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AULA 9 ITER CRIMINIS – DA TENTATIVA I ) INTRODUÇÃO Desde os momentos iniciais quando o delito está apenas na mente do sujeito, até sua consumação, quando o crime se concretiza inteiramente, passa-se por todo um caminho, por um itinerário, composto de várias etapas ou fases, o chamado iter criminis. 1.1. Atos de cogitação, preparação e execução - distinção. a) FASE INTERNA – COGITAÇÃO Trata-se do momento interno da infração. Só há crime na esfera psíquica, na mente do sujeito, que ainda não exteriorizou nenhum ato. Essa fase é totalmente irrelevante para o Direito Penal. Um dos elementos do fato típico é a conduta, que pressupõe exteriorização do pensamento. Enquanto a idéia criminosa não ultrapassar a esfera mental, por pior que seja, não poderá censurar criminalmente o ato. Pode-se falar em reprovação do ato do ponto de vista moral ou religioso, nunca, porém à luz do Direito Penal. Mesmo quando a vontade de cometer o crime é verbalizada, não se tem como regra, ilícito algum, salvo se tal manifestação oral puder violar ou periclitar algum bem jurídico, como se poderia imaginar nos casos de injúria (art. 140), ameaça (art. 147) ou incitação ao crime (art. 286) b) FASE EXTERNA b.1.) Preparação Os atos preparatórios ou conatus remotus verificam-se quando a idéia extravasa a esfera mental e se materializa mediante condutas voltadas ao cometimento do crime. Este, portanto, sai da mente do sujeito, que começa a exteriorizar atos tendentes à sua futura execução. Nessa etapa, como regra, o Direito Penal não atua. Atos considerados meramente preparatórios não são punidos criminalmente. Exemplo: A pretende matar B seu inimigo (cogitação) e possuindo porte de arma, apodera-se do instrumento bélico (preparação), e em seguida, desloca-se até as proximidades da residência do ofendido, sendo surpreendido pela polícia antes de sacar a arma ou mesmo encontrar-se com a vitima visada. Não cometeu crime algum, tendo em vista que ele possui o porte de arma. Eventualmente, o legislador transforma em crimes autônomos condutas que configuram meros atos preparatórios de outros delitos. Referida técnica legislativa, cada vez mais presente nos dias atuais, denomina-se antecipação da tutela penal. São mostras válidas de antecipação de tutela penal, dando-se punição como crimes autônomos de atos preparatórios de outras infrações penais, os artigos 286 (incitação ao crime), 287 (apologia ao crime), 288 (associação criminosa) e o 291 (petrechos de falsificação de moeda). Ainda o art. 34 da Lei Antidrogas e os artigos 12, 14 e 16 do Estatuto do Desarmamento. b.2) Execução A terceira etapa do iter criminis se atinge com o primeiro ato de execução (conatus proximus). Cuida-se de uma das questões mais árduas em Direito Penal estabelecer a exata fronteira entre os atos preparatórios e os executórios. Trata-se de problema de suma importância, pois, enquanto os atos preparatórios são, como regra, penalmente irrelevante, os executórios são penalmente típicos, tanto que, se o sujeito os iniciar, será punido ainda que haja interrupção involuntária de seu agir (dar-se-á no caso, a tentativa – art. 14, II). 1.2) Atos Preparatórios e Executórios- critérios de identificação do início de execução. Critério material (ou critério do ataque ao bem jurídico tutelado): a execução se inicia quando a conduta do sujeito passa a colocar em risco o bem jurídico tutelado pelo delito (Hungria) Critério formal-objetivo (critério do início da realização do tipo): só há início de execução se o agente praticou alguma conduta que se amolda ao verbo núcleo do tipo. Critério adotado no Brasil: Tendo o Brasil adotado a teoria objetiva, exige-se, para a ocorrência de tentativa, o início de atos de execução. Portanto, no Brasil é adotado o critério do início da realização do tipo ou critério formal. 1.3. Consumação, Tentativa e Exaurimento. Caracterização do pós- fato impunível. Há consumação, de acordo com o Código Penal, quando se fazem presentes todos os elementos da definição legal do delito (art. 14, I). ou seja: total subsunção da conduta do sujeito com o modelo legal abstrato. Pode-se dizer, ainda, que essa fase final do iter criminis é atingida com a produção da lesão ao bem jurídico protegido. Importante e definir a linha divisória da consumação. Esse momento é fundamental para determinar a quantidade da pena imposta, o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva (art. 111, I, CP) e o foro competente para o processo e julgamento da infração (art. 70 do CPP). NATUREZA DO CRIME MOMENTO CONSUMATIVO Crimes materiais ou de resultado Consuma-se com a ocorrência do resultado naturalístico ou material. Crimes de mera conduta Consuma-se com a ação ou omissão prevista e punida na norma penal incriminadora Crimes formais ou de consumação antecipada Não exige, para fins de consumação, que ele ocorra, de tal modo que, praticada a conduta prevista em lei,o delito estará consumado Crimes permanentes No momento da cessação da permanência. Crimes culposos Como crimes materiais, apenas estarão consumados com a ocorrência do resultado naturalístico. Crimes omissivos próprios Por ser de mera conduta, basta a inatividade do agente para a consumação Crimes omissivos impróprios Sempre são materiais ou de resultado, de modo que só estarão consumados com a superveniência deste Crimes qualificados pelo resultado Consumam-se com a ocorrência do resultado agravador. Crimes habituais Só se consuma se o agente os pratica repetidas vezes. Uma só conduta, isoladamente, constitui fato atípico. EXAURIMENTO Dá-se quando o agente, depois se consumar o delito e, portanto, encerrar o iter criminis, pratica nova conduta, intensificando a agressão ao bem jurídico penalmente tutelado. De regra o exaurimento apenas influi na quantidade de pena, seja por estar previsto como causa especial de aumento (Ver art. 317, § 1º), seja por figurar como circunstancia judicial desfavorável (ver art. 59). II ) TENTATIVA (CONATUS) 2.1 Conceito A tentativa constitui a realização imperfeita do tipo penal. dá- se quando o agente põe em prática o plano delitivo engendrado e, iniciando os atos executórios, vê frustrado seu objetivo de consumar o crime por motivos independentes de sua vontade 2.2. Natureza Jurídica Trata-se de uma “ampliação da tipicidade proibida, em razão de uma fórmula geral ampliatória dos tipos dolosos, para abranger a parte da conduta imediatamente anterior à consumação”. (Zaffaroni). Tendo em vista que o legislador não criou “tipos tentados”, mas permite a aplicação da tentativa à grande maioria dos delitos, é preciso utilizar o tipo do crime consumado, unindo-o à previsão legal da tentativa (art. 14, II), conseguindo-se punir a parte do iter criminis anterior à consumação. 2.3. Requisitos Início da execução Não consumação Por circunstâncias alheias à vontade do agente. Art. 14 - Diz-se o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) .............. Tentativa (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 2.4. Espécies: 2.4.1. Perfeita e imperfeita a) Perfeita (crime falho): o agente percorre todo o iter criminis que estava à sua disposição, mas ainda assim, por circunstâncias alheias à sua vontade, não consuma o crime. Ex.: A descarrega a arma na vítima, que sobrevive e é socorrida a tempo por terceiros. Apesar de ter esgotado a fase executória, não alcança o resultado por circunstâncias alheias à sua vontade b) Imperfeita: o agente não consegue, por circunstâncias alheias à sua vontade, prosseguirna execução do crime. Ex.: A entra na residência da vítima e, quando começa a se apoderar dos bens, ouve um barulho que o assusta, fazendo- fugir. 2.4.2. Branca e Cruenta a) Branca: quando o objeto material não é atingido (o bem jurídico não chega a ser lesionado). b) Cruenta: o oposto da tentativa branca, ou seja, o objeto jurídico é atingido. CRIMES QUE NÃO ADMITEM A TENTATIVA Crimes culposos; Crimes preterdolosos; Crimes unissubsistentes: são aqueles cuja conduta típica não admite fracionamento. Exemplo. Injúria (art. 140 do CP); Crimes omissivos puros ou próprios: são aqueles em que o tipo penal descreve uma omissão, de modo que, para identificá-lo, basta a leitura do dispositivo penal. Se o fato descrito corresponder a um non facere, o crime será omissivo próprio. Exemplo: Omissão de socorro, art. 135, CP; Contravenção penal; Crimes que a lei pune somente quando ocorre o resultado: há infrações penais cuja existência é condicionada à existência de um resultado. Sem este,o fato á atípico. Elas não admitem, por esse motivo, a forma tentada; Ex.: artigos 122 e 164 do CP; Crimes permanentes de forma exclusivamente omissiva: são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo. Quando praticado de forma exclusivamente omissiva, não admite a forma tentada, isto porque ou o agente se omite e o fato estará consumado ou age e o crime não foi praticado. Ex.: art. 148, CP na forma omissiva. 2.5. Conseqüências para fins de Aplicação de Pena. Leia o art. 14, caput e parágrafo único, do Código Penal. Art. 14 - Diz-se o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Crime consumado (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Tentativa (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Pena de tentativa (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 1. Desistência Voluntária e Arrependimento Eficaz: Art. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 3.1. Conceito a) Desistência voluntária: Trata-se de desistência voluntária no prosseguimento dos atos executórios do crime, feita de modo voluntário, respondendo o agente somente pelo que já praticou (Guilherme de Souza Nucci). “O abandono é voluntário quando ocorre independentemente de impedimentos obrigatórios; é voluntário quando o autor diz a si mesmo: não quero, mas posso; não voluntário quando diz a sim mesmo: não posso,mas quero”. b) Arrependimento eficaz Trata-se de desistência que ocorre entre o término dos atos executórios e a consumação. O agente, nesse caso, já fez tudo que podia para atingir o resultado, mas resolve interferir para evitar a sua concretização. Exemplo: Tício ministra veneno em Mévio; os atos executórios estão concluídos; se nada fizer para impedir o resultado, a vítima morrerá. Por isso, Tício deve agir, aplicando o antídoto para cessar os efeitos do que ele mesmo causou. 3.2. Natureza Jurídica a) Para Magalhães Noronha, Aníbal Bruno, Juarez Cirino e Nelson Hungria a natureza jurídica da desistência voluntária e arrependimento eficaz seria a de causas de extinção da punibilidade. b) Cezar Roberto Bittencourt, Damásio de Jesus, Frederico Marques, Rogério Greco e Mirabete a natureza jurídica destes dois institutos seria a exclusão de tipicidade. 3.3. Requisitos e distinções. Requisitos: Embora a lei fale na qualidade de ser voluntária somente na desistência e no atributo de ser eficaz apenas no arrependimento, em ambas as hipóteses a voluntariedade e a eficácia são requisitos indispensáveis à aplicação dos efeitos do art. 15 do CP. 3.4. Conseqüências na Tipicidade da Conduta. Estando presentes os requisitos da desistência voluntária ou do arrependimento eficaz, o primeiro efeito se traduz na não- responsabilização do agente pela tentativa do crime por ele originalmente visado. As hipóteses de tentativa abandonada conduzem a atipicidade da tentativa do delito genuinamente desejado. Muito embora o desistente ou arrependido não vá responder pela tentativa do crime inicialmente querido, dispõe a parte final do art. 15 que responderão pelos atos praticados até então. Exemplo: Se um indivíduo invade uma casa para subtrair coisa alheia móvel, desistindo voluntariamente de praticar o furto, embora não vá responder por tentativa daquele crime, mas será processado pelo crime de violação de domicílio (art. 150 CP). 4. Arrependimento Posterior: Arrependimento posterior (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 4.1 Conceito Trata-se da reparação do dano causado ou da restituição da coisa subtraída nos delitos cometidos sem violência ou grave ameaça, desde que para por ato voluntário do agente, até o recebimento da denúncia ou queixa. Chama-se posterior, pois ocorre posteriormente à consumação do delito. 4.2. Natureza Jurídica; incidência Segundo a doutrina, possui a natureza jurídica de causa obrigatória de redução de pena, desde que presentes os requisitos constantes do art. 16 do CP. 4.3. Requisitos 1. Que o delito tenha sido praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa; 2. Necessidade de reparação do dano ou restituição da coisa; Essa reparação deve ser sempre integral, a não ser que a vítima ou seus herdeiros renunciem de parcela do devido. Tratando-se de reparação ou restituição meramente parciais, o fato pode configurar mera circunstância atenuante genérica (art. 66 do CP). Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 3. Voluntariedade do agente. 4. Que a restituição ou reparação se dê até o recebimento da denúncia ou queixa. Exige-se que o arrependimento se manifeste até o recebimento da denúncia ou queixa. Se ocorrer após esse momento, mas antes do julgamento, haverá somente uma circunstancia atenuante genérica (art. 65, III, b, CP). Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - o desconhecimento da lei; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) III - ter o agente:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão emtumulto, se não o provocou. 4.4. Distinção do instituto de Arrependimento Eficaz. O arrependimento eficaz ocorre quando o agente já esgotou os atos de execução, mas ainda não atingiu a consumação, em razão de ato praticado voluntariamente. Já o arrependimento posterior dá-se quando, já consumado o crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, o agente, por vontade própria, repara o dano ou restitui a coisa. 5. Crime Impossível: Crime impossível (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar- se o crime. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 5.1. Conceito Também conhecido como tentativa inidônea, impossível, inadequada ou quase crime, é a tentativa não punível, por que o agente se vale de meios absolutamente ineficazes ou volta-se contra objetos absolutamente impróprios, tornado impossível a consumação do crime (art. 17, CP). Exemplo: Atirar, para matar, contra cadáver (objeto absolutamente impróprio) ou atirar, para matar, como uma arma descarregada (meio absolutamente ineficaz) 5.2. Natureza jurídica Cuida-se de causa excludente de tipicidade 5.3 Teorias. Existem três teorias sobre a punição da tentativa inidônea: a) Teoria sintomática: o agente demonstrou periculosidade em seu atuar, deverá ser punido com imposição de medida de segurança, ainda que tenha se utilizado meio inidôneo ou investido contra objeto impróprio. b) Teoria subjetiva: considerando que o agente tinha intenção de praticar o delito, deverá ser punido pela pena correspondente à tentativa do crime. c) Teoria objetiva. O agente não é punido porque objetivamente não houve qualquer perigo de lesão ao objeto jurídico tutelado. Subdivide-se em teoria objetiva pura e teoria objetiva temperada. A teoria objetiva pura pouco importa sejam a ineficácia ou a impropriedade absoluta ou relativa, sendo o crime impossível. Por sua vez, a temperada somente haverá crime impossível se essas forem absolutas. Sendo relativas, haverá a tentativa. Nosso CP adotou a teoria objetiva temperada. OBSERVAÇÃO: A verificação sobre o caráter absoluto da ineficácia do meio ou da impropriedade do objeto deve ser feita caso a caso. Há situação que pode parecer inidônea, contudo pode revelar eficaz no fato concreto. Exemplos: Um indivíduo que, para matar um sujeito, coloca açúcar em sua bebida, sendo a vítima diabética. Cidadão aciona o gatilho de uma arma contra alguém que deseja matar, estando a arma totalmente desmuniciada, vindo a vítima a morrer, todavia por infarto causado pelo susto. Indicação Bibliográfica - Leia o Capítulo XXVI - Crime Consumado e Crime Tentado, do livro: BITENCOURT, Cezar Roberto.Tratado de Direito Penal, conforme plano de ensino. - Leia os art. 13, 14, 15, 16 e 17, todos do Código Penal.
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