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Semântica Lexical: objeto, objetivos e desafios Semântica Lexical É a disciplina que estuda o significado das expressões linguísticas. Semanticista lexical Interessa-se pelo que as palavras significam, porque significam o que significam, como são representadas na mente do falante e como são usadas em textos e no discurso. Semântica composicional (≠semântica lexical) Partindo do princípio de que as palavras têm significado, procura descobrir de que forma operam a estrutura e as relações sintáticas na construção de expressões complexas, como sintagmas e orações. Questões centrais da semântica lexical 1. Qual é a natureza do significado linguístico? 2. Qual é a relação entre as palavras e o seu significado? 3. Como são aprendidos e armazenados os significados das palavras? 4. Como são os significados comunicados e percebidos pelos falantes? 5. Como e porque mudam os significados das palavras? Alguns objetivos centrais da semântica lexical Caracterizar o significado das palavras: Caracterização do conhecimento interiorizado dos falantes sobre os significados das palavras, procurando descrever de forma científica em que consiste o significado das palavras e como pode ser descrito e explicado. Dar conta das relações que mantêm as palavras por força do seu significado: Qualquer falante é capaz de estabelecer relações intuitivas entre o significado de muitas palavras, que são relações estáveis e frequentes, estando subjacentes à organização e estruturação do léxico. Caracterizar os diferentes tipos de significados: Implica o estudo de parâmetros de variação diversos, nomeadamente de índole situacional, geográfica e social. Explicar a variação contextual do significado: A maior parte das palavras varia em função do contexto de uso, devendo a semântica lexical estabelecer que princípios as determinam, nomeadamente devido ao seu grau de previsibilidade. Explicitar como surgem novos significados: De natureza muito flexível, o significado é passível de se adaptar sempre a novas situações, cabendo à semântica lexical determinar as extensões e as mudanças de significado. Alguns problemas e busca de soluções Os instrumentos de descrição: Há um processo de circularidade: coincidência entre a língua objeto de estudo e a língua usada para a descrição e caracterização desse objeto. A natureza do significado: Partir do princípio de que o significado das expressões linguísticas existe na mente dos falantes, coloca a questão de saber se é possível efetuar uma objetivação do significado. A distinção entre conhecimento léxico e conhecimento enciclopédico: Enquanto o conhecimento linguístico é partilhado por todos os membros de uma comunidade, o conhecimento enciclopédico parece depender mais do nível de instrução de cada indivíduo. A lexicalização dos conceitos: Das múltiplas conceptualizações possíveis, a língua só lexicaliza algumas, pelo que não é possível considerar de forma simplista que as palavras são a exteriorização de um inventário comum e partilhado de conceitos. A variação contextual do significado: Uma palavra pode adquirir uma carga de significado em função dos distintos fatores extralinguísticos e situacionais que integram o contexto, considerado de forma ampla. Relação da semântica lexical com outras disciplinas Na linguística: Relaciona-se frequentemente com a lexicologia, morfologia, sintaxe, pragmática, etc. Fornece dados para várias áreas de investigação aplicada, nomeadamente, aprendizagem e aquisição da linguagem, linguística computacional e lexicografia. Fora da linguística: Estabelece contactos com a filosofia, a psicologia, a antropologia, as ciências da computação e a pedagogia. Semântica Lexical: evolução Semântica pré-estruturalista Bréal, Paul. O objeto de análise é a mudança de significado. Diferentes classificações de mecanismos de mudança: a metáfora, a metonímia, a generalização e a especialização. Os significados das palavras era vistos como uma entidades mentais (são pensamentos e a mudança de significado resulta de processos psicológicos). Semântica estruturalista Inspirada em Saussure, a partir da década de 30. As relações mútuas de significado constituem a basa da análise semântica. Algumas abordagens incluem a teoria do campo lexical, a semântica relacional e a análise componencial. Foco numa abordagem sincrónica da linguagem (diacronia ≠ sincronia). Relações paradigmáticas e sintagmáticas. Semântica generativa Desde 1960, aspetos da semântica estruturalista são incorporados na gramática generativa. Katz, Katz & Fodor. Constitui uma tentativa de formalização semântica como parte da gramática formal. A orientação mentalista da gramática generativa cria interesse na adequação psicológica. Esta dupla extensão da análise componencial levanta questões sobre adequação formal e psicológica que influenciam as propostas que emergem depois da fase generativista. Abre-se uma dupla tendência ao nível da teorização. Semântica neo-estruturalista Integra as abordagens contemporâneas que extrapolam os principais tipos de estruturalismo semântico, mas fazem-no à maneira do pós-generativismo. Trata-se de teorias que se constroem com base numa: descrição decomponencial – semântica concetual, léxico generativo, ... descrição relacional – wordnet, funções lexicais, ... Mas atendendo às questões colocadas pela geração generativista, nomeadamente a possibilidade de formalização e a fronteira entre o significado linguístico e uma conceção ampla de cognição. Semântica cognitiva É uma abordagem orientada por princípios psicológicos e cognitivos. Integram-se nesta orientação inovações como a teoria do protótipo, a metáfora concetual, e a semântica de ‘frames’, os modelo cognitivos idealizados, etc. O conceito de léxico Léxico O léxico é como um número finito de unidades, ao contrário das frases de uma língua, razão pela qual existem dicionários de palavras e não existem dicionários de frases. Porém, se é certo que o número de frases possíveis numa língua é infinito, não é menos certo que o número de palavras de uma língua não é tão fácil de delimitar como se pretende dar a entender. Conjunto virtual de todas as palavras de uma língua, isto é, o conjunto de todas as palavras da língua, as neológicas e as que caíram em desuso, as atestadas e aquelas que são possíveis tendo em conta os processos de construção de palavras disponíveis na língua. Numa perspetiva cognitivo-representativa, é a codificação da realidade extralinguística interiorizada no saber de uma dada comunidade. Ou, numa perspetiva comunicativa, é o conjunto das palavras por meio das quais os membros de uma comunidade linguística comunicam entre si. O léxico tem sido normalmente entendido como uma mera lista de unidades/palavras com as suas propriedades idiossincráticas, isto é, não previsíveis a partir de qualquer regra geral da língua. Dentro desta perspetiva, o conhecimento lexical apresentar-se-ia bastante diverso dos conhecimentos fonológicos, morfológico e sintáctico (fundamentalmente constituídos por regras prontas a serem aplicadas) e relevaria quase exclusivamente da memória. Dito de outro modo, o conhecimento lexical mais não seria que a lista memorizada das palavras e das suas idiossincrasias, tornando-se o domínio privilegiado da irregularidade linguística. A natureza do léxico é plurifuncional: as unidades lexicais que o integram envolvem informações de natureza: fonológica morfológica sintática semântica discursivo-pragmática Exemplos de léxico: Léxico mental Léxico mental: repositório de palavras. Representaçãomental da informação sobre palavras. Características: → É imenso e complexo; → Está organizado de forma sistemática; → O seu conteúdo não é rigidamente fixado; → É fluido e flexível; → Tem um nível elevado de informação sobre cada entrada; → O tratamento de entradas faz-se em rede e não de forma alfabética. O léxico é analisável numa dupla funcionalidade: Componente do sistema; Estratégia linguística em situação de uso. O valor de uma unidade léxica é determinado, em parte, em função do valor de outras unidades léxicas. As relações entre unidades léxicas podem ser: paradigmáticas: escolhas semânticas disponíveis num dado ponto da estrutura frásica. sintagmáticas: são expressão de condições de compatibilidade entre palavras ocorrentes na cadeia sintagmática. A língua permite ao falante não só a comunicação com os outros, mas também falar de si e do mundo. Referente → entidade do “mundo” que uma expressão permite designar num dado contexto de uso. As relações entre as palavras e a realidade são diversas: Há palavras que se ligam diretamente às entidades a que se referem → nomes próprios → a relação entre o nome próprio e a entidade que designa estabelece-se com base numa convenção que une diretamente a forma com a realidade extralinguística. Há palavras cuja relação com a realidade se estabelece com base no seu significado → nomes comuns → não referem diretamente objetos concretos, mas aplicam-se à classe total de objetos do tipo especificado. Para referir um objeto concreto, é necessário o recurso a determinados elementos de tipo gramatical: determinantes demonstrativos, possessivos, definidos. Extensão Conjunto de referentes ao qual se aplica um determinado significado. Intensão Conjunto de traços ou propriedades que determinam a pertença ou não de um elemento a uma classe. Significado Conceito complexo e multifacetado. Pode ser entendido como uma forma virtual de traços disponíveis que pode evoluir com o tempo, constituindo a atualização destes traços o sentido. O significado de uma palavra determina a sua referência. Significado descritivo ou denotativo Permite identificar a realidade extralinguística a que se refere uma expressão. Impõe restrições sobre a classe de entidades que podem englobar-se em cada expressão. É de natureza objetiva, associado ao conjunto dos falantes e não a um falante em particular. Pode ser negado se a expressão não se adequa ao tipo de objeto a que pretende referir-se. Significado não descritivo ou conotativo Traços de conteúdo variáveis, secundários, subjetivos e instáveis. As associações conotativas podem ser individuais, mas podem também generalizar-se a um grupo, passando a constituir parte do significado da palavra. Há palavras especializadas na transmissão de significado conotativo: interjeições. A mesma palavra pode conter significado descritivo e significado não descritivo conforme o contexto de uso. A carga conotativa de um termo pode ultrapassar no uso corrente o conteúdo primário. Não se esgota na dimensão valorativa, pois pode associar-se a certas propriedades do falante ou da situação: diferenças diatópicas, diastráticas, diafásicas. As diferenças de tipo conotativo estão subordinadas às diferenças denotativas. Significado lexical As palavras com significado léxico remetem para conceitos a partir dos quais é possível identificar entidades (reais ou imaginárias), atividades, estados, propriedades. É típico de nomes, verbos, adjetivos e alguns advérbios. Apresentam as seguintes caraterísticas: → Formam classes abertas. → Têm conteúdo descritivo. → Ligam-se a representações concetuais acessíveis à introspeção. → É a representação mental que corresponde a uma expressão simples. Significado gramatical As expressões indicam de modo abstrato a forma como se deve combinar entre si os conceitos. É típico de determinantes, quantificadores, conjunções, interjeições, preposições… Apresentam algumas propriedades: → Formam classes fechadas; → Não têm conteúdo descritivo; → Possuem um significado pouco acessível à introspeção; → O seu estudo realiza-se basicamente no âmbito da semântica frásica. Significado literal vs significado figurado É uma distinção muito frequente. A perceção destes dois tipos de significado varia se a descrição é sincrónica ou diacrónica. O significado literal é o significado primário e o figurado resulta da derivação de outras aceções. É difícil distinguir claramente e em todas as circunstâncias um e outro, pois as origens do significado de uma palavra não são sempre acessíveis à consciência do falante nem determinam de modo estrito que um significado seja considerado mais básico do que o outro. Exemplos: É permitido comer na área de trabalho...e, no entanto, o escritório está imaculadamente limpo! Por isso, é importante manter o nome limpo na praça, comprar apenas o necessário e saber se você vai ter o dinheiro para pagar no prazo combinado. O verde inspira-me, dá-me paz e conforta-me quando todas as outras cores me deprimem. Comprei um casaco verde e um sobretudo neste site. O meu menino é de ouro, e não sou só eu que digo. O ouro foi provavelmente o primeiro metal a ser descoberto pelo homem. (…) As civilizações dos Aztecas e Maias (…) também conheciam e trabalhavam o ouro, que consideravam um metal precioso. A distinção de significados Quando se procura explicitar o conceito de significado lexical, surge um problema sério: a interpretação que damos a uma palavra pode variar muito de contexto para contexto. As variações observáveis podem ser de natureza profunda ou mais subtis. (…) Este tipo de variação, endémico no vocabulário de qualquer língua natural, obriga-nos a procurar resposta para perguntas como as que se seguem: As palavras têm tipicamente múltiplos significados? O que constitui o significado? Há um número finito de significados? Como se relacionam os significados uns com os outros? Exemplos: O António é baixo. A Universidade mudou muito nos últimos anos. Cortei relações com a Ana. Cortei o bolo há bocadinho. Cortei a relva do jardim a semana passada. O cabo chegou ao quartel às 10h00. Ela deu-lhe com o cabo da vassoura. A Joana tem uma letra muito bonita. Qualquer letra do alfabeto tem uma forma maiúscula e uma forma minúscula. Ela investiu muito em mim. O touro investiu contra o toureiro. O António é sempre muito agressivo. A campanha da Vodafone foi muito agressiva. No sentido de dar resposta a estas questões, Cruse (2004) aponta testes, retomados e sintetizados por Escandell Vidal (2007), que devem permitir mostrar se duas interpretações de uma palavra são suficientemente diferentes para que se possa considerar que se trata de significados distintos. Teste da identidade Teste da independência das condições de verdade Teste da independência das relações semânticas Teste da autonomia Teste do antagonismo Teste da identidade O António é baixo. É possível termos leituras distintas: a) O António é de pequena estatura. b) O António tem uma voz grave. c) O António toca um instrumento denominado baixo. Nas frases com elisão: Só admite interpretação em que as propriedades de ambos são coincidentes. → O António é baixo e o Joaquim também. Não são permitidas leituras mistas. → *O António é baixo (de estatura) e o Joaquim também (tem voz grave) Os significados são diferentes Teste da independência das condições de verdadeSe dois significados são verdadeiramente diferentes, é expectável que as orações em que aparecem sejam verdadeiras também em condições diferentes. O António é baixo. A frase pode ser verdadeira na aceção de ‘o António é de pequena estatura’ pode ser falsa na aceção de ‘O António tem voz grave’ Pergunta: O António é baixo? Respostas simultaneamente verdadeiras: sim; não Os significados são diferentes Teste da independência das relações semânticas Dois significados são diferentes se cada um contrai relações semânticas independentes com outras palavras. Os significados atribuíveis a ‘baixo’ na frase O António é baixo relacionam este vocábulo com termos diferentes: baixo ≠ alto baixo ≠ barítono, contralto baixo ≠ pianista, violinista baixo = vil Os significados são diferentes Teste da autonomia Uma mesma forma pode apresentar várias interpretações, estando umas contidas dentro das outras. Veja-se a palavra ‘dia’: o tempo que a Terra leva a dar uma volta sobre o seu eixo; o tempo em que o Sol permanece no horizonte Teste: verificar se, quando um dos significados se nega explicitamente, se pode utilizar o outro → Prefiro o dia à noite. Os significados são autónomos Teste do antagonismo Os significados são diferentes podem ser considerados de forma alternativa, mas não simultaneamente. Espero por ti no banco do Marquês. Ambiguidade (potencial): banco do jardim instituição bancária Os significados são antagónicos Significado e ambiguidade Estes testes permitem determinar se os significados são distintos, mas isso não significa que não possam estar relacionados entre si. A ambiguidade lexical é muito frequente nas línguas naturais. Um conjunto de palavras pode conduzir a mais do que uma interpretação só porque as palavras têm mais do que um significado. Trata-se de um fenómeno não homogéneo, pois manifesta-se pelo menos sob duas formas: polissemia e homonímia. A ambiguidade lexical é um fenómeno que decorre da fala, entendida no sentido de Saussure. Ela decorre da polissemia possível dos vocábulos (ou da homonímia); não é nunca uma propriedade de uma lexia. Ambiguidade, polissemia e homonímia Normalmente definimos duas palavras homónimas como sendo aquelas que apresentam a mesma forma (fonética e gráfica), mas que têm dois significados diferentes não relacionáveis entre si. Por seu turno, uma palavra considera-se polissémica quando apresenta vários significados (mais do que um), sendo possível estabelecer uma relação entre esses vários significados. Embora a definição destes conceitos seja simples, quando perante casos particulares nem sempre é fácil dizer se estamos efectivamente perante duas palavras homónimas ou se, pelo contrário, perante uma palavra polissémica. Polissemia A polissemia é o resultado da diversificação do significado de uma palavra → os significados são distintos mas estão relacionados. A polissemia afeta praticamente todas as palavras da língua, porque resulta de mecanismos naturais e inconscientes de atribuição de significado, que muito facilitam a comunicação entre falantes e minoram o esforço de memorização do saber lexical. Causas para a polissemia Designação de novos objetos → um dos casos mais comuns consiste no facto de um termo já existente se aplicar a uma nova realidade. Pluma → Pluma estilográfica Especialização num dado domínio → a mesma palavra pode assumir significados especializados em função do contexto social, cultural ou técnico no qual é utilizada. Usos figurados → muitos significados derivam de outros por um processo de extensão metafórica ou metonímica. Ela saiu finalmente do armário. Decalques semânticos → alguns significados novos resultam da adopção, numa língua, do significado que uma palavra semelhante tem com outra. Ela é uma gestora muito agressiva (dinâmica, empreendedora, assertiva). Reinterpretação de homónimos → embora seja uma situação rara, há palavras diferentes pela sua origem etimológica, mas que os falantes tendem a reinterpretar como estando relacionadas. cravo (<catalão clavel>) - a flor do craveiro - condimento cravo (<francês clavo>) - cravo duro e aprofundado do derma na ploanta do pé, como um cone Tipos de polissemia Cruse (2000) distingue dois tipos de relações entre os significados de uma palavra polissémica: Lineares → um dos significados engloba o outro. Inclusão: O cão é o melhor amigo do homem. O dono levou o cão foi ao veterinário. Parte-todo: Não linear → não inclusão de um significado dentro do outro. Metáfora: operação cognitiva que projeta um domínio concetual sobre outro, isto é, há transferência de um domínio de origem para um domínio meta. Os seus argumentos são muito sólidos. Aquele fulano é burro. Metonímia: associação prévia entre dois significados ou referentes, que se percebem como contíguos. É o resultado da projeção, não entre dois domínios diferentes, mas entre duas categorias diferentes que foram parte do mesmo domínio cognitivo. Roubaram um Picasso. Podes emprestar-me o teu kispo? Alguns testes para determinar a polissemia Uma palavra é polissémica: Quando uma asserção envolver uma palavra passível de ser ao mesmo tempo verdadeira e falsa em relação a um mesmo referente. → Nespresso é um café e não é um café. Quando a coordenação de significados distintos produz frases agramaticais. → *O Pedro bebeu o café e o João também entrou num. Quando mais do que uma definição é necessária para dar conta dos seus significados. → Café – fruto do cafezeiro. → Café – bebida feita a partir do fruto do cafezeiro. → Café – estabelecimento comercial onde se pode tomar esta bebida. Homonímia Fala-se de homonímia quando: Duas palavras diferentes apresentam as mesmas propriedades formais (gráficas e fonológicas), isto é, uma forma de expressão corresponde a duas (ou mais) palavras diferentes; Vários significados distintos coincidem no mesmo significante ou forma fónica. Fontes da homonímia Ullmann (1964) apresenta três fontes ou causas para a homonímia: Convergência fonética: sob a influência de mudanças fonéticas, duas ou mais palavras que outrora tiveram formas diferentes coincidem na forma. vanu (adjectivo) > vão vadunt (forma verbal) > vão Divergência fonética: dois ou mais significados de uma palavra separam-se de tal forma que não há qualquer contacto evidente entre eles. criação (obra, invenção) criação (animais domésticos criados conjuntamente) Influência estrangeira: os empréstimos são incorporados ao sistema fonético da língua acabam por coincidir com vocábulos já existentes. Manga (fruto) Manga (parte de uma peça de roupa) Tipos de homónimos Gutierréz Ordoñez (1989) apresenta uma conceção mais lata do conceito de homonímia, distinguindo entre homónimos parciais e homónimos absolutos. Há homónimos absolutos quando as palavras apenas são diferenciáveis pelo significado, não se lhes aplicando nenhum dos critérios referidos. Exemplos: Acordar com o canto dos pássaros e o cheiro das flores silvestres do alto da serra do Tepequém é um privilégio da pousada. Leandro Salino recebe um passe de Alan e remata para o cantoda baliza. Há homónimos parciais quando: cada um dos significados pertence a uma categoria gramatical diferente: canto bem (v. ); canto da sala (n.) há diferenças de segmentação dos constituintes internos da expressão: baixo (adj.) – morfema de género; baixo (v.)– amálgama de tempo-modoaspeto e pessoa- número a mesma forma se combina com diferentes morfemas de género ou número: o papa; a papa cada significado se associa com padrões sintáticos diferentes: Confio em ti; Confio-te esta missão. Vagueza (ou vaguidade, indeterminação) A vagueza é uma propriedade comum a muitas palavras do léxico comum. Consiste na falta de precisão na designação de uma palavra. Traduz-se na dificuldade de para encontrar limites definidos para a extensão de um termo, isto é, há dificuldade em determinar com total precisão se um determinado elemento se pode englobar ou não no referido termo. Em muitas situações em que ocorrem a especificação científica não apresenta necessariamente relevância científica, pois não é ela que regere o uso comum dos falantes. Exemplos: criança, vermelho... A fonte do fenómeno da vagueza ou vaguidade encontra-se no limite entre o léxico e o contexto. Pode-se considerar que uma palavra é vaga quando não é possível – apenas com as informações fornecidas por elas, ou seja, no léxico, recuperar o seu referente ou sentido com precisão. Relações Lexicais Organização do léxico O léxico é analisável numa dupla funcionalidade: componente do sistema; estratégia linguística em situação de uso. O valor de uma unidade léxica é determinado, em parte, em função do valor de outras unidades léxicas. Relações entre unidades léxicas: • Paradigmáticas → escolhas semânticas disponíveis num dado ponto da estrutura frásica; • Sintagmáticas → são expressão de condições de compatibilidade entre palavras ocorrentes na cadeia sintagmática. Relações Semânticas Para descrever o significado das unidades léxicas, é necessário descrever as suas relações de significado. Relações semânticas = Padrões de organização do léxico de uma língua Propriedades: Produtividade: possibilidade de geração de novos elos relacionais entre as palavras; Binarismo: algumas relações relacionam tipicamente pares de palavras, embora haja um maior leque de possibilidades; Variabilidade: a relação de uma palavra com outra varia de acordo com o significado e com o contexto de uso; Prototipicidade: alguns pares de palavras exemplificam melhor uma relação semântica do que outros; Semi-semanticidade: a relação entre palavras depende de outros fatores para além das suas propriedades semânticas; Inumerabilidade: o número de tipos de relações semânticas não pode ser objetivamente determinado; Previsibilidade: as relações entre palavras obedecem a padrões gerais, sendo as relações semânticas geridas por regras; Universalidade: as mesmas relações semânticas podem ser relevantes para a descrição do léxico de qualquer língua. Hiponímia – Hiperonímia: relação de inclusão Meronímia – Holonímia: relação de inclusão Antonímia: relação de oposição Sinonímia: relação de identidade Hiponímia - Hiperonímia Relação entre uma unidade lexical mais específica ou subordinada e outra mais geral ou superordenada. Relação tipo – instância: do mais geral para o mais específico → hiperonímia Relação instância – tipo: do mais específico para o mais geral → hiponímia Relação de inclusão de uma classe noutra classe Relação de dominância e dependência entre classes → hierarquia ‘ser’: Um X é um tipo de Y Um X é um Y Relação transitiva: Se A B e B C, então A C Se X é um Y e Y é um Z, então X é um Z Se uma oliveira (X) é uma árvore (Y) e uma árvore é uma planta (Z), então uma oliveira (X) é uma planta (Z) Hiponímia - Hiperonímia Um elemento léxico Y define-se como hipónimo de X se todos os traços de X estão incluídos na enumeração dos traços de Y O hiperónimo é mais inclusivo em termos da extensão O hipónimo apresenta uma intensão maior O co-hipónimo está na mesma relação de inclusão que os outros hipónimos em relação ao hiperónimo Relação assimétrica → implicação unilateral Condicional: Se X é um carvalho, então é necessariamente uma árvore carvalho → árvore Se X é uma árvore, então é necessariamente um carvalho árvore ≠ carvalho Contraste: É uma árvore, mas não é um carvalho → verdadeiro É um carvalho, mas não é uma árvore → falso Meronímia – Holonímia Relação de dependência entre a parte (merónimo) e o todo (holónimo) Relação de implicação → hierarquia ‘ter’: Y tem um X X é uma parte de Y Y inclui um X X consta de Y X forma parte de Y O X de um Y Conexão entre dois conceitos mutuamente implicados → X está implicado no sentido de Y X é um merónimo de Y se e só se as frases com a forma Y tem Xs/um X e Um X é parte de um Y são normais quando os SNs um X e um Y são interpretados genericamente Se A é um merónimo de B num contexto particular, então qualquer membro a da extensão de A, ou se relaciona com um membro b específico da extensão em relação à qual é configurado como parte, ou potencialmente entretém uma relação intrinsecamente construída de uma parte em relação a um membro, existente ou potencial, de B. É uma relação assimétrica e (in)transitiva: A casa tem um telhado. O telhado tem uma chaminé. A casa tem uma chaminé. VS A casa tem uma porta. A porta tem um puxador. *A casa tem um puxador. Do ponto de vista do significado → o merónimo inclui o significado do holónimo Do ponto de vista do todo como uma entidade → as partes subordinam-se ao conjunto Meronímia - Subtipos Tipos de Meronímia: Em função da maior ou menor tipicidade Merónimos canónicos (orelha / corpo) Merónimos facultativos (puxador / porta) Antonímia Algumas estratégias para a expressão da relação de oposição: → Unidades léxicas sem relação de forma ou significante entre elas → largo/estreito; bom/mau; velho/jovem; agudo/grave. → Uma forma léxica e a sua própria negação → saltar/não saltar; intervir/não intervir; concorrência/não concorrência. → Uma forma léxica simples e a mesma forma com prefixo → agrado/desagrado; contínuo/descontínuo; coerente/incoerente, responsável/irresponsável; lógico/ilógico. → Duas formas prefixadas, cuja oposição reside no prefixo → introvertido/extrovertido; hipotenso/hipertenso. É uma relação de negação. Os antónimos: → pertencem à mesma categoria sintática; → opõem-se funcionalmente no interior de uma classe semântica → traços semânticos comuns + traços semânticos distintos. A natureza das propriedades semânticas em causa na relação o tipo de oposição. Pode ser entendida em sentido estrito ou lato. Antónimos Graduáveis Exemplos: grande/pequeno; quente/frio; … Constituem a verdadeira relação de antonímia de acordo com Lyons. Representam os extremos de uma escala graduável → os termos opõem-se em relação a uma propriedade semântica que é uma grandeza escalar. Constituem uma oposição binária, inerente e patente, que admite graus intermédios. Constituem termos contrários: A afirmação de A implica a negação de B; A negação de A não implica a afirmação de B; A negação de ambos os termos não produz uma asserção contraditória. Antónimos Complementares Exemplos: verdadeiro/falso; vivo/morto; par/ímpar;homem/mulher; Assentam numa oposição que não admite gradação São mutuamente excluintes Dividem o seu domínio em dois conjuntos sem membros comuns Correspondem, de acordo com Lyons, a termos contraditórios → p e q não podem ser ao mesmo tempo verdadeiras ou falsas: a asserção negativa de p implica a asserção positiva de q → não morto = vivo a asserção positiva de q implica a asserção negativa de p → vivo = não morto Testes: Não são graduáveis: * Este número é mais ímpar do que aquele. O teste dá lugar a proposições tautológicas: Se um nº é par, então não é ímpar → V Se um não é par, então é ímpar → V Se um nº é ímpar, então não é par → V Se um não é ímpar, então é par → V A afirmação e a negação simultâneas dos dois termos produzem sempre uma proposição necessariamente falsa: Este nº é par e ímpar → F Este nº não é par nem é ímpar → F Antónimos Recíprocos Exemplos: padrinho – afilhado; comprar – vender; genro – sogra; professor – aluno; pai – filho. Exprimem a mesma relação vista de perspetivas opostas → papéis reversos da mesma relação Relação simétrica: A implica B; Não A implica não B B implica A; Não B implica não A Trata-se de uma oposição marcada por implicação recíproca Restringem-se aos termos que expressam papéis reversos da mesma relação Trata-se, logicamente, de um inverso – os inversos são opostos em pares de palavras que exibem a inversa de uma relação entre entidades léxicas Testes: A comutação da posição dos dois argumentos torna possível que os opostos possam descrever a mesma situação, podendo dar lugar a expressões sinónimas que satisfazem as provas de equivalência pertinentes, dando lugar a tautológicos: → Se o Pedro é pai do João, então o João é filho do Pedro. → V → Se o João é filho do Pedro, então o Pedro é pai do João. → V A negação da conjunção de ambos os termos resulta numa contradição necessária: → O Pedro é pai do João, mas o João não é filho do Pedro. → F → O João é filho do Pedro, mas o Pedro não é pai do João. → F Opostos Direccionais Podem denotar movimento (ir-vir; chegar-partir; levar-trazer; entrar-sair); localização relativa (acima-abaixo; antes-depois; dentro-fora), mudança de estado em direções opostas ou reversibilidade (fazer-desfazer; montar-desmontar; validarinvalidar; viabilizar-inviabilizar). Trata-se de oposições binárias baseadas num movimento (real ou figurado) em direções opostas a partir de um dado ponto → mudança de estado. Sinonímia Exemplos: alunos – estudantes polícia – agente cego – invisual Relação de implicação bilateral e simétrica Baseia-se na partilha de propriedades comuns Relação de identidade entre significados Concepções de Sinonímia Duas propriedades caracterizam a sinonímia absoluta: os dois significados têm o mesmo conteúdo semântico; as duas palavras podem comutar livremente em qualquer situação sem que isso implique qualquer tipo de contraste: → Anteceder / preceder; mil / um milhar; antecedente / precedente Estes exemplos mostram a existência de 3 grandes problemas para a noção de sinonímia entendida como identidade total: O problema das diferentes dimensões do significado O problema da diferente combinatória das entidades O problema da não identidade de todos os significados das duas palavras As diferentes dimensões do significado → pode considerar-se meramente o conteúdo descritivo e deixar-se de lado as diferenças diatópicas, diastráticas e diafásicas. Identidade do conteúdo descritivo: teste da equivalência: → Se é certo que alguém apanhou uma borracheira, então é certo que apanhou um pifo. → verdadeiro Borracheira → pifo teste de contraste: → É um cárcere mas não é uma prisão. → Falso → É uma prisão mas não é um cárcere. → Falso Cárcere → prisão A combinatória das entidades: seleção de uma unidade léxica em detrimento de outra → razões de uso e norma e não de estrutura → *cabelo alazão vs cavalo alazão Não identidade de todos os significados das duas palavras → como a relação de sinonímia se estabelece entre significados e não palavras, a equivalência não tem que ser total Alguns critérios de diferenciação: Ullman (1972) → um termo é mais geral que outro; um termo é mais intenso que outro; um termo é mais emotivo que outro; um termo implica aprovação ou censura moral enquanto o outro é neutro; um termo é mais técnico que o outro; um termo é mais literário que o outro; um termo é mais coloquial que outro. Baldinger (1977) → geográficos, sociais, idade, sexo, ironia, eufemismos, avaliação.
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