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A Escola dos Annales legados historiográficos de três gerações (1929-1989)

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1. A Escola dos Annales: legados historiográficos de três gerações (1929-1989)
A proposta deste texto é realizar algumas considerações sobre o papel e a importância da chamada "Escola dos Annales" para a cultura historiográfica do século XX e nestes idos do século XXI, pois embora a chamada Quarta Geração, não possua o mesmo impacto paradigmático das gerações anteriores, ainda sim, a influência dessas três gerações são sentidas nos dias de hoje, principalmente da terceira em aspecto de estudos culturais, e nas duas primeiras em aspectos de estudos sociais e teóricos. 
Nesse texto procurei apresentar um pouco da história do surgimento da Revue Annales d'historie économique et sociales (Revista dos Anais de história econômica e social), mais conhecida como revista dos Annales. Assim como falar sobre os principais historiadores que representaram essa revista e a contribuição metodológica e teórica para a historiografia do século XX. 
INTRODUÇÃO:
Para compreendermos os motivos que levaram os historiadores franceses Marc Léopold Benjamin Bloch (1886-1944) e Lucien Paul Victor Febvre (1878-1956) a se unirem para criar uma revista de história a fim de publicar suas ideias e propostas teóricas, devemos conhecer o contexto da cultura histórica e da cultura historiográfica vigentes na França no final do século XIX e no começo do século XX, aspectos estes que marcaram o desenvolvimento teórico e metodológico destes dois historiadores. Na França dos anos 20, a influência do Positivismo, da "Escola Metódica" e do Historicismo ainda vigoravam. 
	
	Auguste Comte
O Positivismo foi concebido pelo filósofo e sociólogo francês, Auguste Comte (1798-1857), consistindo numa doutrina filosófica, sociológica e política que ao longo da História tomou novos conceitos e sentidos. Daí ser recomendável usar Positivismo Comteano para se referir a doutrina original, pois hoje existem várias formas de Positivismo, e nem todas são iguais ao conceito original. Mas, na sua origem, Comte concebia o positivismo como uma doutrina que se opunha ao racionalismo cartesiano, ao idealismo, as explicações teológicas e metafísicas. Para ele, o mundo deveria ser explicado através do sentidos e do que era palpável, logo, a ideia de racionalismo de René Descartes, que considerava a razão acima da própria realidade, e que o conhecimento era nato, não era vista como fundamento empírico por Comte, assim como, o fato de você atribuir causas a questões divinas e metafísicas, que estariam relacionadas a vontade de Deus. Comte privilegiava o conhecimento empírico, assim como Francis Bacon havia escrito no começo do século XVII. Ao mesmo tempo, sua doutrina visava construir um modelo de ética, para o trabalho científico, e até mesmo para a convivência em sociedade. 
"O positivismo foi considerado por Augusto Comte como a base e o fundamento metodológico de uma nova ciência social, a 'física social' ou 'sociologia'. Mais tarde, o positivismo foi concebido por Comte como uma nova religião da humanidade". (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, 1998, p. 4736). 
Para Comte a humanidade deveria cada vez mais, buscar a razão e o conhecimento científico, evitando explicações teológicas e metafísicas, as quais ele via como crendices e superstições de mentes ignorantes. A ciência seria a explicação para o mundo e o universo. Tais ideias foram bastante fortes no século XIX, a ponto de influenciar o meio acadêmico da época, e no caso da história não foi diferente.
	
	Leopold von Ranke
Na Alemanha um historiador chamado Leopold von Ranke (1795-1886) influenciado por algumas das características do positivismo comteano, começou a questionar a forma de como a História vinha sendo estudada, pesquisada e escrita. Ranke ficaria conhecido como o "Pai da história moderna" ou o "Pai da história científica". Ranke tinha a preocupação de contar a história da forma mais próxima da realidade que ela foi, algo que ficou conhecido como Historicismo. 
"O que era novo sobre a abordagem historicista era sua generalização de que a atmosfera e a mentalidade das eras passadas tinham que ser também reconstruídas, pois só assim o registro formal dos eventos teria qualquer significado". (TOSH, 2011, p. 22). 
Um dos problemas que o historicismo apresentou, foi seu forte conservadorismo em se tratar da história política nacional, algo que inibiu o desenvolvimento da historiografia pelo restante do século, pois mesmo a história cultural, a história social e econômica que já existiam no século XIX, não tinham muito espaço no meio acadêmico, fortemente historicista, e posteriormente metodista e positivista, metodologias que possuíam em comum essa tentativa de se "resgatar o passado" ou se "refazer o passado".
Para Ranke, a história deveria ser melhor analisada através dos documentos, de forma a se evitar enganos e identificar fraudes documentais. Sua formação em filologia contribuiu para isso. Não obstante, sua ideia de cientificidade, tentava aproximar a história das ciências exatas, uma pretensão de encontrar exatidão no saber histórico, daí a referência de se escrever uma "história universal", ideia que esteve em alta no século XIX. 
O problema disso é que o passado por si só não é História, a História não chega ao historiador já pronta e finalizada nos documentos, como os positivistas e metódicos acreditavam. A História consiste numa reunião de fragmentos do passado (Certeau, 2009; Chartier, 2009), um discurso que representa o passado. Nesse aspecto, o historiador hoje, busca representar o passado, mas não reconstruí-lo ou refazê-lo, pois isso é impossível. O passado é um grande quebra-cabeça, e nem todas as peças foram encontradas e algumas talvez nunca serão achadas. Tentar contar a História plenamente como Ranke propunha, é uma questão impossível. 
Mas se por um lado o historicismo sofreu duras críticas no começo do século XX, especialmente pelos franceses e ingleses, não significa que Ranke não tivera em o que contribuir. Ranke chegou a escrever mais de 60 livros, embora muitos não são tão conhecidos e alguns até raros de se encontrar hoje, mas como Holanda [1979] dissera, sua principal contribuição não se encontra na forma de se entender a História e pensar sobre ela, mas sim na metodologia de como se estudá-la.
"Foi ele quem criou para os estudos históricos o sistema dos seminários, que aos poucos iriam proliferar em outros países  Ao mesmo tempo desenvolveu recursos de pesquisa e crítica das fontes, adaptando para isso, à História, processos já em uso, antes dele, entre filólogos e exegetas da Bíblia. (HOLANDA, 1979, p. 16).
Ranke defendia a cientificidade da História, embora não negasse que a historiografia (escrita da história) tivesse uma proximidade com a Literatura, devido a narrativa histórica, para ele a influência da linguagem romanceada deveria ser deixada de lado. Tal aspecto se fez como uma crítica a outros historiadores da época que eram influenciados pelo movimento artístico, político e filosófico do Romantismo, como foi o caso do historiador e filósofo francês, Jules Michelet (1798-1846).
Contudo, embora sua defesa de uma "historia ciência" e de um "método mais eficaz" para se escolher as fontes, analisá-las e desenvolver a crítica documental, sua tendência em se privilegiar a história política, foi um dos principais motivos de crítica ao seu trabalho, embora que é inegável que o historicismo esteve em alta na Alemanha e França no final do século XIX e começo do XX, tornando-se uma área dominante, e um dos principais motivos de crítica que Bloch e Febvre viriam fazer com sua revista futuramente. 
Unindo-se as ideias comtianas sobre o positivismo e o método de pesquisa de Ranke, surgiu na Alemanha um grupo de historiadores que passaram a serem chamados de metódicos. Ranke se tornou um dos principais expoentes dessa cultura historiográfica na Alemanha. 
"A escola metódica é criada “em torno de um axioma, o da história como “ciência positiva” (DOSSE, 2003ª, p. 39-40), fugindo do subjetivismo em nome da ciência e do respeito à verdade. Estes historiadoresmetódicos afirmavam, através de suas revistas não serem defensores de nenhum credo dogmático e que apenas buscavam o máximo possível de exatidão para com as fontes". (FARIAS;FONSECA;ROIZ, 2006, p. 121).
"O primeiro objetivo, deste movimento, era o de delinear maneiras claras na abordagem documental (métodos), para os historiadores profissionais. O historiador deveria estar ciente de que pertencia a uma comunidade de profissionais que zela pela objetividade, e que seu papel era apresentar seus escritos sem qualquer traço da estética literária; um discurso frio, duro e sem qualquer resquício das “paixões” pessoais do historiador; ele deveria somente descrever o que está objetivamente contido na fonte, deixando o que há de subjetivo nela. O historiador deveria rechaçar qualquer precipitação imaginativa: “o ponto de partida do ofício de historiador envolvia pesquisar documentos, reuni-los, classificá-los e, com o amparo das chamadas ‘ciências auxiliares’ da história, proceder à crítica externa, especialmente sobre a origem das fontes; em seguida passar à crítica interna visando à determinação dos fatos para, finalmente, coroar com a construção narrativa, agrupando e ordenando os fatos numa seqüência de causalidades” (SILVA, 2001, p. 196)". (FARIAS;FONSECA;ROIZ, 2006, p. 121-122).
Na França, tivemos dois notórios historiadores metodistas, Charles-Victor Langlois (1863-1929) e Charles Seignobos (1854-1942), proeminentes doutores da Universidade de Sorbonne, o qual era então o centro dos estudos de história e da formação de historiadores em França. Os dois são bastante lembrados por seu livro Introdução aos estudos históricos (1898), onde eles repensaram a metodologia da "Escola Metódica". Obra essa que se tornou de leitura obrigatória nos cursos de história na França. Tal fato levou Bloch e Febvre a chegarem ler tal livro. "Este famoso livro é tido como principal manual dos cultores desta História, por expressar o “pensamento metódico ao explorar em detalhes os procedimentos para a coleta de fontes, operações analíticas, críticas interna e externa de documentos, defendendo a compreensão do particular e do circunscrito para se chegar a conhecer o específico da história” (JANOTTI, 2005, p. 12). Apesar, dessa tênue “flexibilidade”, o manual manteve ileso os aspectos essenciais, principalmente, no trato do subjetivismo, não o negando em momento algum". (FARIAS; FONSECA; ROIZ, 2006, p. 122).
	
	Gabriel Monod
Outro importante metodista francês, foi o historiador Gabriel Monod (1844-1912) lembrado entre algumas de suas obras, por ter criado a Revue historique (Revista histórica ou Revista de história) em 1904. Monod foi um árduo defensor da profissionalização do historiador, pois no século XIX e começo do XX, vários historiadores amadores escreviam sobre história. Monod foi mais conservador e menos flexível que Langlois e Seignobos acerca do metodismo. Para ele apenas os historiadores deveriam escrever a História, e essa escrita deveria ser isenta de qualquer influência literária e passional. Neste sentido, ele alegava que alguns temas só deveriam ser tratados muitos anos depois, para se evitar que as "paixões" do historiador interferissem em seu julgamento. 
"A grandeza do historiador estava na capacidade de controlar sua subjetividade. Segundo François Dosse, “o ‘bom historiador’ metódico é(era) reconhecível por seu amor ao trabalho, sua modéstia e critérios incontestáveis de seu julgamento científico”, rejeitando o que “Langlois e Seignobos chama[vam] de ‘a retórica’ e as aparências ou ‘micróbios literários’ que poluem o discurso histórico culto” (DOSSE, 2003ª, p. 38-41). Mas como fugir da sombra da subjetividade que tanto persegue o historiador? Convém lembrar que os processos imprescindíveis da “crítica externa” e da “crítica interna”, supramencionados, encontravam-se na obra Introdução aos Estudos Históricos, e essa foi a resposta dos autores a esta indagação. O subjetivismo estaria contido na fonte, bastaria então que o historiador virtuoso o controlasse, e, se possível, o ocultasse. Para estes autores “a história tinha como objetivo descrever por meio de documentos as sociedades passadas e suas metamorfoses". (FARIAS;FONSECA;ROIZ, 2006, p. 122).
Por essa perspectiva, os metódicos defendiam que a História deveria apenas ser escrita e ensinada por historiadores, estando recluso o seu debate ao meio acadêmico. Essa questão é importante a ser mencionada, pois na França antes de 1870 não havia um Curso de História regular nas universidades. 
No ensino fundamental e médio, a História teria um papel de doutrinação nacionalista. Em 1815 o ensino de história começou a se tornar regular nas escolas, especificamente para o ensino médio ou no caso da época, os períodos chamados de seconde, premiére e terminale. No ensino fundamental, especialmente a fase que compreendia o que hoje chamamos de sexta, sétima, oitava e nona série, o ensino de história na regular. Em 1864 durante a Segunda República Francesa, o Estado começou a cobrar o ensino da História na oitava série, chamada na época de quatrième. No final do século, o governo francês começou a propor a criação de cursos de pós-graduação para várias disciplinas, o que incluía a história. 
Em 1878 a Universidade de Paris-Sorbonne só possuía duas cátedras (disciplinas) em História e mesmo assim tais disciplinas eram realizadas no Departamento de Geografia. Em 1912, o número de cátedras subiu para 12 e dois anos depois já eram 55, o que levou a criação de um Departamento de História. Ao longo do século XIX a história nas universidades era ensinada nos cursos de Letras ou Geografia.  A partir de 1880 com a criação do agregátion para o ensino superior, vários historiadores do ensino fundamental e médio, começaram a fazer essas provas para ingressar nas universidades. Mas, além de historiadores, outros estudiosos de outras áreas também fizeram tal prova para o cargo de professor de história, pois a profissão de historiador como apontara Prost (2008, p. 34-35) ainda não era regularizada na França Oitocentista. 
Além da questão de tentar transformar a História numa ciência "exata", e deliberar que a escrita e a pesquisa da mesma fosse feita apenas por profissionais. A "Escola Metódica" e o pensamento positivista comteano, também refletiam no aspecto que a "história presente" deveria ser posta de lado, pois devido a brevidade dos acontecimentos, e dependendo da sua ordem, isso poderia influenciar no seu estudo. Os metódicos falavam que o historiador que escrevia sobre a "história presente", estava sob a influência de "ideias" ou "paixões" que poderiam afetar sua imparcialidade e juízo de valores. Pelo fato do historicismo ser a principal área de estudo nessa época, falar sobre política sempre foi algo polêmico, logo, recomendava-se que tais assuntos fossem postos de lado, e se espera-se o tempo passar, para se "apagar" eventuais "paixões" sobre estas causas. Tal repercute quando vemos que a maioria dos historiadores dessa época estudavam a Antiguidade, o Medievo e a Modernidade, limitando-se a Contemporaneidade a pelo menos uns 30 anos antes da data que estavam vivendo. 
O pensamento metódico de certo modo contribuiu para essa necessidade de se melhorar o ensino de História na França e a formação acadêmica dos historiadores. O Estado francês tomou como exemplo o modelo alemão, o qual até então era o melhor em termos universitários da época. Assim de 1870 a 1930, a influência da "Escola Metódica" e do historicismo foram preponderantes na formação acadêmica e escolar francesa. 
PRIMEIRA GERAÇÃO (1929-1946)
"A primeira geração, liderada por Marc Bloch e Lucien Febvre, compreende o período entre 1929 e 1946. É marcada por alianças entre história, economia, sociologia, geografia e demografia, pelos conceitos de compressão, história-problema, história global e pelo trabalho de superação dos princípios que regiam a história tradicional como a história política e a história dos eventos". (PORTO, 2010, p. 133). 
Os fundadores:
Se na introdução conhecemos a culturahistoriográfica vigente na França em fins do XIX e começo do XX, passamos para conhecer um pouco da formação dos fundadores dos Annales. 
"O movimento dos Annales, em sua primeira geração, contou com dois líderes: Lucien Febvre, um especialista no século XVI, e o medievalista Marc Bloch. Embora fossem muito parecidos na maneira de abordar os problemas da história, diferiam bastante em seu comportamento. Febvre, oito anos mais velho, era expansivo, veemente e combativo, com uma tendência a zangar-se quando contrariado por seus colegas; Bloch, ao contrário, era sereno, irônico e lacônico, demonstrando um amor quase inglês por qualificações e juízos reticentes. Apesar, ou por causa dessas diferenças, trabalharam juntos durante vinte anos entre as duas guerras". (BURKE, 1992, p. 28).
	
	Marc Bloch
Marc Léopold Benjamin Bloch nasceu em 6 de julho de 1886 em Lyon, sendo filho de Gustave Bloch (1848-1923) o qual também foi um historiador, sendo especializado em Idade Antiga e Idade Média. Marc ingressou no Liceu Louis-le-Grand, e em 1904 passou para a Escola Normal Superior de Paris, onde quatro anos depois, prestou o agregátion, e foi aprovado como professor de história e geografia. Viajou por um breve tempo a Berlim e Leipzig, até que foi aprovado em 1909 na Fundação Thiers, onde estudou por quatro anos como bolsista. Atuou como professor de história no ensino médio até a eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), Bloch foi convocado a servir o país, atuando na infantaria, onde recebeu as patentes de sargento, tenente e capitão. Liderou tropas, foi ferido em batalha, e também ganhou duas honrarias: a Legião de Honra e a Cruz Militar. Em 1919 casou-se com Simone Vidal, com quem teve seis filhos. No mesmo ano foi aceito para se tornar professor de história na Universidade de Estrasburgo. Mudou-se com a família para essa importante cidade no leste da França, próximo a fronteira com a Alemanha. 
Bloch se especializou em história medieval, tornando-se um respeitado medievalista em seu tempo. Em 1924 publicou Os reis taumaturgos (Les rois thaumaturges: Étude sur le caractère surnaturel attribué à la puissance royale particulièrement en France et en Angleterre). Tal livro foi bem peculiar para a época, pois Bloch abordou crendices populares ligadas a ideia do "toque de cura dos reis", pois entre a Idade Média e a Idade Moderna, havia a crendice em França e Inglaterra que os reis possuíam dons de cura. 
"Em segundo lugar, o livro era uma contribuição ao que Bloch denominava “psicologia religiosa”. O núcleo central do estudo era a história dos milagres e concluía com uma discussão explicita do problema de como explicar que o povo pudesse acreditar em tais “ilusões coletivas” (Idem, p. 420 ss). Observou ainda que alguns doentes retornavam para serem tocados uma segunda vez, o que sugere que sabiam ter o tratamento fracassado, mas que o fato não destruía sua fé". (BURKE, 1992, p. 37).
	
	Uma edição de Os reis taumaturgos, prefaciada por Jacques Le Goff. 
"Um terceiro aspecto que enfatiza a importância do estudo de Bloch é o que seu autor chama de “história comparativa”. Algumas comparações são feitas com sociedades distantes da Europa como a Polinésia, embora sejam feitas de passagem e com extrema cautela: (“não transfiramos os Antípodas para Paris ou Londres”) (Bloch, 1924, pp. 52ss, 421n.). A comparação entre a França e a Inglaterra, porém, é central no livro, os dois únicos países em que o toque real era praticado. Acrescente-se, porém, que a comparação é feita de maneira a permitir a constatação das diferenças". (BURKE, 1992, p. 38).
Bloch realizou uma análise não política como tradicionalmente era feito devido a forte influência historicista, mas procurou abordar outros tipos de fontes, e chegou a realizar um estudo social e cultural. Uma das grandes questões que ele quis mostrar com esse livro, era que o poder dos reis também poderia está ligado a causas "sobrenaturais", milagrosas, ou como chamava-se na época supersticiosas, crendice popular, mas uma crendice que assegurava a autoridade real. 
Em 1931 ele publicou Les caractères originaux de l'histoire rurale française, onde abordara uma história rural social e econômica da França, conotando o estudo do desenvolvimento agrícola no país no período medieval e moderno. Para este livro, Bloch usou informações do campo da demografia, botânica, economia, agronomia, etc. A obra é importante no sentido que mostrou um uso interdisciplinar da história com outros saberes, algo que comumente não era feito na época.
"Les caractères originaux de l’histoire rurale française é mais famoso, talvez, pela aplicação do “método regressivo”. Bloch encarecia a necessidade de ler a “ história ao inverso”, pois conhecemos mais a respeito dos últimos períodos e deve proceder-se de maneira a ir do conhecido ao desconhecido (Idem, p. xii). Bloch trabalha de maneira eficiente o método, contudo não reclama sua criação. Sob o nome de “método retrogressivo” havia já sido empregado por F.W. Maitland – um estudioso admirado por Bloch – em sua obra clássica Domesday Book and Beyond (1897); o “além” do título refere-se ao período anterior à realização do Domesday Book, em 1086". (BURKE, 1992, p. 45).
Em 1939, ele publicou seu último livro ainda em vida, intitulado A sociedade feudal (Le Société féodale). Nessa obra, Bloch procurou estudar as características do feudalismo como suas origens, formação, desenvolvimento, consolidação, estruturas de poder, estruturas sociais, etc. Ainda hoje, é um livro recomendável para se compreender o feudalismo, embora que hoje já tenhamos trabalhos mais atualizados sobre o assunto. 
"La societé féodale, é o livro pelo qual Bloch é mais conhecido. É uma ambiciosa síntese que abrange mais de quatro séculos de história européia, vai de 900 a 1300, enfocando uma grande variedade de tópicos, muitos dos quais discutidos em outras obras: servidão e liberdade, monarquia sagrada, a importância do dinheiro e outros. Por isso, pode-se afirmar que se trata de uma obra que sintetiza o trabalho de toda a sua vida. Diferentemente de seus primeiros estudos sobre o sistema feudal, não se restringe à análise das relações entre a propriedade agrária, a hierarquia social, a guerra e o estado. Preocupa-se com a
sociedade feudal como um todo, com o que hoje designaríamos “a cultura do feudalismo”. Como também, ainda uma vez, com a psicologia histórica, com o que o autor chamava de “modos de sentir e de pensar”". (BURKE, 1992, p. 46).
Foi durante essa longa fase em Estrasburgo de 1919 a 1936 que Bloch conviveu com outros historiadores, e entre eles, Lucien Febvre, seu grande amigo. 
	
	Lucien Febvre
Lucien Paul Victor Febvre nasceu em 22 de julho de 1878 em Nancy (Meurthe-et-Moselle). Estudou no Liceu de Nancy, posteriormente mudou-se para o Liceu Louis-le-Grand, onde por dois anos estudou retórica superior. Em 1897 com 21 anos, ingressou na Escola Normal Superior e depois por um tempo na Universidade Paris-Sorbonne, até que em 1902 prestou o agregátion em história e geografia. Passou a trabalhar como professor no ensino médio e a escrever sua tese de doutorado, tendo sido orientado por Gabriel Monod. Em 1911 defendeu sua tese intitulada Phillipe II et la Franche-Comté: la crise de 1567, ses origines et ses conséquences, étude d'historie politique, religieuse et sociale. No ano seguinte a Editora Champion publicou sua tese. Nessa obra como aponta no longo título, Febvre procurou analisar essa crise no reinado do rei espanhol, Filipe II, não apenas sob uma óptica política, mas religiosa e social. Aqui podemos notar que o seu estudo sobre essa crise ocorrida no Franco-Condado partiu de um viés triplo, e não do tradicionalismo historicista. Além disso, o foco também não foi estudar a pessoa do rei, mas suas decisões governamentais. Novamente rompia-se com o estudo dos "grandes homens". 
Tornou-se professor na Faculté de Lettres de Dijon (1912-1914), acabou servindo na guerra, onde chegou a patente de capitão, ao ponto de comandar umas das baterias de artilharia.Em 1919 ingressou na Universidade de Estrasburgo onde ficaria até 1931, quando no ano seguinte tornou-se professor no Collège de France, onde manteve-se trabalhando até 1953. 
"Essa fase de sua carreira iniciou-se com quatro conferências sobre os primórdios do Renascimento francês, uma biografia de Lutero e um artigo polêmico sobre as origens da Reforma francesa, a qual descreveu como “uma questão mal posta”. Todos esses trabalhos referiam-se à história social e à psicologia coletiva". (BURKE, 1992, p. 39).
"Escreveu mais de uma dezena de livros e mais de dois mil artigos em revistas especializadas. Participou como fundador da Revue d'Histoire Moderne (1926), da Revue d'Historie de la Seconde Guerre Mondiale, dos Cahiers d'Historie Mondiale. [...]. Colaborou, principalmente, na Revue de Synthèse Historique, na Revue Historique, na Revue de Histoire Moderne e na Revue de Critique d'Historie et Littérature. Dirigiu a Encyclopédie Française (1935-1940), onde pode pôr em prática as suas ideais contra a especialização em história e a favor do espírito de colaboração entre as ciências humanas e sociais". (CORDEIRO JR, 2010, p.71).
Um dos livros que publicou nessa época foi Martinho Lutero, um destino (1928). Talvez, o seu segundo trabalho mais importante se tratando de estudos sobre a Idade Moderna, até então feitos por ele. A temática do Renascimento, da Reforma, das mentalidades modernas, seriam objetos de estudo de Febvre em outras de suas obras. 
Febvre também foi membro de dezenas de instituições científicas e históricas, como também dirigiu algumas delas, além de atuar como consultor e conselheiro. Alguma das instituições que ele atuou estiveram Centre Nationale de Recherche Scientifique (CNRS), Comité Français de sciences historiques, Comission internationale pour i'Histoire de développement scientifique et culturel de i'humanité, e até mesmo na UNESCO.
"Pois o Febvre universitário, predominante aqui, houve um outro, o Febvre militante e cidadão do Socialiste Comtois ou do Comitê de vigilância dos intelectuais antifascista, o Febvre conferencista e organizador, homem de palavra e de ação, enfim um dos últimos espécimes destes historiadores românticos habitados pelo passado para melhor viver no presente, como Michelet, este mestre reconhecido e amado do historiador do Franco-Condado". (CORDEIRO JR, 2010, p. 72 apud CHARLE, 1991, p. 1488). 
Influência das ciências sociais:
	
	Émile Durkheim
No campo das ciências sociais, a sociologia, filosofia, geografia, antropologia, psicologia, etc., haviam se modificado em relação ao século anterior. Na sociologia, o notório sociólogo francês, Émile Durkheim (1858-1917) ainda no final do século XIX começou a publicar importantes trabalhos que redefiniriam o rumo da Sociologia, rompendo com o positivismo de Comte, propondo um novo método para se estudar sociologia, algo visto em seu livro Regras do método sociológico (1895). Em 1896 ele criou a revista L'Année Sociologique que contribuiu para difundir suas ideias pela França e depois Europa e América do Norte. Os trabalhos de Durkheim tiveram grande influência na formação de Bloch. Ainda na sociologia também tivemos os trabalhos do sociólogo, jurista e economista alemão, Max Weber (1864-1920), que ficou mundialmente conhecido com a publicação de seu livro, A ética protestante e o espírito do capitalismo (1904). Obra essa que Burke [2010] disse que além de tratar de sociologia também possui aspectos culturais. 
Na filosofia tivemos os trabalhos de Henri Berr (1863-1954) que especialmente influenciaram Lucien Febvre, o qual chegou a manter contato e desenvolver uma amizade com esse filósofo francês. Berr em 1900 criou a Revue de synthèse historique, a qual influenciou Febvre quase três décadas depois, a criar sua própria revista. No campo da filosofia também não poderíamos esquecer de Karl Marx (1818-1883). Embora o marxismo não teve uma grande influência na historiografia dos Annales, mas teve uma influência bastante significativa em outros países como Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos e Brasil. Mas, o pensamento de Marx contribuiu para moldar a Sociologia do início do século XX, juntante com Durkheim e Weber.  
	
	Vidal de La Blache
Da geografia tivemos a influência de Paul Vidal de La Blache (1845-1918), o qual fundou a Escola Francesa de Geografia. Em 1893 em parceira com Lucien Gallois, criou a revista Annales de Géographie, o qual se tornou uma importante revista acadêmica do gênero no país. O geógrafo alemão, Friedrich Ratzel (1844-1904) teve bastante destaque no século XIX, principalmente por seu conceito de "determinismo geográfico". Embora fosse mais conservador do que La Blache, a obra destes dois geográfos influenciaram Febvre, o qual mostrava interesse em unir a geografia a história. Por sua vez, Bloch, visava fazer essa união entre a história e a sociologia. O filósofo, sociólogo e antropólogo francês Lucien Lévy-Bruhl (1857-1939) foi um estudioso do qual algumas de suas ideias como "pensamento pré-lógico" e "mentalidade primitiva" influenciaram Febvre nos anos 30. Além disso, Lévy-Bruhl chegou a ser professor Marc Bloch. 
O historiador francês, Émile Mâle (1862-1954) começou a desenvolver trabalhos de ordem cultural, estudando as artes. Sua atenção dada ao estudo das artes no meio social, também influenciou Febvre, assim como os trabalhos do linguista Antoine Meillet (1866-1936) um dos discípulos de Durkheim. 
"Febvre reconheceu também seu débito para com inúmeros historiadores anteriores. Durante toda a vida expressou sua admiração pela obra de Michelet. Reconheceu Burckhardt como um de seus “mestres”, juntamente com o historiador da arte Louis Courajod. Confessa também uma surpreendente influência, a do político de esquerda Jean Jaurès, através de sua obra Histoire socialiste de la révolution française (1901-3), “tão rica em intuições sociais e econômicas” (Febvre, 1922, p.vi. Cf. Venturi, 1966, 5-70)". (BURKE, 1992, p. 30).
Uma das características marcantes dos Annales seria sua tendência a interdisciplinaridade, em se combinar o desenvolvimento metodológico, teórico e técnico de outras ciências sociais para ampliar os horizontes da pesquisa história e seu debate no passado e no presente, de forma a romper com o historicismo.
"O grupo ampliou o território da história abrangendo áreas inesperadas do comportamento humano e a grupos sociais negligenciados pelos historiadores tradicionais. Essas extensões do território histórico estão vinculadas à descoberta de novas fontes e do desenvolvimento de novos métodos para explorá-los. Estão também associadas à colaboração com outras ciências ligadas ao estudo da humanidade, da geografia à linguística, da economia à psicologia. Essa colaboração interdisciplinar manteve-se por mais de sessenta anos, um fenômeno sem precedentes das ciências sociais (BURKE, 1997, p. 126-7)".
Uma "crise da história": 
"Durante quase toda primeira metade do século XX, a mentalidade metódica, baseada nas regras da erudição, atingiu de maneira tão ampla e profunda a historiografia que se manteve hegemônica. Entretanto, isto não impediu que a disciplina histórica tivesse sofrido mudanças significativas, especialmente no que concerne ao alargamento do campo de atuação dos historiadores, bem como da expansão das temáticas e das abordagens até então desprezadas ou desconhecidas no século XIX". (CORDEIRO JR, 2010, p. 74).
Após a Primeira Guerra a educação em França sofreu alguns abalos. Parte dos investimentos foram reduzidos, o acesso as universidades ficou mais difícil; o ensino de história nas escolas começou a ser questionado, especialmente na fase do ensino fundamental, pois alguns políticos alegavam que não havia necessidade de ensinar as crianças a História; no campo historiográfico, ao se estudar as causas que levaram ao desencadeamento da guerra, alguns historiadores começaram a observar que apenas fatores de ordem política não justificavam o início daquele conflito. Havia mais por trás de tudo aquilo. Isso levou a uma "crise da história", ou pelomenos, a uma das "várias crises" que a história vivenciou no século XX. Pois de acordo com Chartier [2010] até os anos 90 ainda vivenciava-se uma "crise da história".
"Neste momento, podem-se verificar duas dimensões diferentes e ao mesmo tempo complementares da crise da história: no âmbito das ciências humanas, vive-se de fato uma forte tensão intelectual concernente às limitações da história metódica, que por sua vez revela uma dimensão macro-histórica da problemática social e política das primeiras décadas do século XX. O esforço em garantir objetividade à história, mas se limitando à história política, não mais atendia aos interesses das novas gerações de historiadores que percebiam com certa preocupação, alentadas pelo otimismo frente ao avanço das ciências sociais, a instabilidade de que se estabelecia na historiografia". (CORDEIRO JR, 2010, p. 75).
"Eis que nos permite notar que a crise da história, a incontestável crise que atravessa a história no nosso mundo contemporâneo, os ataques ao mesmo tempo de vários flancos opostos dos quais ela é o objeto, as incerteza e os torvelinhos sobre ela mesma de quem ela dá o espetáculo cotidiano, tudo isto não a sequela de um mal próprio a esta velha Clio; tudo isto é o aspecto especificamente histórico de uma grande crise do espírito, melhor, ela é somente um dos signos, e ao mesmo tempo uma das consequências, de uma transformação muito recente da atitude dos homens de ciência diante da ciência". (CORDEIRO JR, 2010, p. 76 apud FEBVRE, 1955, p. 306). 
"Baseada nas críticas formuladas desde a aurora do século XX, o movimento dos Annales vem com o objetivo de revolucionar o trabalho e o universo científico do historiador. Será dessas críticas que a escola dos Annales extrairá seu caráter inovador, da história-problema à promoção de pesquisas coletivas (DOSSE, 2003ª, p. 48). A “escola” dos Annales sacramentaria a guerra à história tradicional tendo “como alvo essencial a escola metódica, chamada pejorativamente de “história historicizante (...) tratava-se, portanto, de se afastar o sujeito para quebrar o relato historicizante e fazer prevalecer a cientificidade do discurso histórico renovado pela ciências sociais” (FARIAS;FONSECA;ROIZ, 2006, p. 123 apud DOSSE, 2003b, p. 327).
Bloch e Febvre em sua residência em Estrasburgo testemunharam essa crise pós-guerra, mas principalmente essa "crise da história", e tal condição foi preponderante para o surgimento da revista deles, como uma resposta a essa crise teórico-metodológica. 
Os anos em Estrasburgo:
"Nos anos que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, Estrasburgo era efetivamente uma nova universidade, pois a cidade vinha de ser recentemente desanexada da Alemanha, criando um ambiente favorável à inovação intelectual e facilitando o intercâmbio de idéias através das fronteiras disciplinares". (BURKE, 1992, p. 34).
"Quando Febvre e Bloch se encontraram em 1920, logo após as suas nomeações como professor e maitre de conférences respectivamente, rapidamente tornaram-se amigos (Febvre, 1945, p. 393). Suas salas de trabalho eram contíguas, e as portas permaneciam abertas (Febvre, 1953, p. 393). Em suas infindáveis discussões participavam colegas como o psicólogo social Charles Blondel, cujas idéias eram importantes para Febvre, e o sociólogo Maurice Halbwachs, cujo estudo sobre a estrutura social da memória, publicado em 1925, causou profunda impressão em Bloch". (BURKE, 1992, p. 34).
	
	Vista do Palácio universitário da Universidade de Estrasburgo, um dos principais prédios do campus universitário.
"Outros membros da faculdade de Estrasburgo participaram, ou vieram a participar, das preocupações de Febvre e Bloch. Henri Bremond, autor da monumental Histoire littéraire du sentiment religieux en France depuis la fin des guerres de religion (1916-1924), lecionou em Estrasburgo durante o ano de 1923. Sua preocupação com a psicologia histórica inspirou Febvre em sua obra sobre a Reforma. O historiador da Revolução Francesa, Georges Lefebvre, cujo interesse pela história das mentalidades era muito próximo do dos fundadores dos Annales, aí lecionou de 1928 a 1937. Não é gratuito sugerir que a idéia do famoso estudo de Lefebvre sobre “o grande medo de 1789” deve alguma coisa ao ensaio anterior de Bloch sobre o rumor. Lecionaram também em Estrasburgo: Gabriel Le Bras, um pioneiro da sociologia histórica das religiões, e André Piganiol, cujo ensaio sobre os jogos romanos, publicado em 1923, revela um interesse pela antropologia semelhante ao de Bloch na sua obra Les Rois Thaumaturges, editada um ano depois". (BURKE, 1992, p. 35). 
	
	Henri Pirenne
Em 1920 Lucien Febvre havia planejado criar uma revista de história econômica, a qual seria dirigida pelo renomado historiador belga Henri Pirenne (1862-1935), mas devido a algumas dificuldades, entre elas, a recusa de Pirenne a aceitar a direção, Febvre acabou abandonando a ideia. Oito anos depois, Bloch tentou retomar esse antigo plano. Febvre concordou, e no ano seguinte criaram os Annales d'historie économique et sociale. 
"Novamente, foi solicitado que Pirenne dirigisse a revista; contudo, em virtude de sua recusa, Febvre e Bloch tornaram-se os editores. Originalmente chamada Annales d’histoire économique et sociale, tendo por modelo os Annales de Géographie de Vidal de la Blache, a revista foi planejada, desde o seu início, para ser algo mais do que uma outra revista histórica. Pretendia exercer uma liderança intelectual nos campos da história social e econômica. Seria o porta-voz, melhor dizendo, o alto-falante de difusão dos apelos dos editores em favor de uma abordagem nova e interdisciplinar da história". (BURKE, 1992, p. 42).
Uma revista de combate:
"O primeiro número surgiu em 15 de janeiro de 1929. Trazia uma mensagem dos editores, na qual explicavam que a revista havia sido planejada muito tempo antes, e lamentavam as barreiras existentes entre historiadores e cientistas sociais, enfatizando a necessidade de intercâmbio intelectual. O comitê editorial incluía não somente historiadores, antigos e modernos, mas também um geógrafo (Albert Demangeon), um sociólogo (Maurice Halbwachs), um economista (Charles Rist), um cientista político (André Siegried, um antigo discípulo de Vidal de la Blache)". (BURKE, 1992, p. 42).
"Os historiadores econômicos predominaram nos primeiros números: Pirenne, que escreveu um artigo sobre a educação dos mercadores medievais; o historiador sueco Eli Heckscher, autor do famoso estudo sobre o mercantilismo; e o americano Earl Hamilton, muito conhecido por suas obras sobre as finanças americanas e sobre a revolução dos preços na Espanha. Nessa ocasião, a revista tinha a feição de um equivalente francês, ou de uma rival, da Economic History Review inglesa. Contudo, em 1930, declarava-se a intenção de a revista estabelecer-se “sobre o terreno mal amanhado da história social”. Preocupava-se também com o problema do método no campo das ciências sociais, tal como a Revue de Synthèse Historique". (BURKE, 1992, p. 41-42).
"Entre o ano de sua fundação (1929) e 1945, quando esteve em mãos do “duo de Estrasburgo” (Lucien Febvre e Marc Bloch), cerca de 60% dos trabalhos por ela publicados estiveram dedicados à história econômica. De 1946 a 1969, período em que mais se fez sentir o peso da influência de Fernand Braudel, tal porcentagem oscilou ao redor de 40%". (FRAGOSO; FLORENTINO, 1997, 53).
Em 1933 Bloch mudou-se com sua família para Paris, para ingressar como professor no Collège de France, renomada instituição a qual por duas vezes lhe foi negado trabalho. Três anos depois, foi a vez de Febvre se mudar para a capital francesa, pois foi nomeado professor de história econômica na Sorbonne, e presidente do comitê da Enclyclopèdie Française. Essa mudança do centro "aberto" de Estrasburgo para as instituições mais conservadoras e tradicionais na capital, não interferiu no modo de pensar dos "annalistes" como ficariam conhecidos seus membros e colaboradores. A partir desse posicionamento na capital, Bloch, Febvre e seus colaboradoresaproveitaram para intensificar suas propostas e debates.
"Pouco a pouco os Annales converteram-se no centro de uma escola histórica. Foi entre 1930 e 1940 que Febvre escreveu a maioria de seus ataques aos especialistas canhestros e empiricistas, além de seus manifestos e programas em defesa de “um novo tipo de história” associado aos Annales – postulando por pesquisa interdisciplinar, por uma história voltada para problemas, por uma história da sensibilidade, etc. (Febvre, 1953, pp. 3- 43, 55-60, 207-238)". (BURKE, 1992, p. 49).
Essa ideia de crítica e combatividade, levou alguns como o historiador Antoine Prost a chamar os Annales de uma "revista de combate". Um "combate" a "Escola Metódica", ao historicismo e ao positivismo comteano. Castro [1997] fala que o surgimento dos Annales, e sua abordagem a história econômica e social, pode ser considerado como uma ruptura e um confronto a cultura historiográfica vigente, daí ela falar que a ideia que hoje temos de "história social", começou com o Annales, embora essa área já existisse antes. 
"Com os Annales a história se renovou reformulando suas regras, impondo o tríptico “economia-sociedade-civilização” em detrimento do binômio metódico “história factual-história política”. Esse tríptico manterá juntos sociólogos, geógrafos, psicólogos e historiadores dos Annales, em prol da rejeição comum do historicismo. Assim os Annales propõem o alargamento da história, orientando o interesse dos historiadores para outros horizontes: a natureza, a paisagem, a população e a demografia, as trocas, os costumes. Ampliam-se as fontes e os métodos, os quais devem incluir a estatística, a demografia, a linguística, a psicologia, a numismática e a arqueologia". (FARIAS; FONSECA; ROIZ, 2006, p. 124 apud DOSSE, 2003ª, p. 83).
"Há dois eixos gerais que subentendem a experiência dos Annales: a reivindicação de uma história experimental científica (mais do que culta) por um lado; e, por outro, a convicção de uma unidade em construção entre a história e as ciências sociais. Os dados acerca destes dois pontos eram, à partida, abertos; e continuaram a ser reformulados desde os primórdios do movimento, ao mesmo tempo que se transformavam as próprias condições do trabalho histórico". (CORDEIRO JR, 2010, p. 77 apud REVEL, 1989, p. 12).
"Sob o signo mais forte dos Annales, desenvolvia-se, desde a década de 1930, uma “história econômica e social”. Apesar da maior ênfase na história econômica, nos primeiros anos da revista, a “psicologia coletiva” e as hierarquias e diferenciações sociais também encontravam-se presentes. A oposição à historiografia rankiana e a definição do social se construía, assim, a partir de uma prática historiográfica que afirmava a prioridade dos fenômenos coletivos sobre os indivíduos e das tendências a longo prazo sobre os eventos na explicação histórica, ou seja, que propunha a história como ciência social". (CASTRO, 1997, p. 79). 
Repensando a história:
Duas ideias fundamentais dessa primeira geração, foram a chamada "história total" e a "história-problema". Durante o VI Congresso Internacional de Ciências Históricas ocorrido em Oslo, Dinamarca em 1928; Marc Bloch defendeu a concepção de "história total" a qual compartilhava com Febvre. E que viria a ser desenvolvida na revista dos Annales. 
A ideia de "total" não referia-se a um pensamento positivista de se tentar contar a História em sua totalidade, mas no princípio de contar a História não limitada apenas a história política, ao Estado-nação, aos "grandes homens", aos "grandes acontecimentos", mas abordar os aspectos sociais, econômicos e posteriormente culturais; em se construir uma interdisciplinaridade com a sociologia, geografia, filosofia, arqueologia, antropologia, psicologia, etc. Contar a História sob várias perspectivas que de tal forma pudessem responder as perguntas e questões que a história política não era capaz de responder. 
A partir desse princípio, Febvre concebeu o que ele chamou de "história-problema". Para ele o fato histórico não existia por si só, ele não se encontrava "pronto" nos documentos aguardando ser descoberto por um historiador, como o pensamento positivista passou a expor. Pelo contrário, os fatos históricos são "construções" que o historiador elabora a partir da crítica das fontes e suas investigações. Não devemos entender aqui o conceito de "construção" como criar uma mentira ou inventar, não. A ideia aqui é que nem todos os fatos são importantes para a História, que o passado por si só não faz a História. 
Para Febvre o historiador inicia sua investigação a partir de um "problema", onde ele irá procurar nas fontes a solução para esse "problema", de forma a confirmá-lo ou desmenti-lo. Aqui Febvre reforça sua concepção que os fatos históricos não são inatos, não residem "prontos" nos documentos, pois um documento pode ter muito a dizer, ou pelo contrário, pouco a dizer. E além disso, nem todo documento possui uma significância para a História. Uma fonte tem serventia para a História, quando um historiador concede a ela uma cadeia de significados que a permitam ser encaixada num conjunto de significância maior em sua pesquisa que leve a alguma contribuição para algum aspecto da História. É a partir do "problema" proposto pelo historiador que se inicia a pesquisa histórica. 
"Pois é exatamente em face de um novo entendimento da relação do passado/presente e da noção de que a história é um conhecimento produzido a partir das exigências do contexto de vida do historiador, que Febvre vai aos poucos construindo seu pensamento historiográfico. Suas obras históricas são orientadas pelo princípio da problematização, observada na própria montagem do seu relato histórico, obedecendo a uma lógica de elaboração de perguntas ou hipóteses dirigidas ao passado. Assim, a história, como toda produção científica, independente do campo disciplinar ao qual pertence, tem como motivo fundante de seu exercício racional a busca por respostas a problemas que são postos à partida do trabalho de pesquisa". (CORDEIRO JR, 2010, p. 89).
"A novidade dos Annales não está no método, mas nos objetos e nas questões. As normas da profissão foram integralmente respeitadas por L. Febvre e M. Bloch: o trabalho a partir dos documentos e a citação das fontes. Eles haviam aprendido o ofício na escola de Langlois e Seignobos, sem deixar de criticar a estreiteza das indagações e a fragmentação das pesquisas; rejeitam a história política factual que, nessa época, era dominante em uma Sorbonne que, além de se isolar, estava corroída pelo imobilismo". (PROST, 2008, p. 39). 
Além dessa tendência de ruptura com o tradicionalismo historiográfico vigente na época, e além de propor uma interdisciplinaridade com as ciências sociais, e repensar o estudo e a pesquisa da História, Febvre e Bloch também propuseram uma aproximação da sua revista com o público leigo. O Annales nessa primeira geração procurou dar atenção ao fato que a História não tratava apenas do passado, mas também do presente, e também procurou levar dar acesso a esses debates ao público "não iniciado", ao público não acadêmico, de forma que os aproximassem não necessariamente dos embates teóricos, mas da ciência histórica. 
Nos Annales, o estudo da história passou a ser tratado de fato como uma ciência, fosse ela chamada de "ciência humana" ou "ciência social", mas de qualquer forma, eles queriam mostrar que havia essa identidade científica no saber histórico. Não obstante, uma característica que reforça essa tendência, foi o uso de uma temporalidade relativa, baseada na Relatividade de Albert Einstein. Com essa ideia, o tempo não era visto como algo homogêneo e monolítico, mas o tempo passou a ser visto como sendo interpretado de diferentes formas pelos povos, de que a ideia de progresso não era unânime, que o tempo da História não é igual ao tempo natural. Sobre isso, voltaremos a ver durante a Segunda Geração, onde Braudel desenvolveu essa questão de temporalidade.
Outro aspecto que os Annales defenderam foi uma maior atenção para o estudoda materialidade histórica (não confundir com o materialismo histórico proposto por Marx e Engels), ou seja, estudar o papel do desenvolvimento tecnológico nas sociedades, e a importância do consumo e da produção para a economia e o desenvolvimento das sociedades. Pelo fato dos Annales de se proporem e escrever sobre história econômica, esse viés da materialidade histórica foi bastante empregado nessa área.
Contudo, Vainfas [1997] também assinala que ainda nessa primeira geração, podemos destacar a produção de artigos ligados a "história das mentalidades", tendência que aumentaria na segunda geração, mas principalmente na terceira geração. A "história das mentalidades" como Chartier [1997] fala, consiste num termo difícil de ser conceituado fora da língua francesa, daí de se haver confusões para se identificar o início desses estudos. 
"Bloch e Febvre inauguraram, pois, nos primórdios dos Annales, o estudo das mentalidades, delas fazendo um legítimo objeto de investigação histórica. Mas não se pense que foram eles os primeiros a se dedicarem ao estudo de sentimentos, crenças e costumes na historiografia ocidental. Para citar apenas alguns autores que lhes antecederam ou foram deles contemporâneos nessas preocupações, vale lembrar o próprio Michelet, autor de La sorcière, em 1862 (traduzido em Portugal), e o importante Georges Lefebvre, autor de La grande peur, livro sobre a onda de pânico que varreu a França rural no contexto revolucionário francês. E se for o caso de dar exemplos fora da França, não se pode esquecer do grande historiador holandês Johan Huizinga, autor de O outono da Idade Média (de que há várias traduções), obra publicada em 1919 sobre sentimentos, costumes e religiosidades na França e nos Países Baixos nos séculos XIV e XV, nem de Norbert Elias, sociólogo e historiador alemão que, antecipando-se a Foucault em décadas, publicou em 1939 o seu 0 processo civilizador, livro sobre a sociedade de corte e o surgimento da etiqueta na Europa moderna". (VAINFAS, 1997, p. 197). 
Mudanças de nome na revista e o adeus de Bloch:
Em 1939 a revista mudou de nome para Annales d'historie sociale. Nesse caso, os diretores e seus colaboradores visavam focar o desenvolvimento da revista apenas no campo social, pois antes havia o campo econômico também incluso, mas isso não significa que a história econômica saiu de pauta, não; ela apenas deixou de ter um maior espaço no material publicado nessa revista. Ao mesmo tempo, Marc Bloch aos seus 53 anos de idade, alistou-se voluntariamente ao Exército francês para lutar na Segunda Guerra. Assim, Febvre nesse período cuidou da direção da revista quase que sem o apoio de seu amigo e sócio. 
"Enquanto isso, Febvre continuava a editar a revista, primeiramente com o nome de ambos, mais tarde apenas sob o seu. Muito velho para lutar, passou a maior parte da guerra em sua casa de campo escrevendo artigos e livros sobre a Renascença Francesa e a Reforma. Diversos desses estudos são sobre indivíduos, como Marguerite de Navarre e François Rabelais, não são, porém, biografias estritamente falando. Fiel aos seus preceitos, Febvre elaborava seus estudos tendo por centro problemas. Como pode, por exemplo, Marguerite , uma princesa letrada e piedosa, escrever uma série de histórias, L’Heptameron, algumas das quais extremamente obscenas? Era ou não Rabelais um ateu?". (BURKE, 1992, p. 51).
Em 1942, a revista voltou a mudar de nome, agora para Mélanges d'historie sociale. Nessa época, Bloch havia retornado do campo de batalha, após duras derrotas para a França, e também por ter sido ferido. Contudo com o avanço do nazismo sobre a França, e a consolidação do Regime de Vichy (1940-1944) imposto pela marechal francês Phillipe Pétain, o mesmo começou a adotar a tendência antissemitista do Estado alemão nazista. Bloch que vinha de uma família judia, se tornou alvo do Estado ditatorial francês. Ao mesmo tempo, embora tenha retornado a vida acadêmica, ainda manteve-se ligado a grupos de resistência, mas isso não viria a lhe dá bons resultados. O governo francês cobrou que os judeus deixassem seus cargos na instituições públicas, de ensino, militar, etc., Bloch foi sentenciado a deixar sua função no Collège de France e na direção dos Annales. Marc Bloch a partir de 1942 entrou na clandestinidade. Em 1943 aliou-se a Resistência em Lyon, motivo a mais para se tornar um foragido do Estado. Posteriormente acabou sendo capturado e preso pelos alemãs ainda em 1943. Nesse período que também acabou sendo capturado e mantido preso, escreveu dois livros: L’Étrange défaite, obra essa iniciada em 1940, onde ele tentou dar seu parecer e opinião sobre a Primeira Guerra Mundial e a recém iniciada Segunda Guerra Mundial, como também encontrar motivos para a derrota francesa. 
O segundo livro foi o Apologia da história ou o ofício do historiador, obra publicada postumamente com o apoio de um dos seus filhos Étienne Bloch e Lucien Febvre. Tal livro acabou ficando incompleto e apresenta comentários, notas e dúvidas do autor, pelo fato de não ter tido acesso a suas fontes. Apologia da história consiste numa obra de teor teórico, onde Bloch procurou debater o papel da história e a profissão do historiador. Ainda hoje é considerado um livro importante para se compreender o papel do historiador na sociedade.
Marc Bloch acabou sendo torturado pela Gestapo (a polícia secreta do Estado alemão), a fim de delatar informações sobre a Resistência, e em em 16 de julho de 1944 em Saint Didier de Formans, perto de Lyon, foi fuzilado pelos nazistas. Bloch recebeu honrarias por parte dos familiares, amigos e do próprio Estado. Sendo lembrado não apenas como um grande historiador, mas como um francês que serviu e lutou por sua pátria durante duas guerras mundiais. 
Pós-guerra:
"Depois da guerra, Febvre teve finalmente sua chance. Foi convidado a auxiliar na reorganização de uma das instituições mais prestigiosas no sistema francês de educação superior, a École Pratique des Hautes Études, fundada em 1884. Foi eleito membro do Instituto e tornou-se também o delegado francês na UNESCO, participando da organização da coleção sobre a “História Cultural e Científica da Humanidade”. Em razão dessas múltiplas atividades, sobrou-lhe pouco tempo para escrever com vagar, e os projetos de seus últimos anos jamais foram concluídos (como o volume sobre o “Pensamento ocidental e a crença”, de 1400 a 1800), ou, então, foram terminados por outros". (BURKE, 1992, p. 56).
Em 1945, a revista voltou a assumir o nome de Annales d'historie sociale, embora que duraria pouco esse nome, pois viria a sofrer uma nova mudança em breve. Mas, devido a suas outras ocupações e a sua idade de 67 anos, Febvre viu que era hora de pedir ajuda para manter os negócios na revista, enquanto cada vez mais, estava ocupado com o trabalho na Escola Prática de Altos Estudos (École Pratique des Hautes Études), onde em 1947 viria a fundar a Seção VI e tornar-se seu presidente, assim como também o diretor do Centro de Pesquisas Históricas, criado dentro da Seção VI. 
"Os Annales começaram como uma revista de seita herética. “É necessário ser herético”, declarou Febvre em sua aula inaugural, Oportet haereses esse (Febvre, 1953, p.16)46. Depois da guerra, con tudo, a revista transformou-se no órgão oficial de uma igreja ortodoxa. Sob a liderança de Febvre os revolucionários intelectuais souberam conquistar o establishment histórico francês. O herdeiro desse poder seria Fernand Braudel". (BURKE, 1992, p. 57).
A SEGUNDA GERAÇÃO (1946-1968)
"A segunda geração, dirigida por Fernand Braudel, compreende o período entre 1946 e 1968 e é marcada pelo tema das civilizações e temas demográficos. Constitui-se como escola, ao aportar conceitos (estrutura e conjuntura) e métodos (história serial das mudanças na longa duração) definidos. O estudo das utensilagens mentais (ou psicologia histórica dos anos 30), ao lado de fontes massivas, representativas e temporalmente comparáveis e com certa regularidade, os leva a utilizar os conceitos de regularidades, quantificação,séries, técnicas, abordagem estrutural, tendo como centro de um projeto intelectual oferecer certa dinâmica às estruturas trabalhadas pelas ciências sociais e ainda tentar articular a longa duração como acontecimento". (PORTO, 2010, p. 133).
O historiador do mar: 
	
	Foto de Braudel tirada no Brasil.
Fernand Paul Achille Braudel (1902-1985) nasceu em Lumeville-en-Ormis em 24 de agosto. Seu pai Charles-Hilaire Braudel era professor e lecionava em Paris, contudo o pequeno Fernand foi enviado para a casa de sua avó e lá passou o início da vida vivendo no campo. Braudel já na sua maturidade escreveria que tivera uma origem camponesa. Posteriormente, ele sua mãe e irmãos se mudaram para os subúrbios de Paris. Braudel chegou a dizer que a distância onde os subúrbios se encontravam, lembrava muito uma zona rural. Em 1913 ingressou no Liceu Voltaire onde permaneceu até 1920. Pelo fato de ser uma criança, não foi convocado para a Primeira Guerra Mundial. Enquanto a guerra se desenrolava, na qual Febvre e Bloch estavam lutando, Braudel estava na escola estudando e começou a mostrar grande interesse pela História. Na adolescência decidiu que queria se tornar historiador. Após se formar, ingressou no mestrado na Universidade de Sorbonne, onde em pouco tempo conquistou sua pós-graduação, tendo escrito uma dissertação sobre o impacto da Revolução Francesa (1789-1799) na região de Bar-le-Duc, local onde ficava a vila onde nasceu. Inicialmente, Braudel cogitava se tornar professor em Bar-le-Duc, mas após ser aprovado no agregátion em 1922, no ano seguinte surgiu uma oportunidade de emprego. 
Naquela época a Argélia ainda era uma colônia francesa, e havia a necessidade de professores para lecionar principalmente em Argel, a capital do país, vista como um "modelo de cidade francesa" em solo africano. Braudel se mudou para a colônia ainda em 1923 e permaneceria até 1932. 
"Seu primeiro artigo importante, publicado nesse período, tinha por tema a presença dos espanhóis no Norte da África, no século XVI. Esse estudo, cujas dimensões são a de um pequeno livro, merece ser resgatado de seu imerecido esquecimento. Era, ao mesmo tempo, uma crítica a seus predecessores no tema pela ênfase que haviam atribuído aos grandes homens e às batalhas; uma discussão sobre a “vida diária” das guarnições espanholas; e também uma demonstração da estreita relação, embora invertida, entre a história africana e européia, isto é, quando estourava a guerra na Europa as campanhas africanas eram suspensas, e vice-versa (Braudel, 1928)". (BURKE, 1992, p. 58-59).
Entre 1925 e 1926 tivera que servir no Exército, já que não havia prestado serviço militar anteriormente. Ele atuou um ano na região da Renânia na Alemanha, local do qual achou bastante belo. Em 1927 seu pai morreu, Braudel retornou para a França, buscou sua mãe a qual passou a morar com ele e ainda no mesmo ano, casou-se com Paule Valier. Retornou para a Argélia e continuou com sua carreira como professor de história nas escolas, além de também coordenar eventos e comissões científicas. 
Nesses nove anos que passou transitando entre a Europa e a África, Braudel se encantou com o deserto do Saara, mas principalmente com o Mar Mediterrâneo, o qual cruzou várias vezes em suas jornadas de idas e vindas. Ainda em 1927 ele começou a planejar sua tese de doutorado, estava interessado em abordar o governo do rei de Espanha e Portugal, Filipe II (Filipe tornou-se rei de Portugal e suas colônias a partir de 1580, e manteve-se como soberano das duas coroas até o fim da sua vida em 1598). Ele chegou a se corresponder com Febvre, pois esse havia escrito sua tese sobre o rei espanhol. Febvre lhe respondeu com uma carta: "Mais que Filipe II, seria apaixonante conhecer o Mediterrâneo dos povos berberes".
Com o apoio do historiador francês, Georges Pagès (1867-1939), Braudel conseguiu contatos na Espanha para lá viajar e iniciar suas pesquisas sobre o rei Filipe II. Tivera que agir por conta própria, pois como ele lembra, nessa época não havia bolsas de pesquisa disponíveis. Em Simancas na Espanha ele iniciou suas visitas aos arquivos, e tendo comprado uma máquia fotográfica de segunda mão de um operário e cineasta americano, Braudel realizou fotos de milhares de documentos.
"Deixei os arquivistas e buscadores de Simancas cheios de inveja e admiração ao fazer, por rolos de trinta metros, duas a três mil fotos por dia. Usei e abusei do expediente na Espanha e na Itália. Graças a esse cineasta engenhoso, fui sem dúvida o primeiro utilizador de verdadeiros microfilmes, que eu próprio revelava e lia, ao longo de dias e noites, com uma simples lanterna mágica". (FLORES, 2010, p. 97-98 apud BRAUDEL, 2002, p. 8-9). 
A medida que investigava os arquivos e bibliotecas, aproveitou para escrever alguns artigos sobre assuntos e documentos que foi descobrindo. Em 1931 assistiu em Argel a apresentação de Henri Pirenne sua tese sobre o fechamento do Mediterrâneo pelos árabes. Fernand Braudel começou a se especializar na Idade Moderna e até mesmo, escreveu artigos sobre a África do Norte, região a qual visitou vários dos países. A partir de suas pesquisas nos arquivos e contato com as obras de outros historiadores crescera nele a ideia de escrever sobre o Mediterrâneo.
"Eu havia na cabeça a ideia de descobrir o passado desse mar que via todos os dias e do qual os hidroaviões de então, que voavam baixo, me proporcionavam imagens inesquecíveis. Ora, as séries ordinárias de arquivos falavam sobretudo dos príncipes, das finanças, dos exércitos, da terra, dos camponeses. De depósito de arquivos em depósito de arquivos, eu me embrenhava, então, através de uma documentação fragmentária, mal explorada, por vezes mal ou não classificada. Lembro-me de meu deslumbramento ao descobrir, em Dubrovnik, m 1934, os maravilhosos registros de Ragusa; finalmente, barcos, fretes, mercadorias, seguros, tráficos... Pela primeira vez, eu via o Mediterrâneo do século XVI". (FLORES, 2010, p. 98 apud BRAUDEL, 2002, p. 9-10). 
Em 1932 foi convidado a se tornar professor em Paris, atuando em algumas escolas como o Liceu Pasteur e o Liceu Condorcet. Ainda no mesmo ano, separou-se de sua esposa, mas no ano seguinte reataram o casamento. De 1932 a 1934 continuou com suas pesquisas nos arquivos espanhóis e até mesmo viajou para a Itália, para consultar alguns arquivos. Ao mesmo tempo tivera contato com a revista dos Annales, e com a historiografia que estava sendo desenvolvida por Bloch e Febvre. Braudel na época de seus estudos universitários, tivera influência da geografia e um pouco da sociologia, embora tenha sido educado num ambiente tradicional do metodismo e do historicismo, sua visão da História ia para além da ideia política. 
	
	Foto de Lévi-Strauss no Brasil.
Em 1934 recebeu o convite do Ministério das Relações Exteriores da França para participar de uma missão diplomática que seria enviada ao Brasil, para auxiliar no desenvolvimento dos cursos de sociologia, história, geografia e filosofia na Universidade de São Paulo (USP). Junto a sua comitiva de jovens professores seguiram também o recém sociólogo e futuro antropólogo Claude Lévi-Strauss (1908-2009), o filósofo Jean Maugüe (1904-1990), o geógrafo especialista na América do Sul, Pierre Monbeig (1908-1987) entre outros. Após o nascimento de sua filha em 1935, Braudel seguiu viagem com sua família para São Paulo, onde residiriam pelos dois anos seguintes. Em sua estada no Brasil, visitou os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia. Aproveitou para conhecer obras brasileiras como Os Sertões (1902) de Euclides da Cunha, Casa Grande e Senzala (1933) de Gilberto Freire, livro esse o qual Braudel escreveu uma resenha para os Annales. Nessa época o historiador e economista Caio Prado Júnior havia publicado em 1933, a obra Evolução Política do Brasil, uma obra de caráter marxista. 
Ele também chegou a escrever um pequeno trabalho sobre a Bahia, como também mostrou interesse pelos cangaceiros (em geral grupo de homens que usavam a violência, força e medopara combater o Estado, mas também causavam problemas a sociedade devido a seus crimes. Hobsbawm os comparou com uma espécie de banditismo). Na Bahia, Braudel chegou a comprar peças do traje dos cangaceiros e a ouvir histórias sobre Lampião (1898-1938) notório chefe cangaceiro. 
Durante sua permanência no Brasil ele ainda continuou a realizar suas pesquisas e estudos para sua tese embora de forma mais restrita devido a distância e o tempo de férias, pois aproveitava as férias de verão para retornar a Europa. Braudel chegou a dizer que os quase três anos que viveu no Brasil foram seus anos mais felizes de sua vida. Embora ele não tenha voltado a morar no país, realizou viagens para o mesmo posteriormente. 
Acabado seu contrato, em 1937 enquanto ele e sua família embarcavam no navio que os levaria a França, Braudel se encontrou com Lucien Febvre o qual retornava de uma viagem feita a Argentina. Febvre havia viajado para a Argentina e o Chile, apresentar e participar de congressos. Ambos seguiram viagem de volta a França, e isso contribuiu muito para a visão histórica de Braudel e a sua aproximação ainda mais com os Annales, pois ele passaria a se tornar colaborador da revista. 
"Foi no retorno de sua viagem ao Brasil que Braudel conheceu Lucien Febvre, que o adotou como um filho intelectual e persuadiu-o – se é que ainda necessitava de persuasão – de que o título da tese deveria ser realmente “O Mediterrâneo e Felipe ll”, e não “Felipe II e o Mediterrâneo” (Braudel, 1953, especialmente p. 5; conf. (Febvre, 1953, p. 432)". (BURKE, 1992, p. 59).
Contudo o retorno para a França lhe traria momentos difíceis e perigosos. Em 1938 seu nome foi escolhido para compor uma lista de soldados, devido a eminência de problemas militares com a Alemanha nazista de Adolf Hitler. No ano seguinte os alemães invadiram a Polônia e a Segunda Guerra se iniciou. Em 1940 Braudel foi oficialmente convocado para a guerra. 
"Ele participa da guerra, na fronteira do Reno, na Linha Maginot, um conjunto de fortificações construído na década de 1930, na condição de oficial francês. Nessa condição, Braudel se torna prisioneiro na Alemanha e é deslocado para duas prisões: Mogúncia, até 1942, onde recebia soldo mensal e tinha direito 'a cantina e distrações intelectuais' lendo livros alemães  de geografia sobre o Mediterrâneo e ministrando aula aos demais prisioneiros; depois foi transferido para Lübeck, 'um campo disciplinar' considerado 'aterrorizante', permanecendo prisioneiro até 1945, mas continuava a 'ler, ensinar e escrever". (FLORES, 2010, p. 101-102 apud LIMA, 2009, p. 143-163). 
Embora tenha ficado cinco anos preso, diferente dos quase dois anos que Bloch ficou preso, o cárcere de Braudel foi menos danoso do que o de Bloch. Com o fim da guerra ele foi libertado com seus companheiros e retornou para casa. Acabou se unindo a Febvre para pedir conselhos e orientação na conclusão de sua tese. Em 1946 a apresentou na Seção IV da Escola Prática de Altos Estudos, e no ano seguinte, a defendeu na Sorbonne, sob o título de O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na época de Filipe II (La Méditerranée et le monde méditerranéen à l'époque de Philippe II), livro que o consagraria.
	
	Uma edição de O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na época de Filipe II. 
"O Mediterrâneo é um livro de grandes dimensões, mesmo que consideremos os padrões da tradicional tese de doutoramento francesa. Sua edição original continha aproximadamente 600.000 palavras, o que perfaz seis vezes o tamanho de um livro comum. Dividido em três partes, cada uma das quais – como o prefácio esclarece – exemplifica uma abordagem diferente do passado. Primeiramente, há a história “quase sem tempo” da relação entre o “homem” e o ambiente; surge então, gradativamente, a história mutante da estrutura econômica, social e política e, finalmente, a trepidante história dos acontecimentos". (BURKE, 1992, p. 60).
"Braudel superou, de fato, a concepção cronológica da história política que contava os eventos a partir de datas sucessivas num ritmo mais ou menos previsível de causa e efeito". (FLORES, 2010, p. 103). 
Braudel dedicou sua obra a seu amigo e mentor, Lucien Febvre. Ele tentou publicar sua volumosa tese, mas as editoras se recusaram a financiar esse livro, pois consideraram a obra demasiadamente cara e com baixo público de leitura, no que renderia péssimos ganhos. Ele teve que juntar dinheiro para vim a publicar seu livro dois anos depois. Ainda em 1947 viajou para o Brasil, Argentina e Chile para participar de conferências e congressos.
A era Braudel:
"Após a guerra, os Annales - cuja revista passou a ter o título de Annales, Économies, Sociétés, Civilisations - perseguiram essa dupla estratégia em um contexto diferente. Em primeiro lugar, em 1947, com o apoio de fundações americanas e da diretoria do ensino superior, a criação de uma VI section na École pratique des hautes études direcionada para as ciências econômicas e sociais, cuja presidência foi entrega a L. Febvre. No início da década de 50, o revezamento foi assumido por Fernand Braudel que vinha de ser consagrado por sua tese sobre La Méditerranée à l' époque de Phillippe II (1949)". (PROST, 2008, p. 40-41). Em 1950, Braudel se tornou professor do Collège de France e na sua aula inaugural como de obrigatório para todos aqueles que entram nesta instituição, ele explanou um pouco da sua vida, mas principalmente da sua opinião sobre como a História estava sendo vista e estudada. 
"A história se encontra, hoje, diante de responsabilidades temíveis, mas também exultantes. Sem dúvida porque jamais cessou, em seu ser e em suas mudanças, de depender de condições sociais concretas. (...) E se seus métodos, seus programas, suas respostas mais precisas e mais seguras ontem, se seus conceitos estalam todos de uma só vez, é sob o peso de nossas reflexões, de nosso trabalho e, mais ainda, de nossas experiências vividas. Ora, essas experiências, durante estes últimos quarenta anos, foram particularmente cruéis para todos os homens: elas nos lançaram, violentamente, no mais profundo de nós mesmos e, além no destino conjunto dos homens, isto é, nos problemas cruciais da história. Ocasião de nos apiedar, de sofrer, de pensar, de recolocar forçosamente tudo em questão. Aliás, por que a frágil arte de escrever a história escaparia à crise geral de nossa época? Abandonamos um mundo sem sempre termos tido tempo de conhecer ou mesmo de apreciar seus benefícios, seus erros, suas certezas e seus sonhos - diremos o mundo do primeiro século XX? Nós o deixamos, ou antes, ele se subtrai inexoravelmente, diante de nós". (FLORES, 2010, p. 106-107 apud BRAUDEL, 1992, p. 17-18). 
De 1950 a 1952, Braudel cooperou com Febvre não apenas nos Annales, mas também no Centro de Pesquisas Históricas na Escola de Altos Estudos. Eles publicaram três séries entre os anos de 1951-1952: A primeira série intitulava-se “Portos-Rotas-Tráficos"; a segunda, “Negócios e Gente dos Negócios”; e a terceira, “Moeda-Preço-Conjuntura”.Visivelmente aqui nota-se a presença da história econômica a qual retomou um lugar de destaque nas publicações dos Annales nesta época, como atesta também a mudança do nome da revista. 
Além disso, um dos membros e colaboradores da revista era o historiador francês Ernest Labrousse (1895-1988), especialista em história econômica e social, que desde a primeira geração dos Annales vinha cooperando com Bloch e Febvre. Prost (2008) salienta que entre as décadas de 40 e 50, as obras de Labrousse estiveram em alta no meio econômico e historiográfico. Sua metodologia de estudo e pesquisa era benquista nestas áreas. Outro importante nome foi o historiador francês Georges Duby (1919-1996) que por vários anos colaborou com os Annales, especialmente durante a segunda geração e a terceira. 
	
	Robert Mandrou
Em 1954 o historiador francês Robert Mandrou (1921-1984), especialista em história moderna e história da França, discípulo de Lucien Febvre, tornou-se secretário da revista, cargo esse que manteve até 1962, quando se demitiudevido a desavenças com Braudel. Em 1956 com a morte de Febvre, Braudel se tornou de fato o diretor dos Annales, contudo, ele não se dava bem com Mandrou e outros dos membros e colaboradores da revista. Isso ficaria mais visível nos anos 60. Mandrou também é lembrando como tendo sido ao lado de Duby, iniciador do campo de pesquisa chamado "história das mentalidades", o qual hoje é visto como sendo história cultural. Mandrou e Duby apresentaram interesse para se estudar o comportamento, as representações, as opiniões, a compressão das classes sociais e das sociedades na História. A "história das mentalidades" se popularizaria na terceira geração. Phillipe Àries e Michel Vovelle ainda no final da segunda geração, também passariam a estudar o lado cultural da história. 
"Braudel também sucedeu Febvre como presidente da VI Seção da École. Em 1963, criou uma nova entidade dedicada à pesquisa interdisciplinar, a Maison des Sciences de l’Homme. No seu tempo, a Seção, o Centro e a Maison, todos se mudaram para o 54, Boulevard Raspail, onde a convivência com antropólogos e sociólogos da qualidade de Claude Lévi-Strauss e Pierre Bourdieu, disponíveis para as conversas de café e para seminários conjuntos, manteve e continuou a pôr os historiadores dos Annales em contato com as novas idéias e desenvolvimentos das ciências vizinhas". (BURKE, 1992, p. 75).
"Tendo conservado em suas mãos, durante os seus anos de direção, o controle dos fundos para a pesquisa, publicações e nomeações, guardou para si um grande poder, que usou para promover o ideal de um “mercado comum” das ciências sociais, onde a história era um membro dominante. (Braudel, 1968b, p.349). As bolsas de estudo concedidas a jovens historiadores estrangeiros, como os poloneses, para estudar em Paris ajudaram a difundir no exterior o novo estilo francês, de fazer história. Por outro lado, era notório que Braudel destinava os recursos preferentemente aos historiadores que se dedicavam à época moderna (1500-1800). Se seu império não foi tão vasto quanto o de Felipe II, tinha, porém, um dirigente mais decidido". (BURKE, 1992, p. 75-76).
Além desse controle, poder e autoridade sobre os Annales, Braudel também influenciou com seu trabalho, historiadores velhos e novos como Pierre Chaunu (1923-2009), Emmanuel Le Roy Ladurie, Jacques Le Goff, Pierre Goubert (1915-2012), Pierre Vilar (1906-2003), etc. Como será visto adiante, alguns destes nomes como Le Roy Ladurie e Le Goff, se tornariam diretores e secretários dos Annales durante a terceira geração. Braudel se manteria na direção até 1968, quando devido a uma onda de acontecimentos, pediria afastamento do cargo.
A longa duração e os "três tempos":
Um dos maiores legados da segunda geração foi o desenvolvimento da temporalidade realizado por Braudel, sua ideia de dividir o tempo histórico-processo em três durações e velocidades, algo marcante em seu livro O Mediterrâneo e nas suas demais obras após esse livro. 
Para entendermos esse legado, é preciso conhecer um pouco dessa teoria braudeliana. Primeiro, é importante saber que o "tempo histórico" não é igual ao "tempo natural", ou seja, para o estudo da História, em muitos casos o historiador ele "recorta" o tempo, a fim de determinar fronteiras pelas quais ele guiará a pesquisa histórica. Não obstante, foram também os historiadores que criaram a divisão temporal da História, por exemplo, o que chamamos de Pré-história, Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea é uma temporalização na qual dividi-se certas épocas da História humana (vale lembrar que a geografia possui divisões temporais para o que ela chama de eras geológicas), de forma a facilitar e guiar a compreensão do mundo e das sociedades no tempo. Se não fosse essa construção do "tempo histórico" ficaria complicado as pessoas localizarem os acontecimentos históricos.
No caso de Braudel sua teoria temporal não foi concebida para nomear períodos históricos como mencionado acima, mas sim tornar-se uma metodologia para a pesquisa e a escrita da história. Braudel concebeu dividir o tempo em três durações: curta, média e longa durações, sendo a última a mais famosa, pois foi a qual ele usava e desenvolveu o conceito, embora que a partir da conceitualização da longa duração, ele chegou a repensar as outras duas temporalidades também.
"Entendamo-nos: não há um tempo social com uma única e simples corrente, mas um tempo social com mil velocidades, com mil lentidões que quase nada têm a ver com o tempo jornalístico da crônica e da história tradicional. Creio assim na realidade de uma história particularmente lenta das civilizações, nas suas profundezas abissais, nos seus traços estruturais e geográficos. [...]. Além disso, há, ainda mais lenta que a história das civilizações, quase imóvel, uma história dos homens e suas relações estreitas com a terra que os suporta e os alimenta; é um diálogo que não cessa de repetir-se, que se repete, que pode mudar e muda na superfície, mas prossegue, tenaz, como se estivesse fora do alcance e da mordedura do tempo". (FLORES, 2010, p. 108 apud BRAUDEL, 1992, p. 25-26).
Braudel dizia que certas mudanças históricas só seriam apenas perceptíveis após se passarem dezenas de anos, pois tais mudanças agiriam de forma lenta, que em determinado momento chegariam ser quase que "imóveis", e quase passariam despercebidas, mas para se notar que elas transcorreram, o historiador deveria olhar para a História a partir de um ponto de vista da longa duração, abrangido um século ou mais. 
A partir dessa ideia de se estudar a História de um recorte extenso, Braudel adentrou a área da "história das civilizações", campo surgido no século XIX, mas que ganhou novas diretrizes no século XX, tendo com história britânico Arnold J. Toynbee (1889-1975) um dos seus expoentes. Braudel chegou a dizer que certas questões de ordem econômica, política, social, cultural, religiosa, etc., só seriam visíveis ao se estudar as civilizações, as comparando, procurando levantar semelhanças e diferenças, destrinchando seus processos formadores e de mudança. 
Por exemplo, para se entender a disseminação do cristianismo ou do capitalismo, seria necessário estudar tais acontecimentos sob uma óptica de longa duração, pois foram acontecimentos que levaram séculos para se adaptarem e se consolidar em diferentes cantos do mundo, em diferentes épocas, sob diferentes contextos e em diferentes velocidades. Nesse âmbito, Braudel dizia que a história tradicional: "atenta ao tempo breve, ao indivíduo, ao evento, habituou-nos há muito tempo à sua narrativa precipitada, dramática, de fôlego curto". (BRAUDEL, 1978, p. 44).
Se lembrarmos que a história tradicional era de vertente historicista, que focava a História ao relatar os governos, os feitos dos soberanos, dos generais, dos políticos, dos grandes nomes, dos grandes acontecimentos, logo, tínhamos uma história bastante limitada e reduzida a acontecimentos e as ações destes homens, o que levava a deixar de fora outros aspectos da História. Na longa duração, não se estuda sujeitos e nem as ações, mas sim as transformações  daí, quando Braudel dissera que no seu primeiro volume de O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo, ele escrevera uma geo-história. um "tempo geográfico", onde enfatizava o espaço geográfico e sua influência sobre as sociedades, ao mesmo tempo, nessa geo-história que fazia parte da longa duração, Braudel não dava atenção aos "grandes homens" e aos "grandes acontecimentos", mas o "sujeito" era o lugar e as pessoas. 
"Será Braudel, o historiador das águas, montanhas, planícies, barcos e carros de boi (e seus usuários e modificadores), e não a primeira geração dos Annales, a libertar o século XX historiográfico das prisões biográficas oitocentistas". (FLORES, 2010, p. 105).
"Águas mais calmas, que correm mais profundamente, são o objeto da segunda parte do Mediterrâneo, denominada “Destinos coletivos e movimentos de conjunto”; sua preocupação, a história das estruturas-sistemas econômicos, estados, sociedades, civilizações e formas

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