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DEONTOLOGIA E LEGISLAÇÃO PROF. DR. LUIZ ANTONIO BENTO Reitor: Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira Pró-reitor: Prof. Me. Ney Stival Gestão Educacional: Prof.a Ma. Daniela Ferreira Correa PRODUÇÃO DE MATERIAIS Diagramação: Alan Michel Bariani Thiago Bruno Peraro Revisão Textual: Gabriela de Castro Pereira Letícia Toniete Izeppe Bisconcim Luana Ramos Rocha Produção Audiovisual: Heber Acuña Berger Leonardo Mateus Gusmão Lopes Márcio Alexandre Júnior Lara Pedro Paulo Liasch Gestão de Produção: Kamila Ayumi Costa Yoshimura Fotos: Shutterstock © Direitos reservados à UNINGÁ - Reprodução Proibida. - Rodovia PR 317 (Av. Morangueira), n° 6114 Prezado (a) Acadêmico (a), bem-vindo (a) à UNINGÁ – Centro Universitário Ingá. Primeiramente, deixo uma frase de Só- crates para reflexão: “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida.” Cada um de nós tem uma grande res- ponsabilidade sobre as escolhas que fazemos, e essas nos guiarão por toda a vida acadêmica e profissional, refletindo diretamente em nossa vida pessoal e em nossas relações com a socie- dade. Hoje em dia, essa sociedade é exigente e busca por tecnologia, informação e conheci- mento advindos de profissionais que possuam novas habilidades para liderança e sobrevivên- cia no mercado de trabalho. De fato, a tecnologia e a comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, diminuindo distâncias, rompendo fronteiras e nos proporcionando momentos inesquecíveis. Assim, a UNINGÁ se dispõe, através do Ensino a Distância, a proporcionar um ensino de quali- dade, capaz de formar cidadãos integrantes de uma sociedade justa, preparados para o mer- cado de trabalho, como planejadores e líderes atuantes. Que esta nova caminhada lhes traga muita experiência, conhecimento e sucesso. Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira REITOR 33WWW.UNINGA.BR UNIDADE 01 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................4 1 - ÉTICA E MORAL ...................................................................................................................................................5 2 - A DEONTOLOGIA .................................................................................................................................................6 3 - A BIOÉTICA ..........................................................................................................................................................8 3.1. FATORES QUE INFLUENCIARAM O NASCIMENTO DA BIOÉTICA ................................................................9 3.2. NECESSIDADE DA ÉTICA NA SAÚDE .............................................................................................................. 12 3.3. SÍNTESE HISTÓRICA DO NASCIMENTO DA ÉTICA NA CIÊNCIA BIOMÉDICA ........................................... 14 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................. 15 CLASSIFICAÇÃO TERMINOLÓGICA E NOÇÃO GERAL PROF. DR. LUIZ ANTONIO BENTO ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: DEONTOLOGIA E LEGISLAÇÃO 4WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO O termo “ética” nasceu dentro de um contexto � losó� co. Vários pensadores, em diferentes épocas, abordaram especi� camente assuntos sobre a Ética: Sócrates, Aristóteles, Santo Agostinho, Santo Tomás, Kant, Espinosa, Hegel, Kierkergaard, Weber, Nietzsche, Wittgenstein, Pascal, Paul Tillich etc. O termo leva a interpretar diversos signi� cados. Aristóteles, por exemplo, usou-o para indicar as pesquisas que têm por objeto as qualidades peculiares do comportamento humano. Vale dizer que, tanto a moral quanto a ética são termos de uso corrente e estão relacionados ao conceito de certo e errado. 5WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA 1 - ÉTICA E MORAL A origem da palavra Ética vem do grego ethos, que corresponde ao modo de ser, o caráter. Os romanos traduziram o ethos grego, para o latim mos ou no plural mores, que quer dizer costumes, valores, normas de conduta própria de uma sociedade e cultura, de onde vem a palavra moral. Tanto ethos caráter, modo de ser de uma pessoa, índole, temperamento, como mos costume indicam um tipo de comportamento propriamente humano que não é natural, ou seja, o homem não nasce com ele como se fosse um instinto, mas que é adquirido ou conquistado por hábito, uma conduta de vida, o que é especí� co do homem. Portanto, Ética e Moral, pela própria etimologia, referem-se a uma realidade humana que é construída histórica e socialmente a partir das relações coletivas dos seres humanos, nas sociedades onde nascem e vivem (BENTO, 2008). É importante a� rmar, antes de qualquer coisa, que, quando se fala de ética em geral, se trata de um fenômeno humano: típico e distintivamente humano. Não só porque a ética aborda o comportamento humano, mas porque o aborda enquanto especi� camente “humano”. Falar em moral dá sempre a sensação que se vai restringir a liberdade humana. Moral, na mente comum e experiência cotidiana de muitas pessoas, signi� ca proibição. Algumas pessoas pensam que a moral está ultrapassada nos dias de hoje, encarando-a como um sistema de proibições puritanas descabidas que se destinam, sobretudo, a evitar que as pessoas se divirtam. Não é complicado compreender estas experiências, pois muitas vezes, a moral é uma imposição de grupos dominantes que tolhem a liberdade das pessoas. Por outro lado, a moral pode ser construída pelas próprias pessoas e, então, ela se torna fruto da liberdade humana, fator de a� rmação, de alegria, de esperança e de felicidade (BENTO, 2008). No dia-a-dia não fazem distinção entre ética e moral. Pode-se a� rmar que etimologicamente ética e moral são palavras sinônimas, termos que podem ser considerados equivalentes. Em muitos autores lidos, estes termos se interagem continuamente, de forma dinâmica (FORTES,1998; PEINADO,1996). Todavia, alguns estudiosos preferem fazer uma distinção entre as duas palavras para favorecer o entendimento daquilo que se quer dizer. Assim, a moral é mais prática, representa um conjunto de ideais, de normas, princípios, preceitos, costumes, valores, de atos repetidos, tradicionais, consagrados que norteiam o comportamento do indivíduo no seu grupo social num determinado lugar e numa determinada época, reconhecidos como válidos por uma determinada sociedade. A moral é normativa, isto é, baseia-se em princípios e regras morais � xas. Por exemplo: não matar, não roubar, não mentir são normas morais que estão presentes em todas as culturas e com as quais todos estão de acordo. Quanto às particularidades e outras normas morais são um tanto mais complicados gerando muita discussão e polêmica. Pode-se dizer que a moral é mais concreta, ela conceitua o que é uma boa ou má conduta, enquanto a ética é de� nida como a teoria, a re� exão, o estudo, o debate, o conhecimento ou a ciência do comportamento moral dos seres humanos, que busca explicar, compreender, justi� car racionalmente e criticar a moral ou as morais (os ideais e os valores) de uma sociedade. A ética aborda mais os princípios, ela é mais geral. É um dos mecanismos de regulação das relações sociais do homem, visando garantir coesão social e harmonizar interesses individuais e coletivos. Não se pode perder de vista que tanto a moral quanto a ética são comunitárias. Elas se referem à convivência humana e devem ser feitas em favor de uma vivência dos valores fraternos e harmônicos. A grande � nalidade da ética e da moral é a busca da harmonia, da felicidade humana e da união com o universo. 6WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Figura 1 – Ética e Moral. Fonte: Pixabay (2018). De acordocom Barchifontaine (2004), Ética é a ciência dos costumes. Os costumes são os hábitos de uma pessoa, de um povo, de uma comunidade. Os costumes, de fato, são os comportamentos médios aceitos por uma comunidade. O afastamento dessa média gera surpresas, críticas e repreensões [...]. Face à evolução do sentido do homem e do seu quadro de referência, podemos dizer que a ética e a moral estão em transição: A ética é uma análise do comportamento humano (conjunto de relações). E moral é a avaliação do comportamento humano à luz da teologia, da Bíblia, como critério do juízo de Deus ou à luz de uma ideologia. Em resumo, pode-se dizer que a Moral procura discutir e propor normas válidas para todos, isto é, sobre o que o homem deve fazer e a Ética procura estabelecer princípios de conduta, ou seja, dos valores que deve realizar. En� m, “moral e ética formam um complexo no qual a moral é um sentimento subjetivo reconhecido interiormente pela pessoa, e ética é a fase objetiva onde a norma é o costume do grupo social” (CREMESC, 2003, p. 5). 2 - A DEONTOLOGIA De acordo com Rasche (2005), A deontologia e a ética pro� ssional servem de um lado, para controlar a ação dos membros de um grupo pro� ssional e, de outro lado, para orientar sua conduta, colaborando para a formação de um grupo que se identi� ca e é identi� cado por um modo de agir. Assim a sustentação de uma pro� ssão depende do conjunto de seus membros, dado, a conduta de cada um. Ressalta-se que a deontologia é uma � loso� a que faz parte da � loso� a moral contemporânea e sua origem signi� ca, em grego, ciência ou tratado dos deveres e das obrigações morais. Do grego δέον, traduzido deon (dever, obrigação) + λόγος, logos (ciência) = ciência ou tratado dos deveres e das obrigações morais. 7WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA O termo foi criado no ano de 1834, pelo � lósofo inglês Jeremy Bentham, para falar sobre o ramo da ética em que o objeto de estudo são os fundamentos do dever e das normas, deontologia é também conhecida como “Teoria do Dever”. Ocupa-se dos deveres relativos a classes sociais particulares, pro� ssionais. Figura 2 – Deontologia. Fonte: Pixabay (2018). Deontologia é uma teoria sobre as escolhas dos indivíduos, as quais são moralmente necessárias, servindo, assim, para nortear o que realmente deve ser feito. O primeiro Código de Deontologia foi feito na área da medicina, nos Estados Unidos. Por � m, a deontologia é conjunto de princípios e regras de conduta ou deveres de uma determinada pro� ssão; é a ciência ou tratato dos deveres e das obrigações morais; conjunto de regras que devem regular o exercício pro� sional. Como a ciência dos deveres, o conjunto de normas que regulam o exercício pro� ssional, as normas da deontologia estavam inicialmente incluídas nas que regem a vida humana; recentemente, quando as pro� ssões foram individualizando-se, de� nindo-se, se formou o conjunto de regras que regem o exercício de cada pro� ssão; vieram em Códigos, Decálogos, Cartas ... de Ética Médica, advogado, químico, Fonoaudiólogo etc. Existem referências em antigas leis de ética médica, posteriormente, a medicina foi se desvinculando de suas características atreladas à magia, astrologia e exercida por religiosos. No Egito sob o Império Antigo (2200-2050a.C.), a lei faz referências à formação, à organização do exercício pro� sional; à responsabilidade e aos honorários médicos. O Código amorreus ou Bilalama ou Eshnunna (1950a.C.) também refere-se à responsabilidade e compensação por danos causados às pessoas. O Código de Hamurabi, rei da Baibilonia (1950-1900a.C.), corpo de leis, trata de normas do exercício pro� sional, da responsabilidade civil e criminal do médico, dos honorários, recompensas (prêmios) e punições a médicos e cirurgiões. A Lei de Talião, uma das mais antigas, era o princípio da lei hebraica no Êxodo e conformada no Levítico. Na Índia antiga, o Rei-Veda (1500a.C.) e o Yajur-Veda (700a.C.), são documentos que se referem ao exercício da medicina. Na Grécia antiga, começa a ganhar impulso com os � lósofos médicos de medicina (Pitágoras 580-498a.C.), Empédocles (504-443a.C.), Heráclito, entre outros, até alcançar explendor com Hipócrates (460-375a.C.). Seu Juramento é um verdadeiro Código deontológico de ética pro� ssional médica. O Juramento contém as nromas de formação, exercício, sigilo, responsabildiade e honorários pro� ssionais. 8WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Em Roma, no trâmite da Lei Aquila se � scalizava o exercício pro� ssional e se responsabiliza o médico por negligência, pela morte de um escravo, etc. quando o médico foi pouco cuidadoso em uma cirurgia. O envolvimento de médicos na prática forense (judicial) e normas deontológicas apareceram já, entre outras normas, nas Capitulações de Carlos Magno (784-814), nas Orientações de St. Louis (IX.1226-1270) e no Código Penal Carolino, Carlos V. A Deontologia tem origem na lei natural ou inata ou moral, que vem de Deus na essência do ser humano. A lei natural é intrínseca à natureza racional e inteligência humana, para conhecer e diferenciar, pela razão, o bem do mal, o justo do injusto, o que deve ou não deve fazer, etc. Ela está impressa na mente do homem, na sua razão e consciência, para cumpri-la ou não livremente, e é necessária para uma ordem moral que orienta nossas vidas e condutas. 3 - A BIOÉTICA Surgimento da bioética tem como referencial os trabalhos de re� exão de Van Ransselaer Potter (1911-2001), Wisconsin, Madison, EUA, em 1970, com a criação do neologismo bioethics em um artigo intitulado Bioethics, the Science of survival e, posteriormente, no livro intitulado “Bioethics: Brigde to the future”, em 1971 (BENTO, 2008). Se o nome bioética é ainda muito recente, a disciplina que indica não seria nem mesmo imaginável sem uma longa pré-história, que � xa suas raízes nos séculos passados. Desde tempos mais remotos, de fato, a sociedade tem procurado tutelar a vida e a integridade física das pessoas e regular as intervenções sobre a vida, a vida humana em particular. Temos testemunhas seguras de leis nesse âmbito na Mesopotâmia e no Egito, como o Código de Hammurabi (2.394 a.C.). Contudo, a contribuição essencial para o nascimento da ética médica vem do grego Hipócrates (460-370 a.C.) e da sua escola. Figura 3 - Van Rensselaer Potter (1911-2001). Fonte: Harvards Library (2018). Potter, preocupado com o desenvolvimento exponencial do conhecimento cientí� co biológico e com o atraso da re� exão necessária à sua utilização, reivindica a criação de uma nova ciência, uma ciência da sobrevivência, que se baseie na aliança do saber biológico com os valores humanos. A partir de suas pesquisas sobre o câncer, Potter chegou à compreensão que a bioética deveria ser a ciência da sobrevivência diante das diferentes ameaças à vida e de um ambiente que põe em perigo a vida do planeta. 9WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Assim, nasce a palavra bioética (do grego bios: vida), que representa justamente o conhecimento biológico, a ciência dos sistemas viventes, enquanto ética (do grego ethos: ética) representa o conhecimento dos sistemas dos valores humanos. Etimologicamente: ética da vida. Bioética, portanto, pode ser de� nida como a ciência que regula o comportamento humano no campo da vida e da saúde à luz de valores e princípios morais racionais. O médico Van R. Potter, no ensaio Bioethics: bridge to the future, denunciava como inatural e perigosa a separação entre âmbito cientí� co e humanístico do saber e desejava uma mediação entre as duas culturas. Potter, então, requer para a bioética um vasto campo de aplicação, que englobava o controle da população, a paz, a pobreza, a ecologia, a vida animal, o bem-estar da humanidade, e, consequentemente, a sobrevivência da espéciehumana e do planeta como um todo. Todavia, é bom frisar que sempre existiu, no âmbito da � loso� a, da teologia e do direito, um interesse pelos problemas conexos com a vida física e a prática da medicina. Aristóteles, � lósofo grego (384-322 a.C.), dedicou uma parte do seu livro Ética a Nicômaco (seu pai, um médico) ao tratado da virtude, que, segundo ele, é uma espécie de ética que deve guiar conscientemente o agir do ser humano individual e coletivamente. A prudentia é considerada a mãe (genitrix virtutum) e a guia (auriga virtutum) responsável pelas virtudes. O contexto em que surge a bioética, na segunda metade do século XX, é caracterizado por diversos fenômenos sociais e culturais que podemos sintetizar em quatro “nós” contextuais: o tumultuoso progresso das ciências biomédicas e a colocação de novos interrogativos éticos sobre a capacidade de o ser humano administrar tão imediato e enorme poder; a crescente consciência de que existem direitos humanos inalienáveis, como o direito à justiça, que se fundam sobre a dignidade da pessoa humana antes ainda de serem reconhecidos pelas leis civis; a queda do mito da neutralidade ética da ciência; a necessidade de repensar a relação do ser humano com o seu planeta para uma presença mais respeitosa do ambiente e dos seus equilíbrios. Não obstante, essa amplitude de visão reivindicada por Potter, rapidamente o termo bioética limitou-se às questões suscitadas pelo desenvolvimento das ciências biológicas e sua aplicação na medicina. 3.1. Fatores que influenciaram o nascimento da bioética Depois da Segunda Guerra Mundial, o progresso biomédico, do ponto de vista seja cognitivo, seja tecnológico, não tem conhecido paradas, modi� cando, largamente, a própria imagem que o ser humano tinha de si mesmo e da possibilidade de intervenção sobre o próprio corpo. Para ter uma ideia dos espetaculares progressos da medicina, recordamos algumas pedras milionárias (BENTO, 2008). James Watson e Francis Crick, em 1953, descobrem a estrutura molecular do DNA, o material hereditário da vida, que tem a forma de uma dupla hélice, uma descoberta que daria novos rumos à ciência. Com a descoberta da estrutura da dupla hélice do DNA, iniciasse um período fértil no desenvolvimento da genética: o ser humano conseguiu chegar, assim, às raízes da sua identidade biológica. Com o início das técnicas de reanimação, em 1954, modi� ca-se o curso de muitas doenças. 10WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Figura 4 – DNA. Fonte: Pixabay (2019). Em 1955, o primeiro trabalho cientí� co sobre transplantes de rim (o primeiro transplante de coração humano acontecerá em 1967): o ser humano pode renovar partes essenciais do seu próprio organismo e regenerar-se. As primeiras tentativas conseguidas e documentadas de fecundação animal in vitro são de 1955, mas somente em 1978, em Londres, o primeiro nascimento humano pela FIVET – Fertilização in vitro e transferência de embriões: Louise Brown, o primeiro bebê de proveta. O ser humano consegue interferir nos processos gerativos e dominá-los. Com a experimentação ampla da pílula anticoncepcional a partir de 1960, o ser humano pode separar, a seu gosto, o exercício da sexualidade da fecundidade, segundo o que era hipótese pelos teóricos da revolução sexual. Em 1962, a hemodiálise e a questão da justiça. Na impossibilidade de máquina de hemodiálise para todos, quais os critérios para selecionar os pacientes para fazer a diálise? Os professores Ian Vilmut e K. H. S. Campbell, com seus colaboradores do Roslin Institute, de Edimburgo, na Escócia, em 1996, clonam a ovelha chamada Dolly, que logo se torna a mais famosa ovelha do mundo. A clonagem torna-se uma possibilidade de reprodução humana assexuada. E mais ainda: os transplantes de órgãos e a nova de� nição de morte; engenharia genética e eugenia (do grego eu: bom; génos, que signi� ca “raça, estirpe”, junção da qual resulta o signi� cado “bem-nascida”, — refere-se ao melhoramento de uma raça; reprodução assistida e destino dos embriões humanos; a manipulação de genes; mapeamento do DNA, sem entrar, agora, na questão da clonagem, que se torna uma possibilidade de reprodução humana assexuada; a manipulação de genes; mapeamento do DNA etc. Muitas coisas ainda estão para vir. Aí estão algumas das novas fronteiras da ética médica, agora necessitando de princípios mais amplos, criando o campo alargado da bioética. Tais inovações criaram entusiasmo e, junto, perguntas inquietantes. O ser humano se encontrava, pela primeira vez na sua história, na situação de poder controlar muitos aspectos da sua existência, mas estaria em condições de administrar essas potencialidades? O crescimento perturbado dos conhecimentos cientí� cos e dos meios tecnológicos seria acompanhado de um crescimento adequado na consciência dos valores em jogo? Os mesmos progressos técnicos, a extrema especialização das intervenções, a medicina de massa, não corriam o risco de tornar a medicina, feita para o serviço do ser humano, sempre menos humana? Diante de tais questionamentos, faziam-se, portanto, sentir suas estâncias urgentes e imprescindíveis: humanizar a medicina e, sempre em nome do ser humano, indicar orientações e limites à pesquisa e às intervenções biomédicas. 11WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Nos anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, depois do processo de Nuremberg, em 1947 que revelou os horrores dos campos de concentração nazista, nos quais se realizavam delitos abomináveis em nome das leis do Estado e nos quais os próprios médicos haviam praticado as mais loucas e atrozes experimentações, advertiu-se sobre a necessidade de reencontrar, antes de cada legislação e do direito positivo, antes das razões da lei e da ciência, um fundamento transcultural e universal à tutela e promoção da dignidade do ser humano. Essas raízes comuns de eticidade se expressam na elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela ONU no dia 10 de dezembro de 1948. O tema dos direitos humanos constitui um dos motivos condutores de alguns dos mais relevantes fenômenos socioculturais que têm caracterizado a segunda metade do século: os movimentos paci� stas, os fenômenos da contestação juvenil e o feminismo. O crescimento da sensibilidade geral pelas problemáticas da justiça levou a sublinhar a existência de um direito à saúde e, portanto, do direito de todos de poder usufruir de adequada assistência e tratamento. A atuação dessa justiça sanitária ia, porém, de encontro seja às iniquidades estruturais da sociedade, seja à escassez de alguns recursos terapêuticos. Muito impressionou a opinião pública um artigo intitulado � ey decide who lives, who dies (Eles decidem quem vive e quem morre) publicado na revista Life de 9 de novembro de1962. Em 1961, era possível praticar a diálise crônica, mas, por causa da escassez dos aparelhos disponíveis, colocava-se o problema da escolha dos pacientes que poderiam ter mais probabilidade de recuperação. Em Seattle, a maior cidade do estado americano de Washington, foi instituído um comitê com a responsabilidade de indicar os critérios para selecionar os pacientes para fazer a diálise e decidir sobre a vida ou morte deles. No Hospital Israelita de Nova York, em 1964, foram inoculadas células cancerosas vivas em 22 anciãos. Depois da explosão do escândalo na opinião pública, os médicos confessaram, explicitamente, que pensavam poder fazer qualquer pesquisa se dela resultasse um benefício para a ciência. Desde a década de 1930, mas tornado público apenas em 1972, o Tuskegee study (of untreated syphilis in the negro male),18 no estado do Alabama, em que foram deixados sem tratamento quatrocentos negros si� líticos para pesquisar a história natural da doença. Em 1996, o governo norte-americano pediu desculpas públicas àquela comunidade negra pelo que foi feito. O CasoKaren Ann Quinlan (1954-1985), em estado vegetativo depois de um acidente rodoviário. Após o pedido do tribunal, uma comissão julga que fazer no caso e autoriza a retirada dos aparelhos que a mantinham viva, depois de nove anos em estado vegetativo. O dramático dessas questões é que as experiências não ocorreram em passado distante, no interior de países em desenvolvimento. Essas experiências se veri� caram em cidades como Nova York, nas últimas décadas do século XX. Pelo visto, tais cientistas não se assustaram com Nuremberg (1947); Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); Código Internacional de Ética Médica (1949); Declaração de Helsink (1964) e tantas outras declarações e documentos já aceitos e consagrados pela maioria dos países ligados à ONU. A necessidade de tutelar a autonomia e a dignidade das pessoas também nos confrontos das superiores exigências da ciência torna-se objeto de discussões e apreensão na opinião pública americana e mundial quando, no � m da década de 1960, começaram a vazar notícias alarmantes sobre experimentações feitas em seres humanos sem que soubessem que eram usados como cobaias (BENTO, 2008). 12WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA 3.2. Necessidade da ética na saúde A discussão em torno de questões éticas, particularmente, levantados com o progresso das ciências biomédicas (SPAGNOLO,1999), tem sido retomada e ampliada com frequência nas últimas décadas, nos diversos seguimentos e espaços da sociedade e, particularmente, no mundo da saúde. Este fenômeno pode ser explicado observando o momento histórico-social de mudanças no qual vive o mundo ocidental, de indiferença e substituição de valores tradicionais ético-sociais. Mas, qual é o motivo de se dizer que a ética é necessária, em especial nas pro� ssões ligadas ao mundo da saúde? Não se deveria dar a mesma importância da sua vivência em todos os segmentos da sociedade? O fato é que os pro� ssionais da saúde trabalham em contexto intersubjetivo; o contato com as pessoas que se encontram numa situação de necessidade preenche as suas atividades. Não são, com certeza, os únicos cujo trabalho implica uma constante relação com outros; o ensino, a educação, a assistência social, a administração constitui tipos de pro� ssões particularmente voltados também para as relações intersubjetivas. As pro� ssões, relacionadas com os cuidados de saúde, exigem uma forma de contato humano que deixa transparecer mais diretamente que outras (como, por exemplo, a do ensino da matemática ou da investigação química) a postura ética do agente. É por isso, também, que a Ética está sendo estimulada sob o impacto das investigações que surgem do mundo da saúde (RENAUD, 1999). Sem querer distanciar-se da � nalidade desse item, ou seja, da re� exão sobre a necessidade da ética no mundo da saúde, é oportuno considerar que a Ética é uma ciência essencialmente positiva, que orienta o homem verso ao bem, e que só indiretamente proíbe quando se criam obstáculos ao verdadeiro aperfeiçoamento do homem. O seu ponto de partida é o conceito de pessoa humana, enquanto nessa se re� ete à imagem de Deus. A Ética tem sido o principal regulador do desenvolvimento histórico-cultural da humanidade. Sem ética, ou seja, sem a referência a princípios humanitários fundamentais comuns a todos os povos, nações, religiões etc., a humanidade já teria se despedaçado até à autodestruição (SPAGNOLO, 1999). O fato de os seres humanos serem capazes de concordar minimamente entre si sobre princípios como justiça, igualdade de direitos, dignidade da pessoa humana, cidadania plena, solidariedade etc., cria chances para que esses princípios possam vir a ser postos em prática, mas não garante o seu cumprimento. As nações do mundo já entraram em acordo em torno de muitos desses princípios. A Declaração Universal de Direitos Humanos, promulgada pela Assembleia Geral da ONU, em 1948, é uma demonstração de o quanto a ética é necessária e importante. Mas a ética não basta como teoria, nem como princípios gerais acordados pelas nações, povos, religiões etc. Nem basta que as Constituições dos países reproduzam esses princípios, como a Constituição Federal de 1988. É preciso que cada cidadão e cidadã incorporem esses princípios como uma atitude prática diante da vida cotidiana, de modo a pautar por eles seu comportamento. Isso traz uma consequência inevitável: frequentemente o exercício pleno da cidadania (ética) entra em colisão frontal com a moral vigente. Até porque a moral, sob pressão dos interesses econômicos e de mercado, está sujeita as frequentes e graves degenerações (SCLIAR, 2004). A famosa frase do escritor inglês � omas Morus (1480-1535), nenhum homem é uma ilha, possibilita a compreensão de que a vida humana é convívio. Para o ser humano viver é conviver e ninguém consegue viver isolado, sozinho. É justamente na convivência, na vida social e comunitária, que o ser humano se descobre e se realiza enquanto um ser moral e ético. 13WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA É na relação com o outro que surgem os problemas e as indagações morais: o que deve fazer? Como agir em determinada situação? Como comportar-se perante o outro? Diante da corrupção e das injustiças, o que fazer? Como se deve comportar adequadamente ao lado daquele que sofre? Na realidade quotidiana, constantemente são encontradas situações referentes aos problemas morais. São problemas práticos e concretos da vida em sociedade, ou seja, problemas que dizem respeito às decisões, escolhas, ações e comportamentos dos seres humanos – os quais exigem uma avaliação, um julgamento, um juízo de valor entre o que socialmente é considerado bom ou mau, justo ou injusto, certo ou errado, pela moral vigente. O problema é que não se tem o costume de re� etir e buscar os “porquês” das escolhas pessoais, dos comportamentos, dos valores; age-se por força do hábito, dos costumes e da tradição, tendendo a naturalizar a realidade social, política, econômica e cultural. Com isto, perde-se a capacidade crítica diante da realidade. Em outras palavras, não se tem o costume de fazer ética, pois não faz a crítica, nem se busca compreender e explicitar a realidade moral. No Brasil, historicamente marcado pelas injustiças socioeconômico, pelo preconceito racial e sexual, pela exploração da mão-de-obra infantil, ainda existe uma moral masculina, machista, autoritária de domínio daqueles que detêm o dinheiro e o poder em suas mãos. A realidade brasileira se coloca diante de problemas éticos bastante sérios e de necessidades urgentes de mudanças. Os brasileiros estão por demais acostumados com suas misérias de toda ordem. É, exatamente por isso, que o Brasil precisa construir uma moral que seja democrática. É preciso fazer ética, isto é, pensar e discutir para modi� car a moral autoritária, caso contrário, o Brasil não caminhará em termos humanos (SCLIAR, 2004). Infelizmente, ainda se insiste em naturalizar a injustiça e considerar normal conviver lado a lado as «selvas de pedras» e os «barracos de papelões», as crianças e os mendigos nas ruas; acha-se inteligente e esperto o «jeitinho brasileiro» de levar vantagem em tudo, tende-se a considerar como sendo otário quem procura ser honesto. Há na cultura contemporânea uma forte tendência em sacralizar o errado e abandonar princípios éticos já aceitos e consagrados pela experiência social. Todos os dias há notícias de desonestidade na vida pública, exemplos é o que não faltam na recente história de corrupção; abuso de poder; de exploração; de licenciosidade; de violência; «anões do orçamento»; impeachment de Presidente por corrupção; compras de votos parlamentares para a reeleição; o desrespeito e humilhação para com os pobres; e com os doentes que compram remédios caros e falsi� cados; desvios de dinheiro destinados a projetos para diminuir a fome, o analfabetismo, etc.A Ética perdeu muito da sua força. Atualmente, fala-se de ética médica, ética na política, ética na economia, ética no mercado de trabalho, ética na cultura, ética na ciência, ética nos meios de comunicação social, ética na arte, ética no comércio, ética nos negócios, ética na indústria, ética no esporte, ética de boa convivência, ética ecológica, etc. Todos falam de ética: médicos, advogados, arquitetos, etc. Aliás, nunca se falou tanto em Ética como nos últimos anos. Não sem motivos, fala-se numa crise ética, já que tal realidade não pode ser reduzida tão somente ao campo político-econômico. Cada dia se percebe novos deslizes éticos que envolvem questões de valor, de convivência, de consciência, de justiça relacionadas às vidas humanas. Onde há vida humana em jogo, impõe- se necessariamente um problema ético. O homem, enquanto ser ético enxerga o seu semelhante, não lhe é indiferente. O apelo que o outro lança é de ser tratado como um ser humano igual, com os mesmos direitos e deveres e não como objeto ou bicho. Neste sentido, a Ética vem denunciar toda realidade na qual o ser humano é coisi� cado e animalizado, ou seja, o ser humano concreto é desrespeitado em sua condição humana. Numa época de grandes mudanças culturais, apelar para a ética passa a ser um aspecto importante, tanto na vida cívica como do auto entendimento. Para os pro� ssionais, em particular do mundo sanitário, os códigos e as tradições éticas são elementos fundamentais para de� nir normas de conduta do agir pro� ssional e, ao mesmo tempo, de� nir o que signi� ca uma pro� ssão. 14WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA 3.3. Síntese histórica do nascimento da ética na ciência biomédica A história da Medicina não é nova, vem de muito tempo e tem recebido extraordinárias e maravilhosas contribuições de inúmeras pessoas que possibilitaram e, ainda hoje, possibilitam descobertas e conquistas que indicam as grandes capacidades da mente humana em interrogar e descobrir os mistérios presentes na natureza e revelar os seus segredos e o seu poder capaz de admirá-la, modi� cá-la e dominá-la para o bem do homem. Nessa longa história, desde a origem, tem-se o conhecimento da responsabilidade pessoal do médico no seu comportamento (ethos) e que no centro de suas atenções encontra-se sempre a � gura do “paciente”, a pessoa humana sofredora (GOMES,1996). A missão da medicina era convergir toda a sua atenção sobre esta pessoa na sua experiência da dor. Diante de uma autêntica revolução biotecnológica, a história da biomedicina, com o progresso de novas técnicas terapêuticas e preventivas, lança um grande desa� o à humanidade. As tradições éticas da pro� ssão médica se remetem a 2400 anos, século IV a.C. e aos escritos de cultura pitagórico, que se converteria mais tarde no que se conhece como Corpus Hippocraticum. O Juramente hipocrático simboliza os ideais éticos da pro� ssão médica (GOMES,1996). O Juramento hipocrático foi utilizado de forma ampla até o século XIX. A partir desse século, já em época e cultura cristã, surge gradualmente uma rica normativa a respeito da relação médico- paciente, até chegar à elaboração dos Códigos de deontologia médica. O primeiro é de 1847, obra da American Medical Association (AMA), bem como as associações pro� ssionais de outras nações começaram a elaborar os códigos formais de ética. Estes códigos éticos foram modelados, segundo os princípios articulados no juramento hipocrático, baseados no princípio de bene� cência do paciente. Ao longo da história da medicina, esta ênfase paternalista no benefício do paciente, converteu-se na pedra angular da ética médica. Ora, ética e medicina são indissociáveis na origem, não havendo plano de clivagem para saber onde começa uma e onde termina outra. Em meados da década de 1960, certos fatores presentes na medicina e na sociedade convergiram no início de uma mudança nos valores que eram importantes na relação médico- paciente. O mais notável foi a emergência das novas tecnologias, que modi� caram as ideias gerais sobre a Medicina e inclusas o que signi� cava ser humano: engenharia genética, transplante de órgãos, aborto e controle de natalidade, tratamentos médicos e cirúrgicos, baseados na investigação clínica e manutenção arti� cial da vida. Também nessa época, alguns movimentos provocaram mudanças nas ideias socialmente pré-estabelecidas acerca das relações. O movimento de defesa dos direitos humanos, que se preocupava muito além das diferenças raciais, o movimento feminista, etc. O consentimento informado se tornou em um elemento imprescindível da ética médica e da tomada de decisão neste âmbito (BEAUCHAMP; CHILDRESS,2002). A autonomia se transformou em um princípio ético que guiava as opiniões acerca das decisões médicas. A ética médica se tornou em bioética e se estabeleceu a ideia de que a tomada de decisões na medicina não era só uma questão concernente aos médicos, mas também a toda a sociedade. Portanto, os seres humanos não são expectadores marginais do progresso da ciência e da técnica, mas sujeitos e protagonistas de um progresso histórico. Todos têm uma tarefa especí� ca no atual desenvolvimento biotecnológico. 15WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Durante a década de 1970, os aspectos econômicos foram convertendo-se em parte da re� exão da ética. Os benefícios normalmente considerados em termos econômicos e os aspectos éticos se transladaram ao terreno econômico. A obrigação e a distribuição dos recursos passaram a ser tema de debate, e surgia com frequência a pergunta: podem conter-se os custos sanitários sem limitar a atenção médica? As decisões dos médicos e dos pacientes deixaram de ser o único elemento sujeito a consideração. Os interesses da sociedade (em especial os econômicos) se tornaram na maior preocupação. Nos discursos éticos, o princípio de justiça � nalmente se viu desprezado pelos de bene� cência e autonomia, e a justiça passou a considerar-se o espaço adequado dos recursos médicos. 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS Pode-se concluir que a ética é o modo de ser correto, ideal, franco e claro que cada indivíduo deveria trazer em seu interior. A ética orienta os homens a tomarem as decisões corretas e assim atingirem os seus objetivos de forma justa e honesta. As normas nacionais e internacionais analisadas neste capítulo são instrumentos inspirados a partir do profundo desejo de servir o homem para que suas decisões sejam orientadas segundo o desígnio do Criador. As pesquisas em seres humanos devem ter relevância e utilidade tanto social como cientí� ca. A felicidade social, cultural, política e religiosa das pessoas e seu bem-estar é o que as ciências e a sociedade devem visar. O Código de Nuremberg já tratou deste princípio que deve ser observado pelos estudiosos e cientistas. Deve-se recuperar o valor que a vida contém. Uma das crises pelas qual o mundo passa e, em especial o Brasil, é o desprezo e pouco caso que se tem pela vida e seu bem-estar integral. Aqueles que se dedicam ao mundo da saúde, sobretudo das pesquisas cienti� cas, não podem se deixar elevar pela ambição e pela ânsia de poder. São chamados a usar toda a sua competência técnica neste serviço, mas também não se esquecendo de levar, quando necessário, o conforto. O princípio fundamental que constitui a ética é este: o outro não é um objeto, mas um sujeito de direitos e sua vida deve ser digna tanto quanto a minha deve ser. O que sustenta e fundamenta os direitos, a dignidade e o valor do outro é a sua própria vida e a sua liberdade de viver plenamente, sem qualquer tipo de ameaça. Para mais informações sobre as diferenças dos contextos e conceitos de ética e bioética, acessar: PEIXOTO, Tereza Cristina. Bioética e Humanização em Saúde. EaD, p.60-73. Disponível em: <http://disciplinas.nucleoead.com.br/pdf/Livro_bioe- tica_humanizacao_em_saude.pdf>. Acesso em:12/11/2018. 16WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 1 ENSINO A DISTÂNCIA Para mais informações sobre a ética versus outros sistemas normativos, pode ser acessado o PORTAL VER. Refl exão sobre a ética. Disponível em: <http://www. ver.pt/refl exoes-sobre-a-etica/> Acesso em: 16 jan. 2019. Para mais informações sobre ética ler: O Que é Ética. VALLS, Álvaro L. M. Coleção Primeiros Passos - Nº 177 ISBN 85-11-01177-3 - Ano: 1994. Editora Brasiliense. Disponível em <fi le:///C:/Users/Notebook/Downloads/VALLS,%20A. %20O%20 que%20%C3%A9%20%C3%A9tica.pdf> Acesso em: 16 nov. 2018. Uma revisão interessante do conceito de funções pode ser vista no vídeo: conver- sando sobre ética e moral. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=n- xFCuntnocI> Acesso em: 12 nov. 2018 Para mais informações sobre ética ler: Necessidade da ética na saúde. BENTO, Luiz Antonio. Bioética. Desafi os éticos no debate contemporâneo. Paulinas. São Paulo: 2008. Disponível na Biblioteca da UNINGÁ. Lei nº 8.080, de 19/09/1990: Sistema Único de Saúde (SUS). Disponível em: <http://conselho.saude.gov.br/ le- gislacao/lei8080_190990.htm> Acesso em: 16 jan. 2019. 1717WWW.UNINGA.BR UNIDADE 02 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................... 18 1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS .............................. 19 2 - NECESSIDADE DA REGULAMENTAÇÃO ÉTICA DA PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS ......20 3 - FINALIDADES DA PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS ............................................................22 4 - ALGUNS TIPOS DE PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS .........................................................24 5 - PESQUISA EM SUJEITOS EXPOSTOS A CONDIÇÕES PARTICULARES DE VULNERABILIDADE ...............26 6 - PESQUISA EM CONDENADOS À MORTE ........................................................................................................28 7 - PESQUISA NOS CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO NAZISTAS, EM PRISIONEIROS ........................................30 8 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................. 31 PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS PROF. DR. LUIZ ANTONIO BENTO ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: DEONTOLOGIA E LEGISLAÇÃO 18WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO O rápido progresso das Ciências Biomédicas trouxe novos e inquietantes problemas éticos. Porém, o desenvolvimento biotecnológico não pode subordinar a pessoa humana ao interesse das ciências, da atividade experimental e seus interesses econômicos correspondentes. Por outro lado, deixar de realizar a investigação em seres humanos não é aceitável, tendo em vista todos os benefícios incalculáveis que ela pode oferecer. Antiético seria deixar de fazê-la. Este capítulo se propõe a tratar da pesquisa que pode envolver seres humanos e que é destinada ao seu próprio benefício. Trata-se de pesquisa feita para o homem, no homem e com o homem (BENTO, 2011). 19WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA 1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS Não é possível separar a história da experimentação com seres humanos da história da Medicina. É sabido que na era hipocrática já era praticada a vivisseção, com a � nalidade de compreender a estrutura anatômica do ser humano, sendo que só no século XVII foram realizadas as primeiras experiências destinadas à compreensão da funcionalidade do organismo. Contudo, somente na era hospitaleira da medicina do século XIX, é que se deu a maturação dos estudos de � siologia e patologia, essencial ao entendimento da saúde e da doença. Paralelamente à evolução da medicina experimental, em particular da patologia e da farmacologia, a utilização de seres humanos na pesquisa se impôs para o estudo dos mecanismos patogênicos e terapêuticos. Em graus variáveis, esses estudos podem levar tanto a desconfortos passageiros como a danos reversíveis ou irreversíveis, gerando assim con� ito de interesses entre o pesquisador e o sujeito de pesquisa. A tomada de consciência das implicações éticas, legais e sociais da pesquisa biomédica com seres humanos se dá somente depois da Segunda Guerra Mundial, particularmente, através dos julgamentos dos crimes de guerra pelo Tribunal de Nuremberg. Um dos temas mais polêmicos tratados por esse tribunal foi o das experimentações realizadas nos campos de concentração nazistas em prisioneiros sadios e doentes, sem o conhecimento e consentimento dos mesmos. A análise levada a cabo em Nuremberg revelou o desvio da conduta de pesquisadores que, na busca dos bens da saúde e da vida, deixaram de respeitar esses mesmos bens nos sujeitos de pesquisa. Esses desvios não ocorreram unicamente nos campos de concentração nazistas, mas também e posteriormente, em outros países do ocidente, inclusive os EUA. O ser humano vem sendo seguidamente objeto de pesquisas em muitos aspectos da sua realidade, sem que, em muitos casos, sejam devidamente avaliadas as implicações éticas. Um desses aspectos particulares corresponde à necessidade da busca de novas abordagens terapêuticas para o tratamento de doenças ainda sem cura ou aquelas cujas terapias podem ser aperfeiçoadas, o que exige a pesquisa envolvendo seres humanos. Com o rápido avanço das ciências, várias de� nições vêm sendo propostas para pesquisa biomédica, como a apresentada nas Diretrizes Éticas Internacionais para a Pesquisa Biomédica sem Seres Humanos, do Conselho de Organizações Internacionais de Ciências Médicas (CIOMS). Esse documento, proposto com a � nalidade de facilitar e encorajar as atividades internacionais no âmbito das ciências médicas, a� rma que “o termo pesquisa se refere a um tipo de atividade estruturada para desenvolver ou contribuir para o conhecimento generalizável e inclui os estudos médicos e de comportamento relativos à saúde humana. De modo geral, o termo pesquisa é acompanhado pelo adjetivo biomédica para indicar sua relação com a saúde” (CONSELHO DE ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS DE CIÊNCIAS MÉDICAS, 2004). O signi� cado da palavra experimentação não é sempre univocamente entendido. Para alguns autores, esta expressão comporta dois signi� cados: subjetivo e objetivo. Seu signi� cado subjetivo corresponde à experimentação como repetição de uma ação realizada por um sujeito que conhece sua modalidade e êxitos por via ordinária e, dessa forma adquire uma habilidade que antes não possuía. Assim entendida, experimentação corresponde à aprendizagem. No campo cientí� co, o signi� cado que se dá à palavra experimentação é o do método cujo objetivo é o de adquirir um conhecimento novo e generalizável. 20WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Nesse sentido, a experimentação corresponde à veri� cação, mediante o uso direto de procedimentos ou meios que são novos, dos quais não são conhecidas as possíveis consequências diretas ou indiretas, imediatas ou em longo prazo. 2 - NECESSIDADE DA REGULAMENTAÇÃO ÉTICA DA PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS A natureza empírica da biomedicina postula a necessidade da experiência. Depois de Galileu Galilei (1564-1642), a ciência cresceu exponencialmente, levando ao aperfeiçoamento do método experimental e ampliando suas possibilidades e potencial. Por outro lado, a ciência baseada na experimentação e análise da realidade levou a um novo modo de ver a realidade, no qual só é verdadeiro o que se pode demonstrar empiricamente, ou seja, com base em demonstrações experimentais sólidas (BENTO, 2011). Nas últimas décadas, os avanços veri� cados na biomedicina e na biotecnologia permitiram interferir e manipular os seresvivos, inclusive os seres humanos, o que afeta direta ou indiretamente a vida de todos, trazendo importantes e complexas questões éticas. Ainda que os antecedentes da re� exão bioética possam ser rastreados no século XIX foram as atrocidades cometidas na Alemanha nazista que, nos julgamentos do Tribunal de Nuremberg, chamaram a atenção mundial para a necessidade de estabelecer limites para a atividade cientí� ca. O Código de Nuremberg (1947) é um importante marco internacional da regulamentação da pesquisa em seres humanos baseado no conceito dos direitos fundamentais e universais da pessoa humana. Nele foram estabelecidos limites éticos para a atividade cientí� ca dos pro� ssionais que realizam pesquisas com seres humanos, enfatizando a necessidade do consentimento livre e esclarecido dos sujeitos de pesquisa, o que é claramente enunciado no primeiro parágrafo desse código: O consentimento voluntário do ser humano é absolutamente essencial. Isso signi� ca que as pessoas que serão submetidas ao experimento devem ser legalmente capazes de dar consentimento; essas pessoas devem exercer o livre direito de escolha sem qualquer intervenção de elementos de força, fraude, mentira, coação, astúcia ou outra forma de restrição posterior; devem ter conhecimento su� ciente do assunto em estudo para tomarem uma decisão. Esse último aspecto exige que sejam explicados às pessoas a natureza, a duração e o propósito do experimento; os métodos segundo os quais será conduzido; as inconveniências e os riscos esperados; os efeitos sobre a saúde ou sobre a pessoa do participante, que eventualmente possam ocorrer, devido à sua participação no experimento. O dever e a responsabilidade de garantir a qualidade do consentimento repousam sobre o pesquisador que inicia ou dirige um experimento ou se compromete nele. São deveres e responsabilidades pessoais que não podem ser delegados a outrem impunemente. 21WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Figura 1 – Tribunal de Nuremberg. Fonte: Google Imagens (2019). O Código de Nuremberg é seguido pela promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (1948). Esses direitos, tomados como fundamentais e universais, transformaram as relações sociais, particularmente no ocidente. No Artigo Primeiro � ca estabelecido que: “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. Dentro dessa mesma linha de pensamento, o Código Internacional de Ética Médica (1949), ao tratar dos deveres do médico em geral, ressalta que “qualquer ato ou conselho que possa enfraquecer física ou moralmente a resistência do ser humano só poderá ser admitido em seu próprio benefício”. A consciência dos possíveis desvios nas pesquisas médicas não diminui sua legitimidade. Os incidentes que ocorreram, por mais graves que possam ter sido, não invalidam a necessidade da pesquisa em seres humanos, mas mostram a necessidade de haver adequado controle social das mesmas. Ela deverá ser conduzida com rigor cientí� co, prudência e uso de metodologia adequada de modo que sejam alcançados os benefícios das inovações evitando e limitando os possíveis riscos. Nessa perspectiva, Pio XII, ainda em 1958, havia se manifestado sobre a importância e validade da experimentação em seres humanos, a� rmando que a Medicina tem o direito a realizar “tentativas e intervenções, com métodos e procedimentos novos” desde que sejam para o bonum commune, ou seja, voltados para o “interesse da comunidade” e da “sociedade humana”. 22WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA A quarta cláusula da Introdução da Declaração de Helsinki (1964, mantida nas versões posteriores), reconhece que “o progresso da Medicina se baseia na investigação, a qual, em última análise, tem que recorrer, muitas vezes, à experimentação em seres humanos”. Essa Declaração exige a conformidade da pesquisa médica aos princípios cientí� cos geralmente reconhecidos (Art. 12); a clara exposição do projeto em um protocolo relatado por escrito (Art. 14), a submissão a exame de um comitê independente de análise (Art. 15) e a responsabilidade pela condução da mesma por investigador quali� cado (Art. 16). Estes princípios estão claramente expressos, também, na resolução n. 196/96, rea� rmados e atualizados na resolução n. 466/12, do Conselho Nacional de Saúde do Brasil. Como uma nítida evolução da valorização dos direitos da pessoa, nas versões da Declaração de Helsinki, posteriores a 1975, é enfatizada a superioridade ética dos interesses do indivíduo sobre os interesses da ciência e da sociedade. A Cláusula 5 da Introdução da versão de Edimburgo (2000) declara que “a preocupação pelos interesses dos sujeitos deve sempre ter a prevalência sobre interesses da ciência e da sociedade”. Na pesquisa cientí� ca é fundamental de� nir o seu objetivo, o sujeito e as condições de sua realização, seja ela de investigação básica, diagnóstica ou terapêutica. Não pode deixar de ser avaliado o grau de vulnerabilidade do sujeito de pesquisa, pois diferentes situações podem limitar o uso de sua autonomia, tais como as advindas de suas condições de saúde física e mental e de situações particulares de vida, tais como as proporcionadas pelas instituições totais, como são as prisões, os regimentos militares e os internatos. Por outro lado, por não poderem expressar diretamente suas necessidades e desejos, são particularmente vulneráveis os embriões, fetos e menores de idade. No Brasil, em particular, não pode deixar de ser lembrada a situação dos indígenas, que são tutelados pelo estado. Devem sempre ser garantidas as condições para o adequado exercício da liberdade e da autonomia, o que inclui o acesso às informações claras e corretas, que são necessárias para a validade do consentimento livre e esclarecido. A ética deve iluminar o caminho dos pesquisadores, pois ela é capaz indicar o equilíbrio entre a natureza e a pessoa, a tecnologia e a vida humana. Todo ser humano é inviolável e desfruta de igual direito na sociedade, a qual tem o dever de lhe garantir o exercício de sua autonomia na medida de sua capacidade especí� ca. Portanto, em nome da sociedade e da ciência, o pesquisador tem o dever de respeitar e evitar qualquer prejuízo ao sujeito de pesquisa (BENTO, 2011). 3 - FINALIDADES DA PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS Tanto Código de Nuremberg como a Declaração de Helsinki reconhecem uma distinção fundamental entre a pesquisa básica e aquela destinada à aplicação diagnóstica ou terapêutica (BENTO, 2011). A pesquisa básica tem como objetivo direto veri� car hipóteses cientí� cas, sem correlação direta de benefícios com as necessidades do sujeito pesquisado ou da sociedade. Por outro lado, a pesquisa aplicada tem por objetivo o desenvolvimento de métodos diagnósticos ou terapêuticos, e é destinada ao benefício individual e o da sociedade como um todo. Ou seja, enquanto a pesquisa básica tem como � nalidade adquirir conhecimentos, prescindindo de uma utilidade imediata, a aplicada é orientada para a bene� cência, e como tal deve possuir relevância diagnóstico- terapêutica direta para o sujeito da pesquisa, para a sociedade, ou ambos. 23WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA A introdução de novos medicamentos, técnicas cirúrgicas e métodos diagnósticos está sujeita a incógnitas, riscos e perigos para a pessoa humana. Por isso, a proteção da dignidade e dos direitos humanos impõe ao estudo a necessidade de estabelecer critérios que minimizem a possibilidade de ocorrer qualquer tipo de male� cência. Entre os princípios básicos da Declaração de Helsinki encontra-se a obrigação de obter o consentimento livre e esclarecido do sujeito da pesquisa ou de seu representantelegal, o que é exigido pela Resolução n. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil. Todavia, se por algum motivo não for possível obter o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), a Resolução acima referida dispõe que o Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e, se for o caso, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), após a devida análise do protocolo da pesquisa, diante de justi� cativas relevantes e eticamente aceitáveis, poderá dispensar sua necessidade. Embora, a pesquisa com sujeito humano exija o seu livre consentimento ou do seu responsável legal, a responsabilidade da pesquisa é sempre do pesquisador e não do paciente. O pesquisador deve respeitar o direito de cada indivíduo resguardar sua integridade pessoal. Para evitar con� ito de interesses, o sujeito de pesquisa não pode ter uma relação de dependência com o pesquisador, tal como aquela que existe entre comandado e comandante no exército, professor e aluno nas universidades, e qualquer outra situação análoga de hierarquia. Por outro lado, a qualquer momento, no decorrer da pesquisa, o paciente ou seu responsável são livres para desistir da autorização dada para a realização do estudo e deixar de ser sujeito de pesquisa. A recusa para se tornar sujeito de pesquisa ou, depois de tê-lo aceito, desistir de completar o estudo proposto, não deve interferir no seu direito de receber o tratamento preconizado para doença. A razão da pesquisa de novos métodos terapêuticos reside na esperança de encontrar alívio do sofrimento, prevenção e remédio de doenças para as quais não há tratamento possível ou, para aquelas que já dispõem de alternativas terapêuticas, outro mais e� ciente. O mesmo se pode dizer sobre os métodos diagnósticos. Na pesquisa clínica o estudo desses novos métodos diagnósticos ou terapêuticos só é eticamente aceitável na condição dos pacientes não serem privados do uso dos melhores métodos disponíveis, o que permite a veri� cação da semelhança ou superioridade do tratamento proposto em relação aos já existentes. Não é eticamente aceitável privar o paciente de procedimentos seguros para experimentar outros desconhecidos, sem e� cácia comprovada e possíveis efeitos secundários desconhecidos. Assim sendo, não pode ser utilizado placebo ou de métodos de retirada de tratamento já estabelecido (washout) na realização de estudos envolvendo medicamentos. Esta é a razão pela qual a resolução n. 404/2008, do Conselho Nacional de Saúde do Brasil discorda da nova Declaração de Helsinki, uma vez que esta aceita que um novo medicamento seja comparado ao placebo em populações que não dispõem de nenhum tipo de tratamento. Ainda, em 1975, no Brasil, as pesquisas clínicas foram regulamentadas pela Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) n. 671/1975, publicada no Diário O� cial (Seção I - Parte II) de 01/09/1975. A resolução foi aprovada em vista da necessidade de estabelecer normas de orientação a serem seguidas pela classe médica, referentes às pesquisas e entendimento entre o pesquisador e o sujeito da pesquisa. A resolução assegura que o legítimo interesse do pesquisador não deve, de forma alguma, por em perigo a vida do indivíduo submetido à pesquisa e considera a Declaração de Helsinki, adotada pela Associação Médica Munidal, como guia a ser seguido pela classe médica em matéria referente à pesquisa com seres humanos. 24WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Os documentos internacionais e nacionais recomendam que as pesquisas não- terapêuticas, antes de serem aplicadas ao homem, sejam realizadas previamente em modelos celulares e animais. Os projetos de pesquisa devem ser rigorosos e cuidadosamente pensados e aprovados por um comitê legitimamente reconhecido. De acordo com as normas vigentes no Brasil, o paciente não pode ser visto como mero objeto de pesquisa, mas como seu sujeito ativo. 4 - ALGUNS TIPOS DE PESQUISA BIOMÉDICA COM SERES HUMANOS A pesquisa com seres humanos faz parte da própria história da Medicina, feita ao longo dos séculos em todo o mundo, com diferentes padrões de ética e de qualidade. Ela pode ser realizada com indivíduos voluntários, sadios ou doentes, sendo exigência ética que possam exercer sua autonomia ou que seus responsáveis a represente (BENTO, 2011). Assim sendo, pessoas em condições de grande vulnerabilidade não devem ser sujeitos de pesquisa, tais como os condenados à morte, prisioneiros, militares, internos em instituições destinadas aos cuidados de órfãos e pessoas abrigadas em campos de refugiados, entre outros. Uma forma particular de pesquisa é a realizada em si mesmo, o que se constitui na assim chamada auto-experimentação. Muitos pesquisadores testaram desta forma a validade de novas terapias, causando, por vezes, a própria morte. Trata-se de uma atividade cientí� ca que foge às regras da pesquisa comum sobre outros sujeitos. Ao longo da história, alguns gestos de altruísmo podem ser recordados. Entre outros, está o caso de Moisés Maimônides, médico e � lósofo hebreu do século XII, que instruía os seus aprendizes a experimentar sobre si mesmos a e� cácia dos procedimentos então disponíveis. Werner Forsman, Prêmio Nobel de 1956, realizou o cateterismo cardíaco em si próprio, pela primeira vez, em 1929. Outro pesquisador que usou a si mesmo, além da mulher e dos � lhos, como sujeitos de pesquisa, foi Jonas Salk. Por ocasião dos testes iniciais com a vacina contra a poliominite, Salk declarou: “Quando você inocula crianças com a vacina contra a pólio, você não dorme bem por dois ou três meses”. Para resolver seu con� ito, Salk decidiu compartilhar os mesmos riscos, e assim, vacinou a si mesmo, sua mulher e seus � lhos. Na história da medicina no Brasil, recorda-se que o Dr. Vital Brasil, cientista de fama mundial por ter desenvolvido os soros antiofídicos, deixou-se morder por cobras venenosas para poder testar a e� cácia e segurança desses soros. Deve ser notado que, do ponto de vista ético, a sociedade não é aceitável que alguém seja exposto a qualquer risco desnecessário ou desproporcional, mesmo que seja o próprio pesquisador, que deve seguir as normas válidas para todo e qualquer sujeito de pesquisa. Por outro lado, o uso de familiares – como cônjuges e � lhos – não é aceitável, pois essas relações familiares tornam o sujeito de pesquisa vulnerável, uma vez que existe uma coação, ainda que afetiva e inconsciente, que limita a liberdade para aceitar ou não participar do experimento. Essa situação gera um con� ito de interesses entre o desejo da descoberta cientí� ca e o uso das pessoas próximas como sujeitos de pesquisa expostos a riscos não previsíveis (BENTO, 2011). Nem todos os experimentos destinados ao estudo de novos métodos diagnósticos e terapêuticos podem ser estudados em pessoas sadias. Como exemplo pode ser citado a determinação de características farmacocinéticas de medicamentos novos ou de seus similares (como ocorre no caso dos medicamentos genéricos) em sujeitos sadios. Neste caso, o uso de sujeitos de pesquisa sadios evita a interferência das alterações funcionais advindas da doença, que podem levar a interpretação errônea dos resultados obtidos. 25WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Ainda que toda experimentação em seres humanos envolva riscos para o sujeito de pesquisa, esses estudos em pessoas sadias exigem cuidados especiais para minimizá-los ao máximo. Tanto as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos, do Conselho Nacional de Saúde, Resolução n. 196/96, como o Código de Ética Médica brasileiro, a pesquisa com sujeito humano não pode ser realizada sem que o participante tenha dado consentimento por escrito, após devidamente esclarecido sobre a sua natureza, possíveis riscos e benefícios. Outras exigências postas pela Resolução n. 196/96 em relação à obtenção do termo de consentimento livre e esclarecidose refere à necessidade de todos os esclarecimentos serem apresentados em linguagem acessível àqueles que possam ser convidados a participar como sujeitos de pesquisa de estudos em seres humanos. Na situação particular de nosso país, em que grande parte da população pode ser considerada vulnerável, quer pela situação econômica, quer pela baixa escolaridade e di� culdade em ler e compreender ideias expressas através de termos técnicos e linguagem elaborada, o processo de esclarecimento exige especial cuidado, pois sem ele qualquer consentimento não tem valor ético e legal. Isso é decorrência do fato de que aquele que é convidado a se tornar sujeito de pesquisa só pode tomar uma decisão livre e consciente se tiver compreendido na medida de sua capacidade, os riscos e benefícios aos quais estaria se expondo ao participar do estudo. Outro elemento importante a ser ponderado é saber quais são as motivações que levaram uma pessoa a se apresentar como voluntário para uma determinada pesquisa. Ainda que no Brasil o sujeito de pesquisa não possa ser remunerado por sua participação nos estudos, é previsto o ressarcimento dos gastos com transporte e alimentação. Assim sendo, é possível que um voluntário em di� culdade econômica possa participar de um estudo clínico unicamente com o intuito de auferir algum lucro, seja monetário ou material, representado, por exemplo, pela alimentação oferecida nos dias em que os procedimentos experimentais são realizados. É eticamente inaceitável que sejam oferecidas vantagens aos sujeitos de pesquisa com o intuito de aliciá-los, pois isso criaria um grave con� ito de interesses. O mesmo impeditivo ético se dá quando o procedimento experimental é oferecido como a cura para um doente incurável, que por sua própria condição de saúde se encontra extremamente vulnerável, sem expor os limites do tratamento previsto, seus possíveis riscos e benefícios. Isso envolveria, de certo modo, prometer o que não é possível, gerando uma expectativa maior do que a real, portanto falsa ou fantasiosa e, assim sendo, com alta possibilidade de ser frustrante. Esta situação poderia ser entendida como a indução de pessoas altamente vulneráveis a aceitar a condição de sujeito de pesquisa através da insinuação de benefícios que podem ser esperados, mas que não podem ser garantidos, dos procedimentos experimentais (BENTO, 2011). A condição de voluntário dos sujeitos de pesquisa não exime o pesquisador da responsabilidade por todos os efeitos decorrentes da pesquisa. 26WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA 5 - PESQUISA EM SUJEITOS EXPOSTOS A CONDIÇÕES PARTICULARES DE VULNERABILIDADE A partir do � nal da Segunda Guerra Mundial, dois fatores levaram a uma reavaliação da necessidade de regular a prática médica. Por um lado, os horrores dos campos de concentração associados a pesquisas médicas realizadas em certos grupos da população tinham chocado e envergonhado o mundo. Por outro lado, o progresso cientí� co e tecnológico trouxe situações novas que exigiam decisões complexas, tais como a escolha de pacientes para receber tratamentos não disponíveis para todos os que dele poderiam ser bene� ciários (BENTO, 2011). Foi o horror causado pelos experimentos nazistas que estimularia a elaboração do primeiro texto de referência em bioética, de alcance internacional: o Código de Nuremberg (1947). Figura 2 – Experimentos genéticos nazista. Fonte: Google Imagens (2018). O Código elaborado, por ocasião do julgamento dos crimes de guerra realizados pelo Tribunal Internacional de Nuremberg, em 1947, contempla um conjunto de princípios que deveriam nortear as pesquisas a serem realizadas em seres humanos, que recebeu o nome de Código de Nuremberg. Isso não impediu que continuassem sendo desenvolvidos estudos em seres humanos no chamado mundo civilizado. Há casos clássicos, bem documentados, como o Tuskegee Syphilis Study, iniciado na década de 1930 e conduzido por muitos anos, cujos resultados se tornaram públicos apenas em 1972. 27WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA Esse estudo, realizado pelo Public Health Service em Macon County, Alabama, EUA sem o conhecimento e o consentimento dos sujeitos de pesquisa, analisou doentes de sí� lis de uma comunidade pobre constituída por afro descendentes analfabetos que não receberam tratamento com o objetivo de estudar a evolução natural da doença (PUBLIC HEALTH REPORTS, p. 391- 395). Em 1996, o governo norte-americano pediu desculpas públicas àquela comunidade negra pelo que foi feito. Diante da gravidade dos problemas que vão aparecendo, uma Declaração que trata das questões relativas às pesquisas em seres humanos é submetida à votação e aprovada na XVIII Assembleia Médica Mundial realizada em Helsinki, Finlândia, em 1964. O texto foi revisado pela primeira vez durante a 29ª Assembleia Geral, em Tóquio e, posteriormente, nas Assembleias de Veneza (1983), Hong-Kong (1989), Sommerset West, África do Sul (1996), Edimburgo, Escócia (2000) e Seul, Coreia do Sul (2008). Sua última versão, sob pressão das empresas multinacionais de fármacos, relativizou o uso do placebo, razão pela qual o Brasil não a rati� cou. A Resolução n. 404/2008 do Conselho Nacional de Saúde e o novo Código de Ética Médica, Resolução CFM n. 1.931/2009, expressam a posição brasileira contra o uso de placebo e eventual suspensão de tratamento (washout). Trabalho publicado por Hans-Martin Sass (1983) mostra situações ainda anteriores à guerra, como a de uma circular emitida pelo Ministério da Saúde alemão em 1931, destinada a regular o uso de novas terapias e as pesquisas cientí� cas em seres humanos, a qual continuou vigente durante o regime nazista. Neste documento o direito à concordância do paciente, ou de seu subs- tituto legal, foi reconhecido. Ele devia conceder seu consentimento “claro e indubitável” para participar em ensaios clínicos e experimen tais programados. Sua ordenação legal é muito semelhante à encontrada no Código de Nuremberg, publicado em 1947, como mostra Sass (KOTTOW, 2008). A semelhança entre os variados códigos existentes, tanto internacionais como locais, mostram convergência universal de opinião sobre os princípios éticos fundamentais, o que pode ser tomado como uma manifestação da existência de uma lei natural. Isto pode ser con� rmado pela observação das legislações estabelecidas em diferentes países. O fato dessas legislações não impedirem atrocidades registradas com certa frequência faz pensar que a questão fundamental esteja relacionada com a atribuição da condição humana ou da cidadania. Por não terem sido considerados seres humanos e cidadãos merecedores de respeito, os ciganos, homossexuais, doentes mentais, idosos incapacitados e judeus, entre outras pessoas não desejadas pela sociedade nazista, a legislação acima citada não interferiu nos experimentos realizados por cientistas, dentre os quais Mengele pode ser tomado como paradigma. De fato, apesar da Lei, a sociedade (representada pelo estado) não os incluiu como dignos dos direitos mais fundamentais. A � m de assegurar as exigências de base legal do sistema da bioética, a Declaração de Helsinki prescreve que a missão do médico é salvaguardar a saúde das pessoas e o seu conhecimento acumulado deve estar a serviço dessa nobre missão. A declaração, em seus princípios básicos, exige que a pesquisa cientí� ca respeite uma proporcionalidade adequada entre os possíveis riscos e benefícios para o sujeito de pesquisa. Além disso, deve também respeitar a privacidade do participante e minimizar o impacto do estudo sobre sua integridade física e mental e sobre sua personalidade e ser adequadamente informado sobre os objetivos, métodos, benefícios previstos e potenciais perigos do estudo e o incômodo que este possa acarretar. 28WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO ADISTÂNCIA No Brasil, em concordância com a Declaração de Helsinki, os objetivos, fundamentação cientí� ca, riscos e benefícios, programa e cada procedimento da pesquisa a ser realizada em seres humanos devem ser enunciados claramente em um protocolo de pesquisa que deve ser avaliado por um Comitê de Ética em Pesquisa e, quando necessário, pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). En� m, há uma farta bibliogra� a sobre a eticidade das pesquisas em pessoas particularmente vulneráveis, pois se reconhece que nelas pode haver fatores que lhes diminuem a liberdade de decisão. Deve ser cuidado para que, quando convidadas a participar como sujeitos de pesquisa, tenham a plena liberdade para manifestar seu consentimento, evitando qualquer situação que possa representar coação, tais como as originadas em necessidades econômicas, comum nos países em desenvolvimento (BENTO, 2011). 6 - PESQUISA EM CONDENADOS À MORTE É antiga a prática da experimentação em sujeitos condenados à morte. Recorda-se, por exemplo, no século V a.C., o médico Heró� lo, vivissecava seres humanos condenados à morte para estudar a anatomia e a � siologia do corpo. Mas, têm-se notícias recentes de Estados que realizaram experiências e tratamentos de alto risco com condenados à morte. A Declaração de Helsinque (1964) da AMM, com o título Recomendações para a orientação de médicos quanto as pesquisas biomédicas envolvendo seres humanos», na sua Introdução prescrevem que «a missão do médico é salvaguardar a saúde das pessoas. Seu conhecimento e sua consciência são dedicados ao cumprimento desta missão. Segundo a Declaração de Helsinque, princípios básicos para uma intervenção exigem que esta seja proporcional ao risco inerente para o participante (I.4); o desenho e a realização de cada procedimento experimental, envolvendo seres humanos devem ser enunciados claramente em um protocolo de experiência que deve ser transmitido, para consideração, comentários e orientação, a um comitê, especialmente nomeado, independente do investigador e do patrocinador, desde que este comitê independente esteja de acordo com as leis e regulamentos do País onde se realiza a pesquisa (II.2); a recusa do paciente em participar de um estudo nunca deve interferir na relação médico-paciente (II.4); deve ser antecedido por uma avaliação cuidadosa dos riscos previsíveis, em comparação com os benefícios previstos, para o participante ou para terceiros (II.5); respeitar a privacidade do participante e minimizar o impacto do estudo sobre sua integridade física e mental e sobre sua personalidade (II.6); deve ser adequadamente informado sobre os objetivos, métodos, benefícios previstos e potenciais perigos do estudo, e o incômodo que este possa acarretar (II.7). No Brasil, as pesquisas, envolvendo seres humanos, devem atender às exigências éticas e cientí� cas fundamentais que consiste em: a) consentimento livre e esclarecido dos indivíduos- alvo e a proteção a grupos vulneráveis e aos legalmente incapazes (autonomia). Nesse sentido, a pesquisa, envolvendo seres humanos, deverá sempre tratá-los em sua dignidade, respeitá-los em sua autonomia e defendê-los em sua vulnerabilidade; b) ponderação entre riscos e benefícios, tanto atuais como potenciais, individuais ou coletivos (bene� cência), comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos; c) garantia de que danos previsíveis serão evitados (não-male� cência); e d) relevância social da pesquisa com vantagens signi� cativas para os sujeitos da pesquisa e minimização do ônus para os sujeitos vulneráveis, o que garante a igual consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação sócio humanitária (justiça e equidade). 29WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA O CEM em vigor, no Capítulo XII, Art. 130, proíbe ao médico de «realizar experiências com novos tratamentos clínicos ou cirúrgicos em paciente com afecção incurável ou terminal sem que haja esperança razoável de utilidade para o mesmo, não lhe impondo sofrimentos adicionais». Ora, conforme esse Código, o médico jamais poderá realizar Conforme a Resolução 196/96, Capítulo III.1, “qualquer estudo que seja que venha a expor o paciente a qualquer tipo de risco grave, em particular ao risco da morte. Parece improvável que um estudo que envolvesse alto risco à vida do paciente fosse aprovado pelos Comitês de Ética a partir do fato de que o paciente recebera uma sentença de morte pela Justiça. Além disso, toda a rotina dos estudos/testes precisa ser necessariamente apresentada ao paciente de antemão de forma que ele saiba exatamente como o estudo será encaminhado. Nada pode ser feito diferentemente daquilo que foi combinado”. Outro elemento importante a ser veri� cado e levado a sério pelo médico e pelo pesquisador é que ninguém tem o direito de interferir na vida e destino de outro de forma irreversível e de� nitiva. Desta forma, convém ressaltar que “o pesquisador, ainda que com o consentimento do condenado, chama para si um poder divino – que é a decisão de quando alguém deve morrer. Um sentenciado à pena de morte vive mesmo nos seus últimos dias e momentos de vida, uma experiência única na medida em que vê abreviada sua existência na Terra em virtude de um crime gravíssimo cometido no passado. Nessas condições, cada segundo de vida na Terra tem uma importância fundamental para a vida espiritual desse indivíduo na medida em que ele pode rever seus atos e, nesse processo, modi� car sua caminhada espiritual a partir do arrependimento sincero submetido ao perdão divino” (RESOLUÇÃO 196/96). O que não falta são escritos sobre a eticidade das pesquisas em presos e pessoas com poucos recursos, pois se reconhece que neles poderá ter fatores que lhes diminuem a capacidade livre de decisão. A pesquisa, envolvendo sujeitos presos, deve ter o cuidado para que seu consentimento não seja obrigado ou coagido por medo a uma repressão ou por outras necessidades, como por exemplo: econômica, prática muito comum nos países pobres do chamado Terceiro Mundo. Os limites objetivos da vida e da integridade da pessoa valem para todo o caso, também para as pessoas prisioneiras. Certamente Para os autores Pessine; Barchifontaine (2014), o uso dos seres humanos em experimentos cientí� cos traz inegáveis benefícios sociais. Contudo, é preciso admitir: existe um con� ito virtual entre o interesse do indivíduo submetido à experimentação e o interesse da ciência. Esse con� ito, porém, pode chegar a ser insuportável, como atestam os experimentos conduzidos nos campos de concentração nazistas, onde prisioneiros raciais, políticos e militares foram postos à disposição dos médicos para todo e qualquer tipo de experimentação. Pesquisas revelam que os prisioneiros eram as pessoas indicadas para experiência médica, não se pode negar que os mesmos são sujeitos com capacidade para decidir se querem ou não participar de experimentos cientí� cos, não obstante acabam sendo na prática, pessoas vulneráveis e sujeitas ao abuso. Esta não é mais uma prática comum, pois as leis internacionais e nacionais são muito atentas a estes aspectos da pesquisa, sobretudo nos países onde estas leis são sérias e levadas a sério (HOSSNE, 2003). 30WWW.UNINGA.BR DE ON TO LO GI A E LE GI SL AÇ ÃO | U NI DA DE 2 ENSINO A DISTÂNCIA 7 - PESQUISA NOS CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO NAZISTAS, EM PRISIONEIROS É largamente reconhecido que os experimentos conduzidos em prisioneiros pelos médicos nazistas nos campos de concentração durante a segunda guerra mundial foram de fato crimes brutais cometidos com a aparência de pesquisa médica. As experimentações em prisioneiros nos campos de concentração nazistas marcaram um dos períodos mais cruel da história da humanidade. Na linguagem comum, Auschwitz é uma palavra símbolo que representa, para os hebreus, todos os campos de extermínio nos quais seus parentes e amigos são mortos,
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