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Resenha - Estado e Produção de Bens Públicos

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RESENHA 1 
 
Daniel Galdino Netto 
2016010686 
 
 
Estado e Produção de Bens Públicos no Pensamento Econômico – OLIVEIRA, F. A. 
em: Economia e Política das Finanças Públicas no Brasil: um guia de leitura, 2009 
 
 
 A proposição do autor neste capítulo é de delinear a composição teórica do 
papel a ser cumprido pelo Estado ao longo da evolução do capitalismo sob a ótica 
do pensamento econômico, considerando posições distintas de análise e concepção 
de tal papel (e até mesmo da própria essência do Estado), comparando-as sob a 
ótica marxista, para então apresentar brevemente a dinâmica e estrutura do Estado 
brasileiro. 
 Um ponto basal da análise é de que, inserido no capitalismo, o Estado 
desempenha uma função das condições de reprodução do capital, de acordo com a 
realidade histórico-concreta. As condições de reprodução do capital evoluem de tal 
forma que o Estado modifica sua estrutura e ação. De forma análoga às fases do 
desenvolvimento humano, o autor ilustra a relação Estado-capital temporalmente 
consoante a fases de vida (infância, adolescência, maturidade e terceira idade). 
 A alternância histórica entre doutrinas e seus respectivos dogmas sobre as 
funções do Estado seguem da seguinte forma: 
 
• Infância – Mercantilismo: séc XV, momento de gestação das condições 
iniciais para o processo de acumulação de capital. Condicionamento de 
conceitos de vida social que habilitem dogmaticamente a regência de uma 
nova dinâmica de acumulação (entesouramento), a qual, por sua vez, conta 
com uma ação estatal prevalecente. Tal dinâmica é salvaguardada pela 
centralização do poderio estatal em razão do divino em uma única figura, o 
monarca absoluto, garantidor da soberania do território em nível mercantil. 
Tal concentração de poder leva ao enfraquecimento das bases de apoio à 
produção que o Estado poderia prover já no século XVIII. 
• Adolescência – Capitalismo Concorrencial: séc XVIII, a separação entre o 
governante e o Estado é reforçada no campo teórico político, com defesa a 
uma instrumentalização da soberania estatal que não se fecha na figura de 
um único indivíduo, mas sim por burocracias bem definidas (e tripartidas). No 
campo econômico, o fortalecimento da fisiocracia embasava o argumento da 
não necessidade de intervenção estatal para prover eficiência alocativa de 
recursos e seus respectivos ganhos sociais. As leis naturais por si só seriam 
capazes de alocar valor gerado pela produção, caso a liberdade de ações de 
busca do interesse pessoal fosse garantida. Contudo, percebeu-se que um 
dos fatores básicos para que haja tais ações são informações que 
preconizem uma ergodicidade da taxa de lucro, e que tal fator também é 
gerador de falhas de mercado. É o que, interessantemente, o autor chama de 
“rebeldia” do capitalismo frente ao Estado, semelhante ao comportamento 
humano na fase adolescente. Dessa forma, à época, o Estado cumpriria tal 
lacuna frente à mercados, cumprindo a função alocativa de recursos 
específicos que não atendem tal requisito. Contudo, é também neste 
momento em que a rápida e sufocante desigualdade abalava tal práxis. Há, 
portanto, teorizações que incorporam tais insuficiências com um maior rigor 
matemático, afim de argumentar sobre o funcionamento de remunerações e 
sua relação com as leis naturais, objetivando os quesitos produtividade, 
racionalidade e eficiência que permeiam a escolha de indivíduos em um 
sistema econômico. O Estado, contanto, foi reservado a decisões de ordem 
social e segurança pública, até o momento em que a concentração de capital 
tornou o sistema inoperante. 
• Maturidade – Capitalismo Monopolista: final do séc XIX e início do séc XX, a 
concentração de capital começou a “emperrar” a engrenagem capitalista, 
sendo uma época de grandes crises sistêmicas (crise econômica, duas 
guerras mundiais). Teoricamente, a incorporação de novas funções e 
atribuições do Estado serviria de força atenuadora dos impactos críticos das 
flutuações do capital, uma vez que o mercado por si só não era capaz de 
superar tais falhas. John Maynard Keynes é a figura mais relevante de tal 
período. Segundo Keynes, o Estado deveria incorpor a função distributiva, de 
forma a garantir a economia a uma distribuição de renda justa e equitativa, e 
a função estabilizadora, de forma a introduzir políticas (fiscais, monetárias e 
cambiais) com o intuito de preservar demandas, desacelerar preços e focar 
em produções que sejam benéficas para os objetivos domésticos frente ao 
comércio internacional. A influência keynesiana foi vital para a formação de 
ideologias desenvolvimentistas na CEPAL que teve grande influência em 
políticas econômicas brasileiras durante décadas. 
o Reação a Keynes pela ortodoxia: a teoria monetarista, apoiada em 
modelos de expectativas inflacionárias, reforçou a ideia de que mesmo 
que haja movimentos intervencionistas pelo Estado, tais ações são 
inócuas sobre os agentes quanto à ampliação de renda e do emprego, 
uma vez que há um trade-off entre desemprego e inflação acima das 
expectativas dos agentes, a chamada ilusão monetária. Ou seja, a 
intervenção estatal, apesar de inócua sobre os salários e preços reais 
afeta as expectativas de inflação dos agentes, ocasionando erros de 
previsão sobre o valor nominal, tanto no curto prazo quanto no longo 
prazo. 
• Terceira Idade – Capitalismo Globalizado: a partir da década de 1970, a 
aceleração da inflação e de déficits públicos deu espaço para novas 
composições teóricas sobre o papel negativo do Estado frente às ações da 
iniciativa privada. 
§ Teoria da Regulação: tal teoria defende que a regulação estatal 
preza por interesses dos grupos regulados em detrimento do 
interesse público, uma vez que há uma relação promíscua entre 
tais entidades. Refinada depois de uma década, tal teoria 
incorpora a importância da regulação em áreas de direitos 
sociais, deixando claro o quanto a busca pela eficiência deve 
moldar as instituições e os mecanismos de controle. 
§ Teoria das Expectativas Racionais: em contraponto à teoria 
monetarista de expectativas adaptativas, tal teoria destaca a 
existência de informações incompletas ou imperfeitas que 
modulam os erros de expectativas. Contudo, o resultado da 
intervenção estatal sobre a economia é o mesmo. 
§ Teoria da Escolha Pública: as decisões tomadas pelo Estado 
estão sujeitas à mais falhas do que as decisões dos agentes em 
mercados, uma vez que os elevados déficits governamentais 
advêm de escolhas dos atores sem levar em consideração 
restrições orçamentárias. Os diversos interesses a serem 
alcançados pelos atores da máquina pública levam a 
ineficiências e falhas mais graves do que as provindas pelo 
mercado. Uma das derivações disso são os chamados rent 
seekers, em geral lobbies que tendem a se organizar 
politicamente para auferir lucros e ganhos de capital de 
intervenções estatais, ocasionando falta de ganhos de eficiência 
social. 
§ Teorias de Resgate de um Estado comportado: sob tal 
perspectiva, há um desdobramento da Teoria da Escolha 
Pública com o intuito de prover artifícios para o Estado atuar de 
forma eficiente, ágil e capaz sobre o funcionamento do 
mercado, de forma a garantir uma economia competitiva e 
inovadora. Os limites do Estado, então, estão associados à 
responsabilidade fiscal e equilíbrio patrimonial. 
 
Assim, dado o apanhado teórico feito pelo autor, há a demonstração de tal 
multiplicidade sob a ótica marxista e como tais elementos podem ser retratados 
diante de tal visão. Tomando como ponto de partida de que o Estado é o garantidor 
da reprodução da dominação de classes a longo prazo, uma vez que este funciona 
à mercê do capital, pode-se compreender que o Estado cumpre as funções de 
acumulação e legitimação com o intuito de fazer valer a lei do valor em sua 
plenitude. Contudo, como visto, a posição ora a favor ora contra de tal concepção 
fez com que mecanismosde atuação fossem desenvolvidos, o qual o ator traz à 
análise o caso brasileiro. 
 
Segundo o autor, há três períodos a serem destacados: 
• 1889-1930: momento de definição da 1ª República no Brasil, onde o Estado 
ainda é frágil institucional, econômica e financeiramente. Conduzido sob as 
rédeas das oligarquias paulistas e mineiras, estabelece medidas 
protecionistas do setor cafeeiro, mediante impostos incidentes sobre o 
comércio exterior, de forma a captar recursos para a União pelo de 
Importação e para os estados pelo de Exportação. 
• 1930-1988: o Estado desvincula-se dos interesses oligárquicos regionais e 
passa a engendrar uma maior coesão institucional, por meio da estruturação 
de legislações mais bem definidas. Passa a cumprir com maior proeminência 
a função acumulação e legitimação, assumindo a responsabilidade de 
condução da industrialização do país, mediante artifícios específicos 
(políticas fiscais, cambiais e monetárias). Há dois momentos dentro desse 
intervalo temporal que devem ser comentados: 
o 1930-1964: a fragilidade das bases fiscais e financeiras impede o 
desenvolvimento de revoluções que afetariam o financiamento das 
atividades do Estado, sendo um momento marcado pela criação de 
empresas estatais, contratação de recursos externos e criação de 
fundos fiscais que assegurariam os futuros setores. Apesar de tal 
esforço, os gastos governamentais de administração direta não 
superam 15% do PIB na época. 
o 1964-1988: a força política do governo autoritário instituído no período 
trouxe reformas basilares para o financiamento estatal, de forma que o 
Estado desenvolvimentista pudesse expandir a economia brasileira em 
termos intranacionais e internacionais. Há, contudo, durante tal 
processo problemas de ingerência e má condução de políticas fiscais, 
de forma que tal sucesso de desenvolvimento fracassasse com 
endividamento e inflação a níveis estratosféricos. Nesse período os 
gastos do governo chegam a um quarto do PIB. 
• 1988-2006: a grave crise fiscal do país fez com que a intervenção estatal 
fosse descartada e abominada, sobretudo pela adoção de métodos 
profiláticos neoliberais, ao entender que as amarras para o capital 
internacional em solo brasileiro deveriam ser desfeitas, uma vez que o 
investimento privado de fato se sobressairia diante de tal nova organização 
provendo estabilidade econômica. A ação estatal, portanto, deveria abrir mão 
de seu papel como agente de legitimação e focar em seu papel de 
acumulação, priorizando o pagamento da dívida pública. Contudo, a receita 
tributária do governo chegou a níveis jamais vistos de 35% do PIB, momento 
onde o aumento dos gastos de juros da dívida era a única saída para evitar o 
descontrole total.

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