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83 
Exames 
Complementares 
Ulysses G. Meneghelli e Luiz Ernesto de Almeida Troncon 
..,. Introdução 
Os exames complementares possibilitam a comprovação 
das hipóteses diagnósticas, a detecção de anormalidades fun-
cionais, o reconhecimento de agentes etiológicos, bem como 
determinar as repercussões da doença sobre o organismo 
como um todo. 
Os exames básicos podem ser divididos nos seguintes sub-
grupos: avaliação bioquímica e hematológica, avaliação nm-
cional, estudo das alterações estruturais, pesquisa de agentes 
etiológicos pelos exames parasitológico e bacteriológico das 
fezes e cintigrafia. 
Exames de caráter específico podem ser necessários, de 
acordo com as hipóteses diagnósticas formuladas em cada 
caso. 
..,. Avaliação bioquímica, 
hematológica e sorológica 
Os níveis séricos de albumina estão frequentemente 
diminuídos nas doenças do intestino delgado. Tal redução não 
é, em geral, muito intensa, exceto nas afecções nas quais há 
perda intestinal de proteínas. Nesse caso, costuma haver queda 
de todas as frações proteicas, em particular da gamaglobulina. 
Diminuição muito acentuada dessa fração, junto com redu-
ção modesta dos níveis de albumina, sem anormalidades nas 
outras frações, sugere o diagnóstico de hipogamaglobulinemia 
primária (ver Capítulo 156, Doenças Imunológicas). 
Hipergamaglobulinemia pode ocorrer em todas as doenças 
crônicas, seja de natureza infecciosa, inflamatória ou neoplá-
sica. A doença de Crohn, a blastomicose, a tuberculose e os 
linfomas podem causar grande aumento dos níveis de gama-
globulina. 
Nas diarreias profusas, com perda de grande quantidade de 
água e eletrólitos, pode haver importante redução dos níveis 
séricos de sódio, cloro e potássio, bem como alterações do pH 
do sangue e das concentrações de co2 e bicarbonato, defi-
nidoras da acidose metabólica (ver Seção 6, Metabolismo, da 
Parte 1 O, Sistema Endócrino e Metabolismo). 
Na síndrome de má absorção, há, frequentemente, redução 
das taxas dos eletrólitos mencionados, bem como do cálcio, 
ferro, magnésio e fósforo. Também sofrem queda os níveis 
de colesterol, do caroteno, da vitamina A e da vitamina B12• 
A deficiência de vitamina D, na ausência de hipocalcemia 
importante, pode ser indicada por hipofosfatemia junto com 
elevação das taxas da fosfatase alcalina, além de alteração da 
excreção urinária de cálcio e fósforo. Já a deficiência de vita-
mina K é sugerida pela diminuição da atividade da protrom-
bina. Sua carência é comprovada pela normalização do tempo 
de protrombina após a administração parenteral dessa vita-
• mma. 
O exame hematológico representa um recurso de utilidade 
na avaliação das doenças intestinais. A diminuição da hemo-
globina e do hematócrito, bem como dos glóbulos vermelhos, 
indica anemia, mas a intensidade e o tipo desta dependem 
dos mecanismos subjacentes (ver Capítulo 152, Doenças do 
Sangue). 
O encontro de anemia hipocrômica microcítica sugere 
carência de ferro, enquanto a anemia macrocítica é conse-
quência de deficiência de vitamina B12, de ácido fólico ou de 
ambos. Na síndrome de má absorção, há carência de todos 
estes nutrientes, produzindo padrões variados de anemia. 
Dependendo da etiologia do processo, pode haver predomínio 
da carência de alguns dos elementos necessários à eritropoese. 
Assim, na doença celíaca encontra-se mais frequentemente 
anemia hipocrômica microcítica, própria da deficiência de 
ferro, enquanto a proliferação bacteriana no intestino delgado 
resulta em anemia macrocítica. Lesões ileais, que prejudicam a 
absorção de vitamina B12, provocam macrocitose. 
Nas hemorragias agudas, a anemia (normocítica e nor-
mocrômica) pode ser intensa. Em fase mais tardia, porém, 
instala-se a carência de ferro, que provoca microcitose e hipo-
. 
crom1a. 
O número total de glóbulos brancos pode estar modera-
damente aumentado em todas as condições nas quais há uma 
"reação geral de alerta': como nos períodos de agudização das 
doenças inflamatórias, nas afecções de natureza infectoparasi-
tária ou na hemorragia digestiva aguda. A leucocitose muito 
acentuada é incomum, exceto em algumas complicações da 
doença de Crohn, como a perfuração de alças intestinais. O 
predomínio de formas jovens de neutrófilos pode ocorrer, 
acompanhando a leucocitose. A eosinofilia é observada nos 
processos de natureza parasitária e nas afecções de base alér-
gica. Nestas últimas, o número absoluto de eosinófilos pode 
atingir cifras muito altas, compondo o quadro da gastroente-
ropatia eosinofílica. O número absoluto de linfócitos encon-
tra-se diminuído na linfangiectasia intestinal, o que se deve à 
perda gastrintestinal destes elementos celulares. A linfopenia 
ocorre também na AIDS. 
Exames sorológicos específicos vêm tendo aplicação cres-
cente na avaliação laboratorial nas doenças do intestino 
delgado. Incluem este grupo de testes as provas sorológicas 
específicas para tuberculose e para paracoccidioidomicose, 
quando se suspeita que estas infecções estejam causando com-
prometimento intestinal. Marcadores sorológicos podem tam-
bém ser úteis no diagnóstico da doença de Crohn e, sobretudo, 
na diferença desta afecção com a retocolite ulcerativa, quando 
há envolvimento exclusivo do intestino grosso. Na doença de 
Crohn, ocorre alta taxa de positividade para o anticorpo con-
tra a levedura Saccharomyces cerevisiae (ASCA) e, diferente-
mente da retocolite ulcerativa, menor taxa de positividade do 
anticorpo contra o citoplasma de neutrófilos, do tipo perinu-
clear (pANCA). Em casos nos quais se suspeita do diagnóstico 
da doença celíaca, é atualmente prática corrente a determina-
ção de anticorpos antiendomísio e antitransglutaminase, que 
apresentam altos níveis de sensibilidade e de especificidade. 
678 
.... Avaliação funcional 
O exame macroscópico das fezes pode trazer informações 
interessantes. A determinação do pH e a inspeção visando 
caracterizar volume, consistência e se há restos alimentares 
digeríveis ou de gordura podem fornecer dados indicativos do 
comprometimento do delgado. O peso diário do total de fezes 
emitidas, quando acima de 500 g/dia, sugere síndrome de má 
absorção ou diarreia colerreica. 
O exame qualitativo das fezes consiste no estudo, ao 
microscópio, de amostra de uma suspensão em solução salina, 
após hidrólise ácida ou térmica e adição de um corante espe-
cífico para gorduras, como o Sudão IV. O encontro de gotas 
coradas em amarelo-alaranjado torna possível a comprovação 
da esteatorreia. Apesar da possibilidade de ocorrência de fal-
sos resultados, principalmente, falsos-negativos, trata-se de 
exame útil, sobretudo quando é fortemente positivo, em casos 
com alto grau de suspeição da ocorrência de esteatorreia, que 
pode então ser confirmada. 
A determinação química do teor de gordura fecal é o 
método mais preciso para a comprovação e quantificação 
da esteatorreia. Para isso são colhidas fezes durante 72 h, 
tomando-se o cuidado de manter o paciente em dieta com 
80 a 100 g de gorduras por dia. As pessoas normais excretam, 
no máximo, 7 g/24 h. Valores acima deste limite indicam a 
ocorrência de esteatorreia, a qual pode atingir taxas iguais 
ou superiores a 50 g/24 h na insuficiência pancreática e nas 
enteropatias difusas crônicas, como a doença celíaca ou de 
Whipple. Em outras condições causadoras de má absorção, 
como a síndrome pós-gastrectomia e a proliferação bacte-
riana, os valores, em geral, não excedem 20 g/24 h. No entanto, 
por sua complexidade, esta medida mais precisa do teor de 
gordura fecal é realizada apenas em laboratórios mais especia-
lizados atualmente. Em muitos centros, estima-se a ocorrência 
de esteatorreia pelo exame qualitativo das fezes com o uso do 
Sudão IV, como mencionado anteriormente. 
A medida da excreção urinária da d-xilose após a admi-
nistração oral deste açúcar constitui um método para estu-
dar a absorção intestinal de modo independente da digestão. 
Após a ingestão de 25 g de d-xilose, observa-se, nas pessoas 
normais, excreção de 4 g ou maisna urina emitida nas pri-
meiras 5 h após sua administração. Valores inferiores indicam 
defeito da absorção. Nos processos globais de má absorção 
com esteatorreia, o encontro de valores normais na prova de 
d-xilose sugere, fortemente, defeito da digestão, como ocorre 
na insuficiência pancreática. Falsos resultados normais podem 
aparecer em doenças intestinais proximais de leve ou mode-
rada intensidade e em doenças do delgado distai. 
Nas condições nas quais há acentuada proliferação bacte-
riana no intestino delgado, o teste da d-xilose pode ser anor-
mal devido ao consumo do açúcar pelas bactérias, antes da 
sua absorção. O teste da d-xilose sofre interferência de vários 
fatores, entre os quais o trânsito gastrintestinal e a filtração 
glomerular. Desidratação ou ascite pode determinar redução 
da excreção renal da d-xilose. Por estas razões, atualmente, o 
teste de d-xilose é de limitado valor clínico e tem sido substi-
tuído, principalmente, pela biopsia intestinal. 
O estudo funcional da digestão e da absorção dos hidratos 
de carbono tem sido feito com o teste do hidrogênio (2H) no 
ar expirado, medido por cromatografia gasosa. 
Em condições normais, os açúcares sofrem digestão e 
absorção quase completa no intestino delgado; apenas uma 
fração irrelevante atinge o cólon. Mas, havendo má digestão 
Parte 9 I Sistema Digestivo 
ou má absorção, uma quantidade considerável dos açúcares 
chega ao cólon, no qual sofrem fermentação bacteriana pro-
duzindo grande quantidade de 2H, que é absorvido e excre-
tado pelos pulmões. Deste modo, um grande aumento das 
concentrações de hidrogênio no ar expirado, 60 a 90 min após 
a ingestão de um açúcar, é indicativo sensível e específico de 
má absorção dos hidratos de carbono ingeridos. 
O teste do hidrogênio é usado para o estudo da absorção de 
açúcares como a lactose, a sacarose, a maltose, o amido e a fru-
tose. É indicado, também, no diagnóstico das condições nas 
quais há proliferação bacteriana no intestino delgado. Por isso, 
usa-se como substrato a glicose, a qual, em condições normais, 
é rapidamente absorvida e metabolizada, sem produção de 2H. 
Se houver contaminação bacteriana no jejuno, observam-se 
uma ou mais elevações em "pico" na concentração de 2H, nos 
30 min após a ingestão do substrato. A proliferação bacteriana 
no intestino delgado pode ser, também, determinada com o 
uso de lactulose, um dissacarídio não absorvível, como subs-
trato. Este açúcar também pode ser empregado para o estudo 
do tempo de trânsito orocecal, como será descrito adiante. 
Níveis elevados da concentração de 2H no ar expirado de um 
paciente em jejum representam, por si sós, forte indicação de 
aumento da população bacteriana no intestino delgado ou no 
estômago. 
A lactulose é usada, também, para a medida do tempo de 
trânsito orocecal, parâmetro que se altera em vários transtor-
nos da motilidade digestiva. A chegada ao ceco da lactulose é 
seguida de grande aumento dos níveis de 2H no ar expirado, 
em decorrência da digestão deste açúcar pelas bactérias da 
flora normal do intestino grosso. Desse modo, o tempo decor-
rido entre a ingestão da lactulose e o início da elevação da con-
centração de 2H equivale ao tempo de trânsito da boca ao ceco. 
A perda gastrintestinal de proteínas pode ser detectada e 
medida pelo teste da excreção fecal de macromoléculas mar-
cadas. A mais utilizada é a albumina-51Cr, a qual, uma vez 
injetada na circulação, não extravasa do meio interno para o 
lúmen gastrintestinal, em condições normais. Assim sendo, o 
encontro de níveis elevados de radioatividade nas fezes, após 
a injeção venosa da albumina-51Cr, pode comprovar a perda 
anormal de proteínas pelo tubo digestivo. A determinação 
concomitante da radioatividade plasmática e fecal em perío-
dos de 24 h possibilita estimar o clearance das proteínas plas-
máticas para o lúmen gastrintestinal, o que assegura maior 
precisão ao teste. 
O diagnóstico laboratorial da síndrome carcinoide baseia-se 
no encontro de níveis elevados do ácido 5-hidroxi-indolacético 
(5-HIAA) na urina. Esta substância é um metabólito da sero-
tonina, produzido em grande quantidade pelos tecidos neo-
plásicos. Excreção urinária superior a 50 mg/24 h do 5-HIAA 
é considerada indicativa da síndrome carcinoide. Níveis mais 
baixos, menores que 20 mg/24 h, podem ser encontrados nas 
enteropatias difusas crônicas e quando há proliferação bacte-
. nana. 
O diagnóstico do divertículo de Meckel pode ser feito 
por um exame radioisotópico especial que consiste na inje-
ção venosa do sal sódico do 99mtecnécio, seguida da obtenção 
de imagens cintigráficas do abdome. As células parietais da 
mucosa gástrica têm grande avidez pelo tecnécio, o que torna 
possível o seu "mapeamento" externo após injeção venosa 
do isótopo. Considerando que cerca de 50% dos divertículos 
de Meckel apresentam mucosa gástrica heterotópica em seu 
interior, o encontro de uma região hipercaptante no abdome, 
abaixo e, em geral, à direita da área gástrica, sugere a existência 
desta anormalidade anatômica (Figura 83.1). 
83 I Exames Complementares 
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Figura 83.1 Gamacintigrafia obtida após injeção de pertecnetato de sódio 
Frrrrc) em uma criança que apresentou hemorragia digestiva. Identificam-se 
a figura gástrica e, mais abaixo, mancha menor indicativa de mucosa gás-
trica ectópica. O diagnóstico foi de divertículo de Meckel. 
...,. Estudos das alterações estruturais 
Os métodos empregados para o diagnóstico topográfico 
e anatomopatológico das afecções do intestino delgado são 
os exames de imagens (radiologia, arteriografia, tomografia 
computadorizada, ultrassonografia e ressonância magnética), 
a biopsia intestinal e a endoscopia. 
• Exames de imagem 
O estudo radiológico pode ser feito por radiografia simples 
do abdome, seriografia convencional ou trânsito intestinal, 
arteriografia, tomografia computadorizada, ultrassonografia e 
ressonância magnética. 
A radiografia simples do abdome tem indicação importante 
no diagnóstico das síndromes obstrutivas e na perfuração de 
alças (Figura 83.2). Nas obstruções por obstáculo mecânico, 
as alças delgadas apresentam-se dilatadas e com níveis líqui-
dos. Na síndrome pseudo-obstrutiva, as dilatações de outros 
segmentos do tubo digestivo associam-se às do delgado. As 
679 
perfurações são demonstradas pelo ar livre na cavidade peri-
toneal na região subdiafragmática. Alça rígida, cheia de ar, 
com irregularidades na superfície, sugere doença isquêmica. 
Dilatações aneurismáticas das alças ocorrem nos linfomas. A 
radiografia simples pode mostrar imagens de calcificações de 
gânglios mesentéricos, o que pode auxiliar no diagnóstico de 
tuberculose intestinal, bem como de calcificações pancreá-
ticas, evidência de importante comprometimento do órgão. 
O exame radiológico contrastado do intestino delgado tem 
por finalidade caracterizar a existência de lesão nas paredes 
do órgão, sua possível natureza, posição e extensão, além das 
alterações funcionais. A opacificação é obtida pela ingestão de 
contraste à base de sulfato de bário. Após a ingestão, sempre 
feita com o paciente em jejum de 10 a 12 h, estudam-se o estô-
mago e o duodeno, e, em seguida, acompanha-se o trânsito do 
material baritado ao longo do delgado com sucessivas radio-
grafias, até o íleo terminal (Figura 83.3). 
As alterações morfológicas no exame radiológico contras-
tado do intestino delgado são: 
• Calibre das alças: como o calibre normal do jejuno é de 
25 mm e o do íleo, 20 mm, considera-se uma alça dila-
tada quando excede 30 mm. Uma estenose é reconhecida 
quando há apreciável e persistente redução do calibre, ou 
quando existir dilatação a montante. Estreitamentos transi-
tórios indicam espasmos do órgão 
• Excesso de secreção: é evidente pela diluição excessiva do 
contraste e sua pouca aderência à superfície da mucosa. 
Ocorre particularmente nos processos inflamatórios e 
exsudativos do intestino delgado 
• Alterações nas pregas mucosas: aspregas mucosas apare-
cem em negativo, adquirindo o aspecto radiológico carac-
terístico das alças delgadas. Reconhece-se o espessamento 
da mucosa quando a prega ultrapassa 2 mm, com perda da 
regularidade de suas margens. Edema da mucosa e/ou da 
submucosa (hipoproteinemia, bloqueio linfático, edema 
angioneurótico) ou hemorragia (síndromes hemorrágicas, 
vasculites) são causas importantes de espessamento das 
pregas. Espessamentos distorcidos e irregulares ou o desa-
parecimento total do padrão mucosa são provocados por 
infiltrados inflamatórios (doença de Crohn, tuberculose, 
infecções por Yersinia, estrongiloidíase, blastomicose) e 
neoplásicos (carcinoma, linfomas) 
• Nódulos: aparecem como falhas de enchimento de forma 
arredondada ou semilunar, únicas ou múltiplas e de tama-
• 
Figura 83.2 Radiografias simples do abdome. A. Níveis hidroaéreos observados em pacientes com obstrução do íleo por bridas pós-operatórias. B. 
Distensão de alças delgadas reconhecidas pela imagem característica que lhes dão as válvulas de Kerckring. C. Distensão e irregularidade em alças 
intestinais em pacientes com isquemia mesentérica. D. Coleção aérea subdiafragmática direita em caso de perfuração do íleo. 
680 Parte 9 I Sistema Digestivo 
o 
Figura 83.3 Radiografias contrastadas do intestino delgado. A. Alterações do relevo mucoso determinadas por espessamento edematoso da mucosa 
do intestino delgado proximal, incluindo duodeno, em paciente com estrongiloidíase. &.Irregularidades de contornos das alças com espículos (úlceras), 
áreas de estreitamento e aumento da espessura das paredes (alças afastadas umas das outras) em caso de blastomicose. C. Irregularidades nos contornos 
e imagens de nódulos em paciente com linfoma primário do intestino delgado. D. Região do íleo terminal onde pode ser notada a imagem em pedra 
de calçamento (cobblestones) e de uma fístula em caso de doença de Crohn. 
nhos variáveis. Podem ser pólipos, neoplasias benignas, 
hiperplasia linfoide, mastocitose, macroglobulinemia, 
doenças de Whipple e de Crohn 
• Ulcerações: sendo lesões escavadas, elas aparecem nas 
radiografias como depósitos baritados que podem ter 
tamanho, forma e profundidade variáveis. A mais comum 
dessas lesões é a úlcera péptica da primeira porção do duo-
deno. Elas também aparecem na doença de Crohn, tuber-
culose, blastomicose e processos neoplásicos. 
... Fístulas. São identificadas como trajetos que vão além dos 
limites anatômicos das alças, atingindo órgãos situados nas 
imediações: bexiga, vagina, cólon ou outras alças delgadas. 
São observadas na doença de Crohn, blastomicose e linfomas. 
... Divertículos. Apresentam-se como formações arredondadas 
e lisas anexas às alças, podendo apresentar nível líquido. São 
mais comuns no duodeno. 
... Alterações no mesentério. O desenvolvimento de processos infil-
trativos, inflamatórios ou neoplásicos no mesentério faz com 
que as alças se mostrem rígidas e afastadas entre si. Aderências 
mesentéricas retráteis podem provocar angulações das alças 
que podem chegar até a obstrução. 
A arteriografia torna possível a visualização do sistema 
arterial que supre o intestino delgado. Um cateter introduzido 
em uma artéria, frequentemente a femoral, é levado até a arté-
ria emergente da aorta que se quer estudar. O método possi-
bilita identificar o local de uma hemorragia aguda, bem como 
doenças vasculares ( aterosclerose, arterites) e tumores. 
A tomografia computadorizada (TC) do intestino delgado 
é feita após a ingestão de solução de contraste baritado ou 
iodado. Possibilita a identificação de anomalias congênitas 
(divertículo, má rotação etc.), o estudo de processos infla-
matórios das alças (p. ex., doença de Crohn), a detecção de 
linfonodos anormais e é útil no diagnóstico da obstrução 
intestinal aguda ou crônica e da oclusão das artérias e veias 
mesentéricas. 
A ultrassonografia pode identificar espessamento de alças, 
estreitamentos do lúmen, trajetos fistulosos, tumores, intus-
suscepção intestinal, cistos e ascite. Pelo processo do eco-Dop-
pler pode-se estudar a irrigação do intestino delgado. 
A ressonância magnética (RM) do intestino delgado exige 
que ele esteja quiescente, o que é obtido com o uso de agente 
antiperistáltico ou com jejum de pelo menos 5 h. Utiliza-se 
também a RM com supressão de gordura e contraste de gado-
línio, obtendo-se resultados comparáveis aos da tomografia 
computadorizada. Ela revela-se particularmente útil na ava-
liação de doença de Crohn e no estudo das afecções vasculares 
(angiorressonância). 
• Biopsia intestinal 
A biopsia da mucosa intestinal, obtida por meio de dispo-
sitivos especiais, traz elementos fundamentais para o diag-
nóstico anatomopatológico de várias enteropatias difusas 
crônicas, como a doença celíaca, de Whipple, a amiloidose, 
os linfomas difusos, a acantocitose (abetalipoproteinemia), 
as enterites parasitárias, a linfangiectasia intestinal e o espru 
hipogamaglobulinêmico (Figura 83.4). É importante também 
para o diagnóstico etiológico de protozooses como giardíase, 
criptosporidiose, isosporíase e microsporíase. Não é indicada 
para o diagnóstico de afecções focais. Já a contraindicação 
absoluta está na existência da síndrome hemorrágica. 
O líquido intestinal que vem junto com o fragmento de 
mucosa ou que pode ser aspirado antes da realização da biop-
sia pode ser submetido a exame parasitológico, o qual, fre-
quentemente, é positivo, mesmo quando o exame das fezes é 
negativo. 
O fragmento obtido na biopsia é observado com uma lupa 
ou no microscópio estereoscópico (Figura 83.5), em fundo 
negro, o que possibilita o estudo da morfologia das vilosida-
des. Pode-se fazer com facilidade o reconhecimento da atro-
fia vilositária, como acontece na doença celíaca. Podem ser 
observadas outras anormalidades, como vilosidades em ponte 
ou vilosidades convolutas, encontradas na doença celíaca em 
remissão. Vilosidades túrgidas com espessamentos em suas 
extremidades (lembrando o baqueteamento digital) são vistas 
nas linfangiectasias intestinais. Para o exame histológico de 
rotina, o fragmento de mucosa é distendido sobre um pequeno 
pedaço de papel de filtro, a face cruenta voltada para o papel e 
o conjunto imerso em fixadores comuns. 
A hemorragia e a perfuração constituem as complicações 
mais importantes. Por isso, cuidados especiais, particular-
mente na aspiração e no tipo de cápsulas, devem ser tomados 
83 I Exames Complementares 681 
A 
Figura 83.4 Biopsia do intestino delgado. A. Atrofia de vilosidades e hipertrofia das criptas de criança com doença celíaca. 8. Dilatações do linfático 
central das vilosidades em caso de linfangiectasia. C. Larva de S. stercoralis na mucosa duodenal em paciente com estrongiloidíase. 
Figura 83.5 Biopsia do intestino delgado. Vilosidades intestinais observadas ao microscópio estereoscópico. A. Mucosa normal. 8. Algumas vilosidades 
intumescidas em caso de linfangiectasia por blastomicose sul-americana. C. Atrofia total das vilosidades, aspecto em mosaico, característico da doença 
celíaca. D. Vilosidades anormais, longas, com angulações, em paciente com doença celíaca tratada. 
nos casos em que se presume adelgaçamento das paredes do 
tubo intestinal, como na doença celíaca. 
Em decorrência da possibilidade de complicações e, em 
especial, pela dificuldade técnica inerente à sua realização, 
a biopsia da mucosa do intestino delgado com o uso de dis-
positivos ou cápsulas especiais vem sendo substituída pela 
endoscópica da segunda porção do duodeno, com resultados 
favoráveis especialmente nas doenças que acometem difusa e 
globalmente a mucosa do intestino delgado, como a doença 
celíaca. 
• Endoscopia 
O intestino delgado é acessível ao exame com gastroduode-
noscópios (Figuras 83.6 e 83.7), coloscópios (íleo terminal) e, 
mais recentemente, com enteroscópios e com a cápsula endos-
cópica. 
• 
Edema e hiperemia da mucosa caracterizam as duodeni-
tes. Podem ser também observadas erosões da mucosa, em 
geral múltiplas, provocadaspela ação cloridropéptica ou por 
substâncias exógenas agressivas (p. ex., álcool). Formações 
polipoides constituídas de adenomas, hamartomas (síndrome 
de Peutz-Jeghers), adenocarcinomas e linfomas são raras no 
duodeno. Elevações múltiplas e de pequeno tamanho caracte-
rizam a hiperplasia linfática, quase invariavelmente associada 
a giardíase e deficiência de IgA e IgG. A hiperplasia das glân-
dulas de Brünner pode determinar a formação de adenoma 
isolado ou hiperplasia nodular ou difusa. Na doença celíaca, 
nota-se atrofia da mucosa, bem como, ocasionalmente, o 
aspecto em mosaico característico. Divertículos são diagnos-
ticados pela observação de seus orifícios de comunicação com 
o duodeno. Lesões tipo aftas, isoladas ou múltiplas, úlceras de 
várias formas, tamanhos e profundidades, e espessamentos e 
nodulações nas paredes duodenais são altamente sugestivos de 
. . "' .. 
Figura 83.6 Endoscopia do duodeno. Duodeno- bulbo. A. Bulbo duodenal. Bulbo distendido com mucosa de coloração rósea-clara, aveludada, superfície 
lisa sem pregas. 8. Úlceras duodenais. Pequenas úlceras duodenais rasas, com fundo fibrinoso, com discreto halo de edema e hiperemia, localizadas em 
parede anterior e posterior, com imagens em espelho (kissing ulcers). C. Úlcera duodenal. Úlcera profunda, ovalada, fundo recoberto por fibrina espessa, 
com bordas edemaciadas e hiperemiadas. 
682 Parte 9 I Sistema Digestivo 
Figura 83.7 Endoscopia do duodeno. Duodeno-segunda porção. A. Duodeno. Segunda porção apresentando a papila duodenal, bile e pregas transversais 
habituais. B. Adenoma viloso. Lesão vegetante ocupando cerca de 50% da circunferência do órgão. C. Óstio de divertículo da segunda porção duodenal. 
doença de Crohn no duodeno. O estudo histológico de frag-
mentos das lesões obtidos por biopsia endoscópica esclarecerá 
a natureza da doença duodenal. 
O diagnóstico de uma doença de íleo terminal, suspeitada 
por alterações radiológicas, pode ser feito por endoscopia, pois 
o colonoscópio, ultrapassando a válvula ileocecal, possibilita a 
visualização das lesões situadas nos últimos 30 ou 40 em do 
íleo terminal e a realização de biopsias. 
O exame endoscópico de todo o jejuno e da porção pro-
ximal do íleo pode ser feito, atualmente, com o emprego de 
enteroscópios específicos. 
A cápsula endoscópica é um minidispositivo que contém 
uma microcâmera e deve ser deglutida pelo paciente. Toma 
possível a gravação de imagens durante várias horas. Tem 
como principal indicação esclarecer sangramentos digestivos 
de origem obscura, como os determinados por angiodisplasia 
do intestino delgado. 
A enteroscopia de duplo balão, disponível apenas há pou-
cos anos, torna possível a visualização de todo o intestino 
delgado, podendo o enteroscópio ser introduzido por via 
anterógrada ou retrógrada. É de utilidade no esclarecimento 
de sangramentos que ocorrem no intestino delgado em locais 
não alcançáveis pela tradicional endoscopia digestiva alta ou 
pela colonoscopia. Pode ser útil também no aperfeiçoamento 
do diagnóstico de lesões identificadas pelo exame radiológico. 
.., Cintigrafia 
A medicina nuclear tem utilidade na pesquisa de divertí-
culo de Meckel e de sangramento digestivo (Figura 83.1). 
O diagnóstico do divertículo de Meckel por meio da cinti-
grafia já foi descrito. 
A cintigrafia com hemácias ou enxofre coloidal tem alta 
sensibilidade na detecção de focos de sangramento, sendo 
capaz de detectar sangramento a partir de 0,3 mf/min. 
Em centros mais especializados no estudo da motilidade 
digestiva, a cintigrafia é empregada para o estudo do trânsito 
gastrintestinal. O paciente em jejum ingere refeição de prova 
padronizada marcada com tecnécio 99m ligado a um carre-
gador não absorvível, como o enxofre coloidal ou o fitato. Em 
seguida, posiciona-se junto ao colimador de gamacâmera, que 
possibilita a visualização do estômago e dos vários segmen-
tos do intestino delgado à medida que vão sendo preenchidos 
com o radiotraçador. A definição de regiões de interesse cor-
respondendo ao estômago, ao jejuno, às porções mais distais 
do intestino delgado e ao ceco, nas imagens armazenadas após 
sua aquisição, e a subsequente determinação da radioatividade 
presente nestas regiões, ao longo do tempo, fornece medidas 
acuradas da taxa de esvaziamento gástrico e do tempo de che-
gada do radiotraçador aos vários segmentos intestinais. 
.., Exames parasitológico e 
bacteriológico das fezes 
Nos pacientes com diarreia aguda ou crônica ou com 
outros sintomas nos quais a etiologia infectoparasitária é con-
siderada, são indispensáveis os exames parasitológico e bacte-
riológico das fezes. 
~ Exame parasitológico. No exame parasitológico das fezes, 
procura-se identificar protozoários e helmintos patogêni-
cos para o intestino delgado, como Strongyloides stercoralis, 
Giardia lamblia, ancilostomídeos, Ascaris, Isospora, Cryptos-
poridium. A Isospora é mais facilmente encontrada se a pes-
quisa for efetuada após a amostra de fezes ter sido deixada à 
temperatura ambiente por 1 ou 2 dias. Para todos os outros 
parasitos, é mais conveniente o exame de material recente-
mente emitido. 
~ Exame bacteriológico. O material colhido deve ser submeti-
do a bacterioscopia e cultura a fim de se pesquisarem cepas 
patogênicas de Escherichia coli (produtoras de enterotoxinas 
ou enteropatogênicas não invasivas), de bactérias pertencen-
tes aos gêneros ShigeUa (as mais encontradas são a S. jlexneri 
e a S. sonnei), Salmonella (a mais frequente é a S. typhymu-
rium), Yersinia (Y. enterocolitica) e Campylobacter (C. jejuni). 
Na identificação do agente etiológico nas diarreias agudas, é 
interessante efetuar, sempre que possível, a pesquisa dos vírus 
enteropatogênicos, como o rotavírus. 
A quantificação bacteriológica do intestino delgado é 
necessária para a confirmação do diagnóstico de supercres-
cimento bacteriano (alças cegas, doença diverticular do del-
gado, pseudo-obstrução intestinal). Para isso é indispensável a 
contagem da flora anaeróbia. 
O líquido jejunal deve ser aspirado em seringa estéril des-
cartável, com todo o ar sendo expelido e o bico da seringa, 
selado. Sob estas condições de anaerobiose, o material deve 
83 I Exames Complementares 
ser imediatamente processado pelo laboratório. O valor nor-
mal deve ser estabelecido para cada laboratório, mas uma 
contagem bacteriana total superior a 106 organismos/mf ou 
a simples demonstração de anaeróbios estritos no jejuno tem 
significado diagnóstico. A demonstração de ácidos acético e 
succínico (produzidos por Bacteroides) no líquido intestinal 
por meio de cromatografia líquido-gasosa é prova de contami-
nação bacteriana no delgado. 
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