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RECURSO PROCESSO PENAL

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1. Duplo grau de jurisdição: trata-se de garantia individual, prevista implicitamente na Constituição
Federal, voltada a assegurar que as decisões proferidas pelos órgãos de primeiro grau do Poder Judiciário não
sejam únicas, mas, sim, submetidas a um juízo de reavaliação por instância superior. Estipula o art. 5.º, § 2.º, que
“os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. A partir desse
dispositivo, deve-se fazer a sua conjugação com o previsto no Capítulo III, do Título IV, da Constituição, que cuida
da estrutura do Poder Judiciário, dividindo-o em órgãos hierarquizados e atribuindo a cada um deles a possibilidade
de rever as decisões uns dos outros. Assim, estabelece o art. 102, II, competir ao Supremo Tribunal Federal “julgar,
em recurso ordinário: a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção
decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; b) o crime político”. Significa,
pois, que havendo o julgamento de habeas corpus, denegada a ordem, no Superior Tribunal de Justiça, pode o
interessado recorrer, ordinariamente – sem se submeter a pré-requisitos específicos –, ao Supremo Tribunal
Federal. O mesmo se diga da decisão do juiz federal de primeiro grau, decidindo crime político, contra a qual cabe
recurso ordinário diretamente ao Pretório Excelso. Enfim, são esses, existindo outros, exemplos a demonstrar a
previsão constitucional do duplo grau de jurisdição, embora implícito. Não é demais lembrar, ainda, o disposto no
art. 5.º, LV, da Constituição, no sentido de que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”
(grifamos), o que evidencia a importância da existência de recursos para o livre e pleno exercício da defesa de réus
em processos em geral, especialmente na órbita criminal. Acrescente-se a esses argumentos, a lição de Ada
Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, defendendo o status
constitucional do duplo grau de jurisdição, por meio da ratificação, pelo Brasil, da Convenção Americana dos
Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), em 1992 (Decreto 678/92), conforme previsão do art. 8.º, 2-
h (Recursos no processo penal, p. 24). Em idêntico sentido, a lição de Maurício Zanoide de Moraes (Interesse e
legitimação para recorrer no processo penal brasileiro, p. 30). Destaquemos, no entanto, que, como qualquer
outro princípio ou garantia constitucional, pode comportar exceções. É exatamente o que acontece com os
processos julgados em competência originária dos Tribunais Superiores. Assim, por exemplo, se um deputado
federal for condenado criminalmente pelo Supremo Tribunal Federal, não há como recorrer dessa decisão, não se
aplicando, assim, o duplo grau.
2. Conceito de recurso: é o direito que possui a parte, na relação processual, de insurgir-se contra
decisões judiciais, requerendo a sua revisão, total ou parcial, em instância superior. Segundo Borges da Rosa, o
“recurso tem seu fundamento na contingência humana, na falibilidade da cultura, da inteligência, da razão e da
memória do homem, por mais culto, perspicaz e experiente que seja”. Destina-se, pois, a sanar “os defeitos graves
ou substanciais da decisão”, “a injustiça da decisão”, “a má apreciação da prova”, “a errônea interpretação e
aplicação da Lei, ou da norma jurídica”, “a errônea interpretação das pretensões das partes” e “a errônea apreciação
dos fatos e das suas circunstâncias” (Comentários ao Código de Processo Penal, p. 693). Não nos parece
adequado, pois, classificar como recurso o instrumento processual voltado ao mesmo órgão prolator da decisão,
para que a reveja ou emende. Excepcionalmente, no entanto, surgem instrumentos com essa conformação,
considerados por alguns processualistas como recursos, mas que, em verdade, são autênticos pedidos de
reconsideração ou revisão dirigidos ao mesmo órgão prolator, como ocorre com os embargos de declaração.
Entende-se que ganhem a denominação de recurso uma vez que possibilitam ao magistrado rever a decisão
proferida, mesmo que seja somente para sanar algum erro (obscuridade, omissão, contradição, ambiguidade, entre
outros), podendo, ao fazê-lo, alterar o rumo do que havia sido decidido. Dessa maneira, se o juiz, reconhecendo que
deixou de apreciar uma alegação ou um pedido feito por uma das partes, fazendo-o então nos embargos de
declaração, pode alterar o decidido, transmudando o dispositivo condenatório para absolutório (ou vice-versa).
3. Natureza jurídica do recurso: para Ada, Magalhães e Scarance, trata-se de “aspecto, elemento ou
modalidade do próprio direito de ação e de defesa” (Recursos no processo penal, p. 32), acrescentando Frederico
Marques que não se trata de uma espécie autônoma de ação, mas apenas o poder de rever decisões proferidas
dentro do mesmo processo (Elementos de direito processual penal, v. 4, p. 181).
4. Características fundamentais dos recursos: devem ser: a) voluntários: a interposição depende,
exclusivamente, do desejo da parte de contrariar a decisão proferida. Exceções existem, no contexto do processo
penal, diante dos chamados recursos de ofício (ver nota 13 adiante) e da possibilidade de extensão dos efeitos do
recurso ao corréu, desde que o beneficie, como prevê o art. 580, CPP; b) tempestivos (também é um pressuposto
de admissibilidade): não é viável a interposição de recurso, após o prazo estabelecido, expressamente, em lei. Por
isso, não se deve considerar recursos as ações autônomas – como o habeas corpus, o mandado de segurança e a
revisão criminal –, que têm por finalidade apresentar inconformismo contra certas decisões. Nesta hipótese, as
ações impugnativas podem voltar-se tanto contra decisões com trânsito em julgado – ou simplesmente precluídas a
outro recurso –, bem como contra decisões suscetíveis de serem impugnadas por recurso específico; c) taxativos:
o recurso deve estar expressamente previsto em lei, para que a parte interessada dele lance mão. Não fosse assim e
inexistiria segurança jurídica, visto que toda e qualquer decisão, sob qualquer circunstância, desagradando uma das
partes, permitiria ser questionada em instância superior. A ampla possibilidade recursal certamente terminaria por
fomentar atitudes protelatórias, impedindo o equilibrado andamento do processo.
5. Efeitos dos recursos: o efeito devolutivo é regra geral, permitindo que o tribunal superior reveja
integralmente a matéria controversa, sobre a qual houve o inconformismo. Naturalmente, cabe à instância superior
avaliar, ainda, matéria que lhe permite conhecimento de ofício, sem a impugnação expressa de qualquer das partes
(ex.: nulidade absoluta, mormente quando há prejuízo para o réu). O efeito suspensivo é excepcional, impedindo
que a decisão produza consequências desde logo. Há situações que comportam imediata eficácia, como a sentença
absolutória, a provocar imediata soltura do réu; outras, no entanto, submetem-se à eficácia contida, como a
sentença condenatória, impondo pena privativa de liberdade, que não se executa, senão após o trânsito em julgado
(há hipóteses, também, excepcionais de recolhimento provisório ao cárcere, embora seja fruto de medida cautelar
e não da sentença propriamente dita). Aliás, como bem lembram Ada, Magalhães e Scarance, não é o recurso que
possui efeito suspensivo, pois a decisão sujeita a recurso não tem eficácia, até que a instância superior se
manifeste. Ele é o instrumento para prorrogar a condição de ineficácia da decisão (Recursos no processo penal, p.
51). Pode-se mencionar, ainda, o efeito regressivo, que significa devolver ao mesmo órgão prolator da decisão a
possibilidade de seu reexame, o que acontece com os embargos declaratórios e outros recursos (recurso em
sentido estrito e agravo em execução).
5-A. Vedaçãoda reformatio in pejus: não há possibilidade de haver, interposto recurso exclusivamente
pelo réu, reforma da decisão para piorar sua situação. Tal possibilidade somente existe, caso o órgão acusatório
ofereça recurso. Assim, se o acusado foi condenado, v.g., a dois anos de reclusão por furto qualificado, concedido
o benefício do sursis, uma vez que recorra, pleiteando a absolvição, não pode o Tribunal cassar a suspensão
condicional da pena, alegando que o condenado é reincidente. Seria uma indevida reformatio in pejus. Ver, também,
as notas 21 a 24-C ao art. 617.
5-B. Aplicação do princípio da ampla defesa em 2.º grau: é indispensável, sob pena de nulidade,
consistente em cerceamento de defesa, a publicação prévia da pauta dos Tribunais, para que o julgamento possa ser
acompanhado, tendo em vista ser feito à vista do público. Além disso, é direito do advogado sustentar oralmente
suas razões. Nesse prisma: STF: HC 92.253, 1.ª T., rel. Carlos Ayres Britto, 27.11.2007, v.u.; HC 75.614 – PE, 2.ª
T., rel. Néri da Silveira, 31.03.1998, v.u., DJ 03.12.1999, p. 4. A única exceção, em razão da celeridade exigida,
ficaria por conta do habeas corpus, mas já amenizada pelo STF (ver nota 82 ao art. 664). Se houver
substabelecimento para advogado que exerce a atividade na sede do tribunal onde será realizado o julgamento, deve
haver intimação a este, sob pena de nulidade (ex.: um recurso extraordinário, com origem na Comarca de Belo
Horizonte, segue ao STF, em Brasília. Ocorre, então, o substabelecimento, mesmo com reserva de poderes, a um
defensor cujo escritório situa-se na Capital Federal. Deve este causídico ser intimado, para, querendo, comparecer
à sessão). Nesse sentido: STF: HC 85.476 – PR, 1.ª T., rel. para acórdão Sepúlveda Pertence, 04.10.2005, m.v.,
Informativo 404).
5-C. Sustentação oral e adiamento da sessão: o direito da parte interessada de sustentar oralmente
perante a Câmara ou Turma faz parte do desdobramento da ampla defesa, mas não é irrestrito. Quando houver pleito
de adiamento da sessão, há de existir fundamento para tanto, não se constituindo num singelo pedido, a ser deferido
obrigatoriamente. Conferir: STF: “1. O Supremo Tribunal Federal fixou o entendimento de que, por possuir caráter
facultativo, o indeferimento de pedido de adiamento de sessão de julgamento, pela impossibilidade de
comparecimento do advogado da parte para oferecer sustentação oral, não gera nulidade. 2. Ademais, conforme já
se manifestou a Suprema Corte ‘a excepcionalidade do adiamento de uma sessão de julgamento, por alegada
impossibilidade de comparecimento do Advogado do réu, impõe e justifica a exigência de necessária comprovação
da causa impeditiva invocada. Esse ônus processual, que foi por ele descumprido, não pode ser, agora, invocado em
benefício do impetrante, para o efeito de desconstituir decisão validamente proferida pelo Tribunal’ (HC 61.714 –
RJ, 1.ª T., Rel. Min. Celso de Mello, DJ 15.03.91)” (HC 107.054 – SP, 1.ª T., rel. Dias Toffoli, Informativo 734).
5-D. Amplitude do efeito devolutivo em recurso da defesa: interposto recurso pela defesa, devolve-se
à instância superior amplo conhecimento da matéria, sem qualquer cerceamento ou limitação, desde que o enfoque
seja favorável ao acusado. Por isso, pode-se decidir além do que pleiteou a defesa, beneficiando-se o réu em linha
de argumentação diversa da sustentada no recurso oferecido. A única exceção refere-se à apelação no contexto do
Tribunal do Júri, que se deve ater, vinculadamente, a uma das alíneas do art. 593, III, do CPP (ver a nota 12 ao art.
593). Nessa ótica: STF: “A apelação da defesa, salvo limitação explícita no ato de sua interposição, devolve ao
Tribunal todas as questões relevantes do processo, independentemente delas terem sido arguidas pelos Recorrentes
nas razões de apelação ou, no caso, no pedido de aditamento” (RHC 94.350 – SC, 1.ª T., rel. Cármen Lúcia,
14.10.2008, v.u.).
6. Classificações das decisões judiciais: ver nota 2 ao Título XII do Livro I.
Capítulo I
DISPOSIÇÕES GERAIS7-11
7. Sobre correição parcial, reclamação e agravo na execução criminal: ver notas 1-13 introdutórias
ao Capítulo II, que cuida do recurso em sentido estrito.
8. Sobre recursos especial e extraordinário: ver notas 1-12 introdutórias ao Capítulo VIII, que trata do
recurso extraordinário.
9. Sobre agravo contra denegação de recursos especial e extraordinário: ver a nota 10 introdutória
ao Capítulo VIII, que cuida do recurso extraordinário.
10. Sobre agravo de decisões de integrantes de tribunais e agravo regimental: ver nota 1
introdutória ao Capítulo V, que trata do processo e do julgamento dos recursos em sentido estrito e das apelações
nos tribunais.
11. Sobre mandado de segurança em matéria criminal: ver as notas 1 a 13-B ao Capítulo X, que cuida
do habeas corpus, bem como a nota 30 ao art. 581, V.
Art. 574. Os recursos serão voluntários,12 excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos, de
ofício,13 pelo juiz:14
I – da sentença que conceder habeas corpus;15
II – da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstância que exclua o crime ou isente
o réu de pena, nos termos do art. 411.16-16-A
12. Voluntariedade dos recursos: trata-se de característica fundamental do recurso que seja ele
interposto voluntariamente pela parte interessada na revisão da decisão. Caso haja conformismo, não se deve
reavaliar o julgado. Ver, ainda, a nota 4 supra.
13. Recurso de ofício: trata-se de terminologia equivocada do Código de Processo Penal, uma vez que
recurso é demonstração de inconformismo, visando à reforma do julgado, motivo pelo qual não tem cabimento
sustentar que o juiz, ao decidir qualquer questão, “recorre” de ofício de seu próprio julgado. Assim, o correto é
visualizar nas hipóteses deste artigo o duplo grau de jurisdição obrigatório. Diante da relevância da matéria,
impõe a lei que a decisão seja submetida a dupla análise. Havendo somente uma decisão, não se produz a coisa
julgada, como preceitua a Súmula 423 do STF: “Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex
officio, que se considera interposto ex lege”. Há posição minoritária na doutrina, considerando que o recurso de
ofício está revogado pela Constituição Federal de 1988, particularmente pelo disposto no art. 129, I, que atribui,
exclusivamente, ao Ministério Público a titularidade da ação penal. Assim, caso o juiz considerasse interposto um
recurso, sem haver qualquer requerimento das partes, estaria agindo de ofício e movimentando a ação penal,
valendo-se de ilegítima iniciativa. Não nos parece seja assim, pois o que o magistrado faz, ao determinar o
processamento de um recurso de ofício nada mais é do que submeter a questão, avaliada importante pelo legislador,
ao duplo grau de jurisdição obrigatório. Não está questionando sua própria decisão, mas apenas cumprindo a lei.
Esta, em última análise, considera interposto o recurso. O juiz nada mais faz do que providenciar que os autos
subam à instância superior.
14. Recurso de ofício em legislação especial: exige-se o duplo grau de jurisdição obrigatório, quando
houver absolvição de acusados em processo por crime contra a economia popular ou contra a saúde pública –
exceto entorpecentes, que é caso regido por lei específica –, bem como quando houver o arquivamento dos autos
do inquérito policial (Lei 1.521/51, art. 7.º).
15. Sentença concessiva de habeas corpus em primeiro grau: à época de edição do Código de
Processo Penal, entendia-se não caber recurso do Ministério Público, caso houvesse concessão de habeas corpus
pelo magistrado de primeiro grau. Assim, visando ao controle dessas decisões, em nome do interesse social,
determinou a lei que houvesse o duplo grau de jurisdição obrigatório (Ada, Magalhães e Scarance, Recursos no
processo penal, p. 381). E fornecendo a mesma explicação: Bento de Faria (Código de Processo Penal, v. 2, p.
313). Atualmente, há recurso possível para o Ministério Público (art. 581, X, CPP), razão pela qual desnecessário
seria o recursode ofício.
16. Sentença de absolvição sumária: buscando resguardar a soberania dos veredictos e a competência do
Tribunal Popular, impunha a lei que a decisão do juiz, absolvendo sumariamente o réu, nos processos do júri, fosse
revista pelo órgão jurisdicional superior. Realmente, se o foro competente para deliberar sobre os crimes dolosos
contra a vida é o Tribunal do Júri, somente em casos excepcionais poderia o juiz afastar o conhecimento do caso
dos jurados. Por isso, havia duplo controle da admissibilidade da acusação. Entretanto, com a reforma introduzida
pela Lei 11.689/2008, não há mais sentido em se utilizar o duplo grau obrigatório no caso de absolvição sumária.
Há duas principais razões para tanto: a) o inciso II do artigo 574 faz expressa referência aos termos do art. 411.
Neste dispositivo, anteriormente, fazia-se menção ao recurso de ofício. Ora, o art. 415, que agora cuida da
absolvição sumária, nenhuma alusão faz a essa modalidade de recurso. Ao contrário, no art. 416, especificou-se ser
a apelação, recurso tipicamente voluntário, o adequado para impugnar a sentença de absolvição sumária; b) a
previsão feita, anteriormente, para o processamento do recurso de ofício, dizia respeito às absolvições calcadas em
excludentes de ilicitude ou de culpabilidade (eram as únicas possibilidades previstas pela antiga redação do art.
411). O atual art. 415 aumentou as hipóteses para a absolvição sumária do réu, sem falar em recurso de ofício.
Portanto, seria ilógico e descompassado que o juiz absolvesse sumariamente o réu, com base no art. 415, I, por
exemplo, mas não recorresse de ofício, embora se o fizesse com base no art. 415, IV, tivesse que determinar a
subida do processo obrigatoriamente. Parece-nos, pois, finda a possibilidade de recurso de ofício em casos de
absolvição sumária no procedimento do júri. Nesse sentido: TJBA: “Recurso criminal ex officio. Delito previsto no
artigo 121, caput c/c o artigo 14, inciso II do CP. Absolvição sumária aplicada no juízo primevo. Esvaziamento do
inciso II do artigo 574 do CPP. Quando faz referência ao artigo 411, ora revogado pela lei 11.689/2008.
Desnecessidade do envio a quo para superior instância, in casu. Posicionamento doutrinário que se fortalecesse
(Tribunal do Júri – Guilherme de Souza Nucci – pág. 98)” (Rec. Crim. Ex Officio, 62095-4/2008 – BA, 2.ª C.C.,
rel. Mário Alberto Simões Hirs, 18.02.2009).
16-A. Outras hipóteses de recurso de ofício: registre-se, ainda, a existência de recurso de ofício quando
o relator indefere liminarmente a revisão criminal (ver nota 36 ao art. 625), quando o presidente do Tribunal
indeferir liminarmente habeas corpus (ver nota 80 ao art. 663) e por ocasião da decisão de concessão da
reabilitação (ver art. 746).
Art. 575. Não serão prejudicados os recursos que, por erro, falta ou omissão dos funcionários, não tiverem
seguimento ou não forem apresentados dentro do prazo.17
17. Desvio da administração pública: não pode prejudicar a parte. Se, porventura, deixar algum recurso de
ser processado no prazo legal ou tiver a sua forma desatendida, em decorrência de ato faltoso de servidor público –
não apenas do Judiciário – é preciso garantir o seu seguimento à instância superior. Exemplo disso pode ser
extraído da conduta do funcionário do protocolo, que deixa de enviar ao cartório, a tempo, recurso regularmente
apresentado pela parte. Descoberta a falha, é natural que o recurso deva ser recebido e processado, verificando-se,
administrativamente, a responsabilidade do servidor. Conferir a Súmula 320 do STF: “A apelação despachada pelo
juiz, no prazo legal, não fica prejudicada pela demora da juntada, por culpa do cartório”.
Art. 576. O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto.18
18. Impossibilidade de desistência do recurso do Ministério Público: no contexto da obrigatoriedade
do ajuizamento da ação penal, que vige no processo penal, para os crimes de ação pública incondicionada, não pode
o representante do Ministério Público, uma vez interposto o recurso, dele desistir. Logicamente, não é obrigatório
o oferecimento do recurso, mas, feita a opção, desistência não haverá. É possível, no entanto, que um promotor
apresente a petição de interposição do apelo, abrindo-se, depois, vista a outro representante do Ministério Público
para oferecer as razões. Este último, não concordando com o recurso em andamento, dele não pode desistir, mas
suas razões podem espelhar entendimento diverso do que seria compatível com o desejo de recorrer. Trata-se da
independência funcional do membro do Ministério Público. Imagine-se que o réu tenha sido absolvido por falta de
provas. O promotor toma ciência e apresenta apelação, sem as razões. Posteriormente, quando outro representante
do Ministério Público recebe os autos para oferecer os fundamentos do apelo, aceita os argumentos do magistrado
e, não podendo desistir, apresenta razões concordantes com os fundamentos da sentença.
Art. 577. O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo querelante, ou pelo réu, seu procurador
ou seu defensor.19-21
Parágrafo único. Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação
da decisão.22-24-A
19. Múltipla legitimidade para interposição: admite o processo penal que o recurso seja diretamente
interposto pelo réu. Entretanto, possibilita, ainda, a apresentação por procurador com poderes específicos ou pelo
defensor. No caso de divergência – o réu deseja recorrer, mas o defensor, não, por exemplo – deve prevalecer a
vontade de quem quer sujeitar a decisão ao duplo grau de jurisdição. Conferir o teor da Súmula 705 do STF: “A
renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da
apelação por este interposta”. É preciso destacar, no entanto, que a renúncia do acusado, contando com a
assistência do defensor, a contrario sensu, produz o efeito de renúncia ao direito ao duplo grau de jurisdição,
constituindo autêntico obstáculo ao processamento ou conhecimento do recurso (ver nota 35 ao art. 578). Nesse
sentido: TJSP: “Ademais, como bem consignado pela d. Procuradora de Justiça oficiante, o pedido formulado pelo
impetrante é desprovido de ‘sentido’ lógico, porque se o paciente renunciou ao direito de recorrer da decisão de
pronúncia e, assim, contribuiu explicitamente para que o decisum transitasse em julgado (fls. 55), não há que se
falar em direito de recorrer em liberdade. Frise-se, por primeiro, que não se vislumbra qualquer irregularidade na
manifestação da vontade de renunciar ao direito de interpor recurso contra a decisão de pronúncia, pois tal
declaração foi acompanhada por oficial de justiça, serventuário que possui fé pública (fls. 54). Ademais, se o
Defensor do paciente com ele anuiu e não requereu a reapreciação da decisão, mais uma vez, nenhuma mácula se
extrai do procedimento” (HC 990.10.439905-0, 16.ª C., rel. Almeida Toledo, 14.12.2010, v.u.). Em casos
excepcionais, quando a interposição do recurso mais prejudicar do que auxiliar o acusado – razão pela qual a defesa
não quis recorrer – pode o magistrado alertar o recorrente dos argumentos de seu defensor, enviando-lhe cópia da
manifestação, mormente quando se trata de dativo, que possui contato dificultado com o patrocinado, renovando a
possibilidade de que renuncie à interposição ou mantenha seu intento. Não vemos fundamento na simples rejeição
do recurso do acusado, somente pelo fato de que a vontade da defesa técnica, pelo conhecimento que detém, deva
prevalecer. Por outro lado, se o defensor quer recorrer, mas o réu não deseja, renunciando ao direito quando
receber a intimação da sentença, deve-se dar prosseguimento ao recurso, salvo se houver prejuízo evidente para o
acusado. Nessa hipótese, é possível que o juiz dê ciência ao interessado, que poderá, querendo, constituir outro
defensor, a fim de desistir do recurso interposto, ou mesmo, sendo o caso de dativo, requerer ao magistrado a
nomeação de outro. Sobre o tema, manifestam-seAda, Magalhães e Scarance pela análise do binômio interesse-
utilidade, sustentando que, no caso concreto, “seria a pedra de toque para dirimir o conflito entre a vontade de
recorrer do acusado e a renúncia do defensor, ou vice-versa. Se houver, nas circunstâncias concretas, vantagem
prática que se possa alcançar pelo recurso, prevalecerá a vontade de recorrer, tenha sido ela manifestada no
exercício da autodefesa ou da defesa técnica, e seja esta desempenhada por advogado constituído ou nomeado. Mas
se a vantagem concreta for duvidosa, ou houver valores contrastantes em jogo, prevalecerá a vontade do defensor
técnico, salvo manifestação de renúncia do réu tomada por termo, na presença de seu defensor, que deverá
esclarecê-lo sobre as consequências da renúncia e os benefícios do recurso” (Recursos no processo penal, p. 80).
Confira-se a possibilidade de haver a justa composição dos interesses recursais, tanto do réu, quanto de seu
defensor: TJSP: “As duas tendências opostas admitem, porém, conciliação adequada, capaz de assegurar o
equilíbrio da autodefesa (defesa como direito) e da defesa técnica (defesa como garantia do correto exercício da
jurisdição). De fato, há que impedir, a pretexto de assegurar um julgamento justo, o sacrifício da liberdade do
cidadão-réu (notadamente o que não tem meios para constituir e destituir Advogados e assegurar assim o
predomínio de sua vontade) e cumpre também evitar que o despreparo técnico e o conhecimento imperfeito da
utilidade e mecanismo de impugnação das decisões judiciais possam prejudicar os menos afortunados” (Ap.
152.945-3, São Bento do Sapucaí, 5.ª C., rel. Dante Busana, 25.08.1994. m.v., JTJ 168/311).
20. Possibilidade de trâmite concomitante de dois recursos interpostos pelo réu, por meio dos
defensores dativo e constituído: trata-se, naturalmente, de hipótese excepcional, mas, em homenagem ao
princípio constitucional da ampla defesa, possível. A respeito, confira-se o disposto no seguinte acórdão: TJSP:
“Decisão que deixou de receber apelação interposta por advogado constituído. Indeferitório fundado no fato de que
já tramitava idêntico recurso de iniciativa do defensor dativo. Inadmissibilidade. Ofensa aos princípios da ampla
defesa e do contraditório. Condenado que tão logo intimado da sentença constitui defensor de sua preferência e
confiança para dela apelar. Titularidade do exercício pleno de recorrer. Processamento concomitante porquanto
inexiste colidência na duplicidade dos impugnativos, devendo ser apreciadas sucessivamente todas as linhas de
defesa. Aplicação dos artigos 263 e 581, XV, do Código de Processo Penal” (RSE 261.084-3, Penápolis, 3.ª C.,
rel. Gonçalves Nogueira, 16.11.1999, v.u., JUBI 49/2000).
21. Legitimação excepcional: há, ainda, a possibilidade do ofendido e das pessoas que o sucederem na ação
penal (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão) oferecerem recurso, ainda que não estejam habilitados nos
autos como assistentes de acusação, quando o juiz julgar extinta a punibilidade do réu, impronunciá-lo ou absolvê-
lo, respeitadas as regras estabelecidas nos arts. 584, § 1.º, e 598 do Código de Processo Penal. Outras pessoas ou
entes, previamente admitidos como assistentes de acusação, também podem apresentar recurso. Não se olvide,
também, a excepcional participação do terceiro de boa-fé, cujo bem foi apreendido ou sequestrado, e, apesar de
apresentado os embargos, teve sua pretensão rejeitada pelo juiz (art. 130, II, CPP). Pode ele apresentar apelação.
22. Interesse recursal: trata-se de um dos pressupostos subjetivos (ver nota 26 ao art. 578, CPP) para a
admissibilidade dos recursos. É natural que a parte somente poderá provocar o reexame da matéria já decidida por
determinado órgão, remetendo o feito à instância superior, quando eventual modificação da decisão lhe trouxer
algum tipo de benefício. Recorrer por recorrer é algo inútil, constitutivo de obstáculo à economia processual, além
do que o Judiciário é voltado à solução de conflitos e não simplesmente a proferir consultas ou esclarecer
questões puramente acadêmicas. Conferir: TJAM: “1. O réu não possui legitimidade recursal para pleitear a
restituição de coisa apreendida em favor de terceiro prejudicado, por não ter interesse na modificação da sentença
neste ponto, consoante art. 577 do CPP” (Apelação Criminal 0214166-77.2014.8.04.0001 – AM, 1.ª C. C., rel.
Carla Maria Santos dos Reis, 07.05.2015, v.u.).
23. Interesse na modificação da fundamentação da sentença: como regra, não se reconhece
interesse para a parte que deseje, apenas, alterar os fundamentos tomados pelo julgador para proferir determinada
decisão. Nesse caso, seria completamente inútil reavaliar-se a questão, se o dispositivo da sentença permanecer
inalterado. Entretanto, caso a fundamentação produza efeito consequencial concreto no direito da parte, é possível
o recurso. É o que ocorre com a sentença absolutória por reconhecimento de legítima defesa, bem diversa de outra,
também absolutória, que se sustenta na insuficiência de provas. Esta última não encerra a discussão, que pode
estender-se à esfera cível, em ação autônoma de indenização. A outra, por sua vez, não permite mais que se debata a
responsabilidade do réu.
24. Interesse recursal do Ministério Público: deve ser garantido, tanto no caso de parte acusatória,
interessada na condenação, quanto na situação de custos legis, interessado no fiel cumprimento da lei. Assim, o
promotor, ainda que tenha pedido a condenação e funcione no processo como órgão acusatório, pode apresentar
recurso contra a decisão condenatória, caso entenda ter sido, por exemplo, exagerada a pena imposta ao acusado.
Existindo recurso da defesa, tem este prioridade, naturalmente. Note-se, entretanto, que, no caso de ação privada,
havendo absolvição e não tendo recorrido o querelante, não cabe recurso do Ministério Público para buscar a
condenação, da qual abriu mão o maior interessado. Seria subverter o princípio da oportunidade, que rege a ação
penal privada. Pode recorrer, como custos legis, tendo havido condenação, havendo ou não recurso do querelante,
para contrariar a pena aplicada, por exemplo.
24-A. Interesse recursal e morte do réu: é natural que, falecendo o indiciado ou o réu, durante o trâmite
do inquérito ou do processo, deve o magistrado julgar extinta a punibilidade, afetada a pretensão punitiva do Estado,
arquivando-se o feito. Porém, se o réu morrer após ter sido condenado, durante o trâmite do seu recurso, pode
haver interesse no processamento do mesmo, manifestado por parente ou representante legal, já que a condenação
pode produzir reflexos em outras áreas, como na esfera cível. Questão semelhante foi abordada pelo Tribunal
Regional Federal (1.ª Região), conhecendo e dando provimento a apelo de réu falecido, cujo filho manifestou
interesse no processamento, para alterar o fundamento da absolvição. Confira-se: “Com o falecimento do
interessado, foram os autos arquivados, entretanto, seu filho manifestou-se alegando interesse econômico e moral
no processamento e no julgamento do recurso interposto, razão pela qual o juízo monocrático determinou a
remessa dos autos ao TRF-1.ª Região, independentemente de contrarrazões, para apreciação da admissibilidade do
apelo. A Terceira Turma, por maioria, admitiu o recurso ponderando que, embora o Ministério Público Federal
tenha se manifestado pela inadmissibilidade, por entender que a morte do réu inexoravelmente põe fim ao
processo, o problema não se resume a tais considerações. Na espécie, o sucessor do apelante tem legítimo
interesse no julgamento do recurso, porquanto o fato tem repercussão na área fiscal, e a sentença penal que
declarou a insuficiência de provas não impede o andamento do processo fiscal, pelo qual responderão os herdeiros,
na proporção das forças da herança. Além disso, a lei penal tutela o sentimento de respeito aos mortos, como valor
cultural e como patrimônio de honra da família, mesmo não sendo os mortos mais sujeitos de direitos, seja com a
tipificação de crimes contra a sua memória,seja permitindo a revisão criminal por iniciativa de certos parentes,
seja ensejando a nomeação de curador no caso de morte do revisionado. Ressaltou o julgado que o legítimo
interesse do filho do falecido mais avulta, quando questões morais estão envolvidas na discussão, como no caso,
em que o apelante falecido teve o seu nome envolvido em sonegação fiscal, sendo do mais vivo interesse dos
familiares limpar da sua memória tal acusação, ainda que fosse desprovida de dimensão patrimonial” (Ap.
2001.34.00.015802-3 – DF, 3.ª T., rel. Olindo Menezes, 01.03.2005, m.v., Boletim 180).
Art. 578. O recurso será interposto25-27 por petição ou por termo nos autos,28 assinado pelo recorrente ou por seu
representante.29
§ 1.º Não sabendo ou não podendo o réu assinar o nome, o termo será assinado por alguém, a seu rogo, na
presença de duas testemunhas.30
§ 2.º A petição de interposição de recurso, com o despacho do juiz, será, até o dia seguinte ao último do prazo,
entregue ao escrivão, que certificará no termo da juntada a data da entrega.31-33
§ 3.º Interposto por termo o recurso, o escrivão, sob pena de suspensão por 10 (dez) a 30 (trinta) dias, fará
conclusos os autos ao juiz,34 até o dia seguinte ao último do prazo.35
25. Admissibilidade do recurso: a verificação dos requisitos processuais de interposição do recurso, para
que ele tenha seguimento e seja encaminhado à instância superior, deve ser feita, de regra, pelo órgão que proferiu
a decisão. Excepcionalmente, a avaliação da recorribilidade é feita pelo mesmo órgão ao qual será destinado o
recurso – tal ocorre não somente quando o órgão a quo deixa, indevidamente, de dar seguimento ao recurso e a
parte reclama, pelos instrumentos próprios (também recursos) diretamente ao tribunal superior, mas também
quando o órgão ad quem vai proceder ao julgamento de mérito. Diante do exposto, da mesma forma que o
magistrado de primeiro grau pode negar seguimento ao recurso, o tribunal ad quem pode não conhecer o recurso
interposto. Ambas as decisões são juízos de admissibilidade, cuidando de questões processuais. Anote-se que,
determinado o processamento do recurso, não mais cabe ao juízo a quo obstar-lhe o seguimento, salvo quando
expressamente autorizado em lei.
26. Pressupostos de admissibilidade: os recursos necessitam ser, para o recebimento e encaminhamento
à instância superior: a) cabíveis (haver previsão legal para a sua interposição); b) adequados (deve-se respeitar o
recurso exato indicado na lei para cada tipo de decisão impugnada); c) tempestivos (interpostos no prazo legal).
Ver, ainda, a nota 4 supra. São os três pressupostos objetivos. Devem, ainda, ser: a) envoltos pelo interesse da parte
(se for vencedora em todos os pontos sustentados, não havendo qualquer tipo de sucumbência, inexiste motivo para
provocar outra instância a reavaliar a matéria); b) abarcados pela legitimidade (o recurso precisa ser oferecido por
quem é parte na relação processual, estando capacitado a fazê-lo ou quando a lei expressamente autorize a
interposição por terceiros, conforme preceituado no art. 598, que menciona as pessoas enumeradas no art. 31).
Concordamos com Ada, Magalhães e Scarance, quando sustentam não ser a competência pressuposto de
admissibilidade, pois é “mero requisito de conhecimento por parte de determinado juiz ou tribunal” (Recursos no
processo penal, p. 91).
26-A. Falta de assinatura do advogado na peça recursal: trata-se de mera irregularidade, não
impedindo o processamento do recurso. Consultar a nota 7-A ao Capítulo VIII, Título II, Livro III.
27. Mérito do recurso: ultrapassada a admissibilidade, o órgão competente para reavaliar a matéria julgada e
impugnada pela via recursal deve analisar o mérito do recurso. Significa dar-lhe ou não provimento, isto é,
considerar equivocada a decisão impugnada, reformando-a (ou anulando-a), ou crer acertada a decisão recorrida,
negando provimento ao recurso. Sustenta a doutrina que o acórdão, dando ou negando provimento ao recurso,
sempre substitui a decisão recorrida, passando a ser a decisão a que se dará cumprimento, motivo pelo qual se vê,
nos processos, após a prolação da decisão do tribunal a expressão “Cumpra-se o V. Acórdão”. Embora seja correto
esse entendimento, não vemos óbice na utilização da expressão “manutenção da decisão recorrida” pelo órgão ad
quem, uma vez que se trata, unicamente, do aspecto de fundo do recurso. Quer-se dizer que a decisão está correta.
A negativa de provimento, embora provoque o efeito substitutivo da decisão recorrida, na esfera processual,
demonstra que, na parte atinente ao direito material, o acórdão nada alterou quanto à matéria submetida a
julgamento.
28. Formalidade para a interposição: exige o Código de Processo Penal que os recursos sejam
apresentados por petição ou por termo nos autos, não se aceitando, pois, a forma verbal. Entretanto, não se pode dar
apego desmesurado às formalidades processuais. É possível que um réu manifeste seu desejo de recorrer,
oralmente, assim que toma conhecimento, na audiência ou no plenário do júri, da sentença condenatória,
merecendo seu apelo ser devidamente processado, ainda que não tenha havido a redução a termo. Outra situação
comum é tomar ciência da decisão – seja o acusado, seu defensor e até mesmo o promotor – colocando a
expressão “recorro”, o que possibilita considerar interposto o apelo, aguardando-se a formalização. Quando
oferecido em segundo grau, deve-se respeitar a forma legal, com petição e razões, sob pena de indeferimento, pois,
como regra, submete-se a criterioso exame de admissibilidade.
29. Fundamentação do recurso: pode ou não ser exigida, conforme o caso (no caso de protesto por novo
júri, por exemplo, hoje extinto, não havia necessidade de fundamentar o pedido). Por outro lado, como lembram
Ada, Magalhães e Scarance, existem os recursos de “fundamentação livre e de fundamentação vinculada”. Os
primeiros comportam qualquer tipo de alegação, demonstrando o inconformismo da parte com a decisão proferida,
tal como ocorre com a apelação, na maioria dos casos. Os segundos devem ser apresentados contendo a descrição
dos erros ou equívocos previamente descritos em lei, como ocorre com o recurso extraordinário (Recursos no
processo penal, p. 33).
30. Dispensa da formalidade: tem sido dispensada a exigência de assinatura a rogo, com duas testemunhas,
substituindo-se pela impressão digital do recorrente, mormente quando aposta na frente do oficial de justiça, que o
intima da sentença condenatória. Aliás, sempre que houver dúvida quanto à apresentação do recurso, decide-se em
favor do seu processamento.
31. Dúvida quanto à tempestividade: deve ser decidida, sempre, em favor do processamento do recurso,
visando-se com isso assegurar o duplo grau de jurisdição e a ampla defesa, mormente quando o interesse em jogo é
do acusado.
32. Início e curso da contagem do prazo: ver nota 15 ao art. 798.
33. Recurso interposto por fax: é admitido, desde que, depois, apresente o recorrente o original, em
cartório. Não é necessário que o referido original seja entregue ainda dentro do prazo, pois isso retiraria a utilidade
do fax para a interposição. Entretanto, é preciso considerar que o meio não é inteiramente seguro, pois problemas
com a máquina podem surgir, tais como falta de papel, defeitos eletrônicos, erro de comunicação, entre outros,
impossibilitando prova de que o cartório ou a Vara efetivamente recebeu o recurso. O mais garantido é apresentar o
recurso por fax e o original ainda dentro do prazo, no cartório. Com o advento da Lei 11.419/2006, dependente de
efetiva implementação da informatização do processo judicial, preceitua o art. 10 da referida lei o seguinte: “A
distribuição da petição inicial e a juntada da contestação, dos recursos e das petições em geral, todos em formato
digital, nos autos do processo eletrônico, podem ser feitas diretamente pelos advogados públicos e privados, sem
necessidade da intervenção do cartório ou secretaria judicial, situação em que a autuação deverá se dar de forma
automática,fornecendo-se recibo eletrônico de protocolo. § 1.º Quando o ato processual tiver que ser praticado
em determinado prazo, por meio de petição eletrônica, serão considerados tempestivos os efetivados até as 24
(vinte e quatro) horas do último dia. § 2.º No caso do § 1.º deste artigo, se o Sistema do Poder Judiciário se tornar
indisponível por motivo técnico, o prazo fica automaticamente prorrogado para o primeiro dia útil seguinte à
resolução do problema. § 3.º Os órgãos do Poder Judiciário deverão manter equipamentos de digitalização e de
acesso à rede mundial de computadores à disposição dos interessados para distribuição de peças processuais”
(grifamos).
34. Importância da verificação da tempestividade: determina a lei que haja imediato encaminhamento
do recurso interposto pelo escrivão ao juiz, sob pena de responsabilidade funcional. A despeito disso, a parte não
deve ser prejudicada, caso o escrivão não cumpra o prazo estabelecido. Nesse prisma, conferir a Súmula 428 do
Supremo Tribunal Federal: “Não fica prejudicada a apelação entregue em cartório no prazo legal, embora
despachada tardiamente”.
35. Impedimentos ao processamento ou conhecimento dos recursos: podem ocorrer fatos alheios
aos pressupostos de admissibilidade, que terminam impedindo o processamento ou conhecimento dos recursos.
São eles: a) desistência: quando o réu, acompanhado de seu defensor, não mais deseja persistir no inconformismo,
solicitando que o recurso cesse seu trâmite. Tal situação não é autorizada ao representante do Ministério Público;
b) renúncia: antes mesmo de ser apresentado, pode a parte sucumbida manifestar seu desejo de não recorrer da
decisão. Também nesse caso não se ajusta a hipótese ao Ministério Público. O promotor não é obrigado a oferecer
recurso, porém, não lhe cabe renunciar. Basta, querendo, deixar escoar o prazo legal para a interposição. Consultar
ainda a nota 19 ao art. 577, que cuida da múltipla legitimidade recursal, uma vez que é possível ao réu renunciar ao
direito de recorrer, mas não ocorrer o mesmo no tocante à sua defesa técnica – ou o contrário; c) deserção: quando
deixa de pagar as custas devidas (art. 806, § 2.º, parte final, CPP) ou o traslado de peças dos autos (art. 601, § 1.º,
CPP).
Art. 579. Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro.36
Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará
processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível.
36. Princípio da fungibilidade dos recursos: significa que a interposição de um recurso por outro,
inexistindo má-fé ou erro grosseiro, não impedirá que seja ele processado e conhecido. Assim, caso a parte esteja
em dúvida, por exemplo, se é caso de interposição de recurso em sentido estrito ou apelação, mesmo porque a
matéria é inédita ou controversa na doutrina ou na jurisprudência, é plausível que a opção feita seja devidamente
encaminhada para a instância superior, merecendo ser devidamente avaliada. Erro grosseiro é aquele que evidencia
completa e injustificável ignorância da parte, isto é, havendo nítida indicação na lei quanto ao recurso cabível e
nenhuma divergência doutrinária e jurisprudencial, torna-se absurdo o equívoco, justificando-se a sua rejeição.
Confira-se: STJ: “Decaindo o impetrante em parte do pedido formulado ao Tribunal de origem, em sede de habeas
corpus, é cabível a interposição de recurso ordinário, constituindo erro inescusável o manejo de recurso especial”
(REsp 53.973 – RS, 6.ª T., rel. Paulo Gallotti, 22.08.2006, DJ 09.10.2006, p. 369). A má-fé surge em variados
aspectos, embora o mais saliente seja a utilização de um determinado recurso unicamente para contornar a perda do
prazo do cabível. Exemplo de aceitação da fungibilidade: pode-se conhecer a carta testemunhável como recurso em
sentido estrito, quando for denegado seguimento à apelação (TJSP, CT 348.004-3/8, Ubatuba, 4.ª C., rel. Passos de
Freitas, 11.09.2001, v.u.). Outro exemplo pode-se encontrar no conhecimento do agravo em execução como
correição parcial, no caso da parte que se insurge contra a expedição de guia de recolhimento provisória.
Proclamou o Tribunal de Justiça de São Paulo: “Não cabe agravo antes do processo executório, que se instaura após
o trânsito em julgado da sentença condenatória e a expedição de guia definitiva de recolhimento. (...) Inadequação
do recurso eleito – Aplicação do princípio da fungibilidade – Conhecimento como correição parcial” (Agravo
342.577-3/8, Ribeirão Preto, 2.ª C., rel. Canguçu de Almeida, 31.03.2003, v.u., JUBI 83/03). Pode-se utilizar a
fungibilidade, igualmente, no campo das ações de impugnação. Em caso de dúvida entre habeas corpus e mandado
de segurança, por exemplo, para combater abusiva quebra de sigilo bancário, fiscal ou telefônico, pode-se valer de
qualquer deles (ver a nota 13-A ao Capítulo X, Título II, Livro III). Ainda sobre a fungibilidade: TJSC: “‘Para a
aplicação do princípio da fungibilidade recursal deve restar demonstrado que o defensor não obrou com má-fé ou
erro grosseiro (TJSC, Apelação Criminal 2003.017896-1, de Laguna, rel. Des. Solon d’Eça Neves, j. 02.12.03)’.
‘Erro grosseiro é aquele que evidencia completa e injustificável ignorância da parte, isto é, havendo nítida
indicação na lei quanto ao recurso cabível e nenhuma divergência doutrinária e jurisprudencial, torna-se absurdo o
equívoco, justificando-se a sua rejeição’ (Nucci, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 6.
ed. São Paulo: RT, 2007, p. 895).” (Ap. Crim. 2010.018222-4 – SC, 1.ª C.C., rel. Marli Mosimann Vargas,
23.11.2010, v.u.).
Art. 580. No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25),37-37-A a decisão do recurso interposto por um
dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.38
37. Alteração legislativa: atualmente, trata-se do art. 29 do Código Penal.
37-A. Razão de ser do art. 580: STF: “Aplicabilidade do art. 580 do CPP – razão de ser dessa norma legal:
necessidade de tornar efetiva a garantia de equidade – doutrina – precedentes“ (HC 101118 – MS, 2.ªT., rel. Celso
de Mello, 22/06/2010, v.u.).
38. Recurso e concurso de agentes: adotada, no Brasil, a teoria unitária ou monística em relação ao
concurso de pessoas, cabe observar que não importa o número de agentes colaborando para a prática da infração
penal, pois haverá o reconhecimento de somente um delito. Assim, “quem, de qualquer modo, concorre para o
crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade” (art. 29, caput, CP). Sobre o tema,
consultar a nota 2 do Título IV da Parte Geral do nosso Código Penal comentado. Logicamente, se assim é, caso
um dos coautores recorra e o Tribunal reconheça a atipicidade da conduta, por exemplo, não tem sentido manter a
condenação dos demais – ou mesmo a prisão – somente porque eles não teriam interposto apelo. Nesse caso, está-
se alterando elemento constitutivo e essencial da configuração do crime, relativo ao fato e não ao autor, razão pela
qual deve aproveitar a todos o julgamento proferido. Trata-se da extensão subjetiva do efeito devolutivo do recurso.
Por outro lado, excepciona o artigo a hipótese de benefícios de caráter pessoal. Assim, como exemplo, se um dos
coautores é menor de 21 anos, a prescrição lhe será computada pela metade. Pode ocorrer, portanto, que sua
punibilidade seja julgada extinta, enquanto a dos demais coautores permaneça íntegra. Na jurisprudência: STF: “A
Turma, com base no art. 580 do CPP [“No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do
recurso interposto por um dos corréus, se fundado em motivos que não sejam de caráter pessoal, aproveitará
aos demais.”], deferiu habeas corpus para que seja estendida ao paciente decisão proferida pelo juízo de
execuções criminais da justiça militar que computara os dias remidos pelo trabalho de corréu como pena
efetivamente cumprida. No caso, militar condenado pela prática dos crimes previstos nos arts. 225, § 2.º e 233do
CPM tivera seu pedido de extensão indeferido pelo STJ ao fundamento de que as normas contidas na Lei de
Execução Penal (Lei 7.210/84) não se aplicam a condenado que cumpre pena em estabelecimento penal militar.
Considerou-se que, não obstante a discussão acerca da adoção do instituto da remição, seja para acrescer à pena
cumprida, seja para subtrair à imposta, o ponto fundamental, na espécie, seria a concessão desse benefício ao
corréu. Assim, tendo em conta que o paciente se encontra na mesma situação jurídico-processual daquele,
entendeu-se que igual tratamento a ele deveria ser conferido” (HC 85940 – SP, 1.ª T., rel. Cezar Peluso,
20.06.2006, Informativo 432).
Capítulo II
DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO1-13
1. Conceito de recurso em sentido estrito: é o recurso cabível para impugnar as decisões
interlocutórias do magistrado, expressamente previstas em lei. Embora essa seja a regra, o Código de Processo
Penal terminou por criar exceções: a) decisão que concede ou nega habeas corpus, considerando-se este uma
autêntica ação constitucional; b) decisão que julga extinta a punibilidade do agente, pertinente ao mérito, uma vez
que afasta o direito de punir do Estado e faz terminar o processo. O ideal seria considerar o recurso em sentido
estrito como agravo, valendo para todas as decisões interlocutórias – e não somente as enumeradas em lei –
aplicando-se, ainda, a apelação para as decisões definitivas, especialmente as que envolverem o mérito.
2. Processamento: pode dar-se por instrumento, como se verá nas notas ao art. 587, bem como pode
formar-se nos próprios autos do processo principal, como será analisado nos comentários ao art. 583.
3. Conceito de correição parcial: trata-se de recurso, à disposição das partes, voltado à correção dos
erros de procedimento adotados pelo juiz de primeira instância, na condução do processo, quando provocam
inversão tumultuária dos atos e fórmulas legais. É um recurso de natureza residual, somente sendo cabível utilizá-lo
se não houver outro recurso especificamente previsto em lei (art. 6.º, I, Lei 5.010/66). Conferir: TJSP: “Presta-se
a correição parcial ao ataque às decisões ou despachos não impugnáveis por outro recurso e que representem erro
ou abuso, dos quais resulte a inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal do processo. Destina-se,
portanto, a corrigir o error in procedendo e não o error in judicando” (Cor. Parc. 266.196-3, Praia Grande, 3.ª C.,
rel. Gonçalves Nogueira, 23.02.1999, v.u.).
4. Natureza jurídica da correição: entendemos tratar-se de autêntico recurso, embora com a possibilidade
de se averiguar a conduta funcional do magistrado, determinando a turma julgadora sejam tomadas as medidas
cabíveis para, no âmbito disciplinar próprio, ser analisado o caminho a seguir. Outros, no entanto, sustentam seu
caráter puramente administrativo ou disciplinar. Em nossa visão, correta é a postura adotada pela Justiça Estadual de
São Paulo, fazendo com que a correição parcial seja julgada, normalmente, pelas câmaras criminais. Não há
participação do Conselho Superior da Magistratura ou outro órgão disciplinar similar. Nesse sentido, dispõe a Lei
Estadual 8.040/63 o seguinte: “Caberá correição parcial, para emenda de erros ou abusos que importem na inversão
tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal dos processos, quando para o caso não haja recurso” (art. 25);
“Cabe originariamente às Câmaras Isoladas dos Tribunais de Justiça e de Alçada [este foi incorporado pelo TJSP,
após a Emenda Constitucional 45/04] julgar as correições parciais, feitas as distribuições segundo a competência
para a causa principal” (art. 26); “É de cinco dias o prazo para requerer correição parcial, contado a partir da
intimação, ou do conhecimento, do ato impugnado” (art. 27). E mais, fosse uma reclamação administrativa e
poderia ser apresentada diretamente na Corregedoria Geral da Justiça, para que fosse devidamente instruída (como
se faz com qualquer representação contra magistrado), oferecendo o Corregedor Geral da Justiça o seu relatório e
voto junto ao Conselho Superior, do qual é membro. Não nos parece deva ser o caso, pois a Corregedoria tem
função eminentemente administrativa e fiscalizadora, não lhe competindo proferir decisões jurisdicionais, que
possuam reflexos no processo. Entretanto, ressalvamos que, na Justiça Federal, há entendimento diverso. O
Regimento Interno do Conselho da Justiça Federal da 3.ª Região, no art. 1.º, explicita que “o Conselho da Justiça
Federal da 3.ª Região é o órgão do Tribunal Regional Federal incumbido de presidir, nos territórios dos Estados de
São Paulo e Mato Grosso do Sul, a administração da Justiça Federal de Primeira Instância” (grifamos). No art. 4.º,
I, prevê ser da sua competência “decidir correição parcial, requerida pela parte ou pela Procuradoria da República,
no prazo de cinco dias, contra ato ou despacho de juiz de que não caiba recurso, ou omissão que importe erro de
ofício ou abuso de poder (Lei 5.010/66, art. 6.º, caput, I). Mais adiante (art. 8.º, caput, III), o Regimento estipula
ser da competência do Corregedor-Geral da Justiça Federal “relatar os processos de correição parcial (RI, art. 23,
I), bem como os de representação e justificação da conduta de Magistrados”. No mesmo prisma: “A correição
parcial, prevista no art. 167 do Regimento Interno do Tribunal de Alçada do Paraná, constitui medida administrativa
ou disciplinar destinada a levar ao conhecimento do Tribunal Superior a prática de ato processual pelo juiz,
consistente em error in procedendo, caracterizador de abuso ou inversão tumultuária do andamento do processo,
quando para o caso não existir um recurso previsto na lei processual” (TAPR, incorporado pelo TJPR, Cor. Parc.
0160474-0, Curitiba, 2.ª C., rel. Jurandyr Souza Júnior, 09.08.2000, publicação de 18.08.2000 [a Emenda
Constitucional 45/2004 extinguiu os Tribunais de Alçada]). Parece-nos, no entanto, que a função administrativa do
Conselho não poderia ampliar-se para abranger atos e decisões proferidas pelo magistrado no processo, de caráter
nitidamente jurisdicional. Uma coisa é investigar e punir o juiz que comete abusos; outra, diversa, é consertar
equívocos cometidos no trâmite processual. Esta última deveria sempre ser analisada por câmaras ou turmas
comuns do Tribunal, mas não por órgão disciplinar. A correição parcial encontra respaldo, efetivamente, em duas
leis, conforme aponta a doutrina: na Lei 1.533/51 (art. 5.º, II), que cuida do mandado de segurança [a Lei
12.016/2009, tratando, agora, do mandado de segurança, não mais menciona a correição, mas ela já se consolidou
por força da tradição], bem como na Lei 5.010/66 (art. 6.º, I), que regula a Justiça Federal de primeira instância. É,
em nosso entender, de acordo com posições já sustentadas nesse prisma, a única maneira de considerá-lo um
recurso com respaldo constitucional. Há previsão para a sua existência, feita no Código Judiciário de São Paulo
(Dec.-lei complementar 3/69), nos arts. 93 a 96, mas é preciso ressaltar que somente a União pode legislar em
matéria processual, que é de âmbito nacional e não estadual (art. 22, I, CF). Por outro lado, não é possível aplicar o
disposto no art. 24, XI, da Constituição, prevendo a possibilidade do Estado legislar concorrentemente à União
sobre “procedimentos em matéria processual”, pois a criação de um recurso não pode ser singelamente
considerada um procedimento. Dessa forma, pode-se acolher a existência da correição parcial, em face da previsão
feita nas duas leis federais mencionadas. Há outra posição, sustentando a inconstitucionalidade da utilização da
correição parcial. O principal argumento é de que as leis mencionadas (Lei 1.533/51 [hoje, substituída pela Lei
12.016/2009] e Lei 5.010/66) não criaram o recurso de correição parcial, limitando-se a mencionar a sua
existência. Assim, como compete à União legislar sobre processo, não poderiam ser levadas em conta leis
estaduais, nem regimentos de tribunais, para essa finalidade. Diz Maria Lúcia Medeiros: “Filiamo-nos à correnteque combate a medida por sua inconstitucionalidade e inadequação ao sistema processual atual, que prevê outros
meios processuais legítimos e aptos a corrigir os vícios de procedimento que servem de objeto à reclamação.
Trata-se de medida inconstitucional porque funciona, nas legislações estaduais em que é prevista, como verdadeiro
sucedâneo recursal, não se limitando a punir ou instruir o magistrado a quo mas a cassar, reformar decisões de
juízes de 1.ª instância que importem em erro de atividade, e os Estados, mesmo sob a égide da atual Constituição
Federal, continuam sem competência normativa para legislar acerca de recursos, matéria eminentemente
processual. É inconstitucional, ainda, no âmbito da Justiça Federal, quando se confere ao Conselho da Justiça
Federal competência para julgar da reclamação: se esta se limitasse à instrução ou punição dos magistrados, a
inconstitucionalidade não se daria; porém, não há que se admitir que um órgão eminentemente administrativo
controle a atividade judicante dos juízes de 1.ª instância, reformando-lhe decisões” (Anotações sobre a correição
parcial, p. 132, Revista de Processo 68, out.-dez. 1992). Assim também pensa Arruda Alvim (Correição parcial, RT
452/11-20).
5. Utilização do mandado de segurança em lugar de correição parcial: pode ser possível. Na
anterior Lei 1.533/51, mencionava o art. 5.º, II: “Não se dará mandado de segurança quando se tratar: (...) II – de
despacho ou decisão judicial, quando haja recurso previsto nas leis processuais ou possa ser modificado por via de
correição (...)”. Atualmente, a Lei 12.016/2009 estabelece: “Não se concederá mandado de segurança quando se
tratar: (...) II – de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo”. Ora, não possuindo a correição
parcial efeito suspensivo, torna-se viável a utilização do mandado de segurança em seu lugar, para proteger direito
líquido e certo.
6. Procedimento: parece-nos cabível o rito do agravo, conforme previsto no Código de Processo Civil de
1973. A justificativa baseia-se no fato de a previsão feita para a existência da correição parcial contar com singelas
menções na Lei 1.533/51 [hoje, não mais existente na Lei 12.016/2009] e na Lei 5.010/66, sem qualquer
especificação de rito a seguir. Dessa maneira, cabe ao Estado, autorizado pela Constituição Federal (art. 24, XI),
legislar concorrentemente sobre procedimento em matéria processual. Ora, criado o recurso por lei federal, mas
não disciplinado o seu processamento, coube à lei estadual fazê-lo. No Estado de São Paulo, o art. 94 do Dec.-lei
complementar 3/69 é explícito: “Observar-se-á, no processo de correição parcial, o rito do agravo de instrumento,
ouvido o Ministério Público”. Saliente-se que, a essa época, já existia o Código de Processo Penal, com a previsão
do recurso em sentido estrito, razão pela qual a intenção da lei foi estabelecer o rito do agravo cível, sem qualquer
ligação com o recurso similar do processo penal. Atualmente, modificado que foi o rito do agravo no Código de
Processo Civil de 1973, deveria a correição parcial obedecer ao mesmo trâmite, dirigindo-se a petição diretamente
ao tribunal competente e podendo ser pedido ao relator o efeito suspensivo ativo à correição. Requisitar-se-ia
informação ao juiz da causa, intimando-se a parte contrária para responder ao recurso, ouvindo-se o Ministério
Público. Seria possível haver a retratação do magistrado e o relator também estaria autorizado a indeferir a
correição liminarmente. Quanto a seguir o rito do agravo de instrumento, anote-se, foi claro o Regimento Interno
do Tribunal de Justiça de São Paulo, conforme se vê do art. 209: “O procedimento da correição parcial será o do
agravo de instrumento, como disciplinado na lei processual civil, ouvido o Procurador-Geral de Justiça”.
Atualmente, não é porque o rito do agravo foi alterado que, por conveniência, o rito da correição deveria
transfigurar-se para o do recurso em sentido estrito. No sentido que defendemos: TJSP: “Correição parcial –
Matéria criminal – Rito do agravo de instrumento do Código de Processo Civil de 1973 – Arts. 94 do Código
Judiciário do Estado de São Paulo e 831 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça[atual art. 209] –
Recebimento em Primeiro Grau, como se tratasse daquele recurso – Ausência de previsão legal – Interposição
diretamente ao Tribunal de Justiça como procedimento adequado – Lei Federal 9.139/95 – Recurso não
conhecido” (Ag. 317.809-3, Itápolis, 2.ª C., rel. Djalma Lofrano, 09.10.2000, v.u.); MS 174.499-3, Cotia, 2.ª C.,
rel. Silva Pinto, 12.12.1994, v.u.; TJMG: “A correição parcial segue o rito do agravo de instrumento, que prevê o
prazo de interposição de dez dias, razão pela qual se apresenta tempestiva. O requisito de admissibilidade do pedido
correcional referente ao cabimento exige que não haja previsão legal de recurso próprio aplicável à espécie, o que,
in casu, inocorre, levando ao não conhecimento da pretensão, nos termos regimentais” (Correição parcial
1.0000.04.409865-5/00, Uberlândia, Conselho da Magistratura, rel. Márcia Milanez, 04.10.2004, v.u., DJ
27.10.2004). E, igualmente, está a posição de Carlos Frederico Coelho Nogueira (Mandado de segurança contra
decisão judicial que assegura à testemunha a ser ouvida em inquérito policial fazer-se acompanhar de advogado, p.
147). Reconhecemos, no entanto, que tem prevalecido o entendimento de dever a correição parcial seguir o rito do
recurso em sentido estrito. Dentre os vários argumentos utilizados, estão os seguintes: a) há maior facilidade para
o réu fazer valer a autodefesa, ingressando com a correição parcial diretamente ao juiz, que, naturalmente, o
acusado já conhece, pois foi citado e interrogado. Haveria maior dificuldade de acesso ao tribunal; b) essa mesma
facilidade seria estendida à defesa técnica, mormente do interior dos Estados, que ingressaria com o recurso na
própria Comarca, sem necessidade de se dirigir à Capital, onde se encontra o tribunal; c) poderia haver uma
sobrecarga de recursos no tribunal, na área criminal, já assoberbado pelo número expressivo de habeas corpus; d)
o recurso em sentido estrito, na essência, é a figura correlata, em processo penal, ao agravo de instrumento, em
processo civil. Logo, é natural que a correição parcial siga o rito do recurso em sentido estrito. Nessa ótica: TJSP:
“Poder-se-ia objetar a utilização da correição parcial para reformar o despacho hostilizado, à consideração de se
tratar de decisão de mérito, com caráter terminativo, que desafia apelação ou, na espécie, recurso em sentido
estrito. Mas, sob a perspectiva aventada pelo Promotor de Justiça, de se cuidar de error in procedendo, calha na
hipótese a correição parcial, no mínimo à invocação de fungibilidade recursal, considerando que poderia ter
restado dúvida ao recorrente quanto à natureza jurídica do decidido. Dela conheço, por conseguinte, nos termos do
Dec. Estadual 14.235/44, com a redação dada pela Lei Estadual 8.040/63, e do art. 94 do Código de Organização
Judiciária do Estado de São Paulo, anotando que seguiu a correição o rito do recurso em sentido estrito, como de
correntia jurisprudência desta Corte” (Correição parcial 343.660-3, São Paulo, 3.ª C., rel. Walter Guilherme,
07.08.2001, v.u.); “Interposta na forma de agravo de instrumento, diretamente em segunda instância, o
processamento foi indeferido pelo Exmo. Sr. Desembargador Segundo-Vice Presidente desta Corte, determinando-
se a adoção do rito do recurso em sentido estrito” (Correição parcial 429.090-3/9, Mogi das Cruzes, 4.ª C., rel.
Passos de Freitas, 09.11.2004, v.u.); “A correição foi remetida para este Tribunal, mas foi devolvida à Vara de
origem pela E. 2.ª Vice-Presidência desta Corte, a fim de que fosse processada pelo rito do recurso em sentido
estrito. (...) De início, cumpre observar que a correição parcial não foi corretamente processada, pois deveria
seguir o rito do recurso em sentido estrito, como determinado no r. despacho de fls. 184, dando-se oportunidade à
defesa para apresentar contrarrazões (art.588 do CPP) e proferindo-se, a seguir, o despacho de sustentação (art.
589 do CPP), o que não ocorreu” (Correição parcial 430.519-3/0, Campinas, 4.ª C., rel. Hélio de Freitas,
27.04.2004, v.u.).
7. Conceito de reclamação: trata-se de ação constitucional, com caráter utilitário de recurso, à disposição
das partes, interposto contra decisões que deixem de cumprir os julgados dos tribunais, ofendendo a sua autoridade
ou usurpando-lhe competência. Encontra-se previsto, expressamente, na Lei 8.038/90, conforme disposição do art.
13: “Para preservar a competência do Tribunal ou garantir a autoridade das suas decisões, caberá reclamação da
parte interessada ou do Ministério Público. Parágrafo único. A reclamação, dirigida ao Presidente do Tribunal,
instruída com prova documental, será autuada e distribuída ao relator da causa principal, sempre que possível”. Os
Regimentos Internos dos Tribunais também a preveem e disciplinam a sua utilização. Embora tenha forte conotação
disciplinar, assim como a correição, pois medidas administrativas podem ser tomadas contra o magistrado, após o
seu julgamento, é um autêntico recurso. Afinal, nem sempre está a Corte obrigada a oficiar ao órgão competente
para solicitar a punição do magistrado. Por vezes, o equívoco não representa intenção de desatender o julgado
superior, sendo inútil tomar providências disciplinares. Além disso, representações contra juízes não comportam
pareceres das partes interessadas, uma vez que o interesse é da Administração e não da parte no processo.
Lembremos que, após a edição da Emenda 45/2004 (Reforma do Judiciário), instituindo a Súmula vinculante
(atualmente regulamentada pela Lei 11.417/2006), estipulou o art. 103-A, § 3.º, que “do ato administrativo ou
decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo
Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e
determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
7-A. Alguns enfoques sobre a súmula vinculante: cuida-se de uma realidade jurídica a sua existência.
Anteriormente à Emenda Constitucional 45/2004, as súmulas editadas pelo Supremo Tribunal Federal não
obrigavam os demais Tribunais e juízos singulares as acolherem em suas decisões. Eventualmente, poderia o
julgado de um Tribunal Estadual, por exemplo, contrariar, na literalidade, o conteúdo da súmula do STF. O máximo a
que se poderia chegar seria a parte interessada, por meio de recurso extraordinário (ou habeas corpus, em casos
criminais), atingir o Pretório Excelso e provocar a revisão do julgado. Passa-se a uma nova situação. Por força
constitucional, as súmulas denominadas vinculantes terão vigor de lei ou de decisão final do STF acerca de
qualquer assunto relevante. Dispõe o art. 103-A da Constituição Federal: “O Supremo Tribunal Federal poderá, de
ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre
matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em
relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1.º A
súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja
controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança
jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2.º Sem prejuízo do que vier a ser
estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem
propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3.º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a
súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a
procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja
proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”. Justamente pela força com que a súmula com
efeito vinculante ingressará no mundo jurídico não poderá ser descumprida, sob pena de ajuizamento de
reclamação junto ao STF, conforme já exposto na nota anterior. Não se pretende, em tese, engessar o Poder
Judiciário. As súmulas dessa natureza somente deverão ser editadas em matérias extremamente polêmicas e de
relevância notória. Com isso, almeja-se evitar o processamento de inúmeros recursos inúteis, discutindo, de
maneira protelatória, matéria mais que pacificada pela Suprema Corte. Repita-se o teor do art. 103-A, § 1.º, da CF,
bem como o art. 2.º, § 1.º, da Lei 11.417/2006, no tocante às bases para a edição de súmula com efeito vinculante:
“grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão”. A evolução da
sociedade, a mudança de leis infraconstitucionais e alterações da própria Constituição Federal, por Emenda, podem
provocar o cancelamento dessa espécie de súmula ou sua modificação. São legitimados a propor a edição, a revisão
ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a
Mesa da Câmara dos Deputados, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil, o Defensor Público-Geral da União, qualquer partido político com representação no Congresso
Nacional, qualquer confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional, a Mesa de Assembleia
Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o Governador de Estado ou do Distrito Federal, os
Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais
Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares
(art. 3.º, caput, Lei 11.417/2006). Eventualmente, o Município, quando incidentalmente ao curso de processo em
que seja parte (art. 3.º, § 1.º, Lei 11.417/2006). Naturalmente, não se pode olvidar a atuação do STF de ofício (art.
2.º, § 3.º, Lei 11.417/2006). Outro ponto relevante a destacar: “A Súmula com efeito vinculante tem eficácia
imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os
efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança
jurídica ou de excepcional interesse público” (art. 4.º, Lei 11.417/2006). Essa cautela é fundamental. Há questões
já decididas, com trânsito em julgado, não merecedoras de revisão, somente porque o STF editou súmula vinculante
a respeito. Outras, sob temática diversa, podem dar ensejo à revisão, mormente na área criminal e em benefício do
réu. A Lei 11.417/2006 não descartou a possibilidade de se utilizar, além da reclamação, outros recursos
disponíveis para fazer valer o efeito vinculante da súmula (art. 7.º, caput). Devemos incluir, neste campo, desde
logo, o habeas corpus, que pode ser impetrado pelo próprio réu ou sentenciado a qualquer tempo.
8. Fundamento constitucional: encontra-se prevista no art. 102, I, l, no tocante ao Supremo Tribunal
Federal, e no art. 105, I, f, no que se refere ao Superior Tribunal de Justiça. Destaquemos o conteúdo da Súmula
734 do STF: “Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha
desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”.
9. Processamento da reclamação: apresentado o pedido ao Presidente do Tribunal, será encaminhado,
preferencialmente, ao relator da causa principal, que requisitará informações do juiz a quem foi imputada a prática
do ato. Poderá o relator, caso necessário, suspender o curso do processo ou do ato. As informações devem seguir
em dez dias. O Ministério Público, quando não for o autor do pedido, será sempre ouvido. Se julgada procedente, a
decisãodo magistrado será cassada, determinando-se que se tome a medida correta para preservar a autoridade do
seu julgado. Competente para apreciá-la é o Órgão Especial, sendo o relator, se já não o integrar, aquele que
participou do julgamento principal. Embora julgada pelo Órgão Especial, trata-se, como se disse, de um recurso,
ainda que tenha forte conotação disciplinar, mas o fato é que diz respeito à autoridade do Tribunal, como um todo,
motivando o interesse do Pleno em apreciá-la. Verifique-se para aplicação, por analogia, o disposto no art. 988 do
CPC: “caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I – preservar a competência do
tribunal; II – garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de decisão do Supremo
Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV – garantir a observância de enunciado de
súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de
competência. § 1.º A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão
jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir. § 2.º A reclamação deverá
ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal. § 3.º Assim que recebida, a reclamação
será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível. § 4.º As hipóteses dos incisos III e
IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. § 5.º É
inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão. § 6.º A inadmissibilidade ou o
julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação”.
10. Conceito de agravo em execução criminal: é o recurso utilizado para impugnar toda decisão
proferida pelo juiz da execução criminal, que prejudique direito das partes principais envolvidas no processo.
Encontra previsão legal no art. 197 da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal): “Das decisões proferidas pelo juiz
caberá recurso de agravo, sem efeito suspensivo”.
11. Rito do agravo: explicam Ada, Magalhães e Scarance a origem da denominação agravo para esse
recurso: “É que, à época em que estava sendo objeto de exame o projeto da Lei de Execução Penal, estava também
sendo discutido projeto de Código de Processo Penal, no qual estava previsto o agravo de instrumento. A exigência
de uniformidade entre os futuros diplomas, que deveriam passar a vigorar juntos ou em datas próximas, fez com que
o legislador incluísse o agravo no projeto da Lei de Execução Penal, não o recurso em sentido estrito do vigente
Código. Corresponderia ao agravo de instrumento previsto no projeto do CPP. Não houve qualquer preocupação
quanto ao rito, pois seria seguido o do agravo do Código em discussão” (Recursos no processo penal, p. 196).
Ocorre que o Código de Processo Penal não foi modificado e, logo que a Lei de Execução Penal foi editada,
iniciou-se a discussão a respeito de qual rito seria seguido para o agravo em execução criminal. Muitos, àquela
época, posicionaram-se pela adoção do rito do agravo de instrumento, do Código de Processo Civil de 1973,
somente porque a denominação do recurso era similar. Outros, por parecença com o recurso em sentido estrito
ficaram com o rito para este previsto, até porque se trata de matéria criminal, bem como inúmeros pontos do art.
581 – antes da esfera de impugnação do recurso em sentido estrito – passaram a ser objeto de contestação por
intermédio do agravo. A questão não era tão relevante, pois ambos – agravo de instrumento e recurso em sentido
estrito – tinham ritos praticamente idênticos. Utilizou-se, é verdade, no passado, majoritariamente, o rito do agravo
de instrumento do Código de Processo Civil de 1973. Entretanto, com as alterações produzidas pela Lei 9.139/95,
atingindo o agravo no processo civil, a jurisprudência imediatamente recuou no seu entendimento anterior,
passando a adotar – o que predomina hoje – o rito do recurso em sentido estrito para regular o agravo em execução
criminal. Não há dúvida de que foi a decisão acertada. Ressalte-se, em primeiro lugar, que a intenção do agravo era
acompanhar o rito do recurso que iria substituir, no processo penal, o recurso em sentido estrito, ou seja, o agravo
de instrumento. Não tendo ocorrido a mudança esperada, mais certo que o agravo fique circunscrito ao
procedimento do recurso em sentido estrito. A matéria é criminal e, realmente, o agravo substituiu – e muito – o
que antes era decidido no âmbito do recurso previsto no art. 581. Além disso, para o réu e para o membro do
Ministério Público, é mais simplificado o procedimento do recurso em sentido estrito. Tanto é realidade que Ada,
Magalhães e Scarance, embora sustentem que o rito deve ser o do novo agravo do processo civil, sugerem várias
adaptações para facilitar o seu emprego (ob. cit., p. 200-203). A nós, parece mais adequado utilizar o rito do
recurso em sentido estrito, sem necessidade de se fazer qualquer adaptação. Acrescente-se, ainda, que a lei federal,
instituidora do agravo em execução, não deu a menor pista sobre o rito, apenas chamando de agravo o recurso.
Logo, nada impede que se adote o processo da analogia com o recurso em sentido estrito para o seu trâmite. Deve-
se utilizar, ainda, para sustentar essa posição o constante no art. 2.º, caput, da Lei de Execução Penal: STF: “A
jurisdição penal dos juízes ou tribunais da justiça ordinária, em todo o território nacional, será exercida, no
processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal” (grifamos). Assim é a posição
maciça dos Tribunais pátrios. STF: “No caso, há uma perfeita analogia, pois, diante do silêncio da lei quanto ao
procedimento e dizendo a Lei de Execução que o CPP é fonte principal (art. 2.º), neste deve ser buscada a solução
e esta somente pode ser o recurso em sentido estrito, cuja natureza é semelhante ao agravo” (Min. Carlos Velloso –
relator). E, no mesmo acórdão: “No campo do processo penal, nota-se um descompasso, porque, enquanto a
apelação e o recurso em sentido estrito devem ser interpostos dentro de cinco dias, a prevalecer a tese dos dez dias
previstos no CPC, teremos prazo maior para um simples incidente de execução, ou seja, se se quer recorrer de um
ato condenatório, deve-se fazê-lo no prazo de cinco dias. Uma vez transitada a decisão, havendo incidente na
execução, abre-se para o interessado o prazo de dez dias. O que não consigo conciliar é essa dualidade: ter-se –
repito – no tocante ao recurso passível de enquadramento como principal, o prazo de cinco dias e relativamente ao
incidente da execução, por aplicação subsidiária, o de dez dias, quando, historicamente, o agravo corresponde ao
recurso em sentido estrito, que está disciplinado no CPP” (Min. Marco Aurélio – voto vencedor) (HC 75.178 – RJ,
2.ª T., rel. Carlos Velloso, 30.09.1997, v.u., DJ 12.12.1997, RT 750/539, embora antigo, a posição não se alterou).
Assim também a jurisprudência majoritária dos tribunais brasileiros.
12. Prazo de interposição do agravo em execução: é de cinco dias, a contar da ciência da decisão,
conforme Súmula 700 do STF: “É de 5 (cinco) dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da
execução penal”. Admite-se que o réu o faça diretamente, por termo, desde que, em seguida, o juiz determine a
abertura de vista ao advogado, para a apresentação de razões, garantindo-se a ampla defesa. A legitimidade estende-
se ao defensor e ao Ministério Público, primordialmente. Não é demais acrescer o representante legal do
condenado, seu cônjuge, parente ou descendente, conforme legitimidade conferida, para dar início aos
procedimentos da Lei de Execução Penal, a essas pessoas, pelo art. 195. Além disso, não se pode subtrair o
interesse que tenham, ao atuar em defesa do condenado. Mas, deve haver bom senso na aplicação do dispositivo
(art. 195). Não se incluem como legitimados a recorrer nem o Conselho

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