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Molefi K Asante - Afrocentricidade e uma abordagem para a paz no mundo

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AFROCENTRICIDADE E UMA ABORDAGEM PARA A PAZ NO MUNDO 
 
 
Autor: Molefi Kete Asante 
Tradução: Lana Vitoriano 
Texto original disponível em: http://www.unisa.ac.za/news/wp-
content/uploads/2013/03/Molefi-Asante-article1.pdf 
 
 
O mundo está em uma confusão política. Às vezes dizemos que a África está em apuros, 
mas o mundo está passando por problemas. Mas temos uma participação real na paz do 
mundo. A liderança sul-africana na forma em que Thabo Mbeki mediou numerosas 
disputas tornou-se emblemática no mundo. O ex-presidente, aos 70 anos, tornou-se um 
campeão de conversas africanas pela paz. 
 
Até aqui, a estrutura da paz como uma doutrina nos assuntos mundiais, em grande parte 
foi deixada aos pensadores e políticos europeus. Nós raramente consideramos as ideias 
dos africanos nesses assuntos. O que África tem a oferecer sobre a questão da paz na 
África e no resto do mundo? Claro que África tem uma riqueza de informações, 
conhecimento e capacidade. Nós temos que aprender com nossa história. 
 
É claro que enquanto os africanos têm olhado para mais exemplos práticos de paz, 
ausência de guerra e massagem da dignidade humana, houveram filósofos políticos que 
propuseram empresas que criam condições para a paz mundial. Kwame Nkrumah é um 
desses filósofos. Ele é, de fato, em uma longa linha de filósofos que datam de Imhotep, 
cujo próprio nome significa "aquele que vem em paz". 
 
As perspectivas e possibilidades de paz no mundo eram inerentes na visão de Nkrumah 
de um "Estados Unidos de África". Em consequência, uma África livre de vestígios do 
colonialismo em todas as suas dimensões (econômicas, filosóficas e culturais) traria 
estabilidade ao continente e removeria África, especialmente de sua realidade 
fragmentada como Estado-nação de ser uma região muito disputada para manobras 
políticas e econômicas internacionais. 
 
A visão de Nkrumah era política, mas também era mais do que política; era também 
cultural e filosófica, portanto, afrocentrada. Ele foi um dos primeiros a chamar por uma 
realidade afrocentrada para os africanos. Este é o significado das propostas de Nkrumah 
para uma nova personalidade africana, livre de envolvimentos culturais europeus e 
americanos. Uma personalidade que não está em sintonia com a dos opressores de 
África seria o único método para a afirmação desta nova realidade. 
 
É possível demonstrar como o concurso para os recursos da África são melhor 
preservados por políticas externas comuns e um mercado continental integrado. Isso é 
necessário para que possamos ver Nkrumah, não como um político local nem um político 
ganês, mas como um filósofo político africano, cuja abordagem à governança teve base 
em sua teoria do "grande coração do mundo negro". 
 
Nkrumah parecia lutar com a ideia de voltar para o Gold Coast para aceitar o convite dos 
advogados e empresários que queriam ele como secretário de seu partido político. 
Nkrumah teve que decidir se queria continuar sozinho ou se queria trabalhar em um 
partido político, onde, de certa forma, seria visto como uma criatura da administração 
colonial. Só quando ele sentiu que poderia voltar para Gana como um homem livre, ele 
http://www.unisa.ac.za/news/wp-content/uploads/2013/03/Molefi-Asante-article1.pdf
http://www.unisa.ac.za/news/wp-content/uploads/2013/03/Molefi-Asante-article1.pdf
poderia assumir o trabalho na Convenção das Nações Gold Coast em 28 de dezembro de 
1947. 
 
Nkrumah acreditava que era possível trabalhar com os brancos liberais na administração 
colonial, a fim de estabelecer uma plataforma para o lançamento de seu próprio partido 
político. Ele sentiu que as massas eram muito mais importantes do que a restauração 
para a classe média de pessoas do negócio. Ao mesmo tempo ele era um realista, ele 
sabia que as condições aconteciam durante o tempo colonial em Gold Coast. 
 
O que ele viu, no entanto, como alguém que estava no mastro de sua geração e 
examinou o horizonte político para o futuro com as mais agudas declarações proféticas 
de qualquer um de seus pares, foi que a transformação seria impensável sem uma 
mudançã na condição psicológica das pessoas. 
 
Sim, em um sentido real Nkrumah foi um materialista, mas ele era diferente de Marx, 
porque as circunstâncias que lhe confrontaram foram diferentes daquelas que 
confrontaram as sociedades europeias. Ele foi acusado sobre as condições abusivas que 
saudaram as tropas africanas que voltavam para Kumasi após lutar em guerras na 
Inglaterra. Ele estava preocupado com os mansos, tímidos, responsáveis pela classe 
média negra, para o terror geral da classe colonial. Eles estavam com medo de arriscar 
seu status de classe e, consequentemente, seriam capazes de vender seus irmãos e 
irmãs. Isso chamou por uma nova personalidade. 
 
Claro, todas essas avaliações objetivas mostraram a Nkrumah que as condições estavam 
não apenas em Gold Coast, mas também no resto do continente. O Egito se tornou o 
primeiro país no continente a ganhar sua independência e cinco anos mais tarde Gana 
ganharia sua liberdade a partir da mesma administração colonial britânica. 
 
Nada seria capaz de contar a onda forte da resposta africana para a política, a exploração 
econômica e social. Cheikh Anta Diop, o maior intelectual africano da era moderna, 
perguntaria em Présence Africaine, um ano depois de Nkrumah voltar a Gold Coast, 
"Quando é que será possível falar de um Renascimento Africano?" 
 
Diop nascceu na era colonial, foi educado em escolas estabelecidas por professores 
coloniais. No entanto, ele era capaz de ler os documentos da cultura ocidental com dois 
conjuntos de notas, uma para os exames e outra para sua sanidade mental. Quando 
disseram que a Europa inventou a ciência, ele escreveu nas margens que isso era 
mentira. Quando disseram que os africanos eram inferiores e não tinham filósofos, ele 
escreveu nas margens que isso era falso. Quando eles disseram que a Europa originou a 
civilização, ele escreveu que os europeus haviam falsificado a história. 
 
É fora deste espírito que Nkrumah veio ver a condição da Gold Coast. Ele tinha sido um 
confidente, um estudante se quiserem, um aprendiz de duas das mentes mais agudas de 
seu tempo, W.E.B. Du Bois e George Padmore. Nkrumah tinha encontrado Padmore na 
Inglaterra e tinha sido pressionado em serviço no 5º Congresso Pan-Africano. Du Bois, o 
padrinho do pan-africanismo, lhe influenciou muito e deu-lhe a ideia de que África tinha 
lições para ensinar ao mundo. 
 
É minha convicção que, quando Nkrumah deixou Chorlton Town Hall, Manchester, em 21 
de outubro de 1945, ele era um homem mudado. Foram cinco dias de intenso debate, 
discussão e previsões sobre o futuro da África que haviam transformado os delegados em 
agentes de história. Cada um viu o poder de sua própria agência. Alguns dizem que o 
Congresso era militante, mas "militante" é um termo estranho aqui; os delegados eram 
determinados, cometidos, assertivos e destinados a criar no continente africano um 
quadro de liderança pela liberdade. 
 
O continente africano é uma massa de terra contínua com várias ilhas periféricas, tais 
como Madagascas, Zanzibar, Cabo Verde e outras ilhas menores. É um vasto território. 
Se fosse um país separado, seria a maior nação do mudo. Pode-se colocar a Rússia (17 
milhões de metros quadrados por quilômetro) e o Canadá (10 milhões de metros 
quadrados por quilômetro) dentro da África (30,2 milhões de metros quadrados por 
quilômetro). Canadá, o segundo maior país do mundo, e os EUA, o terceiro maior, podem 
caber confortavelmente dentro da África. Você poderia colocar os EUA, a Índia, toda a 
Europa (incluindo o Reino Unido) dentro de África e ainda sobraria território. Dito de outra 
forma, os "Estados Unidos da África" seria o maior país do mundo em termos de território. 
Seria o terceiro maior em termos de população depois da China e da Índia. 
 
O continente africano não é pobre, embora os povos africanos muitas vezes estejam em 
situação de pobreza. África tem terra arável suficientepara alimentar toda a terra, mas em 
alguns países, as pessoas lutam regularmente contra a fome. Isso é o que os outros têm 
chamado de "o paradoxo da África", a terra mais rica com as pessoas mais pobres. 
Mesmo levando em consideração os desertos, Sahara e Kalahari, o continente africano, 
com suas maciças savanas, com seus profundos recursos florestais e com suas grandes 
regiões aáveis, poderia facilmente apoiar o continente. É uma questão de organização de 
recursos, e não de falta de possibilidades. 
 
Os recursos minerais do continente são fabulosos e, em alguns aspectos, a África é o 
continente mais rico na Terra. Desertos minerais, animais de pasto, óleos para indústrias, 
petróleo, minerais futuristas para as tecnologias de informação são abundantes no 
continente. Mais tipos de madeira podem ser encontrados na África do que em todos os 
outros continentes combinados. Metade dos diamantes do mundo estão aqui. 
 
Uma vez que esses fatos são verdadeiros, como África pode se organizar para aproveitar 
toda essa força? Acredito que Nkrumah tenha compreendido potencial para uma potência 
continental unindo toda a África. 
 
Quase todos os problemas da África podem ser atribuídos à exploração econômica e 
degradação cultural. Os declínios na produção agrícola em África ao longo dos últimos 
trinta anos, na maioria dos casos, estão ligados diretamente à forma como as nações 
ocidentais proíbem ou reduzem a exportação competitiva natural das nações africanas. 
Ainda hoje as exportações africanas foram sancionadas, e onde não foram sancionadas, 
foram fortemente tributadas e, consequentemente, áreas como a produção de algodão, os 
países europeus e norte-americanos apoiaram seus próprios agricultores e a concorrência 
sufocante de agricultores africanos foram apoiadas pelos seus governos. 
 
Não há falta de energia, capacidade ou saber técnico por parte da África, isto é 
estritamente uma falta de poder organizacional e político para ver os interesses da 
economia do continente protegidos. 
 
Há uma história de liderança africana em relação à construção da nação. A primeira 
nação da Terra era uma nação africana. É prorrogada para além da agregação de 
pessoas no âmbito de uma realeza. 
 
O estado de Kemet foi composto por 42 grupos étnicos com semelhanças espirituais, 
cosmológicas, matemáticas, filosóficas se agrícolas. Sua resposta à natureza e às 
relações humanas era algo a ser invejado e copiado por outros. 
 
Quando Menes desceu do sul do Egito, chamado Kemet, pelos africanos, para se unir aos 
quarenta e dois Sepats, chamados de "nomes" pelos gregos, ele alcançou algo que foi 
criticado da mesma forma como as pessoas criticam a discussão de uma África unida. 
Cada Sepat tinha o seu próprio emblema, seu próprio nome para a divindade suprema, 
sua própria variação na linguagem do Vale do Nilo, sua própria história étnica especial, e 
seu próprio capital com os seus próprios santuários e ainda assim Menes, o Grande, 
conseguiu alcançar com êxito o status nacional. 
 
Por exemplo, o Sepat chamado Ta Seti tinha como emblema, "A Terra do Arco", era 
Neteru. Foram Anuket e sua mãe Satis foi a esposa e Khnum e sua capital era Abu, 
conhecida mais tarde como Elefantina, no idioma grego. 
 
Em uma época mais contemporânea, vemos os gigantes do pan-africanismo, como 
Marcus Garvey, W.E.B. Du Bois, Cheikh Anta Diop, Kwame Nkrumah. Garvey acreditava 
em um objetivo, um destino e um deus. Diop escrevia constantemente sobre um 
renascimento africano com unidade cultural. Nkrumah viu uma África maior do que 
simplesmente a unidade cultural de Diop da África negra, porque ele sentiu que o Norte 
tinha sido predominante negro antes que os árabes viessem e tivessem de ser incluídos 
no estado continental. Du Bois procurou uma base científica para unidade política com 
base nas condições materiais do continente. 
 
Estou convencido de que África deve ser unida como uma união federativa. Eu gosto do 
título "Estados Unidos de África". Eu quero ser capaz de viajar e trabalhar entre Cidade do 
Cabo e Cairo, entre Dakar e Dar es Salaam. Eu procuro uma África onde os jovens 
podem se ver como proprietários da terra. Essa não é uma ideia estrangeira, é uma ideia 
africana. Essas origens são profundas na história do próprio continente. 
 
 
Molefi Kete Asante é autor de 75 livros, incluindo "The History Of Africa" e "An 
Afrocentric Manifesto". Ele é presidente do "Molefi Kete Asante Institute For 
Afrocentric Studies", professor da Universidade Temple e um professor 
extraordinário na Unisa.

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