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LUCAS MOTTA DA ROSA AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE CONHECIMENTO DOS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM ACERCA DOS RISCOS OCUPACIONAIS NO HOSPITAL UPA FRANCO ROCHA/SP São Paulo 2020 LUCAS MOTTA DA ROSA AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE CONHECIMENTO DOS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM ACERCA DOS RISCOS OCUPACIONAIS NO HOSPITAL UPA FRANCO ROCHA/SP Monografia apresentada à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho. São Paulo 2020 AGRADECIMENTOS A Deus por ter me dado saúde e força para superar as dificuldades. À minha esposa Aline Pansarine da Rosa e minha filha Bárbara Pansarine da Rosa que estiveram sempre ao meu lado me apoiando e motivando, pois sem elas nada faria sentido. Agradeço a diretoria da Unidade de Pronto Atendimento de Franco da Rocha em nome dos coordenadores Genilson Geraldo e Lincoln Salgado e todos que participaram da pesquisa. E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, o meu muito obrigado. RESUMO Pretende-se no presente trabalho uma discussão sobre os conhecimentos dos profissionais de enfermagem de um Hospital sobre os riscos ocupacionais, objetivando delimitar e compreender esses conhecimentos e discutir sua ligação com os acidentes do trabalho registrados em ambiente hospitalar. Para tanto, parte-se de pesquisa qualitativa e empírica, onde o substrato teórico construído a partir da análise da contribuição teórica e das pesquisas de diversos autores sobre saúde, enfermagem e acidentes ocupacionais são relacionadas à uma série de entrevistas com profissionais de enfermagem na Unidade de Pronto Atendimento – UPA, da cidade de Franco da Rocha. Constata-se que os profissionais possuem conhecimentos razoáveis sobre riscos ocupacionais e como preveni-los, e que esses conhecimentos têm bastado para prevenir de fato os profissionais dos acidentes e adoecimentos, que raramente tem ocorrido. Mas os profissionais de enfermagem entrevistados demonstraram dificuldades em explicar, a nível mais conceitual, sobre o que é acidente ocupacional. Diante do levantamento teórico relaizado e do confronto com as informações colhidas junto aos profissinais de saúde entrevistados foi possível delinerar um quadro indicando que existe o conhecimento e a preocupação do prossifional com relação aos riscos da atividade laborativa, indicando-nos a necessidade de uma ampliação e aprofundamento do conhecimento técnico por parte desses profissionais em relação a tal problemática, o que poderia minimizar ainda mais a incidência de sinistros laborativos e funcionar como catalisador e difusor das técnicas de segurança do trabalho naquele meio. PALAVRAS-CHAVES: Enfermagem. Risco ocupacional. Normas de segurança. Infecção. ABSTRACT The aim of this paper is to discuss the knowledge of nursing professionals in a hospital about occupational risks, aiming to delimit and understand this knowledge and discuss its connection with occupational accidents recorded in a hospital environment. To do so, it starts with qualitative and empirical research, where the theoretical substrate built from the analysis of the theoretical contribution and research by various authors on health, nursing and occupational accidents is related to a series of interviews with nursing professionals in the Unit Emergency Department - UPA, in the city of Franco da Rocha. It appears that the professionals have reasonable knowledge about occupational risks and how to prevent them, and that this knowledge has been sufficient to actually prevent professionals from accidents and illnesses, which has rarely occurred. But the nursing professionals interviewed showed difficulties in explaining, at a more conceptual level, what occupational accidents are. In view of the theoretical survey and the confrontation with the information gathered from the health professionals interviewed, it was possible to delineate a table indicating that there is the knowledge and concern of the professional in relation to the risks of work activity, indicating the need for expansion and deepening of technical knowledge on the part of these professionals in relation to this problem, which could further minimize the incidence of labor claims and act as a catalyst and diffuser of work safety techniques in that environment. KEYWORDS: Nursing. Occupational risk. Safety rules. Infection. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Dados da pesquisa de Balsamo e Feli sobre exposição a líquidos corporais 22 Figura 2: Dados da pesquisa de Balsamo e Feli sobre exposição a líquidos corporais segundo tipo de acidentes e agente causador 23 Figura 3: Informações obtidas na pesquisa de campo com relação aos profissionais entrevistados que sofreram acidentes no trabalho 26 Figura 4: Informações obtidas na pesquisa de campo com relação ao conhecimento teórico dos entrevistados sobre a definição de acidente de trabalho – “Sabe o que é acidente do trabalho” 27 Figura 5: Informações obtidas na pesquisa de campo junto aos entrevistados sobre a frequência e regularidade de capacitação fornecida pela Unidade de Saúde palco da pesquisa - “Formação ou capacitação sobre prevenção de acidentes” 29 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 08 1.1. OBJETIVOS 08 1.2. JUSTIFICATIVA 09 2. REVISÃO DA LITERATURA 10 2.1. O HOSPITAL E A ENFERMAGEM 10 2.1. SEGURANÇA DO TRABALHO NA ENFERMAGEM 14 3. METODOLOGIA 24 3.1. ESTUDO DE CASO – UPA – FRANCO DA ROCHA 24 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES DA PESQUISA 26 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 33 APÊNDICE A – AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS 37 APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO 38 APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DE PESQUISA 39 8 1. INTRODUÇÃO Dentre os profissionais que trabalham nos hospitais, os profissionais de enfermagem constituem a população com maior risco de acidentes de trabalho, acidentes estes que podem ser muito graves, a exemplo de acidentes com materiais perfuro-cortantes, onde o risco de hepatites, HIV e diversas outras doenças podem vitimar o profissional. Diversos autores têm trabalhado o fenômeno, arrolando nível de risco, modalidade dos riscos, oferecendo dados empíricos com trabalhos em diversos hospitais, assim como incluindo a discussão dentro de quadros teóricos que lhe dão orientação e compreensibilidade. 1.1 OBJETIVOS Este trabalho busca discutir os conhecimentos que profissionais de enfermagem, da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) de Franco da Rocha - SP, possuem sobre os riscos inerentes ao seu trabalho, buscando compreender a ligação entre os conhecimentos do profissional e os adoecimentos, e acidentes de trabalho. Partiu-se, por isso, de um problema específico que deu orientação a pesquisa: qual o nível de conhecimentos que os profissionais de enfermagem da UPA, possuem acerca dos adoecimentos acidentes de trabalho e sobre como preveni- los Compreender os acidentes de trabalho e adoecimentos a luz da análise da ligação entre conhecimento que o profissional de enfermagem possui sobre os acidentes, a exposição aos agentes biológicos e como evitá-los, buscando delimitar como esses conhecimentos influenciam seu trabalho operando como fator preventivo dos acidentes. 9 1.2 JUSTIFICATIVA Os acidentes de trabalho ocorrem com muita frequência nos hospitais, apenas de uma série de padronizações buscando prevenir todas as formas de acidentes existirem com abundância. Ocorre que o risco, apesar das diretrizes de segurança são, de fato, inerentes a ocupação dos profissionais de enfermagem. Ademais, apesar das diversas diretrizes de segurança, pesquisas tem demonstradoque não são poucos os profissionais que não seguem com rigor essas medidas de segurança, havendo desde o descaso a partir de um conhecimento que não se põe em prática sobre segurança, até um grau de ignorância perante os verdadeiros riscos ou perante os procedimentos a serem tomados para preveni-los. Diante desta constatação, dos riscos inerentes à atividade de enfermagem que, em que pese a multiplicidade de meios de proteção, muitas vezes superando Este trabalho busca contribuir para a Enfermagem enquanto ciência, buscando melhorar as medidas de segurança incluindo nela conhecimentos sobre os conhecimentos dos profissionais e não apenas sobre as medidas operacionais a serem seguidas, assim como contribuir para melhoria nos hospitais, através de um processo de extensão onde os resultados da pesquisa podem ser apreendidos pela gestão hospitalar e pelos profissionais de enfermagem, operando como autoconhecimento com vista a diminuição dos acidentes de trabalho. 10 2 . REVISÃO DA LITERATURA Neste tópico, procederemos ao levantamento da bibliografia já realizada sobre o tema em exame, com o fim de estabelecer uma base sólida para o desenvolvimento da pesquisa e elucidação das propostas apresentadas. 2.1 O HOSPITAL E A ENFERMAGEM A palavra “Hospital”, como afirma Mozachi et. al., (2006), tem sua origem no latim hospitiu que significa um lugar onde as pessoas se hospedam, referende ao estabelecimento criado pelo clero no século IV que tinha como objetivo cuidar de pessoas enfermas, assim como abrigar viajantes peregrinos. Embora surgido na idade medieval, demorou muitos séculos para que os hospitais assimilassem a ideia de saúde como algo não reduzido a cura, mas com o bem-estar da mente do corpo em sua integralidade. Isso precisou de diversas rupturas filosóficas. Quando se tornou local de cura, já havia a preocupação com aspectos ligados ao espaço interior em relação a quantidade de leitos, assim como desenho da área útil, tipos de salas, ventilação, roupas e diversos instrumentos de saúde (SILVA et. al., 2008). Mas um hospital não é uma mera ferramenta de saúde. Trata-se de uma organização perpassada por linhas de interesses, por mecanismos de poder, ou seja, ele está ligado ao posicionamento das classes sociais, dos Estados, dos mercados em relação ao fenômeno da saúde e da doença. Ademais, é um espaço de formação e gestão de identidades profissionais envolvendo status social mais amplo. Trata-se de uma organização jamais acabada, que se transforma conforme a sociedade muda, ou seja, os hospitais estão sujeitos a redefinições conforme o contexto social (FEUERWERKER e CECILIO, 2007). 11 O trabalho e sua gestão em saúde sempre foi afetada pelos avanços da ciência, cada dia mais em constante transformação na contemporaneidade. Essas transformações modificam as formas de diagnosticar doenças, de tradar a doença, se liga ao aumento dos custos, ao processo de institucionalização de novas práticas realizadas pelos profissionais de saúde, assim como gestão do trabalho (SCHRAIBER, 1993). Desta maneira, o processo de trabalho tem sido marcado por transformações que precisam ser compreendidas pelos profissionais. Não houve, ainda, a substituição de trabalhadores por equipamentos, como tem ocorrido em diversos setores da indústria, mas modificou-se práticas em relação as diversas reconfigurações tecnológicas dentro dos hospitais. A atenção à saúde está ligada, assim, a consensos entre profissionais e usuários, assim como o uso de tecnologias duras, que são equipamentos médicos e medicamentos. As tecnologias leveduras, que são aqueles conhecimentos científicos sobre epidemiologia e sobre clínica; e as tecnologias leves, que são aquelas associadas a forma como se realiza o cuidado. Estas últimas são procedimentos realizados tais como tipo de responsabilização pelo paciente, escuta, lo vínculo entre enfermeiro e paciente, singularização, dentre diversos outros pontos que podem ser aqui destacados (MERHY, 2002). As práticas em saúde, o controle sobre os meios de trabalho, a especialização e a assimilação de várias tecnologias estão modificando o contexto hospitalar, fazendo com que haja predominância de tecnologias leve-duras e duras no cotidiano dos profissionais de saúde, havendo uma mitigação da importância dada pelas instituições de saúde, para aqueles pontos ligados as relações entre profissionais e usuários da saúde. Assim, o trabalho em saúde tem se orientado para ações e sua eficácia, relegando a segundo plano as necessidades afetivas e subjetivas do usuário, o que significa uma definição de diminuição da perspectiva cuidadora, como afirmou Merhy (1997). Nas últimas quatro décadas, houve um crescimento das demandas dos usuários sobre benefícios da ciência médica, o que tem aumentado a insatisfação acerca do acesso à saúde, assim como houve aumento da demanda pela qualidade do atendimento em todas as dimensões (MENDES, 1996). 12 O sistema de saúde pública no Brasil se desenvolveu historicamente a partir de lutas sociais ligadas as demandas por democracia e cidadania, demandas estas que estiveram ligadas também ao Movimento de Reforma Sanitária. A Constituição de 1988 foi um marco nos avanços paradigmáticos sobre saúde no país, havendo uma democratização da saúde, pelo menos em suas bases constitucionais, o que já é uma conquista civilizacional. A lei 8.080, assim como a 8.142 são também marcos importantes nesses avanços. Isso tudo deu origem ao Sistema Único de Saúde, conhecido popularmente com o termo SUS. Dentre as características desse sistema, as principais, podem ser arroladas a prática da saúde enquanto direito do cidadão e dever do Estado, assim como a relevância que o Estado passa a dar a saúde sugere que há uma vontade política no sentido de sua promoção, apesar dos problemas que o SUS possui desde sua criação. É interessante notar que a saúde no sistema privado também está inserida dentro de uma gestão por parte do Estado que jamais deixou de legislar sobre a saúde como um todo dentro do país. Há um alargamento, desta forma, da noção de saúde pública para uma perspectiva mais cidadão e republicana. Assim, o SUS regulamente e fiscaliza toda as instituições de saúde e não apenas as instituições pertencentes ao Estado. Inclui-se aí todo sistema de hospitais e clínicas particulares com fins lucrativos, assim como instituições que oferecem planos de saúde. Também se incluem neste contexto as ONGs e diversas entidades de filantropia ligadas a saúde no Brasil (CARVALHO, 2013). É interessante discutir o fato de que quando cidadãos e profissionais de saúde se referem aos objetivos de saúde, a imagem que vem a mente é a de tratar pessoas que estão doentes e que precisam ser curadas. Essa visão predomina na esfera pública e também na esfera privada. Isso significa que uma dimensão fundamental fica de fora que é aquela mais preventiva, ou seja, impedir que a população adoeça. Do ponto de vista de sistemas privados que lucram com os serviços de cura de doentes, fica aberta a questão mais crítica sobre a finalidade pública de instituições privadas de saúde, mas esta é uma outra questão. Mas o que importa aqui é enfatizar que a Constituição de 1988 e a lei 8.080 inclui uma visão distinta dessa que é predominante (CARVALHO, 2013). 13 Na Constituição de 1988, em seu artigo 196, é afirmado, acerca dos direitos sociais, que “saúde é direito de todos e dever do Estado garantido mediante o acesso igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Em seu artigo 198, afirma-se que deve haver “atendimento integral com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”. E no artigo 200, que “ao SUS compete, além de outras atribuições no termo da lei... (a listagem de várias ações do SUS)” (CARVALHO, 2013). A lei 8.080define de forma taxativa os objetivos principais do SUS, que são (1) delimitar e tornar público todos os fenômenos que afetam a saúde; (2) criar políticas de saúde levando em consideração as esferas econômicas e sociais, sempre no intuito de mitigar agravos a saúde; (3) criar práticas de proteção a população, promover ações de assistência e prevenção. Deve promover também estudos epidemiológicos acerca de todos os fenômenos que condicionam a saúde e a doença, tais como alimentação, tipo de moradia, problemas ambientais, trabalho, educação, lazer, salário, saneamento, etc., e divulgar os resultados. Quando o SUS não faz isso, ele opera apenas dentro de um conceito reducionista e mercadológico de saúde, que é o da redução a cura. Essa perspectiva é prejudicial a própria promoção da saúde no Brasil, já que uma política de prevenção além de ser eficaz, diminui custos para o Estado (CARVALHO, 2013). A Unidade de Pronto Atendimento Doutor Franco da Rocha, que se encontra em Franco da Rocha, no Estado de São Paulo, na Avenida Liberdade, número 250, possui 18 leitos de internação adulta, entre masculino e feminino, e uma estrutura para com 14 leitos para Urgência e Emergência, 11 leitos entre emergência, observação e internação pediátrica. O hospital realiza atendimento de complexidade que vai de pequena a média na clínica médica e em diversas especialidades, tais como, pediatria, ortopedia, assim como atende pacientes internados com problemas neurológicos e infectológicos. O hospital possui também serviços de diagnósticos nas áreas de radiologia, eletrocardiografia, assim como diversos exames de análises clínicas. Atende 24 horas a população, tendo equipe administrativa de apoio e equipe multiprofissional, com médicos psicólogos, enfermeiros, nutricionista, assistente social e fisioterapeutas. 14 2.2. SEGURANÇA DO TRABALHO NA ENFERMAGEM A noção de saúde está ligada, como foi dito, a estrutura social, econômica e política. O conceito variou em relação as épocas, o que tem impactado de forma radical as diversas formas como se concebe o atendimento as pessoas que precisam de ajuda. Assim como saúde, a doença opera do mesmo modo. Houve épocas onde masturbação era tida como uma doença, um tipo de atividade patológica que poderia trazer, supostamente, desnutrição pela perda de proteína no esperma, assim como doenças mentais. A masturbação tratava-se com dietas, infibulação, imobilização daquele que se masturba, choques elétricos com aparelhos programados para operar quando houvesse manipulação da genitália. Em alguns períodos, o desejo de fugir de agravos tinha estatuto de doença mental, chamada de drapetomania, que significava, em grego, “escravo”. Samuel Cartwright propõe diagnóstico em 1851, no sul dos Estados Unidos. Este cientista delimitou como forma de tratamento o açoite, que também foi por ele aplicado a disestesia etiópica, que era a falta de motivação para o trabalho que os escravos americanos possuíam (SCLIAR, 2007). Entretanto, o conceito de “saúde” não era universalmente consensual. Foi preciso acordos internacionais para que isso fosse atingido e mesmo a partir da Liga das Nações, após da Primeira Guerra Mundial, isso não foi conseguido. Apenas após a Segunda Guerra Mundial, através das ações da Organização das Nações Unidas e da OMS foi que se constituiu um consenso internacional sobre o que é e fato a “saúde”. Nesse conceito, que foi promulgado na carta de princípios em 1948, declarando também o Dia Mundial da Saúde (7 de abril), e propondo reconhecimento da saúde como direito humano, dever de todo Estado, afirma que saúde é “o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade". Trata-se de uma noção que refletia as demandas dos movimentos sociais após a Segunda Guerra Mundial. A saúde deve, a partir desse novo paradigma, estar ligada no imaginário social a realização de uma vida plena. Foi um confeito eficaz para os promotores da saúde, na medida em que possibilitada compreender todos 15 os fatores que intervêm no fenômeno da saúde, e sobre o que deve o Estado intervir em relação a promoção da saúde. Nesse sentido, Marc Lalonde cunhou o termo “Campo da saúde” em 1974 (SCLIAR, 2007). No que se refere ao profissional de saúde, apenas recentemente, do ponto de vista histórico, foi considerado profissional de alto risco em relação ao acidente de trabalho. Preocupações em relação a riscos biológicos só surgiram quando se constatou os agravos a saúde dos profissionais que trabalhavam nos laboratórios que lidavam com microrganismos e matérias clínicos a partir de 1940. Na área clínica foi apenas com a preocupação com o HIV, a partir de 1980, que se começou a normatizar sobre o problema do acidente de trabalho, havendo uma discussão generalizada acerca dos ambientes hospitalares e seus condicionantes para a saúde dos profissionais (GIR et. al., 1998). Ocorre que a infectividade pelo trabalho é baixa, mas grave, havendo medo por parte dos profissionais. Dentre os profissionais, os de enfermagem são os mais predispostos ao acidente de trabalho porque estão mais diretamente ligados aos pacientes (BALSAMO e FELLI, 2006). A Enfermagem é uma área especializada no fenômeno do cuidar em saúde, assim como, auxiliar a isso, é uma ciência aplicada acerca desse cuidar humano, de certa forma, individualizado, atendendo as especificidades, na família e na comunidade, e busca sempre operar de forma integral e holisticamente para prevenção da doença, promoção da saúde e recuperação (GEOVANNI, 2002). Horta (1979) afirma que é uma ciência e ao mesmo tempo uma arte, se fundamenta nos conhecimentos científicos sobre práticas que abarquem a saúde e a doença, mas mediadas por relações interpessoais, estéticas, éticas e políticas em relação ao ser humano. Florence Nightingale foi a fundadora da Enfermagem em sua versão atual. Ela abriu o primeiro curso de treinamento em 1860, na Inglaterra. Não tinha conhecimentos sobre contato com microrganismos, pois isso ainda não havia sido descoberto, mas já pensavam de forma meticulosa a questão do cuidado, da limpeza do ambiente, sobre iluminação, ventilação, temperatura certa, nutrição, 16 repouso e cura. Até cerca de 1850, a assistência aos doentes era muito limitada, quase inexistentes para a maioria da população, nos hospitais de campanha, e a insalubridade era muito grande (GIOVANINI et. al., 2002). Para Horta (1979), o Enfermeiro deve ser tratado antes de tudo com humano. Isso significa que não deve ser visto como mero instrumento a ser usado, o que significa, grosso modo, que deve ser levadas em consideração aspectos não apenas físico, mas subjetivos, afetivos e éticos. Apenas como ser humano, pode o Enfermeiro atuar, na medida em que o paciente é também humano e precisa ser tratado em seus aspectos afetivos, emocionais e éticos. Seus conhecimentos legitimam como profissional para cuidar de gente. Trata-se de um círculo de relações humanas e não apenas operacionais. O enfermeiro deve observar em seu trabalho dois pontos fundamentais: (1) o da necessidade de respeito a individualidade da situação de do paciente, o que significa ter empatia e compreender o drama que o paciente vivencia; (2) aprender a trabalhar dentro de certo quadro de regras, valores e saber integrar equipes multiprofissionais (AZAMBUJA et. al., 2007). Deve desenvolver seu trabalho conforme orientações de equipes de saúde, mas sem operar mecanicamente e sabendo operacionalizar a ciência e os aparatos técnicos (KAWAMOTO e FORTES, 1997). Segundo Horta (1979, p. 1), o enfermeiro deve assistir o paciente, o que significa que deve realizar pelo paciente o “que ele não pode fazer por si mesmo; ajudá-lo ou auxiliá-lo quando parcialmente impossibilitado de se autocuidar; orientá-lo ou ensiná-lo, supervisioná-lo ou encaminhá-lo a outros profissionais”.Desta forma, a lei 7.498, de 1986, legisla de forma clara sobre a profissão de Enfermeiro, com o texto seguinte: Art. 1º – O exercício da atividade de enfermagem, observadas as disposições da Lei no 7.498, de 25 de junho de 1986, e respeitados os graus de habilitação, é privativo de Enfermeiro, Técnico de Enfermagem, Auxiliar de Enfermagem e Parteiro e só será permitido ao profissional inscrito no Conselho Regional de Enfermagem da respectiva região. Art. 4º – São Enfermeiros: 17 I – o titular do diploma de Enfermeiro conferido por instituição de ensino, nos termos da lei; II – o titular do diploma ou certificado de Obstetriz ou de Enfermeiro Obstétrico, conferido nos termos da lei; III – o titular do diploma ou certificado de Enfermeiro e a titular do diploma ou certificado de Enfermeiro Obstétrico ou de Obstetriz, ou equivalente, conferido por escola estrangeira segundo as respectivas leis, registrado em virtude de acordo de intercâmbio cultural ou revalidado no Brasil como diploma de Enfermeiro, de Enfermeiro Obstétrico ou de Obstetriz; IV – aqueles que, não abrangidos pelos itens anteriores, obtiveram título de Enfermeiro conforme o disposto na letra d do art. 3o do Decreto no 50.387, de 28 de março de 1961. Art. 5º – São Técnicos de Enfermagem: I – o titular do diploma ou do certificado de Técnico de Enfermagem, expedido de acordo com a legislação e registrado no órgão competente; II – o titular do diploma ou do certificado legalmente conferido por escola ou curso estrangeiro, registrado em virtude de acordo de intercâmbio cultural ou revalidado no Brasil como diploma de Técnico de Enfermagem. Art. 6º – São auxiliares de Enfermagem: I – o titular de certificado de Auxiliar de Enfermagem conferido por instituição de ensino, nos termos da lei, e registrado no órgão competente; II – o titular do diploma a que se refere a Lei no 2.822, de 14 de junho de 1956; III – o titular do diploma ou certificado a que se refere o item III do art. 2o da Lei no 2.604, de 17 de setembro de 1955, expedido até a publicação da Lei no 4.024, de 20 de dezembro de 1961; IV – o titular do certificado de Enfermeiro Prático ou Prático de Enfermagem, expedido até 1964 pelo Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia, do Ministério da Saúde, ou por órgão congênere da Secretaria de Saúde nas Unidades da Federação, nos termos do Decreto no 23.774, de 22 de janeiro de 1934, do Decreto-lei no 8.778, de 22 de janeiro de 1946, e da Lei no 3.640, de 10 de outubro de 1959; V – o pessoal enquadrado como Auxiliar de Enfermagem, nos termos do Decreto-lei no 299, de 28 de fevereiro de 1967; VI – o titular do diploma ou certificado conferido por escola ou curso estrangeiro, segundo as leis do país, registrado em virtude de acordo de intercâmbio cultural ou revalidado no Brasil como certificado de Auxiliar de Enfermagem. Art. 7º – São Parteiros: I – o titular do certificado previsto no art. 1o do Decreto-lei no 8.778, de 22 de janeiro de 1946, observado o disposto na Lei no 3.640, de 10 de outubro de 1959; II – o titular do diploma ou certificado de Parteiro, ou equivalente, conferido por escola ou curso estrangeiro, segundo as respectivas leis, registrado em virtude de intercâmbio cultural ou revalidado no Brasil até 26 de junho de 1988, como certificado de Parteiro. 18 Para o Conselho Federal de Enfermagem, existem mais de 100 mil enfermeiros e enfermeiras no Brasil registrados, sendo que cerca de 554.131 profissionais registrados no Estado de São Paulo. Os dados estão dispostos abaixo e são os mais recentes, datando 1 de dezembro de 2019. É importante considerar, sobre a tabela a seguir, que quando o mesmo profissional teve mais de uma inscrição, ele foi contabilizado também mais de uma vez. Tabela 1: Quantidade de profissionais de enfermagem no Estado de São Paulo Enfermeiros (Definitiva Principal) 130.465 Enfermeiros (Definitiva Secundária) 284 Enfermeiros (Definitiva Remida) 3.262 Técnicos (Definitiva Principal) 217.531 Técnicos (Definitiva Secundária) 259 Técnicos (Definitiva Remida) 573 Auxiliares (Definitiva Principal) 200.337 Auxiliares (Definitiva Secundária) 33 Auxiliares (Definitiva Remida) 1.116 Obstetras (Definitiva Principal) 263 Obstetras (Definitiva Secundária) 0 Obstetras (Definitiva Remida) 6 Enfermeiros (Provisória Principal) 2 Enfermeiros (Provisória Secundária) 0 Técnicos (Provisória Principal) 0 Técnicos (Provisória Secundária) 0 Auxiliares (Provisória Principal) 0 Auxiliares (Provisória Secundária) 0 Obstetras (Provisória Principal) 0 Obstetras (Provisória Secundária) 0 Total Enfermeiros 134.013 Total Técnicos 218.363 Total Auxiliares 201.486 Total Obstetrizes 269 Total 554.131 Fonte: (http://www.cofen.gov.br/enfermagem-em-numeros) 19 Os profissionais de enfermagem não devem ser compassivos, pois hoje os enfermeiros devem agir de maneira interdisciplinar combinando os conceitos de gestão hospitalar, humanização da assistência e assistência técnica. Os serviços de enfermagem, mesmo enquanto verdadeiro gerente de uma unidade de negócios (hospital privado) inserida no contexto de um hospital médico exigem especialistas do setor, uma consciência de responsabilidade e as diversas funções que desempenham. (MOREIRA, 1999). A enfermagem possui mais de 50% dos recursos humanos pertencentes ao setor de saúde e é apontada como responsável pela maior parte da prestação de serviços de saúde no Brasil. No entanto, a desvalorização do mercado devido aos baixos salários dobrou ou triplicou o horário de trabalho, colocando vidas e saúde em risco e, como resultado, a indiferença e afastamento das causas sociais são inevitáveis. É importante enfatizar que mais de 85% da equipe de enfermagem é do sexo feminino. Compreendemos perfeitamente as operações políticas institucionais esclarecidas para justificar o baixo salário da equipe de enfermagem. Essas são reflexões do sistema patriarcal que atribui às mulheres um papel secundário na estrutura e divisão dos bens sociais (GEOVANINI et al., 2002). No momento do surgimento do problema do HIV na população com fatores de risco específicos, passou-se a aparecer casos diagnosticados em profissionais de saúde, que estavam fora dos fatores de risco em sua vida pessoal, o que foi descoberto depois que haviam adquirido o HIV a partir do seu trabalho, nos riscos associados a ocupação. Esses especialistas foram expostos apenas profissionalmente ao sangue de pacientes infectados (CDC, 1987a). Essa transmissão relacionada ao risco por meio de atividade ocupacional levantou muitas preocupações, e os Centros de Controle de Doenças advogaram recomendações específicas para a transmissão do HIV em ambientes de saúde (CDC, 1987b). Embora tenha havido um progresso considerável na compreensão dos riscos ocupacionais e de HIV, os profissionais de saúde, especialmente os enfermeiros, enfrentam vários desafios, incluindo resistência ao uso de EPI, assim como muitas vezes não consideram adequadamente os riscos de transmissão (GIR et al., 1998). 20 Mas mesmo que os indicadores de infecção sejam baixos, isso não deve fazer com que as precauções diminuam, sendo o medo algo presente nas equipes de profissionais de saúde, já que, como afirmado anteriormente, são os profissionais mais vulneráveis aos riscos. Machado et. al., (1992), examinou 36 funcionários que foram vítimas de acidentes de trabalho usando materiais que poderiam estar contaminados com o HIV. Esses acidentes foram registrados em Ribeirão Preto- SP entre 1987 e 1990. Dos que foram infectados, 19 (52,78%) eram auxiliares e 7 (19,45%) enfermeiros, e após acompanhamento clínico e sorológico, não houve soro conversão. O CDC (1994) recebeu 42 notificações escritas de transmissão ocupacional até dezembro de 1994, das quais 13 (30,95%) foram incluídas nos enfermeiros. As práticasde enfermagem ainda precisam se concentrar no atendimento humanitário, mas são orientadas por normas que visam implementar medidas de precaução para proteger os profissionais. Como a produção de conhecimento produzido na década de 1980 foi muito intensa, ou seja, achados frequentes sobre o comportamento do HIV e sua evolução, medidas preventivas estabelecidas foram submetidas ao CDC em várias revisões. Últimas foram as medidas de precaução padrão (GIR et al, 1998 apud GARNER, 1996). Essas precauções são ações de prevenção usadas por qualquer pessoa que lide com ou entre em contato com o paciente, independentemente do diagnóstico ou do status provável da infecção. Aplica-se não apenas ao sangue, mas também a todos os fluidos corporais, secreções, excrementos e pele que não se encontra intacta, mucosa, independentemente de sangue estar ou não estar visível. As precauções são: (1) Lavar bem as mãos antes e depois do contato com o paciente e durante diferentes tratamentos do mesmo paciente, após contato com sangue e outros fluidos corporais, equipamentos ou ferramentas contaminadas e depois de se retirar luvas; (2) Utilizar luvas para fornecer barreira protetora; (3) Se houver expectativa de sangue ou outros fluidos corporais, use um avental limpo e não estéril para proteger as roupas e a superfície do corpo. (4) O uso de máscaras e protetores oculares para proteger o nariz, a boca e os olhos, respectivamente, no tratamento e na situação de pacientes que podem experimentar jatos de líquidos corporais, respingos, etc.; (5) Proteção contra objetos pontiagudos e cortantes, para evitar não reencapar após uso, descarte-os em um recipiente com paredes 21 duras para descarte, coloque-o o mais próximo possível da cama, não retire a agulha da seringa e descarte-o; (6) Manuseie o equipamento de assistência ao paciente com sangue e outros fluidos corporais com cuidado. Ele deve ser limpo ou desinfetado antes de ser utilizado em outro paciente. Embora os riscos sejam baixos e já existam recomendações de quimio-prevenção para a exposição ocupacional ao HIV (CDC, 1996), os especialistas sugerem que os riscos decorrentes de fatores institucionais ou pessoais, como negligência, desinformação, tabus, etc., são grandes. O estabelecimento de normas precisa ser adicionado aos fatores básicos que afetam a proteção profissional: bom senso, conscientização, condições de trabalho adequadas e disponibilidade de equipamentos de proteção individual. Através de educação continuada, deve-se promover melhor tudo isso Como resultado, preconceito, desinformação, cuidados inadequados levados ao medo ou situações que representam risco ocupacional de um profissional de saúde, devem ser evitadas. No nível interagências, o Ministério da Saúde desenvolveu uma política de ação integrada ao Ministério do Trabalho, Emprego e Previdência, a Política Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional (PNSST) e suas diretrizes incluem: I – Ampliação das ações, visando à inclusão de todos os trabalhadores brasileiros no sistema de promoção e proteção da saúde; II – Harmonização das normas e articulação das ações de promoção, proteção e reparação da saúde do trabalhador; III – Precedência das ações de prevenção sobre as de reparação; IV – Estruturação de rede integrada de informações em Saúde do Trabalhador; V – Reestruturação da formação em Saúde do Trabalhador e em segurança no trabalho e incentivo à capacitação e à educação continuada dos trabalhadores responsáveis pela operacionalização da política; VI – Promoção de agenda integrada de estudos e pesquisas em segurança e Saúde do Trabalhador. De acordo com o manual Programa de prevenção de acidentes com material perfurocortantes, de 2010, os serviços de saúde apresentam uma variedade de riscos à saúde dos trabalhadores e dos profissionais de saúde devido ao seu complexo ambiente de trabalho. Desses riscos, muito específico dos serviços 22 médicos é o risco de causar acidentes de trabalho com materiais biológicos, principalmente com materiais perfurocortantes. Além de incluir a lesão, uma grande preocupação desse tipo de acidente é a possível transmissão de patógenos transmitidos pelo sangue, principalmente os vírus da hepatite B e C e a HIV. São doenças que causam grandes prejuízos não apenas aos trabalhadores feridos, mas também à sociedade. Mesmo sem soro conversão, os acidentes relacionados a objetos cortantes envolvem o trabalhador ferido, a angústia de sua família e, muitas vezes, custos financeiros significativos (BRASIL, 2010). Estudo de Balsamo e Felli (2006) sobre acidentes de trabalho resultantes da exposição a fluidos humanos em profissionais de saúde do Hospital Universitário de São Paulo (HU-USP) mostra que a enfermagem é a mais proeminente no número de acidentes resultantes da exposição a fluidos humanos. Um total de 71% foram relatados como demonstra a tabela abaixo retirada do trabalho de Balsamo e Felli (2006) Figura 1: Dados da pesquisa de Balsamo e Feli sobre exposição a líquidos corporais Fonte: BALSAMO & FELI 2016 23 O Departamento de Enfermagem foi o mais proeminente no número de acidentes resultantes da exposição a fluidos corporais, com um total de 35 (73%) incidentes seguidos por serviços profissionais de higiene. Observou-se que os auxiliares de enfermagem que representam 52% dos acidentes de trabalhadores desse grupo foram os mais feridos. Isso pode ser explicado pelo fato de os auxiliares de enfermagem estarem expostos a esse tipo de acidente. Porque eles passam a maior parte do tempo diretamente cuidando dos pacientes e realizando uma variedade de procedimentos invasivos. Todo dia esses achados foram semelhantes aos constatados na literatura, com um índice de cerca de 62,9%. Os profissionais de serviços de higienização, especializados, parecem estar em segundo lugar na lista de ocorrências de acidentes. Nos hospitais universitários, esses trabalhadores permanecem estacionários para limpeza em vários departamentos. Eles são frequentemente expostos a acidentes com facadas, encontrando lixo e agulhas descartadas no chão em lugares difíceis de ver. Ocorre acidente durante a coleta de lixo ou durante a limpeza diária usando um pano de limpeza para limpar o chão. Comparando os fatores de risco entre as áreas de trabalho, os profissionais de serviços de higienização correm maior risco de serem expostos a acidentes (cerca de CR = 8,64) e o auxiliar de lavanderia com CR = 12,5. Os acidentes que ocorrem nesses trabalhadores são principalmente com objetos pontiagudos ou cortantes e, na maioria dos casos, a origem do objeto que causou o acidente é desconhecida. Figura 2: Dados da pesquisa de Balsamo e Feli sobre exposição a líquidos corporais segundo tipo de acidentes e agente causador Fonte: BALSAMO & FELI 2016 24 3. METODOLOGIA Partiu-se de uma pesquisa quanti-qualitativa, descritiva, não experimental e transversal. Buscou-se compreender os conhecimentos dos profissionais, ou seja, o intuito não foi explicar esses conhecimentos ou sua ausência, mas resgatar seu sentido, o que é, a rigor, a definição de compreensão. Para tanto, e à luz dos conhecimentos construídos no estudos teórico do tema, pretendeu-se pesquisa de campo , com o fim de delimitar uma perspectiva fática sobre a problemática apresentada, qual seja: o profissional de saúde possui o conhecimento técnico necessário ao afastamento dos riscos profissionais inerentes à sua atividade e, tal conhecimento, é capaz de funcionar de maneira efetiva para atender à finalidade que se destina? Assim, procurou-se realizar pesquisa de campo, com entrevistas aos profissionais de saúde lotados na Unidade de Pronto Atendimento – UPA, de Franco da Rocha. Uma vez obtida autorização da direção do hospital, foi elaborado questionário padrãoabordando os principais pontos de interessa dessa pesquisa. Uma vez determinados os parâmetros e questionamentos à serem investigados, a pesquisa se realizou por meio de entrevistas, na qual grupos de profissionais foram colocados em sala para responder ao questionário, sem qualquer indução do pesquisador ou de contato entre si, havendo liberdade plena para as respostas, que se desenvolveram de forma discurssiva. 3.1. ESTUDO DE CASO – UNIDADE DE PRONTO ATENDIMENTO DE FRANCO DA ROCHA Conforme estabelecido na proposta da pesquisa, a obtenção dos resultados quando ao questionamento levantado se deu por intermédio de estudo de caso, baseada na análise das respostas realizadas pelos funcionários de hospital alvo ai questionário padrão elaborado para fins de pesquisa. A pesquisa operou através de entrevista com os profissionais da Unidade de Pronto Atendimento da cidade de Franco da Rocha, usando questionário. A UPA 25 de Franco da Rocha possui oitenta e sete profissionais de saúde, desde auxiliares e técnicos em enfermagem a enfermeiros. A pesquisa entrevistou 76 dos profissionais supracitados. Do total de profissionais, tivemos 7 profissionais de folgas e 4 profissionais que não aceitaram participar da pesquisa. O período de coleta das entrevistas foi entre 13 de janeiro de 2020 até 26 de janeiro de 2020. Inicialmente foi solicitada autorização dos responsáveis legais pela administração dessas instituições, assim como cada entrevistado assinou um termo de autorização logo após a pesquisa ser explicada e todas as informações serem devidamente dadas sobre o que é a pesquisa e qual sua finalidade. Esta pesquisa empírica foi analisada a partir de um substrato teórico com auxílio de uma pesquisa em bancos de dados na internet e em livros impressos sobre o trabalho de enfermagem e os acidentes de trabalho. 26 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES DA PESQUISA Conformer indicado na metodologia, a discussão da problemática enfrentada transpassou período de pesquisa empírica, no estudo de caso envolvendo profissionais de saúde com sede de trabalho na UPA de Franco da Rocha. Dentre os setenta e seis profissionais entrevistados, quatro afirmaram que já tiveram doença associada ao trabalho, o que vai contra a discussão geral na literatura sobre acidentes em enfermagem, onde se afirmar que o risco de acidente é algo intrínseco e quase natural entre os profissionais da área de enfermagem, que lidam diretamente com os pacientes doentes, como confirma a pesquisa sobre acidentes de trabalho de Ribeiro (2007). É possível verificar da pesquisa de campo que, ao menos no local estudado e entre os profissionais entrevistados, o índice de incidência de doenças associadas ao trabalho é bastante reduzido em relação às constatações extraídas da literatura. Figura 3: Profissionais que sofreram acidentes no trabalho Fonte: ROSA, 2020 27 A totalidade dos entrevistados (100%) afirmou que o hospital onde foram realizadas as entrevistas oferece EPIs adequados a necessidade deles. As respostas foram similares, mencionando óculos, aventais, máscaras e luvas. Esses quatro itens foram padrão em 90% das respostas, sendo que o restante dos entrevistados acrescentava um item a mais ou apenas mencionava 2 ou 3 desses itens. Do total dos entrevistados, 5 disseram não saber o que é acidente do trabalho, e apenas 2 afirmaram não conhecer a NR32. Esse é um dado interessante que demonstra incoerências nas atividades, o que sugere, portanto, a necessidades de análises qualitativa dos dados. Como é possível saber o que é acidente do trabalho, conhecer essa norma de regulamentação que é bem mais específica, e ao mesmo tempo quase todos os entrevistados tiveram alguma forma de acidente ou adoecimento? Figura 4: Sabe o que é acidente do trabalho Fonte: ROSA, 2020 28 É interessante observar algumas respostas dadas pelos entrevistados. Na resposta a seguir, o entrevistado, ao afirmar que sabe o que é acidente do trabalho, afirmam o uso de EPI como uma prevenção para evitar o acidente de trabalho, associando o EPI a uma proteção que vai evitar o acidente de trabalho 100% e já basta para estar protegido. Isso sugere que os conhecimentos se encontram incoerentes, imprecisos. O profissional sabe na prática o que é o acidente ou adoecimento no trabalho, conhece as normas em sua prática, mas não consegue articular através de discurso a sua própria prática. Obviamente, isso tem relação com o grau de preparação acadêmica do profissional. Nenhum dos profissionais enfermeiros teve dificuldade em articular em discurso sobre o que é acidente do trabalho, mas os auxiliares e técnicos tiveram essa dificuldade. Isso corrobora o fato de que as incoerências e imprecisões na forma como o profissional de enfermagem encara discursivamente é devedora de uma preparação acadêmica. Em outros termos, é preciso ter ciência de que quando o profissional menciona elementos que não constituem acidente de trabalho, não significa que ele não saiba o que é acidente de trabalho. Dado os conhecimentos sobre as normas supracitados, assim como a experiência generalizada de acidentes de trabalho e as tomadas de ações cabíveis após o acidente, tudo isso sugere que os profissionais sabem de forma pragmática o que é acidente. Isso pelo menos na maioria dos entrevistados, cerca de 95%. Mas é interessante notar que houveram respostas deveras confusas, como vários entrevistados afirmam que acidente do trabalho “Para evitar acidentes tem eu usar EPI’s”. Ou seja, o entrevistado considera que ao usar EPI ele está totalmente protegido contra acidente de trabalho ou adoecimento. Como é sabido, o uso de EPI é a última das barreiras de proteção e não oferecem completa proteção contra os riscos de acidente e de doenças profissionais. 29 O termo “acidente biológico” foi usado várias vezes, havendo alguma padronização nesse tipo de resposta. O que sugere que os profissionais dialogam entre si sobre os riscos, a ponto de formarem discursos coletivos e noções que constituem parte da consciência coletiva dos grupos de trabalho nos hospitais. Inclusive erros nas respostas parecem ser padronizados, como a menção ao aumento de peso do profissional, tido como acidente do trabalho. Aquele que ocorre devido a algum acidente de serviço, no horário de serviço, dentro da unidade que presta serviço. Doença ocupacional ser devido o risco biológico, psicológico ou devido ao peso, etc. Quanto às informações sobre se o Hospital palco do estudo oferece treinamento para evitar acidentes, os dados foram inconclusivos, sendo impossível fundamentar ao certo com que frequência esse treinamento ocorre. Alguns falaram que a capacitação ocorre de forma trimestral, outros falaram que ocorre semestralmente, houve alguns que disseram que o treinamento ocorre anualmente. Falaram também a formação ocorre sempre que necessário. Alguns se reduziram a apenas dizer que ocorre periodicamente, e ouve quem dissesse que ocorre mensalmente. Figura 5: Formação ou capacitação sobre prevenção de acidentes Fonte: ROSA, 2020 30 Mas dado que esse treinamento constitui uma necessidade sob a ótica das políticas de saúde e dos consensos profissionais sobre prevenção de acidentes, é compreensível que os profissionais fiquem receosos em falar a verdade. Ocorre que, sob o ponto de vista lógica, se as capacitações ocorrem dentro de certa periodicidade, os profissionais saberiam de fato informar. A falta de consenso, e total aleatoriedade nas respostas sobre a frequência das formações para capacitação e prevenção de acidentes no trabalho sugerem que, no mínimo, não há um protocolo fixo, muito embora essas formações ocorram, dado que todas as respostas foram taxativas ao afirmar que “sim”, ocorrem. Todos os profissionaisdisseram que sabem o que fazer em caso de acidentes de trabalho. As respostas foram unânimes ao afirmar que devem informar seus superiores para tomar as “devidas providências”. Um dos entrevistados afirmou o seguinte: “sim, comunico ao meu superior para que seja tomada as providências cabíveis, para cada caso uma conduta”. Com relação a NR 32 normas que estabelece diretrizes básicas para implementação de medidas de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores dos serviços de saúde, quando perguntado sobre o conhecimento da norma dos 74 dos entrevistados afirmam que sim conhecem a normas, e como mencionado em respostas anteriores novamente sugere o diálogo entre os profissionais para formulação da resposta e discursos coletivos e erros padronizado em sua resposta explicando que a norma fala sobre risco de acidentes e EPIs. 31 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O problema dos riscos ocupacionais, quando associado nas discussões acadêmicas e nas políticas sobre saúde pública, precisam antes de tudo ter ciência de que no que se refere aos profissionais de enfermagem, os acidentes tem se demonstrado, até o momento, inerentes a profissão. Isso não significa que não possa ser mudado, significa apenas que a própria profissão exercida pelo auxiliares, técnicos e enfermeiros oferecem riscos que se mantêm presentes mesmo que medidas sejam tomadas. O que se consegue é minimizar o nível de acidentes, mas sua erradicação é um desafio a ser superado no Brasil. As entrevistas no Hospital objeto de análise nesta pesquisa, demonstraram que o problema em relação aos acidentes do trabalho não está associado necessariamente ao grau de conhecimento, mas a prática do profissional e embora isso pareça incoerente, não o é na realidade. Em relação a literatura, que costuma mencionar a frequência de acidentes ocupacionais com profissionais de enfermagem, não foi possível constatar este mesmo dado no Hospital estudado, já que raramente ocorrem acidentes, de acordo com as entrevistas. Isso não invalida a pesquisa dessa vasta literatura, apenas singulariza o Hospital estudao. Mas é preciso deixar claro que há uma distância entre o fato dos profissionais saber da existência de dada norma sobre precauções em relação aos acidentes, e o fato de ele seguir a rigor todas as precauções. Isso opera de forma similar aos riscos de adquirir HIV por parte do cidadão, onde todos sabem que usar preservativo é importante e que o sexo sem camisinha é perigoso, mas mesmo assim, inúmeras pessoas deixam de usar. No caso dos profissionais de saúde aqui estudados, segundo os dados das entrevistas, não tem como afirmar que não conhecem os procedimentos de segurança. Ocorre que o “conhecimento” é algo mais complexo do que parece. Um dos maiores erros nas pesquisas sociais é pressupor que o que as pessoas sabem determinam suas ações. Isso pressupõe um racionalismo não compatível 32 com a realidade. Em seu dia a dia, os indivíduos não agem movido apenas pelo que sabem, mas por componentes afetivos, emocionais que se misturam aos saberes. No caso do profissional de enfermagem, saber só não basta, deve haver uma mudança cultural e institucional. É preciso a construção de instituições e culturas que tencionem o profissional a tomar os devidos cuidados, e não apenas a mera conscientização das normas e procedimentos. Assim, podemos concluir que no Hospital aqui estudado, o maior problema em relação aos ricsos ocupacionais demonstrou ser mais a nível dos conhecimentos mais gerais sobre acidentes ocupacionais do que de fato sobre os cuidados operacionais, vis a vis, realizados pelos profissionais. Estes raramente sofrem acidentes ocupacionais e sabem “se cuidar” e usar as normas, em medida suficiente para não terem sofrito os acidentes, como informaram. Mas é preciso que atentar para o problema da compreensão sobre acidentes a nível conceitual e sobre a razão de tanta dificuldade em explicar, a nível conceitual, o assunto. 33 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZAMBUJA, Eliana Pinho et. al. 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Trata-se de um estudo quanti-qualitativo, descritivo, transversal e não-experimental, utilizando um questionário com perguntas objetivas. Ao sujeito objeto deste estudo será garantido os esclarecimentos que se fizerem necessários, antes e durante o curso do estudo, bem como o sigilo e privacidade dos dados confidenciais envolvidos na pesquisa e a liberdade de recusar-se em participar ou cancelar o seu consentimento sem penalização alguma e sem qualquer prejuízo. DECLARO, que após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e ter entendido o que me foi explicado, consinto voluntariamente a participação nesta pesquisa. Franco da Rocha, _____ de ______________ de 2020. 39 APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DE PESQUISA QUESTIONÁRIO Sexo ( ) Idade: Estado Civil: Solteiro ( ) Casado ( ) Viúvo/a ( ) Divorciado ( ) Formação: Enfermeiro ( ) Técnico ( ) Auxiliar ( ) PERGUNTAS 1 Qual sua função nesta instituição? 2 Qual setor trabalha? 3 Quanto tempo trabalha nesta instituição? ( ) Menos de 1 ano ( ) Entre 1 e 3 anos ( ) Entre 3 e 5 anos ( ) Entre 5 e 10 anos ( ) Entre 10 e 15 anos ( ) Entre 15 e 20 anos ( ) Entre 20 e 25 anos ( ) Entre 25 e 30 anos ( ) Entre 35 e 40 anos ( ) Mais de 40 anos. Quantos? ________anos 1. Você conhece a noção de “Acidente do Trabalho? Explique. ( ) Sim ( ) Não __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 40 __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 2. Você já se acidentou ou ficou doente nesta instituição? ( ) sim ( )não Descreva o que aconteceu: __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 3. Você sabe o que fazer em caso de acidente de trabalho? Explique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 4. Você sabe o que é doença ocupacional ou do trabalho? Explique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 5. Você sabe o que fazer em caso de suspeita de doença ocupacional? Explique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 6. Você conhece quais os riscos ocupacionais aos quais você está exposto? ( ) sim ( )não Se sim, quais? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 7. Quais as situações no seu dia a dia representam risco de acidente de trabalho? Exemplifique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 41 8. De que forma você previne a ocorrência de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais dentro da instituição? Explique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 9. A instituição oferece treinamentos sobre como evitar acidentes? ( ) sim ( ) não Se sim, com que periodicidade __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 10. A instituição fornece os EPI ́s adequados à sua necessidade? ( ) sim ( ) não __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 11. Quais EPI ́s? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 12. Você já ouviu falar sobre a NR32? ( ) sim ( ) não Se sim, explique. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________
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