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Exame de Ordem 
Damásio Educacional 
XXIX EXAME DA ORDEM 
 
2ª FASE DIREITO TRIBUTÁRIO 
 
Estudo Dirigido 02 - GABARITO 
Questão 
A entidade de assistência social sem fins lucrativos “Ajudar Faz Bem”, detentora da imunidade prevista 
no art. 150, VI, “c”, CF, comercializa calçados para ajudar nas despesas da entidade, sendo todo o valor 
obtido com tal comercialização revertido para as finalidades essenciais da mesma. O Estado de Santa 
Catarina, local da sede da entidade em que são realizadas as respectivas vendas, ao tomar conhecimento 
de tal fato, resolve cobrar o ICMS que em tese incidiria sobre tal operação. 
A empresa “Carne Boa”, que trabalha na área alimentícia, sabendo que uma das áreas de atuação da 
entidade “Ajudar Faz Bem” é alimentar pessoas carentes, resolve doar para a entidade parte de sua 
produção que não pode ser vendida para consumo em razão de defeitos na embalagem. O Estado de 
Santa Catarina, igualmente, decide por cobrar o ICMS devido em razão de tal operação, indicando como 
sujeito passivo da obrigação tributária a entidade beneficente. 
A entidade beneficente, inconformada com as respectivas cobranças, procura “X”, advogado especialista 
em direito tributário, que apresenta as seguintes orientações para a entidade: “No que tange à operação 
de venda de calçados, a cobrança do ICMS é indevida, pois a entidade é beneficiária de imunidade. No 
segundo caso, o tributo é igualmente indevido, pelos motivos antes aduzidos”. 
Conforme a situação acima destacada, e as orientações fornecidas pelo advogado, responda: 
(i) Qual a diferença entre contribuinte de direito e contribuinte de fato? Tal classificação é importante 
tanto para os tributos direitos quanto para os indiretos? 
(ii) A orientação do causídico, na hipótese da venda de calçados, está correta? 
(iii) E na segunda hipótese, incide o tributo? A orientação do advogado está correta? 
(iv) A imunidade das entidades de beneficência incide tanto nos casos em que a mesma é contribuinte de 
fato quanto nas hipóteses em que é contribuinte de direito? 
 
 
 
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Instruções: 
Os Estudos Dirigidos não representam atividades que devem ser remetidas para correção. 
Após 3 dias da publicação dos enunciados, no próprio sistema de atividades, haverá a disponibilização do 
gabarito. 
 
Todas as questões têm como linha mestra a diferenciação entre contribuinte de fato e contribuinte de 
direito. Nesse sentido, o primeiro passo é justamente definir tais espécies de contribuinte. Conforme 
ensina Ricardo Alexandre, “... hoje se fala em contribuinte de fato e em contribuinte de direito. No 
primeiro conceito estão enquadradas as pessoas que sofrem a incidência econômica do tributo, mesmo 
que formalmente não integrem a relação jurídico-tributária instaurada; no segundo caso, está 
enquadrada parte das pessoas que ocupam o polo passivo da relação jurídico-tributária, sendo obrigadas 
a efetivamente pagar o tributo ou a penalidade pecuniária” (Direito Tributário Esquematizado. São Paulo: 
Editora Método, 2017, págs. 352 e 353). 
Deste modo, é possível afirmar, resumidamente, que o contribuinte de fato é aquele que sofre os efeitos 
econômicos da tributação, enquanto o contribuinte de direito é aquele que sofre a incidência jurídica do 
tributo. 
Tal classificação está intimamente ligada à classificação dos tributos em diretos e indiretos. Novamente 
se valendo da doutrina de Ricardo Alexandre, é possível afirmar que “são indiretos os tributos que, em 
virtude de sua configuração jurídica, permitem translação do seu encargo econômico-financeiro para uma 
pessoa diferente daquela definida em lei como sujeito passivo” (op. Cit. Pág, 117). Por outro lado, “são 
diretos os tributos que não permitem tal translação, de forma que a pessoa definida em lei como sujeito 
passivo é a mesma que sofre o impacto econômico-financeiro do tributo” (op. Cit. Pág. 117). Tendo em 
vista as definições acima, pode-se concluir que o ICMS é tributo indireto, em que é possível a identificação 
de um contribuinte de direito e um contribuinte de fato. 
Conforme é possível extrair de tais conceitos, somente faz sentido falar em contribuinte de fato e 
contribuinte de direito nos tributos indiretos, pois apenas nesses é possível ao contribuinte de direito 
transferir o encargo da exação para os demais membros da cadeia econômica. 
 
 
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Uma vez fixada a diferença entre contribuinte de fato e contribuinte de direito, torna-se necessário 
analisar os casos concretos acima destacados. 
No primeiro caso, a entidade assistencial, ao vender os calçados, é o contribuinte de direito da respectiva 
exação. Conforme o art. 4º, LC 87/96, é contribuinte (de direito) do tributo qualquer pessoa, física ou 
jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de 
circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de 
comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior, conceito no qual está incluída 
a entidade assistencial. 
Ocorre, porém, que no caso há a incidência da imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, CF, segundo a qual 
é vedada a instituição de impostos sobre patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive 
suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência 
social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei. Conforme a doutrina de Hugo de Brito Machado 
Segundo, “diz-se que há imunidade quando a Constituição veda a criação e a cobrança de tributos sobre 
determinados fatos ou sobre determinados sujeitos, retirando-os do âmbito das regras que delimitam a 
competência tributária, âmbito no qual, do contrário, não fosse a regra imunizante, tais fatos ou sujeitos 
estariam normalmente abrangidos” (MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Manual de Direito Tributário. 
São Paulo: Editora Atlas, Pág. 87). 
Dessa forma, como incide no caso uma imunidade, e a entidade beneficente é a contribuinte de direito 
do ICMS, a cobrança do ICMS realizada pelo Estado de Santa Catarina é indevida, estando correta a 
orientação do patrono. 
Por outro lado, a orientação do advogado, na segunda hipótese, está equivocada. Inicialmente, impende 
destacar que a operação realizada pela empresa “Carne Boa” não está sujeita à incidência do ICMS, pois 
na hipótese não há uma circulação econômica do bem, mas tão somente uma circulação jurídica. Nesse 
sentido, a doação não configura o critério material da hipótese de incidência tributária do ICMS, pois 
nesse caso não há uma atividade mercantil, conforme exige o art. 155, II, CF, mas tão somente uma 
circulação física do produto. 
 
 
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Ademais, a justificativa dada pelo causídico acerca do motivo pelo qual não incidiria o tributo no caso 
concreto está equivocada. Conforme o supracitado artigo 4º, LC 87/96, é considerado contribuinte de 
direito do ICMS aquele que realiza a atividade mercantil, ou seja, a empresa de carnes. Desse modo, ainda 
que se estivesse diante de uma operação mercantil (o que não é o caso), a entidade de beneficência não 
seria mero contribuinte de fato, e não de direito, ou seja, ela suportaria apenas o encargo econômico da 
exação. Nesses casos, o STF é pacífico acerca da não incidência da imunidade, conforme se verifica no 
seguinte aresto, decidido sob o método da repercussão geral (RE 608872/MG, grifos nossos): 
Recurso extraordinário. Repercussão geral. Imunidade do art. 150, inciso VI, alínea a, CF. Entidade 
beneficente de assistência social. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). 
Aquisição de insumos e produtos no mercado interno na qualidade de contribuinte de fato. 
Beneplácito reconhecido ao contribuinte de direito. Repercussão econômica.Irrelevância. 1. Há 
muito tem prevalecido no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que a imunidade tributária 
subjetiva se aplica a seus beneficiários na posição de contribuintes de direito, mas não na de 
simples contribuintes de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do beneplácito 
constitucional a discussão acerca da repercussão econômica do tributo envolvido. Precedentes. 2. 
Na primeira metade da década de sessenta, alguns julgados já trataram do tema, ensejando a 
edição da Súmula nº 468/STF. Conforme o enunciado, após a Emenda Constitucional 5, de 
21/11/1961, o imposto federal do selo era devido pelo contratante não beneficiário de 
desoneração constitucional (contribuinte de direito) em razão de contrato firmado com a União, 
estado, município ou autarquia, ainda que a esses entes imunes fosse repassado o encargo 
financeiro do tributo por força da repercussão econômica (contribuintes de fato). 3. A Súmula nº 
591, aprovada em 1976, preconiza que “a imunidade ou a isenção tributária do comprador não se 
estende ao produtor, contribuinte do imposto sobre produtos industrializados”. 4. Cuidando do 
reconhecimento da imunidade em favor de entidade de assistência social que vendia mercadorias 
de sua fabricação (contribuinte de direito), admite o Tribunal a imunidade, desde que o lucro 
obtido seja aplicado nas atividades institucionais. 5. À luz da jurisprudência consagrada na Corte, 
a imunidade tributária subjetiva (no caso do art. 150, VI, da Constituição Federal, em relação aos 
impostos) aplica-se ao ente beneficiário na condição de contribuinte de direito, sendo 
irrelevante, para resolver essa questão, investigar se o tributo repercute economicamente. 6. O 
ente beneficiário de imunidade tributária subjetiva ocupante da posição de simples contribuinte 
de fato – como ocorre no presente caso –, embora possa arcar com os ônus financeiros dos 
impostos envolvidos nas compras de mercadorias (a exemplo do IPI e do ICMS), caso tenham 
 
 
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sido transladados pelo vendedor contribuinte de direito, desembolsa importe que juridicamente 
não é tributo, mas sim preço, decorrente de uma relação contratual. A existência ou não dessa 
translação econômica e sua intensidade dependem de diversos fatores externos à natureza da 
exação, como o momento da pactuação do preço (se antes ou depois da criação ou da majoração 
do tributo), a elasticidade da oferta e a elasticidade da demanda, dentre outros. 7. A propósito, 
tal orientação alinha-se aos precedentes desta Corte no sentido de ser a imunidade tributária 
subjetiva constante do art. 150, VI, c, da Constituição aplicável à hipótese de importação de 
mercadorias pelas entidades de assistência social para uso ou consumo próprios. Essas entidades 
ostentam, nessa situação, a posição de contribuintes de direito, o que é suficiente para o 
reconhecimento do beneplácito constitucional. O fato de também serem apontadas, costumeira 
e concomitantemente, como contribuintes de fato é irrelevante para a análise da controvérsia. 
Precedentes. 8. Em relação ao caso concreto, dou provimento ao recurso extraordinário para 
declarar não ser aplicável à recorrida a imunidade tributária constante do art. 150, VI, c, da 
Constituição Federal. Sem condenação em honorários, nos termos da Súmula nº 512/STF. Custas 
ex lege. 9. Em relação ao tema nº 342 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF 
na internet, fixa-se a seguinte tese: “A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários 
na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo 
irrelevante para a verificação da existência do beneplácito constitucional a repercussão econômica 
do tributo envolvido.” 
Na oportunidade, a Corte acabou por fixar a seguinte tese de repercussão geral: A imunidade tributária 
subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples 
contribuinte de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do beneplácito constitucional a 
repercussão econômica do tributo envolvido.

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