Buscar

01.MA.COC.Alfabetização e Letramento

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 65 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 65 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 65 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO 
Ana Cecilia Oñativia 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 ALFABETIZAÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA............................................... 3 
2 PSICOGÊNESE DA LECTO-ESCRITA ......................................................... 13 
3 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO ........................................................... 26 
4 PROCESSOS ENVOLVIDOS NO ATO DE LER E ESCREVER ......................... 37 
5 DIFICULDADES DE LEITURA E ESCRITA ................................................... 47 
6 LITERATURA E CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS .............................................. 55 
 
 
 
 
 
3 
 
 
1 ALFABETIZAÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA 
Por que abordar a alfabetização ao longo da história? O ensino das primeiras letras 
sempre foi um tema que problematizou educadores de diferentes épocas e contextos 
históricos. Qual a melhor forma de alfabetizar? Quais seriam os mais eficientes 
recursos metodológicos para garantir não só o acesso às letras, mas o uso funcional da 
leitura e escrita? Estas e outras muitas perguntas possivelmente já foram formuladas 
em algum momento por você e por quem se dedica à importante tarefa de ensinar. 
A ação de alfabetizar não é um mero ato mecânico desprovido de um substrato 
ideológico. Mesmo quando não se tem consciência disto, o ato de alfabetizar implica 
num comprometimento com uma concepção de homem e de educação inserida num 
determinado contexto sócio-histórico e cultural. 
É por este motivo que não é possível enfrentar os desafios que hoje se apresentam em 
nossa sociedade, quando falamos em alfabetização, sem compreender os percursos 
históricos que seguiu a humanidade a partir do momento em que ensinar a ler e 
escrever foi uma necessidade para algumas comunidades para garantir o seu 
desenvolvimento e perpetuidade. 
Neste primeiro bloco de conteúdo, objetiva-se conhecer o processo de criação da 
escrita por parte da espécie humana, assim como seu desenvolvimento ao longo das 
diferentes culturas a fim de realizar posteriormente um paralelo deste processo com o 
caminho percorrido pela criança ao adquirir a escrita. 
Por outro lado, busca-se apresentar o processo histórico do desenvolvimento das 
práticas alfabetizadoras e as concepções que subjazem nessas práticas, pois, acredita-
se ser fundamental que o profissional que se dedica à tarefa de alfabetizar tenha uma 
consciência crítica das diferentes ações de ensino de leitura e escrita, inclusive das que 
irá adotar. 
 
 
 
 
4 
 
1.1 A história da escrita 
O surgimento da escrita apresenta-se como o divisor de águas entre a história e a pré-
história, já que a partir do momento em que a escrita começou a existir iniciou-se o 
registro dos acontecimentos. A partir do surgimento das primeiras comunidades se fez 
necessário um instrumento que permitisse registrar contratos econômicos, civis e 
religiosos, entre outros, possibilitando o desenvolvimento social e econômico. 
No Oriente Médio, a primeira forma de escrita registrada é a cuneiforme. Por volta do 
ano 3000 a.C. os sumérios desenvolveram, na Mesopotâmia, uma escrita silábica para 
representar a língua falada. Os acádios também adotarão este método, levando assim 
à criação dos alfabetos. No mesmo período há o surgimento da escrita hieroglífica no 
Egito Antigo. As civilizações pré-colombianas na América adotam, por exemplo, a 
escrita chinesa. Outros tipos de escrita tiveram origens independentes. 
Com a escrita, a memória se fixa, fica documentada. O pensamento humano deixa de 
ser mítico e se faz reflexivo, racional. É possível rever o que está escrito, repensar o 
passado, analisar o presente e inferir o futuro. O surgimento da escrita implica não 
somente um avanço para a sociedade, mas uma verdadeira transformação do ser 
humano, a linguagem oral é enriquecida pela linguagem escrita tornando-se mais 
elaborada e racional. 
1.2 Breve história das metodologias 
Há alguns anos as páginas de jornal de maior circulação no país e de conhecidas 
publicações na área educacional apresentavam manchetes como: “MEC discute a volta 
do ‘vovô viu a uva’”; “Governo vai rever processo de alfabetização”; “Debate opõe 
linha construtivista, predominante hoje no país, e o método fônico”, entre outras 
(OÑATIVIA, 2009). 
Conforme Oñativia (2009, p. 11), “O debate ultrapassou o âmbito das autoridades 
educacionais e de renomados escritores e pedagogos e chegou às salas de aula”. 
Assim, surgiram questões fundamentais: a revisão proposta em torno das 
metodologias de alfabetização significa necessariamente um retorno ao tradicional 
 
 
 
5 
 
“vovô viu a uva”? Por que, apesar das inovações pedagógicas, cresce o número de 
alunos que chegam ao ensino médio sem saber ler e escrever? Para compreender 
melhor essas questões, podemos olhar para esse cenário sob o prisma dos processos 
sócio-históricos presentes nas práticas alfabetizadoras (MORTATTI, 2000 apud 
OÑATIVIA, 2009). 
Nesta seção, propomo-nos realizar uma revisão da origem histórica das diferentes 
metodologias e propostas de ensino de leitura e escrita, descrevendo brevemente o 
contexto em que surgiram. Entender o atual cenário das práticas alfabetizadoras só 
será possível se considerarmos a perspectiva histórica da alfabetização (OÑATIVIA, 
2009). 
Sabemos que as práticas pedagógicas não nascem de um dia para outro, mas são o 
resultado de um movimento de questionamento do já estabelecido, o que ao mesmo 
tempo não nega uma tentativa de continuidade em relação ao passado. Vamos 
conhecer como aconteceu esse processo histórico? 
De acordo com Oñativia (2009, p. 11-2), 
José Juvêncio Barbosa, em sua obra Alfabetização e Leitura (1994), distingue 
três períodos principais na história do ensino da leitura e escrita: 
1. O primeiro período vai da Antiguidade a meados do século XVIII e é 
marcado pelo uso exclusivo dos chamados métodos sintéticos. 
2. O segundo período começa ainda no século XVIII, e nele se inicia 
um processo de oposição teórica aos métodos sintéticos pelos 
defensores dos métodos analíticos (ou globais), que se efetivam no 
século XX com Ovide Decroly. 
3. O período atual (devemos lembrar que o texto de Barbosa foi escrito em 1994) 
ultrapassa a luta dos defensores das metodologias sintéticas e analíticas, 
questionando-se aquilo que é a peça chave desses métodos: será preciso passar 
pela mediação da fala para aprender a ler? Hoje sabemos que, independente do 
método de alfabetização adotado, o desenvolvimento da consciência fonológica é 
de grande valor para um processo de alfabetização. Porém, sem esquecer que a 
língua escrita é mais do que um código, é antes de tudo um sistema de 
representação (OÑATIVIA, 2009). 
 
 
 
6 
 
1.3 Métodos sintéticos 
Você já ouviu falar nestes métodos? São os mais antigos. Consideram a língua escrita 
como um objeto de conhecimento externo ao aprendiz. O ensino procede do simples 
para o complexo, num processo cumulativo em que a criança aprende primeiro as 
unidades menores da língua (letras, sílabas, palavras) até chegar às unidades maiores 
(frases e textos) (BARBOSA, 1994 apud OÑATIVIA, 2009). 
Segundo Barbosa (1994 apud OÑATIVIA, 2009), nos primórdios do método sintético 
(cerca de 2 mil anos atrás) a criança deveria primeiro dominar o alfabeto, nomeando 
cada uma das letras, independentemente do valor fonético e da grafia, processo este 
conhecido como soletração. Logo após, mostrava-se a grafia das letras “e, numa 
primeira síntese, apresentavam-se as sílabas de forma sistemática e ordenada, para 
depois introduzir as palavras mais simples (monossílabas) e então as mais longas”. 
Nessa prática não acontecia o processo de correspondência entre som (fonema) e 
grafia (letra), já que a passagem se dá diretamente do nome da letra para a sílaba com 
seu respectivo som silábico, por exemplo: be + a = ba. 
Este procedimento pode resultar um tanto confuso para a criança, não é mesmo?E a 
leitura? Como aconteceria? De acordo com Barbosa (1994), “Como a aprendizagem da 
leitura estava estreitamente ligada à aprendizagem da oratória, o ato de ler era 
sempre um exercício de articulação” que buscava aperfeiçoar a pronúncia das 
palavras. “(...) os textos não tinham [sinais de] pontuação, as palavras não eram 
separadas por espaços em branco”, o traçado das letras era rebuscado e a ortografia 
não estava normatizada. O aluno demorava anos para ler um texto completo. Só 
depois desse período é que se iniciava a aprendizagem da escrita. Essa forma de 
ensino se estendeu por toda a Antiguidade e prevaleceu também na Idade Média. 
Você pode imaginar qual é o contexto teórico que dá lugar a estas práticas? Bom, 
evidentemente no início não havia uma teoria pedagógica que as sustentasse. Porém, 
séculos depois, segundo Oñativia (2009, p. 13), “o behaviorismo, teoria do 
conhecimento que considera a aprendizagem como o conjunto de respostas 
observáveis que são obtidas graças a uma ação precisa e determinada de 
 
 
 
7 
 
fornecimento de estímulos por parte do professor”, passa a ser um bom fundamento 
que justifica estas práticas. 
Por outro lado, o método fônico (ou fonético), atualmente utilizado por algumas 
instituições, que parte do ensino do som das letras, é também um tipo de método 
sintético. Foi usado pela primeira vez por educadores alemães já no começo do século 
XVI (OÑATIVIA, 2009). 
Seu ressurgimento com uma nova abordagem é atribuído, no século XX, ao 
psicólogo Jeanne Chall. 
(...) 
Já no século XIX, M. de Laffore lança uma proposta metodológica baseada 
no ensino do som da letra. Nesse momento, as propostas sintéticas já 
começam a coexistir com as analíticas, as quais estudaremos adiante 
(OÑATIVIA, 2009). 
1.4 Métodos analíticos 
Segundo Oñativia (2009, p. 14), no final do século XIX e início do século XX, a psicologia 
genética influenciou apoiadores dos métodos analíticos, que se opõem aos métodos 
sintéticos, alegando que estes não levam em conta a psicologia da criança e acabam 
por se tornar mecânicos, artificiais e não funcionais. Já no século XVIII, Nicolas Adam 
lançava as bases desse novo método. “Sua metodologia propunha que se escrevessem 
palavras significativas para a criança em pedaços de papel de diferentes formatos.” 
Aos poucos, a criança se familiarizava com essas palavras, passando a escrevê-las 
formando frases. “Segundo Adam, a análise da palavra deveria ocorrer numa etapa 
bem posterior ao domínio das palavras apreendidas globalmente.” 
Posteriormente, outro apoiador dos métodos analíticos, Jacotot, sugere que essa 
análise de palavras comece de maneira mais precoce, fazendo surgir assim uma 
proposta mais eclética: o método analítico-sintético. 
As ideias de precursores como Adam e Jacotot necessitaram aguardar uma base 
teórica que desse fundamento a elas. É por isso que só serão colocadas em prática no 
século XX, com o auge da Psicologia da forma ou gestalt. 
 
 
 
 
8 
 
Decroly abandona a ideia da oralização, afirmando que a escrita é uma 
linguagem autônoma que remete diretamente ao sentido, sem a passagem 
obrigatória pelo oral. (...) Portanto, a aprendizagem da leitura é baseada no 
reconhecimento global de frases significativas para a criança, fase que deve 
durar o maior tempo possível (BARBOSA, 1994 apud OÑATIVIA, 2009). 
1.5 Práticas alfabetizadoras na atualidade 
De acordo com Oñativia (2009, p. 14-15), 
Hoje, as práticas alfabetizadoras variam de acordo com os princípios 
teóricos e metodológicos que norteiam as propostas curriculares de cada 
país. Assim, por exemplo, na Itália, desde 1995, deixou-se de adotar apenas 
um método de ensino e passou a ser utilizada uma concepção chamada de 
natural, que trabalha simultaneamente com a instrução fônica e as técnicas 
visuais, além de levar em conta a experiência prática da criança. (...) Na 
Espanha, as escolas empregam vários métodos, entre eles o fônico, mas a 
proposta construtivista possui demarcada influência. No Brasil, os 
Parâmetros Curriculares Nacionais, no que se refere à língua portuguesa 
têm como base a concepção construtivista. 
Antes de abordar o momento atual da alfabetização no Brasil, seria interessante 
apresentar um breve panorama histórico das metodologias de alfabetização neste 
país. Mortatti (2000) realiza um estudo do desenvolvimento das metodologias de 
alfabetização que abrange o período de 1876 a 1994 (OÑATIVIA, 2009). 
Vejamos quais são estes momentos. 
Num primeiro momento, tem destaque o embate entre os partidários do “método 
João de Deus” (baseado na palavração) e os partidários dos então tradicionais 
métodos sintéticos (soletração e silabação) em que se fundamentavam as primeiras 
cartilhas feitas por brasileiros. O método “João de Deus” passa a ser difundido no 
Brasil a partir do início da década de 1980 por Antonio da Silva Jardim, sendo 
apresentado como um método de base científica (OÑATIVIA, 2009). 
Num segundo momento, acontece grande polêmica entre os partidários de um e outro 
método. 
A Diretoria Geral de Instrução do Estado de São Paulo determinou a 
obrigatoriedade da adoção do método analítico nas escolas públicas. Em 
1920 essa lei foi revogada, estabelecendo a liberdade de cátedra na opção 
do método de alfabetização. Foi a chamada Reforma Sampaio Dória. 
Num terceiro momento, a partir de 1920, defensores do método misto 
(analítico-sintético ou sintético-analítico) e partidários do método analítico 
 
 
 
9 
 
voltam a disputar a primazia dessas diferentes tendências, porém com uma 
propensão cada vez maior de relativizar a importância de cada método (...) 
(OÑATIVIA, 2009). 
O quarto momento, o mais próximo do atual, caracteriza-se pela emergência de uma 
“revolução conceitual”, aproximadamente no final da década de 1970. Emilia Ferreiro 
é quem a propõe e ela muda radicalmente o foco do processo, que estava colocado 
em quem ensina, para o sujeito que aprende, o sujeito cognoscente. Não se tratava de 
uma nova metodologia, mas sim de uma concepção pedagógica que parte do princípio 
de que o sujeito que aprende constrói conhecimento ao interagir com seu objeto de 
conhecimento. Portanto, em se tratando de leitura e escrita, o sujeito ao interagir com 
sua língua é capaz de “recriar” a escrita. “Tal concepção baseia-se na epistemologia 
genética de Jean Piaget (1896-1980) e passa a se denominar construtivismo” 
(OÑATIVIA, 2009). 
Segundo Mortatti (2000 apud Oñativia, 2009, p. 16), “Essas mudanças são resultado de 
uma intensificação dos estudos e pesquisas centrados na psicologia e, mais 
recentemente, na psicolinguística, na sociolinguística e na linguística”. Com base 
nesses estudos surgiram propostas didático-pedagógicas que procuram respeitar o 
processo de construção do conhecimento por parte da criança. 
Por outro lado, 
Atualmente, defensores do método fônico questionam a eficiência do 
construtivismo, baseando-se em detalhadas pesquisas experimentais que 
relacionam as cifras de analfabetismo no Brasil e os números 
correspondentes aos países desenvolvidos que adotaram o método fônico 
(OÑATIVIA, 2009, p. 16). 
Mas será que esta problemática brasileira pode ser atribuída apenas às práticas 
alfabetizadoras? Pensamos que as causas do analfabetismo no Brasil passam por 
outros contextos muito mais complexos da nossa realidade socioeconômica e cultural. 
De qualquer maneira, é importante analisar as ideias que subjazem nas práticas de 
alfabetização. Toda prática pedagógica não acontece de forma isolada. É evidente que 
por trás dela há sempre um conjunto de ideias que a sustenta, mesmo quando o 
professor não tem consciência dessas ideias, concepções e teorias, elas estão 
presentes (WEISZ, 1999). 
 
 
 
10 
 
É desta forma que Telma Weisz (1999) aborda esta temática colocando que para 
compreender a ação do professor é preciso analisá-la com o intuito de desvelar os 
seguintes aspectos: 
• Qual é a concepçãoque o professor tem do conteúdo que ele espera que o 
aluno aprenda? 
• Qual é a concepção que o professor tem do processo de aprendizagem? 
• Qual é a concepção que o professor tem de como deve ser o ensino? 
O empirismo é a teoria que historicamente mais vem influenciando as concepções 
sobre o que é ensinar, quem é o aluno e como ele aprende. O modelo de 
aprendizagem que se deriva desta teoria é conhecido como de “estímulo-resposta”. A 
aprendizagem então é entendida como a substituição de respostas erradas por 
respostas certas (WEISZ, 1999). 
Segundo Weisz (1999), a hipótese que subjaz a essa concepção é a de que o aluno 
precisa fixar informações das mais simples para as mais complexas. O modelo de 
cartilha, que na maioria das vezes responde ao método sintético, tem como base esta 
ideia. 
Qual seria então a concepção de língua escrita (conteúdo) que subjaz ao modelo de 
cartilhas? 
Elas trabalham com uma concepção de língua escrita como transcrição da fala. Em 
geral, apresentam palavras-chave e famílias silábicas usadas de forma exaustiva. 
Portanto, a função do material presente nas cartilhas é apenas a de ajudar o aluno a 
decodificar o sistema alfabético (WEISZ, 1999). 
Como se apresenta o texto, portanto, no modelo de cartilhas? Os textos nas cartilhas 
são um agregado de frases desconectadas. São textos artificiais e sem criatividade. 
E em relação ao processo de aprendizagem? Qual a concepção deste processo nas 
práticas que estamos analisando? Na concepção empirista, o conhecimento está fora 
do sujeito e será internalizado através dos sentidos. O aluno é como uma folha em 
 
 
 
11 
 
branco que será preenchida pelo professor. Paulo Freire referia-se a esta forma de 
ensinar como “educação bancária”. Portanto, o aprendiz vai juntando informações e 
supõe-se que em algum momento irá se produzir um “estalo” no processo de 
aprendizagem (WEISZ, 1999). 
Em relação ao processo de ensino, este é caracterizado por práticas que se sustentam 
na cópia, na escrita sob o ditado, na memorização, na mecânica da leitura. 
Qual seria uma saída para a mudança deste modelo? Segundo Weisz (1999), para 
mudar será necessário reconstruir toda a prática a partir de um novo paradigma 
teórico. 
Na perspectiva construtivista, o conhecimento não é concebido como uma cópia do 
real, ele pressupõe uma ação por parte de quem aprende sobre o objeto de 
conhecimento, neste caso a língua escrita, que organiza e integra os novos 
conhecimentos àqueles já existentes. Porém, Weisz (1999) chama a nossa atenção 
para os casos em que o professor procura inovar sua prática adotando um modelo de 
ensino construtivista sem compreender suficientemente as questões que o sustentam. 
Desta forma, termina mesclando em sua própria prática um modelo que lhe era 
familiar com outro pelo qual não tem muito domínio. 
Outra distorção destas práticas espontaneístas, é a de pensar que o professor não 
precisa intervir no processo de alfabetização ou intervir muito pouco, já que o sujeito 
por si só será quem irá construir o conhecimento (WEISZ, 1999). 
Weisz (1999) também nos chama a atenção para a complexidade dos conteúdos 
escolares e que, portanto, devem ser dados a conhecer aos alunos por inteiro. Se 
partirmos do princípio de que a língua escrita é complexa, ela deverá ser oferecida por 
inteiro para os alunos. 
Pensando assim caberá ao professor criar situações que permitam aos 
alunos vivenciar os usos sociais que se faz da escrita, as características dos 
diferentes gêneros textuais, a linguagem adequada a diferentes contextos 
comunicativos, além do sistema pelo qual a língua é grafada, o sistema 
alfabético (WEISZ, 1999). 
 
 
 
12 
 
Levar o aluno a participar de situações sociais nas quais os textos reais são usados e 
ensinar a pensar sobre os usos e funcionamento da língua escrita deverão ser as 
principais metas de um professor alfabetizador (WEISZ, 1999). 
Podemos concluir, então, que num modelo empirista a informação é introjetada de 
fora. Num modelo construtivista, o aprendiz tem que transformar a informação para 
poder assimilá-la. Portanto, destas concepções derivam-se práticas diferentes. 
Conclusão 
A partir do que foi apresentado até agora, gostaríamos de refletir acerca da distância 
entre a prática e o discurso teórico. Em muitos casos, existe uma grande distância 
entre o que a escola declara fazer e o que de fato faz (OÑATIVIA, 2009). Muitas vezes 
adota-se uma determinada metodologia sem saber os princípios que a fundamentam, 
e ainda mais, sem saber ao certo como aplicá-la. 
Consideramos de suma importância que o professor alfabetizador seja antes de tudo 
um atento observador de seus alunos, identifique as necessidades deles e esteja 
familiarizado com a proposta a ser aplicada. Seja qual for ela, a pedra angular do 
processo é o uso de materiais e orientações estruturados e previamente elaborados. O 
educador deverá entender os fundamentos da proposta que aplica, ou seja, não 
apenas como aplicar, mas também por que e quando aplicar (OÑATIVIA, 2009). 
REFERÊNCIAS 
BARBOSA, J. J. Alfabetização e leitura. 2. ed. rev. São Paulo: Cortez, 1994. 
OÑATIVIA, A. C. Alfabetização em três propostas: da teoria à prática. São Paulo: Ática, 
2009. 
WEISZ, T. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. São Paulo: Ática, 1999. 
 
 
 
 
 
 
13 
 
 
2 PSICOGÊNESE DA LECTO-ESCRITA 
Segundo Omodei e Martini (2016, p. 35), 
Por muito tempo, a principal preocupação dos pesquisadores na área da 
alfabetização girou em torno da técnica, procurando-se definir qual é a 
melhor e mais eficaz metodologia para alfabetizar. 
A partir da segunda metade do século XX, os estudiosos mudaram 
radicalmente o foco de suas pesquisas: deixaram de se perguntar qual é o 
melhor método para alfabetizar e começaram a se perguntar como pensa a 
criança que está aprendendo a ler e a escrever. Essa pergunta foi a porta de 
entrada para outras questões importantes. 
Questões estas como: o processo de aquisição da leitura e da escrita inicia-se com o 
ingresso da criança na escola? Ou a criança já traz conhecimentos sobre leitura e 
escrita quando ingressa na escola? Se ela traz conhecimentos consigo, que tipo de 
conhecimentos são esses? As habilidades consideradas pré-requisitos para o processo 
de alfabetização, tais como coordenação motora e discriminação auditiva, garantem 
por si só sucesso nesse processo? Ou existem outros aspectos que devem ser levados 
em conta? Em que momento o educador pode considerar que o aluno está 
alfabetizado: quando termina o conteúdo da cartilha e reconhece todas as letras do 
alfabeto ou quando é capaz de usar funcionalmente a escrita e consegue ler e 
interpretar textos? O que deve ser ensinado primeiro: a leitura ou a escrita? Ou esses 
processos podem ocorrer simultaneamente? Deve-se iniciar a escrita pela letra cursiva 
ou pela letra de forma? Ou ambas devem ser apresentadas simultaneamente? Essas 
são algumas de tantas questões que têm acometido e ainda acompanham o professor 
alfabetizador. 
Emilia Ferreiro e alguns colaboradores realizaram investigações científicas que 
demonstraram que a criança reconstrói o código linguístico pensando sobre o que a 
escrita representa e como ela se organiza. Com essas pesquisas, muitos dos 
questionamentos apresentados acima começaram a ser respondidos. 
 
 
 
14 
 
Neste bloco temos por objetivo discutir como ocorre o processo de construção do 
conhecimento sobre a escrita na criança, assim como oferecer direcionamentos para a 
intervenção neste processo. 
2.1 Níveis de construção do sistema alfabético1 
No processo de aprendizagem da leitura e da escrita, Fernandes e Hailer (1996) 
distinguem cinco níveis conceituais linguísticos: 
• Nível 1: pré-silábico (que se divide em fase pictórica, fase gráfica primitiva e 
fase pré-silábica propriamente dita). 
• Nível 2: intermediário I. 
• Nível 3: silábico. 
• Nível 4: intermediário II ousilábico-alfabético. 
• Nível 5: alfabético. 
A seguir, apresentaremos com mais detalhes cada um deles. 
Nível 1: pré-silábico 
Fase pictórica 
Assim como no caso do homem primitivo, o primeiro registro da criança é o desenho, 
inicialmente sem figuração (a garatuja ou os rabiscos que o professor do ensino infantil 
observa com tanta frequência). Falamos “sem figuração” porque inicialmente o 
traçado da criança é muito mais a expressão de um ato motor, de um gesto que se 
imprime no papel (VIGOTSKI, 1989). Inicialmente esses rabiscos são linhas retas em 
ziguezague ou em diferentes direções que aos poucos vão se fechando, tomando 
formas arredondadas, as conhecidas “bolinhas”, que futuramente representarão 
letras. 
(...) 
 
1 Texto extraído do capítulo 2 do livro Alfabetização em três propostas: da teoria à prática de Ana 
Cecilia Oñativia, Editora Ática, 2009. p 27-32 
 
 
 
 
15 
 
Fase gráfica primitiva 
Nessa fase, a criança começa a diferenciar o ato de desenhar do ato de escrever. 
Mesmo não sabendo realizar a grafia correta das letras, ela realiza tentativas de 
aproximação da escrita, e em resultado produz pseudoletras, letras misturadas com 
números, rabiscos. A grande diferença em relação à fase anterior reside no fato de 
que, mesmo se tratando de rabiscos, eles têm uma intencionalidade bem definida: 
escrever. (...) 
Vejamos um exemplo de escrita nesta fase: 
 
Fase pré-silábica 
Na fase pré-silábica propriamente dita, a criança começa a diferenciar letras de 
números, desenhos ou símbolos e reconhece o papel das letras na escrita. Entende 
que elas servem para escrever, porém ainda não sabe como, e por isso apresenta 
algumas hipóteses sobre a escrita: 
• Percebe que o traçado segue uma linearidade, da esquerda para a direita e de 
cima para baixo. Já possui uma organização maior no espaço gráfico. 
• Usa letras do próprio nome ou de palavras que conhece de memória para 
arriscar suas hipóteses de escrita. 
• (...) 
• Tem uma leitura global; identifica a palavra como um todo sem fazer a análise 
dela. 
 
 
 
16 
 
• Relaciona as palavras que escreve com as características dos objetos que 
representam, porém sem atribuir ainda sua relação com o som. Essa 
característica é denominada realismo nominal. 
• (...) 
• Tem a concepção de que só é possível escrever com muitas letras (em geral 
mais de três ou quatro). (...) 
Seguem alguns exemplos de escrita da criança nesta fase: 
 
Nível 2: intermediário I 
Como em todo momento de transição, neste nível a criança começa a repensar suas 
hipóteses do nível pré-silábico e fica insegura, pois ainda não conseguiu descobrir a 
organização do sistema linguístico. Geralmente ocorre a negação da escrita, e surgem 
muitos questionamentos. (...) 
Neste nível, o alfabetizador começa a notar certa constância na escrita da criança, já 
que ela percebe algumas relações entre pronúncia e escrita, principalmente no que se 
refere a sons iniciais. Por exemplo, ela identifica a letra inicial de uma palavra e a 
escreve ou relaciona a letra do seu nome com a mesma de outros nomes ou palavras. 
(...) 
 
 
 
 
 
17 
 
Nível 3: silábico 
Este nível representa um grande avanço no processo de construção do sistema 
alfabético da escrita, já que é a partir deste momento que a criança realiza uma grande 
descoberta: a escrita representa a fala. De início, ela supõe que a forma de 
representação é silábica. É muito comum ouvir crianças dizendo que precisam escrever 
o número de letras que corresponde à quantidade de vezes que abriram a boca para 
falar. Isso confere uma sistemática à escrita da criança. Muitas vezes ela “conta” os 
pedaços sonoros antes de escrever. Outras vezes, principalmente no início desta fase, 
a criança não prevê a quantidade de letras que deve colocar na palavra, mas ao ler, 
como sua leitura já é silábica, percebe que sobram elementos e decide apagá-los ou 
riscá-los. 
(...) 
Outras características comuns deste nível são a escrita de uma letra para cada palavra 
nas frases e a falta de definição das categorias linguísticas (artigo, substantivo, verbo 
etc.). 
Nível 4: intermediário II ou silábico-alfabético 
Os conflitos cognitivos vivenciados no nível anterior levam a criança a repensar a lógica 
do nível silábico. Ninguém consegue ler o que ela escreve, e a escrita do adulto é 
diferente da sua. É o momento em que se torna necessário respeitar o valor sonoro, e 
a criança começa a acrescentar letras, principalmente na primeira sílaba. Exemplo: 
MACC (macaco), TIGE (tigre). (...) 
Sua leitura, como no nível anterior, é termo a termo, e não mais global. Neste 
momento, a criança encontra-se a um passo do nível alfabético, e é fundamental que o 
professor a leve a refletir sobre seus conflitos, repensando o sistema linguístico, 
comparando sua escrita com a escrita convencional e assim reconstruindo o código. 
 
 
 
 
 
18 
 
Nível 5: alfabético 
Nesse nível, a criança compreende a lógica da base alfabética da escrita e descobre 
que uma sílaba geralmente é grafada por mais de uma letra (em geral, duas ou três). 
Portanto, ela evolui significativamente no conhecimento do valor sonoro convencional 
de todas as letras – ou pelo menos de grande parte delas –, juntando-as para formar 
sílabas e palavras. 
No texto, a criança inicia a discriminação entre letra, sílaba, palavra e frase. É claro 
que, principalmente no começo, ainda não divide a frase de maneira convencional, 
mas sim de acordo com o ritmo. Por exemplo, a criança escreveria a seguinte frase: 
“Gostomuito daminha escola”. Assim, sua escrita é inicialmente fonétic,a e não 
ortográfica; ela escreve como fala, e não segundo as regras do sistema ortográfico. 
Já a sua leitura, que era termo a termo, passa aos poucos a adquirir característica 
lexical, isto é, a criança lê a palavra como um todo e gradativamente vai ganhando 
fluência, sobretudo nas palavras muito conhecidas, que já fazem parte de seu 
repertório. 
2.2 Sondagem de leitura e escrita 
Esta avaliação inicial pode ser empregada com diferentes objetivos: 
• A avaliação de alunos com dificuldades de aprendizagem, para iniciar um 
trabalho de intervenção psicopedagógica; 
• Para identificar em que momento do processo de construção de leitura e 
escrita se encontram os alunos que iniciam o 1º ou 2º ano do ensino 
fundamental. 
Curto, Morillo e Teixidó (2000), no livro “Escrever e Ler”, apresentam uma proposta de 
avaliação completa e de fácil aplicação. Essa proposta se divide em dois grandes itens. 
 
 
 
 
 
19 
 
Avaliação inicial dos procedimentos de escrita 
A primeira parte desta avaliação é bastante conhecida pelos educadores, propõe-se 
que o aluno escreva, em primeiro lugar, seu nome. A seguir pede-se que escreva 
quatro nomes, em forma de lista (um debaixo do outro), pertencentes a um mesmo 
campo temático (animais, plantas, brinquedos, alimentos, etc.) Por último, uma frase 
simples que contenha um das quatro palavras anteriores. Após cada palavra escrita 
pela criança e após a frase solicita-se que leia, marcando com o dedo onde está lendo. 
É fundamental que o professor registre a forma em que a criança lê, já que isto 
influenciará na identificação do nível em que se encontra a criança. 
Procedimentos de escrita a partir do domínio da transcrição 
Textos memorizados 
Propõe-se à criança que escreva um texto, ou parte dele, que conheça de memória, 
com o objetivo de evitar a interferência de processos de construção do texto. Pode ser 
uma parlenda, letra de uma música etc. 
É preciso observar: 
• O alinhamento, a caligrafia e o manejo do lápis; 
• Separação de palavras, noções de ortografia; 
• Escrita do título, diferenciação ou não do texto. 
Reescrita de um texto conhecido 
Solicita-se que a criança escreva um fragmento de um conto infantil, previamente 
conhecido, com ou sem imagem de apoio. 
É preciso observar:• Como a criança organiza oralmente suas ideias; 
• Diferenciação entre formas próprias da linguagem oral e a estrutura da linguagem 
escrita; 
 
 
 
20 
 
• Formas específicas do texto narrativo; 
• Coloca título e o diferencia do corpo do texto. 
Avaliação inicial dos procedimentos de leitura. 
O que tem neste cartão serve para ler? 
Apresentam-se à criança diversos cartões com grafismos diferentes (palavras em 
cursiva, bastão, letras repetidas ou não, cartão em branco, pseudoletras, cifras etc.). 
Colocam-se os cartões misturados em cima da mesa e convida-se a criança a fazer duas 
pilhas: 
• Uma, com os cartões que servem para ler, ou que podem ser lidos; 
• Outra, com os cartões que não servem para ler, ou não podem ser lidos. 
O objetivo desta atividade é averiguar as ideias que a criança formula sobre a escrita, 
como interpreta os símbolos gráficos. Por isso, é importante anotar todas as 
justificativas dadas pela criança. 
Hipótese sobre o conteúdo do escrito 
Apresentar à criança uma folha com três ou quatro nomes próprios escritos, entre os 
quais esteja o nome dela. Será observado o tipo de leitura que realiza e lhe pediremos 
que aponte o seu nome. 
Interpretação de textos com imagens: usam-se quatro cartões com imagens que 
contenham texto, combinando imagem e texto. 
Procedimentos de leitura a partir da decifração 
Textos memorizados ou muito conhecidos 
Propõe-se a leitura de um texto, ou parte dele, que a criança saiba de cor (poema, 
parlenda etc.). Serão observados aspectos referentes à decodificação da escrita 
(conhecimento das letras e sua correspondência sonora, identificação de palavras ou 
determinados fragmentos etc.). 
 
 
 
21 
 
Textos desconhecidos 
Preferencialmente, se escolhe um texto curto, narrativo, adequado à idade da criança. 
Será observada a qualidade da decifração, a capacidade de integração do significado 
de cada palavra, capacidade de inferir o significado de cada palavra, identificação da 
estrutura do texto. 
Após a identificação do nível em que o aluno se encontra é importante saber quando e 
como intervir de modo adequado para que ele possa passar qualitativamente de um 
nível para outro. É sobre isso que trataremos a seguir, fazendo referência aos 
principais níveis de construção da escrita. 
2.3 Didática do nível pré-silábico2 
Neste nível existem alguns importantes desafios para a criança: 
• Reconhecer a escrita como uma representação diferente do desenho e 
identificar que a leitura de palavras se realiza com base nos caracteres gráficos 
e não dos desenhos. 
• Descobrir o significado dos sinais escritos e o que eles representam. 
• Superar o realismo nominal, isto é, descobrir que o “tamanho da palavra” 
(quantidade de letras) não está diretamente ligado ao tamanho ou às 
características do objeto que representa, mas sim aos sons que a palavra 
representa. 
• Distinguir categorias linguísticas, ou seja, letras, palavras, frases e textos. 
De acordo com a proposta de Esther Grossi (1990), abordaremos algumas estratégias 
que o alfabetizador pode seguir no nível pré-silábico, em três instâncias: letras, 
palavras e textos. 
 
 
 
2 Texto extraído do capítulo 3 do livro Alfabetização em três propostas: da teoria à prática de Ana 
Cecilia Oñativia, Editora Ática, 2009. p 33-35 
 
 
 
22 
 
1. Letras 
• (...) 
• Realize atividades que permitam a análise dos aspectos topológicos 
das letras: pode-se cobri-las com barbante a fim de perceber espaços 
abertos e fechados, linhas curvas e retas; pode-se também passar o 
dedo em letras confeccionadas com lixa e outros materiais que se 
destaquem no papel. 
• (...) 
• Introduza aspectos sonoros por meio da percepção de rimas e sons 
iniciais. 
2. Palavras 
• Relacione os objetos ou as imagens à representação do nome 
(palavras). 
• (...) 
• Propicie a análise das palavras, mas não de forma silábica, e sim em 
relação às suas letras iniciais, finais, número e variedade de letras e 
ordem em que aparecem. 
• (...) 
Textos 
• Vincule o discurso oral ao texto escrito; para isso, é muito útil que o 
professor leia para seus alunos, que os alunos “imaginem” o que está 
escrito, com base em figuras, acompanhem uma poesia, música ou 
parlenda escrita à medida que a ouvem, entre outras atividades. 
• (...) 
 
 
 
 
 
23 
 
2.4 Didática do nível silábico3 
A seguir, apresentamos algumas estratégias possíveis para o professor do nível 
silábico: 
1. Letras 
• Estabeleça uma relação entre as letras e os sons que elas representam. Essa 
análise deverá acontecer espontaneamente e dentro de contextos 
significativos. Em geral, o aluno começa a identificar os sons iniciais das 
palavras. 
2. Palavras 
• Proporcione a identificação do som das letras por meio da análise da sílaba 
inicial das palavras. 
• Contraste as palavras que o aluno escreve com base na memória ou lê 
globalmente e a sua escrita silábica; classifique conjuntos de palavras segundo 
o número de letras; segmente oralmente as palavras em sílabas; troque 
oralmente o lugar das sílabas nas palavras. 
3. Textos 
• Dê continuidade ao trabalho com diferentes portadores de texto. 
• (...) 
2.5 Didática do nível alfabético4 
Neste nível, a criança por fim compreende que cada um dos grafemas corresponde a 
valores sonoros menores que a sílaba. Ela conhece o valor sonoro de todas – ou quase 
todas – as letras; entretanto enfrentará ainda alguns desafios (...): 
 
 
3 Texto extraído do capítulo 3 do livro Alfabetização em três propostas: da teoria à prática de Ana 
Cecilia Oñativia, Editora Ática, 2009.p 33-35 
4 Idem. p 33-5 
 
 
 
24 
 
• Aprender as convenções ortográficas. 
• Entender que às vezes falamos de um jeito e escrevemos de outro. 
• Separar as palavras numa frase. 
• Entender a diferença entre letras, sílabas e frases. 
Conclusão 
É importante pensar que atualmente, em virtude de fatores sociais, econômicos e 
culturais, em muitas sociedades a criança ingressa cada vez mais cedo na escola e no 
“mundo letrado”. Atualmente a escrita está presente em grande parte de nossas 
atividades do cotidiano e acaba ultrapassando os muros escolares. Para darmos conta 
de muitas tarefas, apropriamo-nos dela nas suas mais diversas formas e meios: 
cartazes, televisão, jornais, produtos de consumo etc., e a isso chamamos mundo 
letrado. 
De acordo com Oñativia (2009), esse fator nos leva a repensar as práticas de 
alfabetização. Segundo a postura socioconstrutivista, a alfabetização é um processo de 
interação com a língua escrita em que o grande desafio não é apenas decodificar, mas 
também compreender os usos sociais da escrita. Um ser alfabetizado é aquele capaz 
de utilizar a escrita como um instrumento que lhe permite sugerir, pensar, apreciar, se 
comunicar, ou seja, entrar na cultura escrita e ser membro de pleno direito. 
REFERÊNCIAS 
CURTO, L. M.; MORILLO, M. M. e TEIXIDÓ, M.M. Escrever e ler: como as crianças 
aprendem e como o professor pode ensiná-las a escrever e a ler. Tradução de Ernani 
Rosa; Supervisão e revisão técnica da tradução: Ana Maria Netto Machado. Porto 
Alegre: Artes Médicas, 2000. Vol. 1 
GROSSI, E. P. Didática da Alfabetização. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990. Vols. 1, 2 e 
3. 
 
 
 
25 
 
OMODEI J. D.; MARTINI A. B. O processo de alfabetização e letramento praticado 
pelos professores dos anos iniciais do ensino fundamental. Revista Conteúdo, Capivari, 
v.11, n.1, jul./dez. 2016. Disponível em: <http://tiny.cc/r7aa6y>. Acesso em: 5 maio 
2019. 
OÑATIVIA, A. C. Alfabetização em três propostas: da teoria à prática. São Paulo: Ática, 
2009. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
26 
 
 
3 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO 
No bloco 1 fizemos uma apresentação do caminho percorrido pelas práticas 
alfabetizadoras ao longo da história no mundo e no Brasil. Como foi possívelobservar, 
de acordo com Soares (2011, p. 96), nos deparamos com 
sucessivas mudanças conceituais e, consequentemente, metodológicas. 
Atualmente parece que de novo estamos enfrentando um desses momentos 
de mudança (...): pesquisas que têm identificado problemas nos (...) 
resultados da alfabetização de crianças no contexto escolar (...). 
Um momento como este é, sem dúvida, desafiador, porque estimula a 
revisão dos caminhos já trilhados e a busca de novos caminhos, mas é 
também ameaçador, porque pode conduzir a uma rejeição simplista dos 
caminhos trilhados e a propostas de solução que representem desvios para 
indesejáveis descaminhos. 
A autora encontra possíveis explicações para os caminhos e descaminhos que vimos 
percorrendo na área da alfabetização na relação entre os conceitos de alfabetização e 
letramento. Daí a importância de abordá-los. 
Portanto, temos como objetivo neste bloco abordar os conceitos de alfabetização e 
letramento, bem como a necessidade de uma formação continuada para professores 
alfabetizadores competentes. Também buscamos uma compreensão da leitura e 
escrita como competências de desenvolvimento social e intelectual. 
3.1 Escrita, alfabetização e letramento 
Quando falamos de escrita estamos nos referindo a um objeto de estudo e ao mesmo 
tempo a um produto cultural que não é adquirido de forma espontânea, mas pelo 
contrário, exige um esforço sistemático e direcionado. Daí que falar em escrita nos 
conduz necessariamente a falar em alfabetização que pode ser entendida como o 
processo pelo qual se adquire o sistema convencional de escrita. Já o letramento 
refere-se ao conjunto de comportamentos e habilidades de uso competente da leitura 
e escrita em práticas sociais. Segundo Soares (2011, p. 97), “distinguem-se tanto em 
relação aos objetos de conhecimento, quanto em relação aos processos cognitivos e 
linguísticos de aprendizagem e, portanto, também de ensino desses diferentes 
 
 
 
27 
 
objetos”. Vale ressaltar que, embora distintos, estes processos são interdependentes e 
indissociáveis. 
De acordo com o que já estudamos no bloco 1, podemos dizer que até os anos 80 a 
alfabetização escolar no Brasil buscava em primeiro lugar ensinar o código da língua 
escrita, para só depois desta etapa ensinar a ler textos e escrever com autonomia. A 
influência do construtivismo no processo de alfabetização nos faz rever estes conceitos 
diluindo a distinção entre aprendizagem do código alfabético e as práticas efetivas de 
leitura e escrita. Segundo a proposta construtivista, a criança, quando se alfabetiza, já 
se encontra em um contexto letrado. Portanto, a tarefa de alfabetização deve 
acontecer levando-se em conta esse contexto e oferecendo ferramentas para que a 
criança se aproprie dessas práticas com o uso de materiais reais de leitura e escrita. 
Segundo Soares (2011), a aplicação da teoria construtivista para alfabetização trouxe 
um equívoco entre os professores, já que ao enfatizar os 
(...) processos espontâneos de compreensão da escrita pela criança, ter 
condenado os métodos que enfatizavam o ensino direto e explícito do 
sistema de escrita (...), os professores foram levados a supor que (...) as 
relações entre a fala e a escrita seriam construídas pela criança de forma 
incidental e assistemática, como decorrência natural de sua interação com 
inúmeras e variadas práticas de leitura e de escrita, ou seja, através de 
atividades de letramento, prevalecendo, pois, estas sobre as atividades de 
alfabetização. 
Tentou-se corrigir o problema dos métodos tradicionais que enfatizavam a mecânica 
da escrita, ressaltando-se o processo de letramento e relevando-se o ensino 
sistemático da correspondência entre as letras e seus respectivos sons. Possivelmente 
isto explique, segundo Soares (2011), o fato de virem “surgindo (...) propostas de 
retorno a um método fônico como solução para os problemas que estamos 
enfrentando” no processo de alfabetização. Qual seria então a solução deste 
problema? Acreditamos que considerar ambos os processos, o de ensino do código 
escrito, sem desmerecer a sua importância, isto é, a alfabetização, e o de letramento. 
Ambos processos devem caminhar juntos. 
A criança deve ser alfabetizada, construir 
 
 
 
28 
 
seu conhecimento do sistema alfabético e ortográfico da língua escrita, em 
situações de letramento, isto é, no contexto de e por meio de interação com 
material escrito real, e não artificialmente construído, e de sua participação 
em práticas sociais de leitura e de escrita (...) (SOARES, 2011). 
O caminho para a superação dos problemas que estamos enfrentando, todas as 
facetas do processo de aprendizagem inicial da língua escrita devem se articular e 
integrar. Isto significa que devemos alfabetizar letrando ou letrar alfabetizando 
(SOARES, 2011). 
3.2 Ambiente alfabetizador e agrupamentos produtivos 
De acordo com Lima e Dantas (2013), o processo de alfabetização não se resume na 
aplicação de uma determinada metodologia. Mesmo quando direcionada a um grupo, 
cada aluno apresentará suas necessidades e uma modalidade própria para aprender, 
apresentando novos desafios para o educador. Emília Ferreiro, discípula de Piaget e 
seguindo seus ensinamentos, considera o processo de aquisição da leitura como um 
processo de construção de conhecimento sobre a escrita por parte do aluno. Desta 
forma, muda o foco, que tradicionalmente era colocado no educador, para colocá-lo 
no aluno. Segundo Piaget, o conhecimento não é transmitido, nem se deposita 
unidirecionalmente do adulto para a criança; pelo contrário, o conhecimento é 
construído na interação com o objeto de conhecimento. Emilia Ferreiro dirá, então, 
que a criança recria o código linguístico na medida em que interage com esse objeto 
de conhecimento que é a língua escrita. É como se ela fizesse uma “redescoberta” da 
escrita. 
É importante nos determos nesses conceitos: “reconstruir” e “recriar”. O prefixo “re”, 
nesses casos, refere-se a algo como “retorno” ou “voltar a fazer”. Portanto, não se 
trata de uma construção nova e original, mas sim de se apropriar de um produto 
cultural já existente antes mesmo da criança, que tem suas próprias regras. É nesse 
processo de apropriação que a criança percorre um caminho similar ao seguido pela 
humanidade na sua engenhosa obra de criação do código da língua escrita. Isso implica 
que quem já adquiriu o dito código – no caso, o professor alfabetizador – deverá 
intervir nesse processo, possibilitando que o aluno se aproprie do código, refletindo, 
 
 
 
29 
 
criando hipóteses, errando, refazendo e entrando em conflito para sentir-se 
impulsionado em busca de uma solução. 
Por outro lado, se faz necessário pensar que atualmente, em virtude de fatores sociais, 
econômicos e culturais, em muitas sociedades a criança ingressa cada vez mais cedo na 
escola e no “mundo letrado”. Atualmente, a escrita está presente em grande parte de 
nossas atividades do cotidiano e acaba ultrapassando os muros escolares. Para darmos 
conta de muitas tarefas, apropriamo-nos dela nas suas mais diversas formas e meios: 
cartazes, televisão, jornais, produtos de consumo etc., e a isso chamamos mundo 
letrado. 
Esse fator nos leva a repensar as práticas de alfabetização. Afinal, o que devemos fazer 
com o conhecimento que a criança traz para a sala de aula? De forma alguma eles 
podem ser ignorados, pois são o ponto de partida para o processo sistemático de 
alfabetização. Mas o que se entende por “alfabetizar”? Segundo a postura 
socioconstrutivista, a alfabetização é um processo de interação com a língua escrita 
em que o grande desafio não é apenas decodificar, mas também compreender os usos 
sociais da escrita. Um ser alfabetizado é aquele capaz de utilizar a escrita como um 
instrumento que lhe permite sugerir, pensar, apreciar, se comunicar, ou seja, entrar na 
cultura escrita e ser membro de pleno direito. 
Esta concepção nosindica que o que chamamos de “ambiente alfabetizador” não se 
reduz apenas ao ambiente escolar. A partir do momento em que a criança faz parte de 
um ambiente letrado, todo ambiente é alfabetizador, desde os livros e jornais que 
podem circular na sua família até os outdoors da rua, sem falar das mídias eletrônicas. 
Portanto, o professor deverá saber como aproveitar esses contextos e levá-los para a 
sala de aula e também saber usar os espaços externos à sala para alfabetizar. 
No atual cenário educacional, tem sido um grande desafio alfabetizar alunos 
proporcionando uma atenção individualizada e de qualidade. Em muitos casos, nos 
deparamos com salas de aula muito heterogêneas e muito numerosas. Existem 
estudos que demonstram que uma alternativa muito eficiente é a de trabalhar com 
agrupamentos produtivos. Vejamos então o que vem a ser isso. 
 
 
 
30 
 
Um agrupamento produtivo é formado por alunos que possuem níveis diferentes em 
relação a um determinado assunto, mas que são capazes de contribuir uns com os 
outros. O grande segredo não é apenas saber formá-lo, mas, sobretudo, saber realizar 
uma correta mediação pedagógica. 
Segundo Santos, Girotto e Gonçalves (2017), o agrupamento é de grande valor, “tanto 
para o parceiro mais experiente quanto para o menos, pois, no processo de 
alfabetização, é por meio das trocas de experiências e da reflexão sobre os objetos” de 
conhecimento que o desenvolvimento cognitivo acontece plenamente. 
Ainda de acordo com estes autores (2017), 
Para ter um bom aproveitamento no uso dos agrupamentos produtivos, 
primeiramente se faz necessária uma sondagem, ou seja, uma avaliação 
diagnóstica para saber em que hipótese se encontra cada um dos alunos. 
(...) 
Quando se trata de agrupamentos produtivos, devem-se levar em 
consideração alguns aspectos importantes, como: as duplas não podem nem 
devem ser feitas aleatoriamente. É importante que se unam as crianças em 
hipóteses diferentes, porém próximas entre si, como as exemplificadas a 
seguir: 
• As de hipótese pré-silábica com as de hipótese silábica sem valor 
sonoro. 
• As de hipótese silábica sem valor com as de hipótese silábica com valor. 
• As de hipótese silábica com valor com as de hipótese silábico-alfabética. 
• As de hipótese silábico-alfabética com os alfabéticos ou alfabéticos 
trabalhando entre si. 
Crianças em hipóteses muito diferentes acabam reproduzindo o ensino do 
método tradicional, no qual alguém que sabe mais transmite ao outro que 
sabe menos, este último acaba apenas recebendo o conhecimento, sem ser 
levado em consideração aquilo que já sabia anteriormente; daí a 
importância de hipóteses próximas entre si. 
Como falamos anteriormente, é fundamental a mediação que o professor realiza 
dentro destes agrupamentos. O sucesso do trabalho vai depender dela tendo como 
princípio metodológico a resolução de problemas que desafiem os alunos, mas sempre 
dentro das possibilidades deles. Os educandos precisam de atividades que gerem um 
conflito cognitivo e que desestruturem conhecimentos prévios, pois nos grupos 
produtivos haverá alunos com diferentes hipóteses de escrita, abrindo-se um espaço 
 
 
 
31 
 
para o questionamento e a revisão destas hipóteses (SANTOS; GIROTTO; GONÇALVES, 
2017). 
O trabalho com os agrupamentos produtivos é realmente eficiente quando aliado a um 
bom planejamento. É visível a evolução das crianças no processo de alfabetização em 
um curto período de tempo, pois ao discutir com o amigo e trocar informações, elas 
estão contribuindo para as suas concepções cognitivas (SANTOS; GIROTTO; 
GONÇALVES, 2017). 
3.3 Perspectivas históricas e a-históricas do letramento 
Neste tópico vamos acompanhar os conceitos apresentados por Leda Tfouni (1994) no 
que diz respeito ao conceito de letramento. A autora realiza uma análise muito 
pertinente em relação à representação social do conceito de letramento nos 
diferentes contextos em que ele é utilizado. A autora ressalta que não existe uma ideia 
unificada e fechada do que seja letramento. As múltiplas interpretações deste termo 
têm levado a interpretações errôneas deste conceito na prática. Por este motivo 
Tfouni fala do conceito de letramento dentro de duas perspectivas, a histórica e a-
histórica. 
Na perspectiva a-histórica o conceito de letramento é usado como sinônimo do 
conceito de alfabetização. Vejamos o que Tfouni diz a respeito: 
(...) letramento, para mim, é um processo, cuja natureza é sócio-histórica. 
Pretendo, com esta colocação, opor-me a outras concepções de letramento 
atualmente em uso, que não são nem processuais, nem históricas, ou então 
adotam uma posição "fraca" quanto á sua opção processual e histórica. 
Refiro-me a trabalhos nos quais, muitas vezes, encontra-se a palavra 
letramento usada como sinônimo de alfabetização (TFOUNI, 1994). 
Dentro desta posição, a autora destaca três perspectivas: na primeira que denomina 
de individualista-restritiva, o conceito de letramento fica atrelado exclusivamente à 
aquisição da leitura e escrita enquanto código; a segunda que denomina de 
tecnológica, concebe letramento enquanto produto, com seus usos em contextos 
altamente sofisticados, trazendo uma visão positiva dos usos da leitura/escrita, 
relacionando-os com o progresso da civilização. Já a terceira perspectiva, a cognitivista, 
 
 
 
32 
 
toma a criança como responsável central pelo processo de aquisição da leitura e 
escrita, ignorando as origens sociais e culturais do letramento (TFOUNI, 1994). 
Contudo, Tfouni (1994) destaca que seja qual for a perspectiva, “a ênfase é sempre 
colocada nas ’práticas’, ’habilidades’, ’conhecimento’, voltados sempre para a 
codificação/decodificação de textos escritos. Ou seja, existe aí uma superposição entre 
letramento e alfabetização”. 
Na perspectiva histórica de letramento, a autora estabelece uma relação dialética 
entre letramento e autoria do discurso. Sendo que ao se referir a discurso, engloba 
tanto o discurso escrito como o oral. Portanto, pode haver características da oralidade 
no discurso escrito, como traços do discurso escrito na oralidade. Esta perspectiva nos 
leva a conceber o letramento como um processo muito mais amplo que o de 
alfabetização, iniciando-se antes da aquisição formal da leitura e escrita e perdurando 
perante toda a vida de um indivíduo. Sendo assim, podemos considerar letrada uma 
pessoa não alfabetizada ou aquela pessoa alfabetizada, mas com um baixo nível de 
escolaridade. 
A dimensão histórica do letramento está relacionada ao conceito de autoria do 
discurso, percebendo-se o autor como sujeito do discurso, aquele que é capaz de 
produzir, seja de forma oral ou escrita, seu próprio discurso de forma autônoma e 
dinâmica. Consequentemente, para Tfouni (1994), “a dimensão histórica do 
letramento só se dará se o sujeito ocupar uma posição tal no interdiscurso [interação 
com o outro] que lhe possibilite organizar o intradiscurso (oral ou escrito) que está 
produzindo, de forma a produzir um texto”. 
3.4 Trajetória de formação para professores alfabetizadores competentes 
Faremos referência aqui à formação continuada dos professores alfabetizadores da 
rede pública, que atuam nas séries iniciais. 
De acordo com os Referenciais para a Formação dos Professores, 
Os anos 80 foram tempos de reformas educativas em vários países do 
mundo: as exigências sociais por uma educação de melhor qualidade 
começavam a impulsionar um ciclo de mudanças. No Brasil, esse período 
 
 
 
33 
 
caracterizou-se pela organização de movimentos de educadores e pela 
discussão sobre a formação de professores (BRASIL, 1999). 
Documentos oficiais e acadêmicos consolidaram algumas condições para garantir uma 
prática de qualidade na função docente. 
Desta forma, conforme explicitado nos Referenciais para a Formação dos Professores 
(BRASIL, 1999), uma prática educativa escolar de qualidade devia se compor de Projeto 
Político Pedagógico(PPP) construído coletivamente pelos diversos segmentos da 
escola; organização institucional de funcionamento eficaz e flexível; equipe escolar 
estável; incentivo da direção ao projeto educativo; formação inicial de educadores de 
qualidade; desenvolvimento de ações de educação continuada internas e externas 
sistemáticas, entre outras condições. 
Contraditoriamente, no Brasil, 
A década de 80 foi marcada, por um lado, pelo crescente achatamento dos 
salários dos profissionais da educação – uma vez que não havia 
recomposição frente a uma inflação muito alta – e, por outro, por índices 
alarmantes de fracasso escolar no ensino fundamental – traduzidos em 
percentuais de repetência e evasão inaceitáveis. (...) 
No que se refere à formação de professores, a proposta dos CEFAMs 
[Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério] foi uma iniciativa 
muito importante, que vem conseguindo se manter com certa dificuldade 
ao longo do tempo e merece ser destacada. Surgiu a partir de encontros 
realizados em 1982 entre o Ministério da Educação e um conjunto de 
instituições que tinham, na época, a finalidade de elaborar uma proposta de 
ação integrada do MEC para a formação de professores de 1º grau. 
Pretendia-se criar um tipo de escola de formação de professores que 
pudesse promover atualização e aperfeiçoamento dos profissionais da 
educação, desenvolver práticas inovadoras e pesquisa, formar professores 
leigos, atuar como agente de mudanças. (...) 
A entrada nos anos 90 também foi marcado por uma enorme desvalorização 
profissional do magistério – principalmente em função de salários muito 
baixos – e pela consequente luta dos profissionais da educação por 
melhores condições de trabalho e salário. Ao mesmo tempo, foi marcada 
pelo clima de uma Constituição recém-promulgada, que incorporou em seus 
princípios a valorização do magistério – consenso que se formou nas lutas 
da década anterior –, e pela Declaração Mundial de Educação para Todos 
(Jomtien, Tailândia/1990), compromisso internacional firmado por inúmeros 
países, inclusive o Brasil, que previa a melhoria urgente "das condições de 
trabalho e da situação social do pessoal docente, elementos decisivos no 
sentido de se implementar a educação para todos". Indicava, ainda, a 
necessidade de medidas em relação à formação continuada, profissão, 
carreira e salário, ética profissional, direitos e obrigações, seguridade social 
e condições mínimas para um exercício docente eficaz. Entretanto, os 
princípios explicitados na constituição não foram implementados e, quanto 
 
 
 
34 
 
à Declaração de Jomtien, no Brasil, em nenhum aspecto recebeu a atenção 
merecida tão logo veio a público (BRASIL, 1999). 
A formação continuada, de acordo com os Referenciais para formação de professores, 
é necessidade intrínseca para os profissionais da educação escolar e faz 
parte de um processo permanente de desenvolvimento profissional que 
deve ser assegurado a todos. A formação continuada deve propiciar 
atualizações, aprofundamento das temáticas educacionais e apoiar-se numa 
reflexão sobre a prática educativa, promovendo um processo constante de 
autoavaliação que oriente a construção contínua de competências 
profissionais. Porém, um processo de reflexão exige predisposição a um 
questionamento crítico da intervenção educativa e uma análise da prática 
na perspectiva de seus pressupostos. Isso supõe que a formação continuada 
estenda-se às capacidades e atitudes e problematiza os valores e as 
concepções de cada professor e da equipe (BRASIL, 1999). 
Os programas de formação continuada oferecidos aos professores devem ser 
readequados a cada realidade escolar, já que é este espaço o locus privilegiado de 
formação. Por outro lado, a formação continuada oferecida aos professores 
alfabetizadores deve abranger a equipe escolar como um todo, já que se trata de um 
projeto pedagógico que deve ser construído coletivamente, inclusive com a 
participação da comunidade. 
3.5 A leitura e a escrita como competências de desenvolvimento social e intelectual 
Segundo Vygotsky (1998), o domínio de relações como a escrita nasce nas relações 
com o outro, por conta de nascermos em um mundo letrado. Além do registro da fala, 
a escrita nos possibilita expressar ideias, conceitos e concepções de mundo que 
revelam as representações que as pessoas fazem do seu cotidiano. É através da escrita 
que nos adaptamos às exigências de uma sociedade complexa. A escrita preexiste ao 
nascimento de uma criança, pois é um produto cultural, portanto quando uma criança 
nasce já se encontra em um ambiente mediado pela escrita. 
Para se ter pleno acesso à cultura, precisamos nos apropriar da escrita. Ela se 
apresenta como um pré-requisito para usufruir dos inúmeros recursos que a sociedade 
nos oferece. Atualmente, se faz muito difícil conviver numa sociedade letrada e 
complexa como a nossa sem ter tido acesso à aquisição desta ferramenta de 
fundamental importância. Um adulto analfabeto terá, consequentemente, sérias 
dificuldades para se adaptar às exigências sociais. Este fato é tão significativo que 
 
 
 
35 
 
mesmo o adulto analfabeto termina adquirindo certo grau de letramento que lhe 
possibilita conviver neste mundo permeado pela escrita. 
A escrita não apenas nos possibilita a melhor adaptação às exigências sociais, mas 
também atua como um poderoso instrumento que potencializa o pensamento. 
A escrita, enquanto segunda expressão da linguagem oral, a supera, a 
ultrapassa e a retroalimenta. (...) 
(...) ler e escrever é um fato cultural, isto é, um fato que envolve, de um 
lado, uma atividade sistemática de ensino-aprendizagem e, de outro, um 
esforço voluntário e uma motivação gnósica especial do aprendiz. (...) a 
aprendizagem da leitura e da escrita implica dois elementos imprescindíveis: 
interação social e motivação pessoal, já que a criança deve aprender a 
postergar seus impulsos imediatos e desenvolver atividades que são 
organizadas pelo professor em uma sequência temporal mais longa. 
Oñativia (1983) (...) [aponta] que a linguagem coloquial e prática, de 
estrutura gramatical simples, comprometida com os níveis gestuais e 
analógicos da comunicação, desenvolve-se desde muito cedo, quando se 
inicia o período simbólico e representativo da percepção. Com a influência 
do código linguístico social (ou seja, um idioma), que responde a níveis 
socioculturais de maior organização e diferenciação sintática e semântica, a 
linguagem vai se aperfeiçoando progressivamente. 
Um dos mecanismos desse aperfeiçoamento é a aquisição da linguagem 
escrita, já que esta retroalimenta a linguagem oral, reforçando-a e 
enriquecendo-a por novos modelos morfossintáticos. Assim, a diferença 
entre fala e escrita não consiste simplesmente na forma de acesso a cada 
uma delas (a primeira pelo ouvido; a segunda pela visão e pela motricidade). 
Há um grande salto evolutivo entre a linguagem oral e a escrita, apesar de 
existir entre ambas uma mútua influência sociocultural (OÑATIVIA, 2009). 
Conclusão 
Alfabetização e letramento são conceitos diferentes, porém intrinsecamente 
relacionados. Compreender essa relação dialética entre estes processos muda 
completamente nosso entendimento da prática alfabetizadora. Alfabetizar letrando e 
letrar alfabetizando, conforme Soares (2011) aponta, implica numa visão muito mais 
ampla do que se entende por alfabetizar. Introduzir o aluno no universo das letras é 
muito mais que ensinar um código, implica inseri-lo num universo de representação, já 
que a escrita, além de representar os sons da fala, representa ideias, conceitos, enfim, 
pensamentos. 
 
 
 
 
36 
 
REFERÊNCIAS 
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. Referenciais para 
formação de Professores. Brasília: MEC/SEF, 1999. Disponível em: <https://bit.ly/2Ulc1oC>. 
Acesso em: 5 abr. 2019. 
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Programa de Formação 
de ProfessoresAlfabetizadores – Documento de Apresentação. Brasília: MEC/SEF, 2001. 
Disponível em: <http://tiny.cc/m15o6y>. Acesso em: 5 maio 2019. 
LIMA, A.L. de S.; DANTAS, C.V. Alfabetização e letramento: um estudo de caso nos primeiros 
anos do ensino fundamental na escola pública de Jandira. E-FACEQ, ano 2, n. 2, ago. 2013. 
Disponível em: <http://tiny.cc/gi2o6y>. Acesso em: 4 maio 2019. 
OÑATIVIA, A. C. O método integral e a alfabetização de crianças com necessidades educativas 
especiais. Blog Método Integral com cartelas pictográficas "Dr. Oscar Oñativia", 2013. 
Disponível em: <http://tiny.cc/7yyo6y>. Acesso em: 5 maio 2019. 
______. Alfabetização em três propostas: da teoria à prática. São Paulo: Ática, 2009. 
OÑATIVIA, O. V. Fundamentos psicológicos de los procesos de alfabetización. Revista del 
Instituto de Investigaciones Educativas, Buenos Aires, n. 40, p. 19-36, 1983. 
SANTOS, C.L. dos; GIROTTO, N.; GONÇALVES, P. R. Os agrupamentos produtivos nos processos 
de alfabetização e letramento. Ensaios & Diálogos, Rio Claro, v. 10, n. 1, p. 133-154, jan./dez. 
2017. Disponível em: <https://bit.ly/2TXarVc>. Acesso em: 5 abr. 2019. 
SOARES, M. B. Alfabetização e letramento: caminhos e descaminhos. In: UNIVERSIDADE 
ESTADUAL PAULISTA. Pró-Reitoria de Graduação. Caderno de formação: formação de 
professores: didática dos conteúdos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011. Vol. 2 (Curso de 
Pedagogia). Disponível em: <https://bit.ly/2VqdjeK>. Acesso em: 5 abr. 2019. 
TFOUNI, L.V. Perspectivas históricas e a-históricas do letramento. Cad. Est. Ling., Campinas, n. 
26, p. 49-62, jan./jun. 1994. Disponível em: <http://tiny.cc/0sjp6y>. Acesso em: 14 maio 2019. 
VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente. 6. ed., São Paulo: Livraria Martins Fontes, 1998. 
 
 
 
 
 
37 
 
 
4 PROCESSOS ENVOLVIDOS NO ATO DE LER E ESCREVER 
4.1 Bases neurológicas do desenvolvimento da linguagem: a leitura como uma 
função cerebral global 
Neste tópico vamos analisar o processo de leitura e escrita do ponto de vista 
neurológico. Estudos científicos demonstram que a leitura implica um processamento 
cerebral global. Leitura bem sucedida requer integração dos dois modos de 
processamento simbólico acessíveis à mente humana. 
Desde muito tempo, esses dois modos têm sido dicotomizados como “lógica e 
intuição”, “análise e síntese”, “mecanização e criatividade”. Todavia, os cientistas têm 
provado, recentemente, que cada hemisfério funciona diferentemente, de um ou do 
outro modo, porém eles se integram e complementam. 
Este enorme avanço em conhecimento sobre o funcionamento cerebral tem afetado 
as teorias sobre pensamento e aprendizagem. Alguns educadores reconhecem que 
nossas escolas enfatizam o processamento do hemisfério esquerdo, enquanto o direito 
fica subdesenvolvido. Guiados por descobertas neurológicas, estes educadores estão 
revendo métodos de leitura, principalmente para trabalhar com alunos que 
apresentam dificuldades ou distúrbios de leitura. 
Embora as duas metades do cérebro sejam especializadas para diferentes funções 
cognitivas, o uso contínuo de um hemisfério ou de outro pode habituar pessoas ao 
pensamento “esquerdo” ou “direito”. Se as pessoas são ensinadas a utilizar 
habitualmente apenas um tipo de habilidades (as do hemisfério esquerdo, por 
exemplo) sua capacidade para escolher a resposta mais adequada e eficiente se torna 
diminuída. 
Todas as crianças aproveitariam um currículo equilibrado, mas as crianças com 
preferência para o hemisfério direito são especialmente prejudicadas em nossas 
escolas. 
 
 
 
38 
 
A especialização hemisférica não linguística pode ser resumida rapidamente aqui, 
apesar de que os dados sejam extensos. O hemisfério esquerdo está preocupado com 
detalhes, mas falha na organização coerente, enquanto o hemisfério direito apreende 
características globais, mas ignora detalhes. Para ilustrar, o hemisfério esquerdo 
distingue olhos, nariz, boca, como aspectos importantes do rosto, cada um com sua 
significação. O hemisfério direito, entretanto, reconhece rostos familiares e não 
familiares, uma distinção que o hemisfério esquerdo não consegue fazer. O hemisfério 
direito é superior para percepções visuais, auditivas e cinestésicas não ligadas à 
linguagem. O hemisfério esquerdo reconhece sons linguísticos e símbolos. 
Um número de experimentadores descobriu que o uso de imagens pode estimular a 
compreensão do vocabulário e a aprendizagem. As imagens geradas internamente 
pelas crianças garantem a evocação do vocabulário. 
Usar figuras e encorajar elaboração de imagens mentais possibilita ao professor a 
estimulação do processamento do cérebro direito. Quando as crianças aprendem a 
elaborar pictogramas para palavras novas, para novos conceitos e histórias, a 
compreensão e a evocação podem se desenvolver muito. 
A teoria generativa de cognição oferece uma explicação parcial de por que a 
visualização ajuda as crianças a aprender a ler. O processamento generativo capacita o 
ser humano a completar figuras ou sentenças de acordo com expectativas. 
Na medida em que os professores se tornam mais e mais familiares com os modos 
cognitivos duais do cérebro humano, estratégias mais e mais efetivas serão 
desenvolvidas, ao fim de capacitar os alunos a responder holisticamente à leitura. 
Como outras atividades simbólicas complexas, a leitura exige a participação de ambos 
os hemisférios. Avaliação e integração de ambos os modos cognitivos elevarão os 
alunos, de “alunos que leem” a “leitores”. 
 
 
 
 
 
 
39 
 
4.2 O papel das funções executivas na aprendizagem da leitura e escrita 
De acordo com Fonseca (2017), para se adaptar às exigências da sociedade pós-
moderna, as pessoas precisam desenvolver um conjunto de habilidades cognitivas para 
se transformarem em indivíduos ágeis, resolutivos e criativos. Como estimular então 
em nossos alunos a empatia, o raciocínio e a proficiência da leitura e escrita? 
Segundo Fonseca (2017, p. 44), “transpor nossos conhecimentos do nível de linguagem 
oral para o de escrita é um dos marcos de maior complexidade cognitiva da vida de 
todas as pessoas”. Vamos então entender como as funções executivas podem ser 
aproveitadas a favor da aprendizagem da leitura e escrita. 
Iniciaremos então conceitualizando essas funções. Fonseca (2017, p. 44) afirma que 
Funções Executivas (FE) são habilidades cognitivas exigidas em “tarefas de supervisão, 
coordenação, revisão e organização de pensamentos, emoções e comportamentos em 
busca do alcance de um ou mais objetivos, exigindo que nos adaptemos a fatores 
internos ou externos (...)”. 
As funções executivas são acionadas quando precisamos sair do nosso padrão de 
funcionamento, isto é, quando não podemos mais agir de forma mecânica. Fonseca 
(2017, p. 44) traz algumas metáforas para ilustrar o que entendemos por funções 
executivas: “maestro de uma orquestra”, “líder de uma empresa”, “controlador de 
tráfego aéreo”. 
Vejamos então a comparação que a autora estabelece entre as FE e uma caixa d’água: 
A água da caixa (...) deve ser distribuída por várias torneiras e chuveiro(s) de 
uma residência. Quanto maior a demanda de água, ou seja, quanto mais 
torneiras (...) e chuveiros estiverem sendo utilizados ao mesmo tempo, mais 
a caixa d’água enche; no entanto, temos de respeitar o limite de uso 
simultâneo para essa mesma caixa d’água ter tempo hábil de voltar a 
encher. 
As FE seriam, neste caso, nosso distribuidor de água, isto é, de energia cognitiva para 
as tarefas mais novas e complexas executadas ao mesmo tempo no nosso dia a dia. 
Recentemente tem se destacado três componentes principais das FE: a memória de 
 
 
 
40 
 
trabalho, o controle inibitório e a flexibilidade cognitiva. Vejamos separadamente cada 
uma delas (FONSECA, 2017). 
A memória de trabalho nos permite executar duas ou mais tarefas ao mesmo tempo e 
relacioná-las com diferentes informações armazenadas (seja memória delongo prazo 
ou curto prazo). Por exemplo, para interpretar um texto, precisamos relacionar o que 
acabamos de ler (para isto precisamos guardá-lo na memória de curto prazo) com 
informações a respeito que estão armazenadas em nosso reservatório de 
conhecimentos prévios (memória de longo prazo). Disto se deduz que seremos mais 
eficientes para compreender o que estamos lendo quanto mais conhecimentos prévios 
sobre o assunto temos (FONSECA, 2017). 
O controle inibitório é nossa capacidade de não sucumbir a interferências internas ou 
externas, sejam de ordem racional (inibição fria) ou emocional (inibição quente) para 
mantermos a concentração numa atividade que exige de nós foco num determinado 
período de tempo (FONSECA, 2017). 
Por último, a flexibilidade cognitiva é aquela habilidade que nos permite adaptarmos o 
nosso modo de pensar e agir. Esta habilidade exige de nós criatividade e capacidade de 
reorganização e adaptação (FONSECA, 2017). 
Vejamos então como esses componentes estão presentes no ato de ler e escrever. 
Para conseguir fazer uma ponte entre a linguagem oral e escrita, a criança precisará 
usar suas funções executivas. Na aprendizagem da escrita ortográfica das palavras, por 
exemplo, a criança conserva em sua memória de longo prazo todos os possíveis 
grafemas que representam um mesmo fonema e ao escrever uma palavra toma a 
decisão de qual usar, inibindo as demais. Para construir um texto, precisará usar do 
controle inibitório para se focar no tema sobre o qual está escrevendo, assim como 
selecionar os termos mais adequados para construir um texto coerente e coeso, 
fazendo uso dos seus conhecimentos prévios (memória de trabalho). Na tarefa de 
alfabetização e letramento, os educadores são os principais mediadores e 
estimuladores das funções executivas (FONSECA, 2017). 
 
 
 
41 
 
A seguir, apresentamos algumas orientações para estimular as funções executivas na 
criança: 
• As brincadeiras são um importante mediador para a aprendizagem, pois 
possuem conteúdos emocionalmente significativos. Portanto, deve-se evitar, 
principalmente na educação infantil, de submeter a criança a atividades 
formais de grande sistematização. 
• Desenvolver de forma natural e espontânea a curiosidade sobre os livros e a 
leitura. 
• Canções, principalmente as que envolvem histórias acumulativas, como “Estava 
a velha a fiar” ou “Loja do mestre André”, vão estimular a memória de 
trabalho. 
• Dramatizações auxiliam no desenvolvimento da flexibilidade cognitiva, pois 
possibilitam a alternância de papéis. 
• Construção de histórias com a participação de alunos diferentes, cada um 
acrescentando uma parte, em construção coletiva, desenvolve todas as FE, pois 
o aluno deverá aprender a esperar sua vez para falar (controle inibitório), usar 
sua memória de trabalho para lembrar o que os colegas já falaram ao construir 
a história e ser flexível para mudar o curso da história, caso seja necessário. 
• Atividades de educação física com circuitos estimulam a flexibilidade cognitiva 
e o controle inibitório, favorecendo o desenvolvimento psicomotor (FONSECA, 
2017). 
4.3 Processos envolvidos no ato de ler: estratégias de leitura e conhecimentos 
prévios 
O ato de leitura é um processo complexo que envolve tanto habilidades de 
decodificação (rota fonológica) como de compreensão (rota lexical). A rota fonológica 
é um caminho indireto que nos possibilita realizar a transposição dos signos gráficos 
nos seus respectivos sons (fonemas). 
Estudos demonstram que nossos olhos não deslizam linearmente sobre as linhas – 
lemos em saltos. Esta rota de leitura é utilizada quando nos deparamos com palavras 
 
 
 
42 
 
pouco comuns que não fazem parte do nosso léxico ou que são de uso menos 
frequente. Já quando as palavras que lemos nos são familiares, fazemos uso da rota 
lexical ou direta que possibilita acessar certas palavras de forma global em nosso 
léxico, ou seja, usamos nossos conhecimentos prévios. Ambas as rotas são necessárias 
para um leitor proficiente. Portanto, o que é fácil para um leitor pode ser difícil para 
outro, quando lemos construímos significado e essa construção depende do que já 
sabemos. Ao ler mobilizamos várias estratégias de leitura. 
De acordo com Duke e Pearson (2002 apud ESTRATÉGIA, 2013), a seguir descrevemos 
algumas dessas estratégias: 
1. Predição: capacidade de antecipar-se ao texto, à medida que vai processando a sua 
compreensão. 
2. Seleção: habilidade de selecionar apenas os índices relevantes para a compreensão 
e propósitos da leitura. 
3. Inferência: completa a informação utilizando as suas competências linguística e 
comunicativa, o seu conhecimento conceitual e seus esquemas mentais ou 
conhecimentos prévios. 
4. Confirmação: verifica se as predições e as inferências estão certas ou se precisam 
ser reformuladas. 
5. Correção: uma vez não confirmada a predição, o leitor retrocede no texto a fim de 
levantar outras hipóteses, buscando outras pistas, sempre na tentativa de encontrar 
sentido no que lê. 
Com base nestas estratégias que desenvolvemos no ato de ler, seguem algumas dicas 
para desenvolver na sala de aula: 
• Explorar textos que se sabe de memória para os alunos que tenham construído 
a base alfabética recentemente; 
• Ajudar o aluno a se conscientizar da intencionalidade do autor; 
• Propor leitura com objetivo, com intencionalidade; 
 
 
 
43 
 
• Adotar a prática da leitura nas aulas como atividade permanente; 
• Propiciar a interação entre todos da sala de aula; 
• Considerar o texto como processo, sempre aberto a mudanças. 
4.4 Bases socioculturais do desenvolvimento da linguagem 
Não podemos desenvolver este tema sem fazer referência à obra de Vygotsky (1896-
1934) que considera as funções psicológicas superiores sendo de origem sociocultural 
sendo que os signos são os mediadores por excelência para a constituição destas 
funções. A linguagem tem essa função simbólica e portanto é um instrumento que 
potencializa o pensamento, os processos mentais. 
Segundo Moreira (1999, p. 111), 
(...) instrumentos e signos são construções sócio-históricas e culturais; 
através da apropriação (internalização) destas construções, via interação 
social, o sujeito se desenvolve cognitivamente. Quanto mais o indivíduo vai 
utilizando signos, tanto mais vão se modificando, fundamentalmente, as 
operações psicológicas das quais ele é capaz. Da mesma forma, quanto mais 
instrumentos ele vai aprendendo a usar, tanto mais se amplia, de modo 
quase ilimitado, a gama de atividades nas quais pode aplicar suas novas 
funções psicológicas. 
O desenvolvimento cognitivo dos seres humanos acontece graças a interação que 
acontece por meio desses instrumentos e signos que são por essência uma 
propriedade humana e resultam de construções sócio-históricas e culturais. 
A interação social é, “[...] na perspectiva vygotskyana, o veículo fundamental para a 
transmissão dinâmica (de inter para intrapessoal) do conhecimento social, histórica e 
culturalmente construído” (MOREIRA, 1999, p. 112). 
Para Vygotsky (MOREIRA, 1999, p. 110): 
(...) os processos mentais superiores (pensamento, linguagem, 
comportamento volitivo) têm origem em processos sociais; o 
desenvolvimento cognitivo do ser humano não pode ser entendido sem 
referência ao meio social. Contudo, não se trata apenas de considerar o 
meio social como uma variável importante no desenvolvimento cognitivo. 
Para ele, desenvolvimento cognitivo é a conversão de relações sociais em 
funções mentais. Não é por meio do desenvolvimento cognitivo que o 
indivíduo se torna capaz de socializar, é na socialização que se dá o 
desenvolvimento dos processos mentais superiores. 
 
 
 
44 
 
Oñativia (2009, p. 74) afirma que, 
Com um objetivo fundamentalmente pedagógico, Oñativia (1983) distingue 
diferentes estágios na evolução da linguagem oral e escrita. Numa primeira 
etapa, a linguagem subordina-se à ação. Nesse

Continue navegando