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Tipicidade

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Tipicidade: é um dos elementos do fato típico e divide-se em tipicidade objetiva e subjetiva (a ser tratada mais à frente). A tipicidade objetiva, por sua vez, subdivide-se em tipicidade formal e tipicidade material, conforme veremos a seguir.
IMPORTANTE: Para que seja reconhecida a tipicidade de um fato, necessita-se da presença de todas as suas formas: subjetiva, objetiva formal e objetiva material.
 Adequação típica: pode ocorrer de duas formas: imediata ou mediata. A adequação típica imediata ocorre quando o fato se amolda ao tipo penal diretamente, sem a necessidade de interferência de nenhuma outra norma. Já a adequação típica mediata acontece nos casos em que outra norma, de caráter extensivo, é aplicada para que o fato praticado pelo agente se adeque ao previsto legalmente.
Ex: nos casos de tentativa, além da norma onde se encontra previsto o delito, é imprescindível a aplicação do art. 14, inciso II, do CP.
 Tipicidade Formal: é a conformidade do fato ao tipo penal, ou seja, a adequação do ato praticado pelo agente àquilo que está previsto abstratamente na norma.
Ex: Ana matou Pedro. O ocorrido se amolda ao previsto no art. 121, do CP.
 Tipicidade Material: é a valoração da conduta e do resultado. Assim, verifica-se se o agente ofendeu, ou expôs à ameaça, de forma significativa, o bem jurídico tutelado. A tipicidade material tem o objetivo de delimitar quais condutas realmente possuem relevância para o Direito Penal.
Ex: Rafael subtraiu uma maçã. Formalmente, tal conduta se amolda ao previsto no art. 155, do CP. Contudo, pode-se considerar, a depender do caso concreto, que não há tipicidade material, ante a insignificância da lesão ao bem jurídico protegido pela norma (patrimônio). Assim, ante a ausência de tipicidade material, o fato será considerado atípico.
 A importância do princípio da proporcionalidade no direito penal se relaciona com o fato de que, num Estado Democrático de Direito, a liberdade constitui um bem primordial, tutelado juridicamente, o que implica dizer que qualquer limitação a este bem deve ser obrigatoriamente balanceada, a fim de que ocorra apenas quando for necessário, adequado e proporcional à proteção de outro bem jurídico igualmente relevante.  Isso deve ocorrer sempre se tomando o ser humano como parâmetro para se avaliar as hipóteses em que é possível limitar a liberdade individual.
Por tipicidade conglobante, devemos entender que está superada a ideia de que a tipicidade (descrição de uma conduta na norma penal) é meramente formal, essencialmente descritiva. A subsunção de fato à norma penal hoje, não gera mais a síntese de que há tipicidade penal. Pelo contrário, devemos analisar a questão da tipicidade penal em duas vertentes: 1ª) antinormatividade e 2ª) tipicidade material. A antinormatividade diz respeito à existência de condutas tipificadas na lei penal como proibidas (não desejadas) e passíveis de uma pena em contraposição com as mesmas condutas em tese proibidas, que são fomentadas por outros ramos do direito e que são igualmente previstas em lei de igual hierarquia.
Citamos como exemplo o art. 150 do Código Penal, que trata da violação de domicílio e as determinações constantes dos Códigos de Processo Civil e Penal às obrigações dos oficiais de justiça ao cumprirem um mandado de busca e apreensão ou outro qualquer, no qual podem usar da força.
Ora, imaginemos um oficial de justiça que, ao cumprir um mandado em uma casa, encontra resistência por parte do proprietário e tem que usar da força para cumprir com seu mister. Neste caso, teríamos em tese a prática do delito de violação de domicílio, devendo o proprietário dar voz de prisão em flagrante delito ao oficial por ingressar ou permanecer sem seu consentimento naquele local particular.
Se para cada mandado cumprido pelo oficial com o uso da força ele tivesse que responder por um processo crime de violação de domicílio, evidentemente, a profissão não seria atrativa e a justiça perderia sua força coercitiva e imperativa sobre a iniquidade.
O Código Penal e os códigos de Processo Civil e Penal são leis ordinárias e possuem, portanto, a mesma hierarquia. Ocorre que, neste caso citado, há ANTINORMATIVIDADE, pois o Direito Penal tenta punir o que o Processo Civil e Penal fomentam. Há um choque normativo que deve ser resolvido pela ATIPICIDADE do fato.
Quanto ao segundo elemento da tipicidade conglobante, denominado TIPICIDADE MATERIAL, o intérprete e o operador do Direito devem analisar se o fato submetido à seu crivo pode ser excluído da incidência do Direito Penal por meio da aplicação dos princípios informadores do Direito Penal Mínimo.
Analisa-se se há ofensividade; se a sociedade está adequada à conduta; se o fato possui um desvalor normativo do resultado (insignificância); se o direito penal deve se ocupar de tal assunto não bastando os outros ramos dos direito para solucionar a questão (intervenção mínima); e se o bem jurídico ofendido está dentro do estrato de proteção que a norma penal se propõe a proteger (fragmentariedade).
Assim, somente concluiremos pela existência de tipicidade quanto o fato não for antinormativo e quando não for afastado pelos princípios informadores do direito penal mínimo.
Convém trazer à lume o que foi estudado por Ula Senra a respeito do tema:
O direito é um universo harmônico de normas que guardam, entre si, uma certa ordem e coerência. Caso contrário, haveria a guerra civil - uma guerra de todos contra todos -, e é exatamente isso que a ordem jurídica pretende e deve impedir. É com base nesse entendimento que Eugenio Raúl Zaffaroni constrói a teoria da tipicidade conglobante. A tipicidade conglobante é um corretivo da tipicidade legal, uma vez que pretende excluir do âmbito da tipicidade certas condutas que, pela doutrina tradicional, são tratadas como excludentes da ilicitude. No caso de condutas em que a ordem normativa ordena ou fomenta, segundo Zaffaroni, não se fala em exclusão da ilicitude, mas de ausência de tipicidade conglobante. Por uma questão lógica, o tipo não pode proibir o que o direito ordena ou fomenta. Dessa forma, nos casos de estrito cumprimento do dever legal que, tradicionalmente, excluem a ilicitude da conduta, estar-se-ia diante de atipicidade conglobante. Caso contrário, teríamos que considerar que o oficial de justiça que sequestra uma coisa móvel comete furto justificado, que o médico que cumpre com o dever de denunciar uma doença contagiosa comete uma violação de segredo profissional justificada ou o policial que detém um sujeito por prisão em flagrante comete uma privação ilegal de liberdade justificada. Nos casos de intervenção cirúrgica com fins terapêuticos, a conduta do médico é atípica, por serem fomentadas pelo direito. Por intervenções com fim terapêutico devem ser entendidas aquelas que perseguem a conservação ou o restabelecimento da saúde, a prevenção de um dano maior ou a atenuação da dor. Certas intervenções cirúrgicas, como no caso mutilação, o médico é obrigado a pedir a autorização do paciente. Entretanto, sua falta acarreta apenas a responsabilidade administrativa, podendo-se atribuir a responsabilidade penal se configurar algum delito contra a liberdade individual. Porém, nunca pode ser responsabilizado por lesões corporais, porque o fim terapêutico exclui essas intervenções do âmbito de proibição do tipo de lesões. Já nas intervenções cirúrgicas sem fins terapêuticos o tratamento é diverso. Essas ocorrem nos casos de cirurgia plástica ou extração de órgãos ou tecidos para serem transplantados em outra pessoa (o fim terapêutico diz respeito ao outro, mas não ao doador). Nesse caso, a conduta do médico é típica, mas justificada diante do consentimento e da adequação às normas regulamentares. Caso não haja consentimento do paciente, configura-se a conduta típica de lesões corporais dolosas. Em relação às lesões desportivas, Zaffaroni considera que são conglobalmente atípicas, sempre que a conduta tenha ocorrido dentro da prática regulamentar do esporte, perdendo a atipicidade conglobante e adquirindo tipicidade penal no casode violação dos regulamentos. Data venia, "ouso" discordar do tratamento dado às lesões desportivas por Zaffaroni. Não me parece, ao contrário do que ele afirma, que a ordem jurídica ordene ou fomente esportes como o boxe, por exemplo. Entendo que tais esportes são tolerados pela ordem jurídica e devem, portanto, ser tratados como usualmente o fazem a doutrina e jurisprudência. Em suma, as atividades em que a ordem jurídica ordena ou fomenta são resolvidas no âmbito da atipicidade conglobante. Já as condutas permitidas ou simplesmente toleradas são causas de exclusão da ilicitude. Nos casos de atividades perigosas, por exemplo, devem ser distinguidas as atividades fomentadas e as permitidas. A circulação de veículos automotores, que é fomentada pela ordem normativa e regulamentada, não pode ser considerada da mesma forma que outras atividades, como a instalação de uma fábrica de explosivos, que o direito apenas permite. Por fim, a tipicidade penal é a conjugação da tipicidade legal e da tipicidade conglobante. A tipicidade legal é a subsunção (adequação) da conduta ao tipo penal previsto em lei. A tipicidade conglobante é a antinormatividade aliada à tipicidade material. A tipicidade material significa que não basta que a conduta do agente se amolde ao tipo legal. É preciso que lesione ou coloque em risco bens jurídicos penalmente relevantes. Aliás, é sempre importante lembrar que uma das funções precípuas do direito penal é a proteção de bens jurídicos tutelados pela norma criminal.
A ANTINORMATIVIDADE E ANTIJURIDICIDADE NA TEORIA DO TIPO CONGLOBANTE (ALAMIRO VELLUDO SALVADOR NETTO)
Alamiro Velludo Salvador Netto[3] critica o conceito de antinormatividade consequente da teoria da tipicidade congonblante, especialmente por entender que existe uma contradição com as teorias penais da antijuridicidade de forma que já não renegariam a ilicitude do direito em sua totalidade.
O autor ressalta exemplos dado por Zaffaroni. O primeiro retrata a situação de um oficial de justiça, que devidamente munido de ordem judicial de autoridade competente, exarada em um processo regular de execução, realiza uma ordem de penhora e sequestro de um bem de propriedade de um devedor.
Ao se apoderar do objeto, com a finalidade de executar a mencionada medida, a pergunta que é levantada pelo autor é acerca de como o direito penal e a teoria do delito compreendem este acontecimento. Desta forma, aduz que do ponto de vista formal há a existência da hipótese modelo do artigo 155 do Código Penal (furto), uma vez que, de fato, teria existido a inversão da posse em relação à coisa alheia móvel. De acordo com o autor, em conformidade com o Código Penal brasileiro, “a explicação mais plausível para a resolução da questão é aquela que enxerga a ocorrência de uma causa de exclusão da ilicitude em razão do estrito cumprimento do dever legal, de forma com que a conduta do beleguim seria típica, porém não antijurídica”. Afirma, no entanto, que para Zaffaroni, com fundamento na necessidade de coerência normativa, tal posição não pode prosperar.
Acrescenta, outrossim, um exemplo de necessária menção. Trata do médico que realiza uma cirurgia no paciente, para salvar sua vida e desta forma lhe efetua um corte. Ressalta que em tal situação não se poderia falar de inexistência de dolo, uma vez presentes os elementos volitivo (vontade) e cognitivo (conhecimento).
Afirma, portanto, Salvador, que se estas questões forem resolvidas no âmbito da licitude, estariam, segundo a teoria, criando contradições no ordenamento normativo. Isto porque se “a tipicidade, aqui entendida em seu sentido material e não apenas legal, importa na antinormatividade, esta passa a ser a seara adequada para a resolução do problema”.
Ou seja, a antijuridicidade apenas possuirá valia quando a conduta típica estiver permitida pelo ordenamento jurídico de forma a conferir ao agente a faculdade de sua utilização, quando houver uma permissão excepcional. Ocorre que “nos exemplos expostos não se está diante de uma simples permissão, mas de uma ordem (no caso do oficial de justiça) e de uma atividade fomentada pelo direito (no caso do médico cirurgião)”.  Como consequência, tem-se, segundo a teoria, que, “normativamente, a conduta do oficial de justiça não está excepcionalmente justificada pela ordem jurídica, mas, ao contrário, está determinada pela ordem normativa com a qual aquela não se confunde”. Ademais o autor cita Zaffaroni ao afirmar que no seio de um sistema normativo não se pode conceber “que uma norma proíba o que outra ordena ou aquela que outra fomenta. Se isso fosse admitido, não se poderia falar de ‘ordem normativa’, e sim de um amontoado caprichoso de normas arbitrariamente reunidas”.
Sobre esta conclusão, afirma Salvador que o que se depreende é que mesmo antes da análise da existência de uma norma jurídica permissiva, o universo da antinormatividade já seria responsável pela exclusão de violações nas espécies de cumprimento de dever, o que não acontece com a legitima defesa e o estado de necessidade, que se encontrariam no patamar jurídico e não no normativo. Ou seja, sempre que se estiver diante de um dever, o local dogmático de solução não seria a antijuridicidade, mas a própria tipicidade, através da exclusão de antinormatividade. Desta forma, as condutas amparadas pela causa de justificação de estrito cumprimento de dever legal, portanto, seriam atípicas, não podendo recair sobre elas, inclusive, as exclusões da ilicitude. Conclui o autor, sobre este ponto, que a separação de dois conceitos, de um lado a antinormatividade e do outro a antijuridicidade, parece em nada contribuir à resolução de casos concretos. Ademais, afirma que o conceito de antinormatividade não auxilia a atividade do intérprete, mas, ao contrário, confunde-o, principalmente em face do tratamento diferenciado que exige das causas de justificação que espelham atividades ordenadas ou fomentadas pela ordem normativa.
Afirma ainda que a relevância, para fins jurídicos, do conceito de normatividade é contraditória, vez que “a norma apenas se coloca para o direito na medida em que é jurisdicizada”. Aduz, por fim, que “se há a previsão legal, seguindo a postura de Zaffaroni, já se está diante do antijurídico, sendo despicienda a antinormatividade”.
O consentimento do ofendido significa, em linhas gerais, o ato da vítima (ou do ofendido) em anuir ou concordar com a lesão ou perigo de lesão a bem jurídico do qual é titular. Com maior detalhamento, dir-se-ia que o consentimento do ofendido significa o ato livre e consciente da vítima (ou do ofendido) capaz em anuir ou concordar de modo inquestionável com a lesão ou perigo de lesão a bem jurídico disponível do qual é o único titular ou agente expressamente autorizado a dispor sobre ele.
O consentimento do ofendido, a depender da construção do tipo incriminador diante do qual analisado, pode apresentar-se como:
a) causa de exclusão da tipicidade: se o tipo penal exige o dissenso da vítima enquanto um dos requisitos objetivos formais necessários à completude da figura incriminadora, é claro que o válido consentimento do ofendido exclui a tipicidade. Exemplo: crimes de violação de domicílio — artigo 150 do Código Penal (se alguém permite ou tolera que terceiro ingresse em sua casa, ausente estará a tipicidade da conduta) e estupro — artigo 213 do Código Penal (se a mulher consente na relação sexual, inexiste tipicidade);
b) causa supra-legal de exclusão da ilicitude: o consentimento do ofendido, fora essas hipóteses em que o dissenso da vítima constitui requisito da figura típica, pode excluir a ilicitude, se praticado em situação justificante. Exemplo: aquele que realiza tatuagens no corpo de terceiros pratica conduta típica de lesões corporais (art. 129 do CP), muito embora lícita, se verificado o consentimento do ofendido; aquele que inutiliza coisa de terceiro, ainda que a pedido deste, pratica conduta típica de dano (art. 163 do CP), muito embora lícita, se presente o consentimento da vítima.
Alguns doutrinadores mencionam a possibilidade deo consentimento do ofendido constituir causa especial de diminuição de pena. A jurisprudência brasileira registra como exemplo disto a eutanásia. Aquele que mata a pedido da vítima e para abreviar o sofrimento desta, teria praticado, segundo a jurisprudência majoritária, homicídio privilegiado (por motivo de relevante valor moral — artigo 121, parágrafo 1º, Código Penal)1. Não haveria, neste caso, exclusão da tipicidade nem tampouco da ilicitude, uma vez que a vida seria considerada bem indisponível.
O consentimento do ofendido só pode ser reconhecido validamente se presentes os seguintes requisitos, em caráter cumulativo: bem jurídico disponível, ofendido capaz, consentimento livre, indubitável e anterior ou, no máximo, contemporâneo à conduta, bem como que o autor do consentimento seja titular exclusivo ou expressamente autorizado a dispor sobre o bem jurídico. Vejamos, com maior detalhe, cada uma dessas exigências.
a) que o bem jurídico sobre o qual incida a conduta lesiva seja passível de disposição pelo seu titular.
Consoante Fragoso, “bem jurídico disponível é aquele exclusivamente de interesse privado (que a lei protege somente se é atingido contra a vontade do interessado). O consentimento jamais terá efeito quando se tratar de bem jurídico indisponível, ou seja, aquele bem em cuja conservação haja interesse coletivo”2.
Alguns bens jurídicos são facilmente identificados pela doutrina, em geral, como sendo disponíveis (ex.: patrimônio) ou indisponíveis (ex.: vida). Outros, no entanto, causam certa polêmica. Cite-se, por exemplo, a integridade física ou corporal. Fragoso entende tratar-se de bem indisponível3. Já Rogério Greco diverge, sustentando “que a integridade física é um bem disponível desde que as lesões sofridas sejam consideradas de natureza leve. Caso as lesões sejam graves ou gravíssimas, o consentimento do ofendido não terá o condão de afastar a ilicitude da conduta levada a efeito pelo agente”4.
Por fim, destaque-se que inválido é o consentimento de vítima particular em face de bens jurídicos coletivos. “O consentimento de uma vítima concreta não possui nenhum efeito nos delitos contra a coletividade (ou contra a incolumidade pública), nos quais são afetados bens jurídicos supra-individuais. Como são muitos os titulares desse bem jurídico, o consentimento de um só não afasta nem a tipicidade nem a antijuridicidade do fato”5.
Em suma, inadmissível a renúncia à proteção jurídico-penal de bens jurídicos coletivos (por serem indisponíveis, pela própria natureza jurídica) e dos bens jurídicos individuais indisponíveis.
b) que o ofendido tenha capacidade jurídica para consentir;
Exige-se, segundo Francisco de Assis Toledo, “que o ofendido, no momento da aquiescência, esteja em condições de compreender o significado e as conseqüências de sua decisão, possuindo, pois, capacidade para tanto”6. Trata-se, enfim, da capacidade de entendimento sobre o conteúdo e o alcance do consentimento outorgado.
Nesse sentido, são dotados de capacidade genérica para consentir os maiores de 18 anos mentalmente hígidos. Caso o titular do bem jurídico seja pessoa incapaz, entende Fernando Galvão, que “poderá seu responsável consentir por ele, nos termos da Lei Civil”7.
c) que o ofendido tenha manifestado seu consentimento de forma livre;
Ou seja, é necessário não tenha havido coação, fraude ou qualquer outro vício que possa inquinar de nulidade a manifestação de vontade da vítima. Também aqui, como em qualquer outro ato jurídico, os vícios de vontade ensejam nulidade; ademais, com uma peculiaridade: tais vícios de vontade são tidos, in casu, como insanáveis.
d) que o ofendido tenha manifestado seu consentimento de maneira inequívoca, ainda que não expressamente;
A doutrina, em geral, traz a exigência de que a manifestação de consentimento do ofendido apresente-se indubitável, inequívoca, inquestionável, sem margem de dúvidas. Diz-se, no entanto, que o consentimento pode ser dado de maneira expressa ou implícita, desde que preservada a certeza deste.
e) que o consentimento tenha sido dado pela vítima antes ou durante a conduta lesiva;
O consentimento deve sempre ser anterior ou, no máximo, contemporâneo à conduta do agente; nunca posterior. O fato de a vítima, após a conduta criminosa, anuir com a sua prática, não tem o condão de afastar a tipicidade ou a ilicitude do fato, ao menos em virtude de alegado consentimento do ofendido.
A justificativa para que o consentimento válido seja aquele anterior ou, no máximo, contemporâneo à conduta criminosa é dado pela doutrina tendo em conta o sistema de renúncia à proteção legal bem como o respectivo juízo de desvalor da conduta.
Acompanhe a precisa explicação de Fernando Galvão sobre o tema: “Objetivamente, a valoração positiva da conduta decorre do fato de que, quando da intervenção lesiva, o bem jurídico não estava sob a proteção jurídica. Sendo a renúncia anterior à realização da atividade lesiva, esta não afronta a finalidade protetiva do ordenamento jurídico. O consentimento posterior à lesão não pode ser admitido. Nesse caso, a atividade lesiva viola a planificação normativa e, por isso, preserva-se o desvalor da conduta. Na verdade, uma permissão posterior à realização do fato não pode ser denominada de consentimento. Trata-se-ia de mero ‘reconhecimento’ de uma situação de fato já consolidada, de perdão pelo que já se fez”8.
Note a coerência desta justificativa. Parte-se do entendimento de que, objetivamente, o juízo de valoração positivo ou negativo da conduta depende da análise quanto ao fato de estar ou não o bem jurídico, no momento em que lesionado, sob a proteção legal. Assim, duas são as situações possíveis, senão vejamos:
— se o bem jurídico não estava sob a tutela do ordenamento legal no instante em que lesionado, em virtude de prévia ou concomitante renúncia, o juízo de valoração da conduta é positivo, pois não frustrado o fim protetivo do sistema jurídico-penal. Portanto, in casu, é tido como válido o consentimento do ofendido;
— se o bem jurídico estava sob a tutela do ordenamento legal no momento em que lesionado, ainda que haja posterior concordância do ofendido, o juízo de valoração da conduta é negativo (desvalor da conduta), pois frustrado o fim protetivo do sistema jurídico-penal. Por conseguinte, nesta situação não é possível falar em consentimento do ofendido válido.
f) que o autor do consentimento seja o titular exclusivo do bem jurídico disponível ou que tenha autorização expressa para dispor sobre o bem jurídico;
Não há dúvidas de que o consentimento válido só pode ser dado pelo titular único do bem jurídico disponível ou por pessoa expressamente autorizada por aquele para dispor sobre o bem. Como afirma o poeta popular, “a ninguém é dado fazer cortesia com chapéu alheio”.
Outros Requisitos. É evidente que os requisitos gerais aplicáveis a todas as excludentes de ilicitude também devem estar presentes no consentimento do ofendido. Diz-se, portanto, do (contestado e controvertido) requisito subjetivo de justificação e da proibição do excesso.
O primeiro — requisito subjetivo das excludentes — diz respeito à necessidade de o agente saber que atua em e por causa de situação justificante. Assim, para que a lesão a bem jurídico disponível seja considerada lícita é necessário que o agente tenha consciência de que atua amparado por consentimento do ofendido.
Destaque-se, no entanto, que alguns doutrinadores sustentam a desnecessidade de requisito subjetivo nas excludentes de ilicitude; para estes, bastaria a comprovação dos pressupostos objetivos.
No que toca à proibição de excesso, tem-se que a conduta do sujeito deve sempre respeitar os limites impostos pela causa justificante. Se o agente ultrapassar a seara do consentido pelo ofendido, desvaliosa será a sua conduta, uma vez que violadora da finalidade protetiva do sistema legal, e, portanto, passível de censura quanto ao excesso (leia-se: sujeito à responsabilização pela conduta que extrapola o limite do justificado).

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