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- -1 DIREITO DAS EMPRESAS APLICADO UNIDADE 3 – SOCIEDADES Saulo Bichara Mendonça - -2 Introdução Nesta unidade, você verá que a sociedade limitada tem foco principal na responsabilidade patrimonial do sócio nos tipos diferentes de sociedades regulamentadas no Código Civil. E para compreender adequadamente a sistemática da responsabilidade limitada, ilimitada, solidária ou subsidiária, os conceitos de sociedades simples e empresária serão revisitados de forma mais profunda e exemplificada a partir do estudo da estrutura das cooperativas. Na sequência, as sociedades em nome coletivo, em comandita simples e em comandita por ações serão, igualmente, revisitadas para demonstrar que a legislação permite que tipos societários menores podem ser instituídos para o desenvolvimento de atividades simples e empresária com sócios que assumem responsabilidades ilimitada e subsidiária. Compreendendo essas formas de celebrar contratos sociais e realizar negócios jurídicos, a partir de estruturas societárias, vamos estudar as sociedades limitadas, antigas sociedades por quotas de responsabilidade limitada, conhecendo seu histórico legislativo, suas características principais, que a tornam atrativa a empreendedores de variados níveis, e sua estrutura funcional. Conhecendo juridicamente a sociedade limitada, vamos compreender a razão da estipulação da responsabilidade patrimonial dos sócios quotistas tal como a lei a define, bem como conhecer e compreender os atos normativos orbitais determinados pelo Departamento de Registro de Empresa e Integração (DREI) que devem ser observados por aqueles que almejarem instituir uma sociedade e pelas Juntas Comerciais, enquanto órgãos de registro das sociedades empresárias. Vale ressalvar sempre que, à exceção das cooperativas e das sociedades por ações, os demais tipos societários podem ser instituídos para fins empresariais e não empresariais, consoante se estudou no art. 1.150 do Código Civil, restando às cooperativas apenas para fins não empresariais e as sociedades por ações apenas para fins empresariais, por força, respectivamente, da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971 e Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Acompanhe com atenção e bons estudos! 3.1 Sociedade cooperativa: disciplina jurídica, noções gerais, estrutura e responsabilidade dos sócios As cooperativas são, por natureza, sociedades simples, consoante prescreve o art. 982 do Código Civil, como nos traz Mamede (2018, p. 468-469): As cooperativas são pessoas jurídicas de Direito Privado, organizadas a partir da reunião de pessoas; são, portanto, coletividades de pessoas ( ), mais especificamente,universitates personarum sociedades, já que têm finalidade econômica, embora não tenham finalidade lucrativa. Na condição de sociedades simples, possuem regulamentação jurídica específica e livre instituição, na forma da lei, independente de autorização, vedada a interferência estatal em seu funcionamento. Não confunda, contudo, a independência de autorização com desnecessidade de registro. Muito embora o Estado não possa intervir de forma a proibir sua constituição, seus atos constitutivos devem ser levados a registro na Junta Comercial, nos termos do art. 18 da Lei nº 5.764/71 e art. 32 da Lei nº 8.934/94. Dessa forma, vê-se que, excepcionalmente, apesar de serem sociedades simples, as cooperativas devem ser - -3 Dessa forma, vê-se que, excepcionalmente, apesar de serem sociedades simples, as cooperativas devem ser registradas na Junta Comercial do Estado de sua sede, representando exceção ao disposto no art. 1.150 do Código Civil. Aqui, vale um destaque: sempre que houver conflito entre normas gerais e especiais, prevalecem estas últimas, conforme se depreende da leitura da lei de introdução às normas do Direito brasileiro. Mas, apesar de serem sociedades simples, não se pode negar a necessidade de as cooperativas desenvolverem atividade econômica de forma eficiente a lhes permitir efetiva sustentabilidade. A sociedade cooperativa oscila entre fins ideias e especulativos, pois, conquanto seu objetivo, a rigor, não seja o lucro, nisso se assemelhando à associação, este não está de todo afastado, já que dificilmente se sustentará uma cooperativa deficitária (ALMEIDA, 2005, p. 363-364). Compreendida a sistemática que decorre do conceito das sociedades cooperativas, passa-se a interpretar e assimilar a disciplina jurídica regulatória dessa espécie societária. 3.1.1 Disciplina jurídica A sociedade cooperativa rege-se, como já mencionado, pela Lei nº 5.764/71 que, na qualidade de lei especial, prevalece sobre pontos que o Código Civil eventualmente dispuser de forma contrária. Assunto tratado nos arts. 1.093 ao 1.096 do código citado. Ambas as legislações devem ser consideradas a partir do art. 5º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, que representa o fundamento constitucional das cooperativas. Dessa forma, tem-se a lei especial citada como uma lei recepcionada e os dispositivos do Código Civil como constitucionais. Eventuais casos omissos ainda podem ser solucionados pelas disposições legais atinentes às sociedades simples. 3.1.2 Noções gerais As cooperativas, como sociedades simples que são, podem ser caracterizadas pela sua variabilidade ou dispensa do capital social; concurso de sócios em número mínimo necessário de 20, sem limitação de número máximo, tal como determina o art. 6º, inciso I, da Lei nº 5.764/71, que, excepcionalmente, permite a admissão de pessoas jurídicas que tenham por objeto as mesmas ou as correlatas atividades econômicas das pessoas físicas ou, ainda, aquelas que desenvolvam atividades econômicas sem fins lucrativos. Os cooperativados são impossibilitados de transferirem suas quotas a terceiros estranhos à sociedade, ainda que por herança, também terão limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá possuir. Nas assembleias gerais realizadas na cooperativa, o quórum de instalação será de dois terços do número total de associados, em primeira convocação, e de metade mais 1 dos associados em segunda convocação e de, no mínimo, de 10 cooperativados em eventual terceira convocação, ressalvado o caso de cooperativas centrais e VOCÊ QUER LER? O Sistema de Organização das Cooperativas Brasileiras é o representante nacional do cooperativismo que reuni e fortalece os interesses comuns dos agentes que atuam no setor. Você pode conhecer os serviços que esse sistema oferece, além de conhecer mais sobre o cooperativismo no Brasil, acessando o site (SISTEMA OCB, 2019): <https://www.ocb.org.br >./servicos - -4 mínimo, de 10 cooperativados em eventual terceira convocação, ressalvado o caso de cooperativas centrais e federações e confederações de cooperativas, que se instalarão com qualquer número, consoante o art. 40 da citada lei. Observe que para a assembleia geral funcionar e deliberar, exige-se um número de sócios presentes à reunião, e não uma parcela de detentores do capital social, como é comum no caso das sociedades empresárias. A cada sócio caberá o direito a um só voto nas deliberações, a despeito de ter ou não capital a sociedade, e qualquer que seja o valor de sua participação. Os resultados auferidos serão distribuídos proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a cooperativa. Por ser sociedade simples, o fundo de reserva será indivisível entre os sócios, mesmo que em caso de dissolução da cooperativa. 3.1.3 Responsabilidade dos sócios Na cooperativa, a responsabilidade dos sócios pode ser limitada ou ilimitada, conforme variações de situações previstas na Lei nº 5.764/71. Figura 1 - A proposta do cooperativismo é que os cooperados venham a colaborar mutuamente uns com os outros, de forma que a cooperativa atenda aos interesses e demandas comuns deles conjuntamente, assim, um coopera com o outro mútua e reciprocamente. Fonte: Jelica Videnovic, Shutterstock, 2019. Em regra, será limitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responda somente pelo valor de suas quotas e pelo prejuízo verificadonas operações sociais, guardada a proporção de sua participação nas mesmas operações, e ilimitada quando o sócio responder solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais. - -5 3.1.4 Estrutura Durante muito tempo, as cooperativas tinham sua estrutura fundamentada sobre cláusula de exclusividade, também conhecida como unimilitância, que vedava a vinculação dos cooperativados em instituições congêneres. Contudo, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) emitiu o enunciado 7 da Súmula da Jurisprudência, reconhecendo o rigor excessivo da referida cláusula, segundo que a manutenção de cláusulas proibitivas configuraria prática anticompetitivas (BRASIL, 2009). Após a discussão, retornou ao Superior Tribunal de Justiça que reviu o entendimento e alinhou-se com o precedente antitruste do CADE (STJ, 2010). 3.2 Sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade em comandita por ações: principais características e disciplina legal As sociedades em nome coletivo, em comandita simples e em comandita por ações, juntamente com as sociedades em conta de participação e em comum são conhecidas como sociedades de tipos menores, justamente por serem compostas, no todo ou em parte, por sócios detentores de responsabilidade patrimonial ilimitada. Mas os três tipos societários que se destacam aqui diferenciam-se dos outros dois mencionados por último porque o registro dos seus atos constitutivos acarreta o surgimento da personalidade jurídica, nos termos do art. 985 do Código Civil. Contudo, mesmo tendo as referidas sociedades personalidade jurídica regularmente constituída pelo registro dos atos constitutivos no respectivo órgão competente, todos os sócios na sociedade em nome coletivo, os sócios comanditados, nas sociedades em comandita simples e os sócios (acionistas) diretores, nas sociedades em comandita por ações, ostentaram responsabilidade patrimonial ilimitada pelas obrigações assumidas em nome da sociedade que compõem. Mesmo assumindo responsabilidade patrimonial de forma ilimitada, a lei determina que os credores da sociedade só acionem os sócios diretamente quando restar verificado que a sociedade em si não possui bens suficientes para honrar os compromissos assumidos. Essa regra é conhecida como benefício de ordem e consta no art. 1.024 do Código Civil que deve ser aplicado nos termos do art. 795, §1º do Código de Processo Civil. Assim, se verifica o entendimento consolidado nos precedentes jurisprudenciais, como se vê no julgado TRT23 (2013). Mesmo no caso das sociedades simples, destinadas ao desenvolvimento de atividades econômicas sem fins lucrativos (não empresariais), esses tipos jurídicos de sociedade não se mostram tão atrativas, pois o risco dos sócios de responsabilidade patrimonial ilimitada serem obrigados a honrar compromissos assumidos em nome VAMOS PRATICAR? Consulte o enunciado 7 da Súmula da Jurisprudência do CADE e busque por jurisprudências relacionadas à cláusula de exclusividade ou unimilitância constante nos estatutos sociais de cooperativas e redija um parecer acerca do tema, evidenciando os parâmetros que norteiam a discussão e ressaltando o posicionamento que prevalece e os fundamentos que os sustentam. - -6 sócios de responsabilidade patrimonial ilimitada serem obrigados a honrar compromissos assumidos em nome da sociedade existe, mesmo com a restrição imposta pelo benefício de ordem. Dessa feita, sendo intuito dos sócios desenvolverem uma atividade econômica, empresarial ou não, por meio de uma sociedade regularmente constituída, em que o registro dos atos constitutivos da sociedade permite que se verifique nela uma pessoa distinta da pessoa dos seus sócios, a alternativa mais interessante será a sociedade limitada, como você irá verificar no tópico a seguir. 3.3 Sociedade limitada: formação histórica e tendências de transformação, evolução legislativa e a disciplina no Código Civil As sociedades limitadas, hoje regulamentadas no Código Civil, dentre os arts. 1.052 a 1.087, eram, até então, chamadas de sociedades por quotas de responsabilidade limitada, quando da vigência do revogado Decreto nº 3.708, de 10 de janeiro de 1919. O revogado decreto regulamentava um tipo societário mais simples, se comparado à sociedade por ações, descrita na citada Lei nº 6.404/76. O objetivo do legislador foi instituir um tipo societário menos burocrático e mais objetivo, consequentemente, mais apropriado a pequenos empreendimentos e/ou negócios empresariais familiares. Com o advento do Código Civil e a centralização das normas de direito empresarial neste instituto jurídico, revogou-se o Decreto nº 3.708/19 e atribuiu-se às sociedades limitadas (agora assim denominadas) normas mais atinentes às demandas enfrentadas pelos empreendedores atuais. O dinamismo encontra subsídios também na Instrução Normativa nº 38/2017, DREI, responsável por atribuir às sociedades limitadas características muito semelhantes às companhias de capital fechado. Fato que decorre do profissionalismo demonstrado pelos empreendedores atuais que permite distinguir o atual empresário (definido no art. 966 Código Civil) do antigo comerciante (conceituado pelo derrogado Código Comercial brasileiro. Mas, a despeito das transformações e evoluções legislativas, a característica da limitação da responsabilidade patrimonial dos sócios ao montante investido em quotas destinado à integralização do capital social subsiste. Assim, nas sociedades limitadas, o montante investido serve de parâmetro para a limitação da responsabilidade patrimonial dos sócios perante os compromissos financeiros e patrimoniais assumidos em nome desta. Serve também como parâmetro para o exercício do direito de voto. Nas limitadas, ao contrário do que se estudou VAMOS PRATICAR? Considere uma sociedade hipotética, composta por quatro sócios sendo um detentor de responsabilidade patrimonial ilimitada e três detentores de responsabilidade patrimonial limitada, chamamo-los respectivamente de sócios A, B, C e D. Considere que a sociedade se encontra em financeiro e patrimonial e com sérias dificuldades econômicas que a levamdéficit a ser ré em ações de cobrança e ações de execução, razão pela qual os sócios buscam informação sobre as possíveis consequências jurídicas que os patrimônios pessoais podem sofrer em caso de condenação da sociedade em tela. Dessa forma, redija um parecer elucidativo e fundamentado tendo como tema o benefício de ordem aplicável nas sociedades compostas por sócios com responsabilidade patrimonial ilimitada. - -7 Serve também como parâmetro para o exercício do direito de voto. Nas limitadas, ao contrário do que se estudou sobre as cooperativas, o direito de voto do sócio nas deliberações sociais é proporcional ao que elequantum investiu para a formação da sociedade. Figura 2 - Os direitos decorrentes do investimento feito na composição da sociedade limitada são proporcionais aos valores investidos, dessa forma, as decisões não são tomadas por maioria de votos, mas pelo voto daquele que detêm maior parcela do capital social. Fonte: Adrian Niederhaeuser, Shutterstock, 2019. Ou seja, o legislador regulamentou que os sócios respondem perante a sociedade pelo valor das quotas que subscrevem, de forma limitada, mas devem, concomitantemente, responder solidariamente pela obrigação do sócio que subscrever e não integralizar tempestivamente, nos moldes com os quais se comprometem quando assinam o contrato social. Naturalmente, o sócio que for levado a integralizar a quota do outro remisso passará a ser detentor de direito de regresso, ou seja, um sócio pode ser levado a honrar a dívida de outro inadimplente, mas poderá exigir dele a compensação pelo valor que pagou por ele em razão da determinação legal. Não havendo compensação financeira regular, pode o sócio no exercício do direito de regresso exigir a adjudicação das quotas do então remisso, aumentando, dessa forma, sua porcentagem de participação no capital social. Assim, na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócioé restrita ao valor de suas quotas, mas todos VOCÊ QUER VER? Sobre a responsabilidade patrimonial dos sócios, assista ao vídeo (2017) <https://www. > e entenda um pouco mais sobre os efeitos práticos dayoutube.com/watch?v=jywqK40yP9U regulação jurídica acerca da responsabilidade patrimonial dos sócios na sociedade limitada. - -8 Assim, na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. A Medida Provisória nº 881, de 30 de abril de 2019, tão logo convertida em lei (se o for) alterará o Código Civil, incluindo parágrafo único ao art. 1.052, com a seguinte redação: “a sociedade limitada pode ser constituída por uma ou mais pessoas, hipótese em que se aplicarão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social” (BRASIL, 2019, ). Sobre a presente proposta, há que se consideraron-line que (clique para ler): o teor da referida proposta ainda não tem força de lei e pode perder totalmente a eficácia, haja vista que, de acordo com o art. 62, §3º, da Constituição Federal, medidas provisórias podem perder a eficácia desde a edição se não forem convertidas em lei no prazo de 60 dias, prorrogável, nos termos do § 7º do mesmo artigo, uma única vez, por igual período; se a referida medida provisória for convertida em lei pelo Poder Legislativo federal e o parágrafo único for acrescentado ao art. 1.052 do Código Civil, instituir-se-á a chamada sociedade unipessoal mitigando a força que o princípio da pluralidade societária tem sobre a regulamentação legal sobre direito societário. Como se verificou oportunamente, em regra, as sociedades são constituídas pela união de dois ou mais sócios com propósito comum, sendo exceções a unipessoalidade incidental (art. 1.033, inciso IV do Código Civil) e a subsidiária integral (art. 251 da Lei nº 6.404/76); além de mitigar o princípio da pluralidade societária, a conversão da referida medida provisória em lei nos termos postos provavelmente acarretará em demanda hermenêutica comparativa em relação ao instituto da EIRELI que, embora não configure um tipo societário, é, tal qual as sociedades regularmente constituídas, considerada como pessoa jurídica e, tal qual eventual sociedade unipessoal, é de titularidade de um único agente econômico. Atualmente, além dos termos previstos entre os arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil, as sociedades limitadas também podem ser regidas, em casos de omissões, pelas normas da sociedade simples, podendo os sócios determinarem no contrato social regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade por ações, se assim o desejarem. O referido contrato social instituidor das sociedades limitadas deverá mencionar, sempre no que couber, as indicações constantes no art. 997 do Código Civil, ressalvada a possibilidade de se instituírem cláusulas facultativas que não contrariem a lei e os bons costumes, atentando sempre aos requisitos para o negócio jurídico válido, art. 104 do Código Civil. Na sociedade limitada, o capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio, devendo o contrato social estipular os seus valores e o prazo e forma para integralização. Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social, devem os sócios responder solidariamente, até o prazo VOCÊ O CONHECE? André Luiz Santa Cruz Ramos, doutor em Direito Comercial pela PUC-SP, é Procurador Federal da Advocacia Geral da União (AGU) desde 2004, diretor do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), da Secretaria de Governo Digital, da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo do Ministério da Economia. Ele é o relator da Medida Provisória nº 881 que traz uma série de regras que desburocratiza e simplifica o exercício de atividades econômicas e que já teve o seu relatório aprovado na Comissão Mista. Ainda faltam as votações nos plenários das duas Casas, Câmara dos Deputados e Senado Federal. - -9 Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social, devem os sócios responder solidariamente, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade no respectivo órgão competente, Junta Comercial, se empresária, e Registro Civil de Pessoas Jurídicas, se simples, art. 1.150 do Código Civil, ressalvando a vedação legal de que a contribuição consista em prestação de serviços por parte dos sócios. Em relação à sociedade, a quota é indivisível, salvo para efeito de transferência, caso em que, na omissão do contrato, o sócio poderá ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente da anuência ou mesmo oitiva dos outros, ou mesmo a estranhos, se não houver oposição de sócios titulares de mais 25% do capital social. Observe que a cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros apenas a partir da averbação do instrumento de alteração do contrato social devidamente subscrito pelos sócios que com a cessão concordarem. A quota pode ser um bem em condomínio, nesse caso, os direitos a ela inerentes só poderão ser exercidos pelo condômino representante, ou pelo inventariante do espólio de sócio falecido; respondendo todos os condôminos solidariamente pelas prestações necessárias à sua integralização, a despeito do disposto no art. 1.052 do Código Civil. O sócio remisso, isto é, aquele que subscreveu mas não integralizou sua quota, poderá perdê-la em favor dos demais sócios que com ele respondem solidariamente; poderá também perdê-la em favor de terceiros que venham a compor o prejuízo mediante anuência dos demais sócios, excluindo, assim, o primeiro titular da relação societária, devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas. Se acaso o contrato social prever a aplicação subsidiária da lei das sociedades por ações, poderá a sociedade em si quitar a dívida com valores constantes na conta lucros ou reservas e manter as quotas depositadas na tesouraria da sociedade (arts. 106 e 107 da Lei nº 6.404/76), evitando a redução indesejada do capital social. Perceba que a sociedade limitada é um tipo societário representativo de uma estrutura jurídica mais compacta, se comparada a estrutura jurídica das sociedades por ações, mas representativa de uma engrenagem destinada ao bom desenvolvimento de negócios, especialmente os de natureza empresarial, com dinamismo e diminuta burocracia, voltado à sociedades compostas com poucos sócios, mas não necessariamente baixo investimento. Não há óbice que impeça sociedades limitadas serem empresas de grande porte, até porque o parâmetro para definir pequenas empresas é o montante auferido como faturamento bruto anual. De igual forma, nada impede que as sociedades limitadas sejam instituídas para fins não empresariais, considerando os termos do art. 1.150 do Código Civil e a ausência de proibição regulamentar direta nesse sentido. VOCÊ SABIA? A norma constante no art. 1.053 do Código Civil, no sentido de que às sociedades limitadas se apliquem, subsidiariamente, as normas das sociedades por ações é uma reprodução do art. 18 do Decreto nº 3.708/19. Isso porque, apesar da atual lei das sociedades por ações datar de 1976 (Lei nº 6.404), a companhia representa um dos tipos societários mais antigos, fato que justifica sua complexidade e amplitude, sendo perceptível sua adoção para a realização de variáveis tipos de negócios no segmento empresarial. Gostaria de ler mais um pouco sobre a evolução história das sociedades por ações? Acesse o link (FILIZOLA GONÇALVES, 2019) < > e conheçahttp://www.filizolagoncalves.com.br/evolucao-historica-da-sociedade-anonima/ mais detalhes. - -10 Figura 3 - As sociedades limitadas, especialmente as instituídas para fins empresariais, em regra, possuem poucos sócios que, naturalmente, participam ativamente do desenvolvimento regular da atividade empresária, por isso é comum verificar uma confusão da figura do sócio com a do empresário, contudo, tais conceitosjurídicos são distintos. Fonte: ESB Professional, Shutterstock, 2019. No tópico a seguir, vamos estudar a responsabilidade do sócio quotista, muito semelhante à do acionista (sócio da companhia) e você irá perceber a distinção jurídica e prática em relação à responsabilidade da sociedade empresária em si, consoante se verificará nos limites postos pela disciplina normativa. 3.4 Responsabilidade do sócio quotista: ordinárias e especiais, limites e disciplina normativa Consoante se verifica no art. 1.052 do Código Civil, ao contrário dos demais tipos de sociedades estudadas até aqui, os sócios da sociedade limitada, conhecidos como sócio quotista (ou cotista), têm responsabilidade limitada ao valor das quotas que subscreveu e solidária aos demais sócios que subscreverem quotas da sociedade limitada. Os sócios quotistas, ao entabularem os termos do contrato social, celebram contrato plurilateral comprometendo-se a integralizar as quotas que subscrevem no ato da assinatura do contrato social. Esse negócio jurídico produz (ou deve produzir) dois efeitos imediatos (clique para ler): limitar a responsabilidade patrimonial dos sócios ao montante assinalado no contrato social, evitando que os demais bens que compõem o patrimônio pessoal dos sócios sejam alcançados por credores da sociedade; e, instituir o patrimônio da sociedade a partir da consolidação do capital social, patrimônio este que será responsável pelas obrigações assumidas pela sociedade enquanto pessoa jurídica presentada por seus administradores (sócios ou não). Perceba que o objetivo do contrato social celebrado nesses termos não é prejudicar os credores da sociedade, mas assegurar que os sócios, na qualidade de investidores, consigam assegurar que uma parte dos bens que compõem o seu patrimônio pessoal fique assegurado dos resultados alcançados pela atividade econômica desenvolvida pela pessoa jurídica representativa da sociedade empresária (ou não). Dessa forma, o legislador atribui efetividade ao princípio da livre iniciativa conhecido por ser corolário de um - -11 Dessa forma, o legislador atribui efetividade ao princípio da livre iniciativa conhecido por ser corolário de um dos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito e também da ordem econômica do Estado, o princípio da livre iniciativa (art. 1º, inciso IV e art. 170 da Constituição Federal), como asseveram Souza Neto e Mendonça (2009, p. 519): “a livre iniciativa está funcionalizada aos objetivos constitucionais de sabor ‘social’”. Figura 4 - O contrato social instituidor da sociedade limitada, devidamente subscrito pelos sócios, representa instrumento de alta relevância para estes, como ato jurídico protetor e delimitador do patrimônio. Tão logo o contrato social seja registrado passa a ser oponível a terceiros de boa-fé. Fonte: ASDF_MEDIA, Shutterstock, 2019. A limitação da responsabilidade patrimonial dos sócios em uma sociedade limitada é fator preponderante para a efetiva realização de empreendimentos, pode-se dizer que a regulamentação desse tipo de sociedade é essencial para a operacionalização de incontáveis empreendimentos empresariais, é a concretização do espírito liberal de forma socialmente isonômica. O liberalismo, além de se pronunciar sobre política, prescreve um modelo global de organização da sociedade, concebendo, em especial, padrões de regulação econômica. É, portanto, uma doutrina abrangente, que enfrenta, em muitos aspectos, sérias críticas. [...] o Estado de Direito é um dos elementos centrais da configuração política que permite a cooperação social em um ambiente de pluralismo (o outro elemento é a democracia) (SOUZA NETO; MENDONÇA, 2009, p. 514). A limitação da responsabilidade patrimonial dos sócios representa estímulo à constituição de sociedade limitadas, consequentemente, identifica-se nesta regra um fomento à atividade econômica e à competitividade de forma geral. Competitividade entendida como a capacidade da empresa em formular e implementar estratégias de concorrência que lhe permita ampliar ou conservar uma posição no mercado. A empresa será competitiva quando na produção de determinado produto, ela consegue igualar-se aos padrões de eficiência vigentes no resto do mundo, mantida a mesma relação na utilização de recursos e qualidade de bem (GOMES, 2004, p. 18). Não se pode, porém, confundir a responsabilidade limitada do sócio para com o montante por ele investido na integralização das quotas com a responsabilidade da sociedade limitada perante os compromissos que assumir. A responsabilidade da sociedade limitada, regularmente constituída em pessoa jurídica, será sempre ilimitada, - -12 A responsabilidade da sociedade limitada, regularmente constituída em pessoa jurídica, será sempre ilimitada, ou seja, se por um lado os sócios, em regra, respondem apenas pelo valor de suas quotas, por outro, a sociedade responderá com tudo o que possui pelos compromissos que assumir perante terceiros, credores de boa-fé. Se acaso os bens que compõem o patrimônio da sociedade não forem suficientes para honrar os compromissos por ela assumidos, os sócios, em regra, não serão obrigados a dispor de mais do que já dispuseram para regular integralização das quotas sociais. Diz-se em regra porque há situações que justificam a desconsideração da personalidade jurídica. Da mesma forma, se por um lado o contrato social representa instrumento limitativo da responsabilidade dos sócios ao montante destinado a regular integralização das quotas sociais, por outro, havendo malversação dos fins aos quais se destina a sociedade, uso inapropriado da pessoa jurídica pelos seus sócios ou administradores e confusão patrimonial, isto é, dificuldade de verificar o que representa patrimônio dos sócios e administradores e o que é patrimônio da sociedade, restará verificada condições que justifiquem a desconsideração da personalidade jurídica. Percebe-se que a desconsideração da personalidade jurídica representa instrumento jurídico destinado a proteger a sociedade em si, enquanto pessoa jurídica, da má fé de seus sócios ou administradores, uma vez que comprovados abusos por partes destes no uso da pessoa jurídica, de forma que venham se valer dela para se locupletarem ilicitamente, a desconsideração da personalidade jurídica permite que se suspenda o manto da personalidade jurídica a fim de resgatar no patrimônio pessoal dos sócios ou administradores os bens que lá se encontram de forma indevida, irregular ou ilícita, em razão do desvio de bens da pessoa jurídica em si. VAMOS PRATICAR? Uma sociedade limitada constituída por cinco sócios que dividem entre si o capital social de forma igualitária, na ordem de 20% para cada sócio, tem em seu contrato social, na cláusula capital social, a determinação de que os sócios integralização o capital social da seguinte forma: o sócio A integralizará suas quotas à vista, no ato da assinatura do contrato social, e em espécie; o sócio B integralizará suas quotas em três parcelas iguais e sucessivas, vencíveis, respectivamente, em 30, 60 e 90 dias a contar da assinatura do contrato social, por meio de transferência para conta bancária da sociedade; o sócio C integralizará suas quotas por meio de transferência de um veículo automotor discriminado e avaliado nos termos anexo ao contrato social; o sócio D integralizará suas quotas por meio de transferência de títulos a receber, pelos quais responderá solidariamente em caso de inadimplência dos sacados indicados; o sócio E integralizará suas quotas por meio de serviços prestados à sociedade durante os seis meses subsequentes à assinatura do contrato social, devendo comparecer e trabalhar na sociedade diariamente por até 10 horas por dia. Apresentado o contrato social à Junta Comercial do Estado onde se localiza a sede da sociedade, o registro foi negado pelo vogal que procedeu à análise, sob a justificativa de que os termos entabulados no referido documento estão em desacordo com a norma vigente. Como profissional especializado em Direito Empresarial Societário,redija um parecer que esclareça fundamentadamente como se poderia justificar ou não a negativa da Junta Comercial em registrar o contrato social nos termos informados. - -13 Síntese Concluímos esta unidade compreendendo a sistemática das sociedades cooperativas, a funcionalidade prática das responsabilidades patrimoniais de sócios que possuem responsabilidade patrimonial ilimitada e limitada. Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • compreender que as cooperativas são qualificadas como sociedades simples, possuem regulação própria, características específicas e podem, por um determinado ponto de vista hermenêutico, se aproximarem financeiramente das instituições empresariais, mas, juridicamente com elas não se confundem; • assimilar que sociedades em nome coletivo, em comandita simples e em comandita por ações possuem todos ou alguns sócios com responsabilidade patrimonial ilimitada, isso corresponde a dizer que, na insuficiência de bens patrimoniais que componham a sociedade, estes sócios devem arcar com as responsabilidades dela, respeitado o benefício de ordem na forma da lei civil e processual; • entender que as sociedades limitadas são tipos societários de natureza hibrida, ou seja, têm características de sociedades de pessoas (simples) e de capitais (empresária), podendo ser constituída para fins empresariais ou não; • compreender que os sócios na sociedade limitada possuem responsabilidade patrimonial limitada e solidária, limitada ao valor das quotas que subscrevem e integralizam e solidária aos demais sócios quanto a sua subscrição; • entender que ao contrário dos sócios, a sociedade limitada em si deve responder pelos compromissos financeiros que assumir de forma integral com a totalidade do patrimônio que possuir; • verificar que apesar de terem responsabilidade limitada e solidária, os sócios da sociedade limitada estão passiveis de sofrerem os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica, se verificados os pressupostos legais para tanto. Bibliografia ALMEIDA, A. P. de. : Direito de empresa. 15. ed. rev., atual e ampl. de acordoManual das sociedades comerciais com o novo Código Civil e a Lei nº 10.303/2001 (S/A). São Paulo: Saraiva, 2005. BRASIL, . Regula a constituição de sociedades por quotas, deDecreto nº 3.708, de 10 de janeiro de 1919 responsabilidade limitada. 1919. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d3708. htm. Acesso em: 27 ago. 2019. BRASIL. . Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro.Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 1942. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm. Acesso em: 27 ago. 2019. BRASIL. . Define a Política Nacional de Cooperativismo, institui oLei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971 regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências. Brasília, DF, 1971. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5764.htm. Acesso em: 27 ago. 2019. BRASIL. . 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