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6 aula Abordagem Centrada na Pessoa como ética das relações

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Abordagem Centrada na Pessoa como ética das relações humanas
A palavra “ética” é definida no Dicionário Houaiss como:
Parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano, refletindo especialmente a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social. (Dicionário Houaiss online, 2016)
Dessa definição deriva o significado de conjunto de regras e valores morais. 
Ao formar-se psicólogo, você comprometer-se-á com o Código de Ética profissional, que rege os comportamentos aceitos e não aceitos dos psicólogos no exercício profissional. 
Etimologicamente, ética deriva de duas palavras gregas que compartilham a mesma raiz: éthos e êthos. 
a primeira significa costume, uso, hábito e 
a segunda, caráter, maneira de ser de uma pessoa, disposições naturais de alguém. 
A disciplina filosófica Ética trata da segunda.   
O que significa, então, afirmar, como Amatuzzi (2010), que a Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers, traz contribuições éticas e é, ela própria, uma ética? 
Significa que as propostas de Rogers não se dirigem a técnicas, manejos e procedimentos do psicólogo, como um código de ética faria, mas, sim, à sua atitude. 
Significa ainda mais que isso: que, embora a ACP seja tida como uma abordagem psicológica, ela propõe uma atitude, um modo de ser em relação com os outros e consigo mesmo.
Já foi visto com Holanda (2015) que as Psicologias Humanistas são um acontecimento recente numa história de resgate da ética do pensamento. Assim como o Humanismo renascentista recolocou como centro de preocupação o homem, resgatando sua dignidade, devolvendo-lhe sua responsabilidade por seu ser e se seu mundo, a ACP surge como abordagem psicológica (no primeiro momento ela é Terapia Centrada no Cliente) para, em seguida, tornar-se uma reflexão sobre as relações humanas. (Amatuzzi, 2010)
  
 Diferenciando-se das psicologias em voga nos EUA na década de 1940, Rogers assume a crença na orientação positiva e na tendência ao crescimento das pessoas. Tal atitude manifesta-se na relação com o cliente como horizontalidade, ou seja, o psicólogo deixa de ser um “vidente ilustrado” (Amatuzzi, 2010, p.11), que usa teorias psicológicas gerais e causalistas para diagnosticar e intervir, para “facilitar ao o outro o recurso às suas  próprias fontes interiores” (Amatuzzi, 2010, p.12). Contribui, portanto, postulando um modo de acontecer a relação psicólogo-cliente que resguarda (e resgata) sua autonomia e sua responsabilidade.
A relação psicólogo – cliente na Abordagem Centrada na Pessoa: Relação ética
 “Tornar-se quem se é” é o objetivo da relação terapêutica. Significa poder experimentar seus sentimentos e se relacionar consigo mesmo e com os outros de modo profundo, complexo e satisfatório. Porém, as relações vivenciadas podem conduzir à direção oposta. Circunstâncias ameaçadoras fazem com que o indivíduo priorize a defesa de sua integridade, ficando limitada na sua capacidade de experimentar a complexidade de sentimentos presentes nas relações humanas. Outras circunstâncias podem levar o indivíduo a falsear ou negar a sua realidade vivenciada, ou ainda a reprimir seus sentimentos e desejos. Por exemplo, uma criança pode sentir inveja diante do nascimento de um irmão, mas esse sentimento é mal visto e repreendido pelos pais. Isso pode levar essa criança a reprimir sentimentos percebidos como errados, ficando limitado na sua capacidade de se relacionar com os demais, pois a inveja é um sentimento humano.
A Abordagem Centrada na Pessoa compreende que a repetição e o acúmulo de ameaças à integridade ou repressão de sentimentos, que experimentamos na família, na escola e na cultura podem limitar nossa liberdade de nos reconhecermos como somos e nossas necessidades, de experimentarmos nossos sentimentos e de realizarmos escolhas pertinentes ao nosso desenvolvimento pessoal e relacional.
     O terapeuta nesta abordagem é um facilitador do desenvolvimento pessoal. É alguém que se dispõe a compreender o cliente, respeitá-lo e aceitá-lo tal como ele próprio de percebe. Vê o cliente como pessoa, isto é, um ser livre e responsável, capaz de compreender-se e transforma-se, e relaciona-se com ele enquanto tal. A partir dessa relação terapêutica, a pessoa (cliente) começa a afastar-se de modelos falseados de si mesmo, encaminhando-se para maior autonomia. Torna-se progressivamente mais responsável por si mesmo, pois capaz de decidir-se sobre quais são comportamentos e sentimentos significativos e quais não. Encaminha-se, assim, para uma realidade mais fluida, em processo.
  Esse modo de compreender a relação terapêutica se desenvolve ao longo da obra de Rogers para uma atitude nas relações humanas, isto é, não exclusivamente na relação terapêutica. O pressuposto humanista – resgate da dignidade humana, afirmação de sua responsabilidade, liberdade e autonomia – aparece na Abordagem Centrada na Pessoa como atitude de reconhecer que “O ser humano tem algum poder sobre as determinações que o afetam, e esse poder é, na verdade, mais relevante para o desenvolvimento do que aquelas determinações.” (Amatuzzi, 2010, p.17) Refere-se a um modo de ser, isto é, de assumir-se e estar com outro, como pessoa, no sentido da relação Eu-Tu descrita por Martin Buber. 
Martin Mordechai Buber (hebraico: Viena, 8 de fevereiro de 1878 – Jerusalém, 13 de junho de 1965) foi um filósofo, escritor e pedagogo, austríaco e naturalizado israelita, tendo nascido no seio de uma família judaica ortodoxa de tendência sionista. Buber era poliglota, em casa aprendeu ídiche e alemão; na escola judaica, estudou hebraico, francês e polonês/polaco. Sua formação universitária deu-se em Viena.
O homem nasce com a capacidade de interrelacionamento com seu semelhante, ou seja, a intersubjetividade. Intersubjetividade é a relação entre sujeito e sujeito e/ou sujeito e objeto. 
O relacionamento, segundo o filósofo Martin Buber, acontece entre o Eu e o Tu, e denomina-se relacionamento Eu-Tu. A interrelação segundo Martin Buber, envolve o diálogo, o encontro e a responsabilidade, entre dois sujeitos e/ou a relação que existe entre o sujeito e o objeto. Intersubjetividade é umas das áreas que envolve a vida do homem e, por isso, precisa ser refletida e analisada pela filosofia, em especial pela Antropologia Filosófica.
 Rosmaninho (2015) descreve os modos de relação Eu-Tu e Eu-Isso:
Para Buber existem duas formas básicas do homem se relacionar: uma ele chamou de Eu-Isso e outra de Eu-Tu. São modos do homem se relacionar e se colocar diante do outro e do mundo. Na relação Eu-Isso, o homem se coloca diante do mundo como algo objetivo e, nessa atitude, ele se torna capaz de conhecer e habitar o mundo. Já na relação Eu-Tu, o homem se coloca em relação a um outro, que pode ser uma outra pessoa, uma obra artística ou literária, ou, ainda, uma situação vivenciada. A relação Eu-Tu é marcada pelo impacto da presença do outro, é um encontro no qual o homem é atravessado pela potência e pela força da vivência do outro. Este encontro foge às apreensões usuais e se recusa a ser sistematizado ou esquematizado. (Rosmaninho, 2015, p.176-7)
    Na ACP, a relação Eu-Tu descreve o encontro inter-humano, no qual cada participante é aceito como pessoa autônoma, livre, criativa e capaz de dirigir suas ações na direção do crescimento do crescimento, da complexificação e da realização. Isso porque a pessoa que assim se coloca na vida reconhece a existência de uma tendência formativa universal. (Amatuzzi, 2010)

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