cumpridos. Em Derrida (1995), por exemplo, não vimos atos destrutivos, e a desmontagem em si, não é uma destruição ou mesmo se arrisca a destruir algo. Contudo, uma visão negativa para desconstrução ainda está presente em muitas experiências educativas, principalmente quando há um total desconhecimento, uma vez que se trata de desconstrução e/ou desmontagem. A desmontagem opera pela desconstrução, problematizando, criando leituras, estabelecendo miradas e outros olhares, evidenciando os traços e o processo artístico, ao mesmo tempo em que reflexiona e desvela atraída por aqueles interessados em questionar os modos. Neste ponto, não teria sentido nenhum ‘reproduzir’ aqui atos destrutivos. O desejo, tanto na desmontagem quanto na desconstrução, é compreender como cada um funciona em sua prática e como os conceitos são seguidos de‘interpretações’. No entanto aborda na realização de desconstruir – seja na filosofia, na literatura, na arte ou na linguística – o tradicional cânone de palavras, a existência de uma ligação natural entre significante e significado, tornando a desconstrução descolada e relativa em relação à dialética tradicional, quando se tornam visíveis os jogos de sua construção. Sob influência do filósofo Jacques Derrida (1995), Ileana Diéguez Caballero (2014;2011;2009) assume os atos de fala6, radicalizando a noção da força simbólica sobre o contexto institucional, e abre para uma performatividade de escrituras, que também provoca mudanças na maneira de pensar/fazer o teatro e a cena contemporânea. Tais processos de investigação criaram miradas, “outras linguagens cênicas e dramatúrgicas, outros temas, 6 “Recusar a obra e deixar que lhe sejam roubados a palavra, o corpo e o nascimento pelo deus furtivo é, portanto, precaver-se bem contra o teatro do medo multiplicando as diferenças entre mim e eu. Restaurando na sua absoluta e terrível proximidade, o palco da crueldade, restituir-me-ia deste modo a imediata autarquia de meu nascimento, do meu corpo e da minha palavra” (DERRIDA, 1995, p. 140). 29 outros pontos de vista, outras formas de produção e comunicação” (DIÉGUEZ, 2014, p. 5), no contexto da cena contemporânea expandida, principalmente, por discutir em diferentes práticas e atos cidadãos, uma aproximação ética, a partir dos processos corporais e cênicos da Latino América do século XX, cenário em que realiza seu estudo da desmontagem. Os Cenários Conceituais apresentados são evidenciados desde as práticas cênicas em meados do séc. XX que produziram na Latino América outros modos de compartilhamentos às ações de artistas, coletivos e ações cidadãs, que, passaram a vislumbrar um fator essencial de suas performances - o entre-lugar que, ao mesmo tempo, desvele uma abordagem artístico e pedagógica. Citamos as práticas do ator Victor Varela que passou a promover a partir de sua desmontagem a possibilidade de escrituras mais próximas dos sujeitos latinos e de suas questões, principalmente no espaço da desmontagem em sua gênese. Fazem parte desta escritura reflexiva enquanto ato de ‘mirada política’ (BHABHA, 2007; CABALLERO, 2009), os apontamentos dos atos políticos propostos como caminho performativo em que as práticas artísticas in situ, desempenharam um papel importante nas ações reflexionadas acerca da poética de uma Teatralidade Expandida (em performance). A desmontagem cênica, objeto deste estudo, surge inserida no contexto da cena expandida e se torna outro instrumento de experimentação também para diferentes artistas latinos. Dessa forma, encontramos na mirada pedagógica uma abordagem política, ao mesmo tempo artística e reflexiva a partir das desmontagens com as quais entramos em contato. 30 2.1 A Gênese Da Desmontagem Figura 5: Segismundo ex Marqués (1993). Fonte: Arquivo do Teatro do Obstáculo. Disponível em: <http://artesescenicas.uclm.es/archivos_subidos/obras/851/Segismundo1.JPG>. Quando as práticas de demonstrações de trabalho começaram a ser chamadas por desmontagem, como na apresentação Segismundo ex Marqués (1993), de Victor Varela7 com o grupo do Teatro do Obstáculo (Cuba - 1985), durante o evento da X Oficina da Escola Internacional de Teatro da América Latina e Caribe, EITALC8, a técnica estabeleceu uma nova tessitura das práticas artísticas por toda a América Latina (CABALLERO, 2009, p. 16- 17). Uma versão da desmontagem foi publicada no Livro: Destejiendo Scenas. Desmontagen: procesos de creación e investigación (CABALLERO, 2009); o artigo/desmontagem intitulado La experiencia del tecer ser: Deconstruyendo a Segismund ex Marqués. (VARELA, Victor; CABALLERO, 2009, p. 123), nos traz esse trânsito poético que busca na vida a afirmativa das dúvidas e incertezas dos percursos de um processo de criação. 7 Victor Varela é autor, ator e encenador teatral e artista plástico cubano, fundador do grupo Teatro Obstáculo. 8 “Criada em 1987, em Havana, Cuba, durante o Terceiro Encontro de Dramaturgos convocado pela Casa de las Américas, a Eitalc constituiu-se um organismo pedagógico de incentivo à criação teatral latino- americana baseada na promoção de cursos, oficinas, estúdios e encontros. Seu objetivo é promover o intercâmbio entre artistas e pesquisadores de teatro em moldes diferentes dos convencionais. Nos dez primeiros anos, esse projeto de um estúdio teatral múltiplo e itinerante foi encabeçado pelo dramaturgo argentino Oswaldo Dragún. Alguns dos principais artistas do continente e da Europa já colaboraram com a Eitalc: Atahualpa del Cioppo, Enrique Buenaventura, Santiago García, Andrés Pérez, Miguel Rubio, Arístides Vargas, Flora Lauten, Rosa Luisa Márquez, João das Neves, José Sánchez, Fernando Peixoto, além de grupos como La Candelaria, da Colômbia, Yuyachkani, do Peru, e Malayerba, do Equador”. (Verbete por Equipe Latino americana. Enciclopédia Latino americana. Disponível em: <http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/e/eitalc>. Acesso em: 09/03/2018. http://artesescenicas.uclm.es/archivos_subidos/obras/851/Segismundo1.JPG http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/c/cuba http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/c/casa-de-las-americas http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/t/teatro http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/c/candelaria-la http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/c/colombia http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/y/yuyachkani http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/p/peru http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/m/malayerba http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/e/equador http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/e/eitalc 31 Segismundo ex Marqués (1993), é uma desconstrução do processo de Victor Varela que apresenta o corpo sendo desconstruído com sua presença. Um corpo vivo em cena apresenta-se como um cadáver a ser desmontado, reflexionado nas miradas do diretor que traz suas questões e sua relação com o Grupo do Teatro do Obstáculo. A perspectiva do Teatro do Obstáculo, como teatro criado à margem, nas bordas da sociedade, é um exemplo do deslocamento que a cena contemporânea realizou. Expandida, essa cena ganhou uma articulação suspensa e relacional, que busca nos obstáculos as necessidades de suas práticas e por sua vez perfaz sua estética fronteiriça. O impossível, na criação de Victor Varela, se baseia em questões éticas da prática e pensamento, que constroem poéticas de fronteiras ou da territorialidade, e o sujeito estrangeiro, alheio ao seu corpo e seu processo, sua forma ou identificação se sujeita ao fracasso. As estratégias de desconstrução aguçam o ângulo agudo de seu olhar, raivosamente paródico. Insistindo nas margens, a investigação dos limites é percebida aqui de maneira consistente com a condição inescapável da precariedade. Seus tecidos cênicos convidam ao questionamento mais radical, quase em uma espécie de festividade das bordas, de cumplicidade lúdica com os estados marginais. A forma de realização da desmontagem de Victor Varela demonstra interesse para temas subterrâneos do corpo e de seus cenários agonizantes: aguaceiros, poças, buracos e becos sem saída; de uma diáspora espiritual. De um êxodo que começou em limites insulares úmidos e se espalhou na transgressão dos territórios, ao único lugar onde o impossível hoje tem a aparência de possibilidade: um não-lugar, em que as utopias sejam as únicas saídas mesmo que não defenda a certeza de um caminho. A desmontagem possibilita que os artistas possam, não só demonstrar seus trabalhos artísticos, mas criar performances que acabam realizando maneiras outras de atuação, sugerindo a performatividade, também, para os cenários de apresentação. Os agentes se entrelaçame se bifurcam em todas as dimensões da cultura humana, desde os condicionamentos mais inerentes à espécie e a vida em sociedade, até as sutilezas e as singularidades poéticas de cada sujeito. Tais procedimentos podem ser considerados artístico- pedagógicos, principalmente ao olhar para os processos a fim de criar, de transformar e de refletir os percursos e geram-se tensões em nossa prática. A ideia de (re)flexão enfatiza uma aproximação entre teatralidade/performatividade, de maneira que as noções de representação passaram a ser observadas numa conotação para ‘performances políticas’. 32 A proposição nos gestos e atos, consideradas num viés performático, dialoga com as práticas artísticas/sociais e atos políticos de cidadãos em contextos não-institucionalizados. Nelas se refletem a ação política e cênica de atuação ética e estética, para aqueles que refletem ao redor da cena. Em Ileana Diéguez Caballero (2011), a relação entre corpos e objetos, nas experiências poéticas, dá-se principalmente para as performances no espaço cotidiano. A pesquisadora analisa como os processos teatrais reverberam nos espaços institucionalizados, não-institucionalizado e no contexto urbano considerando na perspectiva da desmontagem uma ‘relação nômade, metafórica e instável’ (TURNER, 2002), sujeita aos imaginários sociais. Houve certo deslocamento conceitual e a atribuição de demonstração passa a ter uma conotação política de abordagem expandida da cena, quando a Desmontagem Cênica promove, num contexto de reflexionar além das práticas, o fazer teatral em grupo e daí então, a desmontagem se transformou num conceito vivo e em construção, se propondo a um tecido teórico/prático de concepção desde sua gênese. A natureza política é performatizada através dos fenômenos oriundos na cena contemporânea expandida em que se pôde estudar diferentes cenários das práticas artísticas de diversos grupos, como o Grupo Etcétera, as Mães da Praça de Maio e Mapa Teatro, por exemplo. O grupo Etcétera (Buenos Aires), formado por artistas de diferentes linguagens, como teatro, artes visuais, poesia e música, no final de 1997, teve por objetivo inicial criar estratégias para interagir com a vida política e social, levando a arte às ruas, por exemplo. Propõem-se a instaurar problemas sociais em espaços onde eles são frequentemente silenciados, como instituições artísticas, a indústria cultural e a mídia. (Figura 6). Figura 6 - EI Mierdazo (2002), em Buenos Aires / Coletivo Etcétera. Fonte: Arquivo do Coletivo ETC. 33 Na performance cidadã do grupo El Mierdazo (2002), os performers se utilizam de seu próprio excremento para denunciar a corrupção e protestar contra a injustiça. Não há um roteiro estabelecido, além da própria instalação do acontecimento, que absorve espontaneamente o confronto direto com as autoridades. Já em as Mães da Praça de Maio, as mães dos desaparecidos usam seus próprios corpos como cenários de representação (Figura 7). Elas carregam faixas com fotos de seus filhos e lenços representando o corpo ausente e o sentimento de sofrimento pela perda dos filhos. Suas palavras de ordem “aparecimento com vida” – dos primeiros anos de luta – e “julgamento e punição aos culpados” estão latentes em cada uma das figuras brancas – contornos de pessoas desaparecidas, desenhadas nos ladrilhos cor de tijolo da Praça de Maio. A escolha da Praça de Maio como local de protesto não foi por acaso. Trata-se do cenário histórico de manifestação do povo argentino, um lugar carregado de significação e de emotividade e que adquiriu um novo sentido a partir das Mães: converteu-se no lugar da memória e da identidade dos argentinos. Figura 7 - Mães da praça de maio. No grupo Mapa Teatro, há a troca de cenário através de intervenções artísticas do coletivo que responde ao discurso geopolítico da modernização de Bogotá. A testemunha das ruínas constrói um estágio liminar entre o posicionamento teatral e um posicionamento ético e político ao reintegrar os residentes de El Cartucho ao espaço, através da performance. A testemunha das ruínas reúne e condensa o trabalho de quatro anos do Mapa Teatro na coleta do testemunho do povo despejado de El Cartucho e representa esse testemunho em performance e em instalações artísticas. O Mapa Teatro encena sequências filmadas das ruas e dos moradores ignorados de El Cartucho. As projeções artísticas nas telas mostram diferentes 34 fragmentos de espaço, mas ao mesmo tempo trabalham juntas em protesto contra a destruição de El Cartucho (Figura 8). Figura 8 - Testígo de las Ruínas / Mapa Teatro. Foto: Ximena Vargas Estes diferentes “Cenários liminares” (2011) são o objeto de estudo da investigadora Ileana. Ela se interessa pelos projetos que não estão inseridos institucionalmente em espaços fechados, mas são oriundos dos gestos promovidos nas ações cidadãs e de performances no espaço urbano cujo corpo, que realiza uma ação, está sujeito ao efêmero do acontecimento. O elemento estético é considerado como uma ação não proposital em sua pesquisa. Nesta obra a pesquisadora dedica-se a estudar a proposta de ‘liminaridade’9, sua abordagem questiona e propõe para o exercício do pensamento uma mirada antiestética e de escritura marginal, questionando modos e formas acadêmicas ao propor um corpus investigativo ‘híbrido’, ‘grotesco’ e ‘carnavalizado’ (BAKHTIN, 1993). Compreende que as estruturas de alguns gêneros – especialmente o teatro - apresentam variações para o estilo romanesco quando se trata de pôr em evidência as confissões, os relatos, as cartografias, as biografias, dentre outras formas, que desvelam a hibridização desta escritura “estreitamente vinculada à confrontação dialógica de linguagens. A paródia e toda palavra utilizada com reserva, colocada entre aspas de entonação, é por excelência um híbrido intencional dialógico” (BAKHTIN, 1989, p. 442 apud CABALLERO, 2011, p. 48). 9“Liminaridade é, portanto, uma condição transitória na qual os sujeitos encontram-se destituídos de suas posições sociais anteriores, ocupando um entre-lugar indefinido no qual não é possível categorizá-los plenamente. Segundo Turner, a vida social se movimenta a partir de um movimento dialético, envolvendo estrutura social e communitas, estrutura e antiestrutura, alimentado pelas práticas rituais”. In: NOLETO, Rafael da Silva; ALVES, Yara de Cássia. Liminaridade e Communitas – Victor Turner. Verbetes, USP, 2015; disponível em: <http://ea.fflch.usp.br/conceito/liminaridade-e-communitas-victor-turner>. Acesso em: 27/03/2018. http://ea.fflch.usp.br/conceito/liminaridade-e-communitas-victor-turner 35 A partir de diferentes performances e manifestos de artistas, grupos e coletivos da Latina América da segunda metade do século XX, a pesquisadora evidencia práticas que desenvolveram um importante solo para reconstruir, reflexionar, repensar os acontecimentos teatrais que deram uma perspectiva mestiça e performativa aos desvelamentos corporais. Experiências como o compartilhamento de memórias corporais, contribuíram na elaboração de estratégias poéticas e passaram a considerar uma dimensão política para a prática de atuação, de reflexão e de presença diante da desmontagem. Consideramos em nossa prática investigativa, estudar uma mobilização para os fenômenos existentes na relação entre o ator e o público, marcando uma dimensão, que estabelece uma retomada histórica, reflexiva e dialética aos paradigmas epistemológicos. Neste sentido, há uma aproximação com o pensamento construído por Ilena Diéguez Caballero (2009; 2011; 2014), quanto às estratégias artísticas cujo centro de discussão perpassa a ação experimental, circunscrita nos espaços que estão nos limites entre a vida e a arte. Pode-se notar que ora a autora destaca as relações éticas, ora os desafiosestéticos questionando os conceitos dramáticos da poiesis aristotélica10 - como uma necessidade de reflexionarmos a memória das desmontagens sob outras miradas. “Cenários Limiares” (2011), apresentam-se como uma importante metáfora desse imbricamento entre a arte e a realidade, não parecendo ter por interesse a mímesis como representação. A autora abre-se para um território de ficções e não-realidades como as práticas e estratégias do “Artivismo” emergentes. Assim, construiu o significado da produção de uma desmontagem cênica, como um conceito aberto. Dessa forma, percebemos que a desmontagem não é, necessariamente, um conceito fechado, pois trabalha em seu contrário, pensando a partir da abertura de possibilidades. Apresenta-se como uma proposição artístico/política, que leva a notar, em processos poéticos, o corpus de ‘liminaridade’ e ‘communitas’11 propostas por Victor Turner12 (2002), e dos ‘ritos de passagem’13, de Arnold Van Gennep (1909)14. 10 GAZONI, Fernando Maciel. A Poética de Aristóteles: tradução e comentários. 2006. 11 “communitas, termo latim à noção de comunidade, já que o caráter de anti estrutura da communitas está baseado em relações sociais e não em pertencimentos territoriais”. Ibid. 2015. 12“Victor Turner (1920-1983), antropólogo britânico que dedicou boa parte de seus esforços intelectuais ao entendimento das simbologias subjacentes aos rituais, deu contribuição significativa à compreensão das práticas rituais ao refinar a noção de liminaridade e elaborar, a partir dela, o conceito de communitas”. Ibid. 2015. 13Os ritos de passagem se refere aos rituais nos quais os sujeitos se apresentam em um contexto deslocado e indeterminado, como uma espécie de morte social transitória, para em seguida possibilitar seu renascimento e reintegração na sociedade. Ibid. 2015. 14Arnold Van Gennep (1873-1957), definiu o processo de mudança de um status social a outro em três etapas. Primeiro, relacionado ao deslocamento do sujeito que é simbolicamente removido da sociedade e 36 2.2 Cenários Conceituais | Teatralidades e Liminaridades [...] a teatralidade tornou-se uma das características mais relevantes da arte contemporânea. Contra toda possibilidade de pureza, de uma essencialidade que depura e separa radicalmente as diversas formas artísticas, a arte reconhece-se hoje como “uma estrutura de acontecimentos”, de situações, de práticas in situ, de teatralidades, de performatividades e (re)presentações (CABALLERO, 2014, p. 128). A teatralidade como campo expandido para além das artes é a discussão na cena contemporânea expandida. Surge nesta pesquisa, com o intuito de evidenciar outros momentos de presença, interessado nos processos criativos que busquem desmontar modelos estéticos de representação e produção. Para Diéguez (2014), “teatralidades, performatividades e (re)presentações” (p. 126) são oriundas das práticas da liminaridade e se relacionam em dois contextos15. Primeiro, no que se refere ao campo expandido na cena latino-americana, a partir dos “limiares antropológicos” mediante “performances culturais” (TURNER, 2002), desenvolvidas por grupos, coletivos e artistas do Peru, México, Colômbia, Argentina e Brasil, durante a segunda metade do séc. XX, que originou o desenvolvimento do conceito de Desmontagem Cênica (DIÉGUEZ, 2009). Busca ainda, os gestos de artistas e não-artistas que se arriscaram a performatizar seus manifestos, como por exemplo, nos gestos de denúncia das violências no questionamento sobre pessoas desaparecidas. No segundo, estrutura-se nas poéticas da experiência que produziram a desmontagem de uma arte que se estabelecia durante um “ato convivial” (DUBATTI, 2002). Foi na segunda metade do século XX que os teatros latino-americanos independentes passaram a atuar em espaços alternativos como ruas, praças, instituições, comunidades, feiras livres, sítios não-convencionais, entre outros. Muito embora, seu interesse esteja centrado nos acontecimentos das performances[25] sob uma perspectiva de liminaridade (TURNER, 2002), estes cenários, aos quais se refere Diéguez (2011), suspendem a distância entre o ator e o espectador de maneira que o público se mistura nas ações e participa diretamente do trabalho, em site specific (lugar especifico). A prática da ação in situ (site specific) implicou o desenvolvimento cênico de uma arte que já não queria ser vista na caixa branca das galerias e museus, nem em seu questiona sua própria identidade. Segundo, o portal limiar quando o sujeito é retirado da sociedade e é supervisionado. Terceiro, o pós-liminar quando há a reintegração do sujeito à sociedade em outra dimensão ou status. Isto é uma forma anti estrutural da relação de indivíduos nos quais os vínculos sociais que compartilham estabelecem as communitas. Neste sentido Victor Turner desenvolve sua proposta a partir do segundo deslocamento da liminaridade. VAN GENNEP, A., Les rites de passage, Paris, Émile Nourry, 1909 (Trad. Bras. Mariano Ferreira. Petrópolis, Vozes, 1978). Apud In: Ibid. 2015. 15 Ileana Dieguez estabelece ainda significado para o limiar com os conceitos de hibridização (Bhabha, Canclini), contaminação (Lotman e Bakhtin), entre outros, como para Teatralidade (Josette Féral, Antonio Sánchez). 37 contrário, nas caixas pretas do teatro. As transformações e expansões do performativo, do teatral e do cênico não têm ocorrido somente por conta das contaminações e disseminações indisciplinares das artes, senão insistentemente pelas demandas e contaminações que os acontecimentos da vida propõem à arte, pela urgência com que nos interpelam as cenas e teatralidades das polis. Dessa forma, a teatralidade como campo expandido não só nos exige reconhecer as outras cenas e o outro teatro que emerge nos interstícios artísticos, mas também nos intima a reconhecer a teatralidade que habita na vida e nas representações sociais, tal como o fez Artaud.(CABALLERO, 2014, p.129). Desmontar remonta à ideia de relacionar certo processo desconstrucionista para a genética teatral, em que sua construção está associada com a perspectiva da teatralidade mencionada também no teatro da crueldade de Artaud. A proposta radical do encenador Antonin Artaud (2002; 1995) reflete, que a teatralidade começou a variar sua arquitetura e linguagem com um menor peso ao discurso da fábula, trocas radicais da noção sociológica de personagem, ruptura ao princípio de mimese com o realismo e uma acentuada prática voltada a relação ambivalente do ator sugerida por Artaud na metáfora de um corpo ‘sem órgãos´(CsO). poderia ser entendida – levando em conta a sua carga de pulsões e a sua característica parricida – na procura de uma teatralidade menos racional e mais corporal. Numa relação metafórica, a demanda de um ‘corpo sem órgãos’ pode esgrimir-se contra a noção de encenação, se entendermos esta como sinônimo da montagem de um texto que prioriza a linguagem verbal. O CsO proposto por Artaud é a expressão de um corpo com vontades, de um corpus libertado, erotizado; um corpo humano, político ou teatral. É a teatralidade sem cotações de representacionismo, driblando a marcação da tradicional organização drama/representação. O texto ali está quebrado, perfurado. O teatro das contaminações, das pestes, de desejo, das vontades. (CABALLERO, 2011, p. 30). Entretanto, vale ressaltar, que não nega sua importância; apenas evidencia, nos processos corporais, as potências de escrituras, sob a premissa de um corpo sem órgãos (CABALLERO, 2011, p. 30). Sobre ele, Derrida (1995), comenta: Mas o teatro assim descolonizado não sucumbira sob sua própria crueldade? Resistirá ao seu próprio perigo? Liberado
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