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@MEDpelobem A síndrome de Cushing (SC) é um estado clínico, resultante da secreção excessiva, persistente e inapropriada de cortisol. Caracteriza-se pela perda do mecanismo de retroalimentação normal do eixo hipotálamo- hipófise adrenal e do ritmo circadiano da secreção do cortisol A síndrome de Cushing pode ser classificada em dois grandes grupos, de acordo com os níveis de ACTH circulante: síndrome de Cushing ACTH- dependente e ACTH-independente. Na síndrome de Cushing ACTH-independente, o cortisol é produzido de maneira autônoma pelo tecido adrenocortical, com consequente supressão dos níveis de ACTH e CRH A secreção de ACTH obedece ao ritmo circadiano apresentando valores máximos pela manhã e mínimos à meia-noite. Os pulsos secretores de ACTH são influenciados por estresse físico e emocional, e mediados pelo sistema nervoso central por meio do controle da secreção hipotalâmica do hormônio liberador de corticotropina (CRH). O CRH interage no corticotrofo através de receptor específico e ativa a adenil-ciclase, aumentando o conteúdo intracelular de AMP cíclico. A maioria dos pacientes com doença de Cushing apresenta um adenoma de células corticotróficas na sela túrcica. A secreção aumentada de ACTH é causada por uma resistência parcial aos efeitos supressivos dos glicocorticóides, o que gera um defeito na retrorregulação negativa, aumentando a secreção de ACTH. A SC, independentemente de sua etiologia, pode estar associada a diversas comorbidades, como hipertensão arterial sistêmica, infecções fúngicas, disglicemias, perda de massa óssea, nefrolitíase e alterações psiquiátricas. Uma das queixas mais frequentes é aumento de peso que se reflete por obesidade truncal, com o preenchimento das fossas supraclaviculares e da giba dorsal. @MEDpelobem A obesidade generalizada é rara em adulto e frequente em crianças. A gravidez é rara em pacientes com hipercortisolismo ACTH-dependente, ocorrendo geralmente associada a tumores adrenais A hipertensão arterial é um achado comum nos estados hipercortisolêmicos, acredita-se que possa ser resultante de excesso de mineralocorticóide por intensa ação do cortisol e do aumento do substrato da renina. Intolerância à glicose e hiperinsulinemia são comuns por causa do efeito do cortisol na gliconeogênese, A osteopenia e a osteoporose são manifestações esqueléticas frequentes, decorrentes do aumento da reabsorção óssea induzida pelo hipercortisolismo. A presença de exoftalmia ocorre por aumento de gordura retroorbitária. Estado clínico que apresenta algumas ou todas as características da síndrome de Cushing verdadeira, com evidências de hipercortisolismo laboratorial, mas com resolução completa após tratamento da condição primária. Esses achados podem aparecer particularmente em pacientes com doenças psiquiátricas (síndrome do pânico, ansiedade, crônica, psicoses e, principalmente, depressão) e no alcoolismo. Para auxiliar no diagnóstico diferencial entre pseudo-Cushing e síndrome de Cushing, realiza-se exames laboratoriais. O cortisol sérico e salivar à meia-noite, acima de 7,5 mcg/dL e > 0,13 @MEDpelobem mcg/dL, respectivamente, apresentam também alta sensibilidade e especificidade no diagnóstico diferencial entre pseudo-Cushing e síndrome de Cushing. Alguns pacientes com doença de Cushing podem exibir secreção cíclica do cortisol. O ritmo de ciclicidade pode variar de meses até anos. Essa dinâmica pode causar considerável dificuldade diagnóstica, e não raramente são necessárias reinvestigações em várias ocasiões para confirmação do hipercortisolismo. O PRIMEIRO PASSO consiste em demonstrar laboratorialmente a existência de um excesso de cortisol. Três testes são considerados de “primeira linha” com este intuito: 1) dosagem do cortisol livre na urina de 24h (CLU); ➢ O cortisol plasmático livre é a forma biologicamente ativa do hormônio, sendo normalmente eliminada na urina em pequena quantidade. ➢ O CLU reflete diretamente a quantidade de hormônio ativo que circulou ao longo de um dia! ➢ O valor de referência do CLU para ser considerado positivo deverá estar acima de três vezes o Limite Superior da Normalidade (LSN). ➢ Valores anormais, porém, < 3x o LSN, não são diagnósticos de síndrome de Cushing, sendo, na realidade, sugestivos de “pseudo-Cushing”. 2) Teste da supressão com dexametasona em dose baixa; ➢ O paciente toma 1 mg de dexametasona às 23h e mede o cortisol plasmático às 8-9h da manhã do dia seguinte, em jejum. Valores < 1,8 μg/dl (< 50 nmol/l) são “suprimidos” (normais), enquanto valores > 1,8 μg/dl (> 50 nmol/l) são “não suprimidos” (anormais). ➢ A função dexametasona é inibir a secreção de ACTH pela adeno-hipófise (reduzindo assim o cortisol plasmático). Se o cortisol não se reduz, ou há hipersecreção autônoma de ACTH (hipófise ou ectópica), não responsiva ao feedback negativo com dose baixa de glicocorticoide, ou há hiperprodução autônoma de cortisol pela adrenal. 3) dosagem do cortisol plasmático ou salivar à meia-noite. ➢ A secreção de cortisol tem seu nadir (valor mais baixo) pouco antes da hora em que a maioria das pessoas vai dormir (por volta de 23h). Em pessoas com a síndrome ele não acontece. @MEDpelobem ➢ Como o cortisol salivar também reflete diretamente os níveis de cortisol plasmático livre, poder ser coletado de forma muito menos incômoda. valores elevados (> 130 nmol/l) podem ser usados para demonstrar a presença de hipercortisolismo. Pelo menos dois dos três testes acima devem ser positivos, a fim de confirmar a existência de hipercortisolismo! Uma vez confirmado o hipercortisolismo: Descobrir a causa da síndrome de Cushing (diagnóstico etiológico). O grande divisor de águas num primeiro momento é a dosagem de ACTH plasmático! ➢ Um ACTH SUPRIMIDO aponta para o diagnóstico de patologia primária da suprarrenal. Solicita-se então uma tomografia computadorizada de abdome superior, com o intuito de visualizar as glândulas. Um tumor < 3 cm provavelmente é um adenoma, enquanto um tumor > 6 cm quase que com certeza representa um carcinoma! ➢ Um ACTH AUMENTADO aponta para o diagnóstico de patologia primária do eixo hipotálamo-hipófise, ou secreção ectópica de ACTH/CRH. Solicita-se então uma RNM da sela. túrcica, à procura de um adenoma hipofisário, ➢ O teste de Liddle 2 é um teste de supressão do ACTH realizado com doses bem mais altas de dexametasona (2 mg VO de 6/6h nas 48h que antecedem a coleta do cortisol plasmático matinal). Seu objetivo é diferenciar o corticotropinoma da secreção ectópica de ACTH Se a RNM de sela túrcica for normal, e não houver supressão do cortisol plasmático com o teste de Liddle 2, o provável diagnóstico é secreção ectópica de ACTH! o próximo exame a ser feito é a TC de tórax e abdome. Se este for normal, solicitaremos uma TC de pescoço (para avaliar o timo, outra fonte possível de tumor secretante de ACTH). Se for normal, tenta-se localizar o tumor com um octreoscan (cintilografia com octreotide marcado). O octreotide é um análogo sintético dasomatostatina, e os tumores neuroendócrinos possuem receptores para somatostatina (grande parte dos tumores que secretam ACTH são neuroendócrinos, como o de pulmão e os carcinoides) Por outro lado, se a RNM de sela túrcica for normal, mas o Liddle 2 suprimir o cortisol, provavelmente estaremos diante de um adenoma hipofisário extremamente pequeno, devendo-se empregar o cateterismo do seio petroso inferior! @MEDpelobem Assim compara-se o ACTH do sangue coletado por cateterismo com o ACTH do sangue coletado na periferia. Duas coletas devem ser realizadas. A primeira sem estímulo e a segunda após administração de CRH exógeno. Uma relação > 2 na primeira coleta (ou > 3 na coleta “estimulada”) confirma a existência de um tumor hipofisário. Caso o ACTH não se modifique após estímulo, estaremos diante de secreção ectópica de ACTH. OBS: Nas doenças primárias da suprarrenal, o ACTH não aumenta após estímulo com CRH. Já nas doenças primárias da hipófise (ex.: doença de Cushing) ocorre aumento EXAGERADO do ACTH. O tratamento de escolha é a ressecção transesfenoidal do corticotropinoma. Os resultados tendem a ser menos satisfatórios na presença de macroadenomas (pois neste caso com frequência há extensão suprasselar da lesão) bem como nos pacientes pediátricos (uma vez que a doença tem comportamento mais “agressivo” nesta faixa etária, com maior taxa de recidiva) Resolvido o hipercortisolismo, os sinais e sintomas da síndrome de Cushing melhoram num período entre 2-12 meses. Nos indivíduos cujo adenoma não pode ser localizado nos exames de imagem, está indicada a hemi-hipofisectomia do lado em que o gradiente ACTH central/periférico for maior! ➢ As principais complicações da cirurgia transesfenoidal são o pan-hipopituitarismo e o diabetes insipidus central, esta devido lesão da neuro-hipófise. Em casos de insucesso da cirurgia transesfenoidal ou recorrência do hipercortisolismo após um período de remissão, o tratamento clínico e/ou radioterápico ➢ Radioterapia: Pode ser empregada em casos de doença persistente, recidiva pós- operatória ou quando o risco cirúrgico for proibitivo. A resposta é lenta, podendo levar de 3-4 anos. ➢ Tratamento clínico: Para o tratamento clínico, estão incluídas as drogas que atuam na região OBS: Nas doenças primárias da suprarrenal, o ACTH não aumenta após estímulo com CRH. Já nas doenças primárias da hipófise (ex.: doença de Cushing) ocorre aumento EXAGERADO do ACTH @MEDpelobem hipotálamo-hipofisária, tais como: os anti- serotoninérgicos (cipro-heptadina), agonistas dopaminérgicos (bromocriptina e cabergolina), agonista gabaérgico (valproato de sódio) e análogos da somatostatina (octreotide). ➢ Pode-se optar por Adrenalectomia bilatera, que é uma opção mais radical para os casos de doença persistente após cirurgia e radioterapia. O paciente se torna definitivamente dependente da reposição exógena de glico e mineralocorticoide. Outra desvantagem é o risco de síndrome de Nelson (Trata-se do surgimento de um macroadenoma hipofisário localmente invasivo, que aparece em indivíduos submetidos à adrenalectomia bilateral.) ➢ Outra ação são inibidores da esteroidogênese adrenal, que são empregados no tratamento da doença de Cushing para o preparo pré- operatório de casos extremamente graves, e também enquanto se aguarda a resposta à radioterapia. As drogas mais utilizadas nos dias de hoje são: cetoconazol, metirapona ou mitotano, pela via oral, ou etomidado IV (infusão contínua) em baixas doses (não anestésicas). REFERÊNCIAS: MEDCURSO. Endocrinologia. Volume 2. medyklin editora, 2019. MARTINS, Mílton de Arruda, et al. Clínica médica: doenças endócrinas e metabólicas, doenças ósseas, doenças reumatológicas. Volume 5. Barueri, SP: Manole, 2009. OBS: O valproato, na dose de aproximadamente 1 g/dia, diminui as concentrações plasmáticas de ACTH em pacientes com síndrome de Nelson.
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