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DOCÊNCIA EM SAÚDE EDUCAÇÃO INCLUSIVA 1 Copyright © Portal Educação 2012 – Portal Educação Todos os direitos reservados R: Sete de setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 Internacional: +55 (67) 3303-4520 atendimento@portaleducacao.com.br – Campo Grande-MS Endereço Internet: http://www.portaleducacao.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil Triagem Organização LTDA ME Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 Portal Educação P842e Educação inclusiva / Portal Educação. - Campo Grande: Portal Educação, 2012. 204p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-8241-163-6 1. Educação inclusiva. 2. Igualdade na educação. I. Portal Educação. II. Título. CDD 371.9 2 SUMÁRIO 1 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: REFLEXÕES SOBRE A ESCOLA PARA TODOS ......................... 4 1.1 O MOVIMENTO PELA ESCOLA PARA TODOS ........................................................................ 6 1.2 PLURALIDADE CULTURAL, DIVERSIDADE, DIFERENÇA: QUESTÕES ÉTNICO- RACIAIS E QUESTÕES DE GÊNERO E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................ 14 2 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: PROCESSO HISTÓRICO E ATENÇÃO À PESSOA COMDEFICIÊNCIA NAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL ......................................................... 38 3 A POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA .................................................................................................................... 59 3.1 DEFICIÊNCIA AUDITIVA .......................................................................................................... 60 3.2 DEFICIÊNCIA FÍSICA ............................................................................................................... 60 3.3 DEFICIÊNCIA INTELECTUAL/MENTAL ................................................................................... 61 3.4 DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA ......................................................................................................... 61 3.5 SURDOCEGUEIRA ................................................................................................................... 62 3.6 SÍNDROME DE DOWN ............................................................................................................. 62 3.7 ALUNOS COM TRANSTORNO GLOBAL DE DESENVOLVIMENTO ....................................... 63 3.8 AUTISMO .................................................................................................................................. 63 3.9 TRANSTORNOS FUNCIONAIS ESPECÍFICOS ....................................................................... 63 3.10 TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM ...................................................................................... 63 4 QUAIS SÃO OS TIPOS DE TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM? .................................... 65 3 4.1 TRANSTORNO DA LEITURA ................................................................................................... 65 4.2 TRANSTORNO DA MATEMÁTICA ........................................................................................... 65 4.3 TRANSTORNO DA EXPRESSÃO ESCRITA ............................................................................ 66 5 ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO ............................................................... 73 6 A EDUCAÇÃO ESCOLAR DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA ................................................ 93 7 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E OS FUNDAMENTOS SUBSIDIÁRIOS AO TRABALHO DO PROFESSOR ............................................................................................................................... 110 7.1 E QUAL O SIGNIFICADO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS? .................................................. 126 8 APRENDIZAGEM E ADEQUAÇÕES PARA ACESSO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA AO CONHECIMENTO ........................................................................................................................ 147 8.1 APRENDIZAGEM: UM TEMA PARA REFLEXÃO .................................................................... 155 8.2 FUNÇÕES MENTAIS DA LINGUAGEM ................................................................................... 163 8.3 FLEXIBILIDADE CURRICULAR: UM ASSUNTO EM DEBATE ................................................ 167 8.4 ACESSO AO CURRÍCULO, ADEQUAÇÕES ........................................................................... 172 REFERÊNCIAS............... .................................................................................................................. 191 4 1 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: REFLEXÕES SOBRE A ESCOLA PARA TODOS A Pluralidade faz surgir um país feito a muitas mãos, onde todos juntos, vindo de tradições diversas, com distintas formas de arrumar o mundo, com inúmeras concepções do belo, conseguem criar uma comunidade plena da consciência da importância da participação de cada um na construção do bem comum. Todos podem ser diferentes, mas são absolutamente necessários. Só com esta união na diversidade se constrói um mundo novo [...]. (THEODORO, 2005, p. 83). Neste curso apresentamos reflexões sobre a educação inclusiva, especialmente aspectos relacionados à escola para todos, questões conceituais, a inclusão, a escola inclusiva e a sociedade inclusiva, priorizando, no entanto: Pluralidade cultural, diversidade, diferença: questões étnico-raciais e questões de gênero e a educação inclusiva, refletidas no movimento da escola para todos, considerando que: O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro da escola. Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume papel central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da lógica da exclusão. (BRASIL, 2008, p. 9). Com esses comentários foi introduzida a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), documento elaborado com o firme propósito de reposicionar a educação especial no País, bem como modificar e inserir nos Projetos Políticos Pedagógicos das escolas comuns as diretrizes norteadoras da implantação dessa Política, cujo 5 foco reside na oferta do atendimento educacional especializado de forma complementar e suplementar aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, identificados como alunado da educação especial, assunto tratado com maior especificidade durante o curso. A construção de uma sociedade inclusiva é um processo de fundamental importância para o desenvolvimento e a manutenção de um Estado democrático. Entende-se por inclusão a garantia, a todos, do acesso contínuo ao espaço comum da vida em sociedade, sociedade essa que deve estar orientada por ações de acolhimento à diversidade humana, de aceitação das diferençasindividuais, de esforço coletivo na equiparação de oportunidades de desenvolvimento, com qualidade, em todas as dimensões da vida (Diretrizes Nacionais de Educação Especial para Educação Básica (CNE, 2001, p. 13). Leia o trecho seguinte e identifique a alternativa correta: Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá- las, a) estamos delegando à escola o papel do enfrentamento independente do processo. b) a educação inclusiva deve assumir o papel do enfrentamento com o professor. c) a educação inclusiva atua como subsidiária ao enfrentamento e à superação. d) a escola, ao empoderar-se, não precisa fazer o enfrentamento à educação inclusiva. e) a educação inclusiva tem os mecanismos para a superação, basta o professor para o enfrentamento. 6 1.1 O MOVIMENTO PELA ESCOLA PARA TODOS A década de 90 impulsionou o assunto, com o discurso em defesa de Escola para Todos, originário de evento relacionado ao assunto ocorrido em Jomtien, Tailândia (1990), por meio do qual estiveram reunidos representantes da Educação dos Países da América Latina e do Caribe. Decorrente dos compromissos firmados pelos governos presentes, aconteceu a Conferência Mundial sobre “Necessidades Educativas Especiais”, (Salamanca, Espanha, 1994) e, o Fórum Consultivo Mundial: Educação para Todos: o Compromisso de Dakar (Dakar, Senegal, 2000). Apoiados nesses eventos, expandiram-se os propósitos da educação inclusiva que, além de outros países, no Brasil, deve ser implementada nas escolas com princípios condutores da inclusão escolar, no sentido de assegurar o direito de todas as crianças à educação, jovens e adultos, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas e outras (BRASIL, 1997a). Como princípios fundamentais e orientação à construção da escola integradora, conforme o texto da Declaração de Salamanca (1994): Todas as crianças de ambos os sexos, têm direito fundamental à educação e [...] a elas deve ser dada a oportunidade de obter e manter um nível aceitável de conhecimentos; Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhes são próprios; Os sistemas educativos devem ser projetados e os programas aplicados de modo que tenham em vista toda a gama dessas diferentes características e necessidades; As pessoas com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas comuns que deverão integrá-las numa pedagogia centralizada na criança, capaz de atender a essas necessidades; As escolas comuns, com essa orientação integradora, representam o meio mais eficaz de combater atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade integradora e dar educação para todos, além disso, proporcionam uma educação efetiva à maioria das crianças e melhoram a eficiência e, certamente, a relação custo-benefício de todo o sistema educativo (BRASIL, 1997, p. 10). 7 Em decorrência, a atenção à diversidade tem sido objeto de estudos e reflexões, especialmente pela constatação da necessidade das mudanças dos sistemas de ensino, das escolas e das práticas pedagógicas e outras tantas providências necessárias à viabilização do acesso e permanência com qualidade na escola, beneficiando a todos os alunos, O movimento em favor da inclusão escolar não seria uma novidade se continuasse reduzindo a diferença à identidade. O propósito desse movimento não é identificar e legitimar as diferenças, defendendo-as a partir de códigos, avaliações, hierarquizações, categorizações, que desencadeiam a segregação e a criação de grupos marcados por uma identidade. A inclusão se apoia na ideia de que somos iguais, porque diferimos uns dos outros e de que a diferença se diferencia infinitamente. Em uma palavra, a escola inclusiva assegura a igualdade entre os alunos diferentes e esse posicionamento lhes garante o direito à diferença na igualdade de direito à educação. (MANTOAN, 2010, p. 13). Com isso, modificando a situação de exclusão que exista no contexto educacional, com a consequente eliminação do preconceito que, além de seu efeito devastador da autoestima e dos relacionamentos, pode-se dizer que: O preconceito pode, contudo, ser entendido como uma atitude diante do outro, o que conduz o seu exame para o plano ético da vida concretamente vivida e não o da racionalidade científica. Sendo assim, pode-se dizer que são preconceituosas as afirmações e atitudes que, a despeito de cientificamente válidas, admitem a redutibilidade do outro como um atributo e, em consequência, a sua despersonificação, impondo-lhe o cárcere da tutela sem fim e, portanto, o seu exílio social. Esse é o caso das visões naturalistas que propiciam formas preconceituosas de inclusão. Afirmar que uma pessoa é deficiente, reconhecendo a irreversibilidade do mal que a acomete, é de partida, impor barreiras ao seu acolhimento, eximindo-se do compromisso de promover o seu desenvolvimento em conformidade as suas necessidades. Mas, ao mesmo tempo, é admiti-la como nosso refém. O preconceito é, assim, um dos sentidos-atos da palavra deficiência que admite a inclusão como um sequestro. (TUNES e BARTHOLO, 2008, p. 143). A educação inclusiva, então, tem sua história oriunda dos eventos e documentos internacionais, supramencionados, nos quais, governos mundiais assinaram acordos, sobretudo 8 relacionados à universalização da educação básica ofertada com qualidade, sem restrição de acesso, O movimento de inclusão escolar do deficiente tem um forte apelo social. Se for perguntado às pessoas se são ou não favoráveis à inclusão de pessoas deficientes no sistema regular de ensino, a grande maioria se mostrará favorável e as que se posicionarem contra causarão muita estranheza, ou seja, para a maioria, o processo de inclusão escolar é visto como bom em si mesmo. Todavia, uma reflexão mais atenta permitirá ver que os motivos e as finalidades do que se chama de inclusão podem ser os mais variados, ligando-se a diferentes maneiras de conceber a deficiência e nem sempre são justificáveis ou bons em si mesmos. Portanto, a tomada de posição requer que se conheça, antes, o porquê e o para quê do processo de inclusão. Somente assim torna-se possível uma compreensão das formas que se adotam ou que se deveriam adotar na sua implementação. Em outras palavras, o que se quer dizer é que há muitas formas de inclusão, algumas desejáveis, outras não. A cada pedagogia da inclusão articula-se um modo diferente de concepção de deficiência. (TUNES e BARTHOLO, 2008, p. 135). Ao mesmo tempo, a inclusão para ser bem-sucedida deve ter garantida a sua qualidade, e uma sólida cumplicidade entre todos os envolvidos com o processo que a direciona na escola, a fim de que os alunos, independentemente de suas condições tenham garantida sua permanência e o percurso com sucesso e satisfeitas suas necessidades básicas de aprendizagem, ressaltando-se no meio desses alunos, os que têm deficiência. Deficiência, de acordo com o Decreto n° 3.298/991, de 20/12/1999, incluindo as alterações apresentadas na redação do Decreto n° 5.2962, de 2004: 1 Regulamenta a Lei n° 7.853, de 24/10/89, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. 2 Regulamenta as Leis n° s 10.048, de 8/11/00, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19/12/00, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. 9Art. 3º - [...] considera-se: I - deficiência - toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; [...] Art. 4º - É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: [...] IV - deficiência mental - funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização dos recursos da comunidade; e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho; Em primeiro lugar porque, As reformas da política educativa, iniciadas na década de 1990, no tocante aos sistemas de ensino, têm encorajado que a educação dos alunos com necessidades educacionais especiais, no caso dos deficientes, aconteça, preferencialmente, nas salas de aulas comuns em escolas regulares. Isso posto, assiste-se a uma reconfiguração das modalidades de atendimento em serviço, as quais, ao serem disponibilizadas no sistema regular de ensino colocam a prerrogativa de comprovação de sua eficácia para o processo de escolarização, principalmente dos deficientes. (SILVA, 2008, p. 68). Sobre o uso de termo necessidades educacionais pelo qual se referem às pessoas com deficiência estão envolvidos outros grupos, com dificuldades de aprendizagem, embora para alguns autores é um termo que pode ser problematizado pelo seguinte: Em vez de focalizar a deficiência da pessoa [o termo] enfatiza o ensino e a escola, bem como as formas e as condições de aprendizagem; em vez de procurar, no aluno, a origem de um problema, defini-se pelo tipo de resposta educativa e de recursos e apoios que a escola deve proporcionar-lhe para que obtenha sucesso escolar, por fim, em vez de pressupor que o aluno deve ajustar-se a padrões de “normalidade” para aprender, aponta para a escola o desafio de ajustar-se para atender a diversidade de seus alunos. (BRASIL, 2001, p. 14). 10 Para Garcia (2006), esse termo da forma como foi proposto nos documentos oficiais reforça a visão funcionalista da deficiência, pela qual o aluno deve ajustar-se à sociedade e à escola e não o contrário como pressupõem as diretrizes da educação inclusiva. Enquanto que para Pletsch (2010, p. 80), [...] alunos com necessidades educacionais especiais são aqueles que apresentam dificuldades no processo de ensino-aprendizagem, podendo necessitar da mediação e do apoio de serviços especializados em períodos determinados, ou durante todo o percurso escolar, de forma a promover o seu desenvolvimento escolar, social e emocional. Portanto, reconhecendo que as expressões necessidades educacionais e educação inclusiva guardam um significado amplo [...] E, ainda, aliado a tudo isso, com o advento da Declaração de Salamanca (1994) foi advogado o conceito de escola integradora, que deve ser compreendida como aquela que acolhe, Crianças com deficiência e crianças bem dotadas; crianças que vivem nas ruas e que trabalham; crianças de populações nômades; crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos ou zonas desfavorecidos ou marginalizados. (BRASIL, 1997, p. 18). Tais reformas são oriundas de eventos voltados à discussão da educação na satisfação das necessidades básicas dos alunos, com os pressupostos da educação para todos, os quais poderão ser analisados na Declaração de Jomtien (TAILÂNDIA, 1990), As necessidades básicas de aprendizagem [...] compreendem tanto os instrumentos essenciais de aprendizagem [...] quanto o conteúdo que precisam os seres humanos para sobreviver, desenvolver plenamente suas capacidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, aprimorar a qualidade de sua vida, tomar decisões com informações suficientes e continuar a aprender. (BRASIL, 1990, Art. I, § I). 11 Por sua vez, a Declaração de Salamanca (1994), “cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem”. (BRASIL, 1997, p. 2). Enquanto isso, o Marco de Dakar (2000) em encontro avaliativo e propositivo apresenta (06) metas e (12) estratégias, as quais, [...] estabelecem um Marko de Ação destinado a permitir que todos os indivíduos realizem seu direito a aprender e cumpram sua responsabilidade de contribuir para o desenvolvimento de sua sociedade. Elas são de natureza global, formuladas a partir dos resultados dos congressos regionais da Educação para Todos e das metas internacionais de desenvolvimento com que os países já estão comprometidos. (BRASIL, 2000, p. 18). Pesquisadores como Pletsch (2010) e Bueno (2008) nos alertam para os rumos traçados à educação inclusiva pelas políticas públicas de educação, no que diz respeito, inclusive às contradições existentes no País, onde a exclusão ainda é predominante, sem contar que, nas escolas, os índices de fracasso escolar são alarmantes, Porém, com frequência esses índices são camuflados por meio da adoção de sistemas de ciclos, programas de aceleração, de progressão continuada ou projetos para “corrigir” a defasagem idade-série. Produzem os “excluídos no interior” da escola [...]. (PLETSCH, 2010, p. 74). Essa autora complementa seus comentários com o que diz Bueno (2004, p. 10) a esse respeito Permanecem e “progridem” nos graus escolares, mas que nada ou quase nada aprendem, sejam eles considerados com “necessidades educacionais especiais” ou deficientes, mas com certeza, membros das populações espoliadas pelos processos de pauperização crescente, fruto das políticas neoconservadoras que se disseminaram por todo o planeta. 12 Outros pesquisadores contribuem com seus comentários sobre a escola como produtora da exclusão, da seguinte forma: Não é apenas desse modo, contudo, que a escola promove a exclusão. Se ela tem prerrogativa de certificar quem está apto, tem também o poder de identificar quem é inepto. A desqualificação é o avesso da certificação de qualidade. Como um esforço de ação preventiva, a escola cunha na história do desenvolvimento intelectual de muitos jovens e crianças, mas não de todos, a marca da inépcia para o vir a ser o adulto, significando isso a profecia do autorrealizável da impossibilidade futura de uma vida social e profissional autônoma. Esse é o caso de um enorme contingente de crianças e jovens que compõem as estatísticas do chamado fracasso escolar. (TUNES e BARTHOLO, 2008, p. 133). Em um trabalho de pesquisa posterior, Bueno ainda apresenta suas críticas relacionadas à Declaração de Salamanca, primeiro levantando equívocos conceituais cometidos pelos órgãos oficiais, na tradução do documento, e por outro lado, dizendo: A declaração simplesmente reconhece que as políticas educacionais de todo o mundo fracassaram no sentido de estender a todas as suas crianças a educação obrigatória e de que é preciso modificar tanto as políticas quanto as práticas escolares sedimentadas na perspectiva da homogeneidade do alunado, mas isto parece ficar obscurecido. Por outro lado, ao se colocar a educação inclusiva como um novo paradigma, esconde-se que, desde há décadas, a inserção escolar de determinados tipos de alunos com deficiência já vinha ocorrendo, de forma gradativa e pouco estruturada, em especial para crianças oriundas de estratos sociais superiores, sob a batuta de profissionais da saúde (médicos, psicólogos, fonoaudiólogos, etc.) e incorporados pela rede privada de ensino regular. Mas, mesmo entre alunos das redes públicas assistenciais de educação especial, osprocessos de inserção de alunos deficientes no ensino regular começaram muito antes das reformas educacionais da década de 90, em cujo bojo surgiu a bandeira da inclusão escolar. (BUENO, 2008, p. 46). O próprio Instituto Nacional de Educação e Pesquisa (INEP) ressalta o seguinte: Os números são “preocupantes”, uma vez que ler uma bula de remédio e identificar seu próprio ativo, calcular juros de um carnê numa compra e prestações, ler o manual de um eletrodoméstico ou de um equipamento de trabalho, além de outras 13 atividades [...] exigem uma gama de informações que seriam de responsabilidade da própria escola. (BRASIL, 2004, p. 39). Bueno, ainda nos diz sobre os índices de escolarização apontados no País, com resultados numéricos problemáticos, evidenciando o baixo nível de aprendizagem escolar dos alunos com deficiência, cuja culpa pela não aprendizagem, na maioria das vezes recai sobre o próprio aluno, os quais não estão sozinhos nessa situação, [...] parece ser ingênuo o espanto de muitos profissionais, estudantes e acadêmicos da educação especial frente aos resultados escolares extremamente baixos alcançados por alunos deficientes, em particular aqueles oriundos das camadas populares, inseridos ou não em classes regulares, como se eles refletissem situação muito diferente de seus pares não deficientes. Entretanto, a simples constatação de que esses baixos resultados não atingem somente esses alunos, mas também muitos outros, considerados “não deficientes”, não basta, porque pode redundar numa visão estreita, de responsabilização das escolas e dos professores por esses baixos resultados. (BUENO, 2008, p. 47 e 48). O trecho “A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro da escola.” Quer dizer que: a) igualdade e diferença andam juntas. b) são ideias divergentes. c) a igualdade é insubstituível. d) ao tratarmos da diferença não necessariamente precisamos pensar na igualdade. e) que diferença é um construto da desigualdade. 14 1.2 PLURALIDADE CULTURAL, DIVERSIDADE, DIFERENÇA: QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS E QUESTÕES DE GÊNERO E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA Com o compromisso assumido pelos governos de implementarem a educação inclusiva, os sistemas de ensino devem organizar seus atos normativos e orientativos, com vistas à oferta de uma educação valiosa nos aspectos cognitivos e práticos. Neste item, estaremos discutindo as diferentes relações e os desafios para o enfrentamento à exclusão dos diferentes grupos por questões étnico-raciais ou de gêneros, considerando os pressupostos da educação para todos, conciliados com os princípios e diretrizes da educação inclusiva. E, ainda, considerando que estamos imersos em uma sociedade plural e desigual, por isso nossa próxima reflexão: A pluralidade cultural existente no Brasil é fruto de um longo processo histórico de interação entre aspectos políticos e econômicos, no plano nacional e internacional. Esse processo apresenta-se como uma construção cultural brasileira altamente complexa, historicamente definida e redefinida continuamente em termos nacionais, apresentando características regionais e locais. Coexistem aqui culturas singulares, ligadas a identidades de origem de diferentes grupos étnicos e culturais. Essa composição cultural tem se caracterizado por plasticidade e permeabilidade, incorporando em seu cotidiano a criação e recriação das culturas de todos esses povos, sem diluí-las, ao mesmo tempo em que permite seu entrelaçamento. Nesse entrelaçamento de influências recíprocas, configura-se a permanente elaboração e redefinição da identidade nacional, em sua complexidade. (BRASIL, 1997a, v. 10. p. 28). Por sua vez, a desigualdade pode ser analisada pelas práticas escolares ou sociais, diante dos grupos sociais desfavorecidos ou envolvidos por estigmas construídos de alguma forma na própria sociedade, É bastante comum que em relação ao aluno proveniente das camadas economicamente menos favorecidas se desenvolva uma expectativa de desempenho baixo. Também a criança e o adolescente provenientes de grupos étnicos socialmente discriminados recebem o mesmo tipo de tratamento. A desigualdade 15 traduzida na situação de pobreza, seja a favelização em áreas urbanas, seja o filho de trabalhadores rurais em condições precárias, seja, ainda, a dificuldade de adaptação do filho do migrante, lamentavelmente tem sido um estigma para muitas crianças na escola. (op. cit. p. 32). Por tudo isso, diante dos quadros que nos mostram o quanto a escola precisa evoluir na formação de seus alunos por uma sociedade justa e mais acolhedora, podemos entender muito mais ainda, que esse tema, pluralidade cultural. [...] permite a explicitação dos direitos da criança e do adolescente referentes ao respeito e à valorização de suas origens culturais, sem qualquer discriminação. Exige do professor atitudes compatíveis com uma postura ética que valoriza a dignidade, a justiça, a igualdade e a liberdade. Exige, também, a compreensão de que o pleno exercício da cidadania envolve direitos e responsabilidades de cada um para consigo mesmo e para com os demais, assim como direitos coletivos. Traz, para os conteúdos relevantes no conhecimento do Brasil, aquilo que diz respeito à complexidade da sociedade brasileira; sua riqueza cultural e suas contradições sociais. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 51). Somos diferentes, sujeitos culturais, históricos e sociais. A diversidade vista na escola como um dado da realidade humana, conduz ao entendimento e à valorização das diferenças entre as pessoas e à desconstrução dos mecanismos que promovem as desigualdades, Num mundo que tende cada vez mais à globalização no plano econômico da qual é ainda desconhecido o conjunto dos efeitos sociais, é importante perceber o incessante processo de reposição das diferenças e o surgimento das etnicidades. De um lado, esse processo ensina que o fato das culturas viverem dinâmicas que resultam em sua modificação constante não quer dizer que o sentido da mudança seja único, e conduza fatalmente ao modelo de desenvolvimento dominante. De outro, apresenta com clareza a necessidade de construção de valores e novas práticas de relação social que permitam o reconhecimento e a valorização da existência das diferenças étnicas e culturais, e a superação da relação de dominação e exclusão – ao mesmo tempo em que se constitui a solidariedade. (Op. cit. p. 36). 16 Dessa forma, o tema diversidade deverá constar no Projeto Político Pedagógico, contribuindo para a manutenção de um currículo culturalmente valioso. Com isso, buscar um diálogo com outros momentos da história cujas manifestações de poder estiveram sempre ligadas à violência, à exclusão, como pode ser visto em episódios referentes à colonização, à inquisição, às cruzadas, à escravidão e outros. Como se pode ver, a história do continente americano, após o “mau encontro” com os colonizadores europeus, é uma história marcada por conflitos étnicos. Esses vão agravar-se, já no final do século XX e início do atual, com a chegada de novas levas de imigrantes europeus e asiáticos. Ainda que os contatos prolongados entre diferentes etnias tenham gerado, em alguns países mais que em outros, um significativo processo de miscigenação, o próprio desenvolvimento dessas sociedades, com forte herança escravista, não consegue eliminar as barreiras sociais, nem os preconceitos raciais. (GONÇALVES e SILVA, 2006, p. 20 e 21). Na opinião de Osório (2005), a escravidão a que o homem encontra-se submetido estabelece-se em seu meiosocial, onde convive com processos de constante seletividade, do nascimento até a morte. E isso, envolve a marca cultural de sua raça, cor, gênero, as formas de interesse das relações de produção em que se insere. No seu próprio meio cultural, o homem é definido como incluído ou excluído de sua própria existência, sob a tutela do estado e dos diferentes grupos sociais, no contexto da diversidade que os engendra. No movimento negro brasileiro, pode-se observar também uma diversidade ou, mais precisamente, uma dualidade entre cultura e política, por meio da qual os militantes buscam construir sua identidade. Esse movimento nunca desenvolveu um projeto separatista [...]. Entretanto suas estratificações internas comportam também clivagens que passam pelos grupos de mulheres negras reivindicando sua especificidade, pelas organizações religiosas e pelos engajamentos políticos, seja de direita, de esquerda, ou de centro. (op. cit. 2006, p. 33). Neste curso, entretanto, priorizamos questões étnico-raciais e de gênero, como elementos constitutivos da diversidade e da realidade humana, cuja identidade e importância 17 remetem à construção e à aquisição do conhecimento para a conquista da cidadania, portanto, categorias necessárias na formação, na valorização e nas relações entre as pessoas. A defesa de uma sociedade justa e sem discriminação, cada dia mais, tem sido uma colocação central dos discursos pronunciados pelos dirigentes e líderes dos mais variados segmentos da sociedade. A construção de um tecido teórico sobre a justiça social no mundo, refletindo-se no Brasil, também tem sido objeto dos debates, reflexões, produções intelectuais e populares de hoje, com grande ênfase na qualidade de vida, meio ambiente, desenvolvimento sustentável, conquista de paz e felicidade, visando um futuro melhor para esta sociedade, historicamente organizada com base na dominação de pequenos grupos e nas desigualdades estabelecidas, onde se localiza, com grande visibilidade, as diferenças nas relações de gênero, apesar dos avanços que vêm sendo observados. (TEIXEIRA, 2003, p. 181). Para Moura (2005, p. 69), esse assunto reveste-se de tamanha necessidade como pauta de conteúdos a serem priorizados nas unidades escolares, embora deva-se reconhecer que, ao mesmo tempo, representa, Um desafio desenvolver, na escola, novos espaços pedagógicos que propiciem a valorização das múltiplas identidades que integram a identidade do povo brasileiro, por meio de um currículo que leve o aluno a conhecer suas origens e a se reconhecer como brasileiro [...]. Por esse motivo, ao discorrer sobre o tema proposto para este curso, enfatizamos o quanto é importante contarmos com uma formação que nos oriente às mudanças de conceitos, especialmente quando se trata de eliminarmos preconceitos, cujos efeitos podem ser perniciosos para o crescimento da pessoa, e, ao mesmo tempo, como impeditivo de seu progresso em todos os campos da aprendizagem, ainda mais que, [...] negros, índios e minorias étnicas em geral começam a detonar os critérios que os classificam como naturalmente inferiores aos grupos étnicos dominantes. Os achados culturalistas vão inspirar os movimentos de mulheres, em várias partes do mundo, contra a suposta supremacia natural dos homens. O mesmo vai ocorrer com os homossexuais, que passam a produzir novas imagens de si mesmos e a combater, por vias judiciais, preconceitos com relação a seu comportamento sexual. 18 Enfim, motivados por uma leitura mais questionadora da diversidade humana, os grupos culturalmente dominados buscam conquistar, paulatinamente, sua emancipação, abandonando os valores culturais que os oprimem. Pouco a pouco, o caráter étnico do multiculturalismo vai cedendo espaço para outros aspectos de dominação cultural. (GONÇALVES e SILVA, 2006, p. 24). Importa, com tudo isso, a necessidade de construirmos uma convivência de paz, solidariedade e respeito na sociedade e mais ainda, nos espaços escolares. Ao mesmo tempo em que nossa miscigenização e pluralidade étnica se transformam em magníficas metáforas e alegorias literárias, negros, índios e mestiços vivem a mais brutal discriminação em todos os lugares em que vivem, seja no campo ou nos centros urbanos. Estranho jogo esse em que os diferentes são, a um só tempo, objeto de exaltação e de exclusão. (op. cit. 2006, p. 68). Em sua própria defesa, porém, grupos são organizados e solidarizam-se para o enfrentamento das desigualdades produzidas no interior da sociedade e na luta pela preservação e respeito às identidades, bem como no sentido de sobreviverem frente às novas orientações culturais. Nesse contexto, as mulheres negras deram uma contribuição muito significativa para democratizar as relações de poder no interior do próprio movimento. Inicialmente, solidarizam-se com a luta das mulheres, em geral, denunciando a supremacia masculina, inclusive a dos seus companheiros negros. Em seguida, reavaliam sua própria inserção nos movimentos de mulheres, pois não veem ali contempladas sua particularidade étnica. Ser branca, ser negra ou mestiça faz uma diferença muito grande em uma sociedade que se habituou a ver os afrodescendentes como serviçais dos brancos e objetos sexuais de seus patrões. (op. cit. 2006, p. 89) Tudo isso sugere outros investimentos por parte das escolas para as necessárias transformações que propiciem, além de um espaço aberto à pluralidade, a remoção de barreiras para a aprendizagem num ambiente rico de conhecimentos e livre de atitudes excludentes e preconceituosas. Daí a importância dos estudos sobre a Pluralidade cultural, a qual, 19 [...] quer dizer a afirmação da diversidade como traço fundamental na construção de uma identidade nacional que se opõe e repõe permanentemente, e o fato é que a humanidade de todos se manifesta em formas concretas e diversas de ser humano. (BRASIL, 1997a, p. 19). Dessa forma, cabe dizer que a pluralidade cultural como afirmação da diversidade reúne, ao mesmo tempo, as diferenças e as diversidades. [...] diversidade é uma dinâmica cultural que existe a partir da diferença no seu devido lugar, por isso não é sinônimo de diferença, que é um conceito que existe na natureza das coisas vivas, existe em qualquer forma viva, mas não contempla valor e definição nas relações. (PEREIRA, 2009, p. 9). Pela necessidade de compreensão conceitual e relacional, a escola deve reconhecer os inúmeros desafios que terá que enfrentar, no sentido de se apropriar de situações diversas entre seu alunado e, tendo em vista a pluralidade cultural que a compõe, isso, considerando a multiplicidade e as diferentes presenças que a frequentam, A escola possui a vantagem de ser uma das instituições sociais em que é possível o encontro das diferentes presenças. Ela é também um espaço sociocultural marcado por símbolos, rituais e crenças, culturas e valores diversos. Essas possibilidades do espaço educativo escolar precisam ser vistas na sua riqueza, no seu fascínio. Sendo assim, a questão da diversidade cultural na escola deveria ser vista no que de mais fascinante ela proporciona às relações. (GOMES, 2010, p. 01). Tais presenças envolvidas com questões diversas, como de gênero, raça, sexualidade, classe social religião, cultura, diferentes situações chamadas de minorias, diferenças regionais, implicados com a diversidade e a diferença. 20 [...] o diferente e a diferença são partes da descoberta de um sentimento que, armado pelos símbolos da cultura, nos diz que nem tudo é o que eu sou e nem todos são como eu sou. Mais que as diferenças o que está em jogo é a imensa diversidade que nos informa é o que nos constitui como sujeitos de uma relação de alteridade. A alteridade revela-se no fato de que o que eu sou e o outro é nãose faz de modo linear e único, porém constitui um jogo de imagens múltiplo e diverso. Saber o que eu sou e o que o outro é depende de quem eu sou, do que acredito que sou, com quem vivo e porquê. (BRANDÃO, 1986, p. 7, apud PEREIRA, 2009, grifo do autor). Com isso, a elaboração e operacionalização do seu Projeto Político Pedagógico, no qual deve haver um compromisso com a educação inclusiva e, concomitantemente o respeito à diversidade humana, assunto que merece ser disseminado no processo ensino-aprendizagem, pois diz respeito a uma realidade subjacente aos princípios da vida. Ao mesmo tempo em que é um assunto abrangido pela temática pluralidade cultural, ressaltada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, ao qual, comporta uma ampliação de horizontes para o professor e para o aluno, uma abertura para a consciência de que a realidade em que vivem é apenas parte de um mundo complexo, fascinante e desafiador, na qual o elemento universal subjacente e definidor das relações intersociais e interpessoais deve ser a Ética. Propicia, ainda, a percepção de que essa característica sociocultural é a expressão de uma pluralidade dinâmica para além das fronteiras do Brasil, a qual tem sido benéfica e estimuladora na definição de valores universais. (BRASIL, v. 10, 1997a, p. 19). À escola cabe acompanhar essa realidade, observando a vivência escolar na diversidade, seu reconhecimento e o exercício das relações entre as pessoas que vivem e transitam no mesmo espaço escolar, tendo em vista ser este espaço um local de múltiplas relações sociais, numa dinâmica sociocultural, onde as diferentes presenças se encontram, e, com isso, promovem o reconhecimento entre si e se confundem, produzindo a riqueza da cultura brasileira. Coexistem aqui culturas singulares, ligadas a identidades de origem de diferentes grupos étnicos e culturais. Essa composição cultural tem se caracterizado por plasticidade e permeabilidade, incorporando em seu cotidiano a criação e recriação das culturas de todos esses povos, sem diluí-las, ao mesmo tempo em que permite seu entrelaçamento. Nesse entrelaçamento de influências recíprocas, configura-se a 21 permanente elaboração e redefinição da identidade nacional, em sua complexidade. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 28 e 29). Mas qual o significado da diversidade? Como entender esse conceito? Pelo que consta em Ferreira (2000), diversidade significa: diferente, distinto, vário, variado. No dicionário Koogan/Houaiss (1998), diversidade tem o mesmo significado que: “caráter que distingue um ser do outro, ser, uma coisa de outra coisa”. Nosso País é expressivamente marcado pela diversidade, manifestada pelos diferentes grupos e suas relações e manifestações, que podem ser vistas pelas, [...] diferentes características regionais, diferentes manifestações de cosmologias que ordenam de maneiras diferenciadas a apreensão do mundo, formas diversas de organização social nos diferentes grupos e regiões, multiplicidade de modos de relação com a natureza, de vivência do sagrado e de sua relação com o profano. O campo e a cidade propiciam as suas populações vivências e respostas culturais muito diferenciadas que implicam ritmos de vida, ensinamentos e valores e formas de solidariedade distintas. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 29 e 30). Diversidade não diz respeito somente ao reconhecimento do outro, mas significa pensar a relação entre o eu e o outro. Considerar o outro é manter o foco de atenção sobre o próprio grupo, mergulhado na sua história, no seu povo. Semelhanças e diferenças são continuamente lembradas nas relações, e, são marcas presentes nas definições dos valores sociais, [...] determinadas “minorias”, identificadas por fatores relativos à classe social, gênero, etnia, sexualidade, religião, idade, linguagem, têm sido definidas, desvalorizadas e discriminadas por representarem “o outro”, “o diferente”, “o inferior”. Diferenças, portanto, têm sido permanentemente produzidas e preservadas por meio das relações de poder. (MOREIRA, 2003, p. 155). 22 Dessa forma, falar da diversidade como uma necessidade imperiosa de contrapor à lógica da homogeneização que, por longos, prevaleceram na escola brasileira, contribuindo para promover a exclusão, acentuar os estigmas e a prevalência das injustiças sociais, aspectos comprometedores da cidadania. A homogeneidade e a ideia de um Brasil sem diferenças, caracterizado pela uniformidade cultural, contribuíram para a neutralização das diferenças culturais e, ao mesmo tempo, para manter a subordinação de uma cultura a outra, ignorando, minimizando ou silenciando as diferenças que compõem a diversidade na escola, marcando profunda e, negativamente, a história da escola no Brasil. De outra forma poderiam estar contribuindo para o enriquecimento para sua cultura e para o engrandecimento da população brasileira. (BRASIL, 1997a). No entendimento de Rodrigues (2003, p. 15), Na lógica da homogeneidade, a escola tradicional procedia de acordo com as ideias de nível de uniformidade, obrigando que os alunos se adaptassem às exigências do sistema. Propondo um ensino igual para todos, porque todos são iguais, a escola marginalizava e segregava liminarmente aqueles que apareciam como diferentes. Com tal predominância de atitudes e exigências, a igualdade funcionava muito mais como uniformização, diferentemente do que preconiza a atenção à diversidade, cujos preceitos identificam a igualdade como uma forma de se valorizar e respeitar as diferenças e as necessidades individuais, com a devida atenção às potencialidades de cada aluno, aos ritmos e às características, no momento em que a aprendizagem deve ter como centro, o aluno. (BRASIL, 1997a, v. 10). Que discussões permeiam a diversidade na sociedade, na escola, enfim, a escola contém orientações para desenvolver seu trabalho pautado na perspectiva da diversidade? Nos documentos oficiais constam proposições a esse respeito, contemplando orientações à Educação Infantil, ao Ensino Fundamental e ao sistema de ensino como um todo, no País, com base nos seguintes princípios: garantia do respeito às diversidades culturais, regionais, étnicas, religiosas e políticas, considerando-se a multiplicidade e a complexidade da 23 sociedade brasileira, legando à educação a responsabilidade de atuar incisivamente no processo de construção da cidadania, sustentada na igualdade de direitos e nos princípios democráticos. E, ainda, tendo hoje, a educação inclusiva como foco. Tratar da diversidade cultural, reconhecendo-a e valorizando-a, e da superação das discriminações é atuar sobre um dos mecanismos de exclusão – tarefa necessária, ainda que insuficiente, para caminhar na direção de uma sociedade mais plenamente democrática. É um imperativo do trabalho educativo voltado para a cidadania, uma vez que tanto a desvalorização cultural – traço bem característico de país colonizado – quanto a discriminação são entraves à plenitude da cidadania para todos; portanto, para a própria nação. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 21). Existe recomendação nos referidos documentos oficiais, que seja priorizado um currículo adequado à promoção da cidadania, no qual a diversidade conquiste e garanta um espaço e significados especiais, mantendo o aluno na convivência democrática e no aprendizado entre os diferentes grupos e comunidades étnicas e culturais e sua própria vida, o que permitirá a consolidação de seus direitos e cumprimento de seus deveres para consigo e para com o próximo. (BRASIL, 1997a, v. 10). O trabalho pedagógico do professor também foi evidenciado, o qual deve voltar-se à valorização das potencialidades e das especificidades dos alunos, conjugando, além dos conhecimentos teóricos como suporte, atitudes reflexivas e cooperativas, compartilhadas, comenfoque dialógico ao longo do processo educacional. [...] a estratégia pedagógica necessária aos processos de ensino-aprendizagem tem seus alicerces nas relações com a utilização plena do diálogo no trabalho compartilhado. O diálogo é o cerne da relação na aprendizagem, em que as partes envolvidas fazem trocas e negociam os diferentes significados do objeto do conhecimento, o que dá relevância ao papel ativo e altamente reflexivo, emocional e criativo do aluno e do professor. O conhecimento, assim, distancia-se de uma perspectiva mecanicista ou cognitivista que enfatiza quase que exclusivamente o produto da aprendizagem, ficando entendido como uma dinâmica que se constrói na confluência dialética entre o individual e o social, tendo em vista o desenvolvimento integral dos sujeitos envolvidos na educação. Alunos cada vez mais interessados, participativos, reflexivos e cooperativos (características sempre apreciadas) só podem ser encontrados em um ambiente interativo cuja comunicação seja 24 estimulada e estruturada dentro de relações de confiança entre todos. Para isso, estratégias pedagógicas só podem ser aquelas que possibilitem essas relações entre pessoas e entre elas e o conhecimento. (TACCA, 2008, p. 51). Além da atenção aos seguintes fatores que são próprios de cada aluno: interesses, motivações, além da observância aos fatores sociais, culturais e à história educativa de cada aluno, entendida, ainda, a diversidade no plano geral da organização social, demográfica e outros fatores da sociedade. Nesse sentido, Lopes (2005, p. 189), invoca o apoio aos professores para o melhor desenvolvimento do seu trabalho e aos alunos para sua formação geral e de apreensão de valores necessários, A educação escolar deve ajudar professor e alunos a compreenderem que a diferença entre pessoas, povos e nações é saudável e enriquecedora; que é preciso valorizá-la para garantir a democracia que, entre outros, significa respeito pelas pessoas e nações tais como são com suas características próprias e individualizadoras; que buscar soluções e fazê-las vigorar é uma questão de direitos humanos e cidadania. Mesmo com a evolução e mudanças identificadas pelos movimentos organizados em defesa da escola para todos, pelos quais a educação inclusiva tem sido o foco do debate, ainda precisamos esclarecer nesse contexto, e defender como necessário, o reconhecimento da diversidade e da diferença, de maneira a evitar equívocos com as finalidades das propostas encaminhadas a esse respeito. Tacca (2008, p. 67), fala da importância dos cursos de formação de professores incorporarem, além de outros conhecimentos importantes, Uma prática reflexiva em relação ao conhecimento, ao aluno, ao contexto vivido e em relação a ele próprio, enquanto sujeito e profissional. Nessa perspectiva, os cursos de formação de professores, poderiam contemplar menos teorias desconectadas com a realidade do professor e, principalmente, menor número de treinamentos em métodos e técnicas de ensino, para considerar mais de perto a formação e 25 instrumentalização do professor em termos de uma reflexão pedagógica que o leve a pensar no valor das relações sociais para o processo de ensinar e aprender, o que pede que ele exerça sua autonomia enquanto profissional. Isso significa saber identificar como colocar em prática o objetivo maior da educação, ou seja, o desenvolvimento humano no contexto social em que vivemos. Ainda são confundidos os propósitos da educação inclusiva como se fosse voltada apenas à inclusão de pessoas com deficiência nas escolas. Sobre esse assunto, pesquisadores como Bueno (2008, p. 49 e 50) [...] as crianças deficientes são apenas uma, entre tantas outras, das expressões concretas das chamadas necessidades educacionais especiais. Tanto assim é que, em nenhum momento aparece no texto original da Declaração o termo “educação especial” como a responsável pelas políticas de integração/inclusão escolar. Com isto, fica claro que o termo “necessidades educativas especiais” abrange, com certeza, a população deficiente, mas não se restringe somente a ela. Atitudes excludentes existem por outras condições, requerendo retomada do que já existe por forças de recomendações constitucionais, pela Carta Magna (1988), por onde podemos entender os pressupostos direcionados à eliminação de ações discriminatórias, à adoção de mecanismos de proteção e de promoção de identidades étnicas, garantindo a todos o pleno exercício dos direitos culturais, bem como o apoio, o incentivo e a valorização da difusão cultural. O enfrentamento às desigualdades sociais, à pobreza, à violação dos direitos humanos - quando vivenciado no cotidiano da maioria das cidades do mundo – impõe que repensemos as bases das políticas de cultura e do seu papel na transformação desse quadro de exclusão que marginaliza mais de um bilhão de pessoas do consumo e do acesso aos códigos da modernidade. Políticas democráticas e inclusivas que levem em conta a variedade e demandas da população, e que propiciem a convivência dessas multiplicidades étnicas, religiosas, de tradições, gostos e sensibilidades, incluindo na agenda de prioridades o combate à pobreza e a todas as formas de discriminação social e política. Uma política cultural exercida a partir da ideia dos direitos e da construção de valores sólidos de cidadania participativa, que nos permita maior capacidade de discernimento, crítica e desenvolvimento social e humano. (PORTO, 2003, p. 202). 26 A escola tem um papel significativo nesse processo. Em primeiro lugar, porque é o espaço em que se dá a convergência entre as crianças de origens culturais e nível socioeconômico diferentes, com diversos costumes e crenças religiosas, visões diversas de mundo, mesmo compartilhadas em famílias. Em segundo lugar, porque, formalmente, a sociedade define a escola como instituição especializada em dar acesso, às crianças, aos conhecimentos sistematizados sobre o País e o mundo. A realidade plural de um país como o Brasil fornece subsídios para debates e discussões em torno de questões sociais. A criança, na escola convive com a diversidade e poderá aprender com ela. (BRASIL, 1997a, p. 23). No texto da Declaração de Salamanca (1994), ao falar da educação inclusiva (integrada, no texto original), além de destacar a pessoa com deficiência como merecedora das mudanças, nos sistemas de ensino para efetivação do acesso e permanência na escola com sucesso, destacou alguns grupos que, por seus traços sociais carregam consigo a complexidade das múltiplas relações sociais. Se, por um lado, desde a Declaração, a ênfase se volta para a adoção de políticas e de práticas educacionais que permitam a inclusão da maior diversidade de alunos, por outro, não se pode deixar de lado o fato de que ela é derivada da preocupação com a chamada “escola para todos”, cujo marco maior foi a Declaração de Jomtien, que teve por finalidade precípua estabelecer princípios, diretrizes e marcos de ação para que todas as crianças do mundo pudessem ter satisfeitas as “necessidades básicas de aprendizagem”. (BUENO, 2008, p. 46 e 47). Por esse motivo, a escola é invocada a assumir a liderança do debate para o alcance de tais propósitos, construindo um diálogo de parceria e cumplicidade, pela formação cidadã de seus alunos. É evidente que, A escola, como parte integrante dessa sociedade que se sabe preconceituosa e discriminadora, mas que reconhece que é hora de mudar, está comprometida com essa necessidade de mudança e precisa ser um espaço de aprendizagem onde as transformações devem começar a ocorrer de modo planejado e realizado coletivamente por todos os envolvidos, de modo consciente. (LOPES, 2005, p. 189). 27 Com essa introdução, inserimos nessa reflexão, questões de gêneroe étnico-raciais, no meio das quais ficam evidenciados, por intermédio das lutas empreendidas pelos seus direitos sociais, dentre outros, mulheres e negros, segmentos, em sua maioria, vulnerabilizados e fragilizados nas mais diversas circunstâncias de vida. a) Questões de gênero Motivos pelos quais, recomendações surgiram para o saneamento de tais condições, oriundas da Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, realizada em Salamanca (ESPANHA, 1994, apud, BRASIL, 1997a), e, ainda em reunião da Cúpula Mundial de Educação, ocorrida nos dias 26 a 28 de abril de 2000 (Dakar), de onde foi originado o Marco de Ação de Dakar – Educação para Todos: Atingindo nossos Compromissos Coletivos. De tais eventos, várias definições e prioridades foram alinhadas, incluindo as questões de gênero como assunto prioritário e emergente: [...] - Garantir que em 2015 todas as crianças, especialmente meninas, crianças em situações difíceis e crianças pertencentes a minorias étnicas, tenham acesso à educação primária de boa qualidade, gratuita e obrigatória, e possibilidade de completá-la. (p. 18). - Atingir, em 2015, 50% de melhora nos níveis de alfabetização de adultos, especialmente para as mulheres, e igualdade de acesso à educação fundamental e permanente para todos os adultos. (p. 19). - Eliminar, até 2015, as disparidades existentes entre os gêneros na educação primária e secundária, e, até 2015, atingir a igualdade de gênero em educação, concentrando esforços para garantir que as meninas tenham pleno acesso, em igualdade de condições, à educação fundamental de boa qualidade e que consigam completá-la. (p. 20). (UNESCO, apud BRASIL, 2000, p. 18 a 20). Essas metas e estratégias para a devida operacionalização constituem o Marko de Ação de Dakar (Dakar, 2000), documento resultante de reunião avaliativa do alcance dos propósitos da educação para todos, instituídos em Jomtien (Tailândia, 1990). Mediante o ato avaliativo (2000) foi identificado que “(II) perto de 113 milhões de crianças, das quais são meninas, não têm acesso “a escola primária; pelo menos 880 milhões de adultos são analfabetos, a maioria de mulheres.” (BRASIL, 2000, p. 14). 28 A cada dia crescem movimentos de luta em defesa de uma sociedade justa e sem discriminação. A busca pela justiça social, meio ambiente, desenvolvimento sustentável, pela paz, felicidade e melhor qualidade de vida, resumem-se em ações materializadas pelas mulheres, visando à conquista de um mundo melhor e pelo enfrentamento às fragilidades a que foram submetidas por práticas influenciadas pela desigualdade justificada por questões de gênero. [...] as mulheres entram nos sistemas simbólicos masculinos no momento em que esses estão se mostrando implacavelmente destrutivos em relação à vida. Na sua formação dependente, parece que lhe foi mais viável desenvolver uma observação silenciosa sobre as relações de poder e de afeto e do que poderia ser melhor traduzido em felicidade. Na família, em geral, a menina devia ser mais estudiosa e o menino mais trabalhador, mais forte e “poderoso”. Que poder é este? (TEIXEIRA, 2003, p. 183). Embora conquistas possam ser identificadas no que diz respeito ao acesso das mulheres aos direitos sociais, como à educação, evidenciam-se, no entanto, a continuidade dos estereótipos de gênero no exercício das matérias escolares, nos comportamentos socialmente instituídos para as mulheres ou para os homens, nas profissões e na sociedade. Meninas vestem cor de rosa e meninos vestem roupa azul; futebol não é coisa de meninas; o mesmo diploma na vida da mulher tem maior valor na vida do homem; profissões exercidas pelos homens são mais bem remuneradas e mais reconhecidas do que quando exercidas pelas mulheres; disciplinas masculinas (Física e Matemática), enquanto que (História) foi apontada como disciplina feminina; sabedoria, habilidade e execução de tarefas quando feitas por mulheres são intuição e quando feitas pelos homens são frutos de habilidades técnicas; o professor, quando bom é considerado criativo, gênio, inteligente e a professora quando é boa é considerada esforçada, estudiosa, explicam melhor, mas não entendem tanto, ou seja, “O saber e a genialidade são masculinos; o esforço e a intuição femininos”. (MACHADO, 2003, p. 198). Os estudos sobre as questões de gênero demandam pesquisas e providências, bem como podemos ver nos apontamentos de Felipe (apud BIAGIO, 2005, p. 35), 29 Se educarmos as crianças a partir de gênero, estaremos limitando as experiências de ambos. Por exemplo, dizer que meninos e homens não devem chorar os impede de desenvolver a sensibilidade e a expressão de seus sentimentos. Da mesma forma, ensinar às meninas que elas não têm competência para as atividades voltadas para as áreas de raciocínio lógico-espacial é limitá-las em suas várias possibilidades de aprendizado. Infelizmente, os brinquedos oferecidos às crianças ainda se pautam por essa divisão radical: às meninas, ensina-se o mundo doméstico, a maternidade o embelezamento. Aos meninos, o mundo das competições, da agressividade, do raciocínio lógico. A violação dos direitos fundamentais, expressa a mais profunda desigualdade, situação em que vivem ainda, mulheres, especialmente pobres, trabalhadoras, negras, embora existam também, homens nessa situação. Ainda existem restrições a altos postos de trabalho e a altos salários à mulher, especialmente quando o assunto envolve vultosos recursos financeiros administrados por elas. Por outro lado, vivenciam-se determinados tipos de trabalho ocupados pela mulher, até os que mantinham a exclusividade dos homens, como motorista de ônibus, de táxi, comandante de aeronave e outros. Mesmo assim, a mulher não abandona seu lado feminino, sua luta diária é acompanhada pela vaidade, pela simpatia, pela beleza e, muito mais ainda, pela determinação. Nesse momento de efervescência, de afirmação da cidadania e de participação ativa na sociedade, novos atores invadem a cena social para denunciar injustiças, reivindicar direitos e propor estratégias de libertação. Entre eles, destaca-se o movimento feminista, cujas ações baseiam-se na valorização da experiência de ser mulher em uma sociedade clivada de diferenças étnicas, de classe, de escolhas sexuais, de profissão, etc. Chega-se a vislumbrar transformações nas relações, nas estruturas sociais, cotejando novas formas de pensar a sociedade. (GONÇALVES e SILVA, 2006, p. 40 e 41). Da mesma forma, a mulher acumula o importante papel de ser mãe e trabalhadora e a missão de mostrar aos homens que o mundo mudou, mas que continua ao seu lado, como parceira na luta pela sobrevivência e pelo bem-estar da família. Evidencia-se mudança da atuação da mulher na política, na família, nos grupos sociais e culturais. 30 A Lei 9394/96 (LDB), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional apresenta como um dos pressupostos básicos a formação integral, como um direito básico de cada cidadão e dever do Estado na oferta, o que ampara o acesso igualitário à educação, especialmente às mulheres em situação de desvantagem social. “Enfim, o clima político da época favorece a emergência de ações afirmativas, visando, entre outras coisas, garantir o acesso de todos a empregos e a estabelecimentos de ensino em todos os níveis.” (op. cit., 2006, p. 41). Conforme nos diz Teixeira (2003), a estatística educacional desde 1980 vem registrando aumento de mulheres na escola, embora submetidas às estruturas de poder, com acesso das mulheres neutralizado pela sociedade aos cargos de maiores prestígios, mesmo em pleno desenvolvimento da feminilização de muitas profissões. Esse autor evidencia a presença maciça das mulheres nas áreas humanas, com base na realidade da educação, na qual a maioria dos docentes é mulher, apontando que, dentre 1,6 milhõesde professores da Educação Básica, 8,5% são do sexo feminino. Da mesma forma, no entendimento desse autor (2003), a escola, ao longo dos anos, vem representando o papel de reprodutora das desigualdades, cujo acesso demonstra a persistência das dicotomias, mediante os significados que estão presentes nas questões internas e externas a ela, quais sejam: ricos/pobres; brancos/pretos; meninos/meninas; católicos/protestantes; adultos/crianças; normais/deficientes. No período entre 1996 a 2003, o número de matrículas de mulheres na Educação Infantil cresceu 48,1% e do sexo masculino 52,5%; no Ensino Fundamental, as matrículas de mulheres cresceram 2,25%, enquanto que as matrículas dos homens cresceram 5,63%. No Ensino Médio o crescimento das matrículas foi de 58% para ambos os sexos, embora especificamente em 2003, o índice de matrículas para as mulheres tenha sido de 54% e para homens 46%. Já no período de 1991 a 2004, o número de estudantes do sexo feminino cresceu 181% frente ao crescimento de estudantes do sexo masculino, estimados em 148%. No mesmo período, o número de matrículas de mulheres passou de 833 mil para 2,3 milhões, diferentemente dos homens que de 731 mil passou para 1,8 milhões. No informe sobre as profissões por sexo e etnia consta a concentração das mulheres brancas nas Universidades nas seguintes áreas: Direito, Odontologia, Arquitetura, Pedagogia, 31 Administração e Medicina. Por outro lado, as mulheres negras foram encontradas na Pedagogia, Biblioteconomia, Licenciatura em Ciências do Ensino Fundamental, Enfermagem, Secretariado e Letras. (Teixeira, 2003). No Censo sobre a Educação Superior (2003, apud Teixeira, 2003), pôde ser observado maior percentual de mulheres cursando o Serviço Social e Orientação (93,8%); Fonoaudiologia (92%); Nutrição (92,8%) e Secretariado (92,6%). Embora se identifique maior presença da mulher na educação brasileira, pesquisas indicam também que elas têm menor poder e, ainda, são vitimadas pela discriminação presente no meio educacional, no que diz respeito às questões de gênero, fazendo-se relevante a atenção da escola a esse assunto no conjunto de estudos sobre a diversidade, também como tema relevante, a fim de que sejam instituídas trocas de informações entre os professores e estudantes, com profunda reflexão, no sentido de fortalecer o respeito, as relações interpessoais entre as diferentes presenças que transitam no seu espaço. As questões de gênero definem-se a partir do cultural e do social, por onde ficam delegadas às mulheres funções na família e na sociedade, como também aos homens, a quem ficam destinadas maiores oportunidades, funções de comando e sabedoria. Qual o papel da escola no sentido de transformar essa situação relacionada às questões de gênero em aprendizagem e superação? De Transformar os problemas em desafios? De promover o respeito, o acolhimento e a valorização da diferença e da diversidade? A resposta poderia ser: trabalhar no sentido de combater atitudes discriminatórias e preconceituosas que inibem a livre expressão das diferentes presenças na escola; combater relações autoritárias; transformar padrões de conduta definidos para homens e mulheres; permitir a expressão das potencialidades de cada ser humano, combatendo estereótipos instalados, pois, sobretudo, a escola precisa entender que, A discussão sobre relações de gênero têm como objetivo combater relações autoritárias questionar a rigidez dos padrões de conduta estabelecidos para homens e para mulheres e apontar para sua transformação. A flexibilização dos padrões visa permitir a expressão de potencialidades existentes em cada ser humano que são dificultadas pelos estereótipos de gênero. Como exemplo comum pode-se lembrar a repressão das expressões de sensibilidade, intuição e meiguice nos meninos ou de objetividade e agressividade nas meninas. As diferenças não devem ficar aprisionadas em padrões preestabelecidos, mas podem e devem ser vividas a partir 32 da singularidade de cada um, apontando para a equidade entre os sexos. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 144). O Censo IBGE (2010) estima a população brasileira em 190. 732. 694 milhões de habitantes, dentre os quais 97.342.162 milhões são mulheres e 93.390.532 milhões são homens. Mais 3,9 milhões de mulheres mais que homens no Brasil. (IBGE, 2010). A população urbana compreende 160.879.708 (84,2%) em relação à população rural, no total de 29.852.986 habitantes (15%). Do percentual total, 48,2 são brancos, 6,9% pretos, e 44,2% são pardos. (IBGE, 2010; acesso em 23/12/10). Dados da Pesquisa Nacional de Desenvolvimento (PNAD) na pesquisa por amostragem contata-se desemprego e informalidade maiores entre as mulheres e a renda feminina, em média, 24% menor que a dos homens. Conforme constatação da Diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT), mudanças poderão ocorrer, a depender de redefinições no âmbito familiar, do avanço das políticas públicas, da legislação e outros fatores relacionados. (emanuelpinheiro.com.br/tag/IBGE; acesso em 23/12/10). Deve-se considerar que a diferença da mulher se expressa pelas mais diferentes formas de agir, de pensar, de responder, de construir, enfim, de ser, de viver e conviver, assim como deve ser a do homem, de outras pessoas como os negros, assunto do próximo item. Quizz - FORCA PERGUNTA: Constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos. RESPOSTA: Educação inclusiva PERGUNTA: Garantia, a todos, do acesso contínuo ao espaço comum da vida em sociedade, sociedade essa que deve estar orientada por ações de acolhimento à diversidade humana. RESPOSTA: inclusão PERGUNTA: Para Ferreira (2000) significa: diferente, distinto, vário, variado. RESPOSTA: Diversidade 33 b) Questões étnico-raciais No século XVIII, a constituição demográfica da população brasileira, foi marcada pela imigração colonial portuguesa e o tráfico dos negros da África, motivação resultante da exploração do ouro e do diamante no Sudeste e no Centro-Oeste e, pela miscigenação resultante do povoamento de brancos e índios e de brancos e negros. Questões raciais ensejaram a exploração dos assuntos referentes às desigualdades sociais. “[...] existe um código perverso na sociedade de esconder a desigualdade debaixo da diversidade, imobilizando as pessoas que são vítimas de discriminação e racismo de se situarem perante o fenômeno e de medirem o alcance de seus anseios ou exigências” (PEREIRA, 2009, p. 10). Essas manifestações sempre chamaram a atenção e conseguem incomodar um considerável número de pessoas, demonstrando o quanto temas sobre as diferenças, a diversidade, especialmente tratando-se da raça negra, mexem com a identidade nacional. Por isso, perguntamos: como a escola poderá contribuir para promover as transformações necessárias para que o País se torne uma Nação inclusiva? Os negros, ao longo da história do Brasil, têm sido, justamente com os índios, os mais discriminados. Essa questão deve ser abordada na escola, incluída obviamente no currículo, de tal forma que o aluno possa identificar os casos, combatê-los, buscar resolvê-los, fazendo com que todos sejam cidadãos em igualdade de condições, a despeito das diferenças e especificidades que possam existir. (LOPES, 2005, p. 187). O que nos diz a estatística sobre a escolarização dessa população? Com relação ao acesso aos estudos, relativo a 2009, na população entre 18 a 24 anos (brancos, pretos e pardos), os números do Ensino Fundamental indicam: brancos (6,4%); pretos (18,2%) e pardos (18,5,8%). Com relação ao ensino superior: em 2009, consta: brancos: 62,6%; 34 pretos (28,2%); e pardos (31,8%). E, ainda, com 25 anos ou mais, dados referentes ao ensino Superior concluído: brancos (9,8%; pretos (4,7%) e pardos (5,3%). (CENSO IBGE, 2010). Frequentamescola 2.7 milhões de pretos e 15,9 pardos, enquanto que o analfabetismo: pretos (13,3%); pardos (13,4%); brancos (5,9%). Certo é que, a diferença ainda é significativa em termos do exercício e alcance da cidadania plena, uma vez detectada que os pretos e pardos na escola apresentam dificuldades de compreensão de textos, indo apenas pouco além da codificação rudimentar. (IBGE, 2010, acesso em 23 dez. 2010). A realidade demonstrada pelo Censo IBGE (2010) aponta o crescimento da população negra, de 2,3% com 25 anos ou mais com ensino superior completo, o que corresponde a um crescimento de 2,3% (1999) para 5,3% (2009). A população parda, de 2,3 (1999) para 4,7% (2009). Aumentou também o quantitativo da população branca com mais estudos, de 9,8% (1999) para 15% (2009). Esses dados cadastrados em 2009 foram publicados no referido recenseamento no ano de 2010. Porém, há indicativos que a população negra e parda necessita de mais acesso para conquistar melhores níveis de graduação, igualdade de condições no mercado de trabalho, cargos e salários. (emanuelpinheiro.com.br/tag/IBGE; acesso em 23/12/10). Em busca de seus direitos, pelos quais se solidarizam em suas lutas, diversos grupos considerados como excluídos, manifestam-se no sentido de combater as injustiças sociais, o preconceito e a discriminação no País, pois embora camuflados, ainda existem e são manifestados, tanto no mais simples gesto simbólico, como em atos de violência, basta acompanharmos na mídia e no nosso entorno, que muito nos informam também sobre a pluralidade em que vivemos, e que precisa ser trabalhado como temática nas escolas. Tudo isso, É possível identificar no cotidiano as muitas manifestações que permitem o trabalho sobre pluralidade: os fatos da comunidade ou comunidades do entorno escolar, as notícias de jornal, rádio e tv, as festas das localidades, estratégias de intercâmbio entre escolas de diferentes regiões do Brasil, e de diferentes municípios de um mesmo Estado. (BRASIL, 1997a, v. 10, p. 53). Pelo que nos indica Lopes (2005, p. 186) 35 Um olhar atento sobre a realidade do povo brasileiro mostra uma sociedade multirracial e pluriétnica que faz de conta que o racismo, o preconceito e a discriminação não existem. No entanto, afloram a todo o momento, ora de modo velado, ora escancarado, e estão presentes na vida diária. O desafio está em conseguirmos todos juntos, a implementação de políticas públicas que tenham como fundamento a história de cada grupo social e cultural e compactuarmos por meio do diálogo, trocando experiências e propondo metas efetivas para a garantia dos direitos sociais como direitos de todos, conforme apregoa a Constituição Federal (1988). As iniciativas isoladas e solitárias podem enfraquecer os movimentos e contribuir para o descaso com que têm sido tratadas as reivindicações por maiores e melhores condições de sobrevivência no meio social. Torna-se evidente, então, [...] a necessidade de um projeto comum que contribua para a redução das desigualdades sociais que ainda, com muita intensidade, caracterizam nossas sociedades contemporâneas, principalmente as do chamado Terceiro Mundo, há que se evitar a formação de guetos, de grupos que se isolem e se voltem apenas para as especificidades de suas lutas. Tal perspectiva somente pode tornar a sociedade ainda mais dividida. (MOREIRA, 2003, p. 155 e 156). Entender a diversidade, portanto, é dialogar e adentrar na história de vida de cada sujeito histórico, aprofundar-se nos inúmeros espaços sociais por onde transita e seus relacionamentos, dentre os quais, a família, o trabalho, a escola, o lazer, os amigos, o ambiente cultural e social. Compreender e conhecer a diversidade são interpretá-las em sua heterogeneidade, e sua relação com os recortes que demarcam a natureza plural dos brasileiros. Sua composição se traduz na presença de índios, de negros, de homens e de mulheres, de pessoas com necessidades especiais, de homossexuais, e outros tantos, cujas lutas e desafios reclamam, sobretudo, um olhar mais crítico, mais envolvente e mais democrático da escola. Compreender a 36 diversidade é aceitá-la como princípio, é contar com uma escola que a interprete e a utilize em suas diversas manifestações e relações socioatitudinais. Os trabalhos pedagógicos realizados de forma prazerosa, com ênfase na interação, contribuirão para a transformação da escola em espaços democráticos, nos quais os diversos saberes se encontram, favorecendo a educação para todos, com todos e por toda a vida, na qual a diferença será a marca fundamental da aprendizagem e a Escola como um todo, na diversidade, viva a diferença em sua plenitude. Mediante os dados observados com relação às questões de gênero e étnico-raciais, coadunamos com Bueno (2008, p. 60, grifo do autor), quando diz, [...] cabe a nós, estudiosos da educação especial, envidar todos os esforços para que a “inclusão escolar” não se restrinja somente à população tradicionalmente atendida por ela, pois, se assim for, estará fadada ao insucesso, já que as diferentes expressões do fracasso escolar têm se abatido sobre os deserdados sociais, criados por políticas econômicas e sociais altamente injustas, sejam eles deficientes, com distúrbios ou “normais”. Para isso, faz-se necessário que se juntem, sobretudo, os negros, os índios, as mulheres, as pessoas com deficiência, dentre outros e, juntos continuem vigilantes e nas suas lutas que, na verdade são de todos, tendo em vista que todos precisam conquistar a cidadania e uma sociedade verdadeiramente democrática, cuja diversidade deve ser vista como uma realidade e um desafio e não mais como um problema. Ao longo dos anos, algumas conquistas se concretizaram por força dos movimentos organizados e que exigiram do poder público políticas específicas em benefício do coletivo e de cada um. E, com isso, os reclamos da Escola para Todos, conforme podemos ver no item antecedente, no início deste curso. 37 A Educação Inclusiva foi desencadeada em Salamanca na Espanha (1994), para salvaguardar: a) o direito à educação de todos os excluídos da escola. b) o acesso aos direitos sociais. c) pessoas com deficiência exclusivamente. d) todas as questões de gênero implicadas com a desigualdade. e) todos os excluídos da escola, exceto os homossexuais. 38 2 EDUCAÇÃO INCLUSIVA: PROCESSO HISTÓRICO E ATENÇÃO À PESSOA COM DEFICIÊNCIA NAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL Neste curso apresentamos uma abordagem sobre o tema “Educação Inclusiva: Processo Histórico e Atenção à Pessoa com Deficiência nas Políticas Públicas no Brasil”, uma vez que a educação assim qualificada, mundialmente tomou forma como uma ação implementada em defesa dos direitos de todos os alunos frequentarem as mesmas escolas e estudarem juntos, uma reação às práticas excludentes que alimentaram estigmas e segregação, alentadores da injustiça social e da exclusão da escola sofrida por tantos alunos, em nome da sua diferença. Em nossa sociedade, ainda há momentos de séria rejeição ao outro, ao diferente, impedindo-o de sentir-se, de perceber-se e de respeitar-se como pessoa. A educação, ao adotar a diretriz inclusiva no exercício de seu papel socializador e pedagógico, busca estabelecer relações pessoais e sociais de solidariedade, sem máscaras, refletindo um dos tópicos mais importantes para a humanidade, uma das maiores do dimensionamento “ad intra” e “ad extra” do ser e da abertura para o mundo e para o outro. Essa abertura, solidária e sem preconceitos, poderá fazer com que todos percebam-se como dignos e iguais na vida social. (BRASIL, 2001b, p. 25). O pressuposto da educação como direito universal, segundo Pletsch (2010), implementou-se nas décadas de 50 e 70, período em
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