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14/08/18 AFECÇÕES DA BOLSA TESTICULAR 1. ESCROTO AGUDO A. INTRODUÇÃO ❖ Definição: Quadro súbito de sintomas escrotais - dor, aumento de volume/edema, eritema ❖ Epidemiologia: representa <1% das entradas na emergência, sendo mais comum na infância e adolescência ❖ Causas: trauma, orquite, hérnia, hidrocele, varicocele, tumor, torção, dor referida... • Principais diagnósticos: torção de apêndice, torção testicular e epididimite B. TORÇÃO TESTICULAR ❖ Consiste no giro do testículo sobre seu eixo e pode ser classificada em: a. Extravaginal: torção do testículo junto com a túnica vaginal – comum na infância b. Intravaginal; torção do testículo isolado dentro da túnica vaginal (“badalo de sino”) – comum na adolescência (12-16 anos), sendo a mais prevalente OBS: ocorre pela fixação incompleta do testículo e epidídimo ao escroto, sendo mais predominante do lado esquerdo e raramente bilateral ❖ Fisiopatologia: causa desconhecida; supõe-se que tenha correlação com temperatura fria, rápidos movimentos, trauma ou rápido crescimento do testículo durante a puberdade ❖ Apresentação clínica: • História: dor severa, na qual o paciente procura atendimento antes de 6 horas • Náuseas e vômitos frequentes • Edema e eritema dependem da duração e do grau de torção ❖ Exame físico: • Edema difuso do testículo – porque suspendeu a irrigação de todo o testículo • Elevação do testículo – com a torção, o cordão torna-se mais curto • Localização transversa do testículo - se não estava bem fixado, torna-se horizontalizado com a sua elevação ➔ Sinal de Angel • Epidídimo anteriorizado • Ausência de reflexo cremastérico (Sinal de Rabinowitz) – indica vascularização inadequada ❖ Exames complementares: • Sumario de urina: para diagnóstico diferencial • USG com Doppler: ▪ Na torção ocorre redução ou ausência de fluxo, parênquima heterogêneo e/ou alterações ecotexturais ▪ Sensibilidade em confirmar diminuição de fluxo 63 – 90% ▪ Em até ¼ das vezes ocorrem resultados falso negativos ▪ diagnóstico diferencial: Avalia outras causas de escroto agudo ❖ Diagnóstico: • Clínico: sintomas e exame físico ➔ quadro clássico não demanda exames complementares • Exploração testicular sem retardo Urologia | Mariana Gurgel 2 OBS: a maior disponibilidade de USG é positiva para confirmação diagnóstica, têm levado a conduta cirúrgica seletiva ❖ Tratamento: • Destorção manual: ▪ Tentativa realizada pelo médico. Não trata a torção, mas procura aliviar a dor e estabelecer melhor fluxo sanguíneo ▪ Manobra medial para lateral (“abrindo um livro”) • Tratamento cirúrgico ▪ Indicado o mais brevemente possível, visando redução da isquemia que ocorre com a demora ▪ Técnica: ✓ Incisão da rafe escrotal ou hemibolsa → abordagem do testículo torcido e avaliação da viabilidade → síntese a. Viável: orquidopexia – 3 pontos b. Não viável: orquidectomia ✓ Orquidpexia contalateral (torção metacrônica) C. TORÇÃO DE APÊNDICE TESTICULAR ❖ Apêndices testiculares: remanescentes embrionários; mais frequentemente localizados no polo superior e cabeça do epidídimo ❖ Causa da torção: não conhecida – anatomia? trauma? aumento pré- puberal? ❖ Epidemiologia: frequente em pacientes mais novos (7-12 anos), sendo a causa mais comum de escroto agudo na infância ❖ Quadro clínico: • Dor gradual ou súbita localizada na cabeça do epidídimo ou polo superior • Pode estar relacionada a esforço e melhorar com repouso • Testículo costuma estar em posição habitual • Náuseas e vômitos pouco frequentes ❖ Exame físico • Blue dot sign (até 52%): sinal patognomônico • Nódulo testicular superior doloroso • A delimitação do epidídimo está mantida (posição usual) • Sem alteração no reflexo cremastérico ❖ Exames complementares: • USG com Doppler: ▪ Hiperperfusão do epidídimo com ou sem apêndice testicular aumentado; ▪ Nódulo ovoide hiper, hipoecoico ou heterogêneo sem fluxo sanguíneo ▪ OBS: ausência se sinais ultrassonográficos não exclui diagnóstico ❖ Tratamento: • Repouso + AINES– com o tempo, a região necrótica será reabsorvida • Raramente: tratamento cirúrgico Urologia | Mariana Gurgel 3 D. EPIDIDIMITE ❖ Definição: Inflamação do epidídimo de causa infecciosa ou não ❖ Epidemiologia: Pico entre adolescentes/adultos jovens ou nos mais idosos ❖ Fatores de risco: anomalia genitourinária, início da vida sexual, retenção urinária e instrumentação da uretra ❖ Quadro clínico: • Dor gradual • Febre • Disúria • Raramente náuseas e vômitos ❖ Exame físico: • Edema e dor à palpação do epidídimo • Testículo normoposicionado • Reflexo cremastérico simétrico • Sinal de Prehn: ocorre alivio da dor à elevação testicular; ▪ OBS: é um sinal subjetivo; sua ausência não descarta o diagnóstico ❖ Exames complementares: • Hemograma – leucocitose, infecção vigente • Sumario de urina – geralmente piúria e/ou bacteriúria • USG: aumento do volume e do fluxo sanguíneo no epidídimo (hiperemia) ❖ Tratamento: • ATB ▪ Crianças: checar anomalias anatômicas e ITU alta (pode ser necessário internar) + Cefalosporinas (cobertura contra patógenos de ITU) ▪ < 35 anos: doxiciclina (cobertura contra gonorreia e clamídia) ▪ >35 anos: quinolonas (cobertura contra patógenos urinários) • Sintomáticos • Suspensão testicular (alivio) 2. VARICOCELE ❖ Definição: dilatação anormal e tortuosa das veias espermáticas internas dentro do plexo pampiniforme do cordão espermático ❖ Epidemiologia: • Presente em 15% da população, principalmente do lado esquerdo • 35% dos homens com infertilidade primária e 81% dos com infertilidade secundária OBS: infertilidade é a ausência de concepção após 12 meses de tentativas regulares desprotegidas. Possui fatores de risco como criptorquidia e idade feminina avançada) ❖ Fisiopatologia: processo patológico desconhecido • Ocorre ângulo reto entre v. testicular e a v. renal esquerda: com o aumento da pressão da hidrostática e/ou incompetência valvar venosa, desenvolve-se a varicocele esquerda OBS: do lado direito a drenagem é diretamente para a veia cava, formando ângulo agudo ➔ varicocele do lado direito levanta suspeita etiológica de cisto/tumor renal ou trombose de cava • Teoria de impedimento da espermatogênese pela varicocele: Urologia | Mariana Gurgel 4 ▪ O sangue acumulado não permite controle térmico adequado → lesão da membrana das células germinativas → redução da síntese de testosterona ❖ Diagnóstico • Clínico: ▪ Dor: apenas em adolescentes e em menos de 10% ▪ Diminuição do volume testicular – em crianças ▪ Infertilidade – em adultos ▪ Aumento do volume escrotal – apenas em casos muito grandes • Exame físico ▪ Deve ser realizado em posição supina e ortostática ▪ Ectoscopia ▪ Palpação com e sem a manobra de valsalva Graduação: ➢ Grau 0: subclínica. Não identificada no exame físico, mas sim no USG ➢ Grau I: palpável com manobra de valsalva ➢ Grau II: facilmente palpável, mas não visível ➢ Grau III: facilmente visível ❖ Exames complementares: (Útil em casos duvidosos ou investigação de infertilidade) • USG com Doppler: ▪ Sua solicitação aumenta a prevalência da doença e o diagnóstico de varicocele subclínica não tem interferência da espermatogênese ▪ Achados: Dilatação > 3mm e reversão do fluxo venoso com valsalva (devido à dificuldade de drenagem venosa) ▪ Indicação: corroborar ou confirmar resultados de exame físico em casos duvidosos • Espermograma: ▪ Apenas 15% dos pacientes com varicocele apresentam alteração da espermatogênese ▪ Devem ser realizados para investigação de infertilidade ▪ A ocorrência do 1º resultado fora dos padrões não fecha diagnóstico. Deve ser realizado 2-3x, com intervalo de algumas semanas ✓ Necessário abstinência sexual de 3 dias ▪ Parâmetros principais e valores de referência ✓ Concentração: 20x105 /ml ✓ Volume: >1,5 ml ✓ Motilidade: 32% motilidade progressiva ✓ Número: 39 milhoes ✓ Morfologia: >4% ❖ Tratamento: cirúrgico • Indicações: ▪ Adulto: casal infértil com varicocele clínica e espermograma anormal ▪ Criança: significante hipotrofia testicular esquerda (≥20%) ou hipotrofia bilateral; dor; análise seminal anormal nos garotos em estádio Turner 5 ou aos 18 anos • Técnicas cirúrgicas: ▪ Retroperitoneal ▪ Inguinal ou sub-inguinal convencional ▪ Laparoscópica ▪ Microcirurgica: técnica de escolha, baixíssimos índices de complicação e falha e melhora o padrão em 60-80% dos casos ▪ Radiográfica • Complicações cirúrgicas: hidrocele e falha Urologia | Mariana Gurgel 5 3. HIDROCELE ❖ Definição: acúmulo anormal de fluido seroso na cavidade da túnica vaginal do testículo ❖ Epidemiologia: • Causa benigna mais comum de aumento do volume escrotal • Incidência estimada em 1% d população adulta ❖ Etiologia: • Congênita ▪ Persistência do conduto peritoneo-vaginal ▪ Ao nascimento: associação com hérnia inguinal • Adquirida: perda do balanço entre produção e absorção de líquidos na túnica vaginal ▪ Secundaria a inflamação (epididimite), neoplasia, trauma ou drenagem linfática ❖ Diagnósticos diferenciais: hérnia, espermatocele, tumor, varicocele ❖ Exame físico: I. Inspeção • Observar se há abaulamento do anel inguinal: se for hérnia grande, deve ser proveniente abdominal, causando abaulamento II. Palpação + redução: tento reduzir o conteúdo para abdome. Se irredutível, pode ser hidrocele ou hérnia encarcerada • Manobra de Landivar: introdução do dedo no anel inguinal externo e solicita-se que o paciente faça a manobra de Valsalva. Avalia se ocorre sensação tátil de hérnia III. Transluminação: útil em crianças. Observando-se apenas liquido: hidrocele ❖ Exames complementares: • USG escrotal: ▪ Diferencia o conteúdo e avalia os testículos não palpáveis (ex: presença de tumor, criptorquidia) ▪ Ex: 95 ml de líquido livre, homogêneo, entre as lâminas da túnica vaginal à direita ❖ Tratamento I. Cirúrgico • Indicações: Problemas funcionais: dor/desconforto; nunca apenas estética • Abordagem inguinal ou escrotal: ▪ Abordagem inguinal: crianças com hidrocele comunicante ou se suspeita de tumor testicular ▪ Abordagem escrotal: todas as outras indicações ✓ Técnica: incisão na rafe mediana → aspira/esvazia → retira o seu excesso de tecido da túnica e realiza fixação • Chance de sucesso grande • Complicações :19% - hematoma, infecção, edema persistente, lesão de vasos espermáticos, dor crônica II. Escleroterapia • Indicada para pacientes idosos com risco cirúrgico elevado • Técnica: aspiração do conteúdo + injeção de agente esclerosante ▪ Agentes mais utilizados: tetracycline (500mg), 2,5% phenol solutions, 95% álcool e etolamina oleate • Chances de cura 33-75% • Nos jovens não é recomendado porque pode afetar na espermatogênese 4. CASOS CLÍNICOS Caso 1: escroto agudo ANAMNESE: Adolescente de 12 anos, sexo masculino com queixa de dor testicular no lado esquerdo, de início há 3 horas, associada a 1 episódio de vômito Urologia | Mariana Gurgel 6 ANTECEDENTES: Refluxo vésico-ureteral com alguns episódios de ITU na fincância EXAME FÍSICO: Dor à palpação do testiculo E, + importante no pólo superior e na cabeça do epidídimo Testículo levemente horizontalizado (em vez de verticalizado) Discreto alívio da dor à manobra de elevação do testículo (Sinal de Prehn) EXAMES COMPLEMENTARES: EAS: 8 leucócitos/campo Hemograma: 11.000 leucócitos USG: Não disponível no serviço • Hipóteses diagnósticas: Torção Testicular, hidrocele, epididimite, varicocele ou torção de apêndice? • CONDUTA: Antibiótico? Anti-inflamatório e repouso? Solicitar USG? Encaminhar para serviço com Cirugião/Uro? Tendo em vista os quadros clínicos diversos e a incerteza do diagnóstico em alguns casos, é preciso ENCAMINHAR, pois a demora pode gerar necrose e perda do órgão Caso 2: Varicocele ANAMNESE: A.L.O, sexo masculino, 27 anos. Queixando-se da dificuldade de ter filhos há 6 meses. Sendo que está casado há 1 ano e já possui uma filha. Relatou que a esposa não possui nenhuma desordem de fertilidade. ANTECEDENTES: Gonorreia há 5 anos; Nega cirurgias prévias; Nega retardo na descida dos testículos; Nega parotidite infecciosa na Infância EXAME FÍSICO: Testículos de tamanho e consistência habituais, sem alterações. Deferentes palpáveis, ausência de ginecomastia; varicocele visível em testículo esquerdo • Hipótese diagnóstica: varicocele grau III • Conduta: solicitar espermograma. ESPERMOGRAMA: Volume: 2,0 ml Motilidade: 52% móveis Vicosidade aumentada Esperm/ml: 12.000.000 Total: 24.000.000 Morfologia: alterações na cauda em 20% Leucospermia: 3 p/c Eritrospermia: raro • Nova conduta: repetir espermograma 2º ESPERMOGRAMA: Volume: 2,5ml Motilidade: 40% Esperm/ml: 11.200.000 Espermatozoides normais: 63% Leucocitos: ausente Hemacias: ausente • Nova conduta: microcirurgia Caso 3: Hidrocele ANAMNESE: M.R.S - 52 anos. Relata aumento gradativo do volume escrotal, evoluindo há 02 anos , sendo indolor, mas causando incômodo pelo volume EXAME FÍSICO: aumento de volume escrotal D às custas de massa de consistência amolecida; indolor à palpação, testículo D não palpável. • Hipótese diagnóstica: hidrocele; conduta: USG para avaliar testículo • Tratamento: cirúrgico Referências 1. RHODEN, Ernani. L. Urologia – Série no Consultório. São Paulo. Artmed. 2009.
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