Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Da MP-948/2020 à Lei nº 14.046/2020, o código de defesa do consumidor contraposto a pandemia em razão do SARS-COV-2 APARECIDA DE GOIÂNIA - GO 2020 Discente: Gustavo dos Santos Turma: Direito Matutino 8 Docente: Lorena Ayres da Rocha Instituição: Centro Universitário Alfredo Nasser APARECIDA DE GOIÂNIA - GO 2020 INTRODUÇÃO A Medida Provisória nº 948, de 8 de abril de 2020, convertida na Lei nº 14.406 de 24 de agosto do corrente ano, versa sobre o adiamento e o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e de cultura em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente da pandemia da Covid-19. 1. Motivação Em virtude da pandemia vários Estados e Municípios emitiram decretos determinando isolamento social, proibindo aglomeração de pessoas, consequentemente sem previsão de retorno fechou-se comércios, shows, eventos e outros do mesmo cunho foram cancelados, sem previsão de retorno, afetando todo um organismo correlacionados (serviços, reservas, transportes, turismo). Diante dos prejuízos decorrentes trazidos pela pandemia sobretudo aos setores turísticos e culturais, nos parece que a medida provisória e sua conversão em Lei busca evitar que aqueles caiam em ruína, para tanto relativiza o Direito de estorno do consumidor, sem contudo deixar de lado sua presunção de vulnerabilidade. 2. CDC e o risco do negócio O empresário não é obrigado a empreender, quando o faz assume o risco de ganhar ou perder, é o mesmo que dizer somente a si cabe o lucro ou o prejuízo. Desta forma o risco do prestador de serviço é integral, motivo o qual a lei não prevê como excludente do dever de indenizar o caso fortuito e a força maior. Assim sendo em respeito ao princípio da vulnerabilidade do consumidor no mercado contraposto a liberdade de empreender e assunção do risco assumido pelo empresário diante de seu direito legítimo ao lucro é que o CDC preteriu que toda a carga econômica recaia sobre o prestador, quando de um acontecimento inesperado que ponha em risco o negócio, art. 12 e 14 do referido Diploma. Posicionamento tomado Rizzatto Nunes. 1 Fabrício Bolzan diverge da opinião supra ao consignar “[o caso] fortuito interno … não exclui a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento [...] o mesmo já não ocorre com o fortuito externo, assim entendido aquele fato que não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor [...]” 2 (grifo nosso). 1 Curso de direito do consumidor / Rizzatto Nunes. - 7. ed. rev. e atual. - São Paulo : Saraiva, 2012,pág. 364 à 368. 2 Direito do consumidor esquematizado / Fabrício Bolzan. - 2. ed. - São Paulo: Saraiva, 2014, pág. 238. 3. Análise da MP-948/2020 convertida em Lei nº 14.046/2020 As normas em exame versam sobre a impossibilidade do cumprimento de obrigações de fazer decorrentes de contrato de consumo, em razão da pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2). Situação não amparada pelo CDC, contínuo posicionamento discriminado em tópico anterior, o que ensejaria a aplicação de normas gerais estabelecidas pelo Código Civil. A grande maioria dos artigos que embasam este estudo receberam com bons olhos a normatização, tecem críticas apenas em relação a falta de técnica jurídica ao dispor os artigos, principalmente na MP-948/2020. Vejamos ponto-a-ponto. O artigo 1º introduz a finalidade, o motivo de ser da normatização. O artigo 2º nos informa desde que o prestador assegure ao consumidor a remarcação, o crédito/abatimento ou pactuem acordo não terão de reembolsar valores já percebidos pelo cancelamento e ou adiamento de eventos. Para cada opção deverão ser respeitados os critérios como peculiaridades em caso de reembolso (sazonalidade / condições originais do serviço contratado), prazo para remarcação 12 meses contados do encerramento do estado de calamidade, etc. A sua aplicação está adstrita aos prestadores de serviços turísticos discriminados no artigo 21 da Lei nº 11.771/2008. Não havendo incidência de custo adicional, taxa ou multa ao consumidor, desde que requisitado em qualquer data a partir de 1º de janeiro de 2020, estendido pelo prazo de 120 dias contados da comunicação do cancelamento ou adiamento do serviço, ou 30 dias antes da realização do evento. Note-se que o prazo estabelecido retro refere-se a Lei, sendo mais benéfico do que os 90 dias estipulados no decreto. Não havendo possibilidade de remarcação ou reembolso, a restituição no prazo de 12 meses, contado da data do encerramento do estado de calamidade é, dos valores recebidos ao consumidor, é medida que se impõe, deduzindo-se os valores a título de agenciamento e ou intermediação. Desde que cumpram com sua obrigação e remarquem evento em até 12 meses, contados do encerramento do estado de calamidade, os Artistas e outros profissionais liberais correlatos não terão o dever de devolução de imediato ao consumidor, consoante §4º. O artigo 5º dispõe acerca do caso fortuito ou força maior, isentando o prestador de serviço ao pagamento de indenização por danos morais; aplicação de multas contratuais; ou aplicação das sanções administrativas previstas no artigo 56 do CDC. José Fernandes Simão , de cunho mais ideológico, e Luiz Quintella , mais técnico, 3 4 tecem críticas quanto a redação dado aos artigos e parágrafos que compõem a MP/Lei, principalmente o disposto no artigo 5º. A opinião que chama mais atenção gira em torno da redação em que se estabelece que as relações de consumo “caracterizam hipóteses de caso fortuito ou força maior”, quando em verdade a pandêmia é o ponto de imprevisão, e dela decorre a impossibilidade do cumprimento da obrigação. Pra arrematar trago alguns julgados aptos a demonstrar como as cortes têm tratado a situação e a aplicabilidade das normas debatidas, vejamos: EMENTA: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – Tutela de urgência em caráter antecedente para determinar o depósito de quantia referente à taxa de ingresso cobrada pela ré, no âmbito da realização do evento organizado pela autora – Tal matéria demanda discussão acerca de cláusulas contratuais, que exigem o prévio contraditório e a ampla defesa – Questões de alta indagação – Ausência de comprovação do periculum in mora, consistente no risco de prejuízo econômico com o fechamento do escritório da requerida no Brasil – Tutela revogada – Recurso provido.” (TJ-SP - AI: 21149222520208260000 SP 2114922-25.2020.8.26.0000, Relator: Marco Fábio Morsello, Data de Julgamento: 07/07/2020, 11ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/07/2020). 5 EMENTA: “AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO CONTRA R. DECISÃO PELA QUAL FOI CONCEDIDA TUTELA ANTECIPADA, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA, NO SENTIDO DE DETERMINAR A SUSPENSÃO DE COBRANÇA DE PARCELAS RELATIVAS A CONTRATO DEINTERCÂMBIO CELEBRADO ENTRE AS PARTES, ESTAS COBRADAS EM FATURAS DE CARTÃO DE CRÉDITO DA AGRAVADA – ALEGAÇÃO DE INCORREÇÃO, COM PEDIDO DE REFORMA - 3 https://www.migalhas.com.br/depeso/330870/mp-948-20-interpretar-e-preciso 4 http://genjuridico.com.br/2020/04/09/medida-provisoria-948/ 5 Ao ler o inteiro teor da decisão note-se a medida provisória 948/2020 com fundamentação para revogar-se a tutela: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/896110201/agravo-de-instrumento-ai-21149222520208260 000-sp-2114922-2520208260000/inteiro-teor-896110354?ref=serp ACERTO DA R. DECISÃO COMO PROFERIDA – PRESENÇA E ATENDIMENTO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300, DO CPC – RESCISÃO DE CONTRATO RELACIONADO AO SETOR DE TURISMO, POR CONTA DA CRISE SANITÁRIA DECORRENTE DA ECLOSÃO DE PANDEMIA (COVID-19) – APLICABILIDADE DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 948 DE 2020 – SUSPENSÃO DA COBRANÇA DAS PARCELAS VINCENDAS, QUE NÃO SE CONFUNDE COM IMEDIATA DEVOLUÇÃO DE VALORES JÁ QUITADOS, COMO PRETENDE FAZER CRER A AGRAVANTE – ACERTO DA R. DECISÃO - RECURSO NÃO PROVIDO.*” (TJ-SP - AI: 21721011420208260000 SP 2172101-14.2020.8.26.0000, Relator: Simões de Vergueiro, Data de Julgamento: 27/08/2020, 16ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/08/2020). 6 EMENTA: “[...] Especificamente em relação às empresas de turismo, foi editada a MP 948 /2020, que prevê: "Art. 2º Na..., 09/06/2020, 09/07/2020, 09/08/2020 e 09/09/2020), a fim de não agravar os danos suportados pela parte...Brasília/DF, 23 de abril de 2020. CARLOS ALBERTO MARTINS FILHO Juiz de Direito [...]”. (TJ-DF 07004734120208079000, Relator: CARLOS ALBERTO MARTINS FILHO, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: 04/05/2020) 7 6 https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/919546573/agravo-de-instrumento-ai-21721011420208260 000-sp-2172101-1420208260000/inteiro-teor-919546741?ref=serp 7 https://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/839990844/7004734120208079000/inteiro-teor-839990864 ?ref=serp 4. Conclusão A MP-948/2020 e sua consequente Lei nº 14.046/2020 buscaram formalizar a excludente de responsabilização do prestador de serviços em razão da pandemia (caso fortuito ou força maior), na impossibilidade de cumprir a obrigação avençada. Ainda que com alguns pontos infelizes em sua redação, referidas normas não retiram a presunção de vulnerabilidade do consumidor diante da assunção do empresário que de livre vontade quis empreender e deve tomar para si os prejuízos decorrentes do risco do negócios, tanto quanto somente a si cabe os lucros daí advindos. Desta feita pode-se afirmar que pelo CDC a responsabilidade do prestador de serviços continua a ser objetiva, contudo flexibilizada pela normalização trazida a baila, traz alternativas para reembolsar o consumidor (remarcação, concessão de crédito ou a possibilidade de acordo em comum pelas partes), de forma a minorar os prejuízos econômicos a que podem sofrer. Vemos assim a importância de manter incólume o Direito de defesa do consumidor, sem contudo deixar a economia quedar em ruína, pela falência de diversas empresas e ou profissionais liberações; isso é a aplicação do diálogo das fontes, o cumprimento social das normas vigentes. Fontes de pesquisa: Curso de direito do consumidor / Rizzatto Nunes. - 7. ed. rev. e atual. - São Paulo : Saraiva, 2012. Direito do consumidor esquematizado / Fabrício Bolzan. - 2. ed. - São Paulo: Saraiva, 2014. https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-948-de-8-de-abril-de-2020-2517680 19 https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=400353 https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/533814/cdc_e_normas_correlatas_2ed.p df https://www.dizerodireito.com.br/2020/04/mp-9482020-disciplina-as-regras-para.html https://www.dizerodireito.com.br/2020/08/lei-140462020-disciplina-as-regras-para.html https://www.migalhas.com.br/depeso/330870/mp-948-20-interpretar-e-preciso https://www.conjur.com.br/2020-abr-22/rebeca-falcao-mp-948-efeitos-consumidor http://genjuridico.com.br/2020/04/09/medida-provisoria-948/ https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-948-de-8-de-abril-de-2020-251768019 https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-948-de-8-de-abril-de-2020-251768019 https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=400353 https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/533814/cdc_e_normas_correlatas_2ed.pdf https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/533814/cdc_e_normas_correlatas_2ed.pdf https://www.dizerodireito.com.br/2020/04/mp-9482020-disciplina-as-regras-para.html https://www.dizerodireito.com.br/2020/08/lei-140462020-disciplina-as-regras-para.html https://www.migalhas.com.br/depeso/330870/mp-948-20-interpretar-e-preciso https://www.conjur.com.br/2020-abr-22/rebeca-falcao-mp-948-efeitos-consumidor http://genjuridico.com.br/2020/04/09/medida-provisoria-948/
Compartilhar