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Resenha de IED - concluída

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RESENHA DA OBRA DE PIERRE CLASTRES. “SOCIEDADE CONTRA O ESTADO” 1974.
TRABALHO DE INTRODUÇÃO AO DIREITO.
PROFESSOR HEITOR PAGLIARO
Alunos:	 Dean Alves Cavalcante
		Felipe Grecov Garcia
Turma: 		Vl Turma de Direito UFG-Campus Jataí
Matéria: 	Introdução ao Direito
Professor: Heitor Pagliaro
Data:		27/06/2014
Jataí-GO
RESENHA DA OBRA DE PIERRE CLASTRES. “SOCIEDADE CONTRA O ESTADO”1974.
Realizando uma analise do texto de Pierre Clastres, com uma ótica totalmente voltada para uma concepção antropológica, percebe-se que o autor identifica algumas relações entre sociedade e Estado. Clastres não condena a formação do órgão mediador tal como conhecemos como Estado, porém, traz uma visão na qual é possível uma organização social que não se baseia em uma transferência de responsabilidade para pessoas mais “esclarecida”, como defendia Kant. O objetivo dessa resenha é identificar como o autor argumenta para defender sua tese “Sociedade contra o Estado”. 
A construção do artigo inicia com uma definição que usa como fundamento um juízo de valor, quando se faz uma separação histórica na definição de sociedade primitiva, atribuindo a essa uma característica de falta de organização social por meio de uma figura estatal. Tal argumento impossibilita um estudo referente à ciência politica utilizada na época, pois limita a interpretação de vários aspectos, como por exemplo, o próprio Direito. Teóricos que defendem essa linha de pensamento propõem que a finalidade da sociedade é o Estado, e não há possibilidade de haver uma organização social sem um órgão estatal, o que cria margem para identificarmos as sociedades primitivas como um conjunto de pessoas à margem da história universal, como diz Clastres. O autor traz outra visão em que a sociedade primitiva foi o em um primeiro estagio, selvagem, e que o Estado seria a próxima fase, ou seja, a civilização. Podemos realizar uma analogia com a linha ideológica Comunista, que considera desse argumento, porém diz que o Estado não é finalidade da sociedade, mas sim um estagio de amadurecimento da mesma, e que tal estagio deve em algum momento ser superado, pensamento também defendido pelo professor Mauro Iasi.
Clastres continua a defender a ideia de que as sociedades primitivas não são inferiores historicamente e antropologicamente. Ele confronta a definição de sociedade arcaica como uma organização social de sobrevivência somente (sem Estado, sem escrita, sem historia), essa sendo uma cultura subsistência a qual não estimula a economia ou as inovações das tecnologias. Pierre Clastres por ser um antropólogo bem conceituado relativiza suas concepções e traz exemplos históricos para confirma-las. Ele traz a ideia de que a relação processual do homem com a natureza é de sobrevivência, e que tal situação é mantida até a atualidade, por isso para suprir as necessidades é necessário um domínio do meio em que este está inserido, tal afirmação possibilita a análise de que as sociedades primitivas possuíam tanto meios de relação social quando de tecnologias de desenvolvimento suficientes para sua sobrevivência, ou seja, cobriam todas suas necessidades, e quando não era possível tal processo, havia dois fins: mudança de território ou desaparecimento. O autor ainda traz uma ideia de configuração horizontal no que se diz respeito a técnicas e tecnologias em um conceito histórico, pois em ambos os aspectos existiu nas sociedades arcaicas a capacidade de satisfazer as necessidades estabelecidas pelo meio. Alguns exemplos expostos no texto como os esquimós e os australianos confirmam a justificativa analisada, pois desenvolveram técnicas e ferramentas suficientes para sobreviverem. Outro exemplo que o autor traz, é a agricultura da América e do velho mundo que se encontrava no mesmo estagio de desenvolvimento, mas que utilizou de conhecimentos dos ameríndios para aperfeiçoamento. 
Clastres traz a imagem da evolução por parte dos índios em aperfeiçoar suas ferramentas que antes era de madeira e pedra, para instrumentos metálicos. Tal tecnologia foi utilizada pela necessidade de facilitar e aumentar a produção, conceitos chaves da economia, porém essa sendo diferente da que conhecemos hoje, pois nas sociedades primitivas a economia era a de subsistência pelo fato de que não produzia excedentes e acumulação de produção. Para confrontar essa análise, o autor nos mostra uma fala de relevante importância a ser citada: 
“... esse argumento não tem fundamento em direito nem em fato. Nem em direito, porque não existe escala abstrata pela qual se possa medir as “intensidades” tecnológicas: o equipamento técnico de uma sociedade não é diretamente comparável àquele de uma sociedade diferente,... Nem em fato, uma vez que a arqueologia a etnografia, a botânica etc. nos demostram precisamente a potência de rentabilidade e de eficácia das tecnologias selvagens.” (Pierre Clastres. “Direito contra o Estado” 1974. Pagina 5)
Após observar o fragmento da obra de Clastres, podemos identificar os dois argumentos que fundamentam sua defesa em relação à legitimidade de que as sociedades arcaicas possuem economia de subsistência pelo simples fato de suas tecnologias e técnicas serem suficientes para subsistir, o que ele considera como principal definição, ao contrario de varias corrente que defendem a ideia de que a economia de subsistência é caracterizada por falta de desenvolvimento.
Essa construção logica criada no texto evidencia situações que ocorrem na formação pré-moldada de conceitos como “índio preguiçoso” ou “trabalhar como um negro”, em ambos os casos há os dois extremos propostos pela sociedade capitalista que justifica seu preconceito com as sociedades primitivas. Como já foi dito a economia de subsistência configurada na visão europeu-americana (homens brancos) não tem fundamento de comprovação, mas mesmo assim, ainda é repassada de geração em geração. Cria-se a visão que Clastres critica: ou vive produzindo somente o necessário para sua alimentação e de certa forma trabalha menos, ou vive para uma acumulação de produção além do que se necessita e trabalha mais. Essa divisão proposta pela civilização ocidental é imposta varias vezes de forma agressiva, pois a diferença cultural não é aceita em uma sociedade que possui Estado, porque para manter tal maquina de organização a produção excedente é necessária, ou melhor, o trabalho é necessário. Essa configuração é exposta no texto através do pensamento criado pelo autor.
Um grande exemplo que Clastres traz várias vezes em seu texto para justificar que as sociedades arcaicas possuíam uma organização social suficiente para suas necessidades sem o aparato da figura do Estado, é as tribos indígenas, pois como um antropólogo, Clastres enxerga através de fatos históricos a realidade social. O autor evidencia uma característica nas tribos indígenas que é mantida até hoje na configuração de divisão do trabalho, o que Marx defende como “primeira divisão do trabalho”, a separação entre o serviço social do homem e da mulher.
Todas essas características de economia de subsistência que qualificava as sociedades primitivas mostra que não é por “preguiça” que não se trabalhava, mas sim por uma questão de alcançar o necessário. Porém a historia nos mostra que mesmo com essa afirmação, é possível observar um acúmulo de produção (reserva de alimentos para o frio, cultivo de plantas medicinais para caso de doença, criação de animais para festivais e comemorações) e um desenvolvimento tecnológico (aperfeiçoamento dos instrumentos de trabalho) nessas sociedades. Outra conclusão dos aspectos da economia de subsistência é o fato de que produzir mais que o necessário está diretamente ligado ao uso da força, ou seja, alguma ameaça através de violência tanto física como uma “violência simbólica” (teoria defendida pelo professor Sergio Raues), que obriga de certa forma o trabalho, o qual às vezes não é aceito. Evento histórico que comprova esse fato é a situação a qual os índios sul-americanos eram expostos, o trabalho escravo, e que resultou nosuicídio de vários indígenas pela não assimilação dessa cultura. Esse uso da força é bem evidenciado por Clastres, pois ele traz uma configuração social de que a cultura do trabalho tornou um “fato social total”, esse sendo uma característica inerente à sociedade pós-primitiva. Porem tal afirmação vai contra o proposito da antropologia, que é evidenciar uma realidade evolutiva e mutável da historia. 
Quando o trabalho se torna característica qualitativa dessa sociedade, ocorre o processo que Clastres chama de “trabalho alienado”, esse sendo configurado no aumento da produção e acumulação, na mudança de satisfação de produção (deixa de ser em si mesmo, e passa a pensar na necessidade do outro) e na criação de divida. Quando tal configuração é exposta socialmente, a sociedade que antes era primitiva passa a ser uma organização social com uma separação de classes, pois com uma estrutura organizada dessa forma há quem sempre tira vantagem e possua uma acumulação maior, resultando em uma influência social maior. Tal influência é mostrada no texto como separação em “dominantes e dominados”. Há então a divisão social que servira de fundamento para todas as demais, a divisão do trabalho, que transfere uma característica puramente econômica para um aspecto totalmente político, configuração essa que prioriza em uma estrutura social, quem tem mais poder, mais acumulação, mais força e quem “trabalha mais”. E quando trabalhamos com uma relação politica, nasce então o divisor histórico que marca a mudança da sociedade primitiva para uma evolução, nasce o órgão mediado do Direito, da Economia e da Politica, o Estado.
A conclusão do pensamento de Pierre Clastres na sua obra “Sociedade contra o Estado” foi limitada pela proposta da atividade da resenha, porém é valido salientar sua principal linha de pensamento anteriormente exposta. Clastres não condena a criação do Estado, e diz ser a medida inevitável em algumas sociedades, porém o autor traz exemplos de configurações sociais de culturas “primitivas” que evidenciam a possibilidade de organização social sem a figura estatal, e para justificar sua tese, usa de instrumentos antropológicos para elaboração de seu estudo.

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